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Organizadoras Rita Maria Lino Tarcia Sílvia Helena Mendonça de Moraes Débora Dupas Gonçalves do Nascimento Autoras Aline Henriques Reis Andréa Chicri Torga Matiassi Silvia Segovia Araujo Freire CUIDADOS PSICOSSOCIAIS NAS ADOLESCÊNCIAS E JUVENTUDES Organizadoras Rita Maria Lino Tarcia Sílvia Helena Mendonça de Moraes Débora Dupas Gonçalves do Nascimento CURSO DE APERFEIÇOAMENTO EM SAÚDE MENTAL E ATENÇÃO PSICOSSOCIAL DE ADOLESCENTES E JOVENS Autoras Aline Henriques Reis Andréa Chicri Torga Matiassi Silvia Segovia Araujo Freire CUIDADOS PSICOSSOCIAIS NAS ADOLESCÊNCIAS E JUVENTUDES 23-144539 CDD-362.21 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Reis, Aline Henriques Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes [livro eletrônico] / Aline Henriques Reis, Andréa Chicri Torga Matiassi, Silvia Segovia Araujo Freire ; organização Rita Maria Lino Tarcia, Sílvia Helena Mendonça de Moraes, Débora Dupas Gonçalves do Nascimento. -- Campo Grande, MS : Fiocruz Pantanal, 2023. PDF Bibliografia. ISBN 978-85-66909-42-5 1. Adolescência 2. Adolescente - Cuidados e tratamento 3. Dor 4. Saúde mental 5. Sofrimento (Aspectos psicológicos) I. Matiassi, Andréa Chicri Torga. II. Freire, Silvia Segovia Araujo. III. Tarcia, Rita Maria Lino. IV. Moraes, Sílvia Helena Mendonça de. V. Nascimento, Débora Dupas Gonçalves do. VI. Título. Índices para catálogo sistemático: 1. Adolescentes : Política de saúde mental : Bem-estar social 362.21 Eliane de Freitas Leite - Bibliotecária - CRB 8/8415 © 2022. Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF. Fundação Oswaldo Cruz Mato Grosso do Sul. Alguns direitos reservados. É permitida a reprodução, disseminação e utilização dessa obra, em parte ou em sua totalidade, nos Termos de uso do ARES. Deve ser citada a fonte e é vedada sua utilização comercial. UNICEF Representante Interina Paola Babos Coordenação do Programa de Desenvolvimento e Participação de Adolescentes Mário Volpi Coordenador Programa de Desenvolvimento e Participação de Adolescentes Gabriela Mora Joana Fontoura Luiza Leitão Rayanne França Oficiais do Programa Daniela Costa Higor Cunha Marina Oliveira Thaís Santos Consultores do Programa Fundação Oswaldo Cruz - Fiocruz Mario Santos Moreira Presidente em exercício Fundação Oswaldo Cruz Mato Grosso do Sul – Fiocruz MS Jislaine de Fátima Guilhermino Coordenadora Coordenação de Educação da Fiocruz MS Débora Dupas Gonçalves do Nascimento Vice- coordenadora de Educação Secretaria-Executiva da Universidade Aberta do SUS – UNA-SUS Maria Fabiana Damásio Passos Secretária-executiva Fundação Oswaldo Cruz Mato Grosso do Sul (Fiocruz MS) Rua Gabriel Abrão, 92 – Jardim das Nações, Campo Grande/MS CEP 79081-746 Telefone: (67) 3346-7220 E-mail: educacao.ms@fiocruz.br Site: www.matogrossodosul.fiocruz.br CRÉDITOS Coordenação Geral Débora Dupas Gonçalves do Nascimento Sílvia Helena Mendonça de Moraes Coordenadora Acadêmica Geral Léia Conche da Cunha Coordenadora Pedagógica Geral Rita Maria Lino Tarcia Coordenador Acadêmico do Módulo Alberto Mesaque Martins Coordenadora Pedagógica do Módulo Eliane Maria da Silva Anunciação Autoras Silvia Segovia Araujo Freire Aline Henriques Reis Andréa Chicri Torga Matiassi Revisora Técnico-científica Alessandra Silva Xavier Apoio técnico-administrativo Antonio Luiz Dal Bello Gasparoto Adriana Carvalho dos Santos Coordenador de Produção Marcos Paulo dos Santos de Souza Designer Instrucional Felipe Vieira Pacheco Webdesigner Stephanie Oliveira Moraes Silva Designers Gráficos Hélder Rafael Regina Nunes Dias Renato Silva Garcia Desenvolvedor David Carlos Pereira da Cunha Desenvolvedores AVA MOODLE Luiz Gustavo de Costa Vinicius Vicente Soares Editor de Audiovisual Adilson Santério da Silva llustrador Kelvin Rodrigues de Oliveira Revisor Davi Bagnatori Tavares Apresentação do módulo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . QUANDO O SOFRIMENTO BATE À PORTA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O QUE FAZER? PRIMEIROS ESBOÇOS! . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O ACOLHIMENTO E A ESCUTA: ALIADOS DO VÍNCULO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . COMPARTILHANDO E AMPLIANDO O CUIDADO: A CLÍNICA AMPLIADA, O PROJETO TERAPÊUTICO SINGULAR E O APOIO MATRICIAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . O FORTALECIMENTO DE VÍNCULOS: CRIANÇAS, ADOLESCENTES, FAMILIARES E COMUNIDADE . . . . . . . . . . . . . . . . . PROJETOS DE VIDA E OUTRAS ESTRATÉGIAS POSITIVAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Encerramento do módulo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Minicurrículo das autoras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Material de apoio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 7 23 33 47 50 55 60 61 65 68 SUMÁRIO Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 6 apresentação do módulo Olá! Seja bem-vindo a mais uma etapa dessa jornada! Nessa nova parada, nosso objetivo é ajudar você a identificar as necessidades psicossociais de crianças e adolescentes que estão em situação de sofrimento e realizar os primeiros socorros psicológicos . Talvez, no seu dia a dia, você se depare com mui- tas Anas e com certeza já se perguntou o que pode fazer para ajudá-las, tanto de forma presencial quanto remota . Assim como no caso apresentado, nesse momento, aí próximo a você, exis- tem muitas crianças e jovens vivenciando sofrimentos psíquicos que se manifestam em comportamentos que colocam a vida deles em risco, como: uso abusivo de drogas, bulimia, anorexia, automutilaçãoe tentativas de suicídio . Neste módulo, enfatizare- mos os dois últimos . Talvez, você tenha muitas dúvidas e até se sinta incapaz e paralisado, sem saber o que fazer diante de tantos casos . E agora? O que fazer? É possível que você acredite que apenas profissionais de saúde mental, como psicólogos e psiquiatras, possam ajudar um jovem nessa situação . É provável também que você sinta que tenha que encaminhar esse “problema” o mais rápido possível, transferindo a responsabilidade para os serviços de saúde . Mas calma! Neste módulo, veremos que identificar as necessidades dos jovens e oferecer os primeiros socorros psicológicos são pa- péis que podem ser exercidos por qualquer pessoa, desde que ela esteja disposta a acolher e a escutar a criança e o adolescen- te . Como vimos no caso, Ana teve comportamentos que coloca- ram sua vida em risco, os quais só foram expostos para pessoas da sua escola . Entretanto, na história de Ana, uma coordenadora pedagógica da escola soube como acolhê-la, ou seja, teve uma escuta sensível e comprometida para o que se passava naque- le momento, fornecendo os primeiros cuidados, indispensáveis para circunstâncias como essa . Venha conosco e vamos apren- der um pouco sobre como você também pode ajudar os jovens da sua comunidade! Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 7 Quando o sofrimento bate à porta O campo da saúde mental, amparado nos fundamentos do Sistema Único de Saúde (SUS), produz uma nova forma de lidar com o sofrimento psíquico: os cuidados voltados para as pessoas com sintomas psicológicos não se restringem às equi- pes de saúde mental, mas se ampliam para outros profissionais, além dos familiares e comunidade . Proposição 1 Feedback positivo: Feedback orientador: Você sabia que o Sistema Único de Saúde (SUS) brasilei- ro é referência mundial em Saúde Coletiva? O SUS é mais do que um conjunto de leis e normativas que orienta e regulamenta o funcionamento dos serviços de saúde . Ele é também uma proposta política que entende a saúde como um direito de todas as pessoas . Além disso, o SUS parte da ideia de que a saúde vai muito além da ausên- cia de doenças e inclui todos os fenômenos que fazem parte da nossa vida . Por isso, no SUS, há uma valorização de um trabalho coletivo, envolvendo muitos atores, como profissio- nais de saúde, gestores, usuários, familiares e demais atores dos territórios . O SUS é uma conquista social brasileira, referência em Saú- de Pública em todo o mundo . Desde sua regulamentação, em 1990, o SUS vem se transformando e sendo aprimorado, inovando as formas de pensar e executar as ações em saú- de . Uma das grandes inovações do SUS é a constatação da complexidade dos fenômenos da saúde e do adoecimento, exigindo a construção de saídas, que requer o envolvimento de vários setores da sociedade e vários atores que atuam no território . No que se refere à saúde mental, o SUS valoriza que o cuidado aconteça de forma integrada ao território, en- globando os diferentes saberes de todos os envolvidos . Por isso, não é preciso ter uma formação específica, como psi- cologia ou psiquiatria, para trabalhar na promoção da saúde mental dos jovens . Você pode colaborar com essa constru- ção procurando outras pessoas interessadas, de diferentes setores e serviços, e organizar espaços para conversas e discussões, como reuniões, fóruns, entre outros . Nesses en- contros é importante que você busque informações sobre os princípios que orientam o SUS e inicie o planejamento de ações e projetos que, certamente, contribuirão para a me- lhoria da qualidade de vida de todos os integrantes do terri- tório em que você vive e atua . Outra dica importante: como dissemos anteriormente, saúde não é apenas ausência de doenças . Por isso, é importante que as ações enfatizem os modos de vida, o cotidiano, os aspectos culturais e políticos, ou seja, que também incluam aspectos relacionados à vida e ao contexto dos jovens . ? Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 8 Serviços que acolham o público infantil e jovem seguem premissas semelhantes e devem levar em consideração as parti- cularidades dessas etapas da vida, que não são poucas . Essa visão mais ampliada deve alcançar, por exemplo, a bagagem histórica trazida pelas crianças e pelos adolescentes, e essa não é uma tarefa exclusiva dos profissionais de saúde, po- dendo ser exercitada por todas as pessoas que lidam e convivem com esse público, sendo atores fundamentais para a garantia de acolhimento, cuidado e encaminhamento para os tratamentos especializados. Com essa escuta, profissionais e demais pes- soas que atuam com os jovens podem promover o autoconhe- cimento e ajudá-los na construção de saídas saudáveis para os impasses e riscos que porventura se apresentem . Portanto, inicialmente, é preciso compreender que a saú- de engloba o bem-estar físico, psíquico e emocional, não sendo apenas a ausência de doenças . Para isso, faremos algumas con- ceituações importantes e, em seguida, refletiremos sobre vários aspectos da saúde: desde os primeiros cuidados na urgência dessas crianças e adolescentes até as possibilidades de constru- ções de saídas coletivas para esses casos que serão abordados nas circunstâncias de crise e urgência . Veremos a seguir que não existe uma abordagem única para tratar dos impasses das crianças e dos jo- vens, assim como não há uma boa abordagem sem um cuidado integral de saúde, ou seja, sem um olhar mais ampliado que inclua os aspectos sociais, culturais, políticos, entre outros. Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 9 Crise, automutilação e suicídio: definição e entrelaçamento desses conceitos Conviver com os amigos, o primeiro beijo, a primeira ex- periência sexual, entre outras experiências são momentos muito importantes na vida de um adolescente . Geralmente, essas expe- riências costumam acontecer na escola ou no grupo de amigos que estudam juntos ou moram próximos . Você se lembra das suas experiências nesse período? Proposição 2 Feedback positivo: Feedback orientador: A adolescência é uma fase desafiadora tanto para quem está nela quanto para quem convive com o adolescente. Você conhece as mudanças psicológicas que os adoles- centes experienciam nessa fase e como elas afetam as relações com as famílias? A adolescência é uma fase de busca de autonomia e cons- trução da própria identidade . Nessa fase, há uma busca por gratificação imediata, isto é, quando se quer alguma coisa, tem que ser naquele momento . Há maior impulsividade, ou seja, agir sem pensar nas consequências . Os amigos pas- sam a ter muita influência, às vezes até maior que a famí- lia, gerando algum tipo de distanciamento dos jovens dos seus pais . E, com o mundo virtual, que se ampliou durante a pandemia, é importante que a família procure estar mais próxima dos jovens e conhecer os seus amigos, já que são pessoas que podem ter (e geralmente têm) uma influência muito grande sobre o comportamento dele . Apesar de ser desafiadora devido às mudanças corporais, hormonais e cerebrais que provoca, a adolescência não precisa ser desesperadora! A fase anterior à adolescência, chamada terceira infância, costuma ser mais tranquila, visto que a criança já tem mais autonomia, isto é, consegue fazer muitas coisas sozinha e não depende tanto dos pais como dependia antes . Isso pode trazer um afastamento gradativo, já que, na infância, muitas interações aconteciam em virtude da necessidade dos cuidados diários . Para chegar à adoles- cênciacom uma relação saudável e de confiança com o fi- lho, é necessário estar presente na vida dele, ter momentos para conversar sobre o dia, sobre os acontecimentos, ouvir abertamente, sem julgamentos e sem oferecer uma solução imediata para os problemas . Assim, a criança vai aprenden- do que pode confiar nos pais. À medida que a criança vai en- trando no mundo digital, os pais precisam estar atentos ao que acontece, ao que os filhos acessam. Um aplicativo cha- mado Family link pode ser instalado no celular de um dos pais. Ele possibilita aos pais: definir quanto tempo a criança poderá usar o celular; quais aplicativos ela baixa; bloquear atividades, entre outras intervenções . ? Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 10 Para as crianças e adolescentes, além de ser um local de aprendizagem de conteúdos e conceitos, a escola também é um espaço que contribui para a socialização e promoção da cidada- nia . Quando a família é ausente ou disfuncional, a escola serve como local de refúgio e apoio, longe das dificuldades familiares. Além dela, outros lugares, como centros de convivência, praças e espaços de lazer, instituições religiosas, entre outros, são espa- ços ocupados pelos jovens, onde aprendem a ser e a conviver . Nos últimos anos, esse cenário foi inesperadamente al- terado . Como uma espécie de pesadelo ou história de terror, a pandemia de Covid-19 gerou insegurança, medo, angústias e muitas mortes . As medidas de distanciamento social tiraram dos jovens as experiências de convivência com amigos e sociedade em geral e aumentaram o tempo de convivência com a família, suscitando as dificuldades inerentes a essa convivência (DA MATA et al ., 2021) . O distanciamento social também gerou ou- tros desafios, como: a incerteza quanto ao futuro, à doença e à morte; dificuldades acadêmicas e de adaptação ao estudo on-li- ne; problemas financeiros; e insegurança alimentar. Além disso, a mudança repentina do ensino presencial para o ensino remoto, sem o preparo e as condições adequadas, somada à longa du- ração da pandemia, fez com que as crianças e os adolescentes entrassem em grande sofrimento . Fonte: Wikimedia Commons Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 11 Observe, a seguir, algumas falas de crianças e adolescen- tes de alguns países da América Latina sobre esse período (UNI- CEF, 2021): Fonte: Unicef (2021) . Disponível em: https://www.unicef.org/media/108126/file/SOW- C-2021-Latin-America-and-the-Caribbean-regional-brief .pdf . Acesso em: 10 nov . 2022 . Antes mesmo da pandemia de Covid-19, a saúde mental dos jovens já vinha chamando a atenção e gerando preocupa- ções . De acordo com o relatório Situação Mundial da Infância 2021 (UNICEF, 2021), quase um em cada seis meninas e meni- nos entre 10 e 19 anos de idade, no Brasil, tem algum transtorno mental . Nessa idade, esse grupo está mais exposto ao risco de automutilações, depressão e suicídio . Conforme Botega (2023), em cada 100 habitantes, 17 têm ideação suicida, com pensa- mentos de acabar com a própria vida, 5 chegam a elaborar um plano suicida, 3 tentam o suicídio e apenas 1 entre esses três é atendido em um pronto-socorro . Esses dados são preocupantes, pois revelam que o número de pessoas que precisam da nossa ajuda é muito maior do que aqueles que chegam até os serviços de saúde . Ou seja, a coisa está feia! E, por isso, precisamos de todos envolvidos no enfrentamento desse desafio. Identificar sinais precoces de sofrimento psíquico, no contexto de vida da criança e do adolescente, pode impedir a escalada da crise, bem como possibilitar o início do cuidado necessário o mais precocemente possível, protegendo a saúde do jovem e potencializando os cuidados o mais rápido possível . Como vimos no caso de Ana, é muito importante refletirmos so- bre como podemos fornecer os primeiros cuidados psicológicos em momentos de crise, quando as crianças e os adolescentes estão colocando suas vidas em risco, principalmente com com- portamentos de automutilação e tentativas de suicídio . Uma primeira forma é a observação durante a convivên- cia. Nesse contexto, você pode identificar alguns sinais e mu- danças no comportamento da criança ou adolescente, como “Não poder ver seus amigos causa depressão porque falar em uma tela não é a mesma coisa – você não tem a mesma conexão que vê-los pessoalmente.” (Menina mais nova, Jamaica). “Fico muito triste e depois começo a tremer, começo a fi- car sem ar e depois começo a chorar, tipo sem conseguir segurar... pareço um zumbi e não tenho mais nada para fazer ou tento levantar meu ânimo, mas até que eu durma isso não vai acontecer.” (Menina mais nova, Chile). “[Pais invalidando nossas experiências] acontece muito. Por exemplo... uma pessoa conta [aos] pais [sobre] seus problemas, e os pais podem dizer: ‘...Você não tem dívida ou nada para ficar triste’, e coisas assim.” (Menino mais novo, Chile). “Quando eu era mais jovem, expressava muito mais meus sentimentos, mas eles não eram validados quando eu ti- nha 13, 14 anos. Eu poderia dizer: ‘Tenho depressão ou me sinto triste’, e eles diriam: ‘Não, você não sabe o que sente porque tem 12 anos’.” (Menina mais velha, Chile). https://www.unicef.org/media/108126/file/SOWC-2021-Latin-America-and-the-Caribbean-regional-brief.pdf https://www.unicef.org/media/108126/file/SOWC-2021-Latin-America-and-the-Caribbean-regional-brief.pdf Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 12 retraimento, tristeza e irritabilidade . Outra importante estratégia para identificar pistas é acompanhar as redes sociais dos jovens, um canal de comunicação muito utilizado por eles . Uma matéria do site BBC (2019) revela a história de uma jovem norueguesa que, ao perder a melhor amiga por suicídio, passou a observar posts que poderiam ser indicativos de sofrimento mental e idea- ção suicida . Segundo ela: “Vejo muitas pessoas que querem morrer. Não vou apenas ficar vendo uma pessoa dizer que vai se matar, ignorar isso e esperar pelo melhor”. No Brasil, um funkeiro levantou suspeitas de sofrimento ao colocar uma foto pessoal que mostrava uma corda e a legenda: “Aprecie a vida, cada momento!”, deixando internautas e fãs preocupados. Uma influencer digital, que enfrentava um quadro grave de de- pressão e ansiedade e efetivou o suicídio, chegou a postar nas re- des sociais: “Entendam, ter depressão é ter que sair da cama sem vontade, e ter que lutar por coisas que não fazem mais sentido para você. Porque expor aqui? Simples. Pra que todos entendam que a vida do insta só mostra uma camada, e tenho certeza que tem muitaaaaaa gente aqui passando por isso”. Proposição 3 Feedback positivo: Feedback orientador: Os influenciadores digitais têm conquistado cada vez mais a atenção do público infantil e adolescente. Você sabe o que é um influenciador digital? Influenciador digital é uma pessoa que tem muitos segui- dores (pessoas que estão cadastradas no perfil do influen- ciador). Eles geralmente falam sobre um tema específico (humor, moda, jogos etc.), mas também podem usar o perfil para falar de si . Nos tempos das redes sociais e da internet, é quase impossível que os jovens não estejam em contato com influenciadores. As redes sociais também têm sido uti- lizadas como espaços importantes para comunicação dos jovens, que podem encontrar influenciadores positivos que podem servir de inspiração para o aprendizado de diversos temas e assuntos . Apesar de as crianças e adolescentes muitas vezes criarem perfis falsos sem que os pais saibam, é importanteque os cuidadores tenham acesso às redes sociais dos filhos e veri- fiquem com alguma frequência o que eles postam, quem se- guem e que tipo de conteúdo estão consumindo . Também é importante conversar com os jovens a fim de conhecer quem são as pessoas que os influenciam (artistas, bloguei- ras, personalidades da mídia etc .) . Mais uma vez, o diálogo e a escuta acolhedora são apoios importantes que permitem o fortalecimento de vínculo com os jovens e favorecem a re- flexão sobre o conteúdo que acessam na internet. ? Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 13 Como você viu anteriormente, o suicídio é um problema social que existe há muitos séculos, inclusive atingindo crian- ças e adolescentes, mas habitualmente era abordado de uma forma silenciosa, tímida e delicada, tanto pelo tabu que envolve o assunto, quanto pelo constrangimento causado em familiares que perderam alguém por suicídio . Hoje, por ser um indicador em constante crescimento, tornou-se um grande problema de saúde pública, sendo necessário conversar sobre o assunto em todos os espaços possíveis e com a ajuda de todas as áreas do conhecimento . Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2021), morrem, anualmente, no mundo, 700 mil pessoas por suicídio . Essa é a quarta maior causa de morte de adolescentes de 15 a 29 anos e tem crescido exponencialmente em menores de 14 anos, indicador em que Ana está enquadrada . Cabe destacar que o suicídio é um fenô- meno complexo e multifatorial que pode afetar indivíduos de diferentes origens, faixas etárias, condições socioeconômicas, orientações sexuais e identidades de gênero . Assim, ele atinge todos os grupos, tornando-se um desafio ainda mais complexo. Contudo, como podemos definir o suicídio? Ele tem relação com a automutilação? Vamos tentar entender, até para podermos chegar às possibilidades de intervenção quando nos deparamos com essas situações . O suicídio pode ser definido “como um ato deliberado executado pelo próprio indivíduo, cuja intenção é a morte, de forma consciente e intencional, mesmo que ambivalente, usan- do um meio que ele acredite ser letal” (LOPES, 2022, p . 296-297) . Geralmente, o suicídio é visto como uma maneira de acabar com a dor . Ocorre uma espécie de restrição mental em que a pessoa enxerga o suicídio como a única forma de resolver a situação, de acabar com o sofrimento que ela está vivenciando (BOTEGA, 2023) . Há níveis relacionados ao suicídio, que vão desde a exis- tência de ideias sobre o ato, como pensamentos de morrer, até planos muito elaborados de tirar a própria vida . No Quadro 1, há uma descrição de cada nível (BOTEGA, 2023) e a definição de automutilação (ARATANGY, 2017) . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 14 QUADRO 1 – NÍVEIS DE IDEAÇÃO E COMPORTAMENTO DE AUTOEXTERMÍNIO Nível Definição Exemplos Autolesão não suicida ou automutilação Machucar-se intencionalmente na superfície do cor- po, gerando sangramento, contusão ou dor (por exemplo, cortar, queimar, bater, esfregar excessiva- mente), com a expectativa de que a lesão não leve à morte (isto é, não há intenção suicida) (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014) . A intenção da automutilação é aliviar algum sofrimento emocional, sentimento de raiva, tristeza, angústia ou vazio inter- no (ARATANGY, 2017) . Objetos para se machucar: lâminas de barbear, cli- pes, grampos de cabelo, facas, tampas de caneta, entre outros . Queimar-se com isqueiro, cigarro ou ferro de pas- sar roupa também são ações possíveis . Os locais podem ser: braços, pernas e barriga (ARATANGY, 2017) . Ideação suicida Ter pensamentos que se relacionam ao desamparo (sensação de estar sozinho, não poder contar com ninguém) e à desesperança (a ideia de que as coisas não vão melhorar ou que podem piorar) . Pensamentos como: “se eu morresse, ninguém sentiria a minha falta”; “eu queria dormir e não acordar mais”; “não posso contar com ninguém”; “as coisas nunca vão melhorar pra mim”; “nunca vou ser feliz”; “eu preferia estar morto” . Intenção suicida Ter o desejo de se matar e alguma intenção de agir conforme esse desejo . Pensamentos como: “Eu não aguento mais . Tô sur- tando. Preciso pôr um fim nessa minha dor”. Plano suicida A maneira como pretende executar o suicídio: dia, local, horário, método etc . Quanto maior a letalidade do método, ou seja, a chance de morrer, e o conheci- mento sobre isso, mais preocupante é . Pensamentos como: “Não vejo solução . É melhor acabar com isso logo”; “Vou colocar um fim na mi- nha dor” . Pesquisa sobre formas de fazer, conversa com pes- soas sobre o tema, planeja como fazer . Tentativa de suicídio Comportamento não fatal dirigido a si mesmo, poten- cialmente nocivo, com qualquer intenção de morrer . Uma tentativa de suicídio pode ou não provocar feri- mento . A tentativa pode ter sido feita por ingestão de me- dicamentos, um nó em corda que se desfez, al- guém que salvou a pessoa antes da morte . Suicídio Quando a pessoa tem êxito e consegue se matar . Os meios mais letais envolvem arma de fogo e en- forcamento . Fonte: Botega (2023) e Aratangy (2017) . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 15 Já os comportamentos autolesivos, também conhecidos como automutilação, envolvem machucar partes do corpo de forma intencional, mas não têm o intuito de causar dano letal . Podem ser: leves, quando as lesões são realizadas com pouca frequência e têm baixa gravidade; moderadas, quando as le- sões são graves a ponto de a pessoa precisar de ajuda médica; e graves, quando as lesões são feitas com frequência e têm maior gravidade, causando prejuízos às pessoas, como os machuca- dos no corpo e o isolamento dos grupos de pertença . As auto- lesões geralmente têm impacto negativo na saúde mental do próprio indivíduo e envolvem: punir-se por algo que acredita ter feito de errado e regular as emoções intensas e geralmente desa- gradáveis . A pessoa faz isso tanto porque, após se cortar, sente um alívio, uma sensação de anestesia, como porque a dor desvia o foco das emoções desagradáveis . As autolesões também têm um impacto nas relações interpessoais, ou seja, as outras pesso- as se preocupam e dão mais atenção, portanto pode trazer um senso de pertencimento . Existem grupos e comunidades que se relacionam justamente por compartilharem esses temas, como as adolescentes que Ana encontrou na internet (QUESADA et al ., 2020) . As situações descritas configuram o auge do sofrimento. No entanto, como perceber que a criança ou o adolescente pre- cisa de ajuda? Como diferenciar comportamentos típicos dessa fase de situações de crise? Como a palavra crise é muito utilizada no contexto da adolescência, é necessário esclarecer que ques- tões pontuais e certos comportamentos típicos desse momen- to de vida não devem ser confundidos com situações de crise, tampouco com doenças . De acordo com alguns estudos sobre a adolescência, alguns comportamentos e características dessa etapa da vida são: insegurança, busca de sensações, impulsivi- dade e agressividade, que seriam consequências das mudanças biológicas e hormonais que acontecem nesse momento da vida (GOMES, 2017) . Em outras palavras, a adolescência é uma fase em que ocorrem muitas mudanças, o que nem sempre é vivido sem conflitos. Contudo, a palavra crise é muito utilizada na área da saúde, especialmente para designar situações de intenso sofri- mento e de gravidade significativa (ALKMIM, 2010). As mudan- ças abruptas de comportamento decorrentes de sofrimento ou prejuízo ajudam a entender melhor essacomparação, como: um adolescente que sempre ficou irritado em determinadas si- tuações passa a ter comportamentos de raiva e agressividade mais intensamente, ameaçando machucar os colegas, animais e a si próprio . Essa mudança pode ser um sinal de que esse ado- lescente está em crise . Assim, o próprio jovem é usado como parâmetro de comparação, ou seja, é preciso conhecer a história dele para identificar quando as mudanças ocorreram e em qual intensidade . Podemos sugerir como indicadores “normais” as mudan- ças de comportamento, o aparecimento da tristeza, a queda no rendimento escolar, entre outros . No que se refere ao suicídio, um risco baixo envolve ausência de tentativa anteriores e, caso ocorram ideias desse tipo, elas são passageiras e geram ansieda- de, perturbação . Além disso, se há um transtorno mental prévio, os sintomas são leves e o jovem tem vida e apoio social (BOTE- Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 16 GA, 2023) . A música Eu sou um fracasso, de Bia Marques (https:// www .youtube .com/watch?v=Z3qzsaim-AA, disponível em 11 out . 2022) mostra o início de uma crise, a sensação de estar só e de ser um fracasso, assim como a desesperança de ser compreendida . Por outro lado, cita lembranças de bons momentos, bem como alguma rede de apoio: “Mas pelo menos sei que com você posso contar” . Com relação aos indicadores médios, “complicados”, é preciso observar se os pensamentos negativos são persis- tentes, mesmo que não envolvam a intenção de tirar a própria vida ou machucar alguém, se as autoagressões estão presen- tes e com qual frequência e gravidade, se tem algum histórico de tentativa de tirar a própria vida, se há isolamento, piora no rendimento escolar e falas de desesperança . Quanto ao risco de suicídio, é moderado se há diagnóstico de depressão ou transtorno bipolar, se os pensamentos de suicídio são fre- quentes, se o suicídio parece ser a solução e se a pessoa conta ou não com apoio social . Em um risco moderado de suicídio, a pessoa não é impulsiva, não faz uso ou abuso de drogas e não tem um plano para se matar (BOTEGA, 2023) . A música RAP - me sinto perdido, nossos sentimentos (https://www .youtube . com/watch?v=7yIlon_oGnI, disponível em 11 out . 2022) retrata um nível um pouco mais intenso de sofrimento: “não faz sen- tido a vida que eu carrego”; “não sei mais se eu vivo por mim mesmo”; “parece que estou perdido nesse mundo sem saída, onde a única opção é uma escolha suicida” . Nela, encontramos alguns indícios de já ter havido uma tentativa anterior de sui- cídio: “me olhando no espelho meu passado me atormenta . O porquê eu fiz aquilo? Talvez ninguém entenda”. Apesar da su- posta tentativa de suicídio anterior e de a pessoa considerar o suicídio como uma opção real e como a solução, identifica-se uma rede de apoio: “Agradeço aos amigos por estarem ao meu lado”, e a ambivalência, indicando, além do desejo de morrer, uma esperança para viver . Músicas, como a citada acima, falam de desesperança, ideação suicida, sentimentos de vazio e temas afins. Apesar de serem impactantes, elas também podem ajudar a nos aproximar da dor de nossas crianças e adolescentes para que possamos compreender como eles se sentem . Além disso, as músicas po- dem ser usadas para suscitar discussões sobre suicídio com os adolescentes, especialmente os que representam nível baixo e moderado de ideação . https://www.youtube.com/watch?v=Z3qzsaim-AA https://www.youtube.com/watch?v=Z3qzsaim-AA https://www.youtube.com/watch?v=7yIlon_oGnI https://www.youtube.com/watch?v=7yIlon_oGnI Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 17 Proposição 4 De que maneira podemos usar músicas para abordar o sofrimento emocional dos jovens? ? Feedback positivo: Os jovens gostam muito de música . Passam boa parte do dia com seus fones de ouvido . As músicas citadas no texto fo- ram escritas por jovens e retratam elementos associados ao sofrimento de que tratamos neste módulo . Feedback orientador: Para iniciar a discussão, pode-se passar o clipe da música ou apenas o áudio, entregando ou projetando a letra dela enquanto o áudio/vídeo é passado . Questões norteadoras como as seguintes podem suscitar a discussão: Música: “Eu sou um fracasso” - O que fez com que a pessoa se sentisse dessa maneira? - Como é a relação da protagonista da música com a pessoa a quem ela fala? - Na sua opinião, o que a protagonista quer receber? Do que ela precisa? - Você já se sentiu de forma parecida? Como? Música: “Rap - Me Sinto Perdido | Nossos Sentimentos” No início da música, o protagonista diz se sentir perdido e acredita que a única opção é o suicídio . O que você pensa sobre isso? Mesmo em situações de muita dificuldade ou de extremo sofrimento, que alternativas uma pessoa pode ter? (pedir ajuda na escola, na unidade básica de saúde, na as- sistência social, no conselho tutelar etc .) O protagonista revela ter perdido pessoas que amava e se questiona se vale a pena viver . Que motivos fazem a vida valer a pena? (família, amigos, animais de estimação, coisas que eu quero fazer, lugares que eu quero conhecer etc .) . A música fala de momentos bons já vividos . Liste três mo- mentos muito bons da sua vida . Tente relembrá-los, como se pudesse revivê-los como um filme em sua mente. Considerando o trecho “É difícil ver pessoas sorrindo ale- gremente; Sem ao menos entender a batalha na sua mente”, você acredita que isso acontece na vida real? Ou seja, pes- soas postam nas redes sociais momentos felizes, mas muitas vezes estão passando por alguma dificuldade ou sofrimento? O trecho “Tenho errado demais pra tu viver junto a mim” traz a ideia de que o protagonista não se sente digno ou à altura de uma pessoa de que ele gosta . Você já se sentiu dessa maneira? Que motivos você tem para orgulhar-se de si mes- mo? Lembre-se de que todos nós temos defeitos e come- temos erros . Todas as pessoas têm coisas sobre si que não gostariam que os outros soubessem . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 18 Como indicadores altos, ou “casos graves”, devem ser verificadas a existência de tentativas anteriores de suicídio e a dependência de álcool ou de outras drogas . Nesse cenário, o jo- vem em crise não vê saídas. Há um plano definido de se matar e ele já pensou em formas de fazer isso, além de já ter providencia- do o que precisa para o ato (BOTEGA, 2023) . FRASES QUE PODEM SINALIZAR PENSAMENTOS SUICIDAS De acordo com Franzin, Reis e Neufeld (2017), o que costuma desencadear uma crise na infância e na adolescência são problemas na família, na escola ou piora de uma psicopatologia já existente, como depressão . A seguir serão listados alguns sinais que podem indicar que o adolescente está em crise, sempre levando em consideração como ele era habitualmente, como está agora e a frequência e intensidade dos comportamentos: - Comportamento agressivo e violento, como quebrar ou jogar coisas, gritar, xingar ou desafiar adultos; - Tentativa de suicídio, tomando remédios, jogando-se de luga- res altos, enforcando-se, usando arma de fogo ou de outras ma- neiras; - Machucar a si mesmo se beliscando, cortando-se, batendo em si mesmo; - Desenvolver depressão e transtornos de ansiedade; - Começar a usar álcool, cigarro ou outras drogas em excesso; - Desregulação emocional, ou seja, choro difícil de controlar ou ficar irritado com facilidade e com frequência, assim como falta de paciência . No caso de Ana, o sentimento de culpa pela morte do pai, a falta que sentia dele, a baixa autoestima, o desconfortoque sentia em casa pela presença do padrasto, a falta de opções de lazer, o afastamento da amiga Karen e as críticas da mãe foram fazendo com que ela ficasse cada vez mais distante, sentindo-se ainda mais sozinha. Ana começou a ficar muito irritada, sem pa- ciência (a irritabilidade frequente e intensa é um sintoma impor- “Quero acabar com o sofrimento”. “Vou deixar de ser um problema para minha família ou meus amigos”. “Eu ando pensando besteira”. “Acho que minha família ficaria melhor se eu não estivesse aqui”. “Eu sou um peso para os outros”. “Estou com pensamentos ruins”. “Eu não aguento mais”. “As coisas não vão dar certo. Não vejo saída”. “Eu preferia estar morto”. “Vou desaparecer”. “As pessoas acham que depressão é frescura. Depois que a pessoa se mata vão ver o que é frescura”. “Vou sumir”. “Em breve isso tudo vai acabar!” Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 19 tante de depressão em crianças e adolescentes), passou a não dormir bem, perdeu a vontade de comer e deixou de fazer coisas de que gostava antes, como fazer vídeos e postar no TikTok . Como destacado anteriormente, a mãe de Ana percebeu as mudanças do comportamento da adolescente e pensou que fosse coisa da adolescência ou “aborrescência”, termo muito uti- lizado, no senso comum, para se referir a essa fase da vida . Essa nomeação é carregada de estereótipos, pois considera que os adolescentes sempre aborrecem ou têm comportamentos equi- vocados . Esses estereótipos colaboram para calar as crianças e os adolescentes, principalmente nas horas em que eles mais preci- sam, sendo, portanto, negligenciados, silenciados ou esquecidos . Proposição 5 Você sabe por que é tão comum o conflito entre pais e filhos na adolescência? ? Feedback positivo: Feedback orientador: As interações entre pais/mães e filhos se transformam du- rante a adolescência devido a algumas características dessa fase do desenvolvimento, como: busca pela independência e pela identidade, maior maturidade e capacidade de crítica sobre o mundo e ampliação da rede de contato do adoles- cente, possibilitando o acesso a valores e informações que fogem à esfera familiar . Trata-se de um momento de maior autonomia dos jovens e que pode contribuir para o desen- volvimento de importantes diálogos sobre temas comple- xos, como valores, política e a própria vida . Os pais precisam aprender habilidades de negociação e ser menos impositivos e punitivistas . A próxima etapa de vida será a adulta, portanto a adolescência é uma etapa de tran- sição na qual a pessoa precisa aprender a negociar, tomar decisões e lidar com as consequências dessas decisões . Como ainda está em fase de aprendizagem, precisa de mo- nitoramento . Dessa forma, os adolescentes não podem ser completamente livres para fazer o que quiserem . No entan- to, a imposição, além de não ensinar o filho a refletir, pois a ordem vem de cima para baixo, costuma gerar raiva e a sen- sação de não ser ouvido . Assim, é preciso que os pais com- preendam o comportamento do filho como uma luta pela autonomia e não como um desafio deliberado. Uma dica é estabelecer regras negociáveis e outras que não entram em negociação . As regras, de preferência dialogadas e nego- ciadas, devem estar claras aos adolescentes, bem como as consequências do não cumprimento . É preciso que ocorra um monitoramento apropriado dos filhos, que os pais sai- bam onde os filhos estão e o que fazem durante o dia. Para tanto, precisam definir claramente como terão acesso a es- sas informações e de que maneira isso será feito . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 20 Fique de olho: sinais de alerta e fatores de risco para automu- tilação e ideação/tentativa de suicídio A depressão é um importante fator de risco tanto para a automutilação quanto para o suicídio . Reconhecer que a criança ou o adolescente está em um quadro depressivo é importante para fornecer suporte e fazer os encaminhamentos necessários . O vídeo Um cachorro preto chamado depressão (https://www . youtube .com/watch?v=6RIu4a7hdAA, disponível em 11 out . 2022) ilustra os sintomas do transtorno . Entre os jovens, em vez de tristeza, pode aparecer com maior frequência a irritabilidade, como no caso de Ana . Entre crianças de 6 a 8 anos, é comum queixas somáticas, como dor de cabeça e dor de barriga . Em adolescentes, as notas na escola podem cair e haver mais fome e sono (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014) . Aratangy (2017) explica que transtornos mentais (como depressão e presença de um trauma), vivências difíceis na in- fância, características pessoais e aspectos sociais são fatores de risco para automutilação e ideação suicida . Com relação aos as- pectos sociais, é preciso prestar atenção: se a criança ou o ado- lescente está se isolando em demasia, tanto da família como de amigos; se está sofrendo bullying (ver módulo 3); se tem em seu histórico de navegação na internet busca de informações sobre automutilação e/ou suicídio; e se tem pessoas conhecidas e/ ou próximas que se mutilam e/ou também apresentam ideação suicida . Quanto às características pessoais, destacam-se a im- pulsividade e a instabilidade emocional, distorções na imagem corporal, pessimismo, insegurança e baixa autoestima e dificul- dades de se relacionar e de regular as emoções . As vivências na infância que são sinais de alerta envolvem: traumas psicológicos, como negligência e violência sexual, física ou emocional; rela- ções familiares disfuncionais; depressão ou dependência de ál- cool e de outras drogas em um ou ambos os pais . Analisando esses fatores de risco, pode-se verificar que Ana tinha vários deles: pode-se pensar em relações familiares disfuncionais (pai era alcoolista e faleceu e Ana se sentia culpa- da pela morte dele; a mãe era crítica e distante emocionalmente; Ana tinha sensação de desconforto na presença do padrasto); Ana mantinha contato pela internet com outras meninas que se cortavam; após o namoro da amiga Karen, Ana isolou-se em casa e na escola, não tinha amigos e ainda lidava com uma queda no rendimento escolar . Ana não gostava de sua aparência nem de seu corpo, portanto desenvolveu baixa autoestima, e suas baixas notas pareciam confirmar suas dúvidas sobre seu próprio valor. Ana apresentava muitos sintomas de depressão que poderiam ter sido reconhecidos, caso os pais e educadores soubessem identificá-los. Conforme Botega (2023), o suicídio pode acontecer tam- bém de forma impulsiva, não planejada, em uma situação de so- frimento intenso (por exemplo, descobrir que a pessoa amada está com outra pessoa ou estar diante de um evento inespera- do, como a prisão dos pais, a morte repentina de uma pessoa querida ou a descoberta de uma doença grave) com um meio letal disponível (arma, veneno, medicamentos, entre outros) . O impulso de cometer suicídio pode ser transitório e durar alguns minutos ou horas . Acalmando-se a crise e ganhando-se tempo, é possível diminuir o risco . Por isso, é muito importante que, nes- https://www.youtube.com/watch?v=6RIu4a7hdAA https://www.youtube.com/watch?v=6RIu4a7hdAA Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 21 sas situações, os jovens recebam os primeiros socorros psicoló- gicos pelas pessoas que os acompanham, mesmo que não se- jam profissionais de saúde mental. Essa ação rápida é essencial para preservar a saúde e a vida do jovem em sofrimento . Dessa forma, com o objetivo de prevenir o suicídio de adolescentes, Botega (2023) sugere orientar os pais a tirar de casa ou esconder elementosque possam ser usados no ato sui- cida, como armas, facas, cordas e medicamentos, que devem ficar em local que a pessoa não consiga acessar, de preferência trancado, e com alguém responsável por administrá-los) . O autor também recomenda prestar atenção ao adolescente que geral- mente demonstra alguns sinais de alerta relacionados ao risco de suicídio . Alguns desses sinais são: • Mudanças importantes no jeito de ser ou na rotina; • Comportamento ansioso, agitado ou deprimido; • Piora no desempenho na escola, no trabalho e em outras ati- vidades em que costumava ter bons resultados; • Afastamento de família e de amigos; • Não querer mais fazer atividades de que gostava; • Descuido com a aparência; • Perda ou ganho de peso; • Mudança no padrão de sono, ou seja, dormir mais do que es- tava habituado ou ter dificuldade para dormir ou ainda acor- dar de madrugada e não conseguir dormir mais; • Comentários autodepreciativos persistentes (por exemplo, “sou uma pessoa ruim”; “ninguém vai querer namorar uma pessoa como eu”; “eu sou um peso para os outros”; “só faço as pessoas sofrerem”); • Comentários negativos sobre o futuro, desesperança; • Disforia marcante (combinação de tristeza, irritabilidade e acessos de raiva); • Comentários sobre morte, sobre pessoas que morreram e in- teresse por essa temática; • Doação de pertences que valorizava; • Expressão clara ou velada de querer morrer ou pôr fim à vida. Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 22 Na história que vimos anteriormente, Ana passou a demons- trar bastante irritabilidade, isolou-se e tinha pensamentos mui- to depreciativos sobre si: “Eu sou tão magra . Com 14 anos não tenho peito, não tenho bunda . Quem vai gostar de mim? Meu cabelo parece uma vassoura . Nada que eu faço dá jeito nele” . Ela também deixou de fazer coisas de que gostava, como ir à praça (nesse caso, foi um dos fatores que desencadeou o início da depressão) e gravar vídeos e postar no TikTok (consequên- cia da depressão) . Em sua fala, ela expressa muitos sinais de seu sofrimento psíquico, os quais resultam em comportamentos que talvez possam ser vistos pelos adultos como rebeldia ou agressi- vidade . Toda essa mudança revelava seu grito por socorro, que só foi ouvido tardiamente . Os fatores de risco de comportamento podem estar re- lacionados a eventos de vida que contribuíram em longo prazo para o risco de suicídio, por exemplo: abuso físico na infância, violência sexual, abuso de substâncias psicoativas (álcool, ma- conha, entre outras); transtorno de estresse pós-traumático (de- corrente de assalto, estupro, de assistir violência doméstica etc .); ter alguém na família que se suicidou; comportamento agressi- vo e/ou impulsivo (agir com frequência sem pensar, às vezes até com consequências ruins); perfeccionismo; transtorno depres- sivo; automutilação; ter tentado suicídio antes; ter sido interna- do em uma clínica psiquiátrica recentemente; sentir-se enclau- surado, sem conexão ou um peso; desesperança; transtorno de identidade de gênero (ter um desconforto com o próprio gênero, sentindo-se inadequado quando assume esse papel social, e se identificar com o gênero oposto); identificar-se como lésbi- ca, gay, bissexual ou transexual; e sofrer discriminação devido à orientação sexual e à identidade de gênero (BOTEGA, 2023) . Nesse último caso, o sofrimento e a ideação suicida também es- tão relacionados à vivência de preconceito e da falta de aceita- ção da família . Existem ainda os fatores que aconteceram perto da ten- tativa ou da ideia de suicídio, que chamamos de fatores preci- pitantes, por exemplo: exposição a casos de suicídio ou tenta- tivas de suicídio, conflitos familiares, separação dos pais, morte de um genitor, rompimento de namoro, bullying e cyberbullying, dificuldades escolares, ações disciplinares e problemas legais, sentir-se desonrado ou ter muita vergonha de algo sobre si (por exemplo, ter uma foto de si nu circulando em WhatsApp) e ter fácil acesso a um meio letal (BOTEGA, 2023) . A automutilação é um fator de risco para o suicídio, pois é como se uma primeira barreira tivesse sido transposta, isto é, a de machucar o próprio corpo, tornando mais fácil uma nova ten- tativa . Destaca-se que os fatores listados, isoladamente, não são exclusivamente as causas de suicídios, mas as consequências que possam ter causado na vida da pessoa podem impulsio- ná-la a ter comportamentos de risco . Além disso, é importante saber que, em geral, a pessoa com ideação suicida tem tanto o desejo de morrer, para acabar com a dor, como o desejo de viver, mostrando uma ambivalência . O apoio social e emocional tem como objetivo aumentar o desejo de viver . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 23 O que fazer? Primeiros esboços! Muitas pessoas acreditam que conversar com o ado- lescente sobre suicídio vai fazer com que ele pense sobre isso ou que desperte nele a vontade de acabar com a própria vida . Esse é um mito, pois, quando a ideia lhe ocorre, ele tem a inter- net para buscar informações . Poder falar sobre a dor que o leva a querer se matar pode, na verdade, ajudá-lo a pensar em ou- tras maneiras de diminuir o sofrimento . Sabemos que, para mui- tas pessoas, essa é uma conversa difícil, fazendo com que pais, educadores e profissionais que atuam com jovens evitem falar sobre o assunto ou simplesmente encaminhem os jovens, sem o devido acolhimento, para um outro profissional, deixando-os ainda mais vulneráveis . Contudo, diversos estudos vêm demons- trando a importância de conversar abertamente e o mais empati- camente possível com os jovens que lidam com a automutilação e a ideação suicida . Muitas vezes, é mais fácil que eles se abram com uma pessoa com a qual já tenham vínculo construído, como professores, oficineiros, líderes comunitários, entre outros, do que com um profissional que, embora especialista, é desconhe- cido para ele . Por isso, é importante que você mantenha uma postura de disponibilidade e escuta acolhedora, mantendo aber- to um canal de comunicação em que a criança e o adolescente possam se expressar e narrar o seu sofrimento . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 24 Proposição 6 Por que conversar sobre automutilação e ideação suici- da é importante? Como podemos fazer isso? ? Feedback positivo: Poder falar sobre a dor e o sofrimento que está sentindo, ao mesmo tempo que quem escuta dá espaço para que o jo- vem possa falar e se mostra disponível para acolher, ajuda muito na prevenção desses comportamentos e na possibi- lidade de as pessoas que sofrem buscarem ajuda . Uma das primeiras coisas que podemos fazer para ajudar quem está sofrendo – e, por isso, automutilando-se – e está com pensa- mentos suicidas é nos informar, buscar informações confiá- veis sobre o suicídio, sobre automutilação e sobre crianças e adolescentes em sofrimento . Querer se informar de maneira correta, ou seja, sem informações equivocadas e estigmati- zadas, é o primeiro passo . Quando lançamos mão dessas in- formações, ficamos mais atentos aos comportamentos das pessoas ao nosso redor, passamos a considerar importante qualquer comportamento diferente do habitual, não consi- deramos mais esses comportamentos como algo que “vai passar” nem ficamos mais deduzindo o que pode ser. Tendo essas informações, vamos querer aprofundar no que pode estar acontecendo, porque sabemos que pode ser algo gra- ve e que essa pessoa pode estar precisando de ajuda . Outro passo é abordar, perguntar, querer saber o que está acon- tecendo de maneira acolhedora,empática, dizendo para o adolescente que tem percebido algumas coisas e que está preocupado com ele, que está ali para ajudar e que podem pensar juntos em saídas para esse sofrimento . Validar o so- frimento e querer saber do que se trata para tentar ajudar são instrumentos muito valiosos e que qualquer um pode utilizar!! Feedback orientador: É mito achar que conversar sobre suicídio pode desenca- dear intenções de tirar a própria vida . Diversos estudos vêm demonstrando a importância de conversar abertamente e o mais empaticamente possível com os jovens que lidam com a automutilação e a ideação suicida . A Organização Mundial da Saúde (OMS), com o objetivo de prevenir e reduzir os ín- dices de suicídio, criou a campanha Setembro Amarelo . Essa campanha visa dar informações e criar ações para a preven- ção ao suicídio . Existe um material complexo e bem elabora- do para ajudar na conscientização e formação das pessoas sobre a temática . O dia Mundial de Prevenção ao Suicídio é o dia 10 de setembro, mas as ações ocorrem durante todo o ano . Para mais informações sobre as ações do Setembro Amarelo, acesse o site: https://www .setembroamarelo .com/ . https://www.setembroamarelo.com/ Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 25 A seguir, algumas perguntas que podem ajudar a abor- dar o assunto . Sempre que uma resposta for positiva, faz-se uma nova pergunta (BOTEGA, 2023): - Alguma vez você já pensou que seria melhor morrer? Já pensou em tirar a própria vida? - Como são esses pensamentos? - Esses pensamentos te assustam? Você consegue afastá- -los? - Quando esses pensamentos começaram? - Você pensou em como se matar? Chegou a procurar infor- mações sobre como fazer isso? - O que motivou a escolha desse método para se matar? - Você tem acesso a esse método? - Você chegou a pensar em um local e em uma data para se matar? - Você consegue pensar em razões para continuar vivo? Na história de Ana, a coordenadora Letícia abordou tanto a automutilação como os pensamentos suicidas . Primeiramente, ela pediu calma à diretora Marli e solicitou que a deixassem sozi- nha com a adolescente . Em seguida, Marli acompanhou a mãe de Ana, dona Arlete, até a sala ao lado, onde permaneceram du- rante toda a conversa entre Letícia e Ana . Quando estavam so- zinhas, com privacidade e em um ambiente favorável, Letícia e Ana se sentaram uma do lado da outra e conseguiram iniciar um diálogo respeitoso . A abordagem da coordenadora foi comple- tamente diferente da de Marli, que havia tratado Ana como uma adolescente inconsequente e que precisava de um puxão de orelha! Ao contrário, Letícia se mostrou disponível e interessa- da em ouvir da própria adolescente o que estava acontecendo com ela, não demonstrando nenhum tipo de julgamento moral e preconceito diante dos comportamentos da adolescente nem a forçando a mostrar as cicatrizes que tinha, o que possibilitou que Ana falasse sobre si e sobre o que estava acontecendo em sua vida . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 26 Proposição 7 Qual a diferença entre uma abordagem agressiva e uma abordagem acolhedora? Tem diferença? ? Feedback positivo: Ao utilizar o acolhimento e a escuta qualificada, você ajuda- rá a proporcionar um início de intervenção sensível e que possibilita outras entradas de ajuda . Com isso, será possível a entrada de outros profissionais e de equipes multidiscipli- nares, assim como ações com as famílias e comunidade . Feedback orientador: Há muita diferença . Estamos chamando de abordagem agressiva a abordagem feita de forma ríspida, que muitas vezes envolve toque no corpo do adolescente que está passando pela situação, gritos, conclusões precipitadas e preconceituosas (“adolescente só faz isso para chamar a atenção”, “suicídio é um ato de fraqueza”) e resposta sem o conhecimento do que está acontecendo . Geralmente, essas posturas acontecem na frente de outras pessoas . Quem está na situação de sofrimento é exposta, ficando mais vulnerá- vel ainda . Outra forma equivocada de abordagem é a que tenta naturalizar e/ou minimizar o sofrimento . A pessoa que faz essa abordagem acha que o adolescente “é assim mes- mo, cheio de crise e frescura”, “não quer saber de nada”, “so- fre por qualquer motivo”, “brigou com a namoradinha e agora está aí sofrendo” . Isso faz com que o adolescente se torne mais arredio, acuado, recusando qualquer possibili- dade de fala e ajuda . Estamos chamando de abordagem sensível e acolhedora aquela que quer de verdade saber o que está acontecendo . A pessoa interrompe o que ela estiver fazendo para escutar, saber do que se trata do pró- prio adolescente, sem responder pelo outro e sem trazer frases prontas e preconceituosas sobre a adolescência, automutilação e pensamentos suicidas . Só conseguimos abordar de maneira acolhedora quando queremos saber do adolescente o que ele tem para dizer . Só assim é pos- sível que ele se abra, sinta-se seguro para dizer o que está acontecendo, o que tem feito e o que tem pensado . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 27 Esse diálogo nos leva a refletir sobre algumas caracte- rísticas que sugerem intenção suicida já em estágio avançado presentes em situações em que os jovens vivenciam sofrimento psíquico (BOTEGA, 2023): - Comunicação prévia de que irá se matar; - Mensagem ou carta de adeus; - Providências finais antes do ato, isto é, organizar algumas coisas da vida, como doar pertences; - Planejamento detalhado, ou seja, já pensou em como fazer e em quando e tomou precauções para que o ato não seja descoberto; - Não ter pessoas por perto que possam socorrer; - Não procurar ajuda logo após a tentativa de suicídio; - Método violento ou uso de substâncias psicoativas; - Acreditar que a forma como planejou se matar seja irreversí- vel e letal, ou seja, que vai levar à morte; - Afirmação clara de que quer morrer; - Desapontamento por ter sobrevivido . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 28 Ao identificar algum desses sinais, é necessário entrar em contato com a família e reforçar o apoio . É importante avisar ao adolescente que esse contato será feito . Além disso, é importan- te ajudar o adolescente a refletir sobre quando ocorre o desejo de se matar ou de se autoagredir, isto é, em que momentos ge- ralmente esse desejo acontece, porque, ao identificar situações que desencadeiam esse desejo, o adolescente pode buscar ações para se colocar em segurança . Para tanto, sugere-se a ela- boração de um plano de segurança . Você pode encontrar um modelo desse plano no material desenvolvido por Franzin, Reis e Neufeld (2017) . Proposição 8 Você já tinha ouvido falar em plano de segurança? En- tende como ele funciona? ? Feedback positivo: O plano de segurança é uma estratégia que a pessoa pode usar em um momento de crise, quando não consegue pen- sar com clareza . Como dito anteriormente, a ideação suicida pode ocorrer de maneira planejada ou de maneira impulsi- va, exigindo nosso cuidado antes mesmo de ela acontecer . Por isso, a identificação dos sinais de mudança de compor- tamento dos jovens e as intervenções preventivas são es- senciais para minimizar o sofrimento psíquico e diminuir as possibilidades de automutilação e suicídio . Feedback orientador: É preciso descobrir atividades que acalmem o adolescen- te, pois o que funciona para um pode não funcionar para o outro. Por exemplo, uma pessoa pode se distrair e ficarmais calma ao brincar com o cachorro da família e outra pode se estabilizar fazendo uma atividade física, diminuindo a ativa- ção corporal por meio de respiração calmante ou resfriando o rosto com o uso de gelo ou água gelada . Assim, é impor- tante testar essas possibilidades em momentos de crises mais leves de forma a ver o que realmente funciona . Além disso, o adolescente pode recorrer ao Pode Falar ou ao CVV em um momento fora da crise para já saber como funcionam e se sentir mais tranquilo e à vontade para recorrer a eles no momento de crise . Uma pessoa que atende ao adolescente sozinha no momento da crise pode se sentir sobrecarrega- da . Assim, é bom que o adolescente tenha mais de uma pes- soa a quem recorrer . Isso aumenta a chance de que ele seja acolhido de maneira adequada . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 29 No caso de Ana, a motivação principal que levou ao di- álogo da adolescente com a coordenadora Letícia foi a auto- mutilação . A fala sobre os pensamentos de morte e as ideações suicidas vieram depois . Cabe destacar, como já falamos anterior- mente, que a pessoa que se automutila não quer acabar com a própria vida, mas usar essa ação para aliviar alguma dor emo- cional ou desconforto ou para impactar, de alguma maneira, o ambiente ao seu redor, seja para obter atenção e apoio nas re- des sociais, seja para sentir-se pertencente a um grupo que tem a mesma prática . Contudo, no caso de Ana, há um agravamento contínuo dos comportamentos de risco, já que, além das auto- mutilações, ela apresenta também pensamentos de morte e von- tade de morrer . Assim, Aratangy (2017) pontua que, de forma semelhante ao que acontece nos casos de ideação e tentativa de suicídio, na automutilação, em geral, há um transtorno mental, bem como outros fatores de risco. Ao identificar que o adolescente está se cortando, o autor sugere que a pessoa comece a conversa so- bre automutilação de forma respeitosa e sem julgamentos . Você pode iniciar com falas como: “Estou preocupado/a com você e gostaria de ajudá-lo/a”; “Estou preocupado/a com você”; “Tenho visto cicatrizes em seus braços e pensei se você não estaria pro- vocando esses ferimentos”; “Se eu estiver certo/a, gostaria que você soubesse que pode falar sobre isso comigo”; “Se você não quiser falar para mim, eu espero que encontre alguém em quem confie para conversar” (ARATANGY, 2017, p. 39). As seguintes perguntas podem ser feitas: • Machucar-se faz com que você se sinta melhor? • Que tipo de situação ou coisas fazem você pensar em se ma- chucar? • Quando você começou esse comportamento? Sabe dizer por quê? • Quais motivos, nessa época, fizeram você considerar a possi- bilidade de fazer a automutilação? • Qual a função da automutilação em sua vida atualmente? • Em quais regiões do seu corpo você costuma se machucar? • Que objetos você geralmente usa para fazer essas lesões? • O que você faz para cuidar de seus ferimentos? • Alguma vez você se machucou mais gravemente do que pla- nejava? • Seus ferimentos já infeccionaram? • Você já procurou ajuda médica por causa de seus ferimen- tos? Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 30 A automutilação pode ser vista como uma dificuldade em regular emoções intensas, isto é, é a forma que o adolescente encontrou para lidar com a dor . Aratangy (2017) nos dá algumas dicas sobre como auxiliar o adolescente em um desses momen- tos, especialmente quando ele sente o desejo de se automutilar . Essas dicas têm o objetivo de aplacar a crise temporariamente, até que os cuidados de longo prazo possam ser acionados, por- que é preciso intervir naquilo que está na base da automutilação, conforme visto anteriormente nos fatores de risco para a automu- tilação . Portanto, as ações a seguir visam tão somente amenizar o desejo e o impulso de se machucar enquanto uma intervenção mais global e especializada não é iniciada (ARATANGY, 2017, p . 44-45): • “Escrever na própria pele com caneta (estímulo tátil sem cau- sar danos à pele); • Esfregar borracha nos locais em que costuma se machucar (estímulo tátil sem causar danos à pele); • Segurar uma pedra de gelo ou esfregá-la nas áreas em que costuma se machucar (estímulo físico e desconforto, sem causar danos à pele); • Escrever, desenhar ou pintar, quando o adolescente gosta dessas atividades; • Procurar alguém para conversar; • Andar descalço sobre cascalho ou provocar outros estímulos que não lesem a pele; • Cuidar de animal de estimação, cozinhar, ler, ouvir música, tocar instrumento; • Praticar atividade física; • Escrever pensamentos e sentimentos em um diário .” Ao serem identificados, na escola, muitos casos de ado- lescentes que se cortam ou que têm ideação suicida, é possível se inspirar no projeto do Centro Educacional Gesner Teixeira, es- cola pública na Cidade Nova DVO, no Gama, a 42 km do centro de Brasília, conforme noticiado na mídia . Mediante pedido de ajuda de uma estudante, a escola se propôs a fazer uma ação . A adolescente convidou para ação amigas e outras pessoas co- nhecidas da escola que ela sabia que se cortavam ou que tinham ideação suicida . Foram desenvolvidas: rodas de conversas, ini- cialmente direcionadas para os estudantes com depressão, que se autolesionavam e que tinham ideação suicida, e posterior- mente ampliadas para outros temas em saúde mental, como os casos de bulimia, anorexia, timidez . Também envolveu os familia- res que se dispuseram a participar . Saiba mais Para saber um pouco mais sobre o projeto no Gama, acesse este link ou clique no ícone ao lado . clique e acesse https://plenarinho.leg.br/index.php/2019/09/setembro-amarelo-escuta-e-acolhimento-mudam-rotina-de-uma-escola/ https://plenarinho.leg.br/index.php/2019/09/setembro-amarelo-escuta-e-acolhimento-mudam-rotina-de-uma-escola/ https://plenarinho.leg.br/index.php/2019/09/setembro-amarelo-escuta-e-acolhimento-mudam-rotina-de-uma-escola/ https://plenarinho.leg.br/index.php/2019/09/setembro-amarelo-escuta-e-acolhimento-mudam-rotina-de-uma-escola/ Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 31 Em associação com a secretaria de saúde, a escola tam- bém ofereceu reiki, meditação e automassagem . Além da parce- ria com a secretaria de saúde, é possível também buscar apoio em diferentes instituições do seu território, como escolas, univer- sidades, organizações não governamentais (ONGs), empresas, movimentos sociais, entre outras . Dessa forma, é possível que você identifique, no território, pessoas que podem acompanhar as rodas de conversas e desenvolver oficinas de teatro, dança, expressão corporal, entre outras . Automutilação, ideação e tentativa de suicídio podem fazer com que a família leve o jovem nessa situação para serviços de saúde mental, embora a crise possa também acontecer na escola ou em outros lugares . No caso de Ana, a crise começou em casa, mas a mãe não percebeu . Foi na escola que a crise de Ana teve o ápice . Na experiência mencionada anteriormente, também foi na escola que a adolescente recebeu ajuda . Dessa forma, a seguir, serão dadas algumas dicas de o que fazer diante de um adoles- cente em crise . Proposição 9 Como podemos propor ações preventivas e interventivas em espaços ocupados pelas crianças e adolescentes? ? Feedback positivo: Feedback orientador: É fundamental que os espaços de convívio das crianças e dos adolescentes estejam atentos ao comportamento deles . Além disso, promover ações que abordem temas como a au- tomutilação e o suicídio pode ajudar o jovem a dizer o que está sentindo ou a contarque está percebendo comporta- mento atípico em um colega . Os jovens vão perceber que podem falar sobre o assunto sem tabu e sem medo . As escolas, as comunidades e os locais que lidam com as crianças e os jovens podem oferecer palestras e rodas de conversas, chamar pessoas que sabem sobre o assunto para abrir uma roda de perguntas e dúvidas e chamar a co- munidade para conversar e falar sobre o tema . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 32 “Pode falar!” – vamos falar sobre isso? Muitos elementos do plano de segurança foram trabalha- dos com Ana pela coordenadora Letícia: ela falou sobre o CVV, le- vantou possibilidades de ações que a adolescente poderia fazer para regular as emoções decorrentes da crise e analisou com Ana os motivos para viver . Letícia percebeu que Ana precisava falar e ouviu com toda a atenção e carinho possível. Às vezes, as pesso- as só precisam falar, só precisam ser ouvidas . Percebendo isso, a coordenadora pedagógica indicou para Ana o canal Pode Falar . Esse canal é uma iniciativa que surgiu com a proposta de oferecer escuta acolhedora a adolescentes e jovens que precisam falar so- bre seus sentimentos, mas não confiam em outras pessoas para isso, têm medo do que vão ouvir e não querem se expor . Muitas vezes, o jovem não consegue reconhecer uma pessoa do seu círculo social em que possa confiar para com- partilhar seu sofrimento . Em outras situações, as pessoas não expressam seus sentimentos por terem medo de julgamentos . A fala permite ao ser humano expressar suas percepções sobre si mesmo e/ou sobre o que está a sua volta . Os sentimentos tra- duzem as percepções do que acontece com o corpo enquanto uma emoção ocorre . A palavra sentir, etimologicamente, traduz essa ideia de dar sentido a algo que ocorreu ou ocorre no corpo (SOUZA et al ., 2020) . O curta animado da ALIKE: https://www .youtube .com/ watch?v=K4Foovfdb-E&t=3s, que permite várias reflexões sobre a educação e o trabalho, também nos possibilita refletir sobre a importância das emoções, as diferentes formas de se expressar e sobre quanto é importante estarmos atentos aos sinais que o corpo e a mente podem expressar quando não estamos bem . O canal Pode Falar, então, surge com a proposta de ouvir o que os adolescentes e jovens estão sentindo em razão das suas per- cepções e permite que todos os usuários desse serviço se ex- pressem sem medo e se sintam seguros e confiantes para desa- bafar . Isso é possível porque o adolescente pode escolher não se identificar, ou seja, muitas vezes, a pessoa que realiza a escu- ta não sabe sequer a cidade ou o estado de onde o jovem fala . Além disso, não há a garantia de que a mesma pessoa atenda o jovem caso ele ligue mais de uma vez . O atendimento do canal conta com um grupo de volun- tários e está disponível 24 horas por dia por meio de chat . Caso o adolescente sinta a necessidade de falar mais especificamente sobre o seu sofrimento, ele pode ser encaminhado para um pro- fissional especializado em saúde mental. O Pode Falar tornou-se um programa durante a pandemia, em 2020 . O atendimento in- dividual funciona em regime de plantão e conta com muitos e importantes parceiros . As mesmas instituições realizam a super- visão técnica de suas respectivas equipes . Existe um cronogra- ma com todos os horários, e essa iniciativa está sendo abraçada por diferentes universidades públicas . É importante ressaltar que não é um atendimento psicológico, mas todos os atendentes estão preparados, pois recebem treinamentos sobre diferentes temas em saúde mental . Você pode saber mais sobre o projeto clicando no link: https://www .podefalar .org .br/ . https://www.youtube.com/watch?v=K4Foovfdb-E&t=3s https://www.youtube.com/watch?v=K4Foovfdb-E&t=3s https://www.podefalar.org.br/ Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 33 O acolhimento e a escuta: aliados do vínculo Para intervir, é fundamental adotar uma postura aberta, empática e de interesse genuíno por aquilo que o jovem fala . No entanto, é comum ouvirmos as pessoas dizendo coisas do tipo: “No meu tempo não era assim!” ou “Na minha época não tinha essas frescuras não” . Esse tipo de abordagem mostra que, aos olhos da sociedade, a juventude é uma “geração perdida”, ro- tulando, muitas vezes, os adolescentes de hoje como “sem ju- ízo”, “manipuladores” e “inconsequentes” . Além disso, quando um adolescente aparece com uma queixa ou mostra algo grave que tem acontecido com ele, como Ana, que estava se cortan- do e tendo pensamentos de morte, é muito comum as pessoas dizerem: “o que fazer com isso?”, “isso é manipulação”, “vamos internar”, “não tenho técnica ou conhecimento para saber o que fazer”, “isso é muito grave . . . Se essa pessoa se matar, como que eu fico?” Bom, quando estamos pensando na perspectiva dos profissionais que lidam com adolescentes, logo pensamos que eles estão capacitados para lidar com essas situações, o que in- clui conhecer tanto os aspectos éticos e legais dos atendimentos como métodos para lidar com uma urgência, com uma crise . No entanto, muitas vezes, não é isso que acontece, por isso muitos profissionais, inclusive da área da saúde, encaminham crianças e adolescentes que estão em crise para os espaços específicos de atendimento em serviços especializados, considerando que apenas esses espaços são responsáveis por esse acolhimento e intervenção . Além disso, essas questões não vão surgir apenas em locais “especializados” ou da saúde, mas em locais e na pre- sença de pessoas que lidam com os adolescentes em sua rotina, como familiares, colegas, amigos, no ambiente escolar, nas redes sociais, entre outros, e isso pode acontecer de formas variadas . O vínculo ou a relação de proximidade com a criança e com o ado- lescente – falaremos sobre isso mais adiante – possibilitam o sur- gimento de demandas veladas, sobre as quais eles só conversam se houver vínculo com o outro que escuta (GUIMARÃES, 2022) . O atendimento de crianças, adolescentes e jovens, então, não deve ser visto como prioridade do médico ou psicólogo . Não mesmo! Todos podemos contribuir com a melhora de alguém que sofre, e muitas vezes temos ferramentas potentes que nem imaginamos . Apesar de a grande maioria dos atendimentos às crianças e adolescentes ser feita por psicólogos, psiquiatras e/ ou pediatras, alguns atendimentos considerados menos graves são realizados, por exemplo, pelas escolas, centros comunitá- rios, ONGs e, ainda, pelos serviços da Atenção Primária, como as Unidades Básicas de Saúde (UBS) (ESSWEIN et al ., 2021) . Curso de Aperfeiçoamento em Saúde Mental e Atenção Psicossocial de Adolescentes e Jovens Módulo: Cuidados psicossociais nas adolescências e juventudes 34 Proposição 10 Você sabia que a forma de acolher e de escutar quem está em sofrimento psíquico pode ajudar muito mais do que se imagina? ? Feedback positivo: Feedback orientador: A forma como acolhemos o sofrimento do outro e como es- cutamos (sem julgamento) pode ajudar muito as pessoas com sofrimento psíquico . O fato de você se propor a ouvir e compreender a dor alheia pode fazer toda a diferença, e essa sensibilidade não se restringe apenas aos profissionais de saúde . Lembre-se de que alguns atendimentos consi- derados menos graves podem ser realizados nas escolas, centros comunitários e ONGs ou, ainda, pelos serviços da Atenção Primária, como as Unidades Básicas de Saúde . O Ministério da Saúde lançou, em 2009, a cartilha Humaniza SUS com o objetivo de orientar as pessoas sobre maneiras de cuidar utilizando tecnologias simples e acessíveis a to- dos . Operando com o princípio da transversalidade, o Hu- maniza
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