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FUNDAMENTOS DE QUÍMICA ORGÂNICA E INORGÂNICA Rodrigo Borges da Silva Introdução à química orgânica Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Descrever a estrutura dos compostos orgânicos. � Classificar compostos de carbono em duas fases: quanto ao tipo de ligação, número de átomos e cadeias carbônicas; e quanto a insatu- ração e ramificações. � Explicar a hibridização de compostos orgânicos. Introdução Nos primeiros estudos químicos realizados, os compostos eram divididos em compostos orgânicos — provenientes de organismos vivos — e inorgânicos — relacionados aos minerais. Hoje, a química é unificada, e o que distingue os compostos orgânicos é que todas essas substâncias apresentam o átomo de carbono em sua estrutura (McMURRY, 2012). Pode- -se dizer, então, que a química orgânica trata do estudo dos compostos de carbono. No entanto, além desse elemento essencial, as moléculas orgânicas são constituídas, também, pelo elemento hidrogênio, em sua maioria, por nitrogênio, oxigênio, enxofre, cloro, fósforo, entre outros elementos. Diferentemente do que era explicado antigamente, hoje se sabe que nem todos os compostos de carbono são derivados de organismos vivos. Corantes, aditivos em alimentos, remédios, polímeros e outras substân- cias conhecidas são preparados em laboratórios de química. A química orgânica é a ciência que está presente em muitos lugares, a começar pelo nosso próprio organismo. Das áreas da química, a parte relacionada à química orgânica é, sem dúvida, uma das mais aplicáveis ao cotidiano. Neste capítulo, você vai ver uma introdução sobre química orgânica. Para isso, vai aprender como os compostos orgânicos se apresentam, com base na descrição de sua estrutura, e vai ver como classificar compostos de carbono quanto ao tipo de ligação, número de átomos, assim como as cadeias carbônicas no que se refere a insaturação e ramificações. Por fim, será capaz de explicar a hibridização de compostos orgânicos, tópico não menos importante para a compreensão dessa área da química que é muito ampla, desafiadora e interessante. Estrutura de compostos orgânicos Uma distinção entre compostos orgânicos e inorgânicos foi iniciada por volta da década de 1780. Compostos orgânicos eram definidos como aqueles prove- nientes de organismos vivos, enquanto os compostos inorgânicos derivados de fontes não vivas (SOLOMONS; FRYHLE, 2001). Juntamente a essa ideia, havia uma crença, chamada de “vitalismo”, que trazia a ideia de que a inter- venção de uma “força vital” era necessária para que se realizasse a síntese de um composto orgânico. Além disso, de acordo com os químicos da época, essa síntese só poderia ocorrer em organismos vivos, e não em frascos de um laboratório de química. Essa ideia foi mantida até que, entre os anos 1828 e 1850, vários dos com- postos tidos como “orgânicos” foram sintetizados a partir de fontes claramente ‘inorgânicas”. Friedrich Wöhler, em 1828, conseguiu realizar a primeira dessas sínteses e descobriu que o composto orgânico ureia, um constituinte da urina, poderia ser obtido quando ocorrida a evaporação de uma solução aquosa que continha o composto inorgânico cianato de amônio (Figura 1). Figura 1. Reação de cianato de amônia formando ureia. Fonte: Solomns e Fryhle (2001). NH4+NCO− H2N — C — NH2 O Cianato de amônia Ureia Calor — — Introdução à química orgânica2 A ideia de “vitalismo” foi desaparecendo aos poucos, nos termos cientí- ficos, depois da experiência de Wöhler, mas tornou real o aparecimento da química orgânica, fato ocorrido em 1850. O termo “orgânico” continua, até hoje, sendo usado com o significado de “o que vem dos organismos vivos”, da mesma maneira como em “produtos orgânicos”, “vitaminas orgânicas”, entre outros termos comumente usados e ouvidos entre as pessoas (SOLOMONS; FRYHLE, 2001). Os produtos orgânicos, também chamados de alimentos orgânicos, tratam de uma cultura que foi produzida sem o uso de pesticidas ou fertilizantes sin- téticos, e sim apenas com adubo orgânico proveniente de dejetos de animais, um meio natural de produção de fertilizantes. Hoje, na ciência, os estudos de compostos provenientes de organismos vivos são chamados de química de produtos naturais. O carbono tem uma importância fundamental no estudo da química orgâ- nica, o que pode ser explicado, além de outras teorias, pelo fato de o carbono ser um elemento do grupo 4A na tabela periódica e, assim, compartilhar quatro elétrons de valência e formar quatro ligações covalentes fortes. O carbono sozinho pode formar uma grande diversidade de compostos, desde o metano, que contém apenas um átomo de carbono, até o DNA, que pode conter muitos átomos (McMURRY, 2012). A estrutura dos compostos orgânicos foi, inicialmente, sendo desvendada com as ideias de Archibald Couper (1831–1892) e Kekulé sobre o comporta- mento químico do átomo de carbono a partir da segunda metade do século XIX (McMURRY, 2012). Eles descreveram a base de uma das teorias mais fundamentais na química, a teoria da estrutura, sobre a qual pode-se dizer o que segue. � Os átomos dos elementos em compostos orgânicos podem formar um número de ligações determinado, de acordo com o que é conhecido por valência. O carbono, por exemplo, é tetravalente, o que quer dizer que pode realizar quatro ligações. Já o oxigênio é divalente, podendo formar duas ligações, e o hidrogênio e (na maioria das vezes) os halogênios são monovalentes, realizando uma ligação apenas (Figura 2). 3Introdução à química orgânica Figura 2. Diferentes elementos e as ligações que eles podem fazer. Fonte: Solomns e Fryhle (2001). Átomos de carbono são tetravalentes Átomos de oxigênio são bivalentes Átomos de hidrogênio e cloro são monovalentes C O H Cl � Um átomo de carbono pode utilizar uma ou mais de suas valências para formar ligações com outros átomos de carbono (Figura 3). Figura 3. Ligações simples duplas e triplas que o carbono pode fazer. Fonte: Solomns e Fryhle (2001). Ligação simples Ligação dupla Ligação tripla C C C CC C � Além disso, átomos de carbono ligam-se diretamente entre si ou com outros elementos, formando estruturas denominadas cadeias carbônicas. Representação da estrutura A estrutura de Lewis representa os símbolos químicos nos quais os elétrons de valência são representados por pontos. Estruturas de Lewis são úteis, pois Introdução à química orgânica4 nos mostram quais os átomos estão ligados e também se há algum átomo que possui elétrons livres. Ao escrever as estruturas de Lewis, juntamos as moléculas ou os íons dos átomos constitutivos, mostrando somente os elétrons de valência, os quais são os elétrons localizados na camada mais externa do átomo. O número de elétrons de valência de um átomo pode ser verificado na tabela periódica, pois ele é igual ao número do grupo ao qual pertence o átomo. Por exemplo, o carbono está no grupo 4A e possui quatro elétrons de valência (Figura 4). Figura 4. O carbono faz quatro ligações, possui 4 átomos de valência. Fonte: Solomns e Fryhle (2001). Nas estruturas de estruturas de Kekulé (Figura 5), os elétrons de ligação são desenhados como linhas, e os elétrons de pares isolados são, geralmente, deixados de fora, a menos que sejam necessários para chamar a atenção para alguma propriedade química da molécula. Embora os elétrons de pares isolados possam não ser mostrados, deve-se lembrar que átomos neutros de nitrogênio, oxigênio e halogênio terão um par, no caso de nitrogênio, dois pares, no caso do oxigênio, e três pares no caso de um halogênio (BRUICE, 2006). Figura 5. Substâncias representadas em estruturas de Kekulé. Fonte: Bruice (2006). H—C—O—H — — O H—C—N—— H—O—N—O H—C—H— — — H H H—C—N—H — — H H — H 5Introdução à química orgânica É comum verificarmos as estruturas simplificadas pela omissão de algu- mas (ou, em alguns casos, de todas) das ligações covalentes e colocar átomosligados a um carbono particular (ou nitrogênio ou oxigênio) próximo a ele com um subscrito para indicar quantas vezes esse átomo aparece. Esses tipos de estruturas são denominados estruturas condensadas (Figura 6). Figura 6. Moléculas representadas em estruturas condensadas. Fonte: Bruice (2006). HCO2H HCN HNO2 CH4 CH3NH2 Veja, na Figura 7, possibilidades de representação para a molécula de propanol. Figura 7. Diferentes fórmulas de representação para a molécula de propanol. Fonte: Cornelio (2014, documento on-line). Saber o número de ligações que um átomo forma ou pode formar é de suma impor- tância para aprender química orgânica (SOLOMONS; FRYHLE, 2001). Introdução à química orgânica6 Compostos de carbono: tipo de ligação e número de átomos Os compostos orgânicos podem ser classificados de acordo com algumas características, como, por exemplo, quanto ao tipo de ligação que realizam. As explicações da natureza das ligações químicas foram, primeiramente, dadas por G. N. Lewis e W. Kössel, em 1916. Dois tipos principais foram propostos: ligação iônica e ligação covalente. A ligação iônica (ou eletrovalente) é formada pela transferência de um ou mais elétrons de um átomo a outro para formar íons, enquanto a ligação covalente é uma ligação que resulta do compartilhamento de elétrons. As explicações e os conceitos dos cientistas citados que surgem das pro- posições originais são satisfatórios para explicar muitas questões em química orgânica. � Ligação iônica: atração eletrostática de íons de cargas opostas (Figura 8). Figura 8. Interação entre os átomos de lítio e flúor. Fonte: Solomons e Fryhle (2001). Li LiF F+ + − + � Ligação covalente: compartilhamento de elétrons entre as espécies envolvidas (Figura 9). 7Introdução à química orgânica Figura 9. Exemplo de formação de ligações covalentes. Fonte: Solomons e Fryhle (2001). H2 H + H Cl2 CH4 Cl + Cl C + 4H CH H—C—H H H H ou H H H H H—Hou ou — — Cl Cl Cl—Cl Estas fórmulas são frequentemente chamadas de estruturas de Lewis e, ao escrevê-las, mostramos apenas os elétrons de camada de valência (Figura 10). Figura 10. Exemplo de ligações covalentes múltiplas. Fonte: Solomons e Fryhle (2001). N2 N N ou N—N—— Na grande maioria dos compostos orgânicos, os principais elementos presentes, além do carbono, cuja presença é necessária e fundamental, há, também, moléculas com átomos, como: hidrogênio (H), nitrogênio (N), ha- logênios como cloro (Cl), Bromo (Br) e Iodo (I), oxigênio (O) e enxofre (S). É sempre bom lembrar o número de ligações covalentes que cada um desses elementos deve efetuar realizar. É possível classificar os compostos de carbono de acordo com cadeia carbônica, insaturações e ramificações, como veremos a seguir. Cadeias carbônicas: insaturação e ramificações Os átomos de carbono se unem, formando estruturas chamadas de cadeias carbônicas. Introdução à química orgânica8 Para classificar as cadeias carbônicas, observa-se: � o fechamento, ou não, da cadeia; � os tipos de átomos envolvidos, com a presença, ou não, de heteroátomos (átomos que não são carbono ou hidrogênio); � a organização dos átomos da cadeia; � as ligações estabelecidas entre os átomos. As cadeias podem ser abertas, fechadas ou mistas. Cadeias abertas Conhecidas como acíclicas e alifáticas. Nesse tipo de cadeia, os átomos de carbono conectam-se e deixam as extremidades livres. � Cadeias abertas lineares: não são formadas por ramificações. � Cadeias abertas ramificadas: apresentam ramificações. � Cadeias abertas homogêneas: não apresentam nenhum outro átomo que não seja carbono ou hidrogênio na cadeia. 9Introdução à química orgânica � Cadeias abertas heterogêneas: apresentam pelo menos um átomo que não seja o carbono ou hidrogênio ao longo da cadeia. Cadeias fechadas As cadeias fechadas ou cíclicas ligam-se entre si e formam um ciclo. Elas podem ser aromáticas ou alicíclicas. � Cadeias fechadas aromáticas são classificadas da seguinte forma. ■ Mononucleares: apresentam apenas um anel aromático, como o benzeno. ■ Polinucleares: apresentam mais de um anel aromático, como o naftaleno. � Cadeias fechadas alicíclicas: não exibem anéis aromáticos. Estão divididas em saturadas e insaturadas. As cadeias fechadas alicíclicas insaturadas são divididas da seguinte forma. ■ Homogêneas: o anel dessas cadeias é formado somente por átomos de carbono. ■ Heterogêneas: são cadeias que apresentam um heteroátomo. Homogênea Heterogênea H2C CHCH CH2 CH2 CH2 ou —— Introdução à química orgânica10 � Cadeias fechadas saturadas: em uma cadeia saturada, todos os átomos de carbono estabelecem somente ligações simples. � Cadeias fechadas insaturadas: na cadeia insaturada, existem ligações duplas entre os átomos. Cadeias mistas Nas cadeias mistas, os carbonos se ligam entre si, como ocorre com as fechadas, e também formam um ciclo na cadeia. � Cadeias abertas saturadas: em cadeias saturadas, os átomos de carbono se ligam entre si por uma ligação simples. O carbono dessa cadeia é denominado saturado. 11Introdução à química orgânica � Cadeias abertas insaturadas: são as cadeias que têm pelo menos dois átomos de carbono unidos por uma dupla a uma tripla ligação. Nessa ligação, o carbono é denominado insaturado. Confira, no link a seguir, mais informações sobre cadeias carbônicas. https://goo.gl/9HZCto Hibridização de compostos orgânicos Os orbitais híbridos são orbitais resultam da combinação de orbitais. Essa combinação é chamada de hibridização de orbital e foi proposta pela primeira vez por Linus Pauling em 1931. Se um orbital s e três orbitais p são unidos, por exemplo, é formado orbital sp3 (o sobrescrito 3 significa que três orbitais p foram misturados) (BRUICE, 2006). Cada orbital sp3 tem 25% de caráter s e 75% de caráter p. Introdução à química orgânica12 s p p p Hibridização 4 orbitais são hibridizados Orbitais híbridos sp3 sp3 sp3 sp3 Outra forma de representar a hibridização (sp3, nesse caso) é por meio da seguinte figura: s p sp3 sp3 sp3 sp3 p p Hibridização Veja, a seguir, a representação da molécula de etano para exemplificar como ocorre a ligação entre orbitais de Csp3-Csp3 (Figura 11). H—C—C—H — — H — H H Etano — H Figura 11. Formação da ligação Csp 3 -Csp 3 na molécula de etano. H H H H H H H H H H H H C H CC C 13Introdução à química orgânica A hibridização sp2 ocorre quando um orbital s e dois dos orbitais p são hibridizados. Após a hibridização, cada átomo de carbono apresenta três orbitais degenerados e um orbital p puro. s p p p Hibridização sp² sp² sp² p De modo a minimizar a repulsão entre os orbitais sp2, eles tendem a ficar o mais distante possível e, assim, adquirem a forma triangular. sp2 120° sp2 sp2 p Vista lateral Vista superior A partir da molécula de eteno, pode-se exemplificar como ocorre a ligação na forma de orbitais. Eteno ou etileno C—C H — — — — H H — H H H C HH C H H Ligação σ formada por sobreposição sp²−s Ligação σ formada por sobreposição sp²−sp² Introdução à química orgânica14 Para tratar da hibridização sp, pode-se dizer que cada de carbono forma ligações covalentes com dois átomos, e apenas dois orbitais (um s e um p) são hibridizados. Resultam, então, dois orbitais sp degenerados. Cada átomo de car- bono no etino, portanto, tem dois orbitais sp e dois orbitais p não hibridizados. s p p p Hibridização sp sp pp De modo a minimizar a repulsão entre os orbitais sp e p, há uma orientação para que eles fiquem o mais afastado possível. p p sp sp Veja, a seguir, a molécula de etino em termos de hibridização. Etino ou acetileno H—C—C—H—— H HCC Ligação σ formada por sobreposição sp−s Ligação σ formada por sobreposição sp−sp 180° Assim, hibridização é o nome dado à demonstração de como os orbitais ficam dispostos quando ocorre uma ligação. 15Introdução à química orgânica No link a seguir, você pode observar umaexplicação didática sobre hibridização de moléculas. https://goo.gl/4w5U7s BRUICE, P. Y. Química orgânica. 4. ed. São Paulo: Pearson, 2006. 2v. CORNELIO, M. Formas de representação dos compostos. 2014. Disponível em: <https:// slideplayer.com.br/slide/2329465/>. Acesso em: 21 nov. 2018. MCMURRY, J. Química orgânica. 7. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2012. 2v. SOLOMONS, S.T.W.G.; FRYHLE, C. B. Química orgânica. 7. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2001. Leituras recomendadas ATKINS, P. W.; JONES, L. Princípios de química: questionando a vida moderna e o meio ambiente. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2013. BAYNES, J.W.; DOMINICZAK, M.H. Bioquímica médica. 4. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2015. DIAS, D. Nomenclatura de hidrocarbonetos insaturados de cadeia aberta. 2018. Disponível em: <https://manualdaquimica.uol.com.br/quimica-organica/nomenclatura-hidrocar- bonetos-insaturados-cadeia-aberta.htm>. Acesso em: 21 nov. 2018. PERUZZO, F. M.; CANTO E. L. Química: na abordagem do cotidiano. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2011. Introdução à química orgânica16 Conteúdo:
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