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EDUCAÇÃO PARA SEXUALIDADE

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Prévia do material em texto

BOAS VINDAS 
 
 
Desejamos as boas-vindas ao curso Educação para a sexualidade. 
 
Informe-se do conteúdo a ser estudado nas próximas semanas, conheça os objetivos da 
disciplina, a organização dos temas e o número aproximado de horas de estudo que devem 
ser dedicadas a cada unidade. 
O período de duração é compreendido em 08 semanas, totalizando a carga horária de 100 
horas/aula. 
Cabe a você administrar o tempo conforme a sua disponibilidade. Contudo, lembre-se de 
que há um prazo para a conclusão do curso. Lembramos, que o curso inclui a realização das 
atividades avaliativas (tarefas) para cada unidade apresentada. 
Os conteúdos estão organizados em unidades de estudo, subdivididas em capítulos, de 
forma didática, objetiva e coerente. Eles são abordados por meio de textos básicos, com 
questões para pesquisa e reflexão. No transcorrer das atividades e unidades são indicadas, 
também, outras fontes de consulta, para aprofundar os estudos, tais como leituras 
acadêmicas, assistência de vídeos, fóruns de debates e pesquisas complementares. 
Lembre-se de que, não obstante o caráter virtual, porém estaremos sempre muito próximos. 
 
 
 
JUSTIFICATIVA 
 
A escola que nos foi legada por uma sociedade moderna, ocidental, masculinizada, branca, 
classificatória e excludente, continua a produzir e a perpetuar diferenças, desigualdades, 
valores e normas nos espaços escolares. Gestos, conceitos, atitudes, discursos, práticas, 
planos de aula são incorporados como adequados ou não para meninos ou meninas. Essas 
questões fazem-nos refletir de forma crítica e desconfiada de que sexualidade está se 
falando? Que sexualidade se está produzindo na escola, através de múltiplos aparatos de 
poder? E, por outro lado, qual está sendo negada, silenciada? Compreender, portanto, dos 
discursos sobre a sexualidade na trama das relações culturais, sociais, históricas que 
acabam sendo forjados no contexto escolar, é papel do educador do presente. 
 
 
 
 
As marcas da escolaridade se inscrevem, assim, nos corpos e mentes dos alunos. 
Guacira Louro (1998:90), chama a atenção para o fato de a escola apenas uma forma de 
sexualidade, a “normal” e construir seus discursos e argumentações em pares opostos: 
masculino/feminino; saudável/doente; moral/imoral. Nesses conjuntos, a primazia é dada 
ao primeiro elemento do par, o qual constitui a referência e o padrão e do qual o outro 
elemento é derivado. 
O que o educador deveria é dialoga e refletir com a comunidade escolar sobre a 
sexualidade no espaço escolar, levantando dúvidas, conflitos, sem abordá-la de forma 
negativa ou somente científica. Pois a questão da Educação Sexual vem para questionar os 
tradicionais modelos históricos e sociais de relações de poder que interditam sua discussão. 
Em um ambiente onde não há preconceitos ela será trabalhada de forma emancipatória e 
pedagógica, é importante também, trazer a família para esta discussão. É preciso questionar 
a visão preconceituosa sob a sexualidade s refletir sobre como o silêncio em relação a 
situações de discriminação por preconceito e violência de gênero contribui para a 
reprodução de uma ordem desigual e excludente. 
 
EMENTA 
 
O curso visa apresentar e discutir as principais propostas de educação sexual/da/para 
a sexualidade, retomando alguns aspectos históricos, as principais razões para que houvesse 
uma educação para a sexualidade em cada contexto, centrando-se nas políticas 
contemporâneas de educação (e saúde) para a sexualidade, com especial destaque para uma 
análise crítica dos Parâmetros Curriculares Nacionais (Pluralidade cultural e orientação 
sexual) a partir dos estudos de gênero e dos estudos culturais. Também visa discutir a 
educação para a sexualidade no âmbito das diferentes pedagogias culturais, com especial 
ênfase para a mídia televisiva. 
 
 
OBJETIVOS 
 
Objetivo Geral 
 
Discutir sobre as relações de poder que se estabelecem socialmente, a partir das 
concepções naturalizadas em torno das masculinidades e feminilidades e que também 
produzem o próprio sujeito da educação, através de discursos disciplinadores e excludentes 
no ambiente escolar; Percorrer os caminhos históricos da construção da sexualidade e, a 
partir destes, compreender qual é qual o papel da escola para promover práticas e atividades 
que abordem as relações de gênero e a educação sexual; Refletir sobre qual o papel da 
escola na promoção dos direitos sexuais, transformando-se em um ambiente que celebre a 
diferença, a inclusão de todas as expressões das sexualidades, gêneros e das identidades 
étnico-raciais. 
Objetivos Específicos 
 
• Compreender o conceito de sexualidade e gênero; 
• Relacionar sexualidade e orientação sexual; 
• Construir o conceito de identidade de gênero; 
• Analisar, identificar e repensar situações de discriminação e violência em relação à 
orientação sexual da pessoa, buscando alternativas; 
• Desenvolver atitudes de compreensão, respeito e valorização das diversidades, a fim 
de criar condições para uma melhor convivência escolar. 
• Propiciar condições de compreender que somos todos seres sexuados no mundo, em 
permanente processo de educação, inclusive de educação sexual. 
• Refletir sobre o papel da educação e da escola na produção das sexualidades e 
identidades de forma autônoma e democrática. 
• Trabalhar a sexualidade na escola, através do conceito de diferença. 
 
AVALIAÇÃO 
 
Constituir-se-á de trabalhos elaborados durante o desenvolvimento do curso, com auxílio 
dos professores e memorial acadêmico. 
As atividades avaliativas objetivam duas ações principais: 
 
⚫ Favorecer o processo de aprendizagem do cursista, por meio de atividades 
reflexivas e analíticas. 
⚫ Fornecer subsídios para o tutor avaliar o desenvolvimento do cursista nas atividades 
e a adequação aos objetivos propostos para a formação do curso. 
As atividades sugeridas no decorrer das unidades do curso devem ser realizadas pelo aluno, 
para compor seu diário de formação. Para realizar essas atividades, o cursista poderá 
consultar os livros indicados na bibliografia, artigos em meio eletrônico ou outras 
produções acadêmicas de seu conhecimento que versem sobre o assunto em questão, assim 
como relatar experiências e vivências profissionais. 
Você contará com o apoio e a orientação de um tutor experiente no assunto, que irá 
interagir com você sanando suas dúvidas e estimulando a discussão de temas importantes 
por meio das seguintes ferramentas. 
O sucesso de sua aprendizagem dependerá de sua disciplina e determinação para o estudo. 
De nossa parte, você contará com o apoio docente e administrativo, sempre que sentir 
necessidade. 
 
Observações: 
 
1. Se sentir necessidade, entre em contato com o seu tutor. 
 
2. Só encaminhe as atividades quando todas estiverem prontas, pois vale nota. 
 
3. A nota mínima para aprovação é 8,0. 
 
 
 
 
 
 
Caro (a) aluno (a), 
 
Agora vamos dar início ao curso Educação para a sexualidade. 
 
Este é o nosso Caderno de Orientação de Estudos e Atividades Avaliativas. Esse material 
foi elaborado com o objetivo de contribuir para a realização e o desenvolvimento de seus 
estudos, assim como para a ampliação de seus conhecimentos no tocante aos conteúdos 
pertinentes a 
Objetiva ainda, informar sobre o conteúdo a ser estudado nas próximas semanas, 
as atividades avaliativas a serem realizadas, para que conheça os objetivos, a organização 
dos temas e o número de horas de estudo que deve ser dedicado a cada unidade. 
A carga horária do curso é de 100 (cem) horas, cabendo a você administrar seu tempo 
conforme a sua disponibilidade. Mas, lembre-se, há uma data limite para a conclusão do 
curso, implicando a apresentação, ao seu tutor, das atividades avaliativas indicadas nesse 
caderno, que contém as respectivas pontuações e prazos de acordo com o cronograma 
disponível na plataforma. 
Os conteúdos e as atividades avaliativas foram organizadosem unidades de estudo, 
subdivididas em capítulos de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por 
meio de textos básicos, com questões para reflexão, que farão parte das atividades 
avaliativas do curso; serão indicadas também, outras fontes de consulta para aprofundar os 
estudos com leituras e pesquisas complementares. 
Desejamos a você um trabalho proveitoso sobre os temas abordados no transcorrer desse 
curso! 
 
 
A Coordenação 
INTRODUÇÃO 
 
 
Queremos conversar com você sobre um tema ainda muito polêmico e importante para 
todos, especialmente para quem trabalha educando outras pessoas: a questão da educação e 
sexualidade. 
Para isso, retomamos a pergunta: afinal, por que ficamos ainda inibidos diante do tema 
sexualidade? 
Para pensarmos um pouco mais sobre isso, gostaríamos de contar-lhe uma pequena 
história: 
 
“Numa determinada cidade do Estado de Santa Catarina, colonizada por imigrantes 
europeus, acontecia anualmente uma festa que reunia toda a comunidade, e o prato mais 
comentado e saboroso do cardápio era o pernil. Pernil este preparado por uma jovem de 18 
anos que pertencia a uma tradicional família da região. 
A fama do pernil espalhou-se para outras cidades, aguçando a curiosidade de uma 
repórter que resolveu fazer uma entrevista com a referida jovem. A repórter perguntou-lhe 
como preparava o pernil. Ela contou que o temperava e, no momento de colocá-lo no forno, 
cortava dele um pedaço. A repórter, intrigada, perguntou: 
- Por quê? 
 
A jovem respondeu: 
 
- Não sei explicar, a minha mãe me ensinou-me assim. 
A repórter disse à jovem: 
- Preciso entrevistar sua mãe. 
 
Ao entrevistar a mãe da jovem, a repórter foi direta à pergunta: 
 
- Qual a explicação para a senhora cortar um pedaço do pernil quando o leva ao 
forno? 
 
A senhora respondeu: 
 
- Sabe que não sei! Aprendi assim com minha mãe. 
 
A repórter perguntou-lhe se havia possibilidade de entrevistar a mãe – que seria a 
avó da jovem. Ela disse que não haveria problema, pois ela tinha 90 anos de idade, mas 
estava muito lúcida e certamente teria o maior prazer em ser entrevistada. 
Chegando á casa da senhora de 90 anos, a repórter perguntou-lhe se ela tinha 
conhecimento da fama do pernil que ela havia ensinado sua filha (e esta á neta) a fazer. Ela 
disse que sim, mas que tudo era muito simples. 
 
Então a repórter perguntou: 
 
- Qual o segredo de cortar um pedaço no momento de levá-lo ao forno? 
Ela respondeu com muita simplicidade e sinceridade: 
- Olha moça, na minha época eu cortava um pedaço, porque meu forno era 
pequeno. Hoje não sei explicar porque elas continuam a fazer o mesmo, se existem formas 
e fornos maiores! ” 
 
Você deve estar se perguntando o que essa parábola tem a ver com a sexualidade. 
Mas será que com a sexualidade não continuamos a fazer o mesmo que nossas avós, mães, 
pais, tios, tias, professores/as, usando a mesma forma e o mesmo forno, mesmo que o pernil 
cortado já não nos sirva mais, sem nos perguntarmos o porquê? Será que simplesmente 
continuamos a repetir costumes acriticamente, repassando preconceitos, tabus, medos, sem 
nos questionarmos se repassando ainda para a realidade em que vivemos? 
Certamente percebemos que, hoje, as transformações ocorrem muito rapidamente, 
mas, no que se refere à temática “sexualidade”, ainda não conseguimos falar dela com a 
maturidade necessária. A ciência e a tecnologia avançam muito nesses últimos anos e, hoje, 
são capazes de responder a questões que, na época de nossos antepassados, não poderiam 
ser resolvidas, bem como novas relações sociais se estabeleceram, gerando a necessidade 
de novos valores de conveniência, em busca do bem viver para todos. Mas, mesmo assim, 
preferimos continuar, muitas vezes, repetindo os mesmos atos, sem questioná-los. 
Como registrou o compositor Belchior na música “Como nossos pais”, tão bem 
interpretada pela cantora Elis Regina: “Minha dor é perceber que, apesar de tudo o que 
fizemos, ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais? ”. É claro que o compositor 
se refere somente ao que reproduzimos acriticamente. Ao agirmos dessa maneira, deixamos 
de viver plenamente nossa vida. 
Muitas vezes não conseguimos deixar de ter preconceitos por estarmos presos a um 
passado calcado unicamente no senso comum, ainda interpretamos o mundo, na maioria das 
vezes, pelos mitos criados para explicar situações que há poucas décadas ainda não era 
possível explicar, inclusive através da ciência, bem como por valores ultrapassados para 
nossa época. 
Precisamos procurar conhecer melhor “qual é a nossa” em relação à sexualidade, 
como diria um adolescente. Temos que buscar reconstruir as nossas verdades provisórias 
até que outras venham a ser elaboradas pelas gerações que nos sucederem. Tudo isso 
sempre visando a uma vida plena, feliz e digna para todos. Enfim, uma vida cidadã... 
Lembre-se sempre de que somos seres humanos, portanto mutáveis, tendo a 
capacidade de renovação a cada dia. Para que essa renovação seja plena, faz-se necessário 
estudar nossa própria história também em relação à sexualidade, às transformações nela 
ocorridas em diferentes épocas e culturas, todas essas certamente registradas em nossa 
maneira atual de ser e agir. 
 
Unidade I 
Educação sexual- paradigmas e pressupostos emancipatórios 
 
 
Sexualidade: conceitos e implicações educacionais 
 
 
Para saber a resposta, tente fazer o seguinte exercício: certamente você está 
confortavelmente instalado/a lendo seu Caderno Pedagógico. Saia por um momento do 
local onde você está estudando, vá para outro ambiente próximo, deixando lá sua 
sexualidade, e volte logo para continuarmos nossa conversa. 
Conseguiu fazer o que lhe sugerimos? É claro que não, pois a sexualidade é uma 
dimensão indissociável do fato de sermos humanos. 
Você é tão sexuado/a como foram e são todos os seres humanos. E isso é verdadeiro 
para todas as pessoas “desde que o mundo é mundo” pois vivem numa sociedade onde os 
discursos e as práticas sobre a sexualidade perpassam todas as esferas da nossa vida 
cotidiana. 
Portanto, o objetivo desta seção é que você se perceba como um ser humano 
sexuado como o são todas as demais pessoas no mundo, em permanente processo de 
educação sexual, independentemente de idade, étnicas, sexo, cultura, religião. 
Isso também é verdade para todas as pessoas que fazem parte de seu dia-a-dia como, 
por exemplo, seu filho, sua filha, seu aluno, sua aluna, seu pai, sua mãe, seus e suas colegas 
de trabalho, os vizinhos e as vizinhas, seu companheiro, sua companheira, seu esposo ou 
esposa etc. Todos e todas são seres sexuados, e essa sexualidade se manifesta das mais 
diversas formas. Seja através dos sentimentos, das emoções, da relação sexual, do prazer. 
Essa dimensão “sexualidade” é parte indissociável de todos nós, em qualquer época de 
nossa vida, em qualquer ambiente, inclusive no escolar. 
Somos seres humanos sempre sexuados ao estabelecermos as relações sociais, na 
produção do nosso modo de vida, ao construirmos nossa história da sexualidade ao mesmo 
tempo em que ela nos constrói. Ao longo de nossa existência, em todas as nossas relações 
sociais, fomos construindo e sendo construídos, elaborando histórica e culturalmente 
regras, modelos, posturas, exigências, cerimônias, permissões e interdições, códigos em 
torno do sexo, tornando a sexualidade permeada de tabus, mitos e preconceitos que se 
perpetuam até nossos dias e que dizem respeito a determinados interesses das diferentes 
épocas, muitas vezes desconsiderando as relações sexuais como sendo também relações 
sociais. 
Nessa perspectiva crítica de análise da realidade, você vai perceber que, como não 
poderia deixar de ser, a sexualidade só pode ser vista como dimensão inseparável da 
história do ser humano em nosso planeta. Todas as linhas de tempo que você estudou e 
ainda vai estudar, nas mais diferentes disciplinas, podem e devemter desvendado os 
paradigmas de sexualidade e educação sexual correspondentes a cada cultura, em cada 
época. 
Veja, no quadro a seguir, como Nunes (1997, p.51-56) fixa metodologicamente 
cinco etapas de compreensão da construção histórico-cultural da sexualidade mais 
relacionadas a mundo ocidental, desde o Paleolítico até hoje. 
 
 
PERIODO CARACTERISTICAS 
 
 
Sexualidade 
Primitiva mítica 
Etapa da compreensão mítica, das sociedades 
agrárias do Oriente Médio. Religião e magia 
como aparelho comercial desses povos. Sexo, 
religião e trabalho em íntima relação com o 
fenômeno da virada. 
 
 
O modelo patriarcal 
Inicia-se com o advento das civilizações 
urbanas do mundo antigo. O sexo 
gradualmente perde seu caráter mítico e passa 
a ser “racionalizado” e controlado. 
 
 
 
 
 
 
 
A sexualidade proscrita na Idade 
Coincide com a desestruturação do mundo 
antigo com a queda do Império Romano e a 
emergência da Igreja como instituição que 
catequiza e organiza o mundo bárbaro. A 
inspiração cristã, o platonismo “batizado” e o 
maniqueísmo mesclam-se ao novo imaginário 
Média social construído pela Igreja por meio do 
enquadramento dos povos bárbaros na 
doutrina cristã. Dominar o corpo e reprimir o 
sexo constitui o ideal da vida cristã. 
 
A puritanização do sexo 
Etapa ligada á transformação do mundo 
medieval com o advento da sociedade 
capitalista, das estranhas do feudalismo. A 
energia sexual deve ser direcionada para o 
trabalho. 
 
 
A descompressão sexual 
Ligada à perda da hegemonia européia sobre 
o mundo e com o advento da sociedade de 
consumo. Perda do espírito erótico. Segundo 
Marcuse é o “prazer mecanizado”. 
 
Observação: Também já registra o autor, em seu livro Desvendando a sexualidade, 
vários indicadores que apontam para uma proposta emancipatória de vivenciar a dimensão 
da sexualidade humana. Sugerimos que você vá descobrindo e anotando esses indicadores à 
medida que for lendo a obra. Serão muito úteis em suas reflexões. 
Assim, as mudanças dos mitos, tabus, preconceitos e valores construído ao longo do 
tempo dependem também da nossa postura diante do tema. E, como disse Rousseau, antes 
de tentar fazer um homem a si próprio, isto é, devemos procurar compreender cada vez 
mais nossa própria sexualidade, refletindo sobre a forma pela qual fomos educados e como 
educamos. Assim, estaremos nos aperfeiçoando como pessoas e ajudando a melhorar a 
sociedade de um modo geral. 
EXISTE DIFERENÇA ENTRE SEXO E SEXUALIDADE? 
 
 
Vamos refletir um pouco sobre esses conceitos. No senso comum, “sexo” tem sido 
conhecido como sinônimo de órgãos genitais, ou da relação, sexual, ou ainda, de toda a 
sexualidade humana. 
Sexo é, basicamente, a caracterização biológica, hereditária, que diferencia 
fisicamente o homem da mulher. 
E a sexualidade, o que é, afinal? 
 
Sexualidade é um termo que surgiu no século XIX, ampliando o conceito de sexo, 
incorporando a reflexão e o discurso sobre o seu sentido e a sua intencionalidade. “A 
sexualidade é sempre construída e definida socialmente sobre o sexo primordial” nos “diz” 
Nunes (1987, p.127). 
É entendida, atualmente, como uma fundamental dimensão humana, como a própria 
vida, englobando sentimentos, relacionamentos, sensualidade, prazer, erotismo, direitos, 
deveres, sexo, enfim o ser humano em sua plenitude, em sua totalidade. 
Observe como essa questão é bem colocada na Proposta Curricular de Santa 
Catarina (1998), segundo a qual 
“a sexualidade não se reduz à união dos órgãos genitais e tampouco pode ser 
confundida com o ato sexual reprodutivo, pois este tanto pode estar inserido 
nem relacionamento afetivo quanto indiferente a qualquer ligação amorosa. 
Ou seja, uma união genital pode acontecer por atração, desejo, prazer, como 
pode ser uma manifestação de poder, violência-prazer e opressão de uma ou 
mais pessoas sobre outrem. A atividade sexual genital, reprodutiva ou não, é 
caracterização biológica do ser humano enquanto espécie animal. Já a 
sexualidade se constitui numa elaboração histórica e cultural, que se explica 
e se compreende no contexto e nas relações nas quais se produz. ” (p.17). 
Você percebeu que, sejam quais forem os conceitos que cada pessoa tem de 
“sexualidade” e de “sexo”, eles terão reflexos imediatos em qualquer tipo de educação 
sexual? Trata-se da educação sexual vivenciada na família e na escola, enfim em todo o 
processo de relações entre os seres humanos, portanto todo processo de educação sexual 
sempre está fundamentado em uma visão de mundo que inclui um conceito de sexualidade 
e de sexo. 
Esses conceitos também são produtos de uma construção sócio-histórica 
determinada e determinante, pois nessa caminhada como seres históricos no mundo é que 
apreendemos atribuições e significados para as nossas crenças, vivências, práticas e 
experiências sexuais. 
A sexualidade é uma dimensão exclusiva do ser humano. Nenhum outro ser vivo, 
além de nós, é capaz de dar sentidos, para além do biológico, à questão da sexualidade. 
Somente nós é que podemos estabelecer valores afetivos, morais e étnicos à sexualidade, 
significando e “re-significando” sentidos, estabelecendo normas e regulamentos, limites e 
possibilidades para os relacionamentos e vivencias dessa rica dimensão. 
Lembre-se de que “cada povo, em cada tempo e lugar, cria e recria, busca forma de viver e 
expressar a sexualidade. Hoje, o que em nossa cultura parece óbvio, acabado e definitivo, 
continua em movimento. Amanhã, essas certezas terão novas conotações, assim acontece 
em outras culturas e num mesmo período histórico, porque tudo está em constante 
transformação. ” (Proposta Curricular SC, p.17). 
Vimos, portanto, que a vida, e nela a nossa inseparável sexualidade, é um processo 
constante de seres humanos que se educam nas relações sociais. 
Como será que estamos vivenciando a questão da sexualidade na nossa vida, de uma 
maneira geral, e mais especificamente no nosso cotidiano escolar? Será que estamos 
vivendo com saúde sexual em nossa casa e em nossas escolas? 
Convidamos você a ler, agora, a definição de sexualidade registrada pela 
Organização Mundial de Saúde em 1975 (apud BLESSA et al, sd.): 
“A sexualidade humana forma parte integral da personalidade de cada um. É uma 
necessidade básica e um aspecto do ser humano que não pode ser separado de 
outros aspectos da vida. A sexualidade não é sinônimo de coito e não se imita a 
presença ou não do orgasmo. Sexualidade é muito mais do que isso. É energia 
que motiva encontrar o amor, contato e intimidade, e se expressa na forma de 
sentir, nos movimentos das pessoas e como estas tocam e são tocadas. A 
sexualidade influencia pensamentos, sentimentos, ações e interações e portanto, a 
saúde física e mental. Se saúde é um direito humano fundamental, a saúde sexual 
também deveria ser considerada como direito humano básico. A saúde mental é a 
integração dos aspectos sociais, somáticos, intelectuais e emocionais de maneira 
tal que influenciem positivamente a personalidade, a capacidade de comunicação 
com outras pessoas e o amor.” 
EDUCAÇÃO SEXUAL E SEUS PARADIGMAS 
 
 
Constatamos, que todos nós somos sexuados, em permanente processo de educação, 
e que cada um de nós possui uma visão de mundo que, dentre outras “coisas”, inclui nosso 
entendimento do que é sexualidade e sexo, com reflexos imediatos em nossa maneira de 
viver, incluindo, aí, o processo permanente de educação sexual. 
Recorrendo a uma afirmação de Paulo Freire – a de que a educação como prática da 
liberdade é um ato de conhecimento, uma aproximação crítica da realidade. Nele, você, 
sujeito em busca de viver a educação como prática de liberdade através de atos de 
conhecimento, procurará fazer uma aproximação cada vez mais crítica da questão da 
educação e da sexualidade, identificando vários paradigmas de educação sexual existentes 
na sociedade atual e seus reflexos na educaçãobrasileira através de várias vertentes 
pedagógicas. 
Antes de falar mais especificamente de educação sexual, vamos refletir um pouco 
sobre educação em geral. 
A educação, como você já sabe, é um fenômeno humano e social, como todas as 
suas determinações, sendo também campo da ação humana. Relembre que toda a sociedade 
ou qualquer grupo social são sempre agências educadoras nem permanente processo 
educacional. Isso porque educação não se reduz á escolarização ou à instrução, já que se 
entende que educar é construir redes de significações culturais e comportamentos 
padronizados, de acordo com os códigos sociais vigentes. A educação sexual, com todos 
seus componentes explícitos e implícitos, formais e não formais, não escapa a essa 
dimensão sociopolítica e cultural. 
Nesse sentido, é evidente que a educação sexual também sempre acontece 
plenamente em todos os grupos sociais, em todas as épocas, em todas as culturas, e se 
expressa em diferentes paradigmas que se refletem em todos os segmentos e organizações 
sociais, dentre elas a escola. E, como sabemos, continua a ser tema controverso na maioria 
das sociedades contemporâneas. 
Falando em educação e em educação sexual, procure aprofundar suas leituras 
também sobre as religiões, principalmente as que são hegemônicas no pensamento 
ocidental cristão, têm tido papel predominante na orientação moral de políticas educativas 
sobre sexualidade ao longo dos tempos, orientações essas que nem sempre ajudam o ser 
humano no seu desenvolvimento pleno. Pelo contrário: muitas das religiões têm 
responsabilidade direta na questão da repressão desumanizadora da sexualidade. 
Lembre-se de que o Estado também tem sido um protagonista fundamental nesses 
debates, como registra Vaz (1996, p. 53), pois, dependendo de que segmento social está ali 
realmente representado, ora assume uma aparente posição de distanciamento frente aos 
diversos segmentos sociais em conflito, ora toma partido de uns ou de outros, favorecendo 
ou dificultando a definição e o desenvolvimento de políticas emancipatória de educação 
sexual nas escolas, nos sistemas de saúde ou nas políticas públicas em geral. 
Os seus estudos de Filosofia e de Sociologia, bem como de várias outras áreas do 
conhecimento, certamente são de grande ajuda para um melhor entendimento dessas 
questões. Talvez você já tenha feito um exercício de construção de uma linha de tempo, 
onde poderia ir registrando e entrelaçando, através dela, alguns acontecimentos marcantes 
que estudou nas várias disciplinas até agora. Poderá também ir incluindo nela, em cada 
época ou data, a etapa ou acontecimentos relacionados a expressões de paradigmas, 
vertentes ou manifestações consideradas específicas da sexualidade e logo perceberia que 
tudo é relacionado. Vários conceitos de vários cadernos, por exemplo, estão sempre se 
referindo ao mesmo processo vital de relações sociais entre os seres humanos e destes com 
a natureza, ao produzirem e serem produzidos em seus modos de vida. ESSE PROCESSO 
É SEMPRE SEXUADO e permeado por vários paradigmas. 
OS PARADIGMAS DE EDUCAÇÃO SEXUAL NA EDUCAÇÃO BRASILEIRA E 
SUAS VERTENTES PEDAGÓGICAS 
 
 
Vamos conversar um pouco sobre os diferentes paradigmas de educação sexual 
existentes na sociedade contemporânea e seus reflexos na educação brasileira, 
principalmente nas escolas. Este é o objetivo desta seção. 
Como nos “diz” Romero (1998), não existe uma única definição do que é 
sexualidade e, por consequência, não existe um só modelo padrão do que se possa chamar 
de educação sexual. Isso porque, a partir da história pessoal e da aprendizagem social é que 
se constroem as concepções sobre tudo, inclusive sobre sexualidade. É social e 
culturalmente que aprendemos alguma atribuição ou significado para as vivências, práticas 
e experiências sexuais. Cada grupo social e cultural constrói e recria imaginários sociais e 
particulares sobre a sexualidade, feitas por um grupo social, e suas expressões no cotidiano 
maior das relações sociais dos seres humanos ao produzirem suas vidas, é o que podemos 
chamar de seu paradigma sobre educação sexual. 
Apresentamos, agora, uma adaptação que fizemos das vertentes dominantes nas 
abordagens pedagógicas da educação sexual no Brasil proposta por Nunes (1996). 
São elas: 
 
1- a médico-biologista; 
 
2- a normativo-institucional; 
 
3- a terapêutico-descompressiva, incluída aí a questão do consumismo pós- 
moderno. 
Todas essas fases “mudaram” a educação sexual para não mudar. Assim como tem 
acontecido com as várias “mudanças do capitalismo”, que realiza aparentes mudanças, que 
não mudam o fundamental: o próprio modo de produção. Seus estudos de Sociologia e 
Economia, dentre outros, serão de grande auxílio no entendimento dessa questão. 
Na vertente médico-biologista, o ser humano é reduzido a uma estrutura organizada 
que apenas reproduz e perpetua sua espécie. São retirados dessa vertente todos os 
componentes sócio-histórico-culturais da construção da sexualidade humana. “O discurso 
médico, matriz da interpretação biologista, reforça o mesmo discurso conservador e 
institucional presente na sociedade brasileira”. (NUNES, 1996, p.141). 
Nela, a reprodução humana é o eixo da discussão, como por exemplo, quando 
estudamos o aparelho reprodutor nos textos escolares centrados, muitas vezes, em noções 
de higiene sexual e procriação, sem inseri-lo numa dimensão maior da sexualidade. 
Condutas sexuais diferentes do padrão dito “normal”, nessa vertente, são 
consideradas “desvios”. Utilizam-se, muitas vezes, modelos de desenvolvimento de plantas 
e animais para explicar a sexualidade humana. Com muito pouco esforço, facilmente, você 
perceberá manifestações dessa vertente no seu cotidiano escolar. A própria questão de 
reforçar a desigualdade entre os sexos – estipulando, no cotidiano escolar, tarefas próprias 
para meninos, acirrando a competição, e tarefas para meninas, estimulando a submissão – 
pauta-se nem suposto diferencial biológico que justifica esse sexismo. 
Já a vertente normativo-institucional, como seu próprio nome diz, é determinada por 
uma rigorosa moral repressiva institucional, misturando, ecleticamente, mecanismos de 
ordem científica e conceitos religiosos morais, fortalecendo-se para fazer frente à chamada 
“revolução sexual”. Defende a promoção dos papéis sexuais tradicionais de modelo 
ocidental cristão e a propagação do casamento patriarcal monogâmico. É intolerante com 
práticas sexuais alternativas e condutas sexuais não procriativas. As instituições normativas 
preferenciais são a família tradicional, a Igreja e a escola. 
Essa vertente está presente nas escolas, via currículo, mesmo que oculto. Procure 
suas pistas, por exemplo, nos conteúdos dos livros didáticos utilizados nas escolas. Como 
um bom (mau?) exemplo, temos livros didáticos que só apresentam um tipo de família 
padrão, aquela que é constituída pelo pai, pela mãe e por filhos, na qual geralmente o 
menino é o mais velho entre outros fatores clássicos. Onde estão representados os vários 
tipos de família que temos hoje em nossa sociedade? Trata-se de um fato aparentemente 
simples, mas que, se não for trabalhando criticamente, perpetua um tipo de discriminação 
inaceitável se quisermos trabalhar a partir do/a nosso/a aluno/a real. 
A vertente terapêutico-descompressiva é baseada numa concepção banalizada da 
psicanálise e dos referenciais da psicologia. São expressões dessa vertente: consultórios 
televisivos, confissões compulsivas no reino do “eu acho...” São utilizadas técnicas e 
metodologias no encaminhamento do sexo individual e coletivo. São dadas receitas de 
como viver a sexualidade. Coloca-se tudo como uma questão “do que dizer na hora certa”. 
Reflete a visão dos seres humanos como “trepadores compulsivos”, como atletas sexuais. 
Nela, a sexualidade é vista como uma questão de produtividade e técnica. Revistas 
apresentam como ter orgasmo,como achar o ponto G, como enlouquecer seu homem, sua 
mulher etc. É obrigatório deixar de ser virgem.... É obrigatório transar por transar... 
É o consumo de relações: um consome o outro. Homem, mulher, criança: todos são 
usados como mercadorias sexuais. Naturaliza-se o sexo como mercadoria, uma vez que ele 
se apresenta mecânico, deserotizado. É uma aparente liberalização e descompressão das 
práticas sexuais. A mídia é utilizada como uma das maiores formas de valores éticos 
sexuais. Todos são considerados como tendo a mesma história e a mesma necessidade. O 
conhecimento sobre a sexualidade tende a ser superficial e vazio, não a considerando como 
uma construção sócio-histórico-cultural. 
Essa vertente está mais presente explicitamente fora da escola, mas chega até ela 
com toda sua força, indiretamente, trazida pelas pessoas pertencentes à comunidade escolar, 
através de suas várias atitudes e falas, através de conteúdos de livros e revistas, de 
expressões corporais, dos padrões das piadinhas, das músicas da moda que exploram essa 
vertente de “descompressão” etc. 
Como você deve ter percebido, todas essas vertentes estão ainda presentes no 
cotidiano da sociedade e no da escola, com maior ou menor intensidade, dependendo de 
cada contexto. 
REFLEXÕES SOBRE UM PARADIGMA EMANCIPATÓRIO DE EDUCAÇÃO 
SEXUAL 
 
Como você percebeu, são várias as vertentes de educação sexual e suas expressões 
na nossa vida, inclusive no cotidiano escolar. Você também deve ter percebido que as 
vertentes apresentadas até agora parecem não compreender o ser humano em sua totalidade, 
nem o ajudam a mudar para melhor a si mesmo e ao mundo em que vive. 
Será, então, que não temos saída na questão da educação sexual? É claro que temos! 
Em toda a caminhada do ser humano como um sujeito que faz sua própria história junto a 
outros sujeitos no mundo, na relação com a natureza, construindo seu modo de vida, 
também existiram e existem até hoje momentos, expressões, enfim vivências de uma 
sexualidade saudável, entendida como uma prazerosa dimensão inseparável do existir 
humano. 
Essa dimensão é parte do seu constituir-se como cidadão pleno de seu tempo. E essa 
maneira de perceber a sexualidade e os conseqüentes reflexos dela no processo de educação 
sexual apresenta-se como o mais forte indicador da existência, mesmo que ainda 
embrionária, de um paradigma de educação sexual emancipatório, que, iniciando-se em 
nível pessoal, não por acaso, está entrelaçado a um paradigma maior de mudança social. 
Nesta seção, o objetivo será ajudar você a identificar alguns indicadores básicos desse 
paradigma emancipatório. 
Para isso, vamos retomar a seguinte constatação: todos os seres humanos inserem-se 
no mundo mediante seus corpos sexuados, mundo que é uma construção sociopolítica, 
histórica e cultural de seres humanos, dialeticamente vistos como seres únicos e parte da 
sociedade ao mesmo tempo, produtores e produzidos nas e pelas relações sociais, mesmo 
que a maioria aparentemente assim não se perceba. 
Neste entendimento, uma abordagem de educação sexual emancipatória é 
visualizada como uma intervenção qualitativa, intencional, no processo educacional que 
sempre está ocorrendo nas relações sociais. Essa abordagem mostra-se como um veio 
temático político-pedagógico fundamental que busca desalojar certezas, desafiar debates e 
reflexões, posturas fundamentais na busca do desenvolvimento pessoal do ser humano 
como um ser corporificado, sexuado, contribuindo na busca de cidadania para todos. 
Assim, essa abordagem sócio-histórico-crítica da dimensão humana da sexualidade 
tem como ponto de partida o entendimento de que “sem dúvida, a repressão sexual e a 
repressão sociopolítica nascem do mesmo tronco e crescem juntas, como tristes irmãs 
gêmeas”, bem como de que “a luta pela liberdade é, portanto, a luta por Eros, e a luta por 
Eros é sempre uma luta política. ” Como nos dizia Bernardi (BERNARDI, apud MELO, 
2001, p.12). 
O que seria, então, um paradigma de educação sexual emancipatória? 
 
Não existem receitas, já que é tudo uma construção pessoal e social, mas certamente 
podemos dizer que é uma busca de reconstrução consciente e participativa de um saber 
amplo e universal sobre a dimensão humana da sexualidade, sem distinção de qualquer 
ordem, e essa reconstrução deve começar dentro de cada um, espraiando-se para o coletivo. 
Não pode ser apenas uma reprodução acrítica do que está posto na sociedade. 
Devemos buscar o despertar da consciência crítica, possibilitando aos indivíduos 
escolherem seus caminhos sem amarras, sem medos, e com conhecimento de sua 
importância nas diversas relações sociais. Como registra Pocovi (2000, p.91) “cada ser 
humano tem seu lugar nesta busca de discutir teórica e historicamente a sexualidade 
humana”. 
Melo (2001) alerta que, na busca da utopia da emancipação do ser humano, não 
podemos esquecer que profundas transformações ocorreram e estão ocorrendo cada vez 
mais rapidamente, continuamente, em nossa sociedade global. Transformações essas que se 
refletem nos valores, nos comportamentos, na literatura, na linguagem, nas músicas e 
filmes etc. O avanço científico e tecnológico e, de um lado e do outro, a “mercadorização” 
dos corpos e de sua sexualidade também influíram e influem poderosamente como 
determinados-determinantes, em todas as dimensões do ser humano, inclusive na 
sexualidade, como bem demonstram as várias vertentes pedagógicas de educação sexual já 
vistas por você. 
“E o tema da educação sexual do ser corpo humano pleno, cidadão, já está até 
fartamente discutido e anunciado. Mas, na maioria das vezes, sem desvelar o 
fundamental: sempre se praticou e se pratica uma educação ou deseducação 
sexual entre seres humanos. Seres estes corporificados em sua inserção no 
mundo, resultado das relações sociais entre os homens nos vários modos de 
produção que existiram, e no atualmente vigente. Para avançarmos na construção 
de um paradigma emancipatório é imperioso que pensemos profundamente sobre 
essa questão: o que é educação sexual? O que significa educar sexualmente? 
Quem pode “educar” sexualmente, ensinar o quê? Como fazê-lo? Quem serão 
esses/essas educadores/as? Educadores/as sexuais somos todos nós, seres 
humanos! Então, a quem interessa cada tipo de educação sexual? A quem 
interessa negar os corpos das pessoas, reprimi-los e torná-los dóceis? Ou, então, 
expô-los como mercadorias? ” (MELO, 2001, p.37). 
 
Essas reflexões podem nos ajudar a desvendar qual o paradigma subjacente à nossa 
maneira de compreender e viver a nossa sexualidade. E a procurar reconstruí-lo. 
Para que esse novo “olhar” possa apontar para uma abordagem emancipatória da 
vida, vida esta sempre sexuada, alguns indicadores podem ser observados: 
1 – Há que se partir uma segura metodologia de análise da realidade social que não 
se limite a uma compreensão ético-religiosa da conjuntura, mas que consiga entender a 
dimensão estrutural dialética da produção da vida social. Assim, a questão da sexualidade 
deixará de ser vista como um objeto apenas da religião, ou da psicanálise, ou da psicologia, 
passando a ser compreendida como uma questão estrutural, parte indissociável do contexto 
social. Neste enfoque, a sexualidade não é anomalia, patologia, disfunção, coisa acidental, 
mas é entendida como um complexo de valores, modelos, comportamentos, padrões 
socialmente construídos de acordo com agentes específicos. Uma abordagem emancipatória 
pressupõe desvendar esses modelos e projetar a ruptura de ordens estabelecidas, na busca 
de um novo que aponte para uma sociedade nova que estabeleça a igualdade, atendendo à 
diversidade cultural, com uma nova compreensão da dimensão sexualidade como parte 
indissociável dos direitos humanos no processo de construção da cidadania. 
2 – Como o processo de construção da cidadania percorre um caminho que se inicia 
com a formação da identidade – quemsou eu? – e da auto-estima, passando das 
aprendizagens básicas para a convivência, efetivando-se na solidariedade e na participação 
social, não é uma conquista nem uma concessão ou dádiva, é um processo que passa pelo 
caminho de uma transformação pessoal, sendo que essa mudança é sempre parte de um 
processo maior de transformação coletiva, tendo como eixo norteador a ação do ser humano 
como sujeito-cidadão. 
3 – Para isso, temos de ter sempre presente que o lugar do ser humano no mundo é a 
sua corporeidade, não apenas como equipamento psicofísico ou conjunto anatômico, mas 
como nó de significações vivas. É o corpo o lugar hibrido da natureza e da cultura. 
Gonçalves (1997, p89) propõe ao homem “estar aberto ao mundo e, ao mesmo tempo, 
vivenciar o corpo na intimidade do Eu: sua beleza, sua plasticidade, seu movimento, prazer, 
dor, harmonia, cansaço, recolhimento e contemplação. (...) Ser-no-mundo com o corpo 
significa movimento, busca e abertura de possibilidades, significa penetrar no mundo e, a 
todo momento, criar o novo”. Há que se recuperar uma significação mais lúdica, livre, para 
o corpo, deixando de lado a concepção anacrônica, muitas vezes ainda vigente, que coloca 
o corpo como oposição, vendo nele todo o princípio do mal, da maldade, da malícia, da 
luxúria, templo de pecado, lugar de perdição, prisão do homem... por exemplo, Santo 
Agostinho, filósofo que é estudado no Caderno de Filosofia, foi um dos que afirmou que o 
corpo é prisão da alma e fonte do que julgamos ser o Mal. 
4 – Ao reencontrar-se com sua corporeidade, o ser humano vê ampliada suas 
possibilidades de reassumir-se cada vez mais como sujeito pleno, fica mais fácil lutar pela 
liberdade de escolha de seus caminhos. Assim, não será tão facilmente manipulada para 
escolher a liberdade que lhe é proposta por alguém. Um indicador, portanto, de que estamos 
trilhando o caminho da busca do emancipatório em educação sexual será aquele 
representado pelo cuidado que tivermos em nossas vivências pedagógicas para que o ser 
humano tenha efetivamente a liberdade de escolha. Há que se ter cuidado para que, em 
nome da emancipação, não se defina previamente qual a “liberdade” que o Outro deva 
escolher. 
Vimos, então, alguns dos indicadores que podem apontar para a construção de um 
paradigma emancipatório de educação sexual. Com base nessas “pistas”, com certeza temos 
condições de fazer uma reflexão crítica sobre nossa vivência pessoal e pedagógica no 
intuito de revê-la na busca de um constante aperfeiçoamento. 
 
 
SAIBA MAIS.... 
 
 
Texto de apoio- extraído do Livro Educação sexual na escola: equidade de Gênero, livre 
orientação sexual e igualdade étnico-racial numa proposta de respeito às diferenças. 
FURLANI, Jimena (org.). Florianópolis, UDESC, 2008. 
Pressuposto teórico e políticos de uma Educação Sexual de respeito às diferenças – 
argumentando a favor de um currículo pós-crítico 
 
Jimena Furlani 
 
 
Educação Sexual – o currículo crítico 
 
Até meados do século XX o contexto das teorizações educacionais esteve marcado 
fortemente pela análise crítica social a partir de referenciais marxistas. 
A obra de Karl Marx (1818-1883) mudou drasticamente as opiniões sobre a 
sociedade humana, causando grande impacto nos pensamentos social e político 
contemporâneos. O marxismo (também conhecido como materialismo histórico, 
materialismo dialético ou socialismo científico) desenvolveu-se a partir de uma crítica à 
tradição racionalista. Para Marx, a análise social, apenas no plano das idéias, do espírito e 
da consciência humana, não era suficientemente crítica para explicar a sociedade e as 
relações humanas. Para o marxismo, “a verdadeira origem dessas idéias estaria na base 
material da sociedade, em sua estrutura econômica e nas relações de produção que esta 
mantém” (JAPIASSU & MARCONDES, 1990, p. 162). 
Assim como a psicanálise (de Sigmund Freud, 1856-1939), o marxismo significou 
uma nova forma de compreender a natureza do conhecimento. O nome geral a este tipo de 
pensamento (um revolucionário conceitual à estrutura epistêmica) foi Teoria Crítica. 
A expressão Teoria Crítica surgiu, em 1937, no texto (Teoria Tradicional e 
Teoria Crítica) de Max Horkheimer (1895-1973) publicado na “Revista de 
Pesquisa Social” (editada de 1932 a 1942) – publicação oficial do Instituto 
de Pesquisa Social (fundado em 1923) em Frankfurt, Alemanha. Esse 
instituto tinha como objetivo “promover, em âmbito universitário, 
investigações científicas a partir da obra de Karl Marx (1818-1883) ” 
(NOBRE. 2004, p. 12 e 13). 
Foram Max Horkheimer e Theodor Adorno, juntamente com Herbert Marcuse e 
outros, que desenvolveram uma revisão do pensamento marxista (no decorrer dos anos de 
1930) que culminou com a chamada Teoria Crítica da Sociedade, da Escola de Frankfurt. 
Essa escola reforçou a idéia de que “a finalidade da Teoria Crítica é a emancipação e o 
esclarecimento. Ela busca tornar os agentes cientes de coerções ocultas, libertando-os; com 
isso, os deixa em condições de determinar onde se encontram seus verdadeiros interesses” 
(Raymond GEUSS, 1988, p.91). Teoria Crítica da Sociedade foi considerada como uma das 
distintas correntes oriundas das diversas interpretações do marxismo. 
Para a reflexão que pretende iniciar, sempre voltada à Educação Sexual que 
pretendo sugerir, pergunto: qual a diferença entre um currículo crítico e um currículo pós- 
crítico? O que é uma pedagogia crítica? O que a distingue de uma pedagogia pós-crítica? 
Como essas perspectivas estão presentes no trabalho pedagógico da escola? 
Essa problematização é extremamente pertinente, sobretudo quando observamos, 
numa análise da história social recente, o quanto alguns referenciais teóricos, que se 
consolidaram no século XX, perpassam as práticas docentes e as mais diversas concepções 
acerca da educação. Trago essa discussão para pensarmos a Educação Sexual porque 
entendo que, nem sempre, professores e professoras têm consciência dessa “escolha” 
teórica, ou possuem discernimento para identificá-la – garantindo, em seu trabalho, uma 
coerência teórica-prática. 
Entendo que referenciais distintos não apenas expressam e constroem uma 
concepção de mundo, de educação ou de sujeitos, mas seu arcabouço conceitual e 
epistêmico explicita suas limitações, suas possíveis interfaces com outras teorias e práticas 
e suas possibilidades reflexivas para o campo a que se destinam problematizar. Quero 
argumentar a favor de uma Educação Sexual pós-crítica. 
Para esse exercício teórico, inicialmente, me parece produtiva a classificação 
apresentada por José Carlos Libâneo (2005), no artigo “As teorias Pedagógicas Modernas 
revisitadas pelo debate contemporâneo na Educação”. O autor organiza correntes e 
modalidades pedagógicas modernas, conforme o quadro a seguir. 
As teorias pedagógicas “críticas” na classificação do autor assumem a denominação 
de “sociocríticas” – perspectivas essas muito presentes nas escolas públicas brasileiras e 
universidades. 
Teorias Pedagógicas Modernas 
CORRENTES MODALIDADES 
Racional-tecnológica Ensino de Excelência 
Ensino tecnológico 
Neocognitiva Construtivismo Pós-Piagetiano 
Ciências Cognitivas 
Sociocríticas Sociologia Crítica do Currículo 
Teoria histórico-cultural 
Teoria sociocultural 
Teoria sociocognitiva 
Teoria da ação comunicativa 
Holísticas Holismo 
Teoria da Complexidade 
Teoria Naturalista do Conhecimento 
Ecopedagogia 
Conhecimento em rede 
Pós-Modernas Pós-estruturalismo 
Neo-pragmatismo 
FONTE: LIBÂNEO, 2005, p. 30. 
 
O conjunto das correntes definidas como “sociocríticas” (LIBÂNEO, 2005), bom 
como suas modalidades, é originário das TEORIAS CRÍTICAS, ou seja, aquelas 
inspiradas no marxismo. São elas: 
o A Sociologia Crítica do Currículo 
o A Teoria histórico-cultural 
o A Teoria sociocultural 
o A Teoria sociocognitiva 
o A Pedagogia histórico-cultural 
o A Pedagogia histórico-crítica 
oA Pedagogia sócio-histórica 
o A Pedagogia histórico-social 
o A Pedagogia libertária 
o A Pedagogia libertadora 
o A Pedagogia de emancipação 
o A Pedagogia crítico-social 
 
Convém lembrar alguns conhecidos pensadores contemporâneos que tiveram no 
marxismo sua inspiração teórica e política e contribuíram para o surgimento de uma 
tradição crítica na educação: no Brasil, Dermeval SAVIANI (1943-), Moacir GADOTTI 
(1941-) e Paulo FREIRE (1921-1997); em Portugal, Boaventura de Sousa SANTOS (1940- 
); na França, Jean-Claude FORQUIN (1922-) Louis ALTHUSSER (1918-1990) e Pierre 
BOURDIEU (1930-2002); nos Estados Unidos, Jennifer Gore (1957-), Michael APPLE e 
Peter McLAREN; na Espanha, José Gimeno SACRISTÁN; na Inglaterra, Basil 
BERNSTEIN (1924-2000), Henry GIROUX (1943-) e Michael YOUNG. 
No Brasil, nas décadas de 1970 e 1980, o marxismo já se constituía numa corrente 
de pensamento muito presente no campo da formação de educadores/as e ainda o é nos dias 
de hoje. Especialmente nas Ciências Humanas e Ciências Pedagógicas, a Teoria Crítica 
buscou resgatar a concepção materialista da história (transformar a realidade e as 
mentalidades) utilizando, para isso, a dimensão cultural. No entanto, esse enfoque cultural 
não foi tratado de maneira aprofundada por Marx, e isso se explica uma vez que o 
marxismo ortodoxo enfatizou excessivamente o aspecto econômico, sobretudo no momento 
histórico de sua formação, quando definiu como base a discussão das forças industriais de 
produção e a crítica da sociedade capitalista de consumo. 
Sem dúvida, o marxismo teve (e tem) grande contribuição na análise social e foi (é) 
uma teoria impactante. Contudo, para a Educação Sexual que proponho neste livro, as 
teorias críticas apresentam significativas limitações teóricas e, conseqüentemente, políticas. 
Umas dessas limitações é exatamente o entendimento de que o poder opressor é central – o 
capitalismo; e “os conflitos desapareceriam” da sociedade caso não houvesse divisão de 
classes. Há duas questões nesse entendimento merecedoras de investimento explicativo: a 
primeira refere-se ao modo de entender a constituição dos “sujeitos sociais”, e a segunda, o 
entendimento de “poder”. 
Educação Sexual – o currículo pós-crítico 
 
Aqui posso, então, apresentar os motivos teóricos e políticos que me fazem escolher 
o pós-estruturalismo como recurso teórico analítico na Educação Sexual. Os argumentos a 
seguir se aproximam do pensamento pós-crítico. 
1. º motivo – O sujeito social 
 
O pós-estruturalismo é uma forma particular de teorização cultural que faz a crítica 
do sujeito centrado, autônomo e universal (do modernismo e do humanismo); aquele sujeito 
que, ao longo da história, teve o reconhecimento, a representação positiva e o privilégio 
social: homem branco, ocidental, cristão, burguês, masculino, heterossexual. 
As teorizações marxistas (críticas) viam as pessoas apenas como sujeitos de classe 
social. Para Marx, esse era o marcador da condição humana que definia as experiências dos 
sujeitos, seus processos de opressão, sua condição de desigualdade e seu grau de hierarquia 
na vida em sociedade. Esse olhar, a partir da tradição marxista de análise social, foi/tem 
“Para cada sujeito (homem ou mulher, menino ou menina), em específicos momentos de sua vida, as 
narrativas sociais constroem diferentes “posições-de-sujeito” (Kathryn WOODWARD, 2000) que 
podem ser investidas de positividade ou de negatividade; podem ser posições centrais ou marginais que 
carregam atributos desejados ou atributos marginalizados, exemplos a serem seguidos ou a serem 
evitados. Este caráter de provisoriedade permite-nos afirmar que “as identidades são, pois, pontos de 
apego temporários às posições-de-sujeito que as práticas discursivas constroem para nós” (Stuart HALL, 
2000, p. 112) e, na dinâmica social, um mesmo indivíduo pode experimentar situações de identidade 
marginalizada ou central, estigmatizada ou aceita como normal. 
 
Somos sujeitos de múltiplas identidades e, ao longo da vida, vivemos diferentes experiências sociais em 
decorrência dessa convergência identitária. Por exemplo, ser mulher, lesbiana, negra, idosa e pobre pode 
significar uma experiência de vida diferente de alguém que é mulher, lesbiana, branca, rica e jovem. As 
identidades culturais interagem e nos colocam em diferentes posições-de-sujeito. Essas diferentes 
posições modificam as experiências de preconceito, de discriminação e de violência experimentadas, por 
cada uma de nós, ao longo da vida. Portanto, não há uma identidade cultural que possa ter tida, 
genericamente e universal a todos os sujeitos, como central ou a mais importante.” 
 
Texto extraído de FURLANI, Jimena (2005b). 
sido responsável pelo apego de muitos/as educadores/as em depositar sobre a ‘classe social’ 
o principal aspecto constituidor dos sujeitos. 
Teorizações pós-críticas, como os Estudos Culturais, por exemplo, vão partir do 
entendimento de que os sujeitos são interpelados por muitas “identidades culturais”, ou 
seja, cada pessoa apresenta distintos e múltiplos aspectos identitários. Essas identidades são 
construídas discursivamente nos processos que instituem a diferença. Não somos apenas 
sujeitos “de classe” e, para muitos de nós, não é a posição econômica o fator determinante 
de nossa existência, de nossa privação social, das circunstâncias de exclusão ou de 
reconhecimento social, de nosso acesso ou negação aos bens materiais, etc. 
A Educação Sexual que estou apresentando neste livro entende que as diferenças 
individuais, visíveis em crianças, jovens e adultos (sejam eles estudantes ou professores/as, 
dirigentes escolares, etc.) não expressam apenas condição econômica. Marcadores sociais 
distintos constituem os sujeitos da educação e podem ter como referência sua condição 
física, seu gênero, sua religião, sua classe social, sua geração, seu estado civil, etc. Hoje, no 
momento histórico atual, sobretudo como resultado das reivindicações e conquistas dos 
movimentos sociais do século XX (as Políticas de Identidade), outros sujeitos (além dos 
grupos populares) têm reivindicado direitos e merecem ser considerados na Educação, nos 
currículos escolares. 
 
 
 
 
 
Marx (e, por conseguinte, as teorizações críticas) não se utilizou da palavra 
“diversidade” e/ou “diferença”, e tampouco reconheceu que outras dimensões humanas 
pudessem ser tão importantes para as pessoas como a classe social. Marx não considerou 
que as pessoas também podiam ser marcadas socialmente por aspectos como, por exemplo, 
seu sexo (ser menino, menina, homem, mulher), seu gênero (masculino, feminino, travesti), 
por sua raça (ser branca, negra, parda), sua origem étnica (ocidental, oriental), seu estado 
físico (cego, surdo, cadeirante), sua sexualidade (heterossexual, homossexual, bissexual), 
sua geração (criança, adolescente, adulto, idosa/o), sua religião ou crença (cristão, 
muçulmano, espírita, umbandista), etc. O entendimento de diversidade humana e social, no 
contexto marxista, não tinha cabimento como entendemos hoje. 
Na pauta da escola do século XXI e das políticas públicas voltadas à educação, 
encontramos preocupações com o respeito ao diferente, à inclusão escolar, à diminuição das 
desigualdades sociais. É possível afirmar que “o respeito à DIVERSIDADE” tem sido 
apresentado como desejado e visto como uma estratégia “politicamente correta” para 
incluir na agenda educacional a inclusão de identidades e sujeitos subordinados. Todos os 
níveis da escolarização brasileira têm repensado e entendimento de “uma escola inclusiva”, 
que promova a inclusão social. 
No ano de 2007 a UDESC (Universidade do Estado de Santa Catarina) promoveu 
discussões sobre o tema objetivando a definição de sua Política de Inclusão. Fui convidada 
a colaborar com a Comissão. O texto a seguir apresenta a versão final com minhas 
sugestões – e explicita um entendimento de “inclusão” e dos sujeitosobjeto de tais 
políticas: 
 
Das concepções de inclusão: 
 
Art. 1º. Entende-se por inclusão: 
I - O processo sistemático e intencional que possibilita o acesso à Universidade, 
de sujeitos marcados por atributos identitários, historicamente, subordinados nas 
relações de poder social (idosos, mulheres, negros, negras, indígenas, portadores 
de necessidades especiais, gays, lésbicas, travestis, transexuais, trangêneros). 
II - A representação positiva desses sujeitos nas políticas de ensino, pesquisa e 
extensão, possibilitando a esses grupos exercer suas atividades como cidadãos e 
cidadãs no contexto da Universidade, gozando dos direitos e prerrogativas 
comuns à todos/as e ao coletivo de seu segmento. 
III - A incorporação curricular da história, cultura e singularidades desses grupos 
como estratégia na mudança de mentalidades voltadas a minimização das 
desigualdades sociais, do combate as formas de preconceitos, violência e 
desrespeito das diferenças individuais e coletivas. 
Art. 2º. A inclusão caracteriza-se como processo complexo e gradativo, 
articulado com a organização da educação nacional, que requer uma prática 
transformadora no contexto da universidade, a partir de ações, que se justificam 
por três princípios: 
I. O direito de todos e todas ao acesso à educação e a produção do conhecimento; 
II. A igualdade de oportunidades para formação profissional numa instituição 
pública e gratuita. 
III. A contribuição da Universidade na busca por uma sociedade da paz e do 
respeito às diferenças. 
[...] Da abrangência da ação 
Art. 5º As ações abrangerão diferentes identidades culturais: 
a) Condição/Estado físico ou necessidades especiais (cadeirantes, surdos, cegos); 
b) Raça e/ou etnia (populações de negros e negras, quilombolas, indígenas) 
c) Identidade de gênero e/ou Orientação Sexual (mulheres, gays, lésbicas, 
bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros); 
d) Condição socioeconômica. 
 
(Documento “Política de Inclusão da UDESC”, 2007) 
 
2. º motivo – O entendimento de poder 
 
Para as teorizações críticas o poder é central, estrutural, e está no “capitalismo 
centrado nas instituições do Estado”; portanto, é vertical e “derivado, relativamente, às 
relações sociais de produção” (SILVA, 2000b, p. 91). Para as teorizações pós-críticas, que 
se baseiam no entendimento de Michel Foucault, “o poder é concebido como 
descentralizado, horizontal e difuso” (SILVA, 2000b, p. 91). Para Foucault (1997), o poder 
apresenta um domínio de relações estratégicas entre indivíduos ou grupos – relações que 
têm como questão central a conduta do outro ou dos outros, e que podem recorrer a técnicas 
e procedimentos diversos, dependendo dos casos, dos quadros institucionais em que ele se 
desenvolve, dos grupos sociais ou das épocas (p. 11). 
Foucault reconhece o poder central e totalizador do Estado, mas chama a atenção 
para as formas de sujeição (assujeitamento) que interpelam as pessoas pelas relações de 
dominação ([...] “força de produção, luta de classe e estruturas ideológicas que determinam 
a forma de subjetividade” (FOUCAULT, 1995, p. 236). Para ele, o mais importante são as 
relações de poder que se estabelecem entre os indivíduos. Ele chama de “poder disciplinar” 
aquele que aciona uma série de procedimentos e mecanismos que interferem na vida das 
pessoas, não para aniquilá-las ou destruí-las, mas para disciplinar os corpos e as mentes. 
O entendimento de poder, em Foucault, portanto, é oposto ao entendimento 
marxista. O poder não é algo que se possui ou que está fixo, e tampouco emana de um 
centro (o Estado ou o capitalismo). O poder é resultante de relações, é móvel e fluido, está 
em toda parte. Por exemplo, mesmo que houvesse distribuição de renda equitativa no país, 
que não houvesse mais miseráveis nem pobres, que a renda per capita das/os brasileiras/os 
fosse uma média boa a muito boa; mesmo que toda a população fosse classe média, média 
alta, etc.; mesmo assim, ainda a sociedade brasileira apresentaria sujeitos subordinados por 
gênero, sexualidade, nacionalidade... Ainda assim a sociedade seria machista, racista, 
homofóbica, xenófoba... Ainda assim existiriam pessoas sendo discriminadas, sofrendo 
violência, coação... 
Gênero, sexualidade, raça e etnia são conceitos que devem ser compreendidos no 
campo da cultura e da histórica e, portanto, relacionados ao poder. “Não apenas como 
campos nos quais o poder se reflete ou se reproduz, mas campos nos quais se exercita, por 
onde o poder passa e onde o poder se faz. ” (LOURO, 2007, p. 211). 
3. º motivo – Saber-poder, a linguagem e os processos de significação. 
 
Foucault criou a expressão saber-poder para enfatizar seu entendimento de que todo 
poder é uma expressão de determinada verdade, ou seja, o poder utiliza “um saber que se 
expressa como conhecimento das populações e dos indivíduos submetidos” a ele (SILVA, 
2001ª, p. 120). Este saber, quando hegemônico, quando tido como verdade absoluta, 
exerce, sobre aqueles sujeitos de que fala, poder sobre eles. Este efeito pode ser positivo ou 
pode ser negativo à existência desses sujeitos. 
O louco, o prisioneiro, o homossexual não foram/não são expressões de um estado 
prévio, original Eles receberam/recebem sua identidade a partir dos aparatos discursivos 
e institucionais que os definem como tais. O sujeito é resultado dos dispositivos que o 
constroem como tal (SILVA, 2001a, p. 120-121). 
Aqui está mais um motivo, teórico e político, de minha escolha por referencial: o 
pós-estruturalismo partilha com o estruturalismo a mesma ênfase na linguagem como 
sistema de significação, mas amplia a sua centralidade – como a noção de ‘discurso’ de 
Michel Foucault e a noção de “texto” de Jacques Derrida –; portanto, é uma reação ao 
estruturalismo. No pós-estruturalismo o é fluido, indeterminado e incerto, enquanto que 
para o estruturalismo o significado é fixo. O pós-estruturalismo rejeita a dialética – tanto 
hegeliana quanto a marxista. No marxismo o sujeito é resultado da ideologia que, uma vez 
removida (sobretudo a estrutura capitalista), surge um novo sujeito. Para Foucault, “não 
existe sujeito a não ser como simples e puro resultado de um processo de produção cultural 
e social” (SILVA, 2001a, p. 120). 
Guacira Louro ao assumir o pós-estruturalismo como referencial teórico aos seus 
estudos de gênero e sexualidade afirma: 
“Empreender tal escolha teórica implica em lidar com contradições sim, mas 
implica deixar de lado a lógica da dialética, que supõe a síntese e a superação 
da contradição. Nessa perspectiva, buscamos superar o raciocínio do tipo ou 
isso ou aquilo e ensaiamos a produtividade de pensar que algo pode ser, ao 
mesmo tempo, isso e aquilo. ” (2007, p. 215) 
São representantes da primeira geração do pós-estruturalismo francês: Jacques 
Derrida, Michael Foucault, Julia Kristeva, Jean-François Lyotard, Gilles Deleuze, Luce 
Irigaray, Jean Baudrillard, entre muitos (Michael PETERS, 2000, p. 34). Os pensadores 
pós-estruturalismo desenvolveram formas peculiares e originais de análise (gramatológica, 
desconstrução, arqueologia, genealogia, semioanálise), com freqüência dirigidas para a 
crítica de instituições específicas (como a família, o Estado, a prisão, a clínica, a escola, a 
fábrica, as forças armadas, a universidade e até mesmo a própria filosofia). Também 
dirigem críticas para a teorização de uma ampla gama de diferentes meios (a ‘leitura’, a 
‘escrita’, o ensino, a televisão, as artes visuais, as artes plásticas, o cinema, a comunicação 
eletrônica) (PETERS, 2000, p. 34). 
A escola hoje não pode, apenas, querer ‘transmitir os conhecimentos sistematizados, 
historicamente, pela humanidade’ – até porque, como esses conhecimentos foram 
construídos em relações desiguais de poder, eles, certamente, não incluem todos os sujeitos 
humanos, nem tampouco são conhecimentos representativos de todas as identidades 
culturais. A escola precisa incluir nasua agenda pedagógica a multiplicidade cultural, os 
saberes populares advindos de movimentos sociais e os saberes advindos das experiências 
subjetivas dos sujeitos. A Educação Sexual deve considerar a diferença como produtiva 
para vida social. Surgem, então, algumas questões à escola: 
Como visibilizar essa diferença nos currículos escolares? 
 
Uma forma é a inclusão, no currículo, de identidades subordinadas. Essa inclusão 
não se traduz apenas na garantia do acesso desses sujeitos aos bancos escolares (negros, 
negras, gays, lésbicas, estrangeiras/os, deficientes físicos, etc.). Essa inclusão se traduz na 
visibilidade de sua cultura e de sua história no currículo escolar e na ressignificação 
positiva dessas identidades e desses sujeitos. 
No lançamento do PCN´s (1997), o então ministro Paulo Renato de Souza se dirigiu 
aos professores e professoras enfatizando o objetivo do novo documento (o de auxiliar na 
execução do trabalho docente) e reconheceu que só se exerce a cidadania plena tendo 
acesso “[...] aos recursos culturais relevantes [...]”, ou seja, “[...] tanto os domínios do 
saber tradicionalmente presentes no trabalho escolar, quanto as preocupações 
contemporâneas com o meio ambiente, com a saúde, com a sexualidade e com as questões 
éticas relativas à igualdade de direitos, à dignidade do ser humano e à solidariedade [...]” 
(BRASIL, 1997, vol. 08, p. 05)(grifos meus). 
Parece-me, então, que considerar os problemas que as crianças, os jovens e os 
adultos enfrentam ao longo de sua existência é admitir que a sociedade é, muitas vezes, 
machista, homofóbica, racista, misógina, etnocêntrica. Preconceitos e atos de discriminação 
marcam os sujeitos e estão presentes na escola, em seu currículo. 
Seria a intolerância uma expressão da dificuldade humana em aceitar a diferença? 
 
Seria a imposição de padrões ditos normais uma demonstração do quanto a 
humanidade é limitada em considerar a multiplicidade – quer seja ela sexual, de gênero, 
religiosa, étnica, racial, etc. – como algo bom, positivo e desejável? 
Como a Educação Sexual pode transitar de um currículo crítico para um pós-crítico? 
 
Que arranjos são necessários? Que efeitos pedagógicos têm cada escolha? 
Tomaz Tadeu da Silva (2001a, p.17), no livro “Documentos de Identidade – uma 
introdução às teorias do currículo”, faz uma simples, mas impactante classificação das 
teorias educacionais acerca dos modos de pensar o currículo. Para ele, elas podem ser 
divididas em três abordagens: as teorias tradicionais, as teorias críticas e as teorias pós- 
críticas. 
 
Teorias do Currículo (SILVA, 2001a, p. 17) 
Teorias TRADICIONAIS Teorias CRÍTICAS Teorias PÓS-CRÍTICAS 
• Ensino 
• Aprendizagem 
• Avaliação 
• Didática 
• Organização 
• Planejamento 
• Eficiência 
• Objetivos 
• Ideologia 
• Reprodução Cultural e 
Social 
• Poder 
• Classe social 
• Capitalismo 
• Relações Sociais de 
Produção 
• Conscientização 
• Emancipação e 
Liberdade 
• Currículo Oculto 
• Resistência 
• Identidade 
• Alteridade 
• Diferença 
• Subjetividade 
• Significação e Discurso 
• Saber-poder 
• Representação 
• Cultura 
• Multiculturalismo 
• Gênero, Sexualidade, 
Raça, Etnia 
 
O quadro anterior, elaborado a partir de Silva (2001a), mostra, de modo simples, 
como cada teoria traz consigo uma lógica. Cada teoria explicita categorias conceituais que 
apontam para o modo como ela pensa e problematiza o meio social e educacional. Nesse 
sentido, esses termos conceituais levam a uma coerência definida a partir dos seus 
princípios teóricos fundacionais. Outras categorias (metodologia, fracasso escolar, dialética, 
desconstrução) que não foram apresentadas por Silva (2001a) são acrescentadas por mim, 
neste livro, por entender que são integrantes dessas concepções de currículo, seguindo a 
mesma lógica conceitual. São elas: 
 
Teorias do Currículo 
Teorias TRADICIONAIS Teorias CRÍTICAS Teorias PÓS-CRÍTICAS 
• Metodologia 
• Fracasso Escolar 
• Dialética 
• Superação das 
contradições 
• Desconstrução 
Categorias segundo Jimena Furlani. 
A Educação Sexual que tenho pensado, nos últimos anos, e que apresento neste 
livro, tem como bússola teórica e política os Estudos Culturais, os Estudos Feministas e a 
perspectiva pós-estruturalista de análise. Vamos entendê-las um pouco melhor... 
A perspectiva Pós-Estruturalista e o Currículo da Educação Sexual 
 
O pós-estruturalismo é uma perspectiva teórica que se comporta como categoria 
descritiva de análise. Originada nos EUA, em reação ao estruturalismo de Ferdinand 
Saussure, rejeita a dialética e a análise social baseada no essencialismo e no enfoque a- 
histórico. “Limita-se a teorizar sobre a linguagem e o processo de significação” (SILVA, 
2001, p. 117). Tem em Foucault e Derrida seus principais alicerces teóricos: o primeiro 
ampliando a centralidade da linguagem através da nação de discurso; e o segundo, com a 
noção de textualidade. O pós-estruturalismo admite o conceito foulcautiano de poder, que o 
“concebe não como algo que se possui, nem como algo fixo, e tampouco partindo de um 
centro, mas como uma relação, como móvel e fluido, como capilar e estando em toda parte” 
(SILVA, 2001, p. 120). 
Essa perspectiva supõe que as relações de poder se encontram no cerne dos 
processos de significações que instituem e marcam as diferenças entre identidades. Os 
diversos significados que são atribuídos às identidades são decorrentes de posições 
específicas de poder. 
Para Silva (2001ª), “sob a influência do pós-estruturalismo, uma análise do caráter 
do currículo, baseada nos Estudos Culturais, enfatizaria o papel da linguagem e do discurso 
nesse processo de construção [...]” (p. 135). Neste referencial, discurso “refere-se tanto à 
produção de conhecimento através da linguagem e da representação, quanto ao modo como 
o conhecimento é institucionalizado, modelando práticas sociais e pondo novas práticas em 
funcionamento” (Stuart HALL, 1997, p. 29). Discurso, segundo Michel Foucault, é o 
“conjunto de expressões verbais amplos, identificados com certas instituições ou situações 
sociais” (SILVA, 2000b, p. 43), como o discurso médico, discurso midiático, discurso 
jurídico, discurso religioso, discurso pedagógico, discurso machista, etc. “O termo é 
utilizado para enfatizar o caráter lingüístico no processo de construção do mundo social” (p. 
43). Esse entendimento de discurso (como institucional) não deve ser confundido com a 
fala pessoal, narrativas individuais, retórica, mensagem oral, sermão, alocução, nota, 
palestra, preleção. 
Uma possibilidade de abordagem, no contexto pós-estruturalista de análise de 
discurso e da linguagem, é o conceito de poder, de Michel Foucault (assumido, igualmente, 
pelos Estudos Feministas). Uma vez que “o poder social não é unificado, coerente e 
centralizado” (Joan Scott, 1995, p. 86), o papel da linguagem na produção e na 
representação dos gêneros e das sexualidades adquire importância fundamental para 
constituição das identidades culturais. 
As sociedades e as culturas delimitam ‘lugares’, posicionam sujeitos e demarcam 
fronteiras entre indivíduos com base no jogo diferença x identidade através da construção 
de representações que promovem qualificações, hierarquias e desigualdades. Guacira Louro 
(1995) chamou esse movimento social de contínuos processos de generificação nos sujeitos 
que são, a partir deles, formados, socializados e educados (p. 103). 
O pós-estruturalismo traz a crítica de Jacques Derrida ao pensamento filosófico 
ocidental. Para Derrida, a episteme ocidental se articula a partir de oposições binárias 
definidas por uma nítida hierarquia de pares opostos, como corpo/alma, sagrado/profano, 
Deus/diabo, masculino/feminino, ativo/passivo, homem/mulher, hetero/homossexual, 
ocidente/oriente, ciência/natureza, “homem”/máquina, razão/emoção, etc. Segundo o autor, 
é possível desmantelar o jogo das dicotomias por meio de umprocesso de “Desconstrução”. 
Desconstruir é questionar (e com isso desestabilizar) as operações e os processos 
envolvidos na construção de determinada idéia, ou seja, duvidar das explicações que 
envolvem “a naturalização, a universalização ou o fundacionismo” (SILVA, 2000b, p. 36). 
Os Estudos Culturais e o Currículo da Educação Sexual 
 
Os últimos 50 anos do século XX viram o florescer de uma série de campos não 
disciplinares de conhecimento, além das já clássicas Ciências Humanas, Sociais e Físicas. 
Esses novos campos tornaram o pensamento contemporâneo marcado pela articulação e/ou 
confluência de distintas abordagens, entra elas: os Estudos de Gênero e Sexuais, os Estudos 
Literários, os Estudos sobre Etnias e Raças e os Estudos Culturais. 
Nelson; Treichler & Grossberg (1995, p. 08) definem algumas principais categorias 
da pesquisa atual em Estudos Culturais: gênero e sexualidade; nacionalidade e identidade 
nacional; colonialismo e pós-colonialismo; raça e etnia; cultura popular e seus públicos; 
ciência e ecologia; política de identidade; pedagogia; política da estética; instituições 
culturais; política da disciplinaridade; discurso e textualidade; história e cultura global 
numa era pós-moderna. Embora os Estudos Culturais possam ser identificados por essas 
categorias, elas não os limitam a tampouco conferem seus limites. Quaisquer campos do 
conhecimento podem ser articulados aos “cultural studies”, entre eles os movimentos 
sociais, sexuais e de gênero, o marxismo, a psicanálise, o pós-estruturalismo. 
Para Stuart Hall (1997), é a partir da metade do século XX que a cultura passou a 
ter uma expressão central na análise e intervenção de todos os aspectos da vida social, 
devido ao seu caráter associativo e constituinte. Na teorização social, o conceito de cultura 
adquiriu um amplo poder analítico e explicativo, ao mesmo tempo em que se tem 
aprimorado seu uso na regulação social. Essa abordagem da análise social contemporânea – 
que coloca (colocou) a cultura num status da centralidade – provocou o que muitos(as) 
intelectuais denominaram de “virada cultural”. 
Interessa-me, sobremaneira, o potencial que os estudos culturais possuem de 
impacto político, na medida em que são capazes de fazer a crítica social das desigualdades 
culturais e, com isso, “conferir” certa importância e influência sobre políticas públicas. 
Um exemplo desse potencial crítico pode ser visto nas questões sobre HIV/AIDS: a questão 
da AIDS mostra-nos um terreno de estudo, denúncia e contestação dos modelos 
hegemônicos e tradicionais da sexualidade humana. Uma crítica à luz dos Estudos Culturais 
pode apontar para a necessidade de se questionar, entre outras coisas, as representações 
discriminatórias religiosas e a homofobia; as relações de gênero; o sexo seguro; os valores 
morais (fidelidade, promiscuidade); a hetero e a homossexualidade; a prostituição; as 
campanhas de redução de danos / ricos; questões de classe e raça. 
Mesmo partindo do pressuposto de que toda a ação social é cultural, a que significa 
dizer que “as práticas sociais expressam um significado – são de significação” (HALL, 
1997, p. 16), nem sempre as ciências humanas e sociais conferiram à cultura um status 
epistemológico (conhecimento e conceitualização) central. 
Hall (1997) mencionou haver dois aspectos de interpretar a cultura e de ver sua 
centralidade: um como ‘substantivo’ – que compreende “o lugar da cultura na estrutura 
empírica real e na organização das atividades, instituições e relações culturais na sociedade, 
em qualquer momento histórico particular”; o outro aspecto, como uma dimensão 
‘epistemolófica’ – a “posição da cultura em relação às questões de conhecimento e 
conceitualização, explicando os modelos teóricos do mundo” (p. 16). Portanto, é a partir da 
“virada cultural” que a cultura passa a ter uma função de destaque, tanto na análise social 
quando na produção do conhecimento científico, compreendida como “campo de luta em 
torno da significação social” (SILVA, 2001, p. 133). 
Nesse processo de compreensão da dimensão cultural, a análise do discurso tornou- 
se especialmente importante uma vez que possibilitou apreender os diversos significados 
contidos na prática social, vislumbrando, com isso, as relações de poder e seus modos de 
regulação. A ‘virada cultural’, assim, “está intimamente ligada a esta nova atitude em 
relação à linguagem, pois a cultura não é nada mais do que a soma de diferentes sistemas de 
classificação e diferentes formações discursivas ao qual, a língua recorre a fim de dar 
significado às coisas” (HALL, 1997, p. 29). 
No âmbito intelectual e acadêmico, este novo campo interdisciplinar de estudo, 
tendo a cultura como conceito central, passou a ser reconhecido como Estudos Culturais, a 
partir da década de 1960. Essa nova abordagem passou a considerar que todas as formas de 
produção cultural necessitam de investigação à luz de outras práticas culturais e das 
instituições sociais e históricas. 
A nova compreensão de cultura passa a reconhecer todas as experiências vividas por 
uma sociedade, abrangendo “a ‘cultura popular’, isto é, as manifestações da cultura de 
massa – livros, tablóides, rádio, televisão, a mídia em geral” (SILVA, 2001, p. 132). A 
concepção de cultura, desenvolvida por Raymond Williams, em “culture and Society”, 
publicado em 1958 – conceito este que conferiu ao Centro de Estudos Culturais e 
Contemporâneos, em Birmingham, “as bases de sua teorização e metodologia”, afirmava, 
em contraste com a tradição literária, que a “cultura deveria ser entendida como o modo de 
vida global de uma sociedade, como a experiência vivida de qualquer grupamento humano. 
Nessa visão, não há nenhuma diferença entre, de um lado, as ‘grandes obras’ de literatura e, 
de outro, os Estudos Culturais, ao recusar a idéia de cultura como aquela que reconhece 
apenas a “alta cultura”, compromete-se com outras práticas culturais, como as artes, as 
crenças, os valores, a vida familiar, as relações de gênero, as instituições a práticas 
comunicativas da sociedade, relacionando-as às estruturas sociais e históricas. 
O conceito de “cultura”, apresentado por Stuart Hall como sendo “o terreno real, 
sólido, das práticas, representações, línguas e costumes de qualquer sociedade histórica 
específica, bem como, as formas contraditórias de ‘senso comum’ que se enraizaram na 
vida popular e ajudaram a moldá-lo”, adquire especial importância na problematização de 
estudo das identidades sexuais e de gênero. Isso principalmente se considerarmos que é a 
cultura o campo social objeto das significações sexuais, objeto de análise dessa 
representação (como objeto de estudo) e local da crítica e da intervenção política. 
Mais recentemente, sob influência do feminismo, os Estudos Culturais têm 
repensado noções de subjetividade, política, gênero e desejo, mostrando como é 
potencialmente possível esta possibilidade de articulação das naturezas constitutivas e 
políticas dos sujeitos e das suas representações, questionando as complexas formas pelas 
quais as identidades são articuladas, experienciadas e rearticuladas. 
Nos anos 1980, os Estudos Culturais, no Centro de Birmingham, mudou a influência 
teórica marxista pelo pós-estruturalismo de Michel Foucault e Jacques Derrida. Sob o ponto 
de vista metodológico, o Centro se dividiu entre duas tendências: as pesquisas de terreno, 
sobretudo etnográficas, de origem na Sociologia, utilizadas especialmente nos estudos das 
chamadas subculturas humanas, e, de outro, as interpretações textuais, de origem nos 
estudos literários, usadas nas análises dos programas de televisão e dos textos de obras 
consideradas ‘populares’ (cf. SILVA, 2001, p. 132). 
Hoje, há uma diversidade de perspectiva teóricas e de influências disciplinares nos 
Estudos Culturais, nos diversos países e centros de estudo, quer sejam por influência 
marxistas ou pós-estruturalistas, da mesma forma

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