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1 CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIFTC CURSO DE PSICOLOGIA ESTÁGIO BÁSICO EM SAÚDE MENTAL DOCENTE: MILENA AZEVEDO TURMA: 29_PSI5AM / QUARTA-FEIRA 7:20 (MATUTINO) CALINE VICTÓRIA SANTANA DOS SANTOS RESENHA: ‘A LOUCURA ENTRE NÓS’ COMO UM RESGATE AO CONCEITO BIOPSICOSSOCIOESPIRITUAL QUESTIONANDO A BUSCA INCESSANTE DA RESPOSTA SOBRE O QUE É NORMALIDADE E LOUCURA A LOUCURA ENTRE NÓS. Direção: Fernanda Fontes Vareille. Produção: Fernanda Fontes Vareille e Amanda Gracioli. Brasil, 2016. DVD. Antes de iniciar falando sobre os aspectos psicossociais que constroem a obra cinematográfica “A loucura entre nós”, é importante explicitar a temática principal que nela está inserida, que é a reconstrução social a partir das mazelas deixadas pelo sistema manicomial no Brasil e no mundo. Nascer com o gênero feminino, estar constituído numa realidade de pobreza, possuir algum tipo de deficiência física ou psicológica eram motivos suficientes para o cidadão ser tratado com total desumanidade dentro de um sistema que não tinha como princípio o olhar cuidadoso sob aqueles que necessitavam de uma atenção mais caprichada. O Movimento da Luta Antimanicomial surge justamente para compreender, estudar, elaborar e lutar pelos direitos daqueles com algum tipo de sofrimento mental, e após muitos avanços da Reforma Psiquiátrica, é possível enxergar na obra os vestígios do sistema manicomial de uma maneira completamente reestruturada e vivências essencialmente diferenciadas em comparação a realidade antes da introdução do Movimento. “A Loucura entre nós”, um documentário inspirado no livro homônimo desenvolvido pelo médico psiquiatra Marcelo Veras, e dirigido pela cineasta Fernanda Vareille que se desenvolve dentro do Hospital Psiquiátrico Juliano Moreira onde abriga pessoas com variados tipos de doenças mentais. Nesse mesmo hospital existe uma ONG chamada de Criamundo, que possui o objetivo de 2 reestruturar e reinserir os pacientes dentro da sociedade, através de atividades interativas, criativas e relaxantes. Inicialmente, o documentário mostra um pouco a área interna do Hospital Juliano Moreira, o seu funcionamento e como os pacientes vivenciam as suas rotinas. A cada paciente que passa pela câmera trazendo a sua narrativa de vida da maneira que lhe cabe, uns tendo mais protagonismo que outros, nos leva constantemente a reflexão do que seria considerado normal, anormal e loucura. Com o desenvolver da história contada no documentário, é notório o foco em duas pacientes que podemos chamar de personagens protagonistas, a Leonor e a Elisângela. Duas mulheres que possuem o mesmo diagnóstico (Transtorno de Bipolaridade), mas que estão inseridas em realidades completamente diferentes quando pensamos num contexto socioeconômico, e isso influencia em muita coisa. A Elisângela, inicialmente, nos mostra instabilidade emocional, resistência ao internamento e as medicações, apresentando um estado de descontrole, agressividade e delírios em relação a sua família. Após muito diálogo, trocas afetivas com sua mãe e filha, Elisângela volta a tomar os medicamentos e a seguir o tratamento corretamente direcionando-se a homeostase. Por outro lado, a personagem Leonor, se apresenta como uma mulher com comportamentos estáveis, com linguagem e aparência diferente dos outros internos do Hospital, sendo funcionária (aparentando até mesmo ser uma professora ou supervisora) da ONG Criamundo, sem demonstrar nenhum vestígio de algum transtorno mental. Ao decorrer dos lances, Leonor começa a falar um pouco sobre a sua visão do local, dos pacientes, das suas relações dentro e fora da instituição e sobre todos os seus anseios para se reconstruir dentro da sociedade, e é a partir desses lances que conseguimos notar que ela também é uma paciente do hospital que demonstra diversos surtos carregados de sentimentos profundamente tristes ou felizes, chegando até mesmo a comentar que não existe um “equilíbrio” para essa doença que possui (Transtorno de Bipolaridade). A realidade é mais complexa do que se pode imaginar. Pacientes sem perspectiva de melhora, diferentes tipos de transtornos sendo manifestados de maneiras diferenciadas, condições financeiras e familiares distintas, contudo nenhum caso é capaz de nos passar um amanhã concreto. Leonor com uma realidade financeira mais estruturada, com propósitos de vida bem estabelecidos, um quadro clínico muito mais estável em comparação a Elisângela, e mesmo vivenciando um cotidiano um pouco mais solitário, ainda sim demonstrava se sentir bem acompanhada com as poucas afetividades que havia construído, no final do documentário ela trouxe um sentimento depressivo profundo e cometeu suicídio, deixando para nós a sua visão sobre seu transtorno que não era nada fácil de enfrentar. Enquanto a Elisângela que possuía uma realidade financeira e familiar, basicamente, oposta a Leonor, conseguiu se reestruturar dentro das suas possibilidades e prosseguir com sua vida carregando o seu diagnóstico dentro de si. 3 É impossível falar sobre “A loucura entre nós”, sem voltar para a questão que tanto precisamos debater, a Reforma Psiquiátrica. O que é considerado normal? E o que é considerado loucura? Não é tão fácil de responder, porque de fato é notória a complexidade na existência do ser humano e no que construímos como sociedade. São diversas regras, normas e leis que com o passar dos anos vão se modificando cada vez mais, são variadas culturas, são dores que muitas vezes não somos capazes de explicar. Então, nem sempre a sociedade foi dessa forma que enxergamos, já foi muito mais violenta, muito mais invasiva e muito mais desumana. Para chegarmos ao ponto que nos encontramos hoje (e ainda tem muito para avançar), foi necessário que uma série de pessoas arriscassem suas próprias vidas almejando e lutando por melhorias no quesito saúde mental. A Reforma Psiquiátrica teve como sua marca registrada o fechamento de alguns dos hospícios que tomavam conta do país e do mundo, para que hoje a internação do paciente seja somente se o tratamento se mostrar ineficaz fora do hospital. Com isso, também temos em 2002, a criação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs) em todo o país, que são espaços para acolhimento, assistência psicológica e médica dos pacientes que possuem algum tipo de transtorno mental, em tratamento não-hospitalar. Somos seres biopsicossocioespirituais, e isso significa que vivemos dentro de uma pluralidade que exige atenção, respeito, cuidado e manutenção do viver. Receber um diagnóstico, seja ele qual for, não é nada simples e considerando o fato de que precisamos lidar com várias outras questões que facilitam ou dificultam a nossa jornada é ainda mais dolorido de vivenciar. Nosso país possui uma imensa desigualdade social, um péssimo acesso e construção educacional e uma realidade carregada de preconceitos históricos, a junção de todas essas perspectivas nos leva a resposta do que é ou não normal: a busca incessante pela sobrevivência em um mundo onde tudo nos coloca numa prova de fogo. Para finalizar, deixo aqui a reflexão da Leonor através da canção Lágrimas Negras, de Gal Costa: “Belezas são coisas acesas por dentro, tristezas são belezas apagadas pelo sofrimento” REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Alves, B. /. O. /. ([s.d.]-a). 18/5 – Dia Nacional da Luta Antimanicomial. Gov.br. Recuperado 29 de março de 2023, de https://bvsms.saude.gov.br/18-5-dia-nacional-da-luta- antimanicomial-2/ Alves, B. /. O. /. ([s.d.]-b). 20 anos da Reforma Psiquiátrica no Brasil: 18/5 – Dia Nacional da Luta Antimanicomial. Gov.br. Recuperado 29 de março de 2023, de 4 https://bvsms.saude.gov.br/20-anos-da-reforma-psiquiatrica-no-brasil-18-5-dia- nacional-da-luta-antimanicomial/ do Esquizo, C. [@CanaldoEsquizo]. (2018, abril 21). A loucura entre nós-filme 2016.Youtube. https://www.youtube.com/watch?v=nozKu0MjkHU dos Serviços de, C. R. de R. ([s.d.]). Reforma Psiquiátrica e política de Saúde Mental no Brasil. Gov.br. Recuperado 29 de março de 2023, de https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf ([S.d.]). Wordpress.com. Recuperado 29 de março de 2023, de https://monitoriapsiq2015.files.wordpress.com/2015/02/psicopatologia-e- semiologia-dos-transtornos-mentais-paulo-dalgalarrondo.pdf
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