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Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 1 DEFINIÇÃO A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica é caracterizada por uma afecção da via aérea inferior de modo irreversível e com destruição do parênquima pulmonar. Ao falar da DPOC vamos sempre relacionar o quadro de bronquite obstrutiva crônica com o enfisema pulmonar. A bronquite crônica pode ser caracterizada por um processo irreversível ou reversível (lembrar da asma) que decorre de um mecanismo inflamatório que resulta de deposição de colágeno e fibrose na via aérea inferior. O enfisema pulmonar decorre de uma destruição do parênquima pulmonar associado ao aumento anormal dos alvéolos. Tal processo culmina na retenção de ar e em prejuízo na troca gasosa. DOENÇA BASTANTE SUBDIAGNÓSTICADA! O tabagismo está presente em cerca de 90% dos pacientes com diagnóstico de DPOC. Isso porque as substâncias presentes nos cigarros permitem estimular a secreção glandular do epitélio respiratório, resultando em hipertrofia; reduzem e bloqueio o mecanismo ciliar das células epiteliais (lesão direta na mucosa); aumenta o recrutamento de neutrófilos que produzem enzimas proteolíticas (elastase); e inibem a ação da alfa-1-antitripsina. Ao falar do tabagismo não podemos esquecer também do risco de um tabagismo passivo, sobretudo em crianças no ambiente domiciliar. Tal exposição pode culminar em um crescimento pulmonar reduzido e prejuízo na VEF1 da criança. Outras formas de tabagismo passivo é a exposição a poeiras tóxicas no ambiente ocupacional, poluição atmosférica e fumaças. Outro importante fator de risco para o desenvolvimento de DPOC é a doença genética autossômica recessiva que resulta em enfisema pulmonar em indivíduos jovens, a deficiência da alfa-1-antitripsina. Tal doença é manifestada em pacientes homozigotos para o gene Z. Dados apontam que 10% dos indivíduos que apresentam tal mutação apresentam simultaneamente uma cirrose hepática. A ausência da alfa-1-antitrpsina deixa a enzima elastase neutrófila degradar o parênquima pulmonar. A reversão desse quadro resulta em infusão da alfa-1-antitripsina. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 2 CONSEQUÊNCIAS DO PROCESSO FISIOPATOLÓGICO OBSTRUÇÃO E HIPERINSUFLAÇÃO Tal achado se configura como um dois mais importantes e presentes em um paciente com DPOC. Para entendermos tal complicação precisamos ter em mente que a manutenção da abertura luminal dos brônquios depende a pressão gerada pelo fluxo de ar que passa sobre elas. Desse modo, quando é realizado a inspiração a musculatura respiratória trabalha (contração) afim de reduzir a pressão intratorácica, permitindo o influxo de ar ambiente para os pulmões. Por outro lado, a expiração decorre do relaxamento da musculatura e da elasticidade da via aérea. Como vimos acima, há uma perda progressiva da elasticidade das vias aéreas (comprometimento do parênquima pulmonar formação de enfisema pulmonar; presença de edema e fibrose de pequenos brônquios) decorrente do processo fisiopatológico, resultando em redução da saída de ar durante a expiração. Como resultado, temos um aprisionamento crônico de ar nos pulmões o que caracteriza os portadores dessa doença de retentores crônicos de ar. O aprisionamento de ar resulta em aumento do volume residual, mantendo o pulmão cronicamente hiperinsuflado, resultando no achado do tórax em tonel no exame físico. DISTÚRBIO DA TROCA GASOSA A troca gasosa nos pacientes com DPOC se encontra comprometida tanto pela lesão enfisematosa, quanto a bonquítica, padrão heterogêneo. Classificamos o paciente com DPOC como um alvéolo mal ventilado, mas bem perfundido. Tal característica permite a Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 3 predominância de um sangue mal oxigenado, originando uma hipoxemia crônica. Com o avançar a doença o paciente pode apresentar tal padrão em repouso. Desse modo, a terapêutica fundamental é administração de oxigênio para os pacientes. A retenção de CO2 se mostra como um problema que acontece mais tardiamente. Isso deriva da hiperinsuflação, aumento do espaço morto fisiológico e redução da sensibilidade dos quimiorreceptores as concentrações desse gás. Desse modo, a gasometria desse paciente apresenta altos níveis de PCO2, com bicarbonato e BE elevados e discreta acidemia moderada (resposta compensatória dos rins em reter o bicarbonato) – acidose respiratória crônica. A história natural da DPOC é compreendida a partir do conhecimento da maturação do sistema respiratório. É sabido que o pulmão atinge sua capacidade máxima de trabalho até os 20 anos de idade, sendo que a partir daí é notado um declínio. O tabagismo, principal fator de risco para DPOC, acentua o declínio dessa capacidade respiratória. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Quando falamos de DPOC os principais sintomas apresentados pelos pacientes são: dispneia e tosse produtiva. A evolução sintomática, por se tratar de doença crônica progressiva, acontece progressiva semelhante a doença, a dispneia, por exemplo, pode se manifestar diante do esforço se agravando até mínimos esforços. Outros sintomas associados a esse quadro pode ser a ortopneia e a dispneia paroxística noturna, embora bastante presentes nas doenças que acometem o coração, pode ser apresentar na DPOC decorrente a piora mecânica do diafragma e pelo aumento a secreção por estímulo vagal a noite. A fim de avaliar a dispneia do paciente com DPOC dispomos da tabela mMRC que quantifica em grau os sintomas, sendo um escore importante para enquadrar o paciente nos grupos A, B, C ou D para o tratamento. O exame físico do paciente apresenta distinções entre o padrão enfisematoso ou bronquítico crônico. Diante disso, podemos traçar dois estereótipos dentre esses dois extremos. O padrão enfisematoso o exame físico será marcado pela redução do murmúrio vesicular, a elasticidade e expansibilidade pulmonar estará prejudicada nesses casos, sendo que a percussão pode apresentar aumento do timpanismo. Dentro desse estereótipo temos o Pink puffers (sopradores róseos) que normalmente são magros, consumidos pela doença, presença de dispneia do tipo expiratória e sem sinais de cor pumonale. O paciente com padrão de bronquite crônica a ausculta pulmonar revela presença de ruídos adventícios (sibilos, roncos, estertores e creptos), associado a redução do murmúrio vesicular. O estereótipo é denominado de Blue bloaters (inchados azuis) os quais apresentam um grau maior de comprometimento da troca gasosa, apresentando cianose por hipóxia crônica. Tal quadro avançado pode apresentar insuficiência ventricular direita e congestão sistêmica. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 4 Um achado importante na avaliação do exame físico desses pacientes é o comprometimento da fase expiratória, a qual se mostra com um tempo maior quando comparada com a fase inspiratória. Sendo assim, os pacientes apresentam uma dispneia expiratória (sopradores), associado a contração da musculatura abdominal. AVALIAÇÃO DO PACIENTE COM DPOC EXAMES COMPLEMENTARES O hemograma dos pacientes com DPOC pode apresentar uma eritrocitose (hematócrito maior que 55%), oriundo do processo de hipoxemia crônica causada pela hiperinsuflação A gasometria arterial vai evidenciar a hipoxemia crônica com PaO2 < 55 mmHg ou SatO2 < 88%; uma hipercapnia com acidose respiratória crônica, associado ao aumento compensatório de bicarbonato pelos rins, BE elevado. Devemos sempre solicitar o exame em pacientes com DPOC exacerbado, VEF1 < 40%, fora do contexto de descompensação e na presença de sinais de insuficiência cardíaca direita. O eletrocardiograma manifesta os sinais de cor pulmonale (sobrecarga cardíaca direita): presença de onda P pontiaguda com amplitude superior a 2,5 mm nas derivaçõesD2, D3 e aVF (famosa P pulmonale), desvio do eixo QRS para a direita, bloqueio de ramo direito em graus variados. Cabe destacar que a hipoxemia crônica pode resultar na presença de uma taquiarritmia, sendo comum as extrassístoles atriais como ritmo atrial multifocal, flutter ou FA. Muitas dessas arritmias melhoram a partir da correção da hipoxemia e reposição eletrolítica (potássio e magnésio). A radiografia de tórax apresenta alterações nos quadros mais avançados da doença com a presença: retificação da cúpula diafragmática, sinais de hiperinsuflação pulmonar, aumento dos espaços intercostal, redução do diâmetro cardíaco, aumento do espaço aéreo retroesternal. A radiografia pode ser utilizada para realizar diagnóstico diferencial com outras afecções pulmonares: pneumonia, pneumotórax e tumor. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 5 A prova de função pulmonar dever ser solicitada (espirometria) para todo paciente com DPOC ou apenas com a suspeita. O exame permite quantificar o VEF1 e fazer a relação entre VEF1/CVF (índice de tiffeneau). A relação VEF1/CVF inferior 70%. Cabe ressaltar que VEF1 permite que a gente avalie o prognóstico do paciente (quanto menor pior), mas não prediz a intensidade dos sintomas, pois a sintomatologia é mais complexa, levando em consideração o nível de atividade física do paciente. A prova boncodilatora é pouco responsiva! CABE DESTACAR QUE SE A RELAÇÃO VEF1/CVF VIER ENTRE 0,6-0,8 DEVEMOS REPETIR O EXAME! A tomografia de tórax é um exame que permite identificar as áreas de enfisema pulmonar, mas influencia pouco na conduta terapêutica, exceto na decisão cirúrgica de remoção de volume pulmonar onde a presença do enfisema é bastante grave. O exame ainda serve para descartar outros diagnósticos como pneumonia, bronquiectasias ou CA de pulmão. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 6 DIAGNÓSTICO DA DPOC Os pacientes com DPOC apresentam baixa reserva pulmonar o que frente a um quadro infeccioso pode descompensar e intensificar os sintomas com exacerbação da dispneia e insuficiência respiratória. Não podemos esquecer da pneumonia, referente à situação problema apresentada, é uma importante infecção que descompensa o paciente. Desse modo, a identificação e o tratamento precoce da doença infecciosa deve ser feita imediatamente. Para que possamos classificar o paciente utilizamos o guideline de GOLD que conjuga os dados da intensidade dos sintomas (CAT e mMRC) e o grau de obstrução das vias aéreas. Como médicos devemos sempre considerar as comorbidades que os pacientes apresentam, pois isso pode influenciar na nossa terapêutica, sendo ela individualizada. O CAT é uma tabela completa que permite avaliar a sintomatologia do paciente de forma mais abrangente, na sua ausência podemos utilizar a tabela mMRC. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 7 TRATAMENTO O principal tópico para início da terapêutica é convencer o paciente a cessar o tabagismo. Isso porque, em termos fisiológicos é notado o declínio do VEF1 com o avançar da idade, sendo o tabagismo o principal indutor de piora desse declínio. Quando a intervenção é mais rápida os valores de VEF1 retornam ao normal após a interrupção do tabagismo. Em um estágio mais avançado o retorno da função pulmonar não é observado, mas em contra partida a função fica estável. Vale lembrar que o tratamento medicamentoso só deve ser indicado para os pacientes que desejam parar de fumar ou na gestação. (tratamento medicamentoso feito com reposição de nicotina – goma de mascar, pastilhas e adesivos; bupropiona – ISRS; e vereniclina – agonista dos receptores nicotínicos). Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 8 TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO O tratamento fundamental é cessar o tabagismo como foi dito acima, bem como educar o paciente para o auto manuseio da doença. Devemos fomentar que o paciente adquira habilidade no uso correto das drogas, consiga monitorizar os sintomas (sinais de alarme), tenha capacidade de modificar a dose (evitar a progressão da doença e o risco de exacerbação) e adoção de um estilo de vida saudável. Dispomos ainda de programas de reabilitação pulmonar (motivação para cessas tabagismo, acompanhamento psicológico), enfoque a fisioterapia respiratória, para os grupos B, C e D, associado a vacinação contra influenza, pneumococo, dTpa e COVID-19. Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 9 A oxigenoterapia domiciliar pode ser uma ferramenta importante nesse tratamento (lembrar que cessar o tabagismo e fornecer oxigênio são medidas importantíssimas). Pacientes devem fazer uso de > 15 horas/dia de oxigênio suplementar a partir dos critérios da sua gasometria. O objetivo dessa suplementação deriva em manter a saturação ≥ 90% com uso mínimo (1 -3 litro/min). Para se beneficiar dessa medida os pacientes devem manifestar dispneia aos esforços. Pacientes que apresentam apneia obstrutiva do sono podem também se beneficiar de suporte ventilatório com ventilação não invasiva. A cirurgia de redução do volume pulmonar serve como medida não farmacológica reservada para situações em que o paciente apresenta uma hiperinsuflação pulmonar sintomática e refratário ao tratamento medicamentoso. Tal intervenção visa aumentar a sobrevida do paciente, sendo avaliado através da TC de tórax. O avanço das técnicas permite o tratamento pneumoredutor pela via broncoscópica com termoablação pulmonar eliminando apenas segmentos pulmonares danificados. Outra alternativa é o transplante de pulmão o que não apresenta evidência de aumentar a sobrevida do paciente. EXACERBAÇÃO DA DPOC Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 10 Matheus dos Santos Correia UniFG – Medicina (Rodízio de Saúde Mental e do Idoso) 11
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