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1 APOSTILA DE DIREITO CONSTITUCIONAL Focada no concurso UFRJ – 2023 Prof.ª Roberta da Costa Santos 2 Sumário Capítulo 1 – Dos princípios fundamentais .................................................................................. 3 1.1 O art. 1º da Constituição da República Federativa do Brasil ...................................... 3 1.1.1 República ................................................................................................... 4 1.1.2 Federação .................................................................................................. 4 1.1.3 Democracia ................................................................................................. 6 1.2 O art. 2º da Constituição da República Federativa do Brasil ........................................ 8 1.3 O art. 3º da Constituição da República Federativa do Brasil ........................................ 9 1.4 O art. 4º da Constituição da República Federativa do Brasil ...................................... 10 Capítulo 2 – Dos Direitos e Garantias Fundamentais (teoria geral) ...........................................11 2.1 Diferença entre Direitos Humanos e Direitos Fundamentais.....................................12 2.2 Diferença entre Direitos e Garantias Fundamentais..................................................12 2.3 Principais características dos Direitos Fundamentais ..............................................12 2.4 Gerações ou dimensões dos Direitos Fundamentais.................................................13 2.5 Dos Direitos Individuais e Coletivos..........................................................................14 2.5.1 Destinatários dos Direitos e das Garantias previstos na Constituição..........15 2.6 Direitos sociais ........................................................................................................47 2.7 Direitos de Nacionalidade ........................................................................................56 2.8 Direitos Políticos .........................................................................................................................63 2.8.1 Direito ao sufrágio.......................................................................................63 2.8.2 Perda e suspensão dos direitos políticos.....................................................70 2.9 Partidos Políticos .....................................................................................................71 Capítulo 3 – Da Organização Político-administrativa ................................................................72 Capítulo 4 – Da Ordem social - educação ..................................................................................74 3 Capítulo 1 – Dos Princípios Fundamentais Vários são os princípios presentes no texto constitucional. Quanto a eles, é importante destacar, primeiramente, que são considerados normas jurídicas, normas constitucionais e, como tais, são dotados de normatividade jurídica e, portanto, de eficácia. No que diz respeito aos Princípios Fundamentais, presentes no primeiro Título da Constituição, nos artigos 1º ao 4º, o professor Flávio Martins assevera que: “A Constituição de 1988 é (...) uma constituição principiológica, diante do elevado número de princípios constitucionais nela presente. Todavia, no Título I, os princípios que ali se encontram são “fundamentais”. Fundamento, do latim fundamentum, significa base, alicerce. Portanto, os primeiros princípios previstos na Constituição foram tidos pelo constituinte originário como os mais importantes, os que servem para todo o ordenamento jurídico-constitucional”. Assim, percebe-se que os Princípios Fundamentais são as características essenciais de nosso Estado e representam os valores que orientam suas escolhas políticas. Como mencionado anteriormente, o Título I da Constituição compõe-se de quatro artigos que tratam dos seguintes assuntos: 1.1 O art. 1º da Constituição da República Federativa do Brasil O art. 1º da Constituição de 1988 é bastante esclarecedor, tendo em vista que já começa nos apresentando o nome oficial do Estado brasileiro: Com base na leitura desse artigo, é possível conhecermos a nossa forma de governo (República), assim como a nossa forma de estado (Federação), sobre os quais falaremos a seguir. Antes de examinarmos, em separado, essas características que marcam a organização do nosso Estado, é importante observar nossa organização político-administrativa prevista no artigo 18 da Constituição: art. 1º - fundamentos da República; art. 2º - separação dos poderes; art. 3º - objetivos da República; art. 4º - princípios que regem as relações internacionais. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) Art. 18 A organização político-administrativa da república Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição. 4 Em decorrência desses dois artigos (1º e 18), pode-se extrair as seguintes características iniciais: Vamos, a partir de agora, estudar isoladamente cada uma dessas características. 1.1.1 República República é uma palavra que vem do latim res publica e significa coisa pública. Trata-se de forma de governo por meio da qual o governante, escolhido pelo povo, chega ao poder por meio de eleições periódicas, exerce um mandato temporário e tem o dever de prestar contas (responsabilidade) por seus atos de governo, tendo em vista que é um gestor da coisa pública. A República se opõe à Monarquia, outra forma de governo. Veja, a seguir, as características que diferenciam uma da outra. A título de exemplo, observe o caso da nossa República: o Presidente da República adquire o poder por meio de eleições, exerce esse poder por um período determinado (quatro anos), representa o povo brasileiro e responde perante este pelos seus atos de governo (a própria Constituição define os crimes de responsabilidade do Presidente da República e estabelece o procedimento para perda do seu cargo, por meio do impeachment, conforme os artigos 85 e 52, respectivamente). 1.1.2 Federação O Brasil é uma Federação desde a Constituição de 1891. Entende-se a Federação (ou a Forma Federativa de Estado) como a união de vários estados, cada qual gozando de autonomia. REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL Forma de Governo é a República; Forma de Estado é a Federação; Regime de Governo (ou Político) é a Democracia; Entes federativos: União, Estados, Distrito Federal e Municípios (todos dotados, apenas, de autonomia (nenhum dos entes possui soberania, somente a Federação possui soberania). REPÚBLICA ❖ eletividade ❖ temporariedade ❖ responsabilidade MONARQUIA ❖ hereditariedade ❖ vitaliciedade ❖ irresponsabilidade 5 No entendimento de Celso Ribeiro Bastos, “a Federação é a forma de Estado pela qual se objetiva distribuir o poder, preservando a autonomia dos entes políticos que a compõem”. Dessa forma, os entes federativos possuem capacidade para se autolegislar e se autoadministrar. A Federação opõe-se ao Estado Unitário, uma vez que esse último possui um comando central único, ainda que descentralizado administrativa e / ou politicamente. Vale ressaltar que a Federação é considerada cláusula pétrea (art. 60, § 4º, I), não sendo possível qualquer proposta de Emenda à Constituição tendente a aboli-la. Ademais, a previsão do princípio da indissolubilidade da Federação, expresso no art. 1º da CRFB/88, veda o direito de secessão, ou seja, o direito de separaçãodo território brasileiro. Apesar de cada Estado federativo apresentar características peculiares, inerentes às suas realidades locais, há pontos em comum que podem ser sistematizados. Assim, segue uma tabela com as principais características da Federação: E por último, mas não menos importante, é importante destacar que os Territórios não são entes federados, não são entes políticos dotados de autonomia. Com efeito, os Territórios são meras divisões territoriais pertencentes à União. Ainda assim, eles podem ser divididos em Municípios e possuem Câmara Territorial, com membros eleitos e competência deliberativa própria, conforme previsto na Constituição no art. 33, §§ 1º e 3º. Fique atento (a), pois a Banca da UFRJ pode colocar os Territórios Federais como integrantes da Federação e, acabamos de explicar, eles NÃO são considerados entes políticos, mas sim, descentralizações administrativas pertencentes à União. Veja como esse assunto já foi cobrado em prova: As entidades federativas são autônomas e se unem para formar (através de uma Constituição) a Federação, que é dotada de Soberania. A formação da Federação Brasileira se deu por um movimento centrífugo ou por segregação. Isso porque, no passado, o Estado brasileiro era centralizado (um único poder), tendo se desmembrado para a formação dos Estados membros. Na federação não existe o direito de secessão (princípio da indissolubilidade do vínculo federativo), porque o pacto federativo é indissolúvel e, além disso, é cláusula pétrea (art. 60, § 4º, I), não podendo sofrer emenda tendente a aboli-la. Há igualdade jurídica entre os estados membros, pois não existe hierarquia entre a União, os Estados, os municípios e o Distrito Federal (há apenas uma repartição de competências prevista na Constituição). Há um órgão representativo dos Estados-membros (Senado Federal). A respeito da organização político-administrativa da República Federativa do Brasil, é correto afirmar que ela é formada pela união: a) indissolúvel dos Estados e dos Municípios; b) indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; c) dissolúvel dos Estados, dos Municípios e dos Territórios; d) indissolúvel dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios; e) dissolúvel dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios. Gabarito: Letra B 6 1.1.3 Democracia Democracia é o regime político em que a soberania é exercida pelo povo. A palavra democracia tem origem no grego demokratía, que é composta por demos (que significa povo) e kratos (que significa poder). Neste sistema político, o poder é exercido pelo povo através do sufrágio universal (que se materializa no direito de votar e de ser votado). O Estado Democrático de Direito assegura, também, a garantia de uma sociedade pluralista, em que todas as pessoas se submetem às leis e ao Direito que, por sua vez, são criados pelo povo, por meio de seus representantes. A lei e o Direito, nesse Estado, visam a garantir o respeito aos direitos fundamentais, assegurando a todos uma igualdade material, ou seja, condições materiais mínimas a uma existência digna. No Brasil vige a democracia semidireta ou participativa, na qual o povo tanto exerce o poder diretamente quanto por meio de representantes, como previsto no § único do art. 1º: Trata-se de um sistema híbrido, no qual existe uma combinação de representação política (democracia indireta) com mecanismos da democracia direta, como por exemplo, o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. 1.1.4 Fundamentos da República Evidenciam-se, no art. 1º da CRFB/88, os Fundamentos da República, previstos nos incisos I a V. São eles: a) soberania, b) cidadania, c) dignidade da pessoa humana, d) valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e e) pluralismo político. É importante ressaltar que, como estes são a base principiológica sobre a qual será construído todo o país, eles são conhecidos como metaprincípios, ou seja, princípios dos quais derivarão todos os outros princípios e regras constitucionais. Para facilitar a sua compreensão e garantir a sua assimilação desse conteúdo, vamos esquematizar os princípios fundamentais a seguir e discorrer, ainda que brevemente, sobre cada um deles. FUNDAMENTOS DA REPÚBLICA Art. 1º, I ao V, CRFB/88 SOberania CIdadania DIgnidade da pessoa humana VAlores sociais do trabalho e da livre iniciativa PLUralismo político Art. 1º (...) Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. SO CI DI VA PLU 7 Essa é a base principiológica sobre a qual será construído o país. Assim, eles são considerados metaprincípios, dos quais decorrerão todos os outros princípios e regras constitucionais. Vamos explicar, de forma objetiva, cada um deles, na medida em que há a possibilidade de a Banca da UFRJ explorar esses conceitos de forma isolada. a) Soberania A soberania consiste em um poder político supremo, formado pela união da independência, no plano internacional, e da supremacia, no plano nacional, ou seja, o ente soberano não está limitado por nenhum outro na ordem interna nem na ordem externa, pois não precisa seguir regras que não sejam voluntariamente aceitas. b) Cidadania Há uma visão estrita e uma visão ampla de cidadania. Na visão estrita, cidadania é a possibilidade de os indivíduos interferirem nas decisões políticas do Estado. Dessa forma, cidadãos seriam aqueles detentores de direitos políticos (capacidade de votar e de ser votado; participação em plebiscitos e referendos). Por sua vez, na visão ampla de cidadania, esta corresponde à titularidade de direitos fundamentais, bem como de deveres perante os semelhantes. c) Dignidade da pessoa humana É princípio de valor supremo em nosso Estado com influência e eficácia sobre todo o ordenamento jurídico. Ele atrai para si o conteúdo de todos os direitos fundamentais, impondo ao Estado o respeito à dignidade da pessoa em todos os seus aspectos, ou seja, há um dever de abstenção (dever de não-interferência ou de não-intromissão) por parte do Estado e também um dever de atuação positiva (dever de prestação), que se materializa com a efetivação de direitos sociais, econômicos e culturais que promovam a liberdade e a igualdade materiais. d) Valores sociais do trabalho e da livre iniciativa Visa a criar uma relação de harmonia e de cooperação entre o capital e o trabalho. Com efeito, no mesmo dispositivo, foi mantida a ponderação entre os valores sociais do trabalho (e a necessidade de proteção constitucional dos direitos dos trabalhadores) e a importância da livre iniciativa, da iniciativa privada, do capitalismo. Dessa forma, entende-se que um não pode sobrepor-se ao outro, tendo como principal objetivo alcançar a justiça social. e) Pluralismo político Decorre do princípio democrático e impõe a opção por uma sociedade plural. É garantia da liberdade de convicção filosófica e política e, também, a possibilidade de organização e participação em partidos políticos. Ressalte-se, todavia, que pluralismo político não se confunde com pluripartidarismo (pluralismo de partidos), que é apenas uma das espécies de sua manifestação. Com isso, um sistema plural é aquele que aceita, reconhece e tolera a existência de diferentes ideias e cultura de costumes. Fique atento (a) porque esses assuntos podem aparecer em prova de duas formas: pode ser cobrada a simples “decoreba”, ou seja, a banca da UFRJ pode explorar apenas a literalidade 8 dos incisos, ou ela pode elaborar uma questão envolvendo o conceito sobre algum desses fundamentos, como na questão a seguir: 1.2 O art. 2º da Constituição da República Federativado Brasil O art. 2º da CRFB/88 estabelece o princípio da tripartição dos Poderes no Brasil. Segundo o referido artigo: O objetivo dessa separação é evitar que o poder se concentre nas mãos de uma única pessoa, para que não haja abuso, como o ocorrido no Estado Absolutista, por exemplo, em que todo o poder se concentrava nas mãos do rei. E, além disso, a independência entre os Poderes é limitada pelo sistema de freios e contrapesos (checks and balances). Esse sistema prevê a interferência legítima de um Poder sobre o outro, nos limites estabelecidos pela Constituição. É o que acontece, por exemplo, quando o Congresso Nacional fiscaliza os atos do Poder Executivo ou o judiciário declara a inconstitucionalidade de alguma lei. Vale ressaltar também que a independência entre os Poderes não significa exclusividade no exercício das funções que lhe são atribuídas, mas, sim, predominância no seu desempenho. Assim, ainda que determinadas funções sejam exercidas, predominantemente, pelos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário (funções típicas), elas também podem ser desempenhadas pelos outros Poderes de modo subsidiário (funções atípicas), com vistas a garantir a sua própria autonomia e independência. Vamos agora tecer breves comentários sobre cada um desses poderes e de suas funções típicas e atípicas, pois esses assuntos vêm caindo muito em prova e já foram cobrados pela banca da UFRJ. Observe o quadro a seguir: O voto é uma das principais armas da Democracia, pois permite ao povo escolher os responsáveis pela condução das decisões políticas de um Estado. Quem faz mau uso do voto deixa de zelar pela boa condução da política e põe em risco seus próprios direitos e deveres, o que afeta a essência do Estado Democrático de Direito. Dentre os fundamentos da República Federativa do Brasil, expressamente previstos na Constituição, aquele que mais adequadamente se relaciona à ideia acima exposta é a: a) soberania. b) prevalência dos direitos humanos. c) cidadania. d) independência nacional. e) dignidade da pessoa humana. Gabarito: Letra C Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. 9 PODERES FUNÇÕES TÍPICAS (exercidas com preponderância) FUNÇÕES ATÍPICAS (exercidas secundariamente) Executivo Pratica atos de chefia de estado, chefia de governo e atos de administração Natureza legislativa: O Presidente da República, por exemplo, adota medida provisória, com força de lei (Art. 62); Natureza jurisdicional: O Executivo julga, apreciando defesas e recursos administrativos. Legislativo Legislação; fiscalização contábil, financeira, orçamentária e patrimonial do executivo. Natureza executiva: dispõe sobre sua organização, provendo cargos, concedendo férias, licenças a servidores etc.; Natureza jurisdicional: o Senado julga o presidente da república nos crimes de responsabilidade (Art. 51, 1). Judiciário Julgar (função jurisdicional), dizendo o direito no caso concreto e dirimindo os conflitos que lhe são levados, quando da aplicação da lei. Natureza legislativa: edita regime interno de seus tribunais (Art. 96, I, “a”); Natureza executiva: Administra, v.g., ao conceder licenças e férias aos magistrados e serventuários (art. 96, I, “f”). 1.3 O art. 3º da Constituição da República Federativa do Brasil O Constituinte originário estabeleceu no art. 3º da CRFB/88 os objetivos fundamentais da República, que são verdadeiras metas a serem alcançadas pelo Estado. Consoante o disposto no referido artigo: Diferentemente dos fundamentos, previstos no art. 1.º, os objetivos são normas de conteúdo principiológico e programático, pois exigem uma atuação positiva (um dever de fazer) do Estado. Assim, elas não produzem todos os efeitos imediatamente, mas devem ser vistas Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. CON GA ER RE PRO (todos verbos) 10 como mandamentos de otimização, ou seja, o Estado deve cumprir o máximo possível desses objetivos, dentro dos limites fáticos, jurídicos e orçamentários. Um exemplo dessa atuação positiva foi a criação de reserva de vagas para negros nas universidades, tema polêmico, mas já debatido e decidido pelo STF (Supremo Tribunal Federal), como podemos ver na decisão abaixo: 1.4 O art. 4º da Constituição da República Federativa do Brasil O art. 4º, reservado aos princípios que regem as relações internacionais, é uma inovação da Constituição de 1988. Este artigo dispõe que: Trechos dos votos de alguns Ministros do STF Todos os ministros seguiram o voto do relator, ministro Lewandowski. Primeiro a votar na sessão plenária desta quinta-feira (26), na continuação do julgamento, o ministro Luiz Fux sustentou que a Constituição Federal impõe uma reparação de danos pretéritos do país em relação aos negros, com base no artigo 3º, inciso I, da Constituição Federal, que preconiza, entre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Na sequência da votação, o ministro Cezar Peluso afirmou que é fato histórico incontroverso o déficit educacional e cultural dos negros, em razão de barreiras institucionais de acesso às fontes da educação. Assim, concluiu que existe “um dever, não apenas ético, mas também jurídico, da sociedade e do Estado perante tamanha desigualdade, à luz dos objetivos fundamentais da Constituição e da República, por conta do artigo 3º da Constituição Federal”. Esse dispositivo preconiza uma sociedade solidária, a erradicação da situação de marginalidade e de desigualdade, além da promoção do bem de todos, sem preconceito de cor. Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I - independência nacional; II - prevalência dos direitos humanos; III - autodeterminação dos povos; IV - não-intervenção; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X - concessão de asilo político. 11 Os dez incisos e seu parágrafo único, previstos no art. 4º da Constituição, demonstram os valores e a tradição do Brasil nas suas relações com outros Estados. Na maioria das vezes, a banca costuma cobrar a literalidade da lei em questões de provas. Veja como isso já apareceu em prova: Nessa etapa final do estudo dos Princípios Fundamentais (arts. 1º ao 4º), é bom salientar como esses assuntos costumam cair nas provas. Em se tratando da Banca da UFRJ, além de cobrar situações hipotéticas com os temas abordados, o examinador também tenta confundir os fundamentos (So Ci Di Va Plu), previstos no art. 1º, com os objetivos (Con Gar Er Re Pro), previstos no artigo 3º, e também os misturando com os princípios que regem as relações internacionais, expressos no art. 4º da Constituição, os quais acabamos de estudar. “CONDE PRESO NÃO REINA, COOPERA IGUAL.” CONcessão de asilo político DEfesa da paz PREvalência dos direitos humanos SOlução pacífica dos conflitos NÃO-intervenção REpúdio ao terrorismo e ao racismo INdependência nacional Autodeterminação dos povosCOOPERAção entre os povos para o progresso da humanidade IGUALdade entre os Estados Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino- americana de nações. Representa exceção aos princípios que regem as relações internacionais do Brasil a: A) solução pacífica dos conflitos. B) vedação de asilo político. C) defesa da paz. D) não-intervenção. E) autodeterminação dos povos. Gabarito: Letra B 12 Capítulo 2 – Dos Direitos e Garantias Fundamentais (teoria geral) A Constituição, em seu Título II, aborda os chamados Direitos e Garantias Fundamentais, regulados entre os artigos 5º ao 17. Trata-se de tema de grande relevância quando se estuda a Constituição, pois este se refere a um conjunto de dispositivos destinados a estabelecer o conjunto de normas que garantem a convivência pacífica e digna de uma sociedade. Antes de passarmos ao estudo desses artigos, de forma isolada, é importante destacar algumas características gerais envolvendo todos esses direitos e garantias, visto que essas informações têm sido frequentemente cobradas em prova. 2.1 Diferença entre Direitos Humanos e Direitos Fundamentais Embora uma parte da doutrina considere as expressões Direitos Humanos e Direitos Fundamentais como sinônimas, é possível fazer uma distinção entre elas. Direitos Humanos são aqueles conferidos aos seres humanos previstos em tratados e convenções internacionais, que resguardam a pessoa humana de uma série de interferências que podem ser praticadas pelo Estado ou por outras pessoas, bem como obrigam o Estado a realizar prestações mínimas que assegurem a todos uma existência digna. Os Direitos Fundamentais, por sua vez, são os direitos humanos que foram incorporados à ordem interna, ou seja, à Constituição. 2.2 Diferença entre Direitos e Garantias Fundamentais Direitos Fundamentais são normas de conteúdo declaratório. A CRFB/88 assegura, por exemplo, o direito à vida (art. 5º, caput), à liberdade de manifestação do pensamento (art. 5º, IV), à liberdade de religião (art. 5º, VI), entre outros. Por outro lado, as Garantias Fundamentais são normas de conteúdo assecuratório, ou seja, são instrumentos destinados a garantir, a assegurar os direitos fundamentais. Os remédios constitucionais são exemplos de Garantias Fundamentais. 2.3 Principais características dos Direitos Fundamentais Os Direitos Fundamentais apresentam as seguintes características: C a ra c te rí s ti c a s d o s d ir e it o s f u n d a m e n ta is Historicidade Universalidade Limitabilidade (relatividade) Concorrência Inalienabilidade Imprescritibilidade Vedação ao retrocesso 13 Historicidade – possuem caráter histórico, nascendo com o Cristianismo, passando pelas diversas revoluções e chegando aos dias atuais. Universalidade – são dirigidos a todas as pessoas, sem restrições, independentemente de sua raça, credo, nacionalidade ou convicção política; Limitabilidade ou relatividade – afirma-se que nenhum direito fundamental poderá ser considerado absoluto, sendo que tais direitos deverão ser interpretados e aplicados levando-se em consideração os limites fáticos e jurídicos existentes. Irrenunciabilidade – os Direitos Fundamentais não podem ser renunciados de maneira definitiva. Concorrência – podem ser exercidos vários Direitos Fundamentais ao mesmo tempo; Inalienabilidade – como são conferidos a todos, são indisponíveis; não se pode aliená-los por não terem conteúdo econômico-patrimonial. Imprescritibilidade – os Direitos Fundamentais não prescrevem, ou seja, não se perdem com o decurso do tempo. São permanentes. Vedação ao retrocesso – a aquisição dos direitos fundamentais não pode ser objeto de um retrocesso, ou seja, uma vez estabelecidos os direitos fundamentais, não se admite o seu retrocesso visando a sua limitação ou diminuição. 2.4 Gerações ou dimensões dos Direitos Fundamentais Segundo Marcelo Novelino, os direitos fundamentais não surgiram simultaneamente, mas em períodos distintos conforme a demanda de cada época, tendo essa consagração progressiva e sequencial, nos textos constitucionais, dado origem à classificação em gerações, ou como prefere a doutrina mais atual, em dimensões, visto que uma nova dimensão não abandonaria as conquistas da dimensão anterior e, assim, essa expressão se mostraria mais adequada. Em um primeiro momento, anunciavam-se os direitos de primeira, de segunda e de terceira dimensão, com base nos lemas da Revolução Francesa: liberdade, igualdade e fraternidade. Mais adiante, estes iriam evoluir para uma quarta e uma quinta dimensão. a) direitos de primeira dimensão Os direitos fundamentais de primeira dimensão são os ligados ao valor liberdade: direitos civis e políticos. São direitos individuais com caráter negativo, tendo em vista que nesses direitos o Estado tem o dever principal de não fazer, de não agir, de não interferir na liberdade pública do indivíduo. Ex.: O Estado não pode tirar a vida, a propriedade, a liberdade de um indivíduo indevidamente, a não ser nos casos permitidos por lei. b) direitos de segunda geração Ligados ao valor igualdade, os direitos fundamentais de segunda dimensão são os direitos sociais, econômicos e culturais. São direitos de titularidade coletiva e com caráter positivo, pois exigem atuações do Estado. Ex.: Direito à saúde, à educação, ao trabalho etc. c) direitos de terceira geração Os direitos fundamentais de terceira geração, ligados ao valor fraternidade ou solidariedade, são os relacionados ao desenvolvimento ou progresso, ao meio ambiente, ao consumidor, à autodeterminação dos povos, bem como ao direito de propriedade sobre o 14 patrimônio comum da humanidade e ao direito de comunicação. São direitos transindividuais, em rol exemplificativo, destinados à proteção do gênero humano. d) direitos de quarta geração Introduzidos no âmbito jurídico pela globalização política, os direitos de quarta geração compreendem os direitos à democracia, à informação e ao pluralismo. e) direitos de quinta geração Por fim, consoante parte da doutrina, os direitos de quinta dimensão contemplam o direito à paz (universal) e os direitos virtuais ou cibernéticos. Agora, após ao estudo das principais características dos Direitos e Garantias Fundamentais, passaremos a análise sistemática dos direitos e garantias fundamentais, começando pelos Direitos Individuais e Coletivos previstos no art. 5º e seus incisos e parágrafos. 2.5 Dos Direitos Individuais e Coletivos O primeiro capítulo do Título II da CRFB/88 trata dos Direitos e Garantias Fundamentais. Este capítulo é formado por apenas um artigo: o bem conhecido artigo 5º. Esse artigo, embora trate primordialmente de direitos individuais, tais como: vida, liberdade, honra, propriedade, etc., aborda também direitos coletivos, como tutela constitucional do consumidor, mandado de segurança coletivo, ação popular para defesa do patrimônio público etc. Analisemos o que prevê o art. 5º da CRFB/88: O art. 5º, caput, da Constituição Federal começa afirmando que “todos são iguais perante à lei”. Trata-se do chamado princípio da igualdade ou da isonomia, que é um princípio jurídico informador de toda a ordem constitucional. Ele pode ser analisado sob alguns aspectos, segundo jurisprudência do próprio STF: a) da igualdade na lei A igualdade na lei – que opera numa fase de generalidade puramente abstrata – constitui exigência destinada ao legislador que, no processo de elaboração das leis, nelas não poderá incluir fatores de discriminação, responsáveis pela ruptura da ordem isonômica. b) da igualdade perante a lei (ou da igualdade formal) Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: 15 A igualdade perante a lei, contudo, pressupondo a lei já elaborada, traduz imposição destinada aos demais poderes estatais, que, na aplicação da norma legal, não poderão subordiná-la a critérios que ensejem tratamento seletivo ou discriminatório. Com efeito, consiste em dar a todos idêntico tratamento, não importando a cor, a origem, a nacionalidade, o gênero ou a situação financeira. No entendimento do Professor Flávio Martins: “A igualdade formal em um país de “elevada desigualdade real”, em vez de igualar, apenas reforça a desigualdade que existe na vida. Dizer que todos devem lutar com suas armas é injusto quando as “armas” são de calibres tão diversos. Vejamos um exemplo: historicamente, os vestibulares das universidades públicas brasileiras foram perfeitos exemplos de igualdade formal. Não importando o perfil dos candidatos (sua origem, cor, condição social etc.), as condições de acesso sempre foram idênticas. Qual a conclusão histórica disso? Aos cursos universitários mais concorridos, somente os mais ricos, os que tiveram uma melhor educação básica (que, no Brasil, infelizmente, encontra-se no ensino privado, e não no público), têm acesso. Quando um pobre, egresso do ensino público, ingressa num desses cursos, torna-se “capa de jornal”, exemplo a ser seguido, a vitória da meritocracia. Segundo o INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), apenas 2,66% dos concluintes dos cursos de medicina em 2010 eram negros ou pardos. Realmente, séculos de igualdade formal deram ensejo a uma desigualdade real de gigantescas proporções. c) da igualdade material Denominada por alguns de igualdade real ou substancial, a igualdade material tem por finalidade igualar os indivíduos, que essencialmente são desiguais. Sabe-se que as pessoas apresentam diversidades que, muitas vezes, não são superadas quando submetidas ao império de uma mesma lei, o que aumenta ainda mais a desigualdade existente no plano fático. Nesse sentido, faz-se necessário que o legislador, atentando para essa realidade, leve em consideração os aspectos diferenciadores existentes na sociedade, adequando o direito às peculiaridades dos indivíduos. Diante do que acabamos de discutir, a igualdade a ser buscada pelo Estado, prevista no art. 5º, caput, da CRFB/88, é a igualdade material, cuja origem teórica remonta a Aristóteles. Assim, a igualdade material consiste em dar aos desiguais um tratamento desigual, na medida da sua desigualdade. No Brasil, um dos primeiros a pregar esse tipo de igualdade foi Ruy Barbosa, num discurso proferido na capital paulista, intitulado “Oração aos Moços”: “a regra da igualdade não consiste senão em aquinhoar desigualmente aos desiguais na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade”. 2.5.1 Destinatários dos Direitos e das Garantias previstos na Constituição Ainda com relação ao caput do art. 5º, é preciso atentar para o fato de que apesar da referência apenas a “brasileiros e estrangeiros residentes no país”, há consenso na doutrina e 16 na jurisprudência do STF de que eles alcançam também qualquer pessoa física que se encontre em território nacional, mesmo que seja estrangeira e residente no exterior. Por fim, vale lembrar também, que a pessoa jurídica (nacional ou estrangeira) também é titular de direitos e garantias naquilo que couber, segundo o entendimento dominante. Depois de estudarmos o caput do art. 5º, vamos, a partir de agora, discorrer sobre os seus incisos mais importantes: Princípio da igualdade ou da isonomia Apesar do princípio da igualdade, expressamente previsto no art. 5º, caput, da CRFB/88, o constituinte originário entendeu ser necessário o estabelecimento de um inciso específico para a igualdade de gênero: Assim, esse inciso reforça o princípio segundo o qual todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza, mas dessa vez com ênfase na igualdade entre os sexos, afastando assim qualquer forma de discriminação entre homens e mulheres. Contudo há que se destacar que homens e mulheres não têm tratamento idêntico por parte do Estado, que poderá dar tratamento diferenciado, na medida em que os gêneros se desigualam. (Imagem retirada de: https://luchtenbergeguilherme.jusbrasil.com.br/artigos/485455199/i-legalidade-da-diferenciacao-de- preco-entre-homens-e-mulheres. Acesso em: 25/02/2022) Segundo a jurisprudência do STF (RE 227.114/SP, 2012), o foro especial para a mulher nas ações de separação judicial não ofende o princípio da isonomia entre homens e mulheres ou da igualdade entre os cônjuges. Isso porque não se trata de um privilégio estabelecido em favor das mulheres, mas de uma norma que visa a estabelecer um tratamento menos gravoso à parte que, em regra, se encontrava e, ainda se encontra, em situação menos favorável econômica e financeiramente. Princípio da legalidade Um dos princípios mais importantes de nossa Constituição, o princípio da legalidade, está insculpido no art. 5º, II, da Constituição Federal, que estabelece: Art. 5º (...) I. homens e mulheres são iguais nos termos desta Constituição; 17 É preciso atentar para o fato de que o princípio da legalidade tem uma aplicação diferenciada para o Estado e para os indivíduos em geral. De fato, o Estado tem o dever de fazer o que a lei impõe (art. 37 da CRFB/88). Podemos citar como exemplo a licitação feita pelo poder público. Neste caso, o princípio da legalidade possui caráter absolutamente vinculado, reduzindo ao mínimo a liberdade do administrador. Por sua vez, o princípio da legalidade para o particular tem aplicação diversa: o particular pode fazer o que a lei não proíbe. A título de ilustração, os estabelecimentos comerciais podem se recusar a aceitar cheques. A conduta não é proibida por lei, que só exige como forma de pagamento o dinheiro em moeda corrente. Proibição da tortura O constituinte originário não se limitou a fixar a dignidade da pessoa humana como um dos principais fundamentos da República Federativa do Brasil. No inciso III do art. 5º dispôs que: A Regra Constitucional condena, e, mais do que isso, veda a prática da tortura e o tratamento desumano ou degradante aos indivíduos. Por tortura, deve-se entender toda a prática de medidas de cunho físico ou mental que tenham potencial de ofender a integridade humana. O tratamento digno e a prática da tortura são noções diametralmente opostas. Este princípio é voltado para todos os integrantes de nossa sociedade e, em especial, para alguns agentes públicos, na medida em que veda às autoridades policiais o uso indiscriminado da força, da tortura, física ou mental, para alcançar os seus objetivos institucionais de combate à violência. (Imagem retirada de: https://canalcienciascriminais.jusbrasil.com.br/artigos/768504341/tortura-em-presidios. Acesso em: 25/02/2022) Art. 5º (...) II. ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; Art. 5º (...) III. ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante; 18 Com base nesse inciso, o STF editou a súmula vinculante nº 11, muito cobrada em concursos públicos: Liberdade de manifestação do pensamento Sem sombra de dúvidas, um dos direitos fundamentais mais importantes está previsto no art. 5º, IV, da CRFB/88: Como se pode observar, a liberdadede manifestação do pensamento é, ao mesmo tempo, um direito (previsto na primeira parte do inciso) e uma garantia fundamental (prevista na primeira parte do inciso). Com efeito, a primeira parte (“é livre a manifestação do pensamento”) é um direito individual ou direito negativo, ou seja, o Estado não poderá, em regra, interferir em nossa liberdade de expressão. Trata-se de um direito de primeira dimensão, conforme já estudamos no capítulo 1. A segunda parte do inciso (“sendo vedado o anonimato”) é uma garantia constitucional destinada a proteger uma série de outros direitos fundamentais, tais como honra e intimidade. Assim, tal liberdade, como qualquer outra, não se dá de maneira absoluta, havendo limites que impossibilitam manifestações de conteúdo imoral e / ou que venham a implicar qualquer ilicitude. Ademais, de acordo com a jurisprudência do STF, é vedado o acolhimento de denúncias anônimas. Estas podem servir de base para gerar investigação pelo Poder Público, mas jamais poderão ser causa única de exercício de atividade punitiva pelo Estado. Direito de resposta O inciso V do art. 5º da CRFB/88 apresenta as consequências civis e constitucionais do uso inadequado ou desmedido do art. 5º, IV (a liberdade de manifestação do pensamento). Consoante este inciso: Súmula Vinculante 11 Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado. Art. 5º (...) IV. é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. Art. 5º (...) V. é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; 19 Conforme já mencionado, este inciso encontra-se diretamente ligado ao inciso IV (acima estudado), tornando-se uma verdadeira garantia para coibir possíveis abusos praticados pela manifestação do pensamento, possibilitando a responsabilização na esfera cível (indenização) e também na esfera criminal por atos caluniosos ou difamatórios. E, é claro, sem contar também com o direito de resposta proporcional ao agravo. Liberdade de Consciência e de Crença Consoante o disposto no art. 5º, VI, da Constituição Federal, A liberdade de consciência equivale à liberdade de pensamento. Ter liberdade de consciência significa que ninguém poderá ser cerceado por defender uma ideologia diversa da que defende a maioria (por exemplo: ser comunista numa sociedade que majoritariamente defende o capitalismo, ser defensor dos direitos sociais numa sociedade que majoritariamente defende o liberalismo etc.). A liberdade de crença, por sua vez, consiste na liberdade de consciência, só que voltada para o aspecto religioso, transcendental. Ela apresenta dois aspectos diversos: a) positivo: o direito de escolher a própria religião; b) negativo: o direito de não seguir, de não professar qualquer religião. O Estado brasileiro é laico, ou seja, não possui religião oficial, mas isso não afasta o dever que o Governo tem de assegurar o livre exercício das diferentes formas de manifestações religiosas praticadas no país. Ademais, ele também tem o dever de garantir (nos limites da lei) o acesso, aos representantes de cada religião, às entidades de internação coletiva, como por exemplo os presídios. Escusa de consciência O inciso VIII, art. 5º da Constituição Federal apregoa que: Art. 5º (...) VI. é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias; VII. é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva. Art. 5º (...) VIII. ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa fixada em lei. 20 Este inciso traz como regra que ninguém será privado de direitos por motivo de crença ou de convicção política ou filosófica, mas, poderá sim, ser privada de direitos (como exceção) se fizer a chamada “dupla recusa”, ou seja, se recusar a exercer uma obrigação a todos impostas e também se recusar a cumprir prestação alternativa, fixada em Lei. Liberdade de atividade intelectual, artística, científica ou de comunicação Consequência da liberdade de expressão, o inciso IX do art. 5º traz um direito fundamental que é umbilicalmente ligado à dignidade da pessoa humana: Este inciso visa a resguardar a propagação do pensamento no exercício da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, guardando íntima relação com a livre manifestação do pensamento, que está prevista no inciso IV do art. 5º da nossa Constituição. Contudo, como não existem direitos absolutos, a própria Constituição determina que, observados seus limites, a lei poderá restringir a manifestação dessas liberdades. Como exemplo, podemos citar a classificação indicativa de cinemas, teatros e programas de televisão, bem como as restrições à propaganda de produtos fumígenos, bebidas alcoólicas ou medicamentos. Intimidade e vida privada O inciso X do art. 5º da Constituição Federal dispõe que: Quatro são os direitos tutelados pelo art. 5º, X, da CRFB/88: a) intimidade; b) vida privada; c) honra; d) imagem. Ademais, ao final, este inciso prevê uma garantia constitucional de proteção (a indenização por dano material e moral). Art. 5º (...) IX. é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença. Art. 5º (...) X. são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; 21 Ou seja, àquele que se sentir lesado em relação a sua intimidade, vida privada, honra ou imagem é garantido o direito de ingressar com ação judicial para pleitear a devida indenização. Segundo a jurisprudência do STF, quem se dedica à vida pública tem também direito à privacidade, no que diz respeito a fatos íntimos e da vida familiar, contudo, essa privacidade é relativa, uma vez que estes devem prestar contas à sociedade da atuação desenvolvida. Vale ressaltar que não há que se falar em violação da vida íntima ou privada quando na realização de suas funções. Inviolabilidade do domicílio A inviolabilidade domiciliar deriva diretamente do direito à intimidade. Ela está insculpida no inciso XI do art. 5º da CRFB/88: De acordo com esse inciso, “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador…”. Pode-se então formular a seguinte pergunta: o que se entende por casa? Para o STF, o conceito de casa deve ser entendido de forma mais ampla, compreendendo qualquer compartimento habitado ou qualquer aposento coletivo, tais como: quartos de hotel, pensão, motel e hospedaria ou, ainda, qualquer outro local privado não aberto ao público, onde alguém exerce profissão ou atividade, e até mesmo o barco ou o automóvel (incluindo trailers, motor-homes ou a boleia de um caminhão), caso sirvam de morada. Aos analisarmos o conceito de casa é importante destacar que a casa é asilo inviolável, contudo existem exceções a essa inviolabilidade: 1ª exceção – com o consentimento do morador (em qualquer horário) 2ª exceção – Em flagrante delito, desastre ou para prestar socorro (emqualquer horário) 3ª exceção – Com ordem judicial (apenas durante o dia) Sigilo da correspondência e das comunicações O sigilo da correspondência e das comunicações também deriva diretamente do direito à intimidade. Ele está prescrito no inciso XII do art. 5º da CRFB/88: Art. 5º (...) XI. a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial; Art. 5º (...) XII. é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal; 22 Esse inciso prevê quatro formas de comunicação, tidas como invioláveis, a saber: a) correspondência; b) comunicações telegráficas; c) dados; d) comunicações telefônicas. Todavia, a Constituição estabeleceu expressamente uma exceção a esse direito, ao autorizar a quebra do sigilo das comunicações telefônicas, mas para que isso ocorra, alguns requisitos precisam ser observados. São eles: Lei regulamentadora (Lei nº 9.296/96); Investigação criminal ou instrução processual penal; Determinada por ordem judicial Imagem retirada de: https://br.freepik.com/fotos-premium/as-algemas-estao-penduradas-em-uma-grade-de-metal-foto-de-alta- qualidade_19234961.htm. Acesso em: 28/02/2022. Contudo, é sempre bom lembrar que não existem direitos absolutos. Dessa forma, admite- se, também, a interceptação das correspondências e das comunicações telegráficas e de dados, sempre que a norma constitucional esteja sendo usada para acobertar a prática de ilícitos. Isso porque, segundo o próprio entendimento do STF: “a Constituição não pode servir como manto protetor para a pratica de ilicitudes”. Nesse sentido, entende o STF, no julgamento do HC 70.814 que: “a administração penitenciária, com fundamento em razões de segurança pública, de disciplina prisional ou de preservação da ordem jurídica, pode, sempre excepcionalmente, e desde que respeitada a norma inscrita no art. 41, da Lei 7.210/84(Lei de execuções Penais), proceder à interceptação da correspondência remetida pelos sentenciados, eis que a cláusula tutelar da inviolabilidade do sigilo epistolar não pode constituir instrumento de salvaguarda de práticas .” Liberdade de profissão A liberdade de profissão é mais um direito umbilicalmente ligado à dignidade da pessoa humana. Consoante o disposto no art. 5º, XIII, da Constituição Federal, Art. 5º (...) XIII. é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; 23 Tendo em vista que o trabalho corresponde a um ingrediente significativo da vida e da personalidade de cada pessoa, é muito natural que cada indivíduo tenha a liberdade para escolher qual trabalho deseja exercer. Todavia, de acordo com o texto, percebe-se que a Constituição, neste inciso, estabelece uma restrição ao princípio da liberdade profissional (trata-se de uma norma de eficácia contida), quando estabelece o atendimento de certas qualificações profissionais, para condicionar o indivíduo ao regular exercício de determinado trabalho, ofício ou profissão. Diante do exposto, vale ressaltar que essas restrições não poderão ser utilizadas de maneira arbitrária ou desproporcional, devendo se levar em conta o tipo de trabalho que está sendo desempenhado, conforme a própria jurisprudência do STF, abaixo relatada: Assim, regra geral, as leis infraconstitucionais que restringem normas constitucionais devem obedecer a três critérios, quais sejam: a) não podem ferir o núcleo essencial dos direitos fundamentais; b) devem ser razoáveis; c) devem ser proporcionais. Liberdade de informação e o sigilo da fonte O inciso XIV do art. 5º da CRFB/88 traz um direito fundamental não apenas ligado à dignidade da pessoa humana, mas também umbilicalmente relacionado ao Estado Democrático de Direito e à República: a liberdade de informação e o sigilo da fonte. Com efeito, esse inciso dispõe que: Esse inciso deve ser analisado sob dois aspectos: o primeiro é sobre a garantia ao direito de conhecer as informações de interesse público ou privado, através da liberdade de acesso à informação. E o segundo, que é o mais importante, possibilita que jornalistas obtenham informações sem terem que revelar sua fonte, até mesmo no que diz respeito a questões judiciais. Consoante o entendimento do Professor Flávio Martins: “Há profissões cujo exercício diz, diretamente, com a vida, a saúde, a liberdade, a honra e a segurança do cidadão e, por isso, a lei cerca seu exercício de determinadas condições de capacidade. Fora deste terreno, não podemos admitir exceções, porque estaríamos mutilando o regime democrático da Constituição (...), dando à lei ordinária uma força que não deve e não pode ter” (RE 511.961/SP, Rel. Min. GILMAR MENDES) Art. 5º (...) XIV. é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional; 24 “O sigilo de fonte, comumente exercido na atividade jornalística, serve de preservação do direito à informação, do direito de informar e do direito de se informar. Ciente da existência dessa garantia constitucional, qualquer pessoa que seja detentora de uma informação de relevante interesse público, sabe que poderá transmiti-la a um jornalista, sem que sua identidade seja revelada. Essa pessoa, “a fonte da informação”, será mantida sob sigilo”. É importante destacar que, caso alguém se sinta prejudicado pela informação, o jornalista que responderá por isso. Liberdade de locomoção A liberdade de locomoção, ou direito ambulatorial, é um dos direitos há mais tempo reconhecidos pela legislação dos povos. Trata-se de um direito fundamental de primeira geração, que garante a todos o direito de ir, de vir e de permanecer. Ele está expresso no inciso XV do art. 5º da CRFB/88: Observe que a liberdade de locomoção poderá sofrer restrições referentes ao ingresso, à saída e à circulação interna de pessoas e patrimônio, nos termos da lei, caracterizando-a assim, como uma norma de eficácia contida. Além disso, caso ocorra algum abuso por parte de autoridade pública, ou até mesmo de autoridade particular (diretor de um hospital particular psiquiátrico, por exemplo) no direito de locomoção, o indivíduo se utilizará de um “remédio constitucional” para se proteger, o chamado habeas corpus, prescrito no inciso LXVIII do art. 5º: O habeas corpus é uma garantia fundamental utilizada sempre que alguém sofrer (habeas corpus repressivo) ou se achar ameaçado de sofrer (habeas corpus preventivo) violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. Ele é considerado uma ação de natureza penal, e não é necessário ter capacidade postulatória para impetrá-lo (ou seja, o indivíduo não precisa de advogado para a impetração). Ademais, ele pode ser proposto por qualquer pessoa (física ou jurídica), brasileiro ou estrangeiro, além de ser gratuito, conforme o inciso LXXVII: Art. 5º (...) XV. é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens; Art. 5º (...) LXVIII. conceder-se-á habeas-corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder; Art. 5º (...) LXXVII. são gratuitas as ações de habeas-corpuse habeas-data, e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania. 25 Direito de reunião O direito de reunião é estreitamente ligado à democracia, à República e ao direito à liberdade de manifestação do pensamento (art. 5º, IV, CF). Ele está previsto no art. 5º, XVI, da Constituição Federal: Reunião pacífica (sem armas) e em locais abertos ao público; Não é necessário pedir AUTORIZAÇÃO; É exigido o prévio aviso, porque o seu direito de reunião não pode frustrar outro anteriormente marcado (“avisado”). Então, tenha cuidado, pois o direito de reunião independe de autorização, mas depende de prévio aviso. Ademais, caso o poder público, de forma arbitrária, impeça o exercício desse direito, o remédio constitucional a ser utilizado será o mandado de segurança, e não o habeas corpus. Fique ligado (a), pois a banca pode explorar esse tipo de questão. Direito de associação A CRFB/88 assegura o direito de associação num conjunto de incisos do art. 5º (XVII a XXI): Art. 5º (...) XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente; Esse inciso costuma ser muito cobrado em prova e, geralmente, na sua literalidade. Dessa forma, é importante memorizar os requisitos para o direito de reunião: Art. 5º (...) XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar; XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento; XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado; XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado; XXI - as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente; 26 As associações são pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, que se formam pela reunião de pessoas em prol de um objetivo comum, e diferenciam-se da reunião por ter caráter permanente (a reunião, prevista no inciso XVI, tem caráter transitório). No que diz respeito aos incisos que tratam do direito de associação (direitos coletivos), é importante se preocupar com a sua literalidade, porque é o que costuma aparecer em provas. Dê atenção especial para o inciso XIX, que é o mais cobrado. Direito de propriedade e sua Função Social O direito de propriedade está previsto num conjunto de incisos do art. 5º (XXII a XXVI): É importante perceber que, além de um direito (inciso XXII), a propriedade também tem um dever a cumprir (inciso XXIII): atender a sua função social. Caso fique comprovado o não cumprimento da função social, segundo a própria Constituição, a propriedade poderá ser desapropriada (a doutrina chama de desapropriação- sanção essa modalidade), mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida pública (art. 182, § 4º, III e art. 184). Como vimos anteriormente, a Constituição prevê em seu artigo 5º que a propriedade será inviolável, mas como bem sabemos, não existem direitos absolutos, assim, pode o poder público intervir na propriedade privada, utilizando-se do princípio da supremacia do interesse público sobre o particular, para a satisfação do interesse de toda a coletividade e para que seja possível o equilíbrio social. Aqui estamos diante de duas formas distintas de intervenção na propriedade: a desapropriação (inciso XXIV) e a requisição administrativa (inciso XXV). Cuidado para não confundir a desapropriação com a desapropriação-sanção. A primeira (desapropriação), como observado, ocorrerá em caso de necessidade, utilidade pública ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ocasionando assim uma transferência compulsória da propriedade do indivíduo para o Estado. Já a segunda (requisição administrativa), será uma espécie de utilização compulsória (“pegar emprestado”) pelo Estado e será efetivada em caso de iminente perigo público e somente ocorrerá pagamento de indenização, se, após a utilização, for constatado algum dano à propriedade. Art. 5º (...) XXII - é garantido o direito de propriedade; XXIII - a propriedade atenderá a sua função social; XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição; XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano; XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento; , 27 Dessa forma, podemos esquematizar os institutos, da seguinte maneira: Desapropriação Requisição Art. 5º, XXIV Art. 5º, XXV Definitiva Temporária Necessidade, utilidade pública e interesse social Iminente perigo público Prévia e justa indenização em dinheiro (em regra). Exceções: art. 182, § 4º, III, 184, caput e 243, CF. Indenização se houver dano Já no inciso XXVI, é nítida a preocupação do legislador constituinte com a proteção dos pequenos trabalhadores rurais, tornando impenhorável sua pequena propriedade rural. Todavia, essa garantia depende do somatório de dois requisitos: a propriedade deve ser trabalhada pela família e a origem do débito deve estar relacionada a sua atividade produtiva. Perceba, também, que a própria Constituição determina que a lei irá dispor sobre meios de financiamento do pequeno produtor/proprietário rural. Propriedade intelectual Os incisos XXVII a XXIX do art. 5º da CRFB/88 tratam da propriedade intelectual. A professora Elisabete Vido esclarece que “a propriedade intelectual envolve a proteção de todos os bens imateriais oriundos de uma criação intelectual”. Consoante o disposto nos referidos artigos: Com relação ao direito do autor, vale frisar que enquanto estiver vivo, ele usufruirá de sua criação plenamente. Contudo, no que diz respeito à transferência dos direitos autorais da obra aos herdeiros após a sua morte, esta poderá sofrer uma restrição, podendo a lei estabelecer um prazo máximo de proteção das criações, findo o qual a obra cai em domínio público. Art. 5º (...) XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar; XXVIII - são assegurados, nos termos da lei: a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas; b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas; XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País; , 28 No caso do Brasil, via de regra, as obras são protegidas até 70 anos após a morte do autor. No entanto, há algumas particularidades específicas,como no caso de obra audiovisual, caso em que a proteção é de setenta anos após a sua divulgação. Findo o prazo de proteção, a obra pode ser livremente divulgada e reproduzida, ressalvados os direitos morais, que são perpétuos. Quanto ao inciso XXIX, a Constituição determina que a propriedade industrial e a sua utilização por seus autores serão temporárias. Perceba que existe uma diferença em relação ao direito autoral previsto no inciso XXVII, pois, nos inventos industriais, os inventores terão apenas o privilégio temporário (enquanto vivos), contados a partir da sua criação, e não necessariamente após a sua morte, pois o que prevalece nesse caso é o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país. Direito de Herança O Direito de Herança está previsto nos incisos XXX e XXXI do art. 5º: Destaque-se aqui que, no caso de sucessão de bens que estão dentro do território brasileiro, em regra, aplica-se a lei brasileira, contudo, se a lei pessoal do “de cujus” for mais favorável, esta será aplicada, mesmo sendo lei de outro país. Defesa do consumidor Consoante o disposto no inciso XXXII do art. 5º da CRFB/88, Quanto a sua classificação (no tocante à Eficácia das Normas Constitucionais), o inciso XXXII é considerado uma norma de eficácia limitada, pois depende de lei posterior para produzir plenamente seus efeitos. Vale ressaltar que a defesa do consumidor já está regulamentada pela Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor). Acesso à informação Considerado um direito básico fundamental, o acesso à informação, previsto no inciso XXXIII do art. 5º, encontra-se regulamentado pela Lei nº 12.527/2011 (Lei de acesso à informação), que dispõe sobre os procedimentos a serem observados pelos órgãos dos poderes Art. 5º (...) XXX - é garantido o direito de herança; XXXI - a sucessão de bens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do "de cujus"; Art. 5º (...) XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor; 29 públicos, com o fim de garantir o acesso a informações de interesse coletivo ou geral. Segundo nos informa o inciso XXXIII: É importante destacar que, com a recusa do fornecimento dessas informações pelo Poder Público ou o não cumprimento dos prazos legais, o indivíduo poderá lançar mão do mandado de segurança para fazer valer o seu direito, desde que as informações não estejam resguardadas sob o manto das hipóteses de sigilo previstas em lei. Direito de petição e Direito de certidão O art. 5º, inciso XXXIV, alínea “a”, da Constituição Federal prevê o direito de petição e, da mesma forma, o art. 5º, inciso XXXIV, alínea “b”, prevê o direito de certidão: O Direito de petição é considerado um instrumento da cidadania, que permite a qualquer pessoa se dirigir ao Poder Público para reivindicar algum direito ou informação. Ele possui dupla função: a defesa dos próprios interesses do indivíduo e, a mais relevante, apresentação de notícia de fato ilegal ou abusivo ao poder público, para que este providencie as medidas adequadas. Por outro lado, certidões são documentos oriundos de autoridade ou de agente do Poder Público que, nessa qualidade, provam ou confirmam determinado ato ou fato, tornando-se assim provas documentais. Sendo o direito à obtenção de certidão um direito líquido e certo, ele também apresenta uma dupla função: defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal. O remédio adequado para a proteção do direito de certidão é o mandado de segurança. Princípio da inafastabilidade da jurisdição Segundo o inciso XXXV do art. 5º da CRFB/88, Art. 5º (...) XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; Art. 5º (...) XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder; b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal; Art. 5º (...) XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; 30 Por meio desse princípio, a Constituição garante a todos o direito de buscar a Justiça sempre que houver uma ameaça ou uma violação ao seu direito. Assim, o Poder Judiciário, no exercício da sua função, deverá solucionar o conflito aplicando o direito ao caso em concreto. Importante ressaltar que tal direito não está condicionado ao esgotamento das instâncias administrativas, podendo, a qualquer tempo, o interessado ingressar com a ação competente, exceção feita à Justiça Desportiva no que se refere à disciplina e às competições esportivas, hipóteses em que a Constituição, em seu artigo 217, §1º, determina expressamente que o Judiciário só admitirá ações a elas referentes após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva. Outro destaque encontra-se no fato de que o princípio da inafastabilidade não assegura o chamado “duplo grau de jurisdição”, pois inexiste obrigatoriedade de duplo grau de jurisdição, uma vez que a Constituição menciona a existência de juízes e tribunais, prevê a existência de recursos, mas não prevê essa obrigatoriedade. Isso porque existem competências originárias em que não há o duplo grau de jurisdição, como por exemplo, naqueles casos em que a competência originária é dos Tribunais. Princípio da segurança jurídica ou da irretroatividade da lei Derivação direta do princípio da segurança jurídica, decorrente do art. 5º, caput, da CRFB/88, o art. 5º, XXXVI, dispõe que: O direito adquirido (aquele que cumpriu todos os requisitos exigidos por lei para sua formação), o ato jurídico perfeito (a consequência do exercício efetivo de um direito adquirido) e a coisa julgada (decisão judicial da qual não cabe mais recurso) são considerados instrumentos de segurança jurídica, impedindo que as leis retroajam para prejudicar situações jurídicas consolidadas. Princípio do juiz natural ou legal O princípio do juiz natural pode ser encontrado em dois incisos do art. 5º da Constituição Federal. O primeiro deles é o art. 5º, XXXVII. O outro é o art. 5º, LIII: Esses dois incisos garantem ao indivíduo que suas ações judiciais serão apreciadas por um juiz imparcial e independente. O inciso XXXVII repudia a existência de juízos ou tribunais de exceção, seja qual for a circunstância. Isso significa que qualquer ação será submetida, sempre, aos Tribunais existentes, criados e previstos na própria Constituição, que a julgará dentro das leis existentes à época do fato. Art. 5º (...) XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada; Art. 5º (...) XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção; LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente; 31 Já no inciso LIII, o legislador constituinte buscou impedir que o indivíduo venha a sofrer consequências de um processo ou de uma sentença eventualmente proferida por um juiz ou um Tribunal incompetente para apreciá-lo, pois apenas os órgãos jurisdicionais que tiveram suas competências estabelecidas pela Constituição e por leis infraconstitucionais poderão exercer a função jurisdicional, cada um na esfera de suas competências, seja territorial ou material. Tribunal do Júri O art. 5º, XXXVIII, da CRFB/88 estabelece o seguinte: Com relaçãoao Tribunal do júri, é importante destacar que a Constituição não estabelece o número exato de jurados, deixando a cargo da lei estabelece-lo. Ademais, esse Tribunal possui competência apenas para julgamento dos crimes dolosos contra a vida e não dos crimes culposos. Fique atento (a), pois geralmente as bancas costumam trocar as palavras para confundir os candidatos. Outro ponto importante é que as chamadas prerrogativas de função (foro privilegiado) prevalecem sobre a competência do Tribunal do Júri, ou seja, se um Senador da República cometer um crime doloso contra a vida, ele não será julgado pelo Tribunal do Júri, mas sim pelo STF, conforme estabelece a Constituição. Princípio da anterioridade da lei penal incriminadora Consoante o disposto no inciso XXXIX do art. 5º da CRFB/88, Esse princípio confere mais segurança jurídica às relações sociais, porquanto estabelece que uma conduta só será considerada crime, se for cometida após a entrada em vigor da lei penal incriminadora. A lei brasileira exige que um fato seja típico e antijurídico para que seja considerado criminoso, ou seja, que o fato esteja tipificado na norma legal e que a contrarie. Sem isso, não há que se falar em crime e muito menos em cominação legal (aplicação de pena). Art. 5º (...) XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida; Art. 5º (...) XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; 32 Princípio da Irretroatividade da lei penal in pejus ou da retroatividade benéfica Derivado do princípio da anterioridade, previsto no inciso anterior, o disposto no inciso XL do art. 5º da CRFB/88 enuncia que: É o princípio segundo o qual uma lei apenas pode retroagir se for para beneficiar o réu. Assim, se alguém comete hoje um ato que a lei não imputa como crime e amanhã esse ato, por força de determinação legal, for transformado em um ato ilegal, a lei não poderá ser aplicada de forma retroativa. Contudo, se ocorrer o contrário, a lei poderá retroagir em benefício do réu, seja diminuindo penas, trazendo benefícios penais quanto à execução da pena ou até mesmo transformando a conduta em fato atípico. Práticas discriminatórias Segundo o inciso XLI do art. 5º da CRFB/88, Além da preocupação com os direitos e as liberdades fundamentais, tais como o direito à vida, à igualdade etc., o constituinte originário se preocupou também com a possibilidade de violação desses direitos tão importantes para a vida em sociedade. Dessa forma, é por intermédio do inciso XLI do art. 5º da CRFB/88, que é definida a punição de condutas que venham a ferir esses direitos e essas liberdades fundamentais. Trata-se de uma determinação ao legislador infraconstitucional, que terá o dever de declarar as condutas consideradas atentatórias aos direitos e liberdades fundamentais como criminosas, levando os infratores às penas previstas em Lei. Crimes inafiançáveis e imprescritíveis e insuscetíveis de graça ou anistia A CRFB/88 estabelece quais são os dois crimes imprescritíveis, nos incisos XLII e XLIV do artigo 5º. Por sua vez, o inciso XLIII do mesmo artigo, apresenta-nos os crimes hediondos e equiparados, quais sejam: Art. 5º (...) XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu; Art. 5º (...) XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; 33 O crime de racismo e a ação de grupos armados contra a ordem constitucional e o Estado Democrático não admitem fiança, ou seja, o réu responde preso pela prática do delito. Ademais, esses são imprescritíveis, vale dizer, não prescreve o direito de promover a ação contra os autores desses crimes. Já os crimes de tráfico, terrorismo, tortura e os hediondos, são apenas inafiançáveis, portanto, eles prescrevem (após os prazos estabelecidos em lei). Além disso, são considerados também insuscetíveis de graça (perdão da pena de uma pessoa condenada) ou anistia (atinge todos os efeitos penais decorrentes da prática do crime, referindo-se assim a fatos e não a pessoas) Princípio da Pessoalidade ou da Personificação da Pena O inciso XLV do art. 5º da CRFB/88 apregoa que: A parte inicial deste inciso determina que a pena não poderá ser transmitida para familiares do condenado ou terceiros, extinguindo-se com a morte do agente. Contudo, em relação aos aspectos patrimoniais envolvidos nessa questão, o tratamento dado será diferente. Com efeito, será transferida para os sucessores a obrigação de reparar o dano ou mesmo a possibilidade do perdimento de bens, mas é claro, há uma limitação ao patrimônio deixado em herança, tratando-se assim de um caso de transmissibilidade do dever de indenizar em decorrência da transmissão do patrimônio do responsável pelo dano. Art. 5º (...) XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei; XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem; XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático; ATENÇÃO! Insuscetível de graça ou anistia = os autores do crime não poderão gozar dos benefícios da graça nem da anistia. Art. 5º (...) XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; 34 Penas permitidas e penas proibidas O inciso XLVI do art. 5º da CRFB/88 apresenta um rol das penas permitidas no ordenamento jurídico brasileiro, ao passo que o inciso XLVII traz um rol das penas proibidas: Com relação às penas admitidas, vale destacar que o seu rol não é exaustivo, podendo a lei criar outras formas de penalidade, desde que estas não estejam no rol das penas proibidas (inciso XLVII). Já no que diz respeito às penas proibidas, é preciso dar atenção à pena de morte, pois em regra ela é vedada, mas uma única possibilidade é admitida, a saber, nos crimes praticados durante a guerra. Princípio da individualização da pena Segundo o inciso XLVIII do art. 5º da CRFB/88, Art. 5º (...) XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos; XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis; Art. 5º (...) XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado; 35 O inciso XLVIII trata de um direito fundamental que necessita de reiteradas políticas públicas no tocante ao sistema carcerário brasileiro. Esse dispositivo busca colaborar com a recuperação do criminoso enquanto este estiver no cumprimento de sua pena. Essa finalidade jamais seria alcançada se fossem colocados em um mesmo estabelecimento prisional pessoas de grande periculosidade e réus primários, jovens e adultos ou homens e mulheres.
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