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POLÍCIA PENAL DO ESTADO DO CEARÁ SECRETARIA DA ADMINISTRAÇÃO PENITENCIÁRIA - SAP/CE RUMO À POLÍCIA PENAL RUMO À NPE DIREITO CONSTITUCIONAL ASSUNTOS: 01. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS – ART. 1º AO 4º 02.DIREITOS FUNDAMENTAIS – ART. 5º AO 16 03.DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – ART. 37 04.DO ESTADO DE SÍTIO E DO ESTADO DE DEFESA – ART. 136 AO 141 05.DA SEGURANÇA PÚBLICA – ART. 144 CONTEÚDO: 01.TEXTO CONSTITUCIONAL 02.DOUTRIMA/COMENTÁRIOS 03.JURISPRUDÊNCIA 04.QUESTÕES 01. A CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL Trata-se, no ordenamento jurídico brasileiro, do documento normativo dotado de maior hierarquia, de acordo com o ensinamento de Hans Kelsen, em sua famosa pirâmide normativa, conforme abaixo se demonstra: Dessa forma, do quadro acima inserido, extrai-se a interpretação de que todas as outras normas do ordenamento jurídico, desde as leis ordinárias e as complementares até as portarias administrativas, devem respeitar os comandos constitucionais. Nesse sentido, a título de exemplo, um ato de remoção de um servidor público estadual realizado como forma de punição e perseguição política pode e deve ser considerado inconstitucional, haja vista ir de encontro aos princípios explícitos no art. 37, caput, da Constituição Federal, quais seja, da legalidade, impessoalidade e moralidade. Vale salientar, como se percebe da figura acima, que entre a legislação infraconstitucional e as normas com caráter constitucional, encontram-se as normas com caráter NORMA SUPRALEGAL, conforme entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal – STF, que entendeu pela ilicitude da prisão civil do depositário infiel, tema que será explicado mais a frente. A esse entendimento a doutrina constitucional dá o nome de princípio da supremacia constitucional, pelo qual as normas constitucionais são supremas na ordem jurídica, devendo ser respeitadas e interpretadas de maneira a garantir sua superioridade. Vale acrescentar, que de acordo com o atual entendimento do Supremo Tribunal Federal, é possível afirmar a existência de normas SUPRALEGAIS, isto é, que estão acima da legislação ordinária, mas abaixo da Constituição Federal, como a exemplo do Pacto de São José da Costa Rica. Estrutura da Constituição Como já foi visto acima, a Constituição Federal é documento jurídico de maior hierarquia no ordenamento jurídico, pelo qual todas as outras normas devem se guiar. Assim, é preciso entender de que forma está estruturada essa norma tão importante no nosso ordenamento, motivo pelo qual se faz necessário estudar a estrutura da Constituição. A Constituição da República Federativa do Brasil é estruturada da seguinte forma: PREÂMBULO: SEM RELEVÂNCIA JURÍDICA NOVE TÍTULOS: CORPO DA CONSTITUIÇÃO ATOS DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS: REGRAS DA CONSTITUIÇÃO DESTINADAS A REALIZAR A TRANSIÇÃO ENTRE A ANTERIOR E A NOVA CONSTITUIÇÃO EMENDAS À CONSTITUIÇÃO: 105 Emendas Constitucionais ATENÇÃO: Diferentemente do que ocorre com o preâmbulo, que não tem força normativa e suas disposições não são parâmetro de constitucionalidade, as normas do ADCT são igualmente constitucionais, isto é, tem a mesma força normativa das normas constantes do corpo da Constituição Federal. CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES: 01. QTO À ORIGEM: a)promulgada - Brasileiras de 1891, 1934, 1946, 1988 b)outorgada - Brasileiras de 1824, 1937, 1967 c)cesarista - submetida a plebiscito ou referendo d)pactuada - duas forças fazem um pacto 02. QTO À FORMA: a)escrita - Brasileira de 1988 b)não escrita (consuetudinária) - Inglesa 03. QTO AO MODO DE ELABORAÇÃO: a)dogmática - feita de uma só vez, de um só jato - Brasileira b)histórica - processo lento de instituição 04. QTO AO CONTEÚDO: a)formal - o que importa é a forma de sua elaboração, pouco importando o conteúdo - Brasileira b)material - não importa a forma de elaboração, o que importa para ser constitucional é se ela trata de organização dos poderes, direitos individuais etc (NOÇÃO DE BLOCO DE CONSTITUCIONALIDADE, POIS HÁ NORMAS CONSTITUCIONAIS FORA DA CONSTITUIÇÃO) 05. QTO À ALTERABILIDADE: a)rígida - processo dificultoso de alteração das normas constitucionais b)semirígida ou semiflexível - uma parte da constituição o processo de alteração é dificultoso, outra parte é semelhante às normas ordinárias c)flexível - todas as normas são alteradas da mesmas forma que a legislação ordinária d)fixas - as normas constitucionais somente são alteradas pelo mesmo poder que insttuiu a Constituição e)imutáveis - São constituições que não podem ser modificadas f)superrígidas - De acordo com Alexandre de Moraes, a Constituição Brasileira de 1988 é assim classificada, pois contém uma parte cuja alteração é complexa, e outra que sequer pode ser modificada, como as cláusulas pétreas. 06. QTO À DOGMÁTICA: a)ortodóxica - a Constituição adota uma ideologia ou religião b)eclética - a Constituição não adota ideologia ou relegião e permite a coexistência de várias. 07. QTO À SISTEMÁTICA: a)preceitual - constituição formada em sua maioria por regras b)principiológica - constituição formada em sua maioria por princípios 08. QTO À ONTOLOGIA - KARL LOWESTEIN a)normativa - a Constituição representa a força popular, sintetiza os fatos reais de poder b)nominalista - A Constituição prevê a dominação da política, mas isso não é colocado em prática c)semântica - a Constituição é instituída a serviço dos Governantes, das elites políticas DOS PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS TÍTULO I Dos Princípios Fundamentais Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. COMENTÁRIOS: Os princípios fundamentais são a base da República Federativa do Brasil, o alicerce no qual é fundado o Estado Brasileiro, e se subdividem em fundamentos, objetivos e princípios internacionais. Mas, no caput do art. 1º, verificam-se a forma de governo, forma de estado, o princípio da indissolubilidade do pacto federativo e o princípio do Estado Democrático de Direito. No art. 1º da Constituição supracitado, podem ser extraídas a FORMA DE ESTADO e a FORMA DE GOVERNO DO BRASIL: Forma de Governo: República – PRINCÍPIO ESTRUTURANTE Sistema de Governo: Presidencialista – PRINCÍPIO ESTRUTURANTE Forma de Estado: Federativa – PRINCÍPIO ESTRUTURANTE 1.1.2. Forma de Governo ou Princípio Republicano Para fundamentar o que se disse acima, colaciono as palavras do Mestre Marcelo Novelino: A história republicana brasileira tem início em 15 de novembro de 1889, com a derrocada do regime imperial. A consagração desta forma de governo no âmbito constitucional, é inaugurada com o advento da Constituição de 1891, sendo que, desde então, todas as cartas políticas brasileiras seguiram o mesmo caminho. A república é uma forma de governo que, antes de se tornar hegemônica em todo mundo, foi objeto de contemplação teórica e de lutas por sua aplicação prática. A compreensão das decorrências advindas da consagração do princípio republicano no texto constitucional pressupõe uma análise ainda que sucinta, dos desdobramentos filosóficos envolvendo este conceito e de sua evolução histórica. (...) A monarquia, durante muitos séculos, foi a forma de governo adotada pela maioria dos Estados, principalmenteaté o início da idade contemporânea. Dentre suas principais características podem ser mencionadas a hereditariedade na transferência do poder e a vitaliciedade do governante, que reinava livre de responsabilidades de natureza política, civil ou penal. Em geral, nos governos monárquicos, o soberano não prestava contas aos súditos acerca das diretrizes políticas adotadas, diversamente do que costuma ocorrer nos Estados contemporâneos. Outrossim, não se cogitava a possibilidade de responsabilização civil da Administração Pública pelos danos causados aos cidadãos, tampouco de responsabilização penal do governante pela prática de ilícitos. A república apresenta, entre suas notas características, o caráter representativo dos governantes, inclusive do Chefe de Estado (representatividade), a necessidade de alternância no poder (temporariedade) e a responsabilidade política, civil e penal dos governantes. A forma republicana de governo possibilita a participação dos cidadãos, direta ou indiretamente, no governo e na administração pública, sendo irrelevante a ascendência do indivíduo para que possa titular e exercer funções públicas. Sobre a forma de governo, vale acrescentar que se trata de cláusula pétrea, isto é, imodificável através de Emenda à Constituição (Art. 60, §4º), pois foi o povo, em 1993 que, através de plebiscito, decidiu que a forma de governo seria republicana em vez de monarquia. (FORMA DE GOVERNO: REPUBLICANA) 1.1.3. Forma de Estado ou Princípio Federativo Sobre a forma de estado, qual seja, federativa, esta também não pode ser modificada através de Emenda à Constituição (art. 60, §4º), e o federalismo brasileiro é por desagregação, tendo em vista que havia um só governo, unitário, que foi divido em vários outros. (FORMA DE ESTADO: FEDERATIVA). Ademais, extrai-se, do caput do art. 1º, o princípio da indissolubilidade do pacto federativo, pelo qual a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal. (INDISSOLUBILIDADE DO PACTO FEDERATIVO). Nesse sentido, no Estado Brasileiro está consagrada a proibição do direito de secessão. Por fim, o caput do art. 1º também consagra o princípio do Estado Democrático de Direito, pelo qual a República Federativa do Brasil é constituída sob um estado, que é democrático, e regido pelo direito. Com base nisso, entende-se que as decisões políticas do Brasil são tomadas pelo povo, diretamente, nos termos da Constituição, ou indiretamente através de representantes eleitos. A nossa democracia é semidireta ou participativa (Art.1º, parágrafo único). 1.2. FUNDAMENTOS – INCISOS I A V DO ART. 1º São Fundamentos da República Federativa do Brasil: - SOBERANIA - CIDADANIA - DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA - - VALORES SOCIAIS DO TRABALHO E DA LIVRE INICIATIVA - PLURALISMO POLÍTICO Para aqueles alunos que tem dificuldade em memorizar e compreender os fundamentos, inserimos uma regra mnemônica de memorização: SO (SOBERANIA) CI (CIDADANIA) DI (DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA) VA (VALORES SOCIAIS DO TRABALHO) PLU (PLURALISMO POLÍTICO) SO.CI.DI.VA.PLU Não obstante a regra supramencionada, serão abordados, a partir de agora, todos os fundamentos do inciso I ao V, do art. 1º, da Constituição Federal de 1988. 1.2.1 Soberania Na ordem como foram dispostos nos incisos do art. 1º, temos o fundamento da Soberania, pela qual, o Estado Brasileiro não deve se submeter a direito estrangeiro se não acordou livremente, através de tratado internacional. (Soberania externa) Contudo, é preciso compreender, que a Soberania é da República Federativa do Brasil, e não da União, pois esta integra a República Federativa assim como os Estados, os Municípios e o Distrito Federal. Ademais, a soberania mencionada também se manifesta dentro das fronteiras do nosso Estado, pois é poder mais elevado dentro de nossas fronteiras (Soberania interna) 1.2.2 Cidadania A cidadania como está descrita na Constituição, não se consubstancia apenas na capacidade eleitoral ativa (VOTAR) e na capacidade eleitoral passiva (SER VOTADO), mas também, e especialmente, na possibilidade do indivíduo participar ativamente da VIDA POLÍTICA da República Federativa do Brasil. EX: Audiências Públicas; Direito de Petição; Mandado de Injunção. 1.2.3. Dignidade da Pessoa Humana A dignidade da pessoa humana é o principal “tijolo” do alicerce formado pelos fundamentos da República Federativa do Brasil, pois todas as normas constitucionais, principalmente a dos direitos e garantias fundamentais, destinam-se a cumprir tal fundamento, isto é, a preocupação deixa de ser com as “coisas” e passa a ser com a pessoa humana. 1.2.4. Valores Sociais do Trabalho e da Livre Iniciativa Como bandeira principal do liberalismo advindo da primeira geração de direitos fundamentais, a livre iniciativa é a liberdade que os indivíduos tem de empreender e fomentar o modelo econômico pretendido pelo Poder Constituinte Originário, qual seja, o capitalista. No entanto, é preciso que haja uma ponderação entre a livre iniciativa e os valores sociais do trabalho pois, ao mesmo tempo em que se permite o livre exercício de atividade empresarial, devem ser garantidos direitos sociais trabalhistas. 1.2.5. Pluralismo Político O Pluralismo aqui mencionado não denota o sentido apenas da multiplicidade de partidos políticos, mas, por outro lado, a multiplicidade de ideias, de crenças, de filosofias, todas vivendo harmonicamente em liberdade, manifestando-se através de associações, sindicatos e partidos políticos. 1.4. Separação de Poderes Art. 2º São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. COMENTÁRIOS: O princípio acima mencionado, denominado pela doutrina de separação de poderes teve origem na obra de Aristóteles, denominada “Política”. De acordo com Marcelo Novelino, “no célebre sistema de freios e contrapesos (checks and balances) a repartição equilibrada dos poderes entre os diferentes órgãos é feita de modo que nenhum deles possa ultrapassar os limites estabelecidos pela Constituição sem ser contido pelos demais”. No entanto, é preciso ter em mente que a separação de poderes não é rígida entre os poderes, mas, como está colocado no prático artigo, aqueles são HARMÔNICOS entre si, isto é, em algumas situações, é possível que um Poder controle o outro, como exceção diga-se de passagem, bem será possível nas hipóteses estritamente delineadas pela Constituição que um poder exerça a função constitucionalmente delimitada a outro poder, sobressaindo daqui a diferença entre as FUNÇÕES TÍPICAS e FUNÇÕES ATÍPICAS, tema mais bem desenvolvido em direito administrativo. FUNÇÕES TÍPICAS FUNÇÕES ATÍPICAS LEGISLATIVO Legislar (criar leis) e fiscalizar Julgar (Art. 52 – Julgamento do Presidente da República por crime de responsabilidade pelo Senado Federal) Administrar – Realização de Concurso Público - Licitação EXECUTIVO Administrar – Função tipicamente administrativa Legislar (Art. 62 - Medida Provisória editadas pelo Presidente da República) JUDICIÁRIO Julgar – Aplicar as normas ao caso concreto – Resolver os litígios Legislar (elaboração de regimentos internos – resoluções genéricas) – Administrar - Realização de Concurso – Licitação 1.5. Objetivos da República Federativa do Brasil Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade equaisquer outras formas de discriminação. DICA: (GA-ER – PRO-CON) ou (CON-GA – E-PRO) COMENTÁRIOS: 1.5.1 Construir uma sociedade livre, justa e solidária. O objetivo acima mencionado, notadamente construir uma sociedade solidária, diz respeito a um direito de 3ª dimensão, pois denota a tentativa de ser um Estado solidário e fraterno para com todos os outros cidadãos. Com base nisso foi que o Supremo Tribunal Federal entendeu pela possibilidade de pesquisa em Células Tronco Embrionárias, na discussão entre o início da vida, se iniciada com o embrião antes de ser implantado, ou apenas após a inserção no útero materno. Dessa forma, na Ação Direta de Inconstitucionalidade 3.510, restou decidido que, em face do objetivo da República em ser solidária, era possível a realização de pesquisas em células tronco com a finalidade de descobrir cura para algumas doenças, como a tetraplegia. 1.5.2 Garantir o Desenvolvimento nacional O estado brasileiro tem como dever garantir o desenvolvimento nacional, tais como o PAC – Programa de Aceleração do Crescimento. 1.5.3. Erradicar a pobreza e a marginalização. Também objetivo da república, o da erradicação da pobreza, pode ser citado como exemplo o fundo de combate e erradicação da pobreza, prorrogado por prazo indeterminado pela EC n. 67 de 2010. 1.5.4. Promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Com fundamento em tal objetivo, o STF decidiu pela possibilidade do casamento e união estável entre pessoas do mesmo sexo, conformes restou decidido na ADI 4277 e na ADPF 132. 1.6. Princípios Internacionais Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I - independência nacional; II - prevalência dos direitos humanos; III - autodeterminação dos povos; IV - não-intervenção; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X - concessão de asilo político. Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações MNEMÔNICO A uto determinação dos povos IN dependência nacional D efes da paz NÃO intervenção CO operação entre os povos para o progresso da humanidade PRE valência dos direitos humanos I igualdade entre os Estados RE púdio ao racismo e terrorismo CO ncessão de asilo político S olução pacífica dos conflitos (A.IN.D – NÃO.CO.PRE.I – RE.CO.S) 2 DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS TÍTULO II Dos Direitos e Garantias Fundamentais CAPÍTULO I DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: COMENTÁRIOS: Os direitos e garantias fundamentais são oponíveis ao Estado, isto é, significa um status de defesa dos cidadãos contra as arbitrariedades daquele a quem o poder é delegado, bem como status de prestação, de exigir do poder público uma atuação estatal para garantir direitos de várias espécies. Nesse sentido, vale destacar que, em se tratando das dimensões de direitos fundamentais, inserem-se na denominada primeira dimensão os direitos individuais e coletivos, ou seja, as liberdades negativas, nas quais o Estado tem o dever de se abster de realizar um ato que atinja ou desrespeite as liberdades individuais. Assim, o cidadão tem um status negativo frente ao poder público, pois a exigência é que o Estado não intervenha nas liberdades do cidadão. 2.1 APLICABILIDADE DAS NORMAS DE DIREITOS FUNDAMENTAIS Regra geral, os direitos fundamentais são de aplicação imediata, pois não carecem de qualquer medida do Poder Público ou até mesmo dos particulares em geral para que sejam efetivamente aplicados e usufruídos por todas as pessoas humanas, a saber pelo direito à vida, que como vimos, desde a concepção, ou seja, quando há a fertilização do óvulo pelo espermatozoide. O fundamento da aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais reside, no plano interno, no disposto no §2º do art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, pelo qual “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais tem aplicação imediata”. A despeito disso, a doutrina constitucionalista em geral ressalva que, não obstante a Constituição prevê que os direitos e garantias fundamentais tem APLICAÇÃO imediata, alguns dos direitos, embora sofrendo incidência dessa norma, não tem APLICABILIDADE, e carecem de lei regulamentadora, complementar ou ordinária, para terem aplicabilidade plena. são as denominadas normas programáticas, que dependem de um programa governamental, ou normas de eficácia limitada, que necessitam da regulamentação legal, complementar ou ordinária APLICAÇÃO IMEDIATA APLICABILIDADE Todas as normas constitucionais tem alguma incidência de forma imediata, e algumas mesmo necessitando de lei pra regulamentar ou sofrendo restrição, MAS OBRIGAM O LEGISLADOR INFRACONSTITUCIONAL A NÃO CONTRARIAR SEUS DISPOSITIVOS. Nessa classificação, que é a exposta por José Afonso da Silva, algumas normas terão aplicabilidade plena, outras limitada e algumas contida. Assim, ter APLICAÇÃO IMEDIATA e ter o efeito de tornas inconstitucional legislação infraconstitucional que com a norma constitucional seja conflitante. Nesse sentido, utilizando-se do magistério de Alexandre de Moraes, em que cita José Afonso da Silva, diferenciamos as normas de eficácia plena, limitada, concentrada e de conteúdo programático: EFICÁCIA PLENA São normas constitucionais de eficácia plena “aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou têm possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situações, que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular” (por exemplo: os “remédios constitucionais) EFICÁCIA CONTIDA Normas constitucionais de eficácia contida são aquelas em “que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do poder público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nelas enunciados” (por exemplo: art. 5o, XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer) EFICÁCIA LIMITADA Por fim, normas constitucionais de eficácia limitada são aquelas que apresentam “aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, porque somente incidem totalmente sobre esses interesses, após uma normatividade ulterior que lhes desenvolva a aplicabilidade” (por exemplo: CF, art. 37, VII: o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica. Essa previsão condiciona o exercício do direito de greve, no serviço público, à regulamentação legal. Ainda, podemos citar como exemplo o art. 7o, XI, da Constituição Federal, que prevê a participação dos empregados nos lucros, ou resultados da empresa, conforme definido em lei). NORMAS PROGRAMÁTICAS As normas programáticas, conforme salienta Jorge Miranda, “são de aplicação diferida, e não de aplicação ou execução imediata; mais do que comandos-regras, explicitam comandos- valores; conferem elasticidade ao ordenamento constitucional;têm como destinatário primacial – embora não único – o legislador, a cuja opção fica a ponderação do tempo e dos meios em que vêm a ser revestidas de plena eficácia (e nisso consiste a discricionariedade); não consentem que os cidadãos ou quaisquer cidadãos as invoquem já (ou imediatamente após a entrada em vigor da Constituição), pedindo aos tribunais o seu cumprimento só por si, pelo que pode haver quem afirme que os direitos que delas constam, máxime os direitos sociais, têm mais natureza de expectativas que de verdadeiros direitos subjectivos; aparecem, muitas vezes, acompanhadas de conceitos indeterminados ou parcialmente indeterminados. EXEMPLO DE EFICÁCIA PLENA: Art. 2º da Constituição Federal – São Poderes Independentes e harmônicos entre si o Legislativo, o Executivo e o Judiciário EXEMPLO DE EFICÁCIA CONTIDA: Inciso XIII do art. 5º - É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer – A LEI PODE RESTRINGIR O ALCANCE DO DIREITO PREVISTO NA NORMA, CONDICIONÁ-LO – Como a lei que regulamentou a PROFISSÃO DE MOTORISTA DE APLICATIVO – ATENÇÃO: A LEI NÃO PROIBIU, MAS REGULAMENTOU A PROFISSÃO. EXEMPLO DE EFICÁCIA LIMITADA: Art. 37, VII – o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica FIQUE LIGADO: SE HOUVER ALGUMA NORMA DE EFICÁCIA LIMITADA, QUE INVIABILIZE O EXERCÍCIO DOS DIREITOS E LIBERDADE FUNDAMENTAIS E DAS PRERROGATIVAS INERENTES À NACIONALIDADE, CIDADANIA, SOBERANIA será possível A IMPETRAÇÃO DE MANDADO DE INJUNÇÃOL, tema a ser melhor explorado a frente, que é um REMÉDIO CONSTITUCIONAL. DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS TÍTULO II Dos Direitos e Garantias Fundamentais CAPÍTULO I DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: COMENTÁRIOS: Os direitos e garantias fundamentais são oponíveis ao Estado, isto é, significa um status de defesa dos cidadãos contra as arbitrariedades daquele a quem o poder é delegado, bem como status de prestação, de exigir do poder público uma atuação estatal para garantir direitos de várias espécies. Nesse sentido, vale destacar que, em se tratando das dimensões de direitos fundamentais, inserem-se na denominada primeira dimensão os direitos individuais e coletivos, ou seja, as liberdades negativas, nas quais o Estado tem o dever de se abster de realizar um ato que atinja ou desrespeite as liberdades individuais. Assim, o cidadão tem um status negativo frente ao poder público, pois a exigência é que o Estado não intervenha nas liberdades do cidadão. 2.2 GERAÇÕES OU DIMENSÕES Sobre o tema, vale mencionar que a doutrina resolveu estudar os direitos fundamentais em gerações, ou dimensões como alguns preferem, as quais destacam-se principalmente a primeira, segunda, terceira, quarta e quinta geração de direitos humanos, a seguir estudadas. 2.2.1. 1ª DIMENSÃO: LIBERDADE ESTADO AUTORITÁRIO→ESTADO DE DIREITO FATOS HISTÓRICOS→MAGNA CARTA DE 1215 (DECLARAÇÕES AMERICANAS DE 1776 E FRANCESA DE 1789) }LIBERDADES NEGATIVAS →São as liberdades públicas, isto é, os direitos de todas as pessoas de serem livres e de não sofrerem intervenções estatais em toda a dimensão de suas vidas. Assim, de acordo com Ricardo Castilho, “consideram-se, nessa primeira geração, as tentativas de limitação do poder do Estado (quase sempre representado pelo rei). Os direitos humanos de primeira geração constituem a defesa do indivíduo diante do poder do Estado, e definem as situações em que o Estado deve se abster de interferir em determinados aspectos da vida individual e social. São as chamadas liberdades públicas negativas ou direitos negativos, eis que implicam a não interferência do Estado”. Tais direitos estão consubstanciados nos Direitos Civis e Políticos (Art. 5º e 14 da CF/1988), tendo como marcos Históricos: Revolução Francesa de 1789 e Revolução Norte-Americana de 1776. →Exemplo: Art. 5º, XI – a casa é asilo inviolável 2.2.2. 2ª DIMENSÃO: IGUALDADE ESTADO LIBERAL→ESTADO SOCIAL FATOS HISTÓRICOS→REVOLUÇÃO INDUSTRIAL (SÉCULO XIX) LIBERDADES POSITIVAS Já os direitos de segunda dimensão, dizem respeito aos direitos sociais, culturais e econômicos da pessoa humana. Nesses direitos, o Estado sai da condição de mero expectador, para a condição de prestador, isto é, são as necessidades vitais básicas que a pessoa humana necessita e que devem ser prestadas pelo Estado, a saber pelo disposto no art. 6º e 7º da Constituição Federal. De acordo com Ricardo Castilho, “seu reconhecimento e sua proteção são fruto principalmente das reivindicações dos movimentos socialistas iniciadas na primeira metade do século XIX. Com efeito, as riquezas geradas pelo desenvolvimento do capitalismo a partir do século XVIII não se estenderam a todas as classes sociais; pelo contrário, o sistema capitalista encetou em seus diversos ciclos à produção de um número cada vez maior de excluídos da sociedade”, tendo como marcos Históricos: Revolução Industrial e Constituição Mexicana de 1917; →Exemplo: Art. 6º - Direito social à educação, saúde, trabalho 2.2.3. 3ª DIMENSÃO: FRATERNIDADE }ESTADO DE FRATERNIDADE (SOLIDARIEDADE) Já os Direitos de 3ª dimensão se referem aos direitos difusos e coletivos, ou seja, os direitos humanos deixam de ser aplicados apenas sob a perspectiva individual, para serem aplicados sob um viés coletivo. Por fim, para sintetizar as três dimensões acima mencionadas, vale destacar o entendimento do Ministro Celso de Melo, do Supremo Tribunal Federal, no voto proferido no Mandado de Segurança 22.164/SP: “Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) – que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais – realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) – que se identificam com as liberdades positivas, reais ou concretas – acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade”. Exemplo: Direito à paz, direito ao meio ambiente, ao desenvolvimento, à informação Por último, não custa lembrar, sobre as dimensões ou gerações dos direitos humanos, que o constitucionalista Paulo Bonavides vem defendendo, ISTO É, a quarta e quinta gerações de direitos humanos. De acordo com Paulo Bonavides, a QUARTA GERAÇÃO se refere ao período de globalização e à formação de um mundo marcado por fronteiras nacionais mais permeáveis, maior limitação da soberania nacional e pelo fortalecimento de “uma sociedade civil internacional”. Segundo Paulo Henrique Gonçalves Portela, Paulo Bonavides vem defendendo a existência de uma QUINTA GERAÇÃO dos direitos humanos, cujo único direito é a paz, entendida como fundamento da “alforria espiritual, moral e social dos povos, das civilizações e das culturas” e da forma de governar a sociedade de modo a punir o terrorista, julgar o criminoso de guerra, encarcerar o torturador, manter invioláveis as bases do pacto social, estabelecer e conversar por intangíveis as regras, princípios e cláusulas da comunhão política. 2.3 CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS IRRENUNCIABILIDADE A pessoa humana, livremente,não pode renunciar aos direitos fundamentais de que é titular. Pode, todavia, optar por não exercê- los em determinadas situações (renúncia ao exercício), o que não caracteriza a renúncia ao direito. Ex: Propriedade não habitada HISTORICIDADE Decorrem das condições materiais e culturais de uma época. Nesse sentido, equivocada a concepção do jusnaturalismo, segundo a qual são atemporais e fixos. Pelo contrário: são fruto da evolução histórica de cada povo – daí não serem os mesmos em todas as partes do mundo INALIENABILIDADE São direitos indisponíveis e, portanto, não podem ser objeto de quaisquer negociações. Ex: Não possibilidade da venda de partes do corpo humano, em vida. IMPRESCRITIBILIDADE os direitos fundamentais não se sujeitam à prescrição, isto é, veda-se ao legislador que estipule prazo para o exercício do direito de ação com vistas a preservá-lo. Ademais, não há prazo para se perder o direito à vida, à liberdade, à propriedade UNIVERSALIDADE Os direitos fundamentais são concedidos a todos os membros da espécie humana, sem distinção de qualquer espécie, sexo, raça, cor, origem ou qualquer outro critério. TRANSNACIONALIDADE Os direitos humanos, por não serem aplicados por questões de raça ou nacionalidade, aplicam a todos os humanos presentes no universo, sendo, por isso mesmo, transnacionais. Ex: Direito à vida no Brasil e na Síria INERÊNCIA Não há necessidade do preenchimento de qualquer condição para que a pessoa humana seja dotada de direitos relativos à sua condição humana, ou seja, desde o nascimento com vida, e até mesmo na concepção, os direitos já aderem ao indivíduo. Ex: Pacto de São José da Costa Rica – Art. 4º, 1: Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção PROIBIÇÃO DE RETROCESSO SOCIAL A presente característica diz respeito à necessidade de que, uma vez adquiridos os direitos humanos, eles não desaparecem por obra do legislador ou dos governantes, sendo proibida a conduta de retirar direitos historicamente alcançados. Ex: Reforma da Previdência e Reforma Trabalhista 2.4. ABRANGÊNCIA DOS DIREITOS INDIVIDUAIS E COLETIVOS - OS DIREITOS FUNDAMENTAIS APLICAM-SE A ESTRANGEIROS NÃO RESIDENTES NO BRASIL? - OS DIREITOS FUNDAMENTAIS SE APLICAM ÀS PESSOAS JURÍDICAS? ATENÇÃO: Vale dizer, de acordo com o caput do art. 5º, que os direitos e garantias fundamentais aplicam-se apenas aos BRASILEIROS e ESTRANGEIROS RESIDENTES NO BRASIL. →NO ENTANTO, de acordo com a doutrina de direitos fundamentais, bem como com a jurisprudência do STF, os direitos são extensíveis a estrangeiros não residentes e apátridas. Se a prova questionar de acordo com a Constituição, a alternativa correta diz respeito à impossibilidade de direitos fundamentais a estrangeiros não residentes, mas se mencionar o entendimento do STF, a resposta é pela extensão de direitos e deveres individuais e coletivos inclusive a estrangeiros e apátridas. Nesse sentido, observe o entendimento de Pedro Lenza: Nada impediria, portanto, que um estrangeiro, de passagem pelo território nacional, ilegalmente preso, impetrasse habeas corpus (art, 5º, LXVIII) para proteger o seu direito de ir e vir. Deve-se observar, é claro, se o direito garantido não possui alguma especificidade, como ação popular, que só pode ser proposta por cidadão. (Lenza, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 20ª ed. 2016) No mesmo sentido, isto é, pela aplicabilidade de alguns direitos fundamentais a estrangeiros, transcrevemos as palavras de Paulo Gustavo Gonet Branco: O caput do art. 5º reconhece os direitos fundamentais “aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País”. A norma suscita a questão de saber se os estrangeiros não residentes estariam alijados da titularidade de todos os direitos fundamentais. A resposta deve ser negativa. A declaração de direitos fundamentais da Constituição abrange diversos direitos que radicam diretamente no princípio da dignidade do homem – princípio que o art. 1º, III, da Constituição Federal toma como estruturante do Estado Democrático de Direito. O respeito à dignidade de todos os homens não se excepciona pelo fator meramente circunstancial da nacionalidade. (Branco, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 8ª ed. P. 173). Por fim, no que se refere à aplicação dos direitos fundamentais às pessoas jurídicas, demonstramos o entendimento do mesmo autor acima citado, segundo o qual: Não há, em princípio, impedimento insuperável a que pessoas jurídicas venham, também, a ser consideradas titulares de direitos fundamentais, não obstante estes, originalmente, terem por referência a pessoa física. Acha- se superada a doutrina de que os direitos fundamentais se dirigem apenas às pessoas humanas. (...) Assim, não haveria por que recusar às pessoas jurídicas as consequências do princípio da igualdade, nem o direito de resposta, o de propriedade, o sigilo de correspondência, a inviolabilidade de domicílio, as garantias do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da coisa julgada. (Branco, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 8ª ed. P. 171/172) 2.5. TEORIA DOS 4 STATUS DO INDIVÍDUO PERANTE O ESTADO - JELLINEK STATUS ATIVO: O indivíduo pode influenciar na vontade do Estado (Direitos Políticos); STATUS PASSIVO: O indivíduo tem deveres em relação ao Estado; STATUS POSITIVO: O indivíduo tem que exigir que o Estado atue para lhe garantir direitos (Direitos sociais – 2ª geração) STATUS NEGATIVO: O indivíduo tem um espaço que o Estado não pode penetrar, são as liberdades negativas (inviolabilidade domiciliar, inviolabilidade de dados) 2.6. EFICÁCIA VERTICAL E HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS - E A EFICÁCIA DIAGONAL EXISTE? A doutrina clássica apregoa que os direitos humanos são direitos que as pessoas detém em face do Estado, num primeiro momento proibindo que este invada a liberdade individual dos cidadãos, e em seguida exigindo- se desse mesmo Estado uma prestação positiva individual e, por fim, prestações de natureza coletiva. Essa é a denominada EFICÁCIA VERTICAL DOS DIREITOS HUMANOS FUNDAMENTAIS. Por outro lado, tem-se a EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS, segundo a qual, os direitos humanos fundamentais passariam a ser aplicados não apenas na relação ESTADO X PESSOA FÍSICA OU JURÍDICA PRIVADA, mas também na relação entre PESSOA PRIVADA X PESSOA PRIVADA. Para corroborar o que se disse acima, colacionamos o entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca da EFICÁCIA HORIZONTAL dos direitos humanos fundamentais: EMENTA: SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIÃO BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. RECURSO DESPROVIDO. I. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados. II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES À AUTONOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-constitucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República, notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias fundamentais. O espaço de autonomiaprivada garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais. III. SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. ENTIDADE QUE INTEGRA ESPAÇO PÚBLICO, AINDA QUE NÃO-ESTATAL. ATIVIDADE DE CARÁTER PÚBLICO. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.APLICAÇÃO DIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS À AMPLA DEFESA E AO CONTRADITÓRIO. As associações privadas que exercem função predominante em determinado âmbito econômico e/ou social, mantendo seus associados em relações de dependência econômica e/ou social, integram o que se pode denominar de espaço público, ainda que não-estatal. A União Brasileira de Compositores - UBC, sociedade civil sem fins lucrativos, integra a estrutura do ECAD e, portanto, assume posição privilegiada para determinar a extensão do gozo e fruição dos direitos autorais de seus associados. A exclusão de sócio do quadro social da UBC, sem qualquer garantia de ampla defesa, do contraditório, ou do devido processo constitucional, onera consideravelmente o recorrido, o qual fica impossibilitado de perceber os direitos autorais relativos à execução de suas obras. A vedação das garantias constitucionais do devido processo legal acaba por restringir a própria liberdade de exercício profissional do sócio. O caráter público da atividade exercida pela sociedade e a dependência do vínculo associativo para o exercício profissional de seus sócios legitimam, no caso concreto, a aplicação direta dos direitos fundamentais concernentes ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, CF/88). IV. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. (RE 201819, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 11/10/2005, DJ 27-10-2006 PP-00064 EMENT VOL-02253-04 PP-00577 RTJ VOL-00209-02 PP-00821) A título de fixação do assunto, inserimos abaixo quadro com as duas teorias, da eficácia vertical e horizontal, extraída do livro Direito Constitucional de Pedro Lenza: A doutrina ainda menciona a teoria da eficácia diagonal, pela qual a relação também é entre particulares, mas nesse caso numa relação de desigualdade, a exemplo da relação entre empregador e empregado ou fornecedor e consumidor. 2.7. DIREITOS X GARANTIAS ATENÇÃO, na Constituição Federal, nota-se a existência de Direitos e Garantias, como por exemplo, a liberdade religiosa (DIREITO) e a proteção aos locais de culto (GARANTIA). 2.8. DIREITOS INDIVIDUAIS E COLETIVOS EM ESPÉCIE DIREITO À VIDA – Art. 5º, caput, da CF/88 A vida aqui tratada compreende o direito de não ser morto, de não ser privado da vida, direito de continuar vivo e direito à vida digna, devendo o caput do art. 5º da Constituição ser interpretado de forma ampla. Assim, como exceção ao direito de não ser morto, tem-se a possibilidade da aplicação de pena de morte, em caso de guerra declarada, conforme permitida no art.5º, XLVII, “a” da CF/88. INÍCIO DA VIDA: De acordo com o art. 2º do Código Civil, a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Assim, cabe destacar o julgamento do STF pela possibilidade de pesquisas em células-tronco embrionárias, no julgamento da ADI 3.510, entendendo que a Lei de Biossegurança (11.105 de 2005) que permite a pesquisa não era inconstitucional, e que não feria o direito à vida na Constituição Federal, já que o embrião a ser pesquisado não estaria inserido no útero materno. Não há norma no direito brasileiro fixando o início da vida, tendo em vista a complexidade de demarcação desse momento delicado. Porém, a lei n. 9.434/1997 e a Resolução n. 1.480/1997 do Conselho Federal de Medicina consideram que um indivíduo está morto quando cessa completamente sua atividade cerebral, isto é, com a morte encefálica. Em face disso, o Supremo Tribunal Federal entendeu pela possibilidade de interrupção da gravidez quando restar comprovada a anencefalia do feto, conforme restou decidido pela ADPF 54, tendo em vista que, se não cérebro no feto anencéfalo, e o aborto é crime contra a vida, não haveria crime na interrupção da gravidez de feto anencéfalo, em face da inexistência de vida. • DE NÃO SER MORTO DIREITO À VIDA • DE VIVER COM DIGNIDADE DIREITO À VIDA Também não é possível a prática da EUTANÁSIA, que consiste no fato de apressar a morte do paciente que se encontra em situação irreversível e incurável, com intensos sofrimentos físicos ou mentais, com a intenção de acabar o sofrimento do paciente e da família. Vale salientar, que alguns tratados internacionais de direitos humanos, como por exemplo o Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos), protege o direito à vida DESDE A CONCEPÇÃO, isto é, desde o encontro do espermatozoide com o óvulo, conforme abaixo ilustrado: 2.8. IGUALDADE: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição COMENTÁRIOS: A igualdade presente no caput do art. 5º diz respeito À igualdade meramente formal (perante a lei), mas a Constituição exige não apenas esse tipo de igualdade, mas, por outro lado, a igualdade material, tendo em vista que, de acordo com o inciso I do art. 5º, homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. A República Federativa do Brasil não busca apenas a igualdade, conforme descrita no caput do art. 5º, mas, outrossim, a igualdade material ou isonomia material, esta consubstanciada no inciso acima citado. IGUALDADE FORMAL: EXPRESSÃO TODOS SÃO IGUAIS PERANTE A LEI IGUALDADE MATERIAL: HIPÓTESES NAIS QUAIS HAVERÁ UMA DISCRIMINAÇÃO POSITIVA, NO SENTIDO DE TORNAL DESIGUAL UMA SITUAÇÃO DESIGUAL, E TORNAR IGUAL UMA SITUAÇÃO IGUAL. EXEMPLOS: ART. 5º, L da Constituição Federal (PERÍODO DE AMAMENTAÇÃO DA PRESIDIÁRIA); TESTE FÍSICO MENOR PARA MULHERES EM CONCURSO PÚBLICO; COTAS PARA NEGROS EM UNIVERSIDADES PÚBLICAS. JURISPRUDÊNCIA DO STF SOBRE O PRINCÍPIO DA IGUALDADE: LIMITE DE IDADE EM CONCURSO: A vedação constitucional de diferença de critério de admissão por motivo de idade (CF, art. 7º, XXX) é corolário, na esfera das relações de trabalho, do princípio fundamental de igualdade (...), que se estende, à falta de exclusão constitucional inequívoca (como ocorre em relação aos militares – CF, art. 42, § 11), a todo o sistema do pessoal civil. É ponderável, não obstante, a ressalva das hipóteses em que a limitação de idade se possa legitimar como imposição da natureza e das atribuições do cargo a preencher. [RMS 21.046, rel. min. Sepúlveda Pertence, j. 14‑12‑1990, P, DJ de 14‑11‑1991.] LIMITE DE ALTURA EM CONCURSO: Concurso público. Fator altura. Caso a caso, há de perquirir-se a sintonia da exigência, no que implica fator de tratamento diferenciado com a função a ser exercida. No âmbito da polícia, ao contrário do que ocorre com o agente em si, não se tem como constitucional a exigência de altura mínima, considerados homens e mulheres, de um metro e sessenta para a habilitação ao cargo de escrivão, cuja natureza é estritamente escriturária, muito embora de nívelelevado. [RE 150.455, rel. min. Marco Aurélio, j. 15‑12‑ 1998, 2ª T, DJ de 7‑5‑1999.] == AI 384.050 AgR, rel. min. Carlos Velloso, j. 9‑9‑2003, 2ª T, DJ de 10‑10‑2003 CASAMENTO E UNIÃO ESTÁVEL DE PESSOAS DO MESMO SEXO O sexo das pessoas, salvo disposição constitucional expressa ou implícita em sentido contrário, não se presta como fator de desigualação jurídica. Proibição de preconceito, à luz do inciso IV do art. 3º da CF, por colidir frontalmente com o objetivo constitucional de “promover o bem de todos”. Silêncio normativo da Carta Magna a respeito do concreto uso do sexo dos indivíduos como saque da kelseniana “norma geral negativa”, segundo a qual “o que não estiver juridicamente proibido, ou obrigado, está juridicamente permitido”. (...) Ante a possibilidade de interpretação em sentido preconceituoso ou discriminatório do art. 1.723 do CC, não resolúvel à luz dele próprio, faz-se necessária a utilização da técnica de “interpretação conforme à Constituição”. Isso para excluir do dispositivo em causa qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como família. Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e com as mesmas consequências da união estável heteroafetiva. [ADI 4.277 e ADPF 132, rel. min. Ayres Britto, j. 5‑5‑2011, P, DJE de 14‑10‑2011 Omissão do Congresso Nacional sobre a CRIMINALIZAÇÃO DA HOMOFOBIA: Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, julgou procedentes os pedidos formulados em ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO) e em mandado de injunção (MI) para reconhecer a mora do Congresso Nacional em editar lei que criminalize os atos de homofobia e transfobia. Determinou, também, até que seja colmatada essa lacuna legislativa, a aplicação da Lei 7.716/1989 (que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor) às condutas de discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero, com efeitos prospectivos e mediante subsunção. Prevaleceram os votos dos ministros Celso de Mello e Edson Fachin, relatores da ADO e do MI, respectivamente (Informativo 931). A corrente majoritária reconheceu, em suma, que a omissão do Congresso Nacional atenta contra a Constituição Federal (CF), a qual impõe, nos termos do seu art. 5º, XLI e XLII (1), inquestionável mandado de incriminação. Entendeu que as práticas homotransfóbicas se qualificam como espécies do gênero racismo, na dimensão de racismo social consagrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do HC 82.424/RS (caso Ellwanger). Isso porque essas condutas importam em atos de segregação que inferiorizam os integrantes do grupo de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transexuais (LGBT), em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero. Considerou, ademais, que referidos comportamentos se ajustam ao conceito de atos de discriminação e de ofensa aos direitos e liberdades fundamentais dessas pessoas. Na ADO, o colegiado, por maioria, fixou a seguinte tese: “1. Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08.01.1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”); 2. A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero; 3. O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito”. Ficaram vencidos, em ambas as ações, os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Marco Aurélio. Os dois primeiros conheceram em parte das ações e as julgaram parcialmente procedentes apenas para reconhecer a mora legislativa e dar ciência ao Congresso Nacional para a adoção das providências necessárias. Para eles, não obstante a repugnância que provocam as condutas preconceituosas de qualquer tipo, somente o Poder Legislativo pode criminalizar condutas, sendo imprescindível lei em sentido formal. Portanto, a extensão do tipo penal para abarcar situações não especificamente tipificadas pela norma penal incriminadora atenta contra o princípio da reserva legal (2). O ministro Marco Aurélio inadmitiu o MI, diante dos limites impostos ao exercício, pelo STF, da jurisdição constitucional. Admitiu, em parte, a ADO, para julgar, nessa extensão, improcedente o pedido, por não assentar, peremptoriamente, que se tenha “criminalizar” no vocábulo “punirá”, contido no inciso XLI do art. 5º da CF. Em decorrência disso, não reconheceu a omissão legislativa quanto à criminalização específica da homofobia e da transfobia. Concluiu que, respeitada a liberdade legiferante franqueada ao legislador ordinário, espera-se que a sinalização do STF quanto à necessária proteção das minorias e dos grupos socialmente vulneráveis contribua para a formação de uma cultura livre de todo e qualquer preconceito e discriminação, preservados os limites da separação dos Poderes e da reserva legal em termos penais. (1) CF/1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;” (2) CF/1988: “Art. 5º (...) XXXIX – não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;” ADO 26/DF, rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 13.6.2019. (ADO-26) PRINCÍPIO DA LEGALIDADE GERAL II - ninguém será obrigado a fazerou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei COMENTÁRIOS: O inciso supramencionado disciplina o princípio da legalidade geral ou ampla, isto é, dirigida a todos, ou a quase todos. Assim, ao particular, é possível realizar tudo o que não estiver previsto ou proibido em lei. No entanto, a legalidade dirigida à Administração Pública é diversa, tendo em vista o caput do art. 37 da Constituição, e no âmbito da Administração Pública apenas é possível a conduta ou ato administrativo se houver previsão em lei. PARTICULAR→TUDO QUE NÃO ESTIVER PROIBIDO É PERMITIDO. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (LEGALIDADE ESTRITA)→APENAS PODE FAZER O QUE A LEI EXPRESSAMENTE PREVÊ. PROIBIÇÃO DE TORTURA, TRATAMENTO DESUMANO OU DEGRADANTE III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; COMENTÁRIOS: A Lei n. 9455, de 07 de abril de 1997, regulamentou o inciso acima citado definindo os crimes de tortura, sendo tal crime, de acordo com o inciso XLIII, equiparado a hediondo. Foi com base no inciso acima que o STF aprovou a súmula vinculante n. 11, trazendo como exceção a utilização de algemas. Vale destacar que a vedação à tortura está presente em todos os documentos internacionais de proteção de direitos humanos no âmbito da Organização das Nações Unidas – ONU, bem como nos documentos regionais de proteção aos direitos humanos, como por exemplo na Organização dos Estados Americanos – OEA, da qual o Brasil faz parte. →VEDAÇÃO À TORTURA na Declaração Universal dos Direitos Humanos – DUDH: Art. 5º Ninguém será submetido a tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes →VEDAÇÃO À TORTURA no Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos): Art. 5º 1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua integridade física, psíquica e moral. 2. Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano. VEDAÇÃO À TORTURA no Pacto dos Direitos Civis e Políticos: Art. 7º Ninguém poderá ser submetido à tortura, nem a penas ou tratamento cruéis, desumanos ou degradantes. Será proibido sobretudo, submeter uma pessoa, sem seu livre consentimento, a experiências médias ou cientificas. ATENÇÃO: A PROIBIÇÃO DE TORTURA É UM DOS POUCOS DIREITOS FUNDAMENTAIS QUE É ABSOLUTO DIREITO À PRIVACIDADE – Art. 5º, X e XI X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; COMENTÁRIOS: A intimidade é algo relacionado ao íntimo das pessoas, às relações mais próximas de amizade e familiares, que não podem ser publicizadas. Já a vida privada ou privacidade, diz respeito a acontecimentos e relacionamentos pessoais em geral, às relações comerciais e profissionais que o indivíduo não deseja que se espalhem ao conhecimento público. Sigilo Bancário: No que se refere ao tema da intimidade e vida privada, o sigilo bancário entre em cena, pois, de acordo com o STF, o sigilo bancário, por regra, deve ser quebrado pela Autoridade Judicial. Dessa forma, de acordo com o STF, a quebra do sigilo bancário pode ser realizada: JUDICIÁRIO: SIM CPI (Federal, Estadual e Distrital): SIM CPI (Municipal): NÃO AUTORIDADE TRIBUTÁRIA FEDERAL: SIM MP: NÃO POLÍCIA JUDICIÁRIA: NÃO XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial Por sua vez, a inviolabilidade do domicílio, como também espécie do direito à privacidade, está prevista no art. 5º, XI da CF/88, acima transcrito, garantindo o direito que o cidadão de não ter sua casa violada, seja pelo Estado, seja por pessoas privadas. Nesse sentido, cabe destacar o CONCEITO JURÍDICO de casa, importante elemento de concretização do direito à inviolabilidade domiciliar. Segundo a doutrina majoritária, o conceito de casa deve ser entendido de forma abrangente, para estender não apenas à moradia propriamente dita, mas qualquer espaço habitado, e em locais nos quais são exercidos atividades profissionais, com exclusão de terceiros, como escritórios, consultórios, estabelecimentos industriais e comerciais (nos locais restritos ao público). Para corroborar o que foi dito acima, colacionamos o entendimento do Supremo Tribunal Federal acerca do assunto: Para os fins da proteção jurídica a que se refere o art. 5º, XI, da CF, o conceito normativo de “casa” revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer aposento de habitação coletiva, desde que ocupado (CP, art. 150, § 4º, II), compreende, observada essa específica limitação espacial, os quartos de hotel. Doutrina. Precedentes. Sem que ocorra qualquer das situações excepcionais taxativamente previstas no texto constitucional (art. 5º, XI), nenhum agente público poderá, contra a vontade de quem de direito (invito domino), ingressar, durante o dia, sem mandado judicial, em aposento ocupado de habitação coletiva, sob pena de a prova resultante dessa diligência de busca e apreensão reputar-se inadmissível, porque impregnada de ilicitude originária. [RHC 90.376, rel. min. Celso de Mello, j. 3‑4‑2007, 2ª T, DJ de 18‑5‑2007 CASA: »compartimento de habitação coletiva »Local de exercício de profissão, não aberto ao público »Escritório de Advocacia e Contabilidade »Quartos de Hotel e Motel No entanto, existem exceções a regra geral da inviolabilidade domiciliar, consistentes na possibilidade de violação para prestar socorro, desastre, flagrante delito, ou durante o dia por determinação judicial e ainda mediante o consentimento do morador. »Consentimento »Prestar socorro »Flagrante delito »Dia por determinação judicial »Desastre DICA: C.P.F.D.D Quanto às situações de desastre e prestar socorro não existem maiores controvérsias, dada a clareza do texto constitucional sobre a sua ocorrência. No entanto, é preciso discorrer sobre a situação de flagrante delito e durante o dia por determinação judicial. No que se refere à situação de flagrância, vale destacar o que dispõe o Código de Processo Penal sobre sua ocorrência e as hipóteses de flagrante delito: Código de Processo Penal Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito. Art. 302. Considera-se em flagrante delito quem: I - está cometendo a infração penal; II - acaba de cometê-la; III - é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração; IV - é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração. Art. 303. Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência. Nas situações supramencionadas, a casa, que é asilo inviolável, poderá ser adentrada, de forma facultativa pelos cidadãos, e obrigatoriamente pela autoridade policial. Por fim, sobre a violação de domicílio no caso de flagrante delito, destaque- se o entendimento do STF, citado por Pedro Lenza, pelo qual: Cabe lembrar, ainda, que o STF, ao julgar o tema 280 da repercussão geral, firmou a tese: “a entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou autoridade, e de nulidade dos atos praticados”. (RE 603.616 – 05.11.2015)Já em relação ao cumprimento de mandado judicial durante o dia, por determinação judicial, cabe dizer que, no que se refere ao conceito do que é dia, a doutrina majoritária se manifesta a favor do critério físico-astronômico, isto é, considera-se dia o período compreendido entre a aurora e o crepúsculo. Por outro lado, a jurisprudência manifesta-se a favor do critério cronológico, ou seja, considerando como o dia o período compreendido entre as 06 e 18 horas. Vale destacar, que a nova Lei de Abuso de Autoridade n. 13.869/2019, dispõe que incorre nas penas do crime do art. 22 (adentrar clandestinamente em residência) QUEM CUMPRE MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO DOMICILIAR APÓS ÀS 21:00 ou ANTES DAS 05:00. Assim, já há entendimento de que a citada lei teria trazido o conceito de dia. No entanto, para fins de prova, é preciso saber como a questão vai cobrar, se de acordo com o entendimento do STF ou se de acordo expressamente com a nova lei de abuso de autoridade, supramencionada. Recentemente, decidiu o STF que: A entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas “a posteriori”, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados. STF. Plenário. RE 603616/RO, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 4 e 5/11/2015 (repercussão geral – Tema 280) (Info 806) Decidiu o STJ, também, que nos casos de hipótese de flagrante: A prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que autorizou o ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato. Em todo caso, a operação deve ser registrada em áudio-vídeo e preservada a prova enquanto durar o processo. STJ. 6ª Turma. HC 598.051/SP, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, julgado em 02/03/2021 (Info 687). Isto é, de acordo com o STJ, é preciso que haja a autorização escrita do morador, bem como que, sempre que possível, haja a gravação da diligência em áudio e vídeo. DIREITOS DE LIBERDADE – Art. 5º, IV, V VI, VII, VIII, IX,XII, XIII, XIV, XV, XVI, XVII 2.11.1. LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO – Art. 5º, IV e V IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem COMENTÁRIOS: A constituição assegurou a liberdade de manifestação do pensando, restando vedado o anonimato. Caso durante a manifestação do pensamento se cause dano material, moral ou à imagem, assegura-se o direito de resposta, proporcional ao agravo, além de indenização. Vale dizer, entretanto, que essa liberdade de expressão não é absoluta, encontrando limites em relação aos direitos alheios e, havendo violação a direitos de outrem, serão assegurados o direito de resposta (art. 5º, V), bem como indenização por dano moral e material (art. 5º, X) Foi com fundamento na liberdade de expressão que o STF decidiu pela legalidade da MARCHA DA MACONHA, isto é, os cidadãos podem sair em marcha pedindo que se libere determinada substância para o uso coletivo, como é o caso da maconha. ADPF 187. A respeito do assunto, verifiquemos as palavras de Marcelo Novelino: Em relação a esse tema, é necessário diferenciar a mera proposta de descriminalização de determinado ilícito penal do ato de incitação à prática de crime ou de apologia de fato criminoso. A defesa, em espaços públicos, da legalização de determinadas condutas (como a prática do aborto ou uso de drogas) ou de proposta abolicionista de um tipo penal, não deve ser caracterizada como ilícito penal, mas, ao contrário, como exercício legítimo do direito à livre manifestação do pensamento, propiciada pelo exercício do direito de reunião. Nesse sentido, o entendimento unânime adotado pelo STF no julgamento referente à denominada “marcha da maconha”. (Novelino, Marcelo. Manual de Direito Constitucional. 8ª ed. P. 503/504) Foi também com fundamento nesse inciso que o STF decidiu sobre a desnecessidade de autorização prévia do biografado, das demais pessoas retratadas na obra, nem de seus familiares, pois essa autorização prévia seria uma forma de censura, não sendo compatível com a liberdade de expressão consagrada pela CF/88. Outra questão acerca da liberdade de expressão, é a possibilidade de INÍCIO DE AÇÃO PENAL OU INQUÉRITO POLICIAL COM BASE EXCLUSIVAMENTE EM DENÚNCIA ANÔNIMA. A jurisprudência do STF admite, conforme acórdão extenso abaixo colacionado, que a DENÚNCIA ANÔNIMA, POR SI SÓ, NÃO PODE DAR INÍCIO À PERSECUÇÃO PENAL, FACE À VEDAÇÃO AO ANONIMATO PRESENTE NO INCISIO IV DO ART. 5 JÁ MENCIONADO: Persecução Penal e Delação Anônima (Transcrições) (v. Informativo 387) Inq 1957/PR* RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO VOTO DO MIN. CELSO DE MELLO: Sabemos, Senhor Presidente, que o veto constitucional ao anonimato, nos termos em que enunciado (CF, art. 5º, IV, “in fine”), busca impedir a consumação de abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e na formulação de denúncias apócrifas, pois, ao exigir-se a identificação de seu autor, visa-se, em última análise, com tal medida, a possibilitar que eventuais excessos derivados de tal prática sejam tornados passíveis de responsabilização, “a posteriori”, tanto na esfera civil quanto no âmbito penal, em ordem a submeter aquele que os cometeu às conseqüências jurídicas de seu comportamento. Essa cláusula de vedação - que jamais deverá ser interpretada como forma de nulificação das liberdades do pensamento - surgiu, no sistema de direito constitucional positivo brasileiro, com a primeira Constituição republicana, promulgada em 1891 (art. 72, § 12). Com tal proibição, o legislador constituinte, ao não permitir o anonimato, objetivava inibir os abusos cometidos no exercício concreto da liberdade de manifestação do pensamento, para, desse modo, viabilizar a adoção de medidas de responsabilização daqueles que, no contexto da publicação de livros, jornais, panfletos ou denúncias apócrifas, viessem a ofender o patrimônio moral das pessoas agravadas pelos excessos praticados, consoante assinalado por eminentes intérpretes daquele Estatuto Fundamental (JOÃO BARBALHO, “Constituição Federal Brasileira - Comentários”, p. 423, 2ª ed., 1924, F. Briguiet; CARLOS MAXIMILIANO, “Comentários à Constituição Brasileira”, p. 713, item n. 440, 1918, Jacinto Ribeiro dos Santos Editor, “inter alia”). Vê-se, portanto, tal como observa DARCY ARRUDA MIRANDA (“Comentários à Lei de Imprensa”, p. 128, item n. 79, 3ª ed., 1995, RT), que a proibição do anonimato tem um só propósito, qual seja, o de permitir que o autor do escrito ou da publicação possa expor-se às conseqüências jurídicas derivadas de seu comportamento abusivo. Nisso consiste, portanto, a “ratio” subjacente à norma, que, inscrita no inciso IV do art. 5º, da Constituição da República, proclama ser “livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (grifei). Torna-se evidente, pois, Senhor Presidente, que a cláusula que proíbe o anonimato - ao viabilizar, “a posteriori”, a responsabilização penal e/ou civil do ofensor - traduz medida constitucional destinada a desestimular manifestações abusivas do pensamento, de que possa decorrer gravame ao patrimônio moral das pessoas injustamente desrespeitadas em sua esfera de dignidade, qualquer que seja o meio utilizado na veiculação das imputações contumeliosas. Esse entendimento é perfilhado por ALEXANDRE DE MORAES (“Constituição do Brasil Interpretada”, p. 207, item n. 5.17, 2002, Atlas), UADI LAMMÊGO BULOS (“Constituição Federal Anotada”, p. 91, 4ª ed., 2002, Saraiva)e CELSO RIBEIRO BASTOS/IVES GANDRA MARTINS (“Comentários à Constituição do Brasil”, vol. 2/43-44, 1989, Saraiva), dentre outros eminentes autores, cujas lições enfatizam, a propósito do tema, que a proibição do anonimato - por tornar necessário o conhecimento da autoria da comunicação feita - visa a fazer efetiva, “a posteriori”, a responsabilidade penal e/ou civil daquele que abusivamente exerceu a liberdade de expressão. Lapidar, sob tal perspectiva, o magistério de JOSÉ AFONSO DA SILVA (“Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 244, item n. 15.2, 20ª ed., 2002, Malheiros), que, ao interpretar a razão de ser da cláusula constitucional consubstanciada no art. 5º, IV, “in fine”, da Lei Fundamental, assim se manifesta: “A liberdade de manifestação do pensamento tem seu ônus, tal como o de o manifestante identificar-se, assumir claramente a autoria do produto do pensamento manifestado, para, em sendo o caso, responder por eventuais danos a terceiros. Daí porque a Constituição veda o anonimato. A manifestação do pensamento não raro atinge situações jurídicas de outras pessoas a que corre o direito, também fundamental individual, de resposta. (...).” (grifei) É inquestionável, Senhor Presidente, que a delação anônima, notadamente quando veicular a imputação de supostas práticas delituosas, pode fazer instaurar situações de tensão dialética entre valores essenciais - igualmente protegidos pelo ordenamento constitucional -, dando causa ao surgimento de verdadeiro estado de colisão de direitos, caracterizado pelo confronto de liberdades revestidas de idêntica estatura jurídica, a reclamar solução que, tal seja o contexto em que se delineie, torne possível conferir primazia a uma das prerrogativas básicas em relação de antagonismo com determinado interesse fundado em cláusula inscrita na própria Constituição. O caso veiculado na presente questão de ordem suscitada pelo eminente Ministro MARCO AURÉLIO pode traduzir, eventualmente, a ocorrência, na espécie, de situação de conflituosidade entre direitos básicos titularizados por sujeitos diversos. Com efeito, há, de um lado, a norma constitucional, que, ao vedar o anonimato (CF, art. 5º, IV), objetiva fazer preservar, no processo de livre expressão do pensamento, a incolumidade dos direitos da personalidade (como a honra, a vida privada, a imagem e a intimidade), buscando inibir, desse modo, delações de origem anônima e de conteúdo abusivo. E existem, de outro, certos postulados básicos, igualmente consagrados pelo texto da Constituição, vocacionados a conferir real efetividade à exigência de que os comportamentos individuais, registrados no âmbito da coletividade, ajustem-se à lei e mostrem-se compatíveis com padrões ético-jurídicos decorrentes do próprio sistema de valores que a nossa Lei Fundamental consagra. Assentadas tais premissas, Senhor Presidente, entendo que a superação dos antagonismos existentes entre princípios constitucionais há de resultar da utilização, pelo Supremo Tribunal Federal, de critérios que lhe permitam ponderar e avaliar, “hic et nunc”, em função de determinado contexto e sob uma perspectiva axiológica concreta, qual deva ser o direito a preponderar no caso, considerada a situação de conflito ocorrente, desde que, no entanto, a utilização do método da ponderação de bens e interesses não importe em esvaziamento do conteúdo essencial dos direitos fundamentais, tal como adverte o magistério da doutrina (DANIEL SARMENTO, “A Ponderação de Interesses na Constituição Federal” p. 193/203, “Conclusão”, itens ns. 1 e 2, 2000, Lumen Juris; LUÍS ROBERTO BARROSO, “Temas de Direito Constitucional”, p. 363/366, 2001, Renovar; JOSÉ CARLOS VIEIRA DE ANDRADE, “Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976”, p. 220/224, item n. 2, 1987, Almedina; FÁBIO HENRIQUE PODESTÁ, “Direito à Intimidade. Liberdade de Imprensa. Danos por Publicação de Notícias”, in “Constituição Federal de 1988 - Dez Anos (1988-1998)”, p. 230/231, item n. 5, 1999, Editora Juarez de Oliveira; J. J. GOMES CANOTILHO, “Direito Constitucional”, p. 661, item n. 3, 5ª ed., 1991, Almedina; EDILSOM PEREIRA DE FARIAS, “Colisão de Direitos”, p. 94/101, item n. 8.3, 1996, Fabris Editor; WILSON ANTÔNIO STEINMETZ, “Colisão de Direitos Fundamentais e Princípio da Proporcionalidade”, p. 139/172, 2001, Livraria do Advogado Editora; SUZANA DE TOLEDO BARROS, “O Princípio da Proporcionalidade e o Controle de Constitucionalidade das Leis Restritivas de Direitos Fundamentais”, p. 216, “Conclusão”, 2ª ed., 2000, Brasília Jurídica). Tenho para mim, portanto, Senhor Presidente, em face do contexto referido nesta questão de ordem, que nada impedia, na espécie em exame, que o Poder Público, provocado por denúncia anônima, adotasse medidas informais destinadas a apurar, previamente, em averiguação sumária, “com prudência e discrição” (JOSÉ FREDERICO MARQUES, “Elementos de Direito Processual Penal”, vol. I/147, item n. 71, 2ª ed., atualizada por Eduardo Reale Ferrari, 2000, Millennium), a possível ocorrência de eventual situação de ilicitude penal, com o objetivo de viabilizar a ulterior instauração de procedimento penal em torno da autoria e da materialidade dos fatos reputados criminosos, desvinculando-se a investigação estatal (“informatio delicti”), desse modo, da delação formulada por autor desconhecido, considerada a relevante circunstância de que os escritos anônimos – aos quais não se pode atribuir caráter oficial - não se qualificam, por isso mesmo, como atos de natureza processual. Disso resulta, pois, a impossibilidade de o Estado, tendo por único fundamento causal a existência de tais peças apócrifas, dar início, somente com apoio nelas, à “persecutio criminis”. Daí a advertência consubstanciada em julgamento emanado da E. Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em que esse Alto Tribunal, ao pronunciar-se sobre o tema em exame, deixou consignado, com absoluta correção, que o procedimento investigatório não pode ser instaurado com base, unicamente, em escrito anônimo, que venha a constituir, ele próprio, a peça inaugural da investigação promovida pela Polícia Judiciária ou pelo Ministério Público: “INQUÉRITO POLICIAL. CARTA ANÔNIMA. O Superior Tribunal de Justiça não pode ordenar a instauração de inquérito policial, a respeito de autoridades sujeitas à sua jurisdição penal, com base em carta anônima. Agravo regimental não provido.” (Inq 355-AgR/RJ, Rel. Min. ARI PARGENDLER - grifei) Vale referir, no ponto, o douto voto que o eminente Ministro ARI PARGENDLER, Relator, proferiu no mencionado julgamento: “O artigo 5º, item IV, da Constituição Federal garante a livre manifestação do pensamento, mas veda o anonimato. A carta anônima de fls. 3 e verso não pode, portanto, movimentar polícia e justiça sem afrontar a aludida norma constitucional.” (grifei) É interessante observar que, na Itália, quer sob a égide do antigo Código de Processo Penal de 1930, editado em pleno regime fascista (art. 141), quer sob o novo estatuto processual penal promulgado em 1988 (arts. 240 e 333, nº 3), a legislação processual peninsular contém disposições restritivas no que concerne aos “documenti anonimi”, às “denunce anonime” ou aos “scritti anonime”, estabelecendo que os documentos e escritos anônimos não podem ser formalmente incorporados ao processo, não se qualificam como atos processuais e deles não se pode fazer qualquer uso processual, salvo quando constituírem o próprio corpo de delito ou quando provierem do acusado. Revela-se expressivo, sob tal aspecto, o que hoje dispõe o vigente Código de Processo Penal italiano (1988), em seu art. 240, que tem o seguinte teor: “240. Documenti anonimi. – 1. I documenti che contengono dichiarazioni anonime non possono essere acquisiti né in alcun modo utilizzati salvo che costituiscano corpo del reato o provengano comunque dall’imputato.” Como já assinalado, o velho Código de Processo Penal fascista
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