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ciencia criminal

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1UNIDADE 1Ciências Criminais e Criminologia: Conceito e campo 
de atuação
Objetivos de aprendizagem
 � Compreender a importância da disciplina 
“Criminologia” para as Ciências Criminais e conhecer a 
Criminologia enquanto ciência do âmbito criminal nos 
seus aspectos históricos.
 � Entender a criminologia como fundamento para a 
compreensão do Sistema Penal e das Estruturas de 
Controle Dominantes.
 � Conhecer a evolução do pensamento criminológico e 
suas principais correntes.
 � Conhecer as tendências da criminologia na 
contemporaneidade. 
Seções de estudo
Seção 1 As Ciências Criminais
Seção 2 A Criminologia 
Seção 3 Criminologia e Segurança Pública 
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Para início de estudo
Liberdade, segurança e democracia são temas que cada vez 
mais têm dominado a pauta dos debates nas sociedades 
contemporâneas.
Com as transformações sociais e tecnológicas, a 
contemporaneidade trouxe também como herança a necessidade 
de um conjunto de atuações capazes de fazer frente às mais 
variadas expressões de violência que afligem a todos - do 
contexto local ao global - o que exige novas análises e estudos 
que permitam a compreensão teórico-empírica dos fenômenos, 
com destaque para os conflitos, as ameaças e os riscos 
comprometedores da construção da paz social e da convivência 
cidadã. 
Nesse sentido, iremos abordar, nessa primeira unidade de 
estudos, a conjuntura das ciências criminais e sua importância 
para dar suporte para ações no âmbito da segurança num Estado 
Democrático de Direito.
Conheceremos o pensamento criminal a partir do movimento 
iluminista (cujas correntes foram denominadas de “Escolas 
Criminais”), destacando o surgimento da Criminologia enquanto 
ciência, seus conceitos, evolução e perspectivas na busca de 
desvendar a questão do “crime” e seus múltiplos aspectos. 
Por fim, estabeleceremos as correlações existentes entre os 
estudos da Criminologia e o Sistema de Justiça Criminal, de 
forma que se perceba o papel do Sistema Penal e das Estruturas 
de Controle Dominantes, do legal ao real, em nossa sociedade.
Bom início de jornada, de novas reflexões e de estudos!
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Ciência Criminal
Unidade 1
Seção 1 – A Ciência Criminal
“Conhecer os crimes, refletir sobre eles, refletir sobre a 
ordem jurídica, eis como se pode construir uma ordem 
pública, construir uma convivência social boa, facilitando 
o trabalho da polícia e concorrendo eficazmente para a 
prevenção da criminalidade.” 
 
Carlos Magno Nazareth Cerqueira
As ciências criminais abrangem estudos que visam a 
compreensão da violência - com destaque para o fenômeno do 
crime e sua complexidade - e das respostas que a sociedade e o 
Estado vêm buscando no sentido de preveni-la ou reduzir seus 
efeitos para a convivência pacífica e cidadã entre as pessoas.
Possui um caráter interdisciplinar e multifacetado na medida 
em que recorre e interage com as ciências, destacadamente a 
criminologia, envolvendo ainda o direito penal e processual 
penal, a psiquiatria, a antropologia, a sociologia, a ciência política 
e a filosofia, cujas problemáticas convergem para o interesse 
comum de compreensão dos conflitos em nossa sociedade.
O desenvolvimento nas mais variadas áreas das ciências - com 
novas formas de “pensar”, de “conhecer”, e de “agir” - aliado 
às novas tecnologias se incorporam ao cotidiano das pessoas, 
e ensejam a necessidade de adequação dos instrumentos do 
Estado no sentido de que novas formas de governança possam 
assegurar o exercício da liberdade, da igualdade e da cidadania, 
num cenário do local ao global de integração e paz social. 
A ciência criminal tem um papel relevante nesse contexto, de 
análise, pesquisas e estudos sobre a violência, pois se trata de um 
problema mundial e que vem acompanhando a trajetória histórica 
da humanidade em busca da “civilização” e do ideário utópico da 
“paz social” - razão pela qual auxilia na compreensão da vida em 
sociedade e dos conflitos em seus aspectos mais fundamentais.
As exigências por mais segurança têm dominado os debates, 
num momento em que os instrumentos jurídicos de regulação 
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social no âmbito penal não têm surtido os necessários efeitos de 
manutenção da ordem pública, o que tem levado à necessidade 
de revisão das políticas criminais que não fiquem somente no 
plano punitivo, mas que permitam outras formas de intervenção 
nos conflitos em que predominem valores constitucionais na 
proteção dos bens jurídicos individuais e supra-individuais.
Cabe elucidar que “ordem pública” compreende o 
seguinte: 
[...] conjunto de regras formais, que  
emanam do ordenamento jurídico da 
Nação, tendo por escopo regular as 
relações  sociais de todos os níveis, do 
interesse público, estabelecendo um 
clima de  convivência harmoniosa e 
pacífica, fiscalizado pelo Poder de Polícia, 
e  constituindo uma situação ou condição 
que conduza ao bem  comum. (Art. 2°, 
inciso 21 do Dec. Fed. Nº 88777/83)
Estudos apontam que a insuficiência da atuação do Estado em 
outras áreas de atendimento às necessidades humanas (como 
educação, saúde, lazer, promoção social, infraestrutura urbana), 
tem levado à busca de mediação pela judicialização dos 
conflitos, em que a ciência criminal e a via punitiva têm servido 
como maior esteio.
O campo de atuação da ciência criminal abrange a dogmática 
penal, a política criminal e a criminologia, que tem como 
objetivo a defesa do Estado, da sociedade e do cidadão, visando 
prevenir a prática de atos que impliquem em violência.
A Dogmática Penal compreende o Direito Penal e o Direito 
Processual Penal, que apresentam limitações ao exercício das 
liberdades individuais e coletivas em nome da convivência 
pacífica e manutenção da ordem pública.
O Direito Penal, segundo Fernando Capez, 
É o segmento do ordenamento jurídico que detém a 
função de selecionar os comportamentos humanos mais 
graves e perniciosos à coletividade, capazes de colocar em 
Por mediação entende-se toda a 
intervenção que vise a composição 
de conflitos entre partes que 
possuem interesses antagônicos, 
buscando soluções possíveis 
construídas pelos envolvidos, 
de maneira que ocorra um 
acordo consensual e pacífico. Na 
judicialização, o Estado se apropria 
dos conflitos e dita as regras, 
havendo, via de regra, sempre um 
ganhador e um perdedor, sendo que 
na esfera criminal, a resposta tem 
sido a criminalização. 
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Ciência Criminal
Unidade 1
risco valores fundamentais para a convivência social, e 
descrevê-los como infrações penais, cominando-lhes, em 
consequência, as respectivas sanções, além de estabelecer 
todas as regras complementares e gerais necessárias à sua 
correta e justa aplicação. (CAPEZ, 2008, p. 1) 
Assim, sempre que houver um ato atentatório contra os bens mais 
importantes da vida em sociedade, o Direito Penal se apresenta 
como o instrumento do Estado para a segurança das relações 
sociais pela via da aplicação de sanções, em que a pena é o meio 
de satisfação da justiça para aquele que transgride, visando não 
apenas a punição pelo mal causado, mas sua recuperação social.
Ocorre que, muito embora haja a necessidade do Direito Penal como 
recurso para a preservação do bem comum, atualmente o sistema de 
direito penal está em crise. Conforme Heleno Claúdio Fragoso:
Põe-se em dúvida o efeito preventivo do sistema punitivo, 
e sabe-se que não é possível emendar o criminoso através 
da pena. Verifica-se que a prisão necessariamente avilta, 
deforma a personalidade e corrompe o condenado. O 
exame da administração da justiça criminal revelou que 
o sistema funciona de forma seletiva, profundamente 
injusta e opressiva. Há evidente incongruência entre 
as aparências do magistério punitivo e suas dramáticas 
realidades. (FRAGOSO, 2008, p. 5) 
Muito embora o sistemapenal esteja em crise, ainda assim ele 
se apresenta como um meio de justiça em razão de sua função 
ético-social de não apenas punir quem transgride, mas também 
de proteger os bens e valores necessários à vida em sociedade (tais 
como a vida, a saúde, a propriedade, a liberdade, a dignidade e o 
meio ambiente). O Código Penal e as leis penais esparsas, como a 
Lei de Tóxicos, Lei de Proteção Ambiental, Lei Maria da Penha, 
Estatuto da Criança e do Adolescente, dentre outras, dão os 
contornos do Direito Penal em nosso país.
Desse modo, o Direito Penal deve refletir os anseios sociais em 
torno do que é justo, refreando condutas que apresentem perigo 
ao convívio, e não um instrumento opressor em defesa do Estado, 
razão pela qual ampara-se em alguns princípios:
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1. Legalidade – só é crime o que previamente for concebido 
como tal.
2. Insignificância – tutela de bens jurídicos relevantes e que 
merecem proteção. 
3. Alteridade – leva em consideração a especificidade da 
pessoa humana.
4. Confiança – instrumento capaz de fazer frente à 
violência.
5. Adequação social – regular condutas que comprometam 
realmente o convívio social.
6. Intervenção mínima – aplicação somente em casos em 
que não se tenha outra medida possível.
7. Fragmentariedade – concorre com outras medidas.
8. Proporcionalidade – a pena deve ser aplicada na justa 
medida, sem excessos.
9. Humanidade – o sistema penal deve possuir um 
ambiente que permita a reinserção social do apenado.
10. Necessidade – a pena deve ser medida extrema a ser 
aplicada a quem transgride.
11. Ofensividade – a violação ao direito deve ser relevante.
Deve se perceber que muito embora o Direito Penal ainda 
seja uma estrutura necessária ao Estado e à sociedade, o crime 
não é apenas fenômeno jurídico, mas sócio-político, em que a 
estrutura social e outros fatores como o econômico favorecem 
sua intercorrência, devendo-se ter a consciência de que a 
judicialização penal dos conflitos não basta para se evitá-los. 
O Processo Penal nasce no contexto histórico e social como 
forma de composição e solução de conflitos visando eliminar 
a força e a autodefesa, em que o Estado interfere visando a 
conciliação entre os envolvidos.
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Ciência Criminal
Unidade 1
Nesse sentido, cabe destacar que: 
(...) Nos seus primeiros anos, todos os poderes se 
enfeixavam nas mãos de uma só pessoa, como no 
regime tribal, ou na família de tipo patriarcal. Depois, 
com o crescimento do agrupamento humano, por 
certo houve necessidade de distribuição de funções, e, 
finalmente, num estágio mais avançado, os órgãos que 
desempenhavam as funções mais importantes, as funções 
básicas, atingiram a posição de Poderes. (...) Para atingir 
a seus fins, as funções básicas do Estado – legislativa, 
administrativa e jurisdicional – foram entregues a órgãos 
distintos: Legislativo, Executivo e Judiciário. Três, pois, 
os órgãos que se altearam a Poderes. (TOURINHO 
FILHO, 2009, p.1) 
Ao Estado atribuiu-se a função de intervir nos conflitos e 
intermediar a composição por meio do Poder Judiciário. No 
âmbito penal, somente o Estado poderá responsabilizar alguém 
pela prática de um fato crime, ou seja, punir, impingindo ao 
infrator a pena após confirmar-se sua responsabilidade, o que 
se fará mediante um processo, o “processo penal”. “O processo 
penal é um caminho para se chegar, legitimamente, à pena.” 
(LOPES JÚNIOR, 2008, p. 9)
Desse modo, quando alguém comete um fato que é considerado 
crime, as estruturas do Estado se mobilizam. Inicialmente o 
Poder Executivo, com a ação de suas polícias, realizando a prisão 
do infrator (se couber) e apurando, mediante uma investigação 
criminal, a comprovação da autoria do ilícito e examinando as 
provas necessárias para a responsabilização do autor do fato. A 
seguir, o Ministério Público promove a ação penal e esclarece 
sua pretensão com base nas provas obtidas pela polícia. Feito 
isso, o processo é encaminhado para o Juiz que ouve as partes – 
Ministério Público e acusado (MP) - e analisa o material produzido 
para aplicar, se for o caso, a pena ou então absolver o acusado. 
Em síntese, este é o processo. 
Cabe observar que existem também outras situações como, 
por exemplo, a prevista na Lei 8099/95 (que trata dos crimes 
de menor gravidade), em que se dá a opção ao particular a 
legitimidade para demonstrar o interesse na execução penal, 
Órgão independente, 
essencial à função 
jurisdicional incumbido da 
“defesa da ordem jurídica, 
do regime democrático 
e dos interesses sociais e 
individuais indisponíveis”.
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podendo o ofendido conceder o perdão a quem o agrediu ou 
violou um direito seu tutelado penalmente. Pode-se citar também 
alguns exemplos do Código Penal, como o caso de estupro, 
previsto no artigo 225, em que o Ministério Público somente 
atua se houver representação da vítima (salvo se for menor de 18 
anos, em que a ação será pública incondicionada, ou seja, não 
exigirá representação). Não obstante, manifestado o interesse 
do particular em começar a ação, o Ministério Público dará 
seguimento ao processo, mas o direito de punir, em qualquer 
caso, sempre caberá ao Estado.
Outra situação de excepcionalidade é aquela em que a pessoa 
pode decidir ou não pela proposta da ação penal, conforme seu 
juízo e avaliação, nos crimes chamados de ação privada, em que 
pesam outros interesses do ofendido, como, por exemplo, nos 
seguintes casos:
 � Crimes contra a honra: calúnia, injúria e difamação 
previstos nos artigos 138 a 140 do Código Penal;
 � Violação de direito autoral - artigo 184 do Código Penal;
 � Induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento 
– artigo 236 do Código Penal.
Nos crimes de ação penal privada, a peça inicial se chama de 
“queixa”, e na ação penal pública, quando o MP a impulsiona, 
se chama “denúncia”.
Por fim, tem-se o caso em que o particular pode também entrar 
com a ação penal quando houver incapacidade do MP, ou seja, 
quando ele não começa a ação nos prazos fixados em lei. Neste 
caso, o particular pode oferecer a queixa substitutiva da denúncia, 
muito embora o MP deva tomar ciência dos autos e retomar a 
titularidade da ação. 
O processo penal é garantidor não apenas das medidas 
necessárias por parte do Estado, como apurar, prevenir, reprimir 
e, eventualmente, responsabilizar quem tenha praticado uma 
conduta criminosa, mas também das garantias formais aos 
acusados pela prática destes atos definidos como crimes em nosso 
ordenamento jurídico. 
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Ciência Criminal
Unidade 1
Cabe destacar que a constituição da República Federativa do 
Brasil de 1988 – CRFB 1988 – no seu título II, artigo 5°, que 
trata “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, prevê algumas 
regras que visam preservar o respeito à dignidade da pessoa 
humana e o direito à liberdade dos acusados, conforme se 
depreende dos seguintes enunciados:
 � não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem 
prévia cominação legal;
 � a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou 
ameaça a direito;
 � a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;
 � ninguém será processado nem sentenciado senão pela 
autoridade competente;
 � ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o 
devido processo legal;
 � aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos 
acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla 
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
 � são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios 
ilícitos;
 � ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado 
de sentença penal condenatória; (CRFB, 1988)
A persecução penal é uma obrigação do Estado e visa, portanto, 
investigar e apurar o ato considerado criminoso e imputar, ou 
isentar,alguém de responsabilidade - observadas as formalidades 
legais - a fim de que a segurança e o respeito ao Estado de 
Direito sejam preservados. 
A política criminal se insere no contexto das ciências criminais 
tendo como objeto de estudo a questão dos meios e recursos 
para fazer frente à criminalidade, buscando suporte teórico nos 
estudos criminológicos e fazendo análises sobre os sistemas 
punitivos vigentes. 
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Para Zaffaroni:
A Política Criminal é a ciência ou a arte de selecionar 
os bens (ou direitos) que devem ser tutelados jurídica 
e penalmente e escolher os caminhos para efetivar tal 
tutela, o que iniludivelmente implica a crítica dos valores 
e caminhos já eleitos. (ZAFFARONI, 1999:132)
Ocorre que o sistema de justiça criminal tem se apresentado 
como um instrumento de exclusão, em que, de forma recorrente, 
a mediação dá lugar à judicialização dos conflitos pela 
criminalização e pela crescente geração de novos estereótipos de 
“criminosos”. 
A política criminal tem um importante papel no sentido de 
proposição de alternativas ao que “está posto” como verdade, 
pois a concepção pautada apenas no controle social pela via da 
punição tem reproduzido a violência, ao invés de preveni-la. 
Sérgio Adorno nos elucida essa questão ao afirmar que: 
Não são poucos os estudos que reconhecem a 
incapacidade do sistema de justiça criminal, no Brasil 
– agências policiais, ministério público, tribunais de 
Justiça e sistema penitenciário–, em conter o crime e a 
violência respeitados os marcos do Estado democrático 
de Direito. O crime cresceu e mudou de qualidade, 
porém, o sistema de Justiça permaneceu operando como 
há três ou quatro décadas. Em outras palavras, aumentou 
sobremodo o fosso entre a evolução da criminalidade e da 
violência e a capacidade do Estado de impor lei e ordem. 
(ADORNO, 2002) 
Cabe destacar ainda que: 
A política criminal, enquanto programa de controle 
do crime e da criminalidade, no Brasil, influenciada 
pelo modelo norte-americano, se configura como mera 
política penal, pois ”exclui políticas públicas de emprego, 
salário, escolarização, moradia, saúde e outras medidas 
complementares, como programas oficiais capazes 
de alterar ou reduzir as condições sociais adversas da 
população marginalizada do mercado de trabalho e dos 
direitos de cidadania, definíveis como determinações 
estruturais do crime e da criminalidade“. (SILVEIRA 
FILHO, 2007, p. 346) 
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Ciência Criminal
Unidade 1
Desse modo, a política criminal, enquanto ciência, precisa 
promover a revisão dos paradigmas vigentes que permeiam 
as ações do sistema de justiça criminal, em que predomina 
a expansão do controle punitivo e o aumento dos índices 
de encarceramento, o que tem redundado na reprodução 
das violências, quer no plano macrossocial como resultante 
de um modelo de sociedade desigual, como na esfera das 
individualidades, o que traz também como consequência 
a deslegitimação e desestruturação do chamado “Estado 
Democrático de Direito”. 
A criminologia, enquanto ciência criminal, é a ciência 
surgida no século XIX, segundo alguns autores, pela fusão da 
Antropologia com o pensamento sociológico, e se ocupa do 
estudo das teorias do direito criminal, das causas do fenômeno 
criminal (e de suas características), da sua prevenção e do controle 
de sua incidência, tendo um caráter interdisciplinar e abrangente 
de outras disciplinas e ciências, tais como o Direito, a Psicologia, 
a Psiquiatria, a Medicina, a Sociologia e a Antropologia.
O campo de estudo e atuação da criminologia tem tido definições 
que, apesar de convergirem para um mesmo objeto – o homem, 
o crime, o criminoso, os fatores criminógenos e os mecanismos 
de controle social – conceitualmente apresentam suas variáveis, 
como se percebe nos conceitos apontados por João Antônio 
Medeiros Vieira, tais como: 
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Amaral Fontoura: “a Criminologia estuda todos os fenômenos 
referentes ao crime - causas, efeitos, constituição mórbida dos 
criminosos, estatística de crimes etc., sendo a Sociologia Criminal 
parte integrante da mesma.”
Paulo Dourado Gusmão: “entende que a Criminologia estuda 
o homem criminoso, o delinquente e o crime em seu aspecto 
psíquico-social, fundada exclusivamente em métodos científicos, 
alheada das definições e das categorias jurídico-penais.”
Basileu Garcia: “a criminologia engloba o objeto da Biologia 
Criminal (compreendidas a Antropologia Criminal propriamente 
dita, a Psicologia Criminal e a Psiquiatria Criminal) e a Sociologia 
Criminal. ‘Estudando a incidência da fenomenologia psíquica 
da criminalidade; o elemento subjetivo do delito, que decide da 
culpabilidade, os motivos que dirigem o comportamento anti-
social etc., a Psicologia marca os necessários rumos à avaliação da 
personalidade, indagação culminante no Direito Penal do nosso 
tempo. O material das suas conclusões alargou-se com a Psicanálise, 
que tenta penetrar nos mistérios do inconsciente. ” 
Magalhães Noronha: entende a Criminologia como ciência causal-
explicativa que estuda as leis e fatores da criminalidade e abrange 
as áreas da Antropologia e da Sociologia Criminal.
Augusto Thomson: “a criminologia é uma ciência natural que não 
dispõe de um objeto de estudo precisamente definido; o crime 
não é um fenômeno natural; a Criminologia considera como objeto 
específico de seu estudo o criminoso designado como tal pela 
máquina da repressão.” 
Pablos de Molina: “Cabe definir a Criminologia como ciência 
empírica e interdisciplinar, que se ocupa do estudo do crime, 
da pessoa do infrator, da vítima e do controle social do 
comportamento delitivo, e que trata de subministrar uma 
informação válida, contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis 
principais do crime – contemplado este como problema individual 
e como problema social –, assim como sobre os programas de 
prevenção eficaz do mesmo e técnicas de intervenção positiva no 
homem delinquente.” (VIEIRA, 1997, p. 33 – 37) 
A Criminologia, enquanto ciência do âmbito criminal, contribui para 
a percepção do fenômeno da violência e da criminalidade de forma 
multifacetada, indo das expressões criminológicas típicas do Estado 
Absolutista, até a concepção crítica que aponta para a necessidade 
de reformulação do paradigma punitivo sob bases que considerem 
a realidade da estrutura social e de novas ações necessárias para a 
incessante resolução de conflitos e promoção da paz social.
Na próxima seção aprofundaremos nossos estudos sobre a 
Criminologia e sua importância e contribuição para a Ciência 
Criminal. 
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Ciência Criminal
Unidade 1
Seção 2 – A Criminologia
O “Crime” e a “Violência” são temas que sempre fizeram parte 
dos diferentes estágios de civilização das sociedades, desde 
os tempos primitivos ou arcaicos (com registros obtidos das 
inscrições rupestres sugestivas das formas de interação humana 
daquela época), passando pela Antiguidade Clássica (em que as 
obras poéticas da época como a Ilíada e a Odisseia retratavam a 
forma de organização social e seus problemas ou ainda a obra 
“Antígona” de Sófocles que nos demonstra a crise histórica 
estabelecida entre o Direito Natural e o Direito Positivo); a Idade 
Média com o Estado Absolutista que passou a ser chamado por 
alguns historiadores e criminólogos também de “Estado de terror 
penal ”; a Idade Moderna com o positivismo jurídico irradiante 
de dogmas e postulados (que, com base principalmente na razão, 
contribuíram para elaborar instrumentos jurídicos de controle 
social que também desaguaram em expressões de violência); e 
a época Contemporânea, que nos confronta com um modelo 
político, econômico e social que tem contribuído para fomentar a 
cultura do medo e da violência. 
Você sabia?
Na tragédiaAntígona, de Sófocles, o conflito se estabelece 
entre Antígona — que representa a família — e Creonte — 
que representa a cidade. Os irmãos de Antígona lutam em 
partidos contrários; um deles, acusado por Creonte de traição 
política, é vencido e morto em combate pelo outro irmão. Como 
traidor político, a lei da cidade não lhe dá o direito ao funeral 
e à sepultura; portanto, não tem direito à outra vida, pois, sem 
o ritual fúnebre e o sepultamento, o corpo é destruído pelos 
animais e não forma a sombra inteira, necessária à outra vida. 
Antígona, contra a lei da cidade, realiza o ritual fúnebre, por 
piedade fraternal. Assim, a tragédia, além de narrar a diferença 
entre o passado e o presente, também narra os conflitos entre as 
leis do costume (o passado familiar) e as leis escritas da cidade. 
(Marilena Chaui. Introdução à história da filosofia, p. 114) 
Portanto, é importante que se compreenda que a história da 
humanidade esteve sempre atravessada pela violência. Muitos 
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são os registros de guerras, perseguições, disputas, questões de 
gênero, preconceitos, desigualdades, terrorismos, explorações 
e por aquela modalidade de violência que muitas vezes é 
entendida e definida por valores de determinados grupos sociais 
organizados: os fatos considerados criminosos, da criminalidade e 
dos processos de criminalização.
Os saberes produzidos sobre essas “violências”, as relações 
dessas violências com as estruturas de poder e as instituições, 
notadamente as da segurança pública, apontando as contradições 
do sistema penal (entre as funções declaradas, simbólicas e as 
reais), são contribuições que a Criminologia, enquanto ciência, 
nos oferece, permitindo que se perceba um modelo de política 
criminal equivocado, onde a reação e punição é quem dá 
sustentação e legitima o discurso repressivo e do controle como 
única forma de proteção social e manutenção da ordem pública. 
A Criminologia busca a compreensão das múltiplas 
dimensões dos atos de violência, principalmente os 
que são considerados de transgressão humana e por 
que o são assim considerados, tendo como premissa 
os mecanismos de controle social e os processos 
de criminalização, e não o “fato-crime” como uma 
realidade ontológica. 
Os saberes teóricos no campo da criminologia servem de base 
e tornam mais elucidativos alguns aspectos sobre os conceitos 
e dogmas equivocadamente construídos sobre o sistema penal 
e a chamada “criminalidade” na sociedade contemporânea, 
permitindo uma análise mais detalhada sobre as características 
dessa “criminalidade” no Brasil (a questão das drogas, da 
violência de gênero, da criança e do adolescente, a análise de 
dados estatísticos e do Plano Nacional de Combate à Violência), 
e as relações de interligação que essas questões estabelecem com 
as instituições integrantes do sistema de justiça criminal. 
A base teórica do pensamento criminológico permite que se 
questione o discurso de fortalecimento do sistema penal e as 
crenças equivocadas de que isto representa o interesse geral, ou 
seja, a erradicação dos problemas sociais com a articulação e 
operacionalização do sistema punitivo - “braço armado do 
Estado” compreendendo a Polícia, o Ministério Público, o 
Judiciário e o Sistema Penitenciário.
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são os registros de guerras, perseguições, disputas, questões de 
gênero, preconceitos, desigualdades, terrorismos, explorações 
e por aquela modalidade de violência que muitas vezes é 
entendida e definida por valores de determinados grupos sociais 
organizados: os fatos considerados criminosos, da criminalidade e 
dos processos de criminalização.
Os saberes produzidos sobre essas “violências”, as relações 
dessas violências com as estruturas de poder e as instituições, 
notadamente as da segurança pública, apontando as contradições 
do sistema penal (entre as funções declaradas, simbólicas e as 
reais), são contribuições que a Criminologia, enquanto ciência, 
nos oferece, permitindo que se perceba um modelo de política 
criminal equivocado, onde a reação e punição é quem dá 
sustentação e legitima o discurso repressivo e do controle como 
única forma de proteção social e manutenção da ordem pública. 
A Criminologia busca a compreensão das múltiplas 
dimensões dos atos de violência, principalmente os 
que são considerados de transgressão humana e por 
que o são assim considerados, tendo como premissa 
os mecanismos de controle social e os processos 
de criminalização, e não o “fato-crime” como uma 
realidade ontológica. 
Os saberes teóricos no campo da criminologia servem de base 
e tornam mais elucidativos alguns aspectos sobre os conceitos 
e dogmas equivocadamente construídos sobre o sistema penal 
e a chamada “criminalidade” na sociedade contemporânea, 
permitindo uma análise mais detalhada sobre as características 
dessa “criminalidade” no Brasil (a questão das drogas, da 
violência de gênero, da criança e do adolescente, a análise de 
dados estatísticos e do Plano Nacional de Combate à Violência), 
e as relações de interligação que essas questões estabelecem com 
as instituições integrantes do sistema de justiça criminal. 
A base teórica do pensamento criminológico permite que se 
questione o discurso de fortalecimento do sistema penal e as 
crenças equivocadas de que isto representa o interesse geral, ou 
seja, a erradicação dos problemas sociais com a articulação e 
operacionalização do sistema punitivo - “braço armado do 
Estado” compreendendo a Polícia, o Ministério Público, o 
Judiciário e o Sistema Penitenciário.
Figura 1. Quadro pintado por van Gogh a partir de uma 
gravura mostrando a prisão de Newgate. 
Fonte: http://www.serazul.com.br/Van.htm
Desse modo, 
o pensamento 
criminológico auxilia na 
desconstrução da visão 
estigmatizante sobre 
a realidade social, de 
concepção maniqueísta 
e excludente. E 
contrapondo ao 
discurso oficial com 
novas possibilidades de 
resolução pacífica dos 
conflitos, possibilitando a 
substituição das políticas 
criminais pelas políticas 
públicas. 
A preocupação com 
o crime, o castigo, a 
punição fazem parte do processo civilizatório, desde o Código de 
Hammurabi na região mesopotâmica, passando pela legislação 
Mosaica constante nos livros da Bíblia; as reflexões de Confúcio 
(551 – 478) - “tem cuidado de evitar os crimes para depois não ver-te 
obrigado a castigá-los”; os gregos que 
com Esopo afirmou que “os crimes são proporcionais a 
capacidade dos que os cometem”, dentre outros pensadores 
da antiguidade clássica como Isocrates (436 – 38 a.C) – 
“ocultar o crime é tomar parte nele” -, Protágoras (485 – 415 
a.C.) que sustentou o caráter preventivo da pena; Sócrates 
(470 – 399 a.C.) através de Platão afirmando “que se 
devia ensinar aos indivíduos que se tornavam criminosos 
como não reincidirem no crime, dando a eles a instrução e a 
formação de caráter de que precisavam”; Platão (427 – 347) 
dizendo que “o ouro do homem sempre foi motivo de seus 
males” (A República); Aristóteles (384 – 322) sugerindo 
que “a miséria engendra rebelião e delito” e Sêneca, em 
Roma ( 4 a.C. – 65 d.C), com sua análise sobre a ira, que 
considerava a mola propulsora do crime, argumentando 
ser a razão da sociedade viver em constante luta fratricida. 
(FERNANDES; FERNANDES, 2002. p.62)
Código de Hammurabi: 
monumento jurídico 
mais importante da 
Antiguidade antes de 
Roma. Continha 282 
artigos, sendo muito 
desenvolvido para a época, 
sobretudo no domínio 
do Direito Privado. 
Hammurabi foi rei da 
Babilônia, provavelmente 
entre 1726 – 1686 a.C. 
(Maior aprofundamento 
ver: GILISSEN, John. 
Introdução Histórica ao 
Direito. Trad. de A. M. 
Hespanha e L. M. Macaísta 
Malheiros. 3. ed. Lisboa: 
Fundação Calouste 
Gulbenkian, 2001.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Muito embora a preocupação com a questão da violênciatenha 
origem em tempos remotos, em que os que exerciam o poder 
tendiam a manter a ordem e buscar a paz pelo controle e o 
desenvolvimento da sua polícia e da sua justiça, é no marco 
histórico do Iluminismo que ocorrem transformações que 
conduzem a uma verdadeira revolução na concepção jurídica 
e também política, econômica e social com reflexos diretos no 
campo do direito penal.
Na base das inquietações do marco histórico do Iluminismo, 
surge uma corrente do pensamento chamada Escola Clássica, 
com uma unidade ideológica comum, com um significado 
político, liberal e humanitário e se contrapondo ao estado da 
legislação penal vigente à época, e do excesso no ato de “punir” 
com castigos corporais e penas de morte, também uma arbitrária 
e desigual aplicação da lei conforme a condição social do acusado. 
(ANDRADE, 2003) 
O pensamento e a obra do italiano Cesare Beccaria (1738 – 1794) 
o torna percussor desse momento. Segundo Gilissen:
Beccaria teve uma grande influência na modernização do direito 
penal. Escreveu o seu livro Dei delitti e delle pene (Dos delitos e 
das penas, 1764) com a idade de 25 anos e publicou-o como um 
panfleto anônimo. Novamente publicado pouco depois com 
um comentário de Voltaire, a obra rapidamente conheceu o 
sucesso e foi traduzida na maior parte das línguas europeias. Sob 
a influência do Contrat Social de Rousseau, Beccaria imagina um 
sistema jurídico no qual cada um deve ceder uma parcela da sua 
liberdade – tão mínima quanto possível – ao soberano, em troca 
da manutenção da ordem por este último. O soberano não pode 
abusar do seu direito de punir; os fatos são apenas puníveis se a 
lei os considerar como infração; é a proclamação da legalidade 
dos delitos e das penas; é o adágio nullun crimen, nulla poena 
sine lege que, embora expresso em latim, nada tem de romano. A 
pena deve ser proporcional ao mal a reprimir; a tortura e a pena 
de morte não podem ser toleradas. (GILISSEN, 2001, p. 368)
Não obstante a importância de Beccaria, é com Cesare Lombroso 
que se tem o marco histórico da fundação da criminologia com 
sua obra “L’Uomo delinqüente”, em 1876, que acaba criando a 
Este movimento surgiu na França 
do século XVII e defendia o 
domínio da razão sobre a visão 
teocêntrica que dominava a Europa 
desde a Idade Média. Segundo os 
filósofos iluministas, esta forma 
de pensamento tinha o propósito 
de iluminar as trevas em que se 
encontrava a sociedade. Os ideais 
iluministas  acreditavam que o 
pensamento racional deveria ser 
levado adiante substituindo as 
crenças religiosas e o misticismo, 
que, segundo os pensadores da 
época, bloqueavam a evolução do 
homem. O homem deveria ser o 
centro e passar a buscar respostas 
para as questões que, até então, 
eram justificadas somente pela fé.  
Fonte: http://www.suapesquisa.
com/historia/iluminismo/
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Ciência Criminal
Unidade 1
Antropologia Criminal. Essa obra estabeleceu uma relação 
entre o homem que pratica crimes e as suas características bio-
psíquicas.
Segundo a professora Vera Regina Pereira de Andrade:
A primeira e célebre resposta sobre as causas do crime 
foi dada pelo médico italiano Lombroso, que sustenta, 
inicialmente, a tese do criminoso nato: a causa do 
crime é identificada no próprio criminoso. Partindo do 
determinismo biológico (anatômico-fisiológico) e psíquico 
do crime e valendo-se do método de investigação e 
análise próprio das ciências naturais (observação e 
experimentação), procurou comprovar sua hipótese 
através da confrontação de grupos não-criminosos 
com criminosos dos hospitais psiquiátricos e prisões 
sobretudo do sul da Itália, pesquisa na qual contou com o 
auxílio de Ferri, quem sugeriu, inclusive, a denominação 
“criminoso nato”. Procurou desta forma individualizar 
nos criminosos e doentes apenados anomalias sobretudo 
anatômicas e fisiológicas vistas como constantes 
naturalísticas que denunciavam, a seu ver, o tipo 
antropológico delinquente, uma espécie à parte do gênero 
humano, predestinada, por seu tipo, a cometer crimes. 
(ANDRADE, 2003, p 35 – 36) 
Portanto, foi Lombroso quem iniciou os primeiros estudos 
em Criminologia, colocando no centro da discussão sobre a 
questão da criminalidade a pessoa humana “incomum”, cujo 
objeto central da discussão é o “homem criminoso” (aquele ser 
antropologicamente diferente das demais pessoas). Lombroso, 
prosseguindo em suas pesquisas, acrescentou como causas da 
criminalidade, ao lado do atavismo, a epilepsia e a loucura moral, 
ou seja, o atavismo, epilepsia e loucura moral constituem o que 
Vonnacke denominou de “tríptico lombrosiano”. (ANDRADE, 
2003, p. 36) 
O chamado “criminoso nato” para Lombroso, além dos estigmas 
físicos, possuía sintomas psíquicos - como insensibilidade à 
dor, preguiça, crueldade, instabilidade emocional, superstição, 
precocidade sexual - sobre o qual a sociedade teria o direito de 
defender-se condenando-o a prisão perpétua e excepcionalmente 
à morte, mas sem expiações morais ou punições infamantes. 
(FERNANDES, 2002)
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Van Hamel chegou a afirmar que “César Beccaria, nos dias de arbí-
trio, disse ao homem: conhece a justiça; César Lombroso, na época em 
que se está aferrado às fórmulas clássicas do Direito Penal, disse à justi-
ça: conhece o homem.” (2001, p. 3.) 
Esse momento histórico propiciou discussões que deram origem 
ao surgimento do paradigma conceitual em Criminologia, 
sofrendo também influências de correntes do pensamento 
chamadas Escolas Penais. Dessas, iremos destacar as duas que 
consideramos mais importantes para esta disciplina e é o assunto 
que passaremos a tratar a seguir.
As discussões sobre a questão do Direito Penal, do crime e da 
criminalidade - com suas respectivas teorias sobre o assunto 
- passaram a ser designadas Escolas Penais. Essas “escolas” 
passaram a (re)analisar os fundamentos do Sistema Penal 
buscando ampliar a compreensão da chamada “criminalidade” e 
de suas teorias. 
Veja, a seguir, as principais escolas de criminologia :
Escola Clássica
A Escola Clássica surge no contexto do movimento Iluminista, 
tendo como consequência os postulados da humanização da 
pena. Beccaria (que já vimos anteriormente) foi o expoente e 
representante máximo da Escola Clássica em decorrência de sua 
valiosa contribuição. 
Teve a preocupação em estabelecer as bases do Sistema Penal com 
fundamentos inspirados na humanização dos meios punitivos, 
legalidade do Direito Penal e Processual Penal - garantia e 
segurança jurídica - e finalidade da pena, opondo-se aos arbítrios 
e lutando pela segurança individual em contraposição à Justiça 
Penal ingente da época, cujas penas, estabelecidas “no duplo pilar 
da expiação moral e da intimidação coletiva, eram excessivamente 
arbitrárias e bárbaras, prodigando os castigos corporais e a pena 
de morte”. (ANDRADE, 2003, p. 49) 
Sustentou-se num sistema dogmático e se baseou em conceitos 
racionalistas, considerando a imputabilidade penal diretamente 
Figura 2. Tipos lombrosianos 
Fonte: DEPAULA, Giovani. A 
Importância do ensino de 
Criminologia na Formação 
Policial. Dissertação de 
Mestrado. Florianópolis: 
UFSC, 2007. 
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Ciência Criminal
Unidade 1
vinculada ao livre arbítrio e à culpabilidade moral, tratando o delito 
como algo de natureza jurídica e a pena como um mal necessário 
à segurança jurídica. (OLIVEIRA, 1996). Deixou como herança 
um legado que, baseado em concepções liberais, contribuiu para 
a consolidação da dogmática jurídico-penal, na produção de uma 
ideologia especificamente penal, a “ideologia da `defesa social ,́ 
que sintetiza a sua percepção básica sobre a problemática da 
criminalidade e da reação social”. (ANDRADE, 2003)
Escola Penal Positiva
A Escola Positiva, na base do pensamento positivista de Ciência, 
incorpora em suas análises um novo método: o indutivo e de 
observação dos fatos, em substituiçãoao Método dedutivo e de 
lógica abstrata da Escola Clássica, “deslocando-se da investigação 
racional para a factual – e do fato para o homem delinquente – 
deslocarão o território classicamente colonizado pelos juristas(...)”. 
(ANDRADE, 2003, p. 63) 
A obra “O homem delinquente”, de Lombroso, é outro item, 
como vimos anteriormente, que contribuiu com o paradigma 
conceitual da Criminologia, constituindo, segundo a professora 
Vera Andrade, junto com a Sociologia Criminal de Ferri, uma 
das matrizes fundamentais desse paradigma, que interpretava 
o delito como uma realidade biológico-social, constituída de 
fatores antropológicos e materiais, realçando como objeto do seu 
estudo o homem “criminoso” e suas características anatômico-
fisiológicas.
Essa Escola Penal, a Positiva, teve como característica a questão 
da responsabilidade social baseada no determinismo e na 
“periculosidade” do delinquente, bem como na sua compleição 
física e biotipo, considerando o crime como um fenômeno natural 
e social produzido pelo homem e a pena não mais apenas como 
um meio de castigo, mas de defesa social, negando o livre 
arbítrio e a liberdade social. (OLIVEIRA,1996, p. 61)
Os seguidores da Escola Positiva defendiam as teorias relativas, 
ou da prevenção, em que a pena tinha um fim prático e imediato, 
o da prevenção geral ou especial do crime, ou seja, servia 
Distendeu o entendimento 
lombrosiano sobre a 
criminalidade admitindo 
uma tríplice série de 
causas ligadas à etiologia 
do crime – individuais 
(orgânicas e psíquicas), 
físicas (ambiente telúrico) 
e sociais (ambiente social)
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Universidade do Sul de Santa Catarina
como um instrumento de “defesa social” com o objetivo de 
“reajustar” ou tornar sem efeito o “homem delinquente” 
Figura 3. Ambiente/local de estudos de Lombroso 
Fonte: http://www.museounito.it/lombroso/storia/storia_2.html
As medidas de segurança, como a de internação em hospital 
de custódia, tratamento psiquiátrico e os institutos jurídicos ( o 
livramento condicional e a suspensão condicional da pena) têm 
sua origem nesse período.
A Mudança do Paradigma conceitual para o Labelling Aproach 
(abordagem por etiquetamento) ou Paradigma da Reação 
Social
O paradigma conceitual, de base positivista e derivado das 
ciências naturais, considerava que algumas características 
distinguiam o homem normal do homem criminoso.
Daí a tese fundamental de que ser delinquente 
constituía uma propriedade da pessoa que a 
distinguia por completo dos indivíduos normais sem 
que se fizesse uma análise crítica do Direito Penal 
Positivo enquanto definidor do crime e das penas. 
(ANDRADE, 2003)
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Ciência Criminal
Unidade 1
É nesse contexto que os pressupostos e postulados das Escolas 
Penais e do paradigma conceitual passam a ser questionados, 
que o surgimento de novos saberes criminológicos começam 
a se contrapor à ideologia da defesa social indagando sobre 
outras causas para o crime e a criminalidade, voltadas para além 
daquelas obtidas pela Antropologia, Sociologia e outras ciências e 
teorias da época.
O labelling aproach e o paradigma da reação social representam 
essa mudança de paradigma em criminologia, passando-se a 
conceber o crime, a criminalidade e o sistema penal segundo 
novos pressupostos, fundados, principalmente, nos processos 
de criminalização, o que ensejará um caminho para a 
construção de uma nova criminologia, a criminologia crítica. 
O labelling tem como fundamento e tese central 
[...] de que o desvio e a criminalidade não são uma 
qualidade intrínseca da conduta ou uma entidade 
ontológica pré-constituída à reação social e penal, mas 
uma qualidade (etiqueta) atribuída a determinados 
sujeitos através de complexos processos de interação 
social, isto é, de processos formais e informais de 
definição e seleção. (ANDRADE, 2003, p. 41) 
Muda-se o foco, indo-se além do estudo do crime e do criminoso 
para a questão dos processos de criminalização, para os que 
são criminalizados e para a reação social da conduta desviada, 
passando-se a questionar a legitimação do sistema penal. 
(ANDRADE, 2003) 
Segundo essa corrente do pensamento, os processos de 
criminalização têm início não apenas no aparato político-jurídico 
do Estado encarregado pelo controle social formal, que engloba a 
Poder Legislativo (criminalização primária), Polícia, Ministério 
Público, Judiciário (criminalização secundária), mas também os 
mecanismos de controle social informal, como a escola, a família, 
a religião ou a mídia. (ANDRADE, 2003, p. 43) 
A mesma parcela social sobre a qual recai a mobilização do 
aparato do Sistema Penal, também acaba sendo a mais atingida 
pelos efeitos da violência, distribuindo-se de forma desigual 
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os riscos reais de vitimização. E isso é atual e muito presente 
na sociedade brasileira, conforme Cláudio Beato “o risco de 
vitimização por homicídio nas grandes cidades, hoje, é cerca de 
300 vezes maior para um jovem de periferia se comparado com o 
risco para o mesmo crime que corre um senhor de meia idade de 
um bairro típico de classe média”. (BEATO, 2004). 
Dessas inquietações decorrem necessidades de novas discussões 
surgindo um movimento criminológico intitulado “Criminologia 
Crítica” cujas teorias, segundo Ian Taylor, Paul Walton e Jock 
Young, são caracterizadas
(...) pela orientação questionadora da ordem social 
que produz o fenômeno do crime (definição do 
comportamento criminoso e dos métodos de controle e de 
repressão da criminalidade) e pelo compromisso com uma 
prática social transformadora das condições estruturais da 
desigualdade material e da marginalidade econômica, nas 
sociedades fundadas na divisão e na exploração de classes. 
O esquema teórico desse questionamento é definido pelas 
categorias fundamentais do pensamento marxista (modo 
de produção, classes sociais, luta de classes, hegemonia 
ideológica, etc.). E por isso, está comprometido com o 
processo histórico de emancipação das massas, exploradas 
como força de trabalho e oprimidas pelos mecanismos 
de poder da ordem social, que seleciona não só os 
comportamentos, os sujeitos que devem ser incriminados. 
(TAYLOR; YOUNG, p. 7)
A Criminologia Crítica se apresenta, assim, com um discurso 
que passa a se concentrar em desconstruir o discurso da 
guerra contra o crime, do combate à criminalidade, tentando 
evidenciar que os processos de criminalização e a inflação 
jurídico-penal nada mais fazem do que agravar os problemas 
sociais, destacando-se a superlotação das prisões e outras formas 
de violência institucional, como a pobreza, o desemprego, o 
estado de abandono, a fome, o estado de terror penal em que 
se desconhece todo o entrelaçamento de leis e armadilhas 
do sistema, mas tudo, enfim, buscando criar no imaginário 
coletivo uma falsa sensação de segurança jurídica.
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 (1) (2) (3)
Figura 4. Falsa sensação de segurança jurídica 
Fonte: Revista Consulex - Ano VI - Nº 131 - 30 de junho de 2002 (Fig.1); Ano VIII - Nº 176 - 15 de maio 
de 2004 (Fig. 2); Ano VI - Nº 127 - 30 de abril de 2002. (Fig.3)
Assim, a Criminologia sofreu um processo de evolução em sua 
concepção que foi influenciado pelas correntes do pensamento 
das Escolas Penais, culminando na Criminologia Crítica que 
redefine seus conceitos e que aponta para a necessidade de um 
sistema de justiça que leve em consideração todos os valores 
e necessidades dos seres humanos, premissa maior para o 
enfrentamento de todas as formas de violência.
Seção 3 – Criminologia e Segurança Pública
A Criminologia nos permite compreender a questão da 
segurança pública sobnovas bases e fundamentos teóricos.
As estruturas de segurança pública no país são as responsáveis 
pela intervenção mais direta e imediata nos problemas que dizem 
respeito à criminalidade e à criminalização - muito embora se 
saiba que uma atuação efetuada de forma cooperativa, envolvendo 
não apenas o poder público, mas também ações do empresariado, 
da sociedade civil organizada e de comunidades locais, tenha 
efeitos bem mais úteis sob o aspecto da solução integrada dos 
conflitos sociais. 
Ocorre que o Estado e a Sociedade têm demonstrado 
insuficiência na compreensão e no trato das questões que 
envolvem a ordem social, percebendo-se que as amostragens 
estatísticas oficiais apontam para um crescimento desproporcional 
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da incidência criminal no país, isso sem falar nas cifras ocultas, 
daqueles crimes que não são contabilizados, os quais, para 
Zafarroni, correspondem a maioria das práticas delitivas. 
Segundo este autor, 
Praticamente não existe conduta - nem mesmo as ações 
mais privadas – que não seja objeto de vigilância por parte 
dos órgãos do sistema penal ou daqueles que se valem de 
sua executividade para realizar ou reforçar seu controle, 
embora se mostrem mais vulneráveis as ações realizadas 
em público, o que acentua a seletividade da vigilância em 
razão da divisão do espaço urbano que confere menores 
oportunidades de privacidade aos segmentos mais carentes.
[...] Se todos os furtos, todos os adultérios, todos os 
abortos, todas as defraudações, todas as falsidades, todos 
os subornos, todas as lesões, todas as ameaças, etc. fossem 
concretamente criminalizados, praticamente não haveria 
habitante que não fosse, por diversas vezes, criminalizado. 
(ZAFFARONI, 1991, p. 25-26)
As estruturas de polícia, assim como as demais instâncias de 
poder, historicamente acabaram servindo às elites de nosso 
país como mecanismo de controle social, e até há pouco tempo 
foram extensão dos Estados, de uma ideologia voltada para a 
segurança nacional. Não obstante, com a abertura política e a 
democratização, nosso país tem procurado se adequar às novas 
realidades e contingências sociais, muito embora a incorporação 
de novos postulados inerentes aos direitos de cidadania encontre 
resistências individuais e institucionais. 
Aliado a esse problema de “função das polícias”, percebe-se que, 
muito embora haja uma tentativa de articulação e mobilização 
no sentido de proporcionar segurança à sociedade e às pessoas, 
seus esforços têm sido muitas vezes em vão, decorrente também 
dos problemas crônicos de nossa sociedade, que é atravessada 
pelas desigualdades sociais (falta de saúde pública, infraestrutura 
urbana deficiente, desvalorização da educação e do sistema de 
ensino) e pelas mais variadas expressões de violência já citadas, 
como a pobreza, o desemprego, os preconceitos, o tráfico de 
drogas, a exploração sexual, a exploração do trabalho infantil 
(e adulto), a falta de assistência familiar, a falta de acesso aos 
meios de cultura, a violência (intrafamiliar, contra a mulher, 
contra os animais), dentre outras questões para as quais não estão 
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plenamente preparadas para agir. Tanto é assim que o chamado 
Guia para a Prevenção do Crime e da Violência nos Municípios, 
elaborado pelo Governo Federal, catalisa e prioriza ações 
nesses aspectos. 
Some-se a isso a cultura punitiva disseminada no contexto social 
e com terreno fértil na esfera policial, que dificultam os espaços 
para a mediação preventiva dos conflitos, e, ao contrário, pune-se 
e violenta-se como resposta da macroestrutura social. 
Assim, sob a proteção da função declarada do Direito Penal, a da 
prevenção “da violência e da criminalidade”, as polícias acabam 
contribuindo para o agravamento desse quadro auxiliando 
na construção dos chamados “processos de criminalização”, 
exercendo influência significativa com a mobilização de 
seu aparato, principalmente quando vira moda falar-se em 
“movimentos de lei e ordem” como solução para os problemas de 
natureza social em momentos de crise. 
Na realidade, é preciso evitar, cada vez mais, que as polícias 
sejam órgãos a serviço de um poder (principalmente o poder 
econômico e o poder político) e sobre isso a afirmação de Jean-
Claude Monet, estudioso de polícia, em seu livro “Polícias e 
Sociedades na Europa” é esclarecedora:
[...] é certo que o desenvolvimento das formas modernas 
de polícia na Europa resultou de uma demanda crescente 
em matéria de segurança, emanada, no essencial, das 
camadas dominantes urbanas. Mas nas modalidades 
de sua organização, tanto quanto nas prioridades 
operacionais que são as suas, transparece, no mais das 
vezes, mais a vontade dos governantes de se dotar de 
instrumentos politicamente confiáveis, do que uma 
verdadeira preocupação de responder à demanda social de 
segurança. É, pelo menos, o que sugere uma observação 
atenta das formas e dos ritmos que escandiram o 
desenvolvimento dos aparelhos policiais desde sua 
emergência histórica. É igualmente o que revela a análise 
de suas estruturas atuais. (2001, p. 100)
Entende-se que se deve instrumentalizar as polícias segundo 
políticas públicas que lhe permitam atuar também num cenário 
político - o que é diferente de ser “usada” politicamente - ou 
Para mais informações 
veja: MINISTÉRIO DA 
JUSTIÇA. Secretaria 
Nacional de Segurança 
Pública. Guia para a 
Prevenção do Crime e da 
Violência nos Municípios. 
Brasília: SENASP, 2006.
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seja, lutar por uma atuação voltada para o atendimento às 
demandas sociais, legitimando suas ações mediante processos 
de interação e participação popular, em sintonia com o que 
prescreve a nossa Constituição em seu artigo 144, ao afirmar 
que Segurança Pública é responsabilidade de todos, não podendo 
ainda se esquecer que segurança, desde os tempos remotos, é 
preocupação dos povos e trata-se de uma necessidade básica, 
de bem viver, ter tranquilidade, de buscar a felicidade! Alguns 
autores chegam a afirmar que há sociedade sem “ justiça”, 
mas não há sociedade sem polícia!
Obviamente que não se pode esquecer as muitas vezes em 
que a atuação das estruturas policiais exigem uma atuação 
eminentemente repressiva, como, por exemplo, naqueles casos 
em que ocorrem inevitáveis enfrentamentos diretos, contato 
físico, troca de tiros, situações essas em que não se torna possível 
o exercício de práticas de mediação, ao menos num primeiro 
momento, devido aos riscos e situação de perigo eminente. 
Há também que se ressaltar que essas situações constituem 
uma pequena parte dentro das múltiplas possibilidades 
da atuação policial e ainda assim um eficiente serviço de 
inteligência policial poderia minimizar em muito a condição de 
enfrentamentos. 
Por outro lado, é importante também perceber que o papel da 
polícia muitas vezes apresenta algumas ambiguidades, como, por 
exemplo, as citadas por Adriana Loche et all ao apontar que na 
ação da polícia, revela-se uma das faces de nossa sociedade, a saber:
Entrar no cotidiano da polícia descortina uma outra 
sociedade, funcionando sob regras e valores diferentes 
dos preceitos fundamentados no direito. Pode-se falar 
de uma lógica ocupacional, mas também de uma lógica 
societária que interferem no julgamento e na prática que 
os policiais têm de suas funções. Lógicas que exigem 
soluções rápidas e proporcionais aos crimes; que colocam 
o criminoso como estando fora do pacto social, portanto, 
sem poder beneficiar-se das garantias constitucionais que 
foram feitas para pessoas de bem; que separam o universo 
em categorias polarizadas de bom x mau, delinquente 
x pessoa de bem etc. Mas, ao mesmo tempo, lógicas 
que permitem uma flexibilidade enorme no tratamento 
das pessoas em função de suas relações. Assim, alguns 
Segundo Álvaro Lazzarini: 
“Atribui-sea Honoré de Balzac a 
afirmação de que `os governos 
passam, as sociedades morrem, a 
polícia é eterná . Ela o é porque, na 
realidade, as nações podem deixar 
de ter as suas forças armadas. 
Nunca, porém, podem prescindir de 
suas polícias, da sua força pública.” 
(LAZZARINI, Álvaro. Estudos de 
Direito Administrativo. São 
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 
1999. p.49.)
Por eficiente serviço de inteligência 
entenda-se aquele voltado à 
produção de informações e dados 
para a proteção social e dos direitos 
inerentes ao exercício de cidadania. 
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Ciência Criminal
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indivíduos teriam mais direitos que os demais porque, 
afinal, são parentes, amigos, protegidos, bem–vestidos, 
estudados tem conhecimento, etc. que aqueles outros que 
não teriam. (1999, p. 172) 
Essa realidade precisa ser percebida, pois trata-se de ponto de 
partida para delimitação dos espaços de atuação das polícias 
numa sociedade de classes e em que as estruturas policiais têm 
se mobilizado amparadas por uma ideologia liberal (burguesa), 
que insiste em hierarquizar suas ações desconsiderando os mais 
vulneráveis socialmente, atuando de forma, muitas vezes, pouco 
isenta. O sistema penitenciário brasileiro, onde a maioria dos 
presos são pessoas pobres, retrata a realidade essa situação. 
Tal reflexão serve para demonstrar a necessidade de construção 
de uma nova filosofia com relação à forma de atuação policial, 
rompendo com o senso comum e com a hegemonia do 
pensamento (ideologias dominantes) no sentido de rever “velhos” 
paradigmas inadequados para uma sociedade que se deseja livre 
e igualitária. Parafraseando o professor Alessandro Baratta: 
que permita o controle social não-autoritário do desvio e que abra 
espaço à diversidade, o que é garantido pela “ igualdade” e expressão 
da individualidade do homem como portador de capacidades e de 
necessidades positivas. (BARATTA, 1999, p. 20) 
A amplitude das políticas públicas necessárias para fazer frente 
ao problema da (in)segurança pública pressupõe o rompimento 
de paradigmas, em que se perceba não apenas a necessidade 
de novas tecnologias e modalidades de gestão, mas também 
a mudança de concepção sobre o papel da polícia; em que se 
inclua tanto na dimensão da prevenção como na repressão, a 
participação democrática nas ações de segurança pública. 
Isso porque os indicativos, e algumas experiências sobre o 
enfrentamento à violência e à criminalidade, têm demonstrado que 
programas e estratégias de segurança baseados numa articulação 
que envolva várias organizações - ou seja, entre estado, sociedade e 
cidadão - tem sido muito mais efetivos como resposta ao problema. 
Há que se ter a consciência de que a questão não está restrita à 
segurança pública, mas compreende a necessidade de atuação em 
outras áreas, como a saúde, lazer, educação, assistência social, 
planejamento urbano e questões sistêmicas como o problema da 
desigualdade e da má distribuição de renda.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
Síntese
Nesta unidade de estudos, nós vimos a contextualização da 
Ciência Criminal e seus principais aportes cujas bases se 
assentam no Direito Penal e no Direito Processual Penal e 
seus fundamentos, do Estado absolutista ao Estado Liberal e 
Democrático de Direito.
Conhecemos a Criminologia enquanto ciência do âmbito 
criminal nos seus aspectos históricos e seus fundamentos no 
sentido de uma compreensão do Sistema Penal e das Estruturas 
de Controle Dominantes.
A evolução conceitual da criminologia a coloca como ciência 
empírica e interdisciplinar, que se ocupa do estudo do crime 
como construção social, da pessoa do infrator, da vítima e 
do controle social do comportamento considerado delitivo, 
entendido como um problema não apenas individual, mas 
também social, assim como os programas de prevenção eficaz 
do mesmo e técnicas de intervenção positiva nas mais variadas 
expressões de violência que culminam em criminalidade e 
criminalização. 
Apresentamos as tendências da Criminologia na 
contemporaneidade, percebendo-se que a corrente chamada de 
“Criminologia Crítica” tem exercido influências que mostram 
a necessidade de modificação do sistema de justiça criminal, 
destacando-se que a “terapia punitiva” faliu já há muito tempo. 
A importância da disciplina “Criminologia” para as Ciências 
Criminais e para a Segurança Pública implica na percepção da 
necessidade de adequação da polícia às novas realidades políticas 
e sociais e numa nova compreensão sobre o estudo do chamado 
“fenômeno criminal” em todas as suas nuances. A Criminologia 
aponta que o atual modelo de política criminal - na medida 
em que prioriza ações de regulação e repressão – somente tem 
servido para validar a lógica da exclusão.
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Ciência Criminal
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Assim, a Criminologia contribui com seus fundamentos para 
que haja uma perspectiva de solidariedade e cumplicidade na 
resolução dos problemas, dos individuais aos comunitários e, 
mesmo que haja a necessidade de uma intervenção repressiva, que 
esta aconteça na exata medida do restabelecimento dos vínculos 
para uma convivência segura e cidadã.
Atividades de autoavaliação
Ao final de cada unidade, você realizará atividades de autoavaliação. O 
gabarito está disponível no final do livro didático. Mas, esforce-se para 
resolver as atividades sem ajuda do gabarito, pois, assim, você estará 
estimulando a sua aprendizagem.
1. “O projeto político da Modernidade, onde se insere o discurso das 
ciências criminais, tem como objetivo a busca da felicidade através da 
negação da barbárie e da afirmação da civilização.” (Salo de Carvalho)
Com base no enunciado acima é correto afirmar sobre as ciências 
criminais e a criminologia: 
a. As ciências criminais abrangem estudos que visam a compreensão 
da violência - com destaque para o fenômeno do crime e sua 
complexidade.
b. A Criminologia se ocupa do estudo do homem delinquente e das 
causas que o levam a praticar atos de violência.
c. As ciências criminais são integradas pelas normas penais e 
processuais penais, bem como pela criminologia e pelos postulados 
da política criminal, tendo por objetivo controlar a violência e 
assegurar os ideais de paz social, muito embora isso incorra na 
realidade social, pois ao invés de contê-la, o Estado acaba por 
reproduzi-la.
d. Historicamente o campo de investigação da criminologia esteve 
reduzido à concepção voltada à intervenção punitiva, no espaço 
da pena e dos cárceres e só recentemente se ampliou a perspectiva 
multifacetada do fenômeno criminal. 
e. A Política Criminal é a ciência ou a arte de selecionar os bens (ou 
direitos) que devem ser tutelados jurídica e penalmente e escolher 
os caminhos para efetivar tal tutela.
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Universidade do Sul de Santa Catarina
2. “A história das penas é seguramente mais horrenda e infame para a 
humanidade que a própria história dos delitos”. (Luigi Ferrajoli)
Escreva, entre 10 e 15 linhas, com uma perspectiva criminológica, sobre 
os fundamentos do Direito Penal em nossa sociedade e seus objetivos, 
dos declarados aos reais! 
3. Um governo comprometido com a justiça e o exercício da ética na 
política, determinado a aprofundar a democracia, incorporando os 
brasileiros mais pobres à cidadania plena, estendendo a todos os 
homens e mulheres de nosso país os direitos civis e os benefícios do 
Estado de Direito Democrático, terá de dedicar-se com prioridade ao 
combate à violência, em todas as suas formas. Da fome à tortura, do 
desemprego à corrupção, da desigualdade injusta à criminalidade. 
(Plano Nacional de Segurança Pública)
Com base no enunciado acima, aponte os principais aspectos do Plano 
Nacional de Segurança Pública, disponibilizado em nosso ambiente 
virtual de aprendizagem (MIDIATECA), que se alinham com uma política 
criminal de basecriminológica! 
4. Apresente uma charge que tenha alguma relação com o perfil do 
“homem delinquente” descrito por Cesare Lombroso! Faça uma 
pesquisa na internet, revistas, livros ou jornais.
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Saiba mais
BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas: texto integral. 2. 
ed. São Paulo: M. Claret, 2000.
ALVAREZ, Marcos César. A Criminologia no Brasil ou como 
tratar desigualmente os desiguais. Revista de Ciências Sociais. 
Rio de Janeiro, Vol. 45, n° 4, 2002, pp 677 – 704.. Disponível 
em: http://www.nevusp.org/portugues/index.php?option=com_
content&task= view&id=1082&Itemid=96
Se você desejar, aprofunde os conteúdos estudados nesta unidade 
ao consultar as seguintes referências:
FERNANDES, Newton; FERNANDES, Valter. Criminologia 
integrada. 2. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos 
Tribunais, 2002.
HULSMAN, Louk; CELIS, Jacqueline Bernat de. Penas 
perdidas. O sistema penal em questão. Trad. de Maria Lúcia 
Karam. Rio de Janeiro: LUAM Editora Ltda., 1993. 
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