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INTRODUÇÃO AO SERVIÇO SOCIAL Na trajetória do Serviço Social, o projeto ético-político é fruto de um processo histórico de lutas marcado por contradições e tensões saturadas de embates teóricos e ideológico-políticos que só adquire concretude e consolidação se analisado a partir da conjuntura sócio- histórica de cada período. Tal questão deve ser considerada levando em conta suas determinações econômicas, culturais e políticas nas lutas de classe da sociedade brasileira. E no serviço social, o significado de um projeto ético-político crítico remete à efetiva tomada de consciência dos fundamentos sobre os quais a prática profissional se desenvolve, baseados em conhecimentos teóricos, princípios e diretrizes éticas e políticas, que prescrevem orientações para bases normativas e referências metodológicas para intervenção. Bons estudos! AULA 06 – PROJETO ÉTICO POLÍTICO O projeto ético-político do Serviço Social pode ser considerado como um avanço para a profissão, sendo fruto de uma organização coletiva e de uma busca de maturidade que possibilita aos profissionais a construção de novas respostas para a intervenção profissional frente à questão social. Para poder alcançar esses conhecimentos, são objetivos desta aula: • Identificar as diferenças entre projeto profissional, projeto societário e projeto ético-político. • Reconhecer os componentes do projeto ético-político profissional. • Discutir a importância do projeto ético-político para profissão. 6 PROJETOS EM DISCUSSÃO Setores profissionais de vanguarda aceleraram o debate sobre a identidade do serviço social e lhe deram um perfil crítico e transformador. A orientação social estratégica do serviço social enfatiza o projeto ético-político do profissional, configurando o projeto profissional (SANTANA, 2000). O projeto profissional é realizado em três dimensões inter-relacionadas, quais sejam (SILVA, 2000): • A dimensão da produção do conhecimento em serviço social, que inclui o processo de reflexão teórico-crítica da profissão; • A dimensão política organizacional da classe, que inclui as entidades representativas dos serviços sociais, inclusive a série CFESS/CRESS; • A dimensão jurídico-política da profissão, que elenca leis e decisões classistas ou comuns. Essas dimensões articuladas entre si formam o corpo material de um projeto ético-político profissional, que deve ser entendido como uma construção coletiva com certa orientação social, que inclui valores, obrigações sociais e princípios que estão em constante discussão. O sucesso do projeto depende de uma análise acurada das condições subjetivas e objetivas da realidade para sua implementação e de ações políticas compatíveis com as atribuições do projeto (BRAZ, 2000). Segundo Netto (1999), todo projeto profissional tem uma dimensão ética que exige padrões como no código de ética profissional, mas: Envolvem ainda as escolhas teóricas, ideológicas e políticas das categorias e dos profissionais – por isto a contemporânea designação dos projetos profissionais como projetos ético-políticos revela toda a sua razão de ser: uma identificação ética só adquire efetividade histórico-concreta quando se combina com uma direção político profissional (NETTO, 1999, p. 99). A dimensão política dos projetos profissionais decorre da sua ligação a projetos comerciais de maior dimensão. Os projetos corporativos formam uma imagem da sociedade em construção, que exige que determinados valores sejam justificados, e determinados recursos (materiais e culturais) sejam priorizados para sua realização (NETTO, 1999, p. 93). A luta por uma nova ordem social deve ser entregue nas categorias de democracia, política pública e proteção dos direitos sócio-políticos contra o projeto neoliberal (BARROCO, 2001). Os projetos profissionais situam-se nas relações sociais e nas divisões sociotécnicas do trabalho e, portanto, são movidos por demandas conflitantes que são definições históricas. Assim, expressam a responsabilidade da categoria profissional com os requisitos estabelecidos (SILVA, 1994). E o reconhecimento da liberdade como valor ético central está no cerne do projeto profissional do serviço social, ou seja, um projeto ético-político. A liberdade é vista aqui como a capacidade de escolher entre alternativas específicas, além de envolver um compromisso com a autonomia, a emancipação e a plena expansão dos sujeitos sociais. Assim, o projeto profissional está relacionado ao projeto social, que se propõe a criar uma nova ordem social sem o controle e/ou exploração de classe, etnia e gênero (BRAZ, 2000). É por isso que o projeto profissional aqui proposto nega o atual projeto social hegemônico e defende a construção dessa nova ordem social, que rejeita toda dominação ou exploração, cujos princípios ainda são a proteção dos direitos humanos, a negação do autoritarismo preconceito e reconhecimento do pluralismo. Segundo Santana (2000, p. 81-82): No código de ética profissional, a dimensão política se expressa como a proteção da igualdade e da justiça, a consolidação da democracia como garantidora dos direitos civis, políticos e sociais e democratização. Como um processo de socialização da riqueza socialmente construída. Relativamente à dimensão especial da profissão, o código de ética afirma o compromisso com a competência, que deve fazer parte do processo de melhoria contínua e de proteção da qualidade dos serviços prestados. A adesão aos princípios éticos definidos pelo Código exige um compromisso político com o próprio projeto de mudança, o que nem sempre acontece nas diversas atividades profissionais cotidianas. O IX Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais realizado em 1998 teve como tema o projeto ético-político do serviço social desenvolvido na década de 1980 e consolidado na década de 1990. Essa proposição continua até hoje e é fortemente enfatizada pela política neoliberal. A discussão sobre a construção de um novo projeto ético-político, que mudaria os rumos do Serviço Social, iniciou-se na passagem dos anos 1970 para os anos 1980, no processo de rejeição e crítica ao conservadorismo da profissão. O novo caminho tomou como base teórica a teoria crítica da tradição marxista. Essa teoria mostra que a sociedade existe por si mesma e é, portanto, um fato. Por outro lado, a atividade humana possui metas e objetivos que devem ser cumpridos, sendo necessário um projeto para alcançá-los. Este projeto deve ser construído com base em valores que legitimam os meios da sua concretização para que os seus objetivos sejam cumpridos (NETTO, 1999). O projeto da empresa é coletivo e por isso tem propostas para toda a sociedade. Para Netto (1999), os projetos empresariais são simultaneamente projetos de sala de aula é: A experiência histórica demonstra que, tendo sempre em seu núcleo a marca da classe social a cujos interesses essenciais respondem, os projetos societários constituem estruturas flexíveis e cambiantes: incorporam novas demandas e aspirações, transformam-se e se renovam conforme as conjunturas históricas e políticas. [...] a concorrência entre diferentes projetos societários é um fenômeno próprio da democracia política. [...] Todavia, também a experiência histórica demonstrou que, na ordem do capital, por razões econômico-sociais e culturais, mesmo num quadro de democracia política, os projetos societários que respondem aos interesses das classes trabalhadoras e subalternas sempre dispõe de condições menos favoráveis para enfrentar os projetos das classes proprietárias e politicamente dominantes (NETTO, 1999, p. 3). Já os projetos profissionais representam a autoimagem de uma classe baseada em valores que a legitimam socialmente. Além disso, delineiam e priorizam objetivos, atividades, formulam requisitos para a atuação profissional, definem padrões de conduta para osprofissionais e criam bases para o relacionamento com usuários, outras profissões e organizações privadas e públicas. Projetos profissionais são construídos a partir de um tema coletivo. No serviço social, esta disciplina coletiva inclui o sistema CFESS/CRESS, ABEPSS, ENESSO, sindicatos e outras associações de assistentes sociais (NETTO, 1999). Segundo Netto (1999), o pluralismo nos projetos profissionais é uma categoria inerente à sua estrutura, pois o sujeito coletivo forma um universo heterogêneo. Porém, segundo o autor, “[...] toda a profissão é um campo de tensões e lutas [...]” (NETTO, 1999, p. 5). Em termos de pluralidade, o projeto hegemônico tem dois componentes: imperativo e indicativo. As seções obrigatórias são obrigatórias para todos os terapeutas. Por exemplo, no serviço social, as componentes obrigatórias são a formação académica e a inscrição no Sindicato dos Serviços Sociais (CRESS). Partes prescritivas são aquelas para as quais não há um consenso mínimo para garantir a adesão estrita (NETTO, 1999). Os códigos de ética profissional são necessários para a atividade profissional, mas não são um fim em si mesmos. Os fundamentos de valores éticos dados nas normas perpassam o projeto profissional como um todo, portanto não é apenas uma parte dele. Os elementos éticos dos projetos profissionais não se limitam a normas morais, direitos e deveres, mas incluem escolhas teóricas, ideológicas e políticas dos profissionais, daí a atual definição de projetos ético-políticos. No contexto histórico da ditadura militar brasileira, a hegemonia conservadora do Serviço Social começou a ser discutida e alterada, principalmente nos movimentos de resistência. Segundo Netto (1999, p. 10), É nesse contexto que o histórico conservadorismo do serviço social brasileiro, tantas vezes reciclado e metamorfoseado, confrontou-se pela primeira vez com uma conjuntura em que a sua dominância no corpo profissional (que, sofrendo as incidências do “modelo econômico” da ditadura, começa a reconhecer-se como inserido no conjunto das camadas trabalhadoras) podia ser contestada – uma vez que, no corpo profissional, repercutiam as exigências políticas e sociais postas na ordem do dia pela ruptura do regime ditatorial. A luta pela democracia na sociedade brasileira, encontrando eco no corpo profissional, criou o quadro necessário para romper com o quase monopólio do conservadorismo no serviço social: no processo da derrota da ditadura se inscreveu a primeira condição – a condição política – para a constituição de um novo projeto profissional. No entanto, o único componente político não foi suficiente para criar um novo projeto profissional de serviço social. A produção teórica do serviço social iniciou-se na década de 1980 e formou uma massa crítica considerável. Na acumulação teórica do serviço social, a maior importância foi separada do conservadorismo teórico e metodológico, pois as matrizes utilizadas foram vistas sob o ponto de vista marxista (NETTO, 1999). O resultado dessa iniciativa foi uma pluralidade de entendimentos teóricos e metodológicos, compatível com o projeto social das massas trabalhadoras, ou seja, uma crítica radical das relações econômicas e sociais existentes. Outra parte da estrutura do projeto ético-político do serviço social foi a reforma curricular em 1982. Procurou-se adequar o bacharelado às novas condições de enfrentamento da questão social exigida pela crescente massa crítica da sociedade classe profissional (NETTO, 1999). O objetivo era criar um novo perfil profissional. Estes anos 1970-1980 as conquistas alcançadas nos anos foram confirmadas na elaboração do código de ética profissional em 1986, embora a discussão sobre a dimensão ética profissional não fosse importante naquele momento. Na década de 1990, a dimensão ética tornou-se importante e amplamente discutida, o que levou à revisão e reformulação do código de ética. A unilateralidade e os limites do texto de 1986 foram ultrapassados, dando lugar ao acúmulo teórico dos últimos 20 anos. Assim, o Código de Ética de 1993 foi o ápice do processo de construção do projeto ético-político do serviço social no Brasil (NETTO, 1999). 6.1 Desafios e possibilidades para o projeto ético-político Como direção social, o trabalho do assistente social é histórico e mutável, pois quando o quadro social muda, surgem novas situações que o obrigam a ser atualizado. Além disso, o serviço social, embora introduza novas formas de fazer, ainda se vale de velhas práticas profissionais que produzem e reproduzem a vida social. Na situação atual, a preocupação do serviço social é do departamento da profissão e o fortalecimento da sua intervenção com as mudanças sociais e a nova regulamentação que a política social enfrenta (ABRAMIDES, 2007). Assim, na subordinação e incerteza do trabalho, a intervenção de um assistente social muda sua perspectiva. Essa nova composição enfatizou negativamente a fragilidade e vulnerabilidade do trabalho; desemprego; e desmontagem de mão de obra geral. Além disso, o assistente social lida diariamente com outras questões, como questões de saúde pública, envelhecimento sem recursos, etc., que representam discriminação e vulnerabilidade social dos usuários dos serviços (ABRAMIDES, 2007). Organizações sem fins lucrativos independentes do estado passam a realizar atividades que não fazem parte da proposta de ação social do estado neoliberal, que só tem projetos extraordinários e especiais no âmbito da seguridade social, cujo objetivo é minimizar atividades negativas da sociedade ajuste estrutural dos programas de segurança. Assim, as ONGs tentam proteger os direitos dos cidadãos de forma mais ampla. Nesse contexto contraditório, o assistente social se depara com a seguinte situação: se por um lado se depara com uma condição que não cumpre sua tarefa na classe baixa, por outro, essa mesma carência o estimula cada vez mais; realizar um projeto ético-político profissional por meio de práticas democráticas, humanas e inclusivas. No entanto, hoje é necessário criar uma visão crítica do que o Estado não é, e fazer uma distinção entre os setores público e privado nesta nova ordem social. Isso no sentido de dar “[...] continuidade ao direcionamento sociopolítico do projeto profissional como um processo pioneiro que vem sendo construído ao longo dos últimos trinta anos [...]” (ABRAMIDES, 2007, pág. 44). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRAMIDES, M. B. C. Desafios do projeto profissional de ruptura com o conservadorismo. Serviço Social & Sociedade, ano 28, n. 91. 2007. BARROCO, M. L. S. Ética e serviço social: fundamentos ontológicos. São Paulo: Cortez, 2001. BRASIL, LEI n° 8.662, de 7 de junho de 1993. Dispõe sobre a profissão de Assistente Social e dá outras providências. Brasília: Presidência da República, 1993. BRAZ. M. Notas sobre o projeto ético-político da profissão. In: CONSELHO REGIONAL DE SERVIÇO SOCIAL 7. REGIÃO. Assistente social: ética e direitos. Rio de Janeiro, CRESS 7. Região, 2000. NETTO, J. P. A construção do projeto ético: político frente à crise contemporânea. In: CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Curso de capacitação em serviço social e política social. Brasília: CFESS, 1999. NETTO, J. P. A construção do Projeto Ético-Político do Serviço Social. Capacitação em Serviço Social e Política Social. CFESS/ABEPSS/CEAD/UnB. Brasília, 1999. SANTANA, R. S. O desafio da implantação do projeto ético-político do Serviço Social. Serviço Social & Sociedade, São Paulo. 2000. SILVA, M. L. L. Um novo fazer profissional. In: Capacitação em serviço social e política social. Módulo IV: O trabalho do assistente social e as políticas sociais. Brasília, DF: CEAD/UnB, 2000. SILVA, O. S. O serviço social na conjuntura brasileira: demandas e respostas. Serviço Social & Sociedade, SãoPaulo, ano 15, n. 44. 1994.