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A Organização da Atenção Nutricional: enfrentando a obesidade Introdução Há cerca de 20 anos, a Secretaria de Saúde de um grande município começou a desenvolver e implantar iniciativas relacionadas à Alimentação e Nutrição. Essas ações foram implementadas, primeiramente, por um Centro de Epidemiologia no qual, ao longo dos anos, foram desenvolvidos diferentes programas na área de alimentação e nutrição, tais como o Bolsa Alimentação e o “Leite é Saúde”. À época, a cidade possuía quase um milhão de habitantes. Em duas décadas, a taxa de crescimento anual da região foi de 2,11%. No ano de 2010, a população ultrapassava um milhão e oitocentos mil habitantes, constituindo-se uma das cidades mais populosas do Brasil (IBGE, 2010)1. Junto com o crescimento populacional, também cresceram as taxas de sobrepeso e obesidade. Em 2006, de acordo com dados da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico, 43,7% da população adulta estava acima do peso e 12,3% com obesidade. Em 2012, o percentual de pessoas com sobrepeso alcançou a marca dos 51,6% e 16,3% da população adulta apresentou obesidade (BRASIL, 2012)2. Esse aumento vertiginoso das taxas de sobrepeso e obesidade apontaram para a necessidade de ações municipais no âmbito da Atenção Nutricional. Atenção Nutricional Compreende os cuidados relativos à alimentação e nutrição voltados à promoção e proteção da saúde, prevenção, diagnóstico e tratamento de agravos, que devem estar associados às demais ações de atenção à saúde do SUS para indivíduos, famílias e comunidades, contribuindo para a conformação de uma rede integrada, resolutiva e humanizada de cuidados. Em termos globais, essas ações aplicam-se a todas as fases do curso de vida e, portanto, a toda população. Já do ponto de vista mais específico, as ações destinam-se a determinadas fases do curso de vida para 1 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Censo, 2010. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/default.shtm. 2 BRASIL.Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Vigitel Brasil 2011: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico [apresentação]. Brasília: Ministério da Saúde; 2012. Disponível em :http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/arquivos/pdf/2012/Abr/10/vigitel_100412.pdf. http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2010/default.shtm http://portalsaude.saude.gov.br/portalsaude/arquivos/pdf/2012/Abr/10/vigitel_100412.pdf 2 atender diferentes públicos: crianças, adolescentes, adultos e/ou idosos, bem como outros grupos de indivíduos. A organização da Atenção Nutricional Desde o início da década de 1990, a atenção à saúde vem sendo organizada e ampliada em todo o município. Inicialmente, as ações estavam integradas ao Centro de Epidemiologia, que possuía um médico e uma nutricionista trabalhando como gestores na área de alimentação e nutrição. Entretanto, ao longo dos anos, com o crescimento da população, surgiu a necessidade de ampliação e diversificação das ações. A antiga área responsável pela gestão e coordenação das ações de alimentação e nutrição precisou então ser reestruturada. Se antes estava localizada no Centro de Epidemiologia, passou a integrar a Diretoria de Atenção Primária à Saúde. Nessa diretoria, encontram-se atualmente diferentes coordenações responsáveis por fortalecer a Atenção Primária, a citar: Coordenação de Atenção ao Cuidado, Coordenação de Suprimento de Serviços, Coordenação de melhoria do acesso e vínculo, dentre outras. A área de Alimentação e Nutrição compõe a Coordenação do Cuidado, que também gerencia os Espaços de Apoio à Atenção Primária (EAAP). Você sabe o que são os Espaços de Apoio em Atenção Primária em Saúde (EAAP)? São espaços de apoio às ações de promoção da saúde e de prevenção de agravos presentes nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) do município em questão, semelhantes aos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), implantados em 2008 pelo Ministério da Saúde. Os Espaços de Apoio, criados um ano após a portaria do Ministério da Saúde para implantação dos NASF, contam com equipes voltadas especialmente para a promoção da saúde e prevenção de agravos, compostas por nutricionistas, profissionais de educação física, fisioterapeutas, psicólogos e farmacêuticos. Cada EAAP é responsável por um grupo de duas a cinco UBS, e é composto por cinco profissionais que desenvolvem atividades de promoção à saúde, prevenção de agravos e eventualmente assistência, juntamente com as equipes das UBS. As equipes têm como objetivo principal ampliar a abrangência e o escopo das ações da atenção básica, bem como sua resolutividade por meio de ações estratégicas voltadas para prática de atividades físicas, de reabilitação, de saúde mental, de alimentação e nutrição, dentre outras. Com o enfoque no controle das condições crônicas de saúde, buscando interferir nos principais fatores de risco, na coordenação do cuidado em saúde ao longo do tempo, as ações de promoção da saúde e de prevenção de agravos buscam atuar no estilo de vida dos cidadãos. 3 Atualmente, estão implantados no município cerca de trinta EAAPs nas mais de cem Unidades Básicas de Saúde do município. Como foram organizadas as ações de Atenção Nutricional? No Brasil, o excesso de peso e a obesidade afetam a população em todas as etapas da vida. No município relatado, a situação não é muito diferente. Dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN) local mostram que o problema acomete indivíduos de todas as faixas etárias. Cerca de 4% dos menores de 5 anos apresentam peso elevado para idade. No que se refere às crianças entre 5 e 9 anos, os valores de sobrepeso e obesidade são aproximadamente 18% e 14% da população, respectivamente. Entre adolescentes, esses dados são ainda mais alarmantes, chegando a cerca de 20% de casos de sobrepeso e 11% de casos de obesidade. Em relação aos adultos, dados do SISVAN também apontam uma prevalência de 34% de excesso de peso e 24% de obesidade. Entre os idosos do município, 45% destes estão com sobrepeso. Frente a esse cenário, os profissionais de saúde do município, ligados à Atenção Básica buscaram trabalhar de forma articulada, construindo um planejamento de trabalho voltado para a Atenção Nutricional, com vistas a organizar as ações de alimentação e nutrição no território e construir a necessária intersetorialidade para o enfrentamento dos determinantes de saúde e nutrição da população. A questão do excesso de peso O sobrepeso e a obesidade são problemas mundiais, caracterizando uma grave questão de saúde pública. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, cerca de 2,8 milhões de pessoas morrem, a cada ano, devido a tais agravos. No Brasil, estes números também são alarmantes. Os dados da Pesquisa de Orçamento Familiar de 2008/2009 apontam para uma prevalência de excesso de peso e obesidade em diferentes etapas do curso da vida dos indivíduos. De acordo com tal pesquisa, o excesso de peso atinge 32% das meninas entre 5 e 9 anos de idade e 34,8% dos meninos. Em relação à obesidade, a prevalência foi de 11,8% para meninas e 16,6% para meninos. Quanto aos adolescentes (10 a 19 anos), o excesso de peso chega a 21,5% para indivíduos do sexo masculino e 19,4% para pessoas do sexo feminino. No que se refere à obesidade, a prevalência cai para 4% entre o sexo feminino e 5,8% entre o sexo masculino. A situação dos adultos mostra-se um pouco mais grave. Segundo a pesquisa, o excesso de peso chega a atingir 50,1% dos homens e 48,0% das mulheres. A obesidade chega a 12,4% em homens e 16,9% em mulheres. 4O planejamento O planejamento das ações de Atenção Nutricional foi desenvolvido por diferentes profissionais da saúde, não só da área de Alimentação e Nutrição. As atividades foram divididas em etapas: definição de objetivos, determinação da situação atual, desenvolvimento de cenários prováveis, análise e escolha de alternativas e soluções, implementação do plano e avaliação dos resultados. Durante o planejamento, foram propostos objetivos prioritários a serem alcançados, tais como a diminuição da prevalência de sobrepeso e obesidade entre a população adulta da região, bem como a prevenção destes agravos em crianças e adolescentes. Após a definição dos objetivos, a equipe partiu para o diagnóstico da situação atual com base na análise dos processos de trabalho, recursos e necessidades existentes. Percebeu-se, assim, uma grande demanda por atendimento em todos os distritos, o que provavelmente dificultaria o atendimento individual, tendo em vista o número de profissionais alocados na Atenção Básica. A partir desse diagnóstico, a equipe construiu possíveis cenários de atuação, que foram analisados tendo como horizonte a melhor forma possível de intervir na realidade da população. Nesse processo de construção, cabe ressaltara importância do diálogo estabelecido entre os diferentes profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas, educadores físicos, psicólogos, farmacêuticos) e a gestão municipal. Tal diálogo permitiu não apenas identificar alternativas e soluções para os desafios encontrados, mas também fortalecer o compromisso da gestão central com a implementação do plano de trabalho elaborado coletivamente. Para tanto, foram realizadas reuniões quinzenais nas quais participavam todos os profissionais envolvidos. Durante as reuniões, os participantes propunham práticas a serem desenvolvidas, simulando possíveis resultados e ações de aperfeiçoamento. A equipe de saúde definiu algumas alternativas/soluções para a organização da Atenção Nutricional - Abordagem coletiva; - Alimentação e Nutrição abordada de forma transversal, por todos os profissionais; - Treinamento dos profissionais de saúde; - Articulação entre diferentes áreas da saúde; - Articulação entre profissionais nutricionistas. Optou-se pela abordagem nutricional de forma coletiva, mediante a realização de atividades em grupo, principalmente aquelas voltadas à reeducação alimentar. Tais atividades reuniram profissionais participantes dos EAAPs, inclusive os nutricionistas. 5 Em todas as Unidades Básicas de Saúde, foram criados grupos para atender pessoas com excesso de peso e obesidade. Esses grupos foram divididos de acordo com a etapa do curso da vida: crianças, adolescentes, adultos e idosos. As abordagens feitas com os grupos foram realizadas de forma transversal, de modo a reunir diferentes profissionais e áreas de conhecimento com o objetivo detratar do tema da Alimentação e Nutrição em sua totalidade. Cabe ressaltar que as atividades foram desenvolvidas em diferentes espaços, não se restringindo apenas às Unidades Básicas de Saúde. As ações também estavam presentes em escolas e espaços comunitários. No entanto, as atividades de Atenção Nutricional não ficaram restritas ao âmbito coletivo, e nem podiam. O atendimento individual também foi realizado, mas de uma forma mais planejada, com o objetivo de atender a situações específicas de alguns pacientes, que demandavam cuidado especializado. Como as ações de atualização profissional foram realizadas? No início, a equipe da Área Técnica de Alimentação e Nutrição identificou a necessidade de ações de formação para os profissionais da Atenção Básica, tanto para abordar os temas relacionados à Alimentação e Nutrição quanto para trabalhar em grupo. Dessa forma, buscou-se qualificar esses profissionais para que atuassem nos grupos de reeducação alimentar e nos demais contextos da Atenção Primária, como nas Equipes de Saúde da Família (ESF), nos EAAPs e também nas Unidades Básicas de Saúde. As ações de formação foram realizadas em parceria com Universidades públicas e privadas com vistas à capacitação dos profissionais para atuarem com a população, de modo a respeitar suas particularidades, bem como os aspectos sociais e comportamentais característicos. Inicialmente, houve a colaboração da área de Nutrição Clínica das universidades participantes. Mas, no decorrer do tempo, a área de Saúde Coletiva foi envolvida e a integração entre as áreas clínica e social ganhou destaque, demonstrando que a atuação na atenção básica requer formação profissional generalista. Dessa forma, durante os treinamentos, foi ressaltada a importância da articulação entre as diferentes áreas da Nutrição, bem como entre as diferentes áreas da saúde para o atendimento integral da população. Manuais e protocolos de Nutrição foram desenvolvidos para serem utilizados pelos profissionais nos grupos de reeducação alimentar e demais atividades. Os profissionais de cada área foram capacitados a desenvolver seu próprio roteiro de trabalho de acordo com a realidade e recursos existentes. Cabe ressaltar a questão da transversalidade das ações de Atenção Nutricional e a participação de diferentes profissionais de saúde na organização das ações, tais como psicólogos, farmacêuticos, enfermeiros, médicos, fisioterapeutas, entre outros. 6 As ações As ações desenvolvidas geraram bons frutos, que se refletiram no modo como o atendimento à população era prestado. Atualmente, a Atenção Nutricional é realizada em três frentes: 1) Promoção da Alimentação Saudável; 2) Prevenção de doenças e distúrbios nutricionais e; 3) Assistência nutricional. Conheça melhor cada uma delas a seguir! 1) Promoção da alimentação saudável As ações de promoção da Alimentação Saudável realizadas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) são: - Atividades de educação nutricional pelas nutricionistas dos Núcleos de Apoio em Atenção Primária à Saúde (NAAPS), tanto nas UBS (ex: grupos de lactentes, gestantes, hipertensos, diabéticos), quanto em outros equipamentos sociais e espaços da comunidade; - Capacitação dos funcionários das UBS no tema Alimentação Saudável; - "Programa Comunidade Escola" no qual são desenvolvidas e implementadas, no ambiente escolar, ações relacionadas à alimentação e nutrição, de forma multidisciplinar; - Além desses, as Unidades Básicas de Saúde possuem diferentes materiais educativos que são utilizados em atividades de educação nutricional. 2) Prevenção de doenças e distúrbios nutricionais Dentre as ações para prevenção de Doenças e Distúrbios Nutricionais, pode-se citar: - Ações preventivas à condição de excesso de peso e obesidade pelos Grupos de educação alimentar; - Implementação do Programa Leite das Crianças: destinado à diminuição da desnutrição em crianças de 6 a 36 meses de idade, pertencentes a famílias em situação de vulnerabilidade social. Essas crianças recebem o equivalente diário de 1 litro de leite fluído pasteurizado, com teor mínimo de gordura (3%) e enriquecido com Ferro e Vitaminas A e D; - Implementação do Programa Nacional de Suplementação de Ferro: tem como objetivo a realização de atividades de orientação alimentar e nutricional concomitantes à distribuição medicamentosa de sulfato ferroso e ácido fólico. 7 3) Assistência nutricional São exemplos das ações de assistência nutricional desenvolvidas: - Implementação do Programa de Atenção Nutricional às pessoas com necessidades especiais de alimentação: tem como principal objetivo promover a atenção nutricional, bem como os cuidados gerais de saúde de pessoas com necessidades especiais de alimentação; - Implementação do Programa de Suplementação Nutricional: tem como público crianças menores de 6 mesesque possuem restrições ao aleitamento materno; - Implementação do Programa Bolsa Família e acompanhamento das condicionalidades de saúde da população atendida. Vale a pena mencionar que as ações e atividades de formação desenvolvidas geraram manuais e cartilhas importantes para a orientação do trabalho nos diferentes âmbitos da Atenção Nutricional. Dentre esses materiais, encontram-se alguns documentos como: - Cartilha “Alimentação Infantil: Orientação aos pais”: distribuída a familiares de crianças menores de 10 anos; - Cartilha “Alimentação para uma vida saudável”: destinada a trabalhos de educação nutricional; - Protocolo do Programa de Atenção Nutricional. A utilização desses documentos nos diferentes espaços de Atenção à Saúde tem propiciado um cuidado integral da população. Aspectos que fazem a diferença Ao longo de duas décadas de trabalho, a área de Alimentação e Nutrição do município tem desenvolvido e aprimorado sua atuação na promoção da alimentação adequada e saudável de forma articulada e transversal. Nesse contexto, a capacitação de profissionais da área, a troca de informações e o trabalho dialogado e interdisciplinar foram essenciais para o fortalecimento da Atenção Nutricional. O apoio do nível central de gestão também se constituiu como fundamental para o sucesso das ações planejadas. Desse modo, cabe destacar a importância do tripé: transversalidade, apoio da gestão e capacitação para o sucesso das ações de Atenção Nutricional. 8 Por fim, ressalta-se o esforço empreendido pela área técnica de alimentação e nutrição do município para qualificar a Atenção Nutricional, de modo a fazer desta um diferencial para melhorar a saúde da população. *** Transversalidade Apoio da gestão central Capacitação
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