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HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA AUTOR: PEDRO V.F. MEDRADO - É todo sangramento decorrente de lesões proximais ao ligamento de Treitz · HDA – Esôfago, Estômago e Duodeno (85%) · HDB – Delgado, colón, reto e ânus (15%) EPIDEMIOLOGIA - A HDA corresponde por 1-2% das internações hospitalares de urgência no Brasil, com mortalidade de 10-14%. · E aproximadamente 80% dos episódios de sangramento digestivo ocorrem no trato gastrointestinal alto. - Os pacientes com mais comorbidades tendem a apresentar níveis mais altos de mortalidade - Pacientes com IC complicada podem apresentam até 28,4% - O sangramento por varizes esofágicas geralmente apresenta perdas sanguíneas de maior amplitude. - Ocorre duas vezes mais em homem, e aumenta com a idade - A prevalência maior em áreas de menor desenvolvimento socioeconômico - A incidência global de HDA causada por úlcera pépticas vem diminuindo, possivelmente graças ao aumento de prescrição de IBP, além dos esforços para erradicação do H. pylori. · No entanto, determinados grupos, como idosos com comorbidades e pacientes cirróticos com história de varizes esofagogástricas parecem ter aumento. CLASSIFICAÇÃO E CAUSAS - Varicosas (15%) – varizes de esôfago, gástricas e duodenais - Não-varicosas (85%) – doença ulcerosa péptica (55%), Má-formação arteriovenosa (6%), Mallory-Weiss (5%), Tumores (4%), Erosões (4%) e outras (11%) - Descrição das frequências e etiologias mais comuns de hemorragia digestiva alta não varicosas. - A prevalência depende muito da coorte do estudo DOENÇA ULCEROSA PÉPTICA - A DUP é a etiologia mais frequente da HDA não varicosa - Incidência entre 31-67% dos casos, com mortalidade entre 3-14%, com aumento com a idade, hospitalizações e comorbidades. · Causas mais comuns de úlceras no TGI, incluem lesão péptica devido à infecção por H. pylori e uso de AINE. - Quatro grandes fatores de risco para desenvolvimento de HDA nesses pacientes · O uso de AINEs · Infecção pelo H. pylori · Estresse · Acidez gástrica - Preditores de recidiva hemorrágica · Idade >60 anos; · História de úlcera péptica; · Choque; · Comorbidades; · Baixo nível de Hb com necessidade de hemotransfussão; · Sangramento ativo como hematêmese ou visualizado na endoscopia. - Secreção ácida péptica causa uma arterite com infiltração de polimorfonucleares. · Perímetro da artéria, sendo mais intensa próximo à base da úlcera, onde ocorre necrose da parede vascular, causando a ferida sangrante Quadro clínico - Manifestações clínicas variáveis – história clínica + exame físico com toque retal · Melena · Hematêmese · Enterorragia ou hematoquezia · Sangramento oculto QUADRO CLÍNICO - História clínica e diagnóstico mais prováveis · Uso de AINE ou Warfarina – úlcera gastroduodenal · Enxerto aortofemoral ou aneurisma – fístula aortoentérica · Hepatopatia crônica – varizes esofagogástricas · Polipectomia prévia – HDB · Púrpura e petéquias – vasculites, leucemia e plaquetopenias · Ausência de dor abdominal – angiodisplasias · SIDA – Kaposi, CMV, Herpes, fungos e micobacterioses · Vômios ou soluços intensos – Síndrome de Mallory-Weiss - Critérios clínicos de alto risco de morbimortalidade · Idade>60 anos · Choque, instabilidade · Comorbidades associadas · Hematêmese e enterorragia volumosa · Melena persistente · Hemorragia em pacientes internados · Ressangramento em pacientes já tratados com EDA · Necessidade de transfusão sanguínea · Aspirado NG c/ sangue vivo CONDUTA INICIAL NOS PACIENTES COM HDA - Medidas gerais – assegurar vias aéreas pérvias e ventilação adequada, além de restabelecimento hemodinâmico dos indivíduos. · Oxigênio suplementar se SatO2<90% · IOT se hematêmese grave e/ou rebaixamento do nível de consciência · Garantir proteção de via aérea e prevenção de bronco-aspiração. - Restaurar volemia – garantir acesos venosos calibrosos · Avaliar necessidade de cristaloide e hemoderivados de acordo com achados do exame físico: palidez cutânea, alteração da temperatura das extremidades, tempo de enchimento capilar, PA, FC, FR, alteração do nível de consciência e diurese. · Acessos venosos calibrosos: · Punção venosa periférica, jelco 16 a 18, ou acesso venoso central. - Estimativa de perda sanguínea · Classe I – até 750ml · Classe II – 750-1500ml · Classe III – 1500-2000ml · Classe IV - >2000ml - Solicitar exames laboratoriais: hemograma completo, coagulograma (TP, INR), função renal, eletrólitos, tipagem sanguínea e função hepática (nos hepatopatas) - Quando transfundir hemoderivados? · Hematêmese maçica · Hb<7g/dL · Pacientes coronariopatas se beneficiam com níveis de Hb acima de 9 a 10g/dL · Em pacientes >65 anos de idade, sintomáticos é aceitável transfundir quando níveis de Hb<9g/dL · HDA ativa + INR>1,5 · Plaquetas <50.000 com sangramento ativo · Plaquetas <10.000 mesmo sem sangramento ativo Diagnóstico endoscópico - A EDA é o método diagnóstico de escolha na HDA, com acurácia de 94% dos casos para DUP. - EDA nas primeiras 12-24h da internação, após estabilização hemodinâmica. - Classificação de Forrest · Forest I – risco de ressangramento maior · Ia – em jato, risco de ressangramento 90% · Ib – babando/ em porejamento, risco de sangramento de 50% · Forest II · IIa – coto vascular visível, risco de sangramento de 33% · IIb – coagulo visível/aderido, risco de sangramento de 10% · IIc – fundo com pontos de hematina, risco de sangramento de 7% · Forest III – fundo limpo, risco de sangramento de 3% Outros métodos diagnósticos - Arteriografia · Quando indicar? · Em pacientes com hemorragia volumosa em que a EDA não identificou o sítio do sangramento · E quando a terapêutica endoscópica não foi eficaz. · Condição para identificação – o sítio do sangramento deve ter uma velocidade mínima de 0,5 mL/min. · Permite identificar e possibilita a terapêutica com injeções seletivas que estanque o sangramento. - Cintilografia – hemácias marcadas com Tc-99 · Quando indicar? · Pacientes com EDA em que não é capaz de identificar o sítio do sangramento. · Condição para identificação – velocidade mínima de 0,1mL/min · Positividade de 25-64%, e precisão de 41-95%. Lavagem gástrica - Lavagem gástrica é questionável · O uso da sonda nasogástrica pode ter valor como diagnóstico na confirmação inicial de HDA · A presença de sangue vermelho vivo no aspirado é preditor independe de ressangramento · 16% desses pacientes apresentam lavado negativo, mesmo se vier negativo não exclui sangramento · Sonda com água gelada (vasoconstrição) – não tem benefício Estratificação do risco de ressangramento - Escore de Rockall – avaliar mortalidade e prognóstico do doente · Baseia-se em parâmetros clínicos: idade, situação da volemia (choque, PA e pulso), presença de comorbidades e características endoscópicas. · Varia de 0 a 11 pontos - Escore de Rockall menor ou igual a 2 pontos são de baixo risco para desfechos desfavoráveis (ressangramento <5% e mortalidade <1%) - Escore de Rockall maior ou igual a 8 o risco de ressangramento é de 53,1% e mortalidade 41,1% Tratamento a longo prazo - Tratamento a longo prazo de pacientes com úlcera hemorrágicas · H. pylori identificado – erradicar H. pylori ESOFAGITE - A doença do refluxo gastroesofágico, em algumas situações pode causar uma HDA. - Além do RGE, infecções (Candida albicans, herpes vírus e CMV), lesões químicas ou danos físicos podem resultar em erosões na mucosa. - Tratamento clínico com IBP - EDA se ulcera focal com sangramento ativo ou recente, pode fazer injeção de epinefrina ou ablação. LACERAÇÃO DE MALLORY-WEISS - Sangramento normalmente após episódios de vômitos e ingestão aguda de álcool - A maioria dos casos, o sangramento cessa de forma espontânea e é indicado apenas medidas de suporte - De 15-30% dos pacientes acabam necessitando de alguma forma de terapia endoscópica (cauterização com eletrocautério, injeção de epinefrina, aplicação de clipes metálicos e ligadura elástica) · Via de regra sangramento cessa espontaneamente e a conduta é expectante LESÃO DE DIEULAFOY - Lesão originada de uma dilatação vascular arterial aberrante, medindo 1-3mm localizada na submucosacom desgaste da mucosa evoluindo para ruptura do vaso. - Sangramento intermitente, recorrente e importante repercussão hemodinâmica. - Etiologia desconhecida, descrito com associações com doenças hepáticas e uso de AINEs - EDA é o exame de escolha, porém difícil identificar se o sangramento não é ativo. - Terapêutica endoscópica hemostática tem resultados quando realizada a ligadura elástica ou clipes metálicos. DOENÇA VARICOSA - A grande maioria associada a hipertensão portal e cirrose, resultado do sangramento de varizes esofágicas ou gástricas. - Apenas 50% dos pacientes com HDA varicosa param o sangramento espontaneamente quando comparado com 80-90% dos indivíduos com HDA não varicosa. · Cessado o sangramento, há elevado risco de recorrência, principalmente nas primeiras 48-72 horas, podendo ocorrer em até 70% nas primeiras seis semanas. - Mortalidade de até 20% em seis semanas - Etiologias diversas da HP – atentar-se para esquistossomose (zona da mata) - Varizes gástricas são menos comuns que as esofágicas - Fatores preditores de mortalidade no sangramento varicoso · Idade >60 anos; · Instabilidade hemodinâmica; · Presença de comorbidades; · Uso de anticoagulantes e anti-inflamatórios; · Sangramento volumoso ou persistente; · Recidiva precoce de HDA; · Necessidade de hemotransfusão. Classificação das varizes - Grau I – varizes de fino calibre, medindo até 3mm de diâmetro - Grau II – varizes de médio calibre, medindo entre 3 e 5 cm de diâmetro - Grau III – varizes de médio calibre, medindo acima de 6mm de diâmetro com tortuosidades - Grau IV – varizes com mais de 6 mm de diâmetro tortuosas e com sinais da cor vermelha ou com presença de manchas hematocísticas na superfície. TUMORES - São causas comuns no hospital, geralmente paciente mais idoso que acompanha de perda de peso. TRATAMENTO ESPECÍFICO PARA HDA NÃO VARICOSA - Inibidor da bomba de prótons (IBP) por via endovenosa · Antes da endoscopia é recomendado para pacientes com HDA de origem ulcerosa. - Omeprazol na dose de 80mg em bolus IV, seguido da infusão contínua de 8mgh - Meta-análise evidenciou que a dose intermitente de IBP IV (40 ou 80mg 2x/dia) tem eficácia semelhante à infusão continua. - Se confirmada a origem ulcerosa da HDA, manter IBP por 72h após a terapêutica endoscópica e, em seguida, poderá ser modificada para dose 40mg/dia por VO. - A infecção pelo H. pylori é a principal etiologia da doença ulcerosa péptica e a sua erradicação reduz substancialmente as taxas de recorrência da doença. - Adrenalina como homeostático - Agentes pro-cinéticos antes da endoscopia – eleva o sucesso da terapêutica endoscópica, melhora a visualização da mucosa · Eritromicina 250mg ou 3mg/kg IV, 20-120 minutos antes da endoscopia. TRATAMENTO ESPECÍFICO PARA HDA VARICOSA - Droga que diminui o fluxo esplâncnico · Terlipressina 2-4mg EV + 1-2 mg EV 4/4h por 2 a 5 dias · A Somatostatina: dose inicial de 250mg seguida por uma infusão continua de 250-500mg/h - Tratamento endoscópico com ligadura elástica – controle do sangramento em 86-92% dos casos - EDA + escleroterapia caso a ligadura não esteja disponível - Balão esofágico (balão de Sengstaken Blakemore) · No sangramento esofágico agudo refratário · Deve permanecer por no máximo 24h · Efetivo no controle do sangramento em 90% dos pacientes · Risco de ressangramento com a desinsuflação do balão é de 50% · As complicações estão presentes em 15-20% dos pacientes (ulceração esofágica, necrose e perfusão esofágica, necrose de asa de nariz e pneumonia aspirativa) - TIPS – Derivação intra-hepática portossistêmica transjugular · Para os casos mais graves, casos refratários, Child B com sangramento ativo e Child C · Complicações · Encefalopatia portossistêmica · Estenose (em até 50%) ou trombose do shunt com ressangramento · Trombose da veia porta · Sangramentos (hematoma, hemoperitôneo e hemobilia) PROFILAXIA PRIMÁRIA DA HDA VARICOSA - Quando fazer? · Portadores de varizes de médio e grosso calibre; · Presença de sinais vermelhos nas varizes; · Paciente com doença hepática grave (Child-Pugh B e C); · Opcional em pacientes com varizes de fino calibre. - Betabloqueadores utilizados – propranolol e o nadolol · Propanolol até 320mg/dia, e Nadolol até 80mg/dia · Carvedilol em baixas doses (6,25 a 12,5g/dia) · Objetivo – reduzir em 20% a 25% da FC inicial (limite inferior de 55 bpm e uma PAS mínima de 90mmHg) · Mais de 30% dos pacientes não exibem redução na pressão portal - Ligadura elástica – paciente com contraindicação ou intolerância ao uso de terapia farmacológica, ou pode associado Betabloqueador + Ligadura elástica. · O uso combinando de ligadura elástica e betabloqueador não seletivo é usado na prevenção da recorrência de sangramento de varizes. Se o paciente sangrar, você pode continuar usando. · Se o paciente não pode fazer ligadura elástica, a outra opção são os nitratos – maximizando a redução da pressão portal. - Prevenção de ressangramento · Betabloqueador não seletivo (propranolol ou nadolol) + terapêutica endoscópica de preferência ligadura elástica · A endoscopia deve ser realizada, em média, a cada 2 semanas, até obliteração das varizes - Não se faz escleroterapia para profilaxia primária (aumento do risco de sangramento varicoso), só é feita no sangramento ativo - Antibioticoterapia profilática para cirróticos por 7 dias – Ciprofloxacina e Ceftriaxona · Todo paciente cirrótico com ascite e HDA deve receber profilaxia – Norfloxacina VO 400mg 12/12h - Profilaxia de encefalopatia hepática com uso de lactulose ou rifaximina durante o período de sangramento digestivo. CONCLUSÕES - A HDA é relativamente comum e associada com mortalidade ainda relativamente alta - A doença ulcerosa péptica ainda é a maior causa de HDA - A EDA deve ser realizada nas primeiras 24h após o evento - Pacientes com alto risco de sangramento em úlceras deve, além de terapia endoscópica, fazer o uso de IBP intravenoso - Os betabloqueadores são o tratamento de escolha para profilaxia primária - O tratamento farmacológico da hemorragia varicosa aguda é preferencialmente realizado com terlipressina ou somatostatina - A eficácia da ligadura é maior que a escleroterapia para pacientes com hemorragia varicosa aguda. - Fatores de pior prognóstico na HDA · Idade avançada · Maior número de comorbidades · A origem do sangramento é varicosa · Hipotensão ou choque à admissão · Enterorragia ou vômito com sangue “vivo” · Número de transfusões necessárias · Sangramento ativo à endoscopia · Sangramento de úlcera >2cm · HDA em paciente internado · Necessidade de cirurgia de emergência