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POLÍCIA COMUNITÁRIA E GESTÃO INTEGRADA AULA 4 Prof. Dalton Gean Perovano 2 CONVERSA INICIAL Nesta aula, discutiremos a respeito do papel desempenhado pelas instituições na gestão integrada que combina segurança pública e defesa social. Esse processo tem especial relação com a articulação de princípios de policiamento comunitário, tendo em vista que, segundo Rico (1998), a verdadeira prevenção do crime não é fruto da presença da polícia de forma ostensiva, mas da atuação proativa, antecipativa, com o estabelecimento do contato com a população. As instituições de segurança pública e de defesa social enfrentam obstáculos significativos relativos à prevenção eficaz do crime, em virtude da necessidade de reformas em seus sistemas, sobretudo no que diz respeito à aplicação de projetos desenhados e dimensionados à população. Na atualidade, é necessária a criação de novos e originais papéis para as forças policiais, como a criação do “policial da vizinhança”. Além disso, faz-se preciso que as unidades básicas das polícias tenham responsabilidade territorial e poder decisório da chefia local e que as tarefas da gerência superior sejam reconstruídas. TEMA 1 – GESTÃO INTEGRADA E COMUNITÁRIA DA SEGURANÇA PÚBLICA A integração das ações da segurança pública consiste em um sistema de proteção e regulação do convívio social, definido pela Constituição Federal de 1988, art. 144, como "Dever do Estado, direito e responsabilidade de todos" e exercido pelas polícias Federal, Rodoviária Federal, Ferroviária Federal, Militar e pelo Corpo de Bombeiros. A Constituição, embora ainda preveja que as Guardas Municipais também façam parte desse processo, não descreve o sistema penitenciário e a aplicação da justiça. As instituições, por vezes, não trabalham de maneira integrada. Além disso, no cumprimento de seus papéis constitucionais, carecem de maior delimitação legal e do cumprimento, por parte dos gestores, do que já se encontra delineado pela lei. Para superar essas disparidades, Rico e Salas (1992) referem-se ao cumprimento das normas que precisam ter valor prático, a menos que seus conteúdo e significado sejam compreendidos, por meio da educação, da formação e do controle, por todos os funcionários responsáveis pela aplicação da lei. 3 Nesse sentido, o conceito de polícia comunitária e os modelos de policiamento comunitário consistem no que melhor atende aos princípios éticos e a uma lógica de planejamento para as ações de segurança pública, em qualquer sociedade. Para Dias Neto (2000, p. 27), o modelo de gestão fundamentado na administração hierarquizada auxilia na organização das ações da polícia: O modelo profissional implementou mudanças radicais nos sistemas internos de prevenção e punição de abusos. Implantou-se um estilo militarizado de gestão, baseado em regras e restrições que enfatizavam a importância da ordem e da disciplina. Para evitar ambiguidades na aplicação das regras, introduziu-se um modelo de administração altamente hierarquizado, conhecido como “sistema de comando e controle” (comand and control system). Nesse sentido, uma polícia profissional vai além do sistema de comando e controle. É também necessário que os policiais façam de seu ofício a sua vida e assim valorizem a instituição a que servem e, consequentemente, à comunidade que atendem. TEMA 2 – A NATUREZA DO POLICIAMENTO COMUNITÁRIO A atividade de policiamento transita por duas fronteiras: o policiamento repressivo/reativo e o policiamento preventivo. Seguramente, essas duas categorias são formas didáticas e práticas de nomearmos a polícia quando esta atua, respectivamente, de maneira repressiva/reativa ou de forma preventiva diante de terminadas situações. No entanto, entre essas duas categorias, existem múltiplas formas ainda não catalogadas, ou não estudadas, de diversas naturezas de ações policiais. Vale ressaltar que Trojanowicz e Bucqueroux (1999) descrevem o que não é policiamento comunitário e alertam que este não é um nome a mais para prevenção do crime, tendo em vista que prevenção não é necessariamente sinônimo de policiamento comunitário. A prevenção do crime, segundo os autores, é uma das ações realizadas pela polícia, mesmo que esta desenvolva suas atividades na perspectiva do policiamento tradicional. Pelo policiamento preventivo são assegurados: 1. Presença de profissionais bem equipados e bem treinados; 2. Condições de comparecimento rápido para uma repressão; 3. Uso de investigação para descoberta de autores de delito e de apresentação provas contra eles, em caso de falha de repressão imediata; 4 4. Denúncia de infratores presos em flagrante ou identificados posteriormente; 5. Julgamento e condenação de infratores denunciados; 6. Recolhimento para cumprimento de pena de condenados – se recolhidos, são mantidos presos pelo tempo da sentença condenatória e devolvidos à sociedade recuperados. TEMA 3 – O POLICIAMENTO ORIENTADO AO PROBLEMA Uma das ferramentas de gestão adotadas no policiamento comunitário é o policiamento orientado ao problema (POP), ou Problem-Oriented Policing, que envolve a identificação e a análise das especificidades do crime, da desordem ou do problema, a fim de obter resposta eficaz. O POP foi desenvolvido por Goldstein, em 1979, e ampliado em 1987 por John E. Eck e William Spelman para o método Sara, focado também na resolução de problemas. O modelo Sara (no Brasil, Iara) adota quatro elementos básicos para a resolução do problema de segurança pública (Brasil, 2007, p. 134-135): “scanning (identificação), analysis (análise), response (resposta) e assessment (avaliação)”. A comunidade consiste em um dos fatores fundamentais para a gestão comunitária da segurança pública e representa a força articuladora da sociedade, pois é por ela que as ações e a vontade da coletividade são desempenhadas. Segundo Dantas (2007), a comunidade é definida como um grupo de pessoas que vivem em determinadas zonas e que estão ligadas por mútuos interesses. A comunidade, por sua natureza, apresenta inúmeros problemas de ordem de interesse pessoal ou coletivo, que, por vezes, contrariam as volições individuais ou de grupo de pessoas, com as eventuais articulação e condução ou com a mediação da polícia para a resolução do problema. Dessa maneira, no policiamento comunitário, a ocorrência policial é apenas o sintoma de um problema. No POP, é apresentada uma nova ferramenta para que se trabalhem as causas e a solução desse problema. O foco do trabalho comunitário é assegurar que a polícia mobilize recursos e esforços na busca de respostas preventivas para as adversidades locais, em vez de reagir contra incidentes, isto é, trabalha com foco voltado aos sintomas 5 desses problemas. Em outras palavras, a polícia passa a trabalhar para a resolução das causas. TEMA 4 – A CONSTITUIÇÃO DAS FORÇAS NA COMUNIDADE Nos estudos de polícia comunitária, encontramos três categorias de comunidades: de negócios, escolar e organizada. O papel do município, no amplo sistema de segurança pública, além de ser protetor de seus bens e serviços, está direcionado à prevenção social e situacional, conforme atribuição específica do art. 144, parágrafo 8º, da Constituição Federal. Assim, a gestão integrada e comunitária da segurança pública, para obter resultados positivos, depende da ação planejada na participação dos agentes políticos, representados pelos poderes Executivo e Legislativo. Outras organizações sociais são de absoluta importância no cenário contributivo para a área da segurança pública, como a escola, as instituições de ensino superior, as organizações não governamentais (ONGs), as instituições religiosas, os clubes de serviço, o Sistema S, as federações de comércio, as associações comerciais, a maçonaria, entreoutros parceiros importantes. Uma comunidade organizada provê a mobilização inteligente dessas forças. A mídia consiste em outro fator fundamental na formação da opinião pública, e a comunidade, por sua vez, deve criar o ambiente favorável e inteligente para que a imprensa esteja a serviço de seus propósitos. Outro espaço de ação da polícia comunitária são os gabinetes de gestão integrada em segurança pública, implantados no Brasil em 2009, cuja finalidade é condensar esforços, articulando as instituições das diversas esferas de governo conforme um tema comum, nesse caso, a redução da violência e da criminalidade. Os principais participantes do amplo sistema de segurança pública são as polícias Militar, Civil, Federal, Rodoviária Federal, Ferroviária Federal, os Bombeiros Militares e os Guardas Municipais, os quais poderão desempenhar as ações de gestão de policiamento comunitário desde que sejam qualificados para tal. 6 TEMA 5 – O CONSELHO COMUNITÁRIO DE SEGURANÇA PÚBLICA O Conselho Comunitário de Segurança Pública consiste em uma entidade de direito privado, com vida própria e independente com relação aos segmentos da segurança pública ou a qualquer outro órgão público. É uma modalidade de associação comunitária, de utilidade pública, sem fins lucrativos, constituída para o exercício do direito de associação garantido no art. 5º, inciso XVII, da Constituição Federal. Esse Conselho tem por finalidade mobilizar e congregar as forças da comunidade para a discussão de problemas locais da segurança pública, no contexto municipal ou em subdivisão territorial de um município. Ele difere dos conselhos municipais de segurança pública, visto que o objetivo destes é a criação dos poderes legislativos municipais, com propósitos político-partidários voltados à definição de ações estratégicas que influenciem o ente federativo. Além disso, o Conselho Comunitário de Segurança Pública consiste em um meio para incentivar e organizar o voluntariado, proporcionando um espaço em que ocorra o debate e a promoção da solidariedade. A participação de seus conselheiros e da comunidade permite o diagnóstico de problemas locais. Além disso, possibilita a criação de ações estratégicas preventivas referentes à segurança pública, por meio da mobilização do amplo espectro da rede comunitária, que inclui, por exemplo as pessoas organizadas, o poder público, o empresariado, as organizações não governamentais. As pautas referentes aos problemas locais são discutidas em reuniões periódicas entre representantes das comunidades, igrejas, escolas, organizações representativas da segurança pública e defesa social, nas quais as situações adversas são identificadas e analisadas de maneira sistêmica. Nesse contexto, as organizações representativas da segurança pública e a defesa social participam como parte da solução das causas desses problemas, uma vez que a solução e a sua articulação são de responsabilidade coletiva. NA PRÁTICA Suponha que o prefeito de um grande centro urbano de um estado brasileiro tenha realizado, ao longo de seu mandado eleitoral, grandes obras de revitalização, construção de longas extensões de ruas, incentivado e 7 implementado muitas indústrias de transformação, gerando, assim, muitos empregos e grande desenvolvimento econômico. Em consequência disso, imagine que tenha ocorrido a migração de muitas pessoas de áreas rurais – com pouca ou sem qualificação para a indústria – para esses centros, atraídas pela esperança de emprego e de melhor qualidade de vida. Com o deslocamento dessas pessoas do interior, munidas de poucos recursos financeiros e, em sua maioria, sem referências de familiares na nova área, formou-se um aglomerado ainda maior em uma favela próxima a um bairro tradicional e residencial. Em virtude disso, a polícia local registrou aumento nos níveis de ocorrências policiais, como pequenos furtos, crescimento da demanda de vagas na educação, problemas com o saneamento básico, entre outros aspectos. Diante do cenário imagético apresentado, de que maneiras as três categorias de comunidades poderiam se organizar para traçar um plano de contingência? FINALIZANDO O principal objetivo das políticas públicas é levar à população as condições mínimas dos processos de humanização, de dignidade e de bem- estar social. No campo da segurança pública e da defesa social, os princípios de polícia comunitária permitem que os gestores articulem os melhores resultados operacionais e de condições de trabalho de seus agentes, em consonância com os anseios das comunidades. A força das comunidades está em estas interagirem e dependerem uma das outras, e são elas que se mobilizam/constroem o projeto de polícia comunitária, com a organização das demais forças da sociedade, a criação de um conselho comunitário de segurança, entre outros. Nesse sentido, o Poder Executivo, nos níveis federal, estadual e municipal, com o provimento de recursos para a preservação da ordem pública, contribui para a melhoria das condições de vida das pessoas, com a contratação e a qualificação de policiais, guardas municipais, promotores e juízes, a aquisição e a manutenção de equipamentos e armamentos, a construção de prédios para delegacias, quartéis, bases comunitárias, estabelecimentos prisionais, a aquisição e a manutenção da frota de veículos, entre outros aspectos. O Poder Legislativo, no exercício de suas funções previstas na Carta 8 Magna, tem a importância da criação de leis e a proteção das Instituições de Segurança Pública e Defesa Social, na perspectiva de Polícia Comunitária. 9 REFERÊNCIAS BRASIL. Constituição Federal Anotada. São Paulo: Editora Método: 2014. BRASIL. Secretaria Nacional de Segurança Pública – Senasp. Curso nacional de polícia. Portaria nº 14/2006, Brasília, DF, 2007. DIAS NETO, T. Policiamento comunitário e controle sobre a polícia: a experiência norte-americana. IBCrim. 2000. DANTAS, G. F. de L. Em busca de um modelo de gestão da segurança pública: policiamento comunitário. 2007. RICO, J. M. La policía en américa latina: del modelo militarizado al comunitario, Pena y Estado. n. 3. Policía y sociedad democrática, Rústica, Buenos Aires, 1998. RICO, J. M.; SALAS, L. Delito, insegurança do cidadão e polícia. Rio de Janeiro, 1992. TROJANOWICZ, R.; BUCQUEROUX, B. Policiamento comunitário: como começar. 2. ed. São Paulo: Polícia Militar do Estado de São Paulo, 1999.
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