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Copyright © Cassandra P. Lewis, 2020 Copyright © The Gift Box, 2022 Todos os direitos reservados. Direção Editorial: Anastacia Cabo Preparação de texto e revisão final: Equipe The Gift Box Arte de Capa: Bianca Santana Tradução e diagramação: Carol Dias Nenhuma parte do conteúdo desse livro poderá ser reproduzida em qualquer meio ou forma – impresso, digital, áudio ou visual – sem a expressa autorização da editora sob penas criminais e ações civis. Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança com nomes, datas ou acontecimentos reais é mera coincidência. Sumário Início Capítulo 1 Capítulo 2 Capítulo 3 Capítulo 4 Capítulo 5 Capítulo 6 Capítulo 7 Capítulo 8 Capítulo 9 Capítulo 10 Capítulo 11 Capítulo 12 Capítulo 13 Capítulo 14 Capítulo 15 Capítulo 16 Agradecimentos Cassandra P. Lewis kindle:embed:0007?mime=image/jpg Os sinos estão tocando, você consegue escutar? O Natal significa um monte de coisas para um monte de gente. Um tempo para a família, um tempo para doar. Um tempo para refletir. Seja lá o que o feriado signifique para você, espero que te traga o que você precisa. Feliz Natal! O supermercado, algumas semanas antes do Natal, às seis e meia da noite, é uma experiência. As pessoas nesta época do ano estão um pouquinho loucas; eles sem dúvida precisam ter um saco inteiro de nozes com cascas, dez tubos de cada sabor de batata Pringles e quatro tubos de chocolate Quality Street, ou o Natal deles estará arruinado. Não estamos totalmente no tempo em que isso acontece — temos alguns dias antes de as pessoas começarem a perder a cabeça por completo —, porém, ainda assim, há pessoas varrendo as prateleiras em busca de lembrancinhas e pacotes de água tônica, apenas por precaução, tornando isso aqui um inferno. Há famílias que vão direto para lá com seus filhos, ainda de uniforme da escola, brigando com eles o tempo inteiro enquanto mais e mais produtos cheios de açúcar são jogados no carrinho. Há os filhos sem noção, pegando presentes de última hora, como esmaltes ou vasos de plantas antes de fazerem suas viagens nos dias anteriores ao Natal. Há os mais velhos, que procuram amêndoas açucaradas ou gelatina de laranja e rodelas de limão, e as jovenzinhas escolhendo cílios e unhas postiças para suas saídas à noite no Natal. Sem mencionar os compradores semanais de sempre, frustrados com o fluxo crescente em seus corredores de sempre. E então, há euzinha. Está vendo aquela garota ali? Aquela que parece que normalmente come de forma regular e malha com alguma frequência, mas que, no momento, está se esgueirando pelo mercado e empurrando um carrinho cheio de comida gordurosa e vinho? Sim, essa sou eu, e há uma razão perfeitamente razoável para eu estar parecendo que planejo comer uma tonelada de biscoito e queijo, mas vou chegar lá. Meu nome é Ella, e aqui vão alguns fatos curiosos sobre mim. Vivo e trabalho em Londres. Não preciso te dizer nada sobre Londres, preciso? Não, acho que não. Sou executiva de relações públicas e sou muito boa. Ainda não tenho nem trinta anos, mas já recebo um salário invejável e acabei de alcançar minha terceira promoção em sete anos. Sou bem feliz, de maneira geral. Tenho uma família doida, porém ótima, e alguns amigos maravilhosos. Faço pilates, ioga e spinning três vezes na semana e geralmente sigo uma dieta bastante limpa, embora goste de uma ou duas taças de vinho e nem me deixe começar a falar sobre meu amor por salgadinhos… Quanto mais salgado, ou picante, melhor. Trabalho duro e tento me divertir muito, e gosto de pensar que sou divertida — até as noites ficarem mais escuras e os dias mais frios, então meu humor muda. Veja só, eu absolutamente odeio o Natal. Loucura, né? Especialmente com um nome como o meu; ah, espera, não te falei meu nome completo, falei? É Noella Star Frost! Sim… tem como ficar mais temático? Meu pai me nomeou e tenho certeza de que ou ele estava chapado na época ou bebeu Baileys demais naquele ano. Sei o que você está pensando — que eu devo ser algum tipo de Scrooge… morta por dentro. Que tipo de pessoa odeia o Natal? É que a data, para mim, não é só isso. Também é meu aniversário e o próximo, que será daqui a onze noites frias e escuras, será quando farei vinte e nove anos. Todo mundo pensa que deve ser maravilhoso fazer aniversário no Natal. Você deve receber vários cartões e presentes, né? Errado. Na verdade, as pessoas apenas juntam os dois eventos em um e, em pouco tempo, esquecem totalmente do seu aniversário. Até o seu noivo — como se o Natal já não fosse um dia ruim o bastante para largar alguém. Há mais do que isso, porém, do que minha falta de presentes duplos e meu coração partido há dois anos. Quando eu tinha dez anos, ouvi um barulho no andar debaixo na véspera de Natal e, certa de que era o Papai Noel, desci as escadas para ver minha mãe cuidadosamente criando marcas de pegadas com neve no carpete usando talco e meu pai mordendo os biscoitos que deixamos para o grandão. Fiquei devastada. Depois, como se perder a mágica natalina por conta dos meus pais não fosse decepção o suficiente, quando eu fiz doze anos, acordei na manhã do Natal e descobri que a razão para o meu labrador, Billy, não vir brincar comigo era porque ele estava morto. Caramba, você acredita nisso? Ele morreu. No Natal. Feliz aniversário para mim. O Natal para mim é apenas miserável, sempre foi e, pelo que posso dizer, sempre será. Então aí está. Eu odeio o Natal e não vão me fazer mudar de ideia. Meus anos de feriados miseráveis me trouxeram a este ponto e, no último dos meus vinte e tantos anos, tomei uma decisão final. Dane-se. Dane-se a viagem de duas horas de carro até a casa dos meus pais ou a gruta, como é conhecida nesta época do ano. Dane-se o coral na praça da vila. Dane-se o jantar com peru. Dane-se a cidra quente. Dane-se a árvore, a fogueira, as tortas de carne moída e, pelo amor de Deus, danem-se os malditos presentes. Cansei de colocar um sorriso falso por duas semanas no ano. Neste Natal, me entupi por duas semanas de trabalho e vou me trancar no meu loft, comendo comida gordurosa, bebendo demais, sem nunca me vestir e assistindo apenas filmes de menininha e musicais. Subitamente, a data soa bastante atraente. Quando termino de guardar todas as guloseimas que acabei de comprar, decido que é justo ligar para minha mãe e avisar sobre meus planos para o feriado. Não vai cair bem, mas será necessário. Precisarei de uma taça de vinho primeiro, porém. Abro um Merlot, sirvo uma taça bem generosa e tomo um gole tão grande que não consigo nem engolir de uma vez, e só então aperto para ligar. — Oi, mãe — digo, animada, assim que ela atende, e me preparo para a merda bater no ventilador. — Não, mãe. Estou bem, de verdade. Só senti que devo ficar em Londres esse ano. Tem muita coisa acontecendo. Depois de trinta e cinco minutos de conversa ao telefone, tento o meu melhor para ainda soar convincente, procurando no congelador por sorvete. Ela está devastada por eu não ir para casa. Aparentemente, o Natal não será o mesmo sem mim. Não, posso garantir que será bem mais feliz sem meus constantes comentários mal-humorados e sarcásticos. — Ok, mãe, prometo que vou tentar aproveitar. Te ligo em alguns dias. Amo você. Desligando e colocando o telefone no silencioso, suspiro, aliviada. Vou mesmo fazer isso. Jogo-me no sofá, puxando uma manta sobre as pernas e agarro o controle remoto. Que a operação Dane-se o Natal comece de verdade. Tenho uma ótima vista da cidade na minha sala, especialmente à noite. Às vezes, apenas sento no sofá com uma taça de vinho e, em vez da TV, observo as luzinhas brilhantes do trânsito e as janelas dos escritórios e blocos de apartamentos enquanto escuto música. Sei o que você está pensando: luzinhas brilhantes, que alegria. Bem, é exatamente por isso que minhas persianas estão fechadas hoje à noite. Não haverá brilhos festivos neste loft, muito obrigada. No lugar, serão musicais e realitiesshows, algo previsível. Fico sentada no sofá, gemendo pela minha barriga estar cheia e pelo pote agora vazio de sorvete. Por um breve momento, desejo ter alguém para dividir tudo isso. Abro o aplicativo no meu telefone que promete te ajudar a encontrar amor, mas tudo o que realmente entrega é sexo medíocre com pessoas aleatórias. De todo jeito, funciona para mim. Não estou atrás de mais do que isso. Olho para ele por um segundo, considerando mandar mensagem para um cara com quem dei match e com quem já saí, para ver se ele está a fim de um chameguinho, mas decido que é melhor não. Primeiro, estou com a barriga cheia de sorvete e, segundo, não vou me dar o trabalho de tomar banho. Não sinto falta de estar em um relacionamento, a maior parte do tempo, mas há momentos em que tenho saudades de ter alguém para simplesmente dividir meu espaço. Essa é uma das coisas pelas quais eu gostava de estar com Pete. Com frequência, sentávamos juntos, lendo, sem falar nada, e eu amava. Acho que eu deveria te contar um pouco sobre ele, não deveria? Meu ex-noivo, o homem a quem estava pronta para me comprometer? Assim, ele é uma grande parte do motivo de eu estar dizendo não ao Natal este ano, então faz sentido, acho. Pete e eu nos conhecemos na faculdade; na real, ele era meu professor. Não se deixe levar por imagens mentais de velhos suados usando suéteres cheios de traças. Quando comecei meu curso aos dezoito anos, Pete só tinha vinte e oito e era um gostoso. Não estava pronta para seguir em frente do meu relacionamento anterior, então foram meses em que ele foi apenas uma coisinha bonita para eu olhar, seguidos de dois anos de flerte e insinuações sutis antes de algo realmente começar. Quando fui selecionada para acompanhar Pete em um jantar de premiação em Birmingham, pelo meu trabalho em um projeto que rendeu ao nosso departamento algum reconhecimento da indústria, aconteceu. Champanhe demais, meu vestido de matar, quartos de hotel a algumas portas de distância e dois anos de frustração sexual reprimida me fizeram bater na porta dele trinta minutos depois de ele me deixar na minha. Quando ele abriu com uma camisa desabotoada e um copo de uísque na mão, apenas me deu um sorriso conhecedor e deu um passo para o lado para me deixar entrar. A arrogância deveria ter sido uma bandeira vermelha, mas, na época, apenas me fez balançar uma branca. Rendi-me, de corpo, mente e alma. Ele poderia fazer comigo o que desejasse, e eu queria que ele fizesse tudo. Na manhã seguinte, esperava que Pete me implorasse para manter em segredo e me dizer que nunca poderia acontecer de novo, ou perderia o emprego. Em vez disso, me acordou com uma repetição exata do que aconteceu na noite anterior e muito mais. Claro, tivemos que manter em segredo. Ainda faltavam oito meses para eu conseguir o diploma e não queria que Pete perdesse o emprego por minha causa; mas nunca mais fazer o que fizemos naquela noite certamente não era uma opção. Vivemos quase seis bons anos juntos, ou pelo menos pensei que tivesse sido. Ele me pediu em casamento no nosso segundo aniversário, dois anos desde que contamos às pessoas sobre nós. O casamento estava bem adiantado: o local alugado, o vestido pendurado na casa dos meus pais, e então tudo desandou. Aparentemente, ele tinha se apaixonado por uma de suas ex-alunas, que era seis anos mais nova que eu. No caso de você não estar acompanhando, isso a tornava dezesseis anos mais jovem que ele. Está vendo um padrão surgindo? Minha mãe, é claro, me lembrou de que ela nunca gostou dele. Que ela nunca confiou nele e “fazer isso bem no Natal” — entende o quero dizer? Bem no Natal e não “no seu aniversário” — “bem, apenas mostra o tipo de homem que ele realmente era”. Tive sorte de escapar, aparentemente; sim, me senti bem sortuda (insira aqui um rolar de olhos sarcástico!). Ainda assim, seguindo em frente, afinal, sou britânica. Cabeça erguida, velha amiga. Tomo um gole de vinho e decido que dois anos é tempo suficiente para ficar mal. Já coloquei tudo na conta do carma de todo jeito, por conta de um erro épico de relacionamento antes de conhecer Pete. Já me arrependi desde então e aquilo voltou para me ferrar de jeito. Ainda não estou interessada em conhecer ninguém para nada sério, de jeito nenhum; felizmente solteira e pronta para me envolver com um saco de Doritos que sei que estou cheia demais para comer, mas não consigo resistir. Carreira, família e amigos são tudo para mim a partir de agora; relacionamentos são superestimados de todo jeito e podem ir para a caixinha do “dane-se”, junto do Natal. Bem, isso é tudo para o meu primeiro dia de “dane-se o Natal”. Até agora, tudo bem. Ao subir na minha cama deliciosamente confortável e me aninhar para passar a noite, me sinto cheia até o talo, embora relaxada e satisfeita por essa ser a melhor decisão que já tomei. Acordo no susto e procuro meu telefone. Não tiro um dia livre do trabalho além dos fins de semana e quando estou fora do país há quatro anos. A parte do meu cérebro que sabe que é terça-feira, mas não que tirei folga decide me dar um pequeno ataque cardíaco antes do restante da minha mente se ligar e me dizer para relaxar. São onze da manhã! Cristo, nunca dormi tanto! Seis da manhã é normalmente o meu prazo. Começo a rir. Poderia me acostumar com isso. Desço da cama e ligo o sistema de som do loft. Foi um dos meus grandes gastos quando consegui a última promoção. Teve que ser instalado profissionalmente por técnicos que me deram uma lição completa de como usar. Toca em todos os cômodos e posso coordenar a luz por todo o apartamento para combinar com o clima e o ritmo da música. É bom para festas, longos banhos e basicamente tudo entre isso. A parede de vidro do meu banheiro que separa o box do chuveiro do restante do cômodo muda completamente de cor para combinar com qualquer humor que eu quiser. Eu amo. Entro no chuveiro — hoje roxo, no caso de você estar se perguntando — e canto a plenos pulmões cada música no meu mix dos anos oitenta, enquanto me esfrego, depilo, passo shampoo e condicionador — levando meu tempo e aproveitando cada gota gloriosa e quente de água que vem da ducha acima de mim. Depois do meu café da manhã totalmente do bem com bolinhos açucarados e um milk-shake de chocolate direto da embalagem (eu sei, estou regredindo), decido fazer maratona na Netflix enquanto faço minhas primeiras compras on-line. Amo roupas novas e, ai, os sapatos. Tiro um cochilo à tarde, me atualizo nos últimos acontecimentos da minha timeline do Facebook e então me ajusto para assistir Missão Madrinha de casamento pela centésima vez quando meu telefone começa a vibrar na mesinha de centro. Não, não, de jeito nenhum, não vai rolar. Não vou atender. Não vou atender ao telefone de jeito nenhum. Não mesmo. Não… — Oi, mãe. — O quê? Eu sou fraca… — O quê? Mãe, fala devagar. Não consigo entender uma palavra. — Ela está entrando em pânico e agora eu também. Não dá para compreender o que ela está tentando me falar, então fico feliz quando minha irmã aparece no telefone. — Ella, é o papai. Estamos no hospital. Eles acham que é um ataque no coração. Está brincando comigo? Mesmo quando eu não participo do Natal, a maldição ainda me atinge. — Ok, Nats. Estou a caminho. Meu pai tinha um ataque do coração esperando para acontecer há anos. Está acima do peso e não é a pessoa mais ativa do mundo. Come doces como se tivesse medo de que alguém fosse levar todos embora e torce o nariz toda vez que minha mãe dá salada ou batata assada, mas se recusa a ouvir que há qualquer coisa para se preocupar. Ele provavelmente é a minha pessoa favorita no mundo e não consigo lidar com o pensamento de perdê-lo. Não tenho nem certeza do que joguei na minha bolsa para passar a noite; enchi a mão com roupa íntima, uma escova e uma seleção aleatória das roupas que toquei primeiro. Não queria esperar mais nenhum segundo do que o necessário antes de cair na estrada. Ter que parar para abastecer era frustração suficiente, e me peguei bufando como tanto de tempo que o tanque parecia levar para encher. Dirijo direto para o hospital para ver meu pai e, a esta altura da noite, não era para levar as duas horas e meia que meu GPS está prometendo; pelo menos espero que não. — Ella, caramba, você deve ter vindo voando. Não esperávamos que você chegasse por pelo menos mais uma hora. — Minha irmã luta para ficar de pé e me abraçar assim que piso na sala de espera. Ela deve dar à luz em três semanas e, pelo seu tamanho, você nunca acreditaria que só há um bebê ali dentro. Quero fazer o que sempre faço e dizer que ela parece enorme, soltar alguma piada com elefante e então conversar diretamente com sua barriga para dizer ao meu sobrinho que sou a única pessoa normal da família, mas não posso. Agora não. Estou preocupada demais. Não estou pronta para perder meu pai. — O que está acontecendo? — pergunto, nervosamente olhando da minha irmã para minha mãe, que caiu no sono em uma cadeira no canto da sala. — Ele sentiu um pouco de dor. Não tenho certeza. Estava brincando com Poppy e então ela gritou a plenos pulmões, aí corremos para a sala e vimos que ele tinha desmaiado. — Ela engole em seco e fecha os olhos por um momento. — Chamei a ambulância e estamos aqui. Jude nos falou que pode ser um ataque do coração, mas… Espera. — Jude? — interrompo, meu coração saltando para a garganta, após eu ter pulado todas as partes importantes do que ela acabou de me contar. Subitamente, o papai não é mais minha única preocupação. — Sim, Ella, Jude. Ele é médico aqui — dispara. Ai, merda! Meu coração bate forte no peito e devo estar fazendo careta, porque Nats rola os olhos. — Noella, não é momento ou lugar para você sentir peso na consciência, então engole isso. Natalia é três anos mais velha que eu, casada com um homem amável e tem uma filha de três anos, Poppy, e meu sobrinho, que está cozinhando dentro da barriga enorme dela. Somando tudo, ela tem a vida organizada. Ela é uma completa adulta, embora eu, além da minha carreira e casa linda, sinta muitas vezes que estou brincando de ser gente grande. É professora da escola primária e muito boa em seu trabalho, mas também é ótima em me fazer sentir que tenho cinco anos de idade e acabei de ser pega desenhando nas paredes. Amo minha irmã, ela é ótima, minha melhor amiga e… Ah, você quer saber quem é Jude? Espere, espere, vou chegar lá em um minuto. — Desculpa, Nats, é só que… Paro de falar quando a porta da sala de espera se abre e lá está. Ah, e ele é lindo de morrer e faz meus joelhos fraquejarem; sempre foi. Todo dia desde que nos conhecemos, ele partia corações; pelo menos era isso que toda senhora idosa que colocava os olhos nele dizia. Na verdade, não acho que ele poderia quebrar sequer um coração, não Jude. Ele me olha e tem que voltar o rosto para mim para confirmar. Sorrio timidamente, esperando que não haja sinais externos de como meu coração está batendo rápido ou do tanto de calor que subitamente sinto, mas ele muda sua atenção para Nats. — Seu pai teve um ataque na angina, Tali. — Meu estômago dá cambalhotas com o fato de ele usar um apelido para minha irmã, e a memória de como sempre esteve confortável com a minha família. Ele era parte dela, de verdade. — Está estável agora, mas precisamos monitorá-lo de perto. Vou dar um tiro no escuro e colocar a culpa na dieta dele. — Sorri e minha mãe, que agora está subitamente desperta, levanta da cadeira. Ela pega no pé do meu pai sobre a dieta há anos. — Ele não é ativo como já foi e certamente ganhou alguns quilos nos últimos anos. O tom de Jude é simpático, mas conhecedor. Natalia se senta e minha mãe coloca a cabeça entre as mãos. Ele se abaixa na frente dela e segura seus dedos, a encorajando a encará-lo. Ela o faz e visivelmente relaxa, embora eu quase passe mal. — Ele vai ficar bem. Só precisa largar o biscoito recheado. — Jude vira para Natalia e sorri, um sorriso largo, confortável e de parar o coração, que literalmente sai em sua voz. Você consegue ouvi-lo sorrir, o que é isso? — É melhor eu voltar ao trabalho. Vocês devem ir para casa, descansar. Vamos cuidar dele. — Vira-se para mim, o rosto de alguma maneira sem expressão. — Bom te ver, Nel. — E então, sem outra palavra, ele sai, e sinto que posso respirar de novo. Ok, agora que ele se foi, me deixa te contar tudo sobre Jude. O amável, lindo e sexy pra caramba doutor Jude. Jude e eu nos conhecemos quando o pai dele conseguiu um emprego no hospital local e comprou uma casa perto da nossa. Eu tinha quatro anos e um mês — e tinha muito orgulho daquele mês —, Jude era quatro meses mais velho. Rapidamente nos tornamos inseparáveis. Jude e eu passamos nossos dias jogando futebol, subindo em árvores e brincando com carrinhos de brinquedo, ou assistindo filmes da Disney em dias de chuva. Éramos melhores amigos, até que, um dia, Jude entrou na escola e, do nada, se tornou a criatura mais linda que já vi. Na minha mente, ele parecia Nick Carter dos Backstreet Boys e, para ser honesta, o que mais uma adolescente do final dos anos noventa poderia querer? Jude não entendia por que eu parei de querer ficar com ele e tentei ficar normal ao seu redor, mas, honestamente, não conseguia. Sentia um calor e ficava vermelha na sua companhia, minha língua ficava presa e eu começava a suar. Uma bagunça. Tínhamos catorze anos quando Carly Barnett deu uma festa em casa. Era a primeira vez que íamos a uma festa onde não havia adultos e, de alguma maneira, havia álcool. Jude não estava lá quando cheguei e fiquei aliviada. Saí para fumar e beber, enquanto Jo Milner beijava Darren Hardy a alguns centímetros de mim. Sentindo que segurava vela, pensei em deixá-los e entrar na casa. Estava indo ao banheiro quando alguém me puxou pelo braço até a varanda. Era Jude — e eu estava prestes a vomitar com meu nervosismo e empolgação. Ele tinha cheiro de desodorante Lyx Africa, que para mim, adolescente, com um pouco de álcool nas veias e já incontrolável atração por ele, sem mencionar a camisa azul pólo que ele estava usando e eu amava, ficou insuportável e me deixou totalmente selvagem. — Aí está você! Estava tentando te encontrar sozinha há dias e você continuava se esquivando de mim. O que está acontecendo com você, Nel? — Parecia preocupado e eu com calor. Que bagunça. — O que você quer dizer? — Sei que disse essas palavras, mas não era minha voz. Era estridente e vacilante, e transparente demais. — Noella, somos amigos há uns dez anos e agora você nem fala comigo. Sinto sua falta. Ai, merda! Se meu interruptor de tesão adolescente já não estivesse ligado para ele, Jude acabou de colocar na força máxima. Calor subiu pelas minhas bochechas e procurei ao redor por uma escapatória. Então a porta se abriu. — Ai, graças a Deus, Ella. Achei que você nunca diria a ele que gostava dele. Aproveite. Joanne Milner do caralho. Morri por dentro. Juro, devo ter ficado vermelha-beterraba do calor que saía do meu rosto. Jo fechou a porta de novo e a varanda já aconchegante parecia dez vezes menor do que antes. Jude ficou quieto por um minuto — eu não conseguia falar, nem olhar para ele. — É verdade? Você gosta de mim? — perguntou, tímido. Sem qualquer escolha àquela altura, apenas acenei. Ele riu. — Ai, caramba, Nel, por que você simplesmente não me disse? — E então me beijou. Sem aviso, sem esclarecer como se sentia, apenas meu primeiro beijo de revirar o estômago e me deixar de joelhos. Foi o começo de uma nova era para Jude e eu. Uma hora depois do beijo, ele virou meu namorado oficialmente. O que o transformou em meu primeiro amor, o que o transformou em minha primeira vez. O que depois acabou comigo partindo seu coração. — Chocolate quente para todas? — minha mãe pergunta quando entramos na cozinha. O marido de Nat, Richard, e sua filha, Poppy, estão dormindo na cama. É tarde e sei que estamos todos exaustos, embora preocupados. Quero ir para a cama. Estava bem cheia de comida gordurosa e me sentindo letárgica quando subi no carro, mas a adrenalina me fez enfrentar. Agora, que tudo se acalmou,estou exausta, mas até eu saber que minha mãe está dormindo e acomodada, não vou deixá-la. Aparentemente, nem Natalia vai. — Okay, mãe — responde por nós duas e sentamos à mesa da cozinha, mamãe se virando para começar a fazer as bebidas. — Ella, você vai ficar bem se dividir o quarto com a Pops? — Nats pergunta e aceno. — Claro que sim, mana. Não se estresse. — Sorrio e dou um tapinha em sua mão sobre a mesa. A conversa não está fluindo particularmente bem dada a exaustão coletiva, e estou apenas torcendo para que minha mãe anuncie em breve que está pronta para dormir. — Certo, meninas. Vamos tirar um cochilo. Ella, estou muito feliz por você estar aqui, amor. — Mamãe me entrega uma xícara de chocolate quente e se inclina para beijar minha cabeça antes de, com a sua xícara em mãos, nos desejar boa noite e sair do cômodo em direção às escadas. Natalia e eu trocamos olhares e sorrimos, fraquinho, pegando as nossas e seguindo também. O papo pode esperar. — Cedo demais. Resmungo de brincadeira. Estou bem ciente da minha bela sobrinha de três anos de idade, que atualmente está batendo no meu nariz com alguma coisa que ainda não identifiquei. — Acorda, Elly, sou eu — sussurra, por algum motivo desconhecido, dado o recente ataque ao meu rosto. Tento esconder uma risada. — Não, estou cansada. — Solto um gemido e então uma risada, quando batem na minha testa com algo. — Ai, Poppy. Abro os olhos para a criança carrancuda com asinhas de fada, uma das mãos no quadril e a outra empunhando o objeto agressor: uma varinha brilhante com uma estrela rosa no topo. Sento e olho para ela, fazendo minha cara de “vou te pegar”, e ela começa a rir. Estico-me, seguro debaixo de seus braços e puxo-a mais para cima na cama, a enchendo de cosquinha. Poderia até ser considerado tortura. Estou praticamente prendendo a menina para fazer cosquinha debaixo dos seus braços, assim consigo ouvir aquela risada. É contagiante. Dava mesmo para iluminar meu dia mais sombrio. Amo essa garotinha mais que tudo na vida. Depois que ela me implora para parar em meio a risadas incontroláveis, encerro a tortura antes de aproveitar o abraço mais amável de todos com minha humanazinha favorita, que revela todos os itens que colocou em sua carta para o Papai Noel. Aquela que Natalia me mandou por e-mail há algumas semanas, assim eu poderia escolher o que comprar. — E então pedi duas Barbies, e perguntei se elas poderiam ser bonitas. E pedi um carro rosa. E um pouco de chocolate. Aí, no Natal, você pode brincar com uma delas. E vou dividir meus chocolates com você. Sorrio e espero, me perguntando se ela terminou. Seu sorriso é o maior e mais radiante que ela tem. — Vamos lá. Hora do café da manhã. Poppy e eu descemos as escadas para a cozinha aberta e área de jantar, e somos recebidas pelo som de Last Christmas, de Wham, tocando alto no rádio da mamãe. Suspiro, tão baixinho quanto posso — e assim se inicia. Poppy começa a rir e rodopiar com a música, sacudindo sua varinha no ar, mamãe e Natalia rindo e aplaudindo. Ando até lá e abaixo o rádio, mas Natalia imediatamente coloca alto de novo como estava antes, arregalando os olhos para mim como um aviso para não começar. Olho para ela, que ergue a sobrancelha de um jeito que diz: “nem pense nisso, maninha”. Cedo, afinal, o Natal na gruta nunca muda. Sento à mesa e Nat me entrega uma xícara. Há um bule de chá fresco sobre a mesa, então me sirvo um pouco quando ela se senta ao meu lado. — Jude ligou. Viro para ela, que sorri para mim, sabendo. Seu nome ainda me afeta. Não consigo esconder isso dela. — Disse que o pai parece melhor hoje. Deve voltar para casa amanhã, se tudo estiver bem. Vamos vê-lo mais tarde, se você quiser? — Sim, claro que quero, são ótimas notícias. — Dou um gole no chá, o que me faz sorrir. Não bebo chá em Londres, só quando estou em casa. Quero dizer, na casa dos meus pais. E é bem reconfortante. — Ele não vai ficar feliz de mudar a dieta. Natalia e eu rimos, mamãe geme na cozinha. — Ai, meninas, nem falem. Ele vai dar tanto trabalho. — Nega com a cabeça e então ri conosco. Conhecemos o papai muito bem. Ele não é nada mal- humorado, é um homem muito amável, mas é teimoso com suas coisas. Gosta de cerveja, carne e gordura no café da manhã; fuma cigarro e se recusa a acreditar que qualquer dessas coisas faça mal a ele. É um velho teimosos e vai odiar isso. Tomo outro gole do chá e observo Natalia levantar e dançar com Poppy, girando sua barriga enorme de forma que me fez sentir cansada, e nem estou grávida. Não sei como ela tem tanta energia. Mamãe está fazendo massa para tortas na cozinha. É uma adorável cena natalina, ou deveria ser, se eu não odiasse o Natal, é claro. Olho em volta para as decorações festivas que mamãe colocou com cuidado em todo o cômodo. É bem bonitinho, até para mim. Ela passou anos juntando decorações realmente especiais para pendurar e tudo tem o seu lugar. É familiar e confortável, mas é Natal. Não dá para evitar sentir que, quanto mais tempo eu passar aqui, mais parece que algo ruim vai acontecer. Preciso garantir que meu pai está bem, é o mais importante, mas assim que tiver certeza disso, preciso dar o fora daqui, pelo bem da minha família. — Oi, pai — cumprimento, dando a volta na cama de hospital. Inclino-me e deixo um beijo e um abraço nele. — Como está se sentindo? Ele abraça Natalia e minha mãe, então estende o braço para fazer um buraco para Poppy sentar. É coisa do papai. Ele sempre estica o braço em formato de “O” e desafia Nat e eu para ver se ainda cabemos. É claro que sim, logo, ele nos dá o tipo de abraço que apenas o melhor pai do mundo inteiro pode dar. Poppy ri e a levanto na cama. Ela ri e se aconchega no avô, instantaneamente o acalmando de um jeito que só ela consegue. Ele responde minha pergunta. — Estou me sentindo bem, amor. Tive uma boa noite de sono e algumas boas drogas. Obrigado por vir até aqui, não consigo acreditar que tive que fingir um ataque do coração para te trazer para casa. — Pisca, rindo, e eu sorrio, negando com a cabeça. Amo tanto meu pai. Passamos algum tempo nos atualizando e rindo pelos peidos espontâneos (aparentemente) relacionados à gravidez de Natalia. Ela nem sabe quando vão acontecer, o que resulta em algumas situações hilárias e embaraçosas, como na noite de apresentação de rúgbi de seu marido, Richard, e na piscina infantil do clube local. O tempo de visitas é tão limitado no hospital que você se pega constantemente verificando o relógio. Temos que sair daqui às três e já são duas e meia. Não quero ir. Senti muito a falta do meu pai. Preciso de um aliado na casa de mulheres malucas. Richard, meu outro parceiro no crime, está no trabalho o dia inteiro e não vai voltar até de noite. Há uma batida na mesa atrás de mim e viro. É Jude e — ai, Deus — ele está maravilhoso. Como ele pode andar por aí com essa aparência? Quer dizer, é apenas injusto. Está usando o uniforme do hospital, nada glamouroso e, ainda assim, totalmente sexy. Seus olhos cor de avelã reluzem com o brilho da janela e combinam com as mechas caramelo que ele sempre teve em seu cabelo habilmente despenteado. Só me pergunto quanto trabalho ele teve para fazer seu cabelo parecer que não tinha feito nada, quando coloca a mão no ombro de Natalia e eles sorriem calorosamente um para o outro. — Não estou interrompendo, né? — pede, e toda minha família o cumprimenta com entusiasmo, até mesmo Poppy, a traidorazinha. Ela não sabe o que significa “ex”? — Só preciso verificar seu prontuário, John. Permaneço sentada na ponta da cama com as costas viradas para Jude. É igual tortura. Só quero encará-lo e absorver cada centímetro de beleza, mas sei que não tenho direito. Minha família está aproveitando um leve papo com ele enquanto me dissolvo na frente deles. Todos riem e conversam como se fossem antigos amigos. Minhas bochechas ficam quentes e parece que não consigo erguer os olhos do fio do lençol embaixo de mim, que estou mexendo sem perceber. — Vamos nos certificar de que ele pare de comertorta, Jude — minha mãe garante, encarando meu pai, que rola os olhos e bufa. — Preciso que fique aqui mais um pouco, Frosty. — Sorri e aperta a mão dele, mas não consigo evitar relaxar com o som reconfortante do apelido que ela deu ao papai. — Bem, fico feliz de ouvir, Sue. Pequenas mudanças farão um mundo de diferença, John. Jude coloca o prontuário no final da cama, bem atrás de mim, tão perto que, se eu me inclinar só um pouco para trás, seus dedos tocariam a parte de trás do meu braço. Sua pele na minha pela primeira vez em uma década; pensar nisso é demais para lidar e, em vez de reclinar para trás, me mexo para frente, longe dele. — Certo, a menos que exista qualquer mudança drástica hoje à noite, você pode ir para casa amanhã. Não estarei aqui, mas o médico de plantão vai avaliá-lo e ligar. Vejo vocês depois. Ele deixa o quarto e enrolo uma revista antes de bater com ela na cabeça de Natalia. — Ai — reclama, rindo, assim como Poppy. — Por que isso? Ela sabe muito bem. — Por mantê-lo falando. Aquilo foi tão estranho. — Apenas para você. — Ri mais forte e o restante da família se junta a ela. Brilhante. Poppy ri ainda mais pela histeria de sua mãe, que me olha. — Ele mora na casa ao lado da mamãe e do papai, mana. Você vai vê-lo e precisa aprender a lidar com ele. Olho para Nats, confusa, mas decido não questionar mais sob o medo de morrer de vergonha. Jude mora ao lado? Ele voltou a viver com a mãe? Não consigo imaginar um médico em alta vivendo com a mãe, então preciso descobrir os detalhes daquele pedaço de informação, mas não agora. Quanto mais pergunto sobre Jude, mais Natalia vai me zoar. Voltamos do hospital e minha mãe começa a fazer um chá. Um vapor quente e lindo. Sempre que estamos todas aqui, nós mulheres nos sentamos à mesa de jantar enquanto uma de nós cozinha. Richard está na sala, assistindo futebol; se meu pai estivesse aqui, estaria com ele. Poppy está sentada à mesa fazendo cartões de Natal e Natalia está na cadeira ao meu lado com o pé no meu colo para eu massagear seus tornozelos inchados. Estamos em paz. Minha mãe passeia pela cozinha cantando o que toca na rádio. O som das músicas e as cores das luzes natalinas que vão mudando levam minha mente de volta ao loft, ao meu sistema de som, minhas luzes. Se o papai vem para casa amanhã, não há motivo para eu ficar. Ainda temos nove noites até o Natal. Se eu for para casa assim que ele se assentar, ainda posso salvar meus planos de “dane-se”. — Hello, Terra chamando Noella. — Olho para Natalia e percebo que estava em um mundinho só meu. Parei de massagear seus tornozelos e estava encarando as luzes natalinas. — Desculpa, estava no mundo das fadas. — Sorrio. — Poppy te fez uma pergunta, tia Elly. Viro para minha sobrinha, sentada com um sorriso enorme em seu rostinho estupidamente adorável. — Desculpa, princesa, o que você me perguntou? — Posso dormir com você quando o Papai Noel vier? Natalia sorri para a filha e então para mim. Engulo em seco. — Hm, é… Pode ser que eu não fique aqui até lá, querida. Acho que terei que voltar para casa. Os ombros de Poppy caem e seu lábio inferior começa a tremer. Ai, não, não chore. Não consigo lidar com isso. — O quê? — Natalia pergunta, bruscamente, chamando minha atenção para si. — Bem, você sabe que eu queria ficar sozinha esse ano, Nats. Se o pai estiver bem, eu posso ir para casa. — Faz todo sentido para mim até que vejo as lágrimas nos olhos de Natalia e ela começa a soluçar… Hormônios da gravidez! — Ai, meu Deus, Nats. Não chore. Poppy está chorando de um lado da mesa e Natalia do outro. Sou uma pessoa horrível. — Somos tão ruins? — Natalia pergunta, fungando e secando as lágrimas, e abaixa os pés do meu colo, acariciando a barriga. — Não, não, claro que não — explico. — Eu só não curto o Natal, você sabe disso. Estico-me para frente e coloco as mãos em seus joelhos para tentar transmitir meu amor. — Nós te amamos, Ella. Sentimos sua falta. Eu sinto sua falta. Estou cansada, gorda e cheia de hormônios, e preciso da minha irmã. — Ela chora um pouco mais, porém é tão dramático que suspeito que haja uma risada por baixo. Sorrio. — Amo todos vocês. Sabem disso. Não falo mais. Estou com muito medo de piorar. Eventualmente, as lágrimas param. Seguro Poppy e digo a ela que veremos o que vai acontecer com o vovô antes de pensar em ir para casa. Parece acalmá-la, pelo menos por enquanto. — O que você fez para as minhas meninas chorarem então, Ebs? — Richard me pergunta, nós dois sentados à mesa de jantar. Nats bate no braço dele. — Não a chame assim — fala, baixinho. Rio um pouco mais. — Bem, Dick — respondo, e Nat bufa bem alto. — Eu disse que pode ser que eu vá para casa assim que souber que meu pai está bem. Natalia me olha e preciso encerrar a conversa — ela não está pronta para voltar a isso. Ah, desculpa, quer saber por que meu cunhado me chama de Ebs? É diminutivo de Ebenezer, de Ebenezer Scrooge. Ele sempre me chama de Ebs desde que começou a sair com Nats há doze anos e descobriu que eu odiava o Natal. Sempre o chamei de Dick, pênis, em vez de Rick. E Natalia odeia tudo isso. Dick e eu sempre nos demos bem como se uma casa estivesse pegando fogo. Ele dirigiu até Londres para me buscar depois do meu término. Esteve lá para me ajudar a mudar de casa, fica no meu loft quando está trabalhando na capital e saímos para beber e jantar. É sempre divertido estar ao redor dele, que é um irmão para mim. Ele me coloca no meu lugar quando preciso, e vice- versa. Brincamos constantemente, sarcasmo é nossa segunda língua, mas ele também é uma das pessoas mais carinhosas do mundo e ama “suas garotas” mais do que qualquer coisa na terra. Faz tudo por elas e por sua família inteira. É o melhor homem que eu poderia ter torcido para minha irmã encontrar. Eu o amo muito. — Ah, você é corajosa. — Ri e morde um pedaço de pão de alho. — Já viu quão grávida ela está? — Ele me olha, se divertindo com minha estupidez por cutucar um urso. — Como eu poderia perder isso? — brinco. — Tivemos que empurrar a mesa de jantar para ela conseguir entrar. — Tomo um gole de vinho e imediatamente me arrependo, porque Nats me belisca e gira a pele do meu braço. Quase engasgo. Estremeço e rio, esfregando a área. — Mamãe — resmungo —, briga com ela. Minha mãe rola os olhos e Natalia me dá língua. Poppy nos dá uma risada adorável da cadeira entre seus pais. O clima melhorou mais uma vez. Não tenho certeza do que vai acontecer quando eu realmente decidir ir embora. No momento, podemos todos evitar, mas assim que o pai voltar amanhã e eu souber que ele está bem, vou ter que deixar minha irmã muito grávida brava outra vez, assim como sua filha. Acordo cedo, o que não é difícil quando se está compartilhando o quarto com uma criança pequena. Relutante, abro os olhos e vejo Poppy dançando em frente à cama inflável onde ela está dormindo durante minha permanência na casa. Ela alinhou seus ursinhos e bonecas e está entregando uma baita apresentação a eles. — Bravo! — comemoro e aplaudo, conforme ela faz uma reverência e vira para mim, radiante. — Bom dia, Elly — deseja, muito educada. — Dormiu bem? Sorrio, ela é tão fofa que dói. — Dormi, bebê. E você? Ela sobe na minha cama e se aconchega em mim. — Sim, dormi. Foi adorável. Prendo uma risada por seu tom de voz adulto e decido apenas aproveitar o carinho. Quando Natalia descobriu que estava grávida de novo, decidiu que tinha que estar perto de casa. Dick cresceu no sistema de adoção e não tinha família além de nós, então ficou alegre em ser obrigado por ela, que implorou para colocarem a casa no mercado. Vendeu rapidamente e ficaram mais do que felizes, mas então tiveram dificuldade de encontrar um lugar perto da casa dos nossos pais; por isso, vieram morar aqui. Mamãe e papai não gostaram da ideia de eles gastarem todo o dinheiro para alugar um lugar e tinham o espaço, então se recusaram a aceitar não como resposta e meu antigo quarto se tornou o de Poppy. Minha decoração adolescente em verde-limão e roxo (não julgue,era a década de 90) foi substituída por uma pintura rosa das mais bonitas e um mural na parede de criaturas da floresta dançando balé. É um pouquinho estranho, para ser honesta, mas a criança ama. — Vamos lá, bebê. Vamos descer para tomar café da manhã. Descendo as escadas para a cozinha, animada para conseguir um pouco de comida, o som de música natalina e o cheiro avassalador de canela me atingem. Pauso no fim das escadas e Poppy corre na frente. Preciso de um minuto para me preparar para isso — para garantir que não vou fazer careta para o rádio e levar um tapa por conta disso. Em vez de ir para a cozinha, visto as sapatilhas de balé de Nats que estão na sapateira e sigo para a porta da frente. O ar frio de dezembro toca minha pele e fecho os olhos, respirando fundo — é quando o barulho de um carro me traz de volta à vida. Merda. Abro os olhos, que imediatamente se conectam com os dele, e não tenho para onde correr ou me esconder. — Dia — digo, um tanto alegre, sentindo que preciso dizer algo agora que ele está me vendo. Encolho-me porque o Doutor Bonitão está me vendo parada aqui de óculos, roupão e sapatilhas de balé, cabelo preto despenteado preso de qualquer jeito no topo da cabeça; e não como aqueles coques desajeitados legais que as pessoas costumam usar esses dias. Pareço apenas uma cebola que alguém deixou lá para brotar. Vejo um leve sorrisinho virar sua boca para cima ao me encarar. — Dia — responde, cortês, saindo do carro em direção à porta da frente, e o silêncio reina entre nós. Estranho. — Jude — chamo, por algum motivo, antes de ele entrar. Não sei o porquê, já que, na verdade, não tenho o que dizer. Ele para com a chave na fechadura e se vira para me encarar. Posso ver até dessa distância que ele respira fundo, o ar frio o traindo por conta da condensação que sai de seu nariz. — Você parece bem. O quê? Você parece bem! Eu poderia muito bem ter dito: “ei, Jude, sei que parti seu coração, mas, caramba, você está ótimo nesse jeans”. Argh. Encolho-me de novo e ele franze a sobrancelha antes de acenar. — Te vejo mais tarde, Nel. — Acena, girando a chave e entrando. Jogo a cabeça para trás e rosno. Voltando para a casa, entro na cozinha limpando a umidade dos meus óculos na faixa do roupão. Nats me olha com curiosidade. — Estava fumando? — indaga, e torço o nariz para ela. — Claro que não — respondo, divertida e confusa, e ela dá de ombros. — Bem, você foi direto lá para fora e voltou para cá toda estranha. Gemo, caindo na cadeira ao lado dela, e me inclino contra minha irmã, jogando o braço sobre sua barriga. — Vi Jude. — Gemo de novo e ela passa o braço pelo meu ombro. — Foi tão ruim assim? — pergunta, apoiando a mão sobre a minha em sua barriga. — Disse que ele parece bem. Risadas brotam da minha irmã. O tipo de risada que faz sua barriga pular para cima e para baixo e traz Dick para a cozinha, já se divertindo sem saber o motivo. — O que está rolando? — pergunta, sorrindo. — Ella — fala, bufando. — Ella viu Jude. — Começa a rir novamente, e sento, encarando-a. — Não é tão engraçado assim — afirmo, na defensiva. — Ah, é sim. — Apoia a mão na barriga, expirando e tentando controlar sua risada. Dick ri junto, ainda sem saber o motivo. — Ela viu Jude e disse “você parece bem”. — O tom que usa para zombar de mim é a parte mais divertida da sua versão dos fatos, e Dick ri alto em resposta. — Okay, caramba. — Abaixo a testa na mesa. — Ai, Ebs. Que vergonha. — Dick dá um tapinha nas minhas omoplatas. — Onze anos sem falar com ele e é com isso que você começa? — Sim — respondo, minha voz abafada por conta da cabeça baixa. — Por isso, literalmente, sinto que estou me revirando por dentro. — Olho para ele. — Vocês dois podem ir à merda. Nem é tão engraçado assim. Ele sorri. — Ah, você sabe como ela fica quando começa a rir, e não consigo resistir a essa risada. Dick fica por trás da esposa e esfrega os ombros dela, que se inclina para trás para encará-lo, ainda rindo para si mesma. — Desculpe, Ella — pede Nats, segurando minha mão. — Fico chocada com quão estranha você fica ao redor dele, mesmo depois de tanto tempo. — Sim, obrigada, mana. — Rolo os olhos. — Enfim, alguma notícia do papai? Natalia respira fundo de novo e toma um gole de chá, acenando ao engolir. — Hm, sim. Ele pode vir para casa depois de meio dia. Ia te perguntar se você se importa de buscá-lo, porque preciso levar Pops para pegar a fantasia dela de Natal. Sorrio. Esqueci completamente de que Poppy estaria na peça de Natal da igreja na noite da véspera. Ela seria a estrela, e já sei que será a melhor estrela que essa maldita vila já viu. — Claro que posso. Onde está a mamãe? Imagino que ela vá querer ir, né? — Lá em cima — Dick devolve, virando para começar a encher a chaleira. Nats sorri para o marido e fico de pé, me direcionando ao corredor. Passo por Poppy na sala, assistindo desenho com sua tiara na cabeça e mastigando uma tigela de frutinhas picadas; que princesinha. — Dia, mãe — chamo, animada, colocando a cabeça para dentro da porta do quarto dela. — Dia, meu amor. — Sorri, um pincel na mão. — Vou de carro buscar o papai. Você vem junto, né? — pergunto, sorrindo. — Você vai dirigir? — Franze o cenho para mim, que rolo os olhos. — Sim. Você vem? — Claro que vou. — Bufa, voltando a se maquiar. — Tudo bem. Vou me vestir. Avise quando estiver pronta e nós vamos. Faço meu caminho para o meu, desculpe, para o quarto de Poppy em busca de algumas roupas. Começo a vascular a bolsa e ouço um som bem familiar vindo dos fundos da casa. Sabendo que estamos sempre abastecidos de lenha já cortada graças ao sempre preparado Dick, sei que o barulho do machado batendo em um bloco a cada trinta segundos deve ser Jude. Nossa casa e a dele se juntam no meio, mas, de cada lado das duas, temos um espaço bem grande antes de haver outra casa; não existe outro lugar de onde o som claro de madeira sendo cortada possa estar vindo. Tímida, faço meu caminho para a janela, sem querer ser vista bisbilhotando, mas ao vê-lo lá fora, a camisa de manga longa presa ao corpo conforme levanta e abaixa o machado, dividindo a madeira, esqueço sequer de me importar de ser pega. Tem uma cena que vi ser compartilhada na internet sobre o Capitão América nos filmes da Marvel, basicamente dividindo um bloco de madeira apenas com as mãos, com músculos aparentes e uma boa aparência. Isso é melhor. Por mais perfeito que seja, Cap não tem nada a ver com o homem que estou encarando intensamente pela janela do meu antigo quarto. Não para mim. Estou observando Jude. Jude, lindo, gato, gostoso pra caramba; meu primeiro beijo, meu primeiro amor, meu primeiro tudo. Um homem que vi e senti cada partezinha, fazendo algo tão masculino e forte; mais do que nunca, o arrependimento me inunda. Que erro épico do caralho eu fiz. A parte mais doida disso tudo é que, se eu não tivesse terminado as coisas, há uma boa chance de que Jude e eu estivéssemos casados agora. Estávamos naquela direção; era tão real para nós, ainda éramos melhores amigos, mesmo completamente apaixonados. Toda vez que vejo minha irmã com o marido, olhando um para o outro com tanto amor, ou apenas entendendo o que o outro está pensando, isso vem à minha cabeça; para que Jude e eu rolaríamos os olhos? O que dissecaríamos, deitados na cama, com canecas fumegantes? Que documentários da Netflix veríamos, ficando irritados um com o outro quando assistimos o episódio seguinte sozinhos. Viro e volto a procurar minhas roupas. Passo a mão em um jeans, mas não encontro nada além de uma camiseta e me rendo a ter que pedir à minha mãe se posso pegar algo mais quente emprestado. Excelente. — Sério, mãe? — Rolo os olhos, nós duas entrando na sala e arregalando os olhos de Nats e Dick. — Isso era tudo que você tinha para eu usar? — Sim. — Posso ouvir o divertimento em sua voz. — É tudo que eu tenho, amor. — Vejo-a piscar para minha irmã, aquela espertinha. Puxo o suéter de Natal, olhando para ele — é medonho. O nariz vermelho de Rudolph, a rena, piscapara mim e acho que é melhor passar frio na minha camiseta do que vestir isso. — Vamos lá, vamos buscá-lo — minha mãe diz, animada, avisando que não tenho tempo para trocar de roupa. Vai ser o Rudolph. Rosno, vestindo o casaco e indo para a porta da frente, pegando as chaves do carro no caminho. — Ella, diminua. — Minha mãe agarra a porta do carro com a mão esquerda e a ponta do banco com a direita. — Mãe, estou dentro do limite de velocidade. — Pela primeira vez. — Sei como dirigir, sabe? Ela nega com a cabeça e fecha os olhos. Minha mãe é a pior passageira do mundo. Sofreu um acidente quando adolescente e, mesmo que ninguém tenha se machucado de verdade, isso a afastou do volante pelo resto da vida. Ela nunca quis aprender e odeia ser passageira, mas, por viver no interior, não dá exatamente para evitar. Em vez disso, ela sobe no banco e constantemente engasga, grita e diz a quem estiver dirigindo para diminuir, tomar cuidado e o que mais conseguir pensar em dizer em meio ao seu pavor. Sinto muito por ela e odiaria ter tanto medo de alguma coisa, mas, meu Deus, é irritante pra caramba. Paramos em uma vaga de estacionamento no hospital e minha mãe mal consegue esperar para descer do carro, se oferecendo para ir buscar o bilhete enquanto espero no carro tentando fazer o nariz do Rudolph parar de piscar. Maldito negócio. — Oi, pai — digo, feliz, quando entramos no cubículo do papai para vê-lo vestido e definitivamente pronto para ir embora. — Oi, docinho. — Olha por trás de mim e arregala os olhos quando vê apenas minha mãe. — Você veio dirigindo? — Sim, por que isso é tão surpreendente? — questiono, confusa com sua expressão. — Só estou chocado por sua mãe não estar tremendo. — Ri, e mamãe suspira, dando a volta para beijá-lo. — Sou uma boa motorista — protesto, o que o faz rir de novo. — Se você está pronto, vamos te tirar daqui. Minha mãe senta atrás no caminho para casa e fico feliz. Meu pai se irrita menos com a forma como dirijo do que ela e, com a mulher sentada lá, posso aumentar o rádio só um pouquinho a mais para abafar seus murmúrios. Ao chegarmos em casa, ela coloca meu pai na cama, para o seu desgosto, já que prefere ficar sentado na sala comendo o chocolate do Natal e assistindo televisão. Ele parece bem. Natalia e eu ajudamos minha mãe a planejar algumas refeições e lanches para facilitar a alimentação dele e, com sorte, ainda o permitir sentir que não está perdendo muita coisa do Natal. Tudo parece bom, todos parecem felizes e acomodados; então, é hora de dar tchau. — Fiz uma xícara para você, pai — aviso, entrando no quarto, e ele sorri. — É por isso que você é minha filha favorita — brinca. — Sim, aposto que disse isso quando Nats te trouxe uma mais cedo também. — Rio, e ele sorri ainda mais. — Pai, quero te perguntar uma coisa. Ele toma um gole e puxa o ar ao perceber que está quente demais para beber. Pego a xícara da mão dele, rolando os olhos de brincadeira, e coloco na mesinha de cabeceira. — Qualquer coisa, querida. O que houve? — responde. — Ah, sabe que eu queria ficar em casa sozinha no Natal. Pensei se, já que você está bem e em casa agora, se importaria de eu voltar para Londres. Vejo a decepção em seu rosto e minha decisão vacila. Quero ir, mas adoro minha família e não os quero machucados. — Amaria se você ficasse, Ella, mas você é uma mulher crescida e tem que tomar suas decisões. — Sua voz não tem o entusiasmo de sempre. — É que você sabe que não amo o Natal, pai. Não estou com vontade de comemorar este ano — explico, e ele respira fundo. — Nunca vou entender isso, Noella. Fizemos um trabalho tão ruim ao longo dos anos para este ser um período tão doloroso no ano para você? — Ele parece ferido, o que me fere. Estico a mão sobre a dele. — Pai, não, vocês foram os melhores pais que eu poderia desejar e tudo o que fizeram por mim foi excepcional, eu só não gosto desta época do ano. Não é culpa de ninguém, só minha. — Aperto sua mão um pouquinho e ele sorri brevemente. — Noella Star, meu milagre de Natal, você é estranha. — Seu sorriso se abre mais e imito sua expressão. — Faça o que tiver que fazer, mas não será a mesma coisa sem você. Fico de pé e beijo meu pai na testa antes de voltar para o quarto de Poppy e juntar minhas coisas. Volto para casa amanhã. Operação Dane-se o Natal está de volta. Antes de chegar à cozinha, consigo ouvir Poppy e seu pai cantando músicas de Natal. Eles parecem felizes. Estou de banho tomado e vestida, pronta para começar o dia. Largo a bolsa na porta da frente e volto para me juntar a todos para o café da manhã, mas não consigo deixar de sorrir. Mamãe está com a mão na barriga de Natalia, sentindo o bebê se mover; o olhar de pura alegria em seus rostos preenche o espaço. Bem, preencheria, se o cômodo já não estivesse explodindo de enfeites de Natal. Dick está fazendo o café da manhã e Poppy está mostrando ao papai o que posso apenas assumir que seja sua coreografia para a peça de Natal. O olhar de concentração em seu rosto é quase doloroso, e ele fica sentado, completamente paralisado ante sua neta. Queria poder fazer isso. Observo minha família, todos relaxados e felizes por estarem juntos nesta época do ano, e sinto inveja. Em qualquer dos outros onze meses do ano, eu estaria exatamente igual, mas tenho apenas um bloqueio mental com dezembro: assim que o mês vira no calendário, eu me fecho. — Dia — digo, espero que alegre, e minha mãe e Nats se viram para mim, sorrindo. — Ella, venha ver como ele está ativo hoje — Natalia chama, alegre. — Acho que ele gosta da música. Imito sua expressão e vou até lá para sentir o que meu sobrinho acha que é música natalina. Apoio a mão na barriga dela, minha mãe e meu pai celebram com Poppy e Dick coloca uma xícara de café na mesa para mim. Sorrio em agradecimento, então ofego quando a barriga de Natalia se move totalmente para um dos lados. — Meu Deus, menino, você está tentando sair? — brinco, e Nats arregala os olhos para mim. — Nem brinca, as contrações falsas de Braxton Hicks tem sido incessantes essa semana, e a culpa é do papai — adiciona a última frase um pouco mais alta para o papai poder ouvir. Ele vira preocupado para ela, que devolve com um sorriso. Minha atenção é arrancada da minha irmã quando Poppy passa os braços bem apertados por minhas pernas e me abaixo para pegá-la. — Dia, raio de sol — digo, beijando sua bochecha. — Dia, Elly. Está animada para me ver de estrela? — pergunta, e meu coração se aloja na garganta. — Você sempre é uma estrela para mim, bebê, mas mamãe ou papai terão que me mandar um vídeo da sua peça, porque tenho que ir para casa hoje — cuspo, o mais rápido que posso. Arrancando o curativo de uma vez só. A cozinha fica em silêncio — bem, exceto por Cliff Richard, ainda cantarolando no rádio no canto. — Sério? — Natalia dispara, logo que Poppy começa a chorar nos meus braços. — Ai, não, Pops, não chore. Sinto muito. Nats pega minha sobrinha de mim e me encara; seguida por Dick, deixam o cômodo. Minha mãe funga e se levanta da mesa, indo para o café da manhã abandonado no fogão. Papai apenas dá de ombros. — Você é mesmo uma vaca egoísta, sabia? — Natalia sibila, voltando à cozinha sozinha, tendo deixado o marido acalmar a filha na sala. — Natalia — rebato, um pouco chocada. — Não gosto do Natal, você sabe disso. O papai está bem, todos vocês estão, então não preciso estar aqui. — Posso sentir minhas defesas aparecerem. Ninguém tira esse lado de mim como Natalia. — Não, você não precisa, Noella, mas deveria querer. Somos sua família. — Ela puxa o ar entre os dentes e apoia a mão na barriga, me fazendo dar um passo à frente de preocupação, mas logo estende a mão para me parar. — Brincamos com seus chiliques e dramas patéticos em relação ao Natal por tempo suficiente. Você já tem quase trinta anos. É hora de crescer, caramba. — Não consigo falar. Tento, mas nada sai. — Quer saber, Ella, se conseguir encontrar um jeito de chegar em casa, pode ir. — Sorri pretensiosamente, e fecho a cara. — O que vocêquer dizer? Meu carro está literalmente na frente da casa — disparo, sarcástica. — Não olhou fora da janela hoje, né? — indaga, inclinando a cabeça de um jeito que a fazia parecer a garota de quinze anos que disse à minha versão de doze que eu nunca teria chance com Justin Timberlake e estava apenas passando vergonha por acreditar que teria. Viro e começo a caminhar para a porta dos fundos, meu coração afundando quando olho para fora. — Sim, boa sorte para chegar em Londres, Ella. — O despeito em sua voz faz meus punhos cerrarem. — Estamos presos na neve. A vila Cotswold, onde cresci, é pequena. É daquelas vilas que você vê impressas nas caixas de chocolate, com telhados de palha, uma loja, um pub e uma agência de correios. É perfeitamente inglês e sua beleza está nisso. É histórico, bem conservado e perfeitamente pitoresco. A coisa com a Inglaterra, porém, é que não lidamos muito bem com o “clima”. Considerando que temos praticamente todos os tipos, geralmente não é tão extremo para nos considerarmos totalmente preparados. Quando chove pesado, parecemos perder toda a habilidade de dirigir de forma adequada. Se está quente, somos internados no hospital com queimaduras de terceiro grau e insolação; se está nevando, tipo, nevando muito, ficamos fodidos. Não para em Londres. Aqui mesmo, em algumas horas, a recente camada branca é reduzida a uma fumaça com sabor de raspadinha nas laterais da estrada. Mas aqui, na vila dos meus pais, que calha de ser no fundo de um vale, quando neva assim, nada anda. Não temos tráfego suficiente para derreter a neve e o acúmulo dela no muro de pedra no topo do jardim torna a trilha totalmente inútil. Fazendo meu caminho rapidamente para a porta da frente, enfio o pé nas botas, fico chocada com a batida na porta. Pego a pá de neve que o papai deixa ao lado da sapateira no inverno e abro a porta com tanta raiva que quase a arranco das dobradiças. Jude arregala os olhos e franzo o cenho para ele, a pá na mão. — Pensei em dar uma olhada no seu pai — comenta, tímido de certa forma, e eu bufo. — Fique à vontade. — Andei para o lado, assim passamos um pelo outro e vou lá fora para inspecionar. Merda. Meu carro está meio enterrado ao lado do monte, a neve até meus joelhos no jardim, e a estrada não parece melhor. Rosno e bato os pés, me arrastando até o veículo, determinada a limpar o caminho. Eu vou para casa. Começo a cavar na neve. É mais pesado do que me lembro, não faço isso há anos. Em pouco tempo, estou exausta e congelando, e não cheguei muito longe. Então ouço aquela risada — aquela que eu costumava conhecer tão bem. Eu costumava amar, embora, nesse momento, faça meu sangue ferver. — O quê? — retruco, olhando para ele e subitamente percebendo o tanto que minhas mãos estão frias. — Mas que diabos você está fazendo, Nel? — Jude questiona, atrás de mim. — Não é óbvio? — devolvo e começo a cavar de novo, tendo dificuldade pelas minhas mãos dormentes e braços agora trêmulos. — Bem, parece que você está freneticamente tentando tirar seu carro da neve. — Posso ouvir a diversão em sua voz, o que me irrita. — Viva! Temos um vencedor — respondo, estendendo os braços para os lados, antes de deixá-los cair com minha cabeça para respirar. — Bem, Noella, a menos que você esteja planejando limpar a estrada inteira e, provavelmente, o resto da vila, não tenho certeza de que bem isso te fará. Você dirige um Fiesta, não um tanque. Ergo o rosto para encontrar seus olhos e ele acena para a estrada que vem para a casa dos meus pais. Ele está certo, posso cavar quanta neve quiser em volta do meu carro, mas não vou chegar longe. A estrada está parte neve, parte gelo. Estou presa aqui. Rosno em voz alta, olhando para o céu em frustração. — Certo, vamos lá — diz, de forma natural, e viro para encará-lo. — O quê? — pergunto, bruscamente. — Vamos lá — repete, indo para o próprio carro. É um Land Rover — que ri na cara da neve. Ele já tirou o que tinha ao redor do veículo e dá para lidar com o restante. Paro por um momento para recuperar o fôlego antes de admitir minha derrota. Largo a pá do papai por cima do muro no jardim e vou em direção à enorme fera verde. — Entra — Jude ordena, e eu o faço. Tem uma voz de comando e um olhar determinado; resistir é inútil. Subo no carro, batendo os calcanhares na lateral para tirar a neve das botas. Jude entra e, depois de fecharmos as portas, nos encaramos. É apenas um momento, mas dá para cortar a tensão com uma faca. Não ficamos sozinhos há uma década e tenho a impressão de que, de repente, ele está questionando subitamente sua decisão de me mandar entrar no carro. Olhando para a estrada à frente, Jude suspira e gira a chave. O veículo ganha vida e se movimenta. Posso praticamente sentir o vapor saindo por meus ouvidos. Sei que Natalia estava me observando brigar com a neve de uma das janelas da casa, provavelmente me chamando de todos os nomes possíveis. Não consigo acreditar que ela me chamou de egoísta. Ela não entende que estou me removendo do Natal tanto para benefício deles quanto para o meu? Pego-me rangendo os dentes e solto um suspiro audível de frustração. Subitamente, sinto frio e estremeço. Suspeito que a adrenalina do desespero e do aborrecimento tenha diminuído agora. Passo os braços ao meu redor e Jude, notando, liga o aquecedor do carro. Olho para ele e sorrio, timidamente, como agradecimento. — Sobre o que foi isso? — pergunta, depois de um período de silêncio desconfortável, e me viro para encará-lo. Ele é realmente esplêndido, sempre foi, mas agora sua feição amadureceu; na adolescência, nunca teve barba, mas agora tinha pelos faciais curtos e bem cuidados. Seus olhos captam luz como sempre e percebo que estou encarando. — Nel? Que vergonha. — Quero ir para casa em Londres. Nats me chamou de egoísta. É basicamente isso — explico, percebendo como soa ridículo. — Ah, uma clássica situação de Tali versus Nel. — Sorri, e não consigo evitar me acalmar um pouco. — Por que você quer ir embora? — insiste. — Vamos lá, Jude, você sabe que odeio o Natal. — Viro o corpo um pouco em direção a ele e o observo dirigir. — Ai, Noella, você ainda está batendo nessa tecla? — Espia para mim de relance e arregalo meus olhos, surpresa. — Nel, você tem quase trinta anos de idade. Você teve o quê? Talvez uns três Natais de merda nesse período. O resto deles tem sido você dizendo a si mesma que odeia quando, na verdade, não tem motivos reais para isso, além da sua própria teimosia e incapacidade de deixar as coisas de lado. Fico atordoada. Sinto a boca começar a se abrir um pouco e não consigo dizer nada de fato. Não conversamos por uns dez anos e ele vem com isso. — Não estou tentando ser rude, mas você tem uma família incrível, que absolutamente te adora. A menos que os últimos onze anos tenham entregado desastres natalinos horríveis, você precisa parar de ser uma teimosa de merda e simplesmente deixar pra lá. Uau, eu não estava pronta para nada disso. Sinto minha frustração voltar e viro para a janela, o silêncio recaindo sobre nós mais uma vez. Jude para em uma estrada lateral que reconheço, e meu coração acelera no peito. Sei para onde ele está me levando. Estaciona o carro em um ponto perto do rio. Há uma pequena cachoeira e toda a área está cercada por árvores. É um pouquinho longe da vila e um tipo diferente de paz se encontra aqui — apenas o som da água correndo. Jude e eu encontramos este lugar quando tínhamos dezesseis anos. Estávamos passando um dia de verão perto do rio, tentando encontrar o local perfeito para relaxar, comer a comida que trouxemos e nadar; era bem aqui. Sempre estava quieto, bem isolado e perfeito para um casal de adolescentes apaixonados passar o tempo. Quando Jude passou na prova de direção uns dois meses depois de fazer dezessete anos, este lugar se tornou ainda mais especial para nós. Não nos limitamos aos longos dias de verão para andar ou pedalar por aqui. Podíamos vir a qualquer momento, faça chuva ou faça sol, de dia ou de noite, e fizemos isso. Sentávamos em seuVolkswagen Golf, ouvíamos música, comíamos, nos beijávamos e mais. Hoje é um dia para ficarmos sentados dentro do carro, frio demais para sair, e a neve ainda está caindo. Definitivamente não faríamos nenhuma das outras coisas que eram costume aqui, mas apenas estar aqui me acalma e sei que foi por isso que ele me trouxe. — Tinha esquecido como aqui é bonito — comento, me inclinando para frente e estreitando os olhos para observar além da neve. Jude pausa por um momento antes de respirar fundo e falar de novo. — Eu não estava tentando ser um babaca antes. — Sua voz está mais baixa agora, como se estivesse arrependido por dizer o que estava na cabeça. — Você não tem motivo para ser legal comigo, Jude, então não tenho direito de ficar ofendida — afirmo, pensativa, olhando para ele brevemente antes de me voltar para o paraíso invernal que nos cerca. Com o motor desligado e nada de música, o som da cachoeira caindo na piscina de gelo logo abaixo sobrecarrega meus sentidos. Fecho os olhos e permito que isso acalme minha ansiedade que só cresce com a conversa potencial que está por vir. Assim que Jude aceitou que eu queria terminar e parou de me implorar para mudar de ideia, nunca mais nos falamos. Nunca conversamos sobre o motivo. Nunca mais conversamos sobre nada. Onze anos e ele nunca teve nenhum tipo de explicação sobre o motivo de eu partir seu coração. Agora, estamos sozinhos em seu carro e, se quiser me perguntar sobre, não tenho para onde correr para evitar o assunto. Além disso, em algum ponto, ele merece uma resposta. — Nada disso é por causa daquilo, Nel. Você decidiu tempos atrás que não gosta do Natal e se apegou a isso, independente do fato de que tal decisão te deixa miserável. Se realmente riscar os anos ruins e pensar nos outros, acho que vai perceber que tem algumas memórias maravilhosas dessa época do ano. Suspiro em alívio, por ele não parecer que quer perguntar sobre o término, então contemplo suas palavras. Ele está certo? Passei tanto tempo odiando o Natal que não consigo me imaginar sequer mudando de ideia sobre, mas talvez ele tenha um ponto. Talvez um punhado dentre quase trinta não seja suficiente para justificar uma vida inteira de ódio pelo feriado. Minha antipatia está tão arraigada em mim agora, porém, que não tenho certeza se haverá um caminho de volta, mesmo se quiser encontrar um. — Por que você voltou? — pergunto, querendo quebrar o silêncio. — Minha mãe estava vendendo a casa e apareceu uma vaga no hospital. Pareceu o destino. — Sorrio, pois Jude sempre acreditou que tudo acontece por um motivo. Um ideal muito hippie para um homem da ciência, costumava sempre dizer a ele. — Sei que você acha que não faz sentido, Nel, mas, talvez, se abrir os olhos para o que está ao seu redor, verá que há sinais em todo lugar — rebate, um pouco na defensiva. Deve ter visto que sorri com a memória. — Não estava julgando, apenas sentindo a nostalgia. Desculpa. — Viro para encontrar seu olhar e sorriso. — Seu maldito hippie. O sorriso se abre mais e ele nega com a cabeça. — A fim de uma cerveja? — indaga, e aceno. Amaria uma. Ter tempo para conversar com Jude tem sido incrível. Evitamos aquela conversa, mas falamos sobre estudo e trabalho. Ele me contou sobre sua vida em Edimburgo e me senti um pouco estranha quando perguntou sobre Pete. Ele sabia sobre o término, mas, já que recebeu a informação dos meus pais, não tinha todos os detalhes. Sem querer discutir tudo com Jude, me ative aos pontos principais. Estávamos noivos, ele me traiu, terminamos o noivado. Jude travou a mandíbula e chamou Pete de “idiota do caralho” e então, felizmente, nosso pedido chegou à mesa e serviu para mudarmos de assunto. Não quis discutir nenhum dos relacionamentos que teve desde que terminamos, o que me deixa feliz. Terminei com ele, mas pensar nele com outra pessoa ainda me incomoda. — Vamos, a gente deveria voltar — Jude fala, quando nossos pratos estão vazios, e aceno para concordar. Não estava planejando sair com ele hoje e não estou com minha bolsa, o que me faz sentir culpada por ele ter que pagar por tudo, então, por mais que esteja amando a companhia, não quero que ele gaste mais dinheiro comigo. Ficamos de pé, colocamos os casacos e caminhamos até a porta do pub. — Ai, meu Deus, está congelando aqui. — Estremeço assim que pisamos fora do espaço quente e aconchegante para o ar sombrio da noite, o frio gélido tocando nossas peles aquecidas. A temperatura caiu bastante desde que chegamos há algumas horas e uma leve cobertura de neve que estava na calçada depois que os donos do bar limparam a entrada virou uma pista de gelo. Dou um passo e imediatamente sinto o pé deslizar no gelo. Por instinto, estico a mão para agarrar o braço de Jude, que faz o mesmo, e rimos. Não consigo parar as batidas do meu coração com o contato. Sei que é bobo, mas senti mais falta dele do que consigo admitir. Sorrimos um para o outro com um olhar que diz “foi quase” ao nos estabilizarmos antes de continuar. — Vamos ficar bem se voltarmos com a pista desse jeito? — pergunto, preocupada por Jude nos levar de carro para casa se as estradas estiverem parecidas com a calçada. — Vamos sim. Tenho pneus de neve, vamos ficar firmes. — Jude tenta me garantir quando me guia pela grama coberta de neve e menos traiçoeira em frente ao pub. Meu pé afunda na neve crocante. Cobre a maior parte da minha canela e estou grata por ter colocado as botas em vez dos tênis de corrida mais cedo no meu momento de raiva e ânsia de sair de casa. Só queria ter pensado em colocar meias, porém. Chegamos onde o carro está parado e Jude estica a mão para mim; olho para ela e depois para ele. — O quê? — Sorri. — Se eu cair, você cai comigo. Rio, estendendo a mão para ele. Caminhamos lentamente em direção ao carro e, depois de alguns tropeços e escorregões, chegamos ao lado do passageiro inteiros. Jude abre a porta e espera que eu suba antes de fechar e dar a volta na frente do veículo. Ofego quando ele desaparece totalmente de vista. Sento para frente e ele fica de pé, me olhando nos olhos, e começa a rir; sabendo que ele está bem, faço o mesmo. Ao abrir a porta do carro ao seu lado, estou rindo histericamente. — Você está bem? — consigo dizer, com ele subindo no banco do motorista e ligando o motor. — Fui bem sutil — declara, começando a rir de novo e me fazendo perder a cabeça. Assim que as risadas diminuem, olho para Jude e sorrio. — Obrigada por hoje. Tem sido bem legal rir com você de novo — admito, tem mesmo. Algumas bebidas, um almoço delicioso e algumas horas conversando sobre os velhos tempos e os anos em que estivemos longe me deixam com uma sensação de euforia flutuando por meu corpo. Jude sempre foi capaz de me fazer sorrir, de me fazer rir e, apesar de toda dor que aconteceu entre nós e dos anos afastados, ele ainda é mestre naquela arte. Ele acena, sorri, mas não fala nada. Também gostou, mas posso ver que ainda dói, mesmo que só um pouco. Algumas poucas horas felizes juntos não podem apagar aquilo. Voltando sua atenção para o para-brisa, Jude dá ré devagar na vaga e nos leva para fora do estacionamento. Até aqui, tudo bem. Começamos a passar pelas estradas isoladas do campo, tão lentos que dá agonia, e consigo sentir o carro lutando para ficar na pista. — A coisa está feia, Nel. Consegue sentir deslizar? — Jude pergunta, agarrando o volante, e aceno. Estou usando toda a minha energia para obrigar as rodas a se fixarem na estrada e nos levarem para casa em segurança. Dirigimos mais um pouco até estarmos na metade do caminho para casa, quando Jude grita: — Merda. Sinto a parte de trás do carro ser empurrada para a esquerda e vejo Jude lutando para recuperar o controle. Meus dedos se afundam no estofamento abaixo de mim enquanto observo as árvores lá fora circularem o carro com o brilho dos faróis; paramos, com um barulho poderoso e um som de amassado horrível, a frente do veículo se chocando contra o tronco de uma larga árvore. Leva um momento de silêncio absoluto até eu perceber o queaconteceu. — Nel, consegue me ouvir? Você está bem? — Percebo que Jude está falando comigo e recobro os sentidos. — Nel, docinho. — Sinto sua mão em meu braço e me viro para ele, soltando o ar que prendia. Aceno. Estou bem. O motor ainda está ligado e, depois de ver que estou bem, ele tenta dar ré no carro para sair do buraco em que caímos, mas não dá certo; as rodas simplesmente giram desesperadas buscando tração; não vamos a lugar nenhum. Jude busca o telefone do bolso do casaco. — Porra — xinga, e olho para ele. — Minha bateria morreu, e a sua? Nego com a cabeça. — Não trouxe o telefone. Não trouxe nada comigo. Pânico aperta minha garganta e fico pensando em como essas estradas são isoladas no meio do verão, porém, no inverno e em uma noite tão ruim como essa, ninguém virá. — Tudo bem, vai ficar tudo bem, Nel. Precisamos ir lá para trás. Tenho cobertores e outras coisas na mala. Temos que economizar bateria, então vou desligar o motor um pouco, mas podemos ficar juntos para nos aquecer até alguém aparecer. Sei que ele também está preocupado. Fizemos sexo nessas estradas várias vezes justamente porque ninguém aparece para te pegar. Estico a mão para abrir a porta. — Não — Jude dispara e o encaro. — Fique no carro, passe pelo meio. Vou dar a volta para a mala, okay? Ele abre a porta e tenta pisar no chão abaixo com a escuridão. Solto o cinto e começo a passar pelos bancos para a parte de trás. Ouço Jude pegando as coisas na mala por trás de mim e o som da porta fechando. A porta do passageiro de trás se abre e uma pilha de tecidos é empurrada na minha direção, mas logo Jude vem, bem ao meu lado. — Coloque os casacos sobre as pernas e chegue mais perto. Só tenho um cobertor, teremos que dividir. Jude passa o braço sobre meu ombro para me trazer para perto e traz o cobertor até nossos pescoços. — Está tão frio. — Meus dentes batem quando falo, minha respiração fica presa na garganta com os tremores violentos do meu corpo. — Vamos congelar até a morte? Os braços de Jude se apertam ao meu redor. — Claro que não, não seja tão dramática. — Ele esfrega meus braços para tentar me aquecer, mas sei que ele está desesperadamente gelado também. — Vou ligar o aquecedor um pouco. Jude se inclina entre o espaço dos bancos para a frente do carro e gira a chave na ignição. O motor ganha vida e logo o ar quente começa a circular. Voltando a sentar perto de mim, me prende em seus braços. Silêncio cai entre nós quando a proximidade assume o controle e alerta todos os meus sentidos — e suspeito que os dele também. — Vamos ficar bem. Não é tão tarde. Alguém vai aparecer logo — fala baixinho, me segurando apertado. Jude me diz que tem que desligar o motor de novo e, quando se inclina para frente, faróis por trás de nós enchem o carro, seu brilho refletindo na neve ao nosso redor. — Sim! — Jude fala e se junta a mim no banco de trás. Quando abre a porta, ouço dizer: — Meu Deus, estou tão feliz de te ver! — Coloca a cabeça para dentro do carro e estende a mão para mim. — Vamos, Nel. Ao sair do carro, fico feliz por ver Phil, um dos fazendeiros locais, parado perto de nós em sua caminhonete. Reafirma que não deveríamos estar dirigindo com esse tempo, então nos diz para entrar. Avisa a Jude que o ajudará a levar o carro para a oficina amanhã, mas, agora, vai apenas nos levar para casa. No calor do veículo, Jude me segura perto de si, esfregando meus braços e beijando minhas têmporas, e sinto que vou vomitar com o frio que sinto na barriga. Estou agitada pelo acidente, o medo e a adrenalina, tensa por tremer tão violentamente e surtando com o nervosismo e a emoção. Nunca imaginei ficar tão perto dele de novo. Sei que é apenas pelos eventos da noite e seu instinto natural de cuidar dos outros que o faz me abraçar como se eu fosse muito preciosa para ele, mas, seja lá o que for, aceito. Quando chego em casa, Jude me leva até a porta e espera Natalia abrir antes de confirmar uma última vez que estou bem e beijar minha testa. Ele deseja boa-noite a nós duas e minha irmã me conduz para dentro, Jude caminhando até sua casa. — Ai, meu Deus, Ella. Onde você estava? — Nats passa os braços ao meu redor, apertando, e fecha a porta por trás de si. — Fiquei tão preocupada. Mil desculpas por ter sido uma vaca. Ela dá um passo para trás, colocando as duas mãos na barriga e soltando o ar. — Você está bem? — indago, preocupada. — Estou bem. Você me deixou toda estressada. Onde estava? — É uma longa história, posso te dizer amanhã? — Estou congelando e, subitamente, exausta, o calor da casa começando a me descongelar. — Você não vai para casa? — pergunta, hesitante. — Não, Natalia. — Rolo os olhos, de brincadeira. — Ainda estarei aqui amanhã. Vejo o sorriso — é o mesmo sorriso de “eu dou meu jeito” que Nats sempre teve, mas não estou brava. Como poderia, ela só me quer por perto. — Por que você não vem fazer compras comigo e a mamãe manhã então? E Poppy, é claro. Dou de ombros. — Devo só ficar aqui com o papai, se você não se importar. — Claro que não — Nats responde, sorrindo —, desde que você ainda esteja aqui quando voltarmos. Eu a abraço, beijo sua bochecha e viro para subir as escadas. Acendo a lâmpada do meu quarto para ver Poppy enrolada em seu ursinho na minha cama. Sorrio e considero que ela provavelmente vai estar quente o bastante para servir como minha garrafa de água quente. Estremeço e me dispo, vestindo o pijama, então subo ao lado de Poppy, tomando cuidado para não acordá-la. Apago a luz e fecho os olhos; pela primeira vez em mais de uma década, vou dormir com a sensação recente dos lábios de Jude na minha pele. Antes de abrir os olhos, noto a rigidez em meu corpo e me lembro do solavanco quando o carro de Jude bateu na árvore noite passada. Puxo o ar profundamente pelo nariz e solto pela boca, decidindo que não contarei de jeito nenhum para minha mãe o que aconteceu. Estico a mão para pegar meu telefone e vejo a hora, dez e dezoito da manhã. Não faço ideia de como consegui dormir tanto, como Pops não me acordou ou como fiquei sem café da manhã, mas estou grata por isso. Quando abro a porta do quarto, o silêncio na casa é ensurdecedor. Sem música, sem sons ou cheiro de comida no fogo, sem Poppy sendo Poppy, e me lembro de que minha mãe e Nats a levariam para compras de Natal de última hora. Dick está no trabalho, então somos apenas papai e eu. Abro em silêncio a porta do quarto dos meus pais, enfiando a cabeça por ela. Papai está recostado na cama, roncando, um filme natalino passando na TV silenciosa. Fecho a porta de novo e caminho para o andar de baixo. Preciso de café… muito café. Sinto o cheiro quando o bule começa a encher e involuntariamente fecho os olhos. É um dos meus cheiros favoritos no mundo. Planejo tirar completa vantagem da casa silenciosa e deitar no sofá com um livro quando ouço o inconfundível grito de Poppy Eloise. Confusa, sigo o som até o jardim dos fundos e congelo ao abrir a porta ante a visão da minha sobrinha construindo um boneco de neve com meu ex. — Elly — chama, animada, ao reparar que estou na porta, pulando no lugar, suas bochechas sendo tomadas por um sorriso. — Veja o que estamos fazendo. — Estou vendo — respondo, empolgada, olhando entre ela e Jude em busca de alguma explicação. — Dia — fala, reluzindo. — Estava limpando o caminho essa manhã quando sua mãe e Tali saíram. Essa monstrinha — sorri para Poppy, e meu coração se aloja na garganta — não estava feliz por ter que deixar toda essa neve fresca para andar em lojas, então eu disse que ficaria para brincar com ela até você acordar. Sua explicação me faz congelar e tenho dificuldades de responder. Sei que ele ama minha família — a dele e a minha eram praticamente uma, estávamos sempre próximos e ele conseguiu manter, ou pelo menos recuperar, um pouco disso desde que voltou —, mas vê-lo aqui, fazendo a pessoa mais importante do meu mundo gritar de alegria só porque precisava de alguém para brincar na neve com ela é demais. — Você vem brincar, Elly? — Poppy grita, bem maisalto do que o necessário, por sua empolgação. — Eu ia tomar uma xícara de café, doci… — Não consigo terminar a frase, já que uma bola de neve acerta a porta ao meu lado e, chocada, me viro para um Jude sorridente. — Acho que ela está com medo de vir brincar com a gente, Pops — comenta com minha sobrinha risonha; os dois se dobram para pegar mais neve. O sorriso infantil no rosto dele e a forma que encara Poppy como se ela fosse a melhor amiga dele no mundo inteiro faz meu estômago revirar; ele está absolutamente divino como sempre foi. Não falo da sua aparência, que é de tirar o fôlego a propósito, mas desde o dia em que conheci Jude McDonagh ele me tem feito sorrir. Não houve um dia, além daquele em que pisoteei seu coração, que ele não fez meu coração palpitar com a mais pura alegria. Ele traz o melhor de todos que o cercam e encontra tanto prazer nas coisas simples como fazer um boneco de neve com uma menina de três anos de idade porque se sente genuinamente recompensado pelo sorriso em seu rosto. É por isso que eu sei que Jude é excelente em seu trabalho. Existem algumas pessoas por aí que são colocadas na Terra para ajudar o próximo e o doutor Jude McDonagh é uma delas. É um dos melhores seres humanos que conheço. — Não, para, estou de pijama — protesto, dando um passo atrás assim que outra bola de neve atinge a janela ao meu lado. — Saia para brincarmos. — Jude se aproxima e, sorrindo, se abaixa para pegar mais neve. Seus olhos brilham com malícia ao lançar outra bola. — Ok, ok. — Ergo os braços na defensiva e rio. — Pelo menos me deixe me vestir primeiro. Ele abaixa o braço e estica a mão livre para bater na da minha sobrinha. Assim que fecho a porta e me viro para subir as escadas, o baque de uma bola de neve contra o vidro me faz pular, e depois rir — crianças, os dois. Escovo os dentes e rapidamente visto um jeans com camiseta, antes de colocar o suéter do Rudolph de novo e negar com a cabeça. Se Jude me vir com isso, nunca mais terei paz. Terei que ficar de casaco. Coloco meias, desço correndo para pegar minhas botas e encontro um gorro e luvas do cesto da Natalia na porta da frente. Ao pisar do lado de fora no jardim dos fundos, pronta para desviar das bolas de neve rápidas e voadoras, meu coração para ante a visão. Poppy está deitada na neve, rindo, Jude parado em cima dela, tentando sem sucesso ensiná-la a fazer um anjo. Quando balança os braços para mostrar a ela o que fazer, sua risada genuína combina com a dela, o que é contagiante. Os olhos dele se acendem ao me ver e me sinto um pouco ansiosa de uma hora para outra. Não tenho certeza do que está acontecendo, mas estar perto dele é muito bom. — Estão se divertindo? — pergunto, tentando evitar os olhos dele sem deixar tudo estranho. Poppy luta para se erguer da neve para me cumprimentar, e tanto Jude quanto eu rimos quando ele estende as mãos para ela. — Elly, vamos construir uma família de neve, ok? — afirma, séria, e me abaixo para dar um abraço nela, que apoia as luvas molhadas contra minhas bochechas. — Okay, senhorita Poppy. Tem certeza de que não está gelada demais? — confiro, percebendo o nariz vermelho na pele marrom de seu nariz e bochechas. — Não, estou bem. — Dá um largo sorriso e se vira para saltar em direção ao primeiro boneco completo da família. Ao brincarmos na neve, não consigo evitar rir, sorrir e me sentir, em geral, no topo do mundo. Desejei muito estar perto de Jude de novo. Quis muito ao longo dos anos ouvir sua risada, ver seu sorriso e encarar seus olhos incríveis. Fazer tudo isso, assim como ouvir e ver a alegria da minha sobrinha, me sinto muito sortuda. Pela primeira vez desde que atendi aquele telefonema no meu loft até agora, estou muito feliz por estar em casa. Fazemos a cabeça e erguemos para a terceira pessoa de neve, então noto Poppy começar a tremer. — Certo, mocinha, acho que devemos entrar para nos esquentar um pouquinho. — Nãooo — protesta, os dentes batendo, e Jude a pega no colo. — Estou com tanto frio, Poppy, pode me levar para dentro, assim podemos nos esquentar e terminar a família mais tarde ou amanhã? — Ele é tão bom com ela, que está encantada por ele como todos os outros. A pequena sorri e passa os braços ao redor de seu pescoço. — Vamos ficar debaixo da coberta tomando chocolate quente — sussurra, em um tom que eu ouça, e sorrio. Ela fala igual à mamãe, e igual à Natalia, o que parece uma ideia absolutamente perfeita. Dentro da casa, tiro o cachecol, luvas, botas, casaco e protetores de ouvido de Poppy, sorrindo com a forma como seus cachos macios se juntaram pela umidade, antes de ela sair correndo para a sala e ligar a TV. Quando Jude tira suas próprias botas e casaco, eu faço o mesmo; ai, não! Imediatamente me arrependo do meu movimento quando os olhos de Jude disparam para o nariz vermelho que pisca em meu tórax e sorri. — Ficou bom em você — diz, sarcástico, e eu rosno. — Shhh, vai sentar, vou fazer as bebidas. Ouço Poppy recitar Frozen palavra por palavra, enquanto faço três chocolates quentes (e um morno). Levo uma xícara para o papai, que está fazendo palavras cruzadas na cama, então desço e vejo Jude enrolado debaixo de uma coberta e Poppy dançando no tapete. Eu rio. — Foi ela quem te cobriu? — pergunto baixinho e entrego uma xícara a ele, que acena. — Sim, não é para eu me mexer até estar aquecido, aparentemente. Rio, colocando minha xícara e a de Poppy na mesa, a pegando e caindo no sofá com ela em meu colo, soprando em seu pescoço e a fazendo gritar e dar risadinhas. Bebemos nossos chocolates quentes e assistimos ao filme, o silêncio caindo entre nós. Quando noto que a respiração de Poppy, que está deitada em meu colo, suaviza, estico a mão e toco o braço de Jude. — Ela está dormindo? — sussurro, e ele acena, sorrindo. Ficando de pé lentamente, a levo para o andar de cima até a cama. Ao voltar para a sala, fica um pouco estranho. Com Pops na cama, o muro entre nós se foi. Considero sentar no outro sofá, mas seria um movimento estranho. Penso que Jude provavelmente vai embora agora de todo jeito, mas, ao me sentar no local onde estava anteriormente, ele não parece que vai a lugar algum. Jude vira o corpo para mim. — Você fica bem diferente sem os óculos — comenta, pela primeira vez reconhecendo que a Nelly quatro olhos agora só tem dois. — Um diferente bom? — questiono, sorrindo. — Apenas diferente. Sempre amei seus óculos, você sabe disso. Ele estica o braço nas costas do sofá em minha direção. — Eu ainda tenho. — Sinto como se precisasse dar essa garantia a ele. — Só uso as lentes na maior parte do tempo agora. Ele não precisava saber daquilo — ele não ligaria. Sorri, tentando não morrer puramente por ser estranha. — Essa manhã foi divertida — comenta, sorrindo suavemente, e o imito. — Foi sim, ela aproveitou tanto. — Meu sorriso se alarga quando penso no olhar no rosto de Poppy durante a brincadeira. — E você? — pergunta, e não tenho certeza se o imaginei chegando mais perto ou se ele chegou mesmo. — Me diverti também — comento, minha voz baixa, o nervosismo fazendo meu estômago girar, e percebo que não imaginei o movimento quando ele vem para mais perto ainda. — Jude, não sei se alguma coisa está acontecendo aqui e não quero ter esperanças de que está, então apenas diga… — Algo está acontecendo — corta meu resmungo e sorri, pegando minha mão e gentilmente me encorajando a ficar mais perto. Inclino-me, incapaz de me parar, mesmo que eu saiba que provavelmente devesse, quando o som da porta da frente nos acorda do que quer que seja aquele momento, e rapidamente nos afastamos. Natalia aparece na sala. Meu coração bate forte no peito e me sinto como se fosse uma adolescente que acabou de ser pega beijando o namorado, de novo. — Shhh — peço, rapidamente. Não consigo formar palavras ainda e Nats arregala os olhos para mim. — Poppy está dormindo — Jude explica. Minha mãe entra na sala por trás de minha irmã e pergunta como está o papai; Natalia me encara, com suspeita. — Tenho certeza de que Jude pode te contar,mãe. Ella, pode me dar uma mãozinha por um segundo, por favor. Tenho uma suspeita de que estou prestes a levar uma detenção da professora. Olho para Jude, que me dá um sorriso espertinho, e fico de pé para seguir minha irmã até a cozinha. — Noella, o que você está fazendo? — fala, baixinho. — Natalia, do que você está falando? — Copio seu tom e me faço de boba. Bufando, ela nega com a cabeça. — Você sabe onde quero chegar. O que você estava fazendo quando entramos? — Parece genuinamente preocupada, e fecho a cara para ela. Eu a amo, mas minha irmã é tão frustrante às vezes. — Nats, você entrou e eu estava assistindo Frozen e falando com alguém que conheço praticamente a vida inteira, depois de uma manhã em que nós dois brincamos no quintal com sua filha. Poppy literalmente acabou de ir para a cama, então o que exatamente você acha que viu quando entrou? Ela nega com a cabeça e suspira. — Ella, você partiu o coração dele e, se lembro corretamente, chorou até dormir por semanas. Desculpa se não quero ver nenhum dos dois se machucarem de novo. Não falo nada. Frustrada, pressiono os lábios um no outro e me emociono, as memórias enchendo meu cérebro mais uma vez. — Você o ama, Ella. — Abaixa ainda mais a voz e volto meu olhar para ela. — Sei que você nunca deixou de amar. Não entendo por que você fez o que fez, não faz sentido. Nunca vou entender. Mas ele é doce, educado e está em um momento muito bom, não consigo lidar com a ideia de você mudar de planos de novo e partir o coração dele outra vez. — Não mudei de planos, Nats. — Olho para ela, minha cabeça inclinando um pouquinho para o lado, surpresa por ela pensar tão mal de mim, que eu o machuquei apenas porque mudei de ideia. — Eu meio que entendo, sério. Você estava se mudando para uma grande cidade, sozinha pela primeira vez. — Você não entende — tento interromper, mas ela prossegue: — Queria viver uma vida de solteira. Era jovem. — Você não entende — digo mais alto. — Mas você o rasgou totalmente, e a si mesma, tudo porque queria brincar um pouco. — Você não entende, Natalia. — Minha voz está alta, alta demais, mas não consigo parar. — Não terminei com ele porque queria. Terminei porque os pais dele me pediram — cuspi a verdade que segurei por onze anos, e meu coração parou. — O quê? — A voz de Jude veio por trás de mim e me fez fechar os olhos e respirar um pouco mais rápido. Não era assim que eu queria que ele descobrisse. Na real, esperava que ele nunca descobrisse. — Tali, pode nos dar um minuto, por favor? Abro os olhos e vejo minha irmã me observando, seus olhos cheios tanto de confusão quanto de desculpas. Explicarei a ela mais tarde. Agora, preciso contar tudo a Jude. Ele entra na cozinha e passa por mim, indo para a porta dos fundos e olhando em volta por um momento antes de se voltar para mim. Ele precisa de respostas. Sento à mesa da cozinha e ele vem se juntar. — Conte o que aconteceu, Nel. — Sua voz está tão suave; ele não parece ferido nem bravo, apenas pronto para saber por que terminei o que tínhamos. Esfrego a mão sobre o rosto e respiro fundo. — Não queria que você descobrisse, Jude. Sei que merecia saber, mas não queria — começo, honesta. Jude não responde, apenas espera que eu continue. — Eu amava seus pais, você sabe disso. Ele sabe tanto que acena, só uma vez, reconhecendo. — Quando seu pai estava doente e sabia que tinha chegado o fim, eu fui vê-lo. Queria que ele soubesse o quanto eu te amava e que cuidaria de você, garantir que estivesse bem. — Fecho os olhos e respiro fundo; Jude abaixa o olhar para as mãos sobre a mesa. — Já estava em Londres há três meses e você em Edimburgo; apesar de tudo que estava acontecendo e da distância, estávamos nos dando bem. Queria garantir ao seu pai que você ficaria bem, mas não sabia que você tinha dito a ele que estava pensando em adiar seu primeiro ano e se transferir para uma universidade em Londres. Ele me olha, claramente surpreso por eu saber que ele tinha discutido aquilo com o pai. — Seu pai tinha tanto orgulho de você, Jude. Naquele dia, ele segurou minha mão e me falou que, do momento em que soube que seria pai, tinha toda essa esperança e sonhos pelo filho. Torcia para que você se tornasse médico e que talvez quisesse estudar em Edimburgo, assim como ele. Quando você fez exatamente isso, o coração dele explodiu. Depois de se despedir de você quando foi embora, ele chorou de alegria absoluta e um orgulho enorme por seu garoto querer seguir seus passos. “Você estava estudando medicina em Edimburgo, de todos os lugares possíveis. Você não viu o brilho nos olhos dele, Jude, quando falou de você. Era como se o câncer não existisse. — Encontro os olhos úmidos de Jude ao se lembrar do orgulho que o pai sentia. Continuo: — Ele me disse que estava grato por eu te amar daquele jeito. Estava tão grato por você ter alguém que te adorasse e que quisesse te ver feliz na vida. Então apertou minha mão e disse que por isso tinha que me pedir para fazer algo que era injusto com nós dois. “Ele sabia que, assim que morresse, você não teria motivo para ficar em Edimburgo. E que, depois de um ano afastado, provavelmente já teria um emprego e acabaria nunca voltando para a faculdade. Disse que partia o coração dele me pedir para partir o seu, mas não conseguiria encarar seus últimos dias preocupado com seu futuro. — Ofego, percebendo que estou chorando ao contar a história pela primeira vez, e seco as lágrimas das minhas bochechas, Jude desviando o olhar para as portas dos fundos. — Levei um tempo para perceber o que ele estava pedindo. Quando o encarei, lágrimas enchiam meus olhos e ele apertou minha mão. “Ele disse: ‘nós te adoramos, Ella, e sinto muito por te pedir isso, mas preciso saber que ele vai ficar bem’. — Respiro fundo. — Eu não poderia garantir um futuro decente para você, Jude. Éramos crianças. Podia prometer te amar e ficar com você, mas ele precisava saber que você seria capaz de comprar uma casa quando estivesse pronto, que pagaria suas contas e teria uma ótima vida. Queria ser capaz de te prometer isso e achei que ficaríamos bem, mas não podia garantir. Fiquei sentada em silêncio com ele, sem saber o que dizer. “Meu coração já estava partindo antes mesmo de ter feito qualquer coisa, mas ele e eu sabíamos que eu concordaria. Ele era seu pai, Jude, seu herói, e estava morrendo. Não podia deixá-lo encarar tamanha preocupação por você. — Fungo e seco mais lágrimas, soltando o ar. — Não respondi. Fiquei de pé e o abracei. Quando fui embora, sua mãe me abraçou e disse que sentia muito, e eu soube que tinha que fazer o que me pediram. Queria garantir que você estaria bem, então decidi esperar até depois do funeral, mas estava me matando. “Quanto mais eu esperava, mais aquilo partia meu coração e mais sentia que estava quebrando uma promessa não dita a um homem que admirava tanto. Quando você veio me visitar em Londres antes do Natal, parecia bem e forte, e pensei que ficaríamos bem, mas então você começou a falar sobre se mudar para perto de mim e entendi que não podia esperar mais. Então parti seu coração, e sinto muito por isso, Jude. Eu me odiei e me arrependi todos os dias desde lá.” Soltei o ar, sentindo como se não estivesse respirando direito nos últimos quinze minutos ou algo assim, ou melhor, nos últimos onze anos. Fechei os olhos e percebi que aquele foi o pior Natal da minha vida. Essa era a razão pela qual eu odiava tanto. Agora que ele sabe a verdade, ela toda, e o fardo que carreguei sozinha por todos esses anos está aí exposto, não é mais um segredo. Jude engole em seco, mas permanece em silêncio por um tempo, absorvendo o que contei. Ele me olha e estica a mão sobre a mesa em busca da minha. — Você nunca quis terminar comigo? — pergunta, seus olhos encontrando os meus, e nego com a cabeça. — Queria que tivesse me contado tudo isso. Eu teria entendido. — Olho para baixo, envergonhada por ter escondido por tanto tempo. — Obrigado, Nel, por trazer paz a ele no fim da vida. — Suas palavras me surpreendem e volto a encará-loquando fica de pé e me puxa em um abraço. — Já tratei pacientes no fim da vida o bastante para saber que eles apenas precisam de algumas coisas. Aquele homem era um super-herói para mim. Você partiu meu coração, mas saber que fez isso puramente para facilitar as coisas no final — volta para trás e me encara também —, eu te perdoo, Nel, e obrigado por fazer aquilo por ele. Suas palavras me surpreendem e me deixam nervosa, mas então ele beija o topo da minha cabeça e me abraça apertado no melhor momento que tive em algum tempo, e subitamente me sinto mais calma do que senti em todo o tempo que estivemos separados. — Você vai voltar para Londres? — indagou. Não esperava que essa fosse sua próxima pergunta e olhei para ele, confusa. — Não sei — respondi, honesta. — Não posso, até a neve diminuir, acho. Ele sorri. — Fique, Nel. Me dê os próximos dias. — Dou um passo atrás e procuro uma explicação em seu rosto. — Apenas… me dê os próximos dias e, o que quer que eu sugira, diga sim. — Ele ri quando arregalo os olhos. — Tudo dentro dos conformes, prometo. Você me deu um presente hoje, Nel. Eu precisava saber de tudo isso e agora tenho que te dar algo em retorno. Me dê os próximos dias e vamos fazer você se apaixonar pelo Natal de novo. Solto um risinho e ele me dá um largo sorriso irresistível. — Isso é um sim? — questiona, e rolo os olhos, brincando. — Acho que te devo essa, né? — respondo, aceitando o fato de que não voltarei a Londres. Operação Dane-se o Natal está off, e dizer sim ao Natal, aparentemente, está muito on. Jude teve um turno noturno ontem, então, depois de tudo que contei, ele teve que entrar no Land Rover que a oficina emprestou depois de rebocar o dele e foi para o hospital. Sentei no sofá e contei tudo sobre a noite passada, enquanto Dick dava banho em Poppy e a preparava para cama. Minha mãe ficou com o pai na cozinha, tentando convencê-lo que era bom comer salada no inverno. — Uau, Ella, você deveria ter me dito. — Puxou-me para perto e beijou minha cabeça. — Não deveria ter carregado isso tudo sozinha. Assenti. Sabia que não deveria ter me isolado, mas fiz isso e não podia mudar agora. — Ele quer que eu dê os próximos dias a ele, que diga sim ao que sugerir. — Ela arregala os olhos, como fiz quando Jude me falou, e ri. — Não daquele jeito. Ele quer me fazer me apaixonar pelo Natal de novo, aparentemente — explico. — Ai, Noella Star, não acho que seja só por isso que ele quer que você se apaixone. Tentei ao máximo não pensar do mesmo jeito. Não era muito difícil me apaixonar, já que nunca realmente deixei de amar Jude. Só tinha me esquecido, mas, estando ao redor dele de novo, se ele me pedisse em casamento amanhã, eu provavelmente diria sim… Assim, eu teria que dizer que sim, acho. Disse a ele que falaria sim para o que ele sugerisse. Mas não posso pensar desse jeito. Não posso me permitir alimentar expectativas de que isso seja mais do que nostalgia e ele sentindo que precisa finalizar nossa história com um brilhante laço natalino agora que sabe a verdade. Quer dizer, não sei nem se ele está solteiro, quanto mais me permitir esperar que ainda haja uma chama que valha explorar. Depois de um rápido banho, seco o cabelo e espero que a entrega rápida das minhas roupas de inverno que agendei na tarde de ontem chegue logo. Eu e Rudolph precisamos buscar caminhos separados. Descendo as escadas como estômago roncando pelo almoço e gritando comigo por perder o café da manhã de mais cedo, vejo uma sombra se aproximar da porta da frente pelo vidro embaçado e fico animada para receber meus vestidos quentes e novos jeans. — Ah, oi. — Fico surpresa ao abrir a porta para Jude, ainda mais por ele estar com meu pacote. Ele nunca esteve tão sexy, para ser sincera. Um belo homem entregando roupas novas e sapatos; sim, por favor. — Sua entrega me acordou. — Sorri, e franzo o cenho. — Eles levaram para mim em vez daqui. Posso entrar? Está congelando aqui fora. Devolvo o sorriso e estico a mão para pegar o pacote, com Jude me seguindo para dentro da casa. Entramos na sala e ele cumprimenta meus pais, sentando no sofá, e me jogo no chão para abrir o embrulho. — Para uma garota que não gosta do Natal, você sabe bem como abrir um presente — Jude afirma e meu pai ri. Suspiro, soltando “ooh” e “aah” para cada coisa que comprei e estou desesperada para provar todos eles, mas não quero ser rude. — Desculpa. — Volto-me para os olhos divertidos de Jude. — Ainda fico empolgada com roupas novas. — Sorrio, envergonhada, e ele me dá um largo sorriso. — Bem, você teria algo apropriado para patinar no gelo? Meus olhos se arregalam. — Jude, não sei patinar. — Nego com a cabeça e ele me dá um largo sorriso. — Noella, diga sim. — Ele me lembra do nosso acordo e, relutante, eu concordo. Subindo as escadas para vestir meu novo jeans preto e meu novo suéter vermelho de gola alta, me sinto fantástica. Após dias usando as roupas da minha mãe, me sinto mais eu. É bom pra caramba. Admiro minhas curvas no espelho, girando de um lado para o outro para ver como minha bunda está fantástica e me permito imaginar a reação de Jude. Subitamente, fico empolgada para descer as escadas. Rapidamente coloco um pouco de maquiagem e então visto minhas novas botas pretas e praticamente pulo os degraus no caminho lá para baixo. Ao passar por Dick no final da escada, ele arregala seus olhos já grandes e acena em aprovação; eu sorrio, e ele se inclina perto do meu ouvido, falando baixinho: — Acaba com ele, garota. Beijo sua bochecha e caminho para a sala. — Certo, se você está determinado a me humilhar, vamos colocar esse show na estrada. — Sorrio para Jude, que me olha de cima abaixo, depois engole em seco com força e desvia para o meu pai. Seguro uma risada. Funcionou. — O quê? Cadê o casaco natalino? — brinca, ficando de pé, e dou um tapa em seu braço. — Calado. Vamos. Pego meu casaco, gorro, luvas e bolsa, levando Jude para fora da casa. Andando até seu carro, me sinto bem menos confiante do que há cinco minutos. Primeiro, não faço ideia do que está acontecendo entre nós e, segundo, estou morrendo de medo de estar prestes a perder um dedo. — Pronta? — Jude sorri para mim, seus olhos arregalados e claramente empolgados. — Não — respondo, rindo. — Estou com medo de verdade. Ele sorri, pega minha mão e leva à boca, beijando as costas dos meus dedos. Meu estômago se aperta e não consigo tirar os olhos de seus lábios. Não esperava por isso, tinha esquecido completamente das minhas preocupações. — Apenas diga sim, Nel. — Sua voz está baixa e ele sorri por entre meus dedos, então se afasta com aquele sorriso de parar o coração. Com isso, estou dentro: direi sim para qualquer coisa que ele inventar em seguida. — Okay, senhorita Frost, está pronta? — Jude entra no gelo com confiança e me estende a mão. Dou risadinhas, empolgada com o entusiasmo infantil que irradia dele, e dou um passo nervoso para frente, rindo tanto que escorrego e agarro a mão dele com mais força. — Opa! — grito ao deslizar, quase caindo de cara no gelo, então racho de rir quando ele me segura, minha bunda empinada. Pareço um potro recém-nascido tentando ficar de pé pela primeira vez. Ele consegue me endireitar e segura meu corpo contra o seu. — Está bem, Bambi? — Ri, e jogo a cabeça para trás, deixando outra risada alta sair e agarrando seus braços para proteger minha própria vida. — Está tão escorregadio — comento, alto demais, e ele ri. — É gelo, Nel. — Ri ainda mais. — Eu te disse que não conseguia patinar. — Meu sorriso se abre e ele pisca. — Mas você disse sim. Suas mãos deslizam por meus braços até agarrar as minhas e, mesmo através das camadas de roupa, ele ainda deixa uma trilha de arrepios. — Estabilize as pernas — pede, olhando em meus olhos e falando baixinho. — Sinta a força nas suas coxas e depois deslize os pés, um de cada vez, lentamente, pequenos movimentos. Mexa-se comigo. Ele começa a se mover, me encorajando a ir junto. Balanço, mas ele me estabiliza e então me mexo um pouco mais. Olho paraas crianças usando os pinguins como apoio com inveja; como eu consigo um desses? Então encontro seus olhos e percebo que já consegui: Jude é meu pinguim. Sorrio com o pensamento e ele me olha em dúvida. Nego com a cabeça e rio, o que me faz balançar de novo. Concentre-se, Noella. Começo a encontrar meu ritmo o suficiente para Jude soltar uma das minhas mãos e patinar perto de mim em vez de simplesmente me puxar com ele. Agora sou capaz de olhar ao redor. O rinque de patinação ao ar livre fica no meio do mercado natalino mais próximo da nossa vila. Há belas luzes penduradas entre as árvores e postes de luz, e fico grata por Jude cronometrar nossa vinda com a iluminação no fim da tarde. Há algo mágico em relação às luzes que começam a ganhar vida e acendem o céu sobre nós enquanto a noite cai. A enorme árvore de Natal no final da pista está cheia lâmpadas coloridas com uma grande estrela dourada no topo. Não consigo evitar o sorriso ao ver a alegria e as risadas nos rostos dos casais, das famílias e dos grupos de amigos ao meu redor. Volto a pensar na última vez que me lembro de realmente curtir o Natal. Eu tinha dezessete anos. Jude e eu, assim como Nats, Dick e nossos pais, fomos a uma viagem de um dia para Bath nos mercados natalinos de lá. Tinha esquecido daquilo até agora. Devo ter bloqueado para permitir minha personagem que odeia a data, mas foi maravilhoso. — Ei, você está aqui comigo? — Jude pergunta ao meu lado, trazendo minha atenção de volta para si e voltando a se mover na minha frente, segurando minhas mãos e patinando de costas. — Sim. — Abro um largo sorriso. — Desculpa. Ele imita o sorriso. — Vamos lá, vamos pegar algo para beber. Percebendo a queimadura em minhas pernas, fico grata e aceno entusiasmada, com ele me guiando para o lado. — Você foi muito bem — afirma, nós dois andando pelo mercado em direção ao bar. Consigo sentir o cheiro de quentão antes de poder ver o bar, que está me chamando. O aroma é uma delícia e juro que começo a me sentir tonta pela fumaça no ar. Jude me leva pela mão no meio da multidão antes de pedir dois vinhos e me trazer para perto de si. — Minhas coxas estão me matando — comento, uma resposta atrasada para seu elogio anterior, erguendo a voz sobre o som das conversas que nos cercam, e ele ri, me entregando o líquido quente que literalmente é o Natal em uma xícara. O cheiro é absolutamente divino. — Sim, definitivamente é um treino — responde e toma um gole. — Vamos lá. — Segura minha mão. — Quero muito que você prove essas nozes temperadas. Rio bem alto. — Estou vendo que sua conversa não mudou na última década — brinco, o fazendo rir de novo. — Sim, mas ainda funcionam. — Bebe o vinho, com um sorrisinho esperto. — Então, quer provar as nozes? — Suas bochechas sobem com a expressão feliz. — Claro que sim. — Aceno, imitando seu rosto. — Viu? — Abre os braços, vitorioso, o que me faz rir de novo, mas estica a mão para me levar pelo mercado. Ele estava certo sobre as nozes. Amêndoas torradas e castanhas do caju misturadas com todo tipo de especiarias: com pimenta, com pimenta e cacau, canela e sal. As amêndoas apimentadas são minhas favoritas, mas Jude compra uma seleção com várias para levarmos para casa para minha família. — Para onde sua mãe se mudou? — questiono, jogando outra amêndoa na boca durante nossa caminhada, olhando para as diferentes barraquinhas de decoração natalina caseira, geleias artesanais e mais. Se eu soubesse disso aqui antes de fazer minhas compras de Natal, poderia ter levado tudo daqui, já que é a cara da minha família. — É… — Ele pega uma estrela de madeira e vira na mão antes de devolver e se mover pela barraquinha. — No momento, ela está em uma casa de repouso. Franzo o cenho, confusa. A mãe de Jude não é muito mais velha que a minha, não mesmo, certamente não o suficiente para estar em uma casa de repouso. — Ela ficou muito esquecida depois que o papai morreu e colocamos na conta do luto, mas o tempo passou e foi piorando. Ela estava esquecendo os nomes das coisas como uma chaleira e colocando potes de metal no micro- ondas. Eles diagnosticaram como demência precoce enquanto eu estava morando no norte e precisei vir para casa. Ela decidiu que queria vender a casa e ir morar em um lar de repouso quando ainda podia tomar sua própria decisão, porque sabia que ficaria pior e não queria colocar aquele fardo em mim. Fico em choque. Eu não sabia como não fiquei sabendo de nada disso. Meus pais deveriam saber. Natalia também. — Sinto muito, Jude. Não fazia ideia. — Minha voz é baixa. Fico muito triste com a notícia e perturbada por ele. — Pedi que não te contassem. — Vira o rosto para mim rapidamente. Levanto o rosto para encará-lo e ele para, se voltando para mim. — Não vim visitar quando Tali me dizia que você estava aqui. Evitava ir a Londres de todo jeito porque não queria esbarrar em você. Convenci minha mãe a ir para Edinburgo comigo no Natal ou passar com as irmãs dela para não ter que te ver. — Suspira. — E quando ela ficou doente, eu sabia que, se eles tivessem te contado, você teria tentado voltar comigo, pelo menos para oferecer simpatia ou apoio, e eu não queria aquilo. Então pedi para não contarem. Eu amo a mãe de Jude. Queria ter sabido de tudo isso e ter conseguido vê-la enquanto ainda era a mulher que eu conheci, porém, por mais que doa, entendo seus motivos. Eu o machuquei — ele não queria me ver. Aceno. Não há muito mais para ser dito, então sorrio, procuro sua mão e o deixo continuar a me levar pela central natalina. Chegamos a uma lojinha que vende dedicadas peças de decoração feitas à mão e faço Jude parar. Não sei por que sou atraída por elas, mas são tão bonitas e elegantes que não consigo lutar contra o desejo de segurá-las nas mãos. Não é estranha essa absoluta necessidade de passar as mãos sobre algo que você acha atraente? Um sofá novo, um vestido de seda, a bunda de Jude naqueles jeans. Sorrio sozinha e pego um penduricalho em formato de floco de neve. Por mais que rejeite esse período do ano, sempre tive uma queda por flocos de neve. Amo a simetria deles. Amo que haja algo tão mágico por algo tão simples quanto água congelada ficar tão bonito, mesmo que seja uma beleza que não é tão visível a olho nu e que não seja feito para durar. O floco de neve em minhas mãos, porém, é. Pode ser frágil, mas é feito com muita habilidade e sei que seria um tesouro em uma coleção como a da mamãe. — É perfeito para você — Jude comenta, sorrindo, e entrego a decoração ao vendedor, me preparando para pagar. — É para a mamãe. — Sorrio. — Não tenho uma árvore. — Estou chocado. Que horror — responde, sarcástico, e eu rio. — Tudo bem, tudo bem. — Rolo os olhos, brincando. — E você, vai levar alguma coisa para sua gruta pessoal? — indago, pegando meu agora embalado floco de neve, e viro para encarar Jude. — Também não tenho uma árvore. — Tosse, tentando esconder as palavras e ergo as sobrancelhas. — Desculpa, o que disse? — Rio. — Sim, eu sei. Não tive tempo. Tecnicamente, eu tenho uma. Só não montei. Vou trabalhar a maior parte do dia 25 de todo jeito, então não vi muito sentido. Percebo que começamos a andar de novo. Não sei como não o percebi pegar minha mão de novo ou meus pés se movendo, mas há alguma coisa sobre falar com Jude de novo depois de todo esse tempo que simplesmente me leva para longe. — Ah, você deveria, Jude — comento. — Você não é um velho avarento como eu. Precisa de brilhos e luzes cintilantes em sua vida. — Abro um largo sorriso e ele me encara, seus olhos refletindo o mesmo brilho que estou falando. — Talvez — responde, antes de entregar a bolsa de castanhas de caju com sal e pimenta para mim, me oferecendo seus produtos. Pego uma noz e jogo na boca, notando o ar frio mordendo minha pele. Estamos nos afastando da multidão agora, o que nos deixa mais expostos aos elementos. Estremeço, e Jude percebe. — Está com frio? Posso te levar para casa. Nego com a cabeça. — É dezembro. Claro que estou com frio, mas não quero ir embora ainda. — Como se fosseuma experiência totalmente extracorpórea, me encontro realmente querendo ver as luzes natalinas, ouvir música, sentir o aroma da estação, a canela, as castanhas assadas, o quentão… é intoxicante. Ele abre um sorriso e passa o braço ao redor do meu ombro, me trazendo para perto e me segurando ao lado do corpo. Seguimos andando. — Noella Star Frost, você está mesmo começando a aproveitar o Natal? — questiona, diversão em cada palavra. — Estou aproveitando as compras, a comida e a bebida — respondo — e a companhia não é ruim. — Apoio-me nele, que me puxa para perto, beijando minha têmpora. Não há nada de começar nisso aqui — está para se moldar como o melhor Natal de todos os tempos. Jude nos levou do mercado para casa ontem à noite e ficou estranho. Estamos em um lugar estranho. Somos ex um do outro, nosso relacionamento não terminou bem, mas nos vimos metidos na vida um do outro sem termos tempo para qualquer um de nós se acostumar com a ideia. E agora que ele sabe o motivo para eu encerrar as coisas é como se a nuvem que pairava sobre nós pelos últimos onze anos tivesse sumido. De várias maneiras, é como se alguém tivesse dado play em nós, depois de estarmos pausados há muito tempo. De volta à companhia um do outro, é praticamente impossível para nós estarmos qualquer coisa diferente de inteiramente confortáveis. É realmente difícil não nos vermos de novo como melhores amigos, e estamos claramente lutando contra a vontade de voltar a ser mais que isso. Não é como se qualquer um de nós realmente pensasse em voltar para onde estávamos. Tínhamos dezoito anos quando terminamos e agora temos vinte e nove. Dormi com outros homens e fui noiva de alguém e ele, andando por aí como fez nos últimos onze anos, com uma personalidade de matar, não há chance de a cama dele ter esfriado. Nós dois sabemos que isso é uma mistura de nostalgia e um amor profundo um pelo outro. Nós mudamos. Não somos mais os mesmos adolescentes que éramos. Temos carreiras, hipotecas, melhores amigos que o outro nem sabe que existe. Ainda assim, é quase impossível não estarmos completamente atraídos e voltar à vida do outro como duas peças perdidas de um quebra-cabeça que acabaram de aparecer, escondidas debaixo das almofadas do sofá este tempo inteiro. Nós combinamos, Jude e eu, mas não estamos juntos. Não somos mais nada e é aí que fica estranho. Ele estacionou o carro do lado de fora da casa e ficamos sentados por um momento, o silêncio desconfortável nos esmagando. Se eu estivesse em um encontro e fosse deixada em casa, poderíamos nos beijar ou não, desejar boa-noite e eu sairia, ele dirigiria para longe. Do jeito que está, eu disse sim para Jude, como prometi que faria, e tive o momento mais incrível de todos, então ele me levou para casa e nenhum de nós sabia qual era o próximo movimento, por isso ninguém fez nada. Saímos do carro, desejamos boa-noite e caminhamos pelos respectivos gramados, paralelos um ao outro, antes de gritar boa-noite de novo por cima da cerca-viva. Quando fechei a porta, a vontade de mandar uma mensagem para ele e dizer “isso foi estranho” era enorme, mas percebi que ainda não tínhamos trocado números de telefone; era tudo tão estranho. Hoje de manhã, determinei que não haveria mais estranhezas. Ainda temos cinco dias até o Natal e, já que estarei por aqui nesse período, graças à neve e à enorme culpa familiar, meu belo ex-namorado, vizinho temporário e atual professor da arte de amar o Natal será parte disso tudo. Então preciso resolver isso e temos que conversar e trabalhar no que estamos. Sendo realista, não pode ser nada sério, mas eu não diria não a encontrá-lo dentro da minha meia pendurada na lareira em algum momento da próxima semana. — Você está aqui com a gente, Ebs? — Dick pergunta, divertido, já que estou sorrindo para mim mesma na mesa do café da manhã, um pedaço de salsicha na ponta do meu garfo, pronto e esperando pacientemente para ser devorado. — O encontro de ontem foi realmente tão sonhador? — Não era um encontro, Dick — respondo, recebendo um coro de bufos e caretas de Natalia e mamãe. — Vocês dois tem nomes de verdade, sabem? — Nats dispara, olhando de nós para Poppy, que está enfiando cereal de chocolate na boca sem parar para respirar. — Peço desculpas, Natalia. Richard, poderia passar o molho de tomate, por favor? — peço, sorrindo. — Mas é claro, Noella — responde, me entregando o ketchup como se fosse uma garrafa de vinho. — Ai, foda-se — Nats murmura baixinho, minha mãe ofega e tanto eu quanto Dick gritamos “olha a boca, Natalia” em meio a risadas. Nats não xinga com frequência, mas, quando o faz, porra, eu amo. — Mãe, comprei uma coisa para você — aviso, empurrando a cadeira para trás quando paro de rir. Vou até o corredor para pegar minha bolsa e volto, entregando o pacote. — Ah, Ella — cantarola, olhando o floco de neve na caixa que tem nas mãos. — É lindo, querida, obrigada. Ela parece genuinamente tão feliz que não consigo evitar um sorriso. Eu poderia ter perdido isso. Poderia estar sentada sozinha no meu sofá agora; que idiota. Meu pai está se sentindo bem melhor agora, após alguns dias de descanso. Alguma cor voltou às suas bochechas e minha mãe parou de se estressar para que ele ficasse na cama. — Oi, pai — digo, pisando no quintal, e o encontro desfrutando de um café no frio. Meu pai ama o frio. Sendo grande, ele tem um pouco de dificuldade quando está calor, mas, no frio, parece que ele foi feito para isso. Nunca o vi se incomodar com isso. Não está nevando há alguns dias agora, mas ainda tem bastante no chão e a família de neve que Poppy, Jude e eu fizemos ainda está bem forte no ar frio. Se eu não estivesse dizendo sim para Jude, poderia ficar tentada a entrar em Frank, o Fiesta, e voltar para Londres, a Big Smoke. Ah, quem eu quero enganar? Definitivamente vou participar dessa coisa de Natal da família este ano. Parece diferente agora. — Oi, docinho — papai responde, esticando o braço para um abraço. Vou até lá e permito que ele me segure de lado. É muito confortável e ele está bem quente. Não digo nada. Só quero ficar perto um pouco. — Como foi sua tarde ontem? Respiro fundo e passo o braço sobre sua barriga, me aconchegando no grande urso. — Foi amável, pai — respondo, com honestidade. — Você e Jude estão… — Não estamos nada — corto. — Estamos apenas… — pauso, tentando pensar na melhor resposta, embora não tenha nenhuma realmente — resolvendo as coisas. Ele fica satisfeito; pelo menos eu assumo que sim, já que não diz mais nada, apenas toma outro gole do café. — Ella, a porta. — Nats coloca a cabeça para o lado de fora e me chama. Meu coração dá um salto. Só tem uma pessoa que bateria aqui na porta procurando por mim. Ao chegar à porta, Jude me estende uma caixa retangular e sorri. — Apenas diga sim — pede e dá um passo para trás. — Pego você às seis. — Enquanto ele se vira para ir embora, olho para a caixa e volto para Jude. — O quê? — Rio. — Jude — chamo, e ele se vira no final do caminho para casa. — Abra… te vejo às seis — repete o horário, e olho para a caixa em minhas mãos assim que ele sobe no carro e liga o motor. A caixa em si é de um tom luxuoso de creme, a fita de cetim champanhe amarrada ao redor dela é finalizada com um grande pingente de floco de neve prateado. Passo a mão por ele e não consigo deixar de sorri. Fecho a porta da frente logo que Jude dirige para longe e abro a caixa. Dentro, há um monte de papel seda pérola. Apoio a caixa na escada para ter as duas mãos livres e mexer no papel de dentro. Meus dedos encontram o tecido vermelho macio e me delicio com a sensação dele na pele. Confusão enche meu cérebro ao segurar a peça na caixa. — Vem cá — Natalia chama, ao meu lado —, vamos provar. Olho para minha irmã, que sorri sabendo de algo e animada, pego a caixa e subo as escadas. Às seis da noite em ponto, há uma batida na porta. Ergo um pouco o vestido, já que é grande demais sem salto, e atendo. — Minha nossa — digo sem querer, quando coloco meus olhos em um pedaço real do paraíso.Jude McDonagh, no smoking mais lindo e de caimento perfeito. Seus olhos estão brilhando na luz do corredor e aquele cabelo está perfeitamente imperfeito como sempre. Minha boca fica mais seca que o deserto do Saara. — Você parece absolutamente incrível. — Ele sorri, quase nervoso, e, por um breve momento, franze o cenho. Fico aliviada por ele parecer estar tão afetado por mim no vestido que ele escolheu quanto eu estou por ele, minha própria fantasia de James Bond em pessoa. — Bem, você não está nada mal. — Sorrio. — Aonde vamos? — Venha — estende a mão para mim —, vou te contar no caminho. Aceito sua mão e levanto o vestido de novo, subindo no sapato que ele deixou com Natalia; ele pensou em deixar três pares para eu poder escolher, óbvio, porque é o homem perfeito. — Não — interrompeu, e olhei para ele, confusa. — Coloque as botas. Deixe para colocar os saltos no carro. — Não. — Rio. — Não vou usar botas com esse vestido — protesto. — Nel, estamos no inverno. Está nevando, frio, congelando. Não quero que você quebre o pescoço. Só deixe para colocar quando estiver no carro, por favor. — Como posso dizer não a isso ou ao apelo cuidadoso em seus olhos? Bufo, enfiando os pés nas botas desajeitadas, me sentindo muito estranha naquele vestido de noite, carregada com as joias elegantes da Nats que ela comprou para o casamento, mas me sentindo prestes a dar um passeio no campo. — Você precisa de um casaco também. — Dá um sorriso espertinho, e rolo os olhos, dramática. Jude sorri, vitorioso, e visto o casaco, então me dobro para pegar o sapato, que ele estende a mão para carregar, me dando a outra para segurar. Levanto o vestido e, com a mão na dele e minha barriga dando mortais até chegar à garganta, vamos para o seu carro. Depois de uma hora no carro, músicas natalinas tocando no rádio o tempo todo, mas, pela primeira vez, sem me irritar, já que o ouço cantar junto enquanto dirige, ele para na entrada de um grande hotel no campo. Há uma enorme árvore de natal perto da porta da frente iluminada e me sinto confortável com as luzes coloridas, piscando contra o chão coberto de neve. Consigo ver as pessoas saindo de seus carros na entrada e passando pelo tapete vermelho sobre as escadas, seu carro sendo levado para estacionar. Jude para, desce e rapidamente dá a volta para abrir minha porta e me ajudar. Saio, me sentindo menos ridícula pelo casaco quando sinto o ar congelante em minhas pernas nuas, uma vez que a fenda vai até acima do joelho no vestido que se abre. Fico de pé e envolvo o casaco mais apertado. Ele pega minha mão e nos leva para dentro. — O que é isso? — indago, e chegamos às portas na parte de cima das escadas; lá dentro, entrego meu casaco em troca de um bilhete. — Baile de Natal do hospital — responde, e arregalo os olhos para ele. — O quê? Essas pessoas são seus colegas de trabalho? — A maioria — informa, apertando minha mão mais uma vez. Começamos a andar, cada um pegando uma taça de champanhe da bandeja que nos foi estendida. — Alguns são doadores, estudantes, a maioria de departamentos diferentes. Óbvio, nem todo mundo está aqui porque ainda temos um hospital para cuidar, mas sortearam os nomes de quem poderia vir. Tive sorte, já que tinha tirado esse fim de semana para ver minha mãe, comprar algumas coisas, então aqui estamos. Nós nos encontramos em um salão de baile grande, extravagante e elegantemente decorado. Há um enorme lustre de cristal reluzente pendurado no teto acima de, talvez, umas vinte grandes mesas redondas, todas cobertas por enfeites das vermelhas flores natalinas, com luzes brancas e laços de veludo vermelhos. É bem bonito, e não consigo esconder o sorriso por Jude ter escolhido o vestido mais bonito possível. Vermelho é a minha cor favorita e esse vestido combina perfeitamente com os arredores a ponto de ser um sentimento bem reconfortante, depois de ficar tão ansiosa para estar nos braços de Jude em um evento desses. Olho ao meu redor. Há um palco enfeitado como um perfeito paraíso de Natal. É lindo — árvore brancas com decoração cinza azul-gelo e um painel de flocos de neve. Na frente do palco, uma enorme pista de dança com um globo de luzes girando acima. Ninguém dança ainda e a mudança da iluminação no piso brilhante é hipnótica. — Então essa é a moça que colocou um sorriso no seu rosto nos últimos dias. — Uma voz chama minha atenção de toda a observação, e viro para ver o homem que aperta a mão de Jude. Ele me olha de cima abaixo e lambe o lábio inferior. — Posso ver por quê. O jeito como me olha me deixa imediatamente desconfortável e o jeito como Jude passa o braço pela minha cintura e me traz para perto me diz que ele sente o mesmo; ou isso ou esse é o equivalente a Jude mijar no próprio jardim. Gosto desse pensamento. Não dá para evitar. A ideia de ele sentir que sou território dele e querer me marcar envia certo tipo de arrepio por todo meu corpo. — Aled, esta é Noella. Noella, Aled — Jude diz, monótono, e Aled chega um pouco para frente. Acho que ele virá beijar minha bochecha, então rapidamente estendo a mão. Cai fora, Aled! — Prazer em conhecê-lo. — Sorrio, cortês, e Jude tira o braço da minha cintura para segurar minha mão. — Nel, vamos pegar umas bebidas? — Sorri para mim. Assim que concordo com a cabeça, ele se desculpa com Aled e me guia. — Desculpa, ele é tão estranho. Se alguém viria direto até você hoje, tinha que ser ele. — Ele é médico? — pergunto, enquanto esperamos ser servidos no bar. — Não, ele trabalha na administração, mas parece passar mais tempo vagando nas enfermarias e encontrando motivos para se meter nas coisas dos outros do que fazer qualquer trabalho. Ele olha para longe e vejo sua mandíbula tensa. Não é algo que estou acostumada a ver em Jude. Ele sempre parece ser tranquilo, muito calmo, mas estar irritando por Aled ficar de olho em mim faz algo comigo. Preciso tomar cuidado com quanto beberei hoje ou posso me fazer de idiota ao montar no colo dele no caminho para casa ou algo assim. Quero dizer, o smoking ligou a ignição, o jeito como os olhos dele passearam pelo meu corpo rugiu o motor, mas essa possessividade tão clara em seu rosto… é um pé firmemente pressionado no acelerador. — Ei — chamo, apoiando a mão no seu braço que está apoiado no balcão, esperando nossas bebidas. Ele se vira para mim e suaviza com meu sorriso. — Obrigada por me trazer aqui hoje — declaro, genuína, e ele sorri. — O prazer é completamente meu — responde, então me entrega uma taça de vinho branco que acabou de ser colocada na frente dele. Pega sua água tônica e toma um gole. — Vai trabalhar amanhã? — indago. — Não, de folga o fim de semana todo. Lembro-me que ele já tinha dito aquilo e aceno, me desculpando. — Por que não deixa o carro aqui e toma uma bebida comigo? Parece um pouco injusto que seja eu que estou bebendo na sua festa do trabalho. — Nós nos afastamos do bar e entramos na área entre o bar e o salão principal. — Fica a uma hora de casa — comenta, enquanto procuramos uma mesa alta para apoiar nossas bebidas. — E daí? Te trago amanhã para buscar o carro. Até divido a grana do táxi contigo. — Pisco, o que o faz sorrir. — Ganho uma boa grana agora, Nel, posso pagar o táxi. — Assopra os dedos e finge polir no paletó, e protesto dramaticamente. — Ah, não. Depois de ter comprado este vestido e estes sapatos? Eu cuido disso. — Senhoras e senhores — um homem bem vestido no início dos seus vinte anos —, por favor, tomem seus assentos. O jantar será servido em breve. Jude pega nossos drinks e, depois de olhar duas vezes em que mesa estamos sentados, nos guia até lá. Fico aliviada ao descobrir que Jude não conhece realmente nenhuma outra pessoa sentada à nossa mesa. Significa que não teremos perguntas estranhas para mim e, na maior parte do tempo, terei sua atenção exclusiva. — Segura no meu Christmas Cracker[1] — Jude pede, se virando para mim e me esticando o tubo, o que me faz rir. — Você diz coisas engraçadas, doutor McDonagh. — Sorrio, pegando na minha ponta. Ele pisca, o que faz meu estômagoe tudo abaixo se apertar deliciosamente. Puxamos, e ele ganha um gorro rosa e um cortador de unhas. — Por que o boneco de neve estava olhando entre as cenouras? — pergunta, com um grande sorriso. Rio com seu sorriso ridículo e nego com a cabeça. — Não faço ideia. — Ele estava tirando meleca. Ele se recosta para trás, parecendo tão orgulhoso de sua piada terrível que me faz rir alto, fazendo a senhora ao meu lado se virar para mim. — Parece que estamos perdendo toda a diversão aqui. É bom ver um jovem casal rindo juntos tão livremente. — Ela sorri e engulo um pouco do vinho que acabei de pegar. — Há quanto tempo estão juntos? Arregalo os olhos para Jude, sem saber como responder nem causar algum desconforto para ele em um evento de trabalho. — Quinze anos — responde, sorrindo. — A pena para assassinato é menor que isso, mas não é a toa que dizem que sou um santo. — Ergue a taça para a senhora, que ri bem alto, e olho para ele, um pouco confusa, um pouco divertida. Ele se inclina na minha direção quando as entradas começam a chegar à mesa e beija minha têmpora. Não fala nada. Não precisa — ele só está feliz. O jantar está delicioso, três pratos, todos tipicamente natalinos. Cozinhados na mais absoluta perfeição e em porções pequenas o suficiente para permitir que eu dance e não fique inchada em um vestido que já abraça minhas curvas. Depois de algumas taças de vinho cada, Jude e eu estamos rindo como adolescentes e dançando como se tivéssemos voltado aos bailes do colégio. É bem divertido estar tão livre com ele de novo. — Preciso de um pouco de ar — aviso, por sobre a música, e ele acena, me puxando pela mão e me guiando pela multidão de dançarinos até a saída. Estremeço quando o ar frio toca minha pele, mas é bem-vindo. O ar lá dentro está pesado, com a quantidade enorme de corpos quentes embriagados, todos encharcados de perfume e loção pós-barba. Apesar do cenário cinco estrelas e dos vestidos e ternos caros, está suado demais naquela pista de dança. — Aqui — Jude chama, tirando o paletó e colocando em meus ombros. Agarro as lapelas e puxo para mais perto, inalando o cheiro dele e esperando que minhas bochechas não pareçam tão vermelhas quanto parecem. — Obrigada — digo, baixinho, e meus olhos encontram os seus. — Está se divertindo? — indaga, começando a passar as mãos para cima e para baixo por meus braços para me aquecer. Por instinto, chego mais perto dele. Minha proximidade faz meu coração bater um pouco mais rápido. Encontro seu olhar quando ele abaixa o seu e noto sua língua umedecer o lábio inferior. Ele abaixa a cabeça na minha direção e eu levanto a minha, desesperada para pressionar os lábios no dele, sentir sua língua na minha. — Últimos pedidos no bar, galera. — Um dos membros da equipe do hotel abre a porta para avisar, nos arrancando do nosso momento. Jude solta o ar e sorri, pressionando a testa na minha por um momento, então me beija ali. — Vou chamar um táxi. Ele volta para dentro para conseguir nosso carro e eu fico, usando o momento para lamentar nosso quase deslize e me perguntar que beijaço teria sido. Entro de novo, o som de Fairytale of New York, e a voz de dezenas de pessoas cantando juntas, me faz sorrir. Eu o encontro, com meu casaco nas mãos, e nossos olhos se encontram. Ele sorri ainda mais e acena para a saída. — Obrigada pela noite, Jude — digo, assim que ele passa os braços ao meu redor e me segura por perto por conta do frio. — Eu me diverti muito. — Não foi nada. — Beija o topo da minha cabeça. — Obrigado por dizer sim. Rio, olhando para ele. — Como se eu tivesse escolha. O caminho para casa no táxi é um pouco estranho. O motorista não parece querer parar de falar, deixando poucas oportunidades para Jude e eu discutirmos qualquer coisa, mas, conforme seus dedos traçam os meus pelo caminho de cinquenta minutos, me sinto estranhamente contente. Talvez seja o álcool em meu sistema ou, me atrevo a dizer, ou o fato de que estou cheia de alegria natalina, mas me sinto muito feliz e, pela primeira vez desde que vi Jude naquela sala de espera do hospital, não estou preocupada com o que existe ou poderia existir entre nós. Quando descemos do táxi, escorrego um pouco e Jude agarra meus braços, me trazendo para perto. — Deixei minhas botas no seu carro — comento, sorrindo sarcasticamente, e ele nega com a cabeça. Então, em um momento, ele me pega no colo, como o noivo faz com a noiva. Dou um gritinho, divertida, e levo a mão à boca para me calar e tentar evitar que minha família acorde. — Não, se você escorregar, eu vou cair de um lugar ainda mais alto. — Começo a rir descontroladamente e ele me acompanha. — Não vou escorregar, Nel — responde, confiante, e caminha na direção. Quando chegamos à porta da frente, Jude me coloca no chão e sorrio para ele. — Obrigada — falo, genuína, e seus olhos cor de avelã pegando a luz e mostrando um brilho impossível. Ele é perfeito. — Nel — chama, sua voz baixa quando fecha os olhos por um breve momento, depois abre de novo, voltados para o meu. — Quero te beijar. A franqueza de suas palavras e a realidade do que minha resposta trará faz minha barriga se revirar e apertar. — Então me beija — respondo. O que mais posso dizer? Jude me dá um pequeno sorriso antes de apoiar a mão nas minhas costas e me trazer mais para perto de seu corpo. Seus lábios separam os meus e sua língua gentilmente gira pela minha; com isso, sinto meus joelhos fraquejarem. Meu coração bate forte no peito e gemo contra seus lábios. — Vamos para a sua casa — sugiro, baixinho, sem ar. — Nel — pronuncia meu nome, mas continua a me beijar, me segurando perto de si. — Não podemos. — Ele me beija de novo, então se separa, apoiando a testa na minha. — Nós bebemos. Não quero que esse seja o motivo. Processo suas palavras rapidamente. — Não é. Não é por conta de algumas taças de vinho, Jude — protesto, querendo desesperadamente que ele me leve para a cama. Enquanto ele sorri para mim docemente, percebo que meu desespero absoluto vem de algum lugar. A coragem induzida pelo álcool está com força total e aceito que ele está totalmente correto. Não duvido do meu desejo por ele, mas este não é o momento nem o jeito correto para algo mais acontecer. Suspiro, frustrada, mas a luz do corredor brilha pelo vidro da porta e ouço a chave na fechadura. Jude dá um passo para trás e olho em direção à porta, que se abre. — Vocês estão bem? — Nats pergunta, puxando o roupão ao redor de si, mesmo que não chegue nem perto de fechar sobre o barrigão. — Sim, desculpa, eu te acordei? — pergunto, e Jude vai para mais longe. — Não, eu estava acordada. Vocês ficaram aí fora por tanto tempo que pensei que tinha esquecido a chave — diz, e olho para Jude, depois de volta para minha irmã, vendo o entendimento piscar em seus olhos. Ela nos interrompeu. — Obrigado por vir comigo hoje, Nel — Jude corta o silêncio. — Eu me diverti muito. — Ele sorri para mim, que retorno. — Te vejo amanhã. Noite, Tali. Ele se afasta e vou para dentro, fechando a porta. — Desculpa — pede, genuinamente. — O que eu interrompi? — Nós nos beijamos. — Seus olhos se arregalam, mas eu a corto: — Esquece isso. O que você está fazendo acordada? Você precisa descansar. — Eu sei, mas não consigo dormir. Minhas costas estão me matando e me sinto agitada. — Ela vai para a cozinha e a sigo. — Natalia, acha que deveríamos chamar a parteira? — pergunto, preocupada de verdade, mas ela nega com a cabeça. — Não, tudo bem, não é nada; me conte sobre hoje. — Ela senta e, depois de servir um copo d’água para nós duas, me junto a ela e começo a contar tudo. [1] Tubos de papelão embrulhados com cores natalinos. Deve-se segurar nas extremidades e puxar para abrir, deixando que estoure. Quem ficar com a maior parte, ganha o que está dentro. Costuma trazer uma piada, trocadilho ou charada dentro. Também é uma gíria para sair com uma pessoa atraente durante a época das festas de fim de ano. — Bom dia — digo, alegremente, ao entrar na cozinha. — Dia, Elly! —Poppy grita, altodemais para mim após uma noite de vinho, e estremeço. — Dança comigo? — pede, docemente, e não consigo dizer não. Giro com ela, no estilo natalino, ao som de Slade. Que clássico. — So here it is, Merry Christmas… — canto, e Poppy ri. — Dia — a voz de Jude chama minha atenção para a porta, e Natalia me dá um sorrisinho sarcástico, sentando depois de tê-lo deixado entrar. Congelo, com Poppy em meus braços. Felizmente, em vez de me manter dançando, ela o quer: sei o que está sentindo, criança. — Jude! — grita, correndo para ele, que a pega nos braços e sorri. Ela bagunça seu cabelo e o abraça apertado. Meu coração se desfaz um pouquinho. — Ei, Pops. Que dança maravilhosa — diz, verdadeiro, enquanto tento me recompor um pouco e parecer menos ridícula no meu pijama de gatinho, óculos e cabelo bagunçado e preso. — Quer um café, amorzinho? — minha mãe pergunta a Jude, que acena e coloca Poppy no chão. — Eu adoraria. Obrigada, Sue. — Sorri para mim. — Você parece muito bem, considerando o tanto de vinho que tomou ontem. — Ele sorri ainda mais, e quero socar aquela carinha bonita. — Você bebeu tanto quanto eu e, só para me irritar, parece… — paro, antes de dizer que ele está perfeito na frente da minha família inteira — bem melhor do que eu. Boa defesa, Noella. Estremeço. Minha mãe estende uma xícara de café para Jude, que agradece antes de se virar para mim. — Ainda pode me levar para pegar meu carro? — indaga, se dirigindo a mim, e minha família volta a tomar café. Tinha me esquecido disso, mas claro que posso. — Sim, claro. Quando? Ele olha para o relógio. — Ah — faz uma careta —, em breve, desculpa. Tenho que estar em um lugar, e é uma viagem de duas horas de carro. Olho para o relógio e vejo que já são dez e quinze. Preciso de um banho e esperava beber alguma coisa antes de ter que dirigir. — Deixa só eu comer uma torrada — afirmo, passando por ele na cozinha. — Nel, você vem comigo? Depois de pegar meu carro, digo — convida, e eu olho para ele assim que coloco o pão na torradeira. — Ir com você aonde? — indago, e ele sorri. — Sim, sim. — Rolo os olhos de brincadeira. — Apenas diga sim. Ele sorri para mim, se inclinando no balcão da cozinha, e me apoio no lado oposto, sorrindo igual. Uma hora e meia depois, com meu cabelo seco pela toalha enrolada do melhor jeito que pude — não sou muito boa com cabelo —, chacoalho as chaves do carro para Jude, que está sentado na sala com Poppy, olhando para o livro de figurinhas novo dela. — Pops, tenho que ir — avisa, beijando sua cabeça e se mexendo para ficar de pé. — Termine isso aqui para mim? Venho ver amanhã. Ela sorri para ele, suas bochechinhas subindo e alegria emanando dela. Não consigo evitar um sorriso também. — Vejo vocês mais tarde, família — aviso, virando para o corredor. Deslizo um casaco e saio. — Só preciso colocar algumas coisas no seu carro, se estiver tudo bem. Não vou ter tempo de voltar para buscar. — Jude dá a volta na cerca entre nossas casas e volta pela porta da frente. Fico apoiada no meu carro, chaves na mão, sem ter ideia de que diabos ele está inventando, quando volta até mim com uma caixinha de som — sim, eu disse caixinha de som —, assim como algumas sacolas contendo Deus sabe o quê. Ele me dá um grande sorriso ao colocar as coisas no banco de trás e entrar no lado do passageiro. Olho para o céu, respiro fundo e entro no carro. Estou grata porque as estradas limparam um pouco. Ainda tem bastante neve e gelo, mas já aliviou bastante da nevasca e agora as estradas estão boas para dirigir. — Obrigado, Nel — Jude diz, enquanto dirijo, e olho para ele brevemente. Por que ele é tão perfeito? O sorriso inocente em seu rosto deixa minha boca seca. — De nada — respondo, voltando minha atenção para a estrada. — Para onde vamos? — insisto. — Pegar meu carro — fala, sabendo que não é isso que quero dizer. — E depois? — pressiono, olhando para ele de novo. — Você vai ver. Olhos na estrada. Nego com a cabeça, sorrindo. — Você é tão ruim quanto a minha mãe. — Solto um sorrisinho. — Bem, ela está certa, você é uma péssima motorista. Rio mais alto — pensar em minha mãe e Jude sentados, discutindo o modo como dirijo, tomando uma xícara de chá é engraçado demais. — Quer falar sobre a noite de ontem? — pergunta, e a risada morre. Engulo em seco. Claro que esse momento chegaria. Eu deveria ter pensado melhor na minha resposta. Agarro o volante um pouco mais firme. — Não tenho certeza se sei o que dizer — respondo, honestamente, e ele pausa. — Bem, nos beijamos pela primeira vez em muito tempo. — Eu sei — comento, olhando para ele —, eu estava lá. — Sorrio, o que o faz rir. — Tudo bem, eu sei, foi horrível. É difícil saber o que dizer, Nel, mas sinto que precisamos falar algo. Respiro fundo e solto. — Eu sei. A verdade é que essa semana tem sido a melhor que tive em muito tempo. Só de estar perto de você de novo é uma terapia, mas não entendo o que está acontecendo e acho que talvez precisemos apenas de um minuto. — Solto tudo tão rápido que nem sei se ele conseguiu ouvir, mas o vejo acenar em minha visão periférica. O silêncio recai sobre nós. Jude subitamente canta em voz alta a música natalina no rádio e olho para ele, em choque, antes de nós dois começarmos a rir. Canto a próxima frase em resposta e ele sorri. Cantamos a sequência juntos e percebo duas coisas: uma, sei mais palavras das canções natalinas do que pensei; dois, realmente gosto delas. Chegamos ao hotel. Parece diferente na luz fria do dia. Ainda é incrível, mas o glamour das luzes, dos vestidos de noite com glitter e das joias reluzentes se foi. Agora é simplesmente um bonito hotel no campo em uma maravilha de inverno perfeita. Quando chegamos ao carro de Jude, ele me pede meu telefone. — Certo, meu telefone está aí, caso precise dele. Programei o endereço, caso você me perca, mas deve dar para me seguir, se você souber como dirigir devagar o suficiente para ficar atrás de alguém. — Ele pisca para mim e dá um largo sorriso. Não consigo falar. Minha boca está seca pela piscadinha e o sorriso acabou comigo. Eu o sigo para fora do estacionamento do hotel pelas estradas rurais que nos levam ao nosso destino desconhecido, e me sinto estranhamente empolgada. Jude nunca me leva a um lugar onde eu não me divirta, nunca me coloca para fazer algo que eu não goste, então sei que será bom. Sigo seu carro pela estrada de uma casa de repouso e meu estômago se revira um pouco. Estamos aqui para ver a mãe dele. Tenho certeza. O lugar é lindo, uma antiga construção georgiana que foi convertida naquilo, com enormes carvalhos ao longo da entrada e o que parecem grandes jardins nos fundos do prédio. Estacionamos, saímos e mordo meu lábio. Amo a mãe de Jude e, claro, sei que ela não guarda rancor de mim por machucá-lo, já que foi pedido dela e do marido que eu terminasse as coisas, mas não a vejo há muito tempo. Ela pode nem se lembrar de nada daquilo — nem se lembrar de mim. Não faço ideia do que esperar. — Não fique tão nervosa — avisa, sorrindo, e me encontra no meu carro, abrindo a porta de trás. — Estamos aqui para ver sua mãe? — indago, meu coração começando a bater forte no peito. Ele parar e se vira para mim. Sua expressão se suaviza e ele se estica para afagar meu braço. — Pode ser que ela não saiba quem você é ou talvez se lembre de cada detalhe. É meio que uma montanha-russa. Se não quiser entrar e preferir voltar para casa, tudo bem. — Sorri de novo, seus olhos brilhando na suave luz da tarde. — Mas não estamos aqui apenas para ver minha mãe, então eu amaria que você ficasse. Minha mente zumbe com o que poderíamos estar fazendo aqui, mas o sorriso em seu rosto ao me entregar o rádio que trouxe de casa apaga minhas preocupações. Se for com ele, vale a pena. Lá dentro, somos recepcionados alegremente pela equipe da casa. Jude me apresenta e sou recebida com abraços e desejos de um bom Natal de cada um deles. — Todos estão prontos e animados — uma das cuidadoras diz, nos levando por portas duplas de madeira, e as abre. Umcoro de celebrações soa e Jude sorri, acenando para as pessoas que enchem a sala. Há umas trinta pessoas no grande salão de jantar, todos com idade próxima de sessenta anos ou mais, vestidos para impressionar. — O que é isso? — pergunto baixinho, apenas para Jude ouvir, e ele se vira para mim. — Eles queriam uma festa de Natal, então eu disse que faria uma. — Sorrindo genuinamente pela alegria que está trazendo a essas pessoas, Jude pega o rádio de mim e coloca na mesa antes de começar a montar tudo. Observo por um momento, em choque, a bondade que vem naturalmente dele. — Ella? — Meu nome é dito em um questionamento por trás de mim e lágrimas surgem em meus olhos com o som da voz. Viro para ver a mãe de Jude sorrindo para mim. — Meu Deus, olhe para você. — Estende os braços para mim, que dou um passo a frente. Ela me segura apertado, beija minha bochecha e sussurra em meu ouvido. — Sinto muito pelo que te pedimos. Agora, pelo menos, neste momento, quando precisei dela, ela se lembra, não só de mim, mas de tudo. Sento um pouco com a mãe de Jude, que me pergunta sobre meu trabalho e vida em Londres. Depois de um tempo, ela pausa, ficando em silêncio, antes de perguntar se conheço seu filho e se quero ser apresentada. Empurro o nó que se forma em minha garganta com a realidade de sua condição e como deve ser difícil para Jude ver sua mãe literalmente esquecer quem são as pessoas no meio de uma conversa. Olho para ele, que veste um gorro de Papai Noel e um cinto de lantejoulas, e algo deve revelar que meu momento com Jane se foi. Ele franze o cenho, erguendo um dos cantos da boca no que parece ser um pedido de desculpas ou simpatia. Não sei, mas seja lá o que for, é desnecessário. Essa é a realidade — a montanha-russa dele. Só estou vivendo por um dia. — Tudo bem, seus bagunceiros, vamos mexer essas cadeiras um pouquinho, que tal? — chama, sorrindo, antes de colocar um CD (lembra deles?) e dando play, deixando os tons doces e festivos de Frank Sinatra encherem a sala. Observo com alegria os homens mais velhos estenderem as mãos para pedirem às damas a dançarem. Todos parecem muito felizes e livres, é um amor. Alguns dos menos estáveis do grupo apenas se balançam, aplaudem e cantam junto de suas cadeiras. Que coisa adorável ele fez por eles. As luzes da árvore no canto apagam e acendem, refletindo nos enfeites de ouropel e folhas penduradas do teto. Sorrio, pensando que a casa de repouso provavelmente está acostumada a usar as mesmas decorações há décadas. Lembro-me de quando costumávamos ter correntinhas e guirlandas em casa, quando Natalia e eu éramos pequenas. — Ei — Jude chama, conseguindo minha atenção, e senta ao meu lado. — Oi, mãe — fala com Jane, que se vira para ele. — Jude, meu amor. — Sorri, muito feliz. — Quando você chegou aqui? — Ela se lembra dele. — Seu pai sabe que você voltou? — Ai. Meu coração afunda. — Não, mãe. — Segura a mão dela. — Não o vi. — Vejo quando aperta a mão dele um pouquinho antes de convidá-la para dançar. Seus olhos se acendem e ela solta uma risadinha, mas pega na mão dele, que a guia para a pista de dança improvisada no meio da sala. — Devemos mostrar a eles como se faz, amor? — um homem mais velho diz por trás de mim e me viro para ele, sorrindo. O senhor parece tão elegante com sua camisa e gravata borboleta. — Como posso resistir? — respondo, permitindo que ele lidere. Dançamos, meu parceiro canta junto da música e me faz sorrir. Ele ri e diz que sabe que não consegue cantar bem, mas que ama fazer isso de todo jeito, e digo a ele que sou assim também, antes de acompanhar sua cantoria. — Tudo bem, tudo bem, Jim, já foi o bastante, obrigado — Jude diz, colocando a mão nas costas de Jim e o fazendo rir. — Bobeou, dançou, Doc — responde, piscando, e rio alto. Não esperava uma frase dessas vindo dele. — Minha neta me ensinou isso, eu falei direito? — me pergunta, e eu aceno. — Perfeitamente. — Sorrio. Jim devolve a expressão e dá um passo atrás, levando minha mão à boca para beijar a parte de trás, e eu me derreto. Que homem doce. — Vai lá, Doc. — Passa minha mão para Jude. — Ela é toda sua. Ele me traz para perto e não consigo deixar de desejar que fosse verdade. Jude e eu dançamos juntos as músicas de Natal, rodeados por casais mais velhos e cuidadores que fazem o mesmo. Algumas pessoas estão comendo, outras jogando cartas. Quase todas usam uma coroa que veio no Christmas Cracker. — Acho que você estava certa sobre a árvore — fala, contra minha têmpora, e jogo a cabeça para trás para observá- lo, confusa. — O quê? — indago, sorrindo. — Minha árvore de Natal. Você estava certa. Eu deveria montar. Vou fazer isso hoje à noite. Você me ajuda? Minha garganta se fecha um pouco com a perspectiva de estar completamente sozinha com Jude, em sua casa, onde não tenho nenhum motivo para manter meu autocontrole funcionando. Então percebo que o estou encarando e brigo comigo mesma — ele me pediu para ajudar a decorar a árvore, não para dar uma lap dance. — Bem, sim, faltam dois dias para a véspera do Natal — eu rio —, mas por que não? Jude sorri e beija minha testa. — Não, não, não, nada disso. Tem que ser de verdade — alguém grita, e viramos nossa atenção para Jim, parado com alguns outros residentes e dois cuidadores, todos nos assistindo e sorrindo. — Façam valer a pena — pede, apontando o dedo para cima da cabeça de Jude. Confusos, erguemos as cabeças para olhar. Visco. Jude sorri e volta o olhar para mim. — Vamos lá, um de nós pode morrer a qualquer momento — Jim chama, e deixo sair uma risada de choque, antes que a mão de Jude na minha bochecha traga minha atenção para ele. — Temos que dar às pessoas o que elas querem, né? — Dá de ombros e ergue a sobrancelha. Ficando na ponta dos pés, encontro seus lábios com os meus. O beijo em público é casto; mal pressionamos a boca um no outro, com ele segurando meu corpo junto ao seu. Nada como a respiração pesada e as línguas de ontem, mas, quando penso a respeito, com seu cheiro preenchendo minhas narinas e a sensação de seu corpo pressionado no meu, meu estômago se aperta e meus joelhos enfraquecem. Afasto-me, um coro de celebrações e aplausos surgindo quando todo mundo volta a cuidar dos seus próprios problemas, e dou um passo para longe de Jude, que me olha, preocupado. — Preciso de um minuto — falo, com honestidade, antes de sair da sala, depois sair do prédio e ir para o meu carro. Fico sentada no carro, dentro do estacionamento da casa de repouso, minha mente girando. O que estamos fazendo? O que é isso? Estou muito confusa. Meu estômago está se revirando a semana inteira e meu coração bate tão rápido que pensei que explodiria em mais de uma ocasião. Ele é bonito, gentil e doce, muito bonito e sexy, ainda é divertido, bobo e mais do que qualquer coisa quero que ele seja meu. Mas ele não pode ser, então o que estamos fazendo? Ele acabou de comprar uma casa, aceitou um emprego, está estabilizado e feliz, assim como eu. Tenho um cantinho maravilhoso em Londres, que amo muito. Fui promovida recentemente. Sou bem respeitada entre meus companheiros. Jude e eu estamos com tudo resolvido, então que merda é essa? É apenas nostalgia? Toda essa coisa de diga sim é um jogo que ele está fazendo com minhas emoções, algum tipo de revanche? Conforme penso, minhas mãos agarram o volante. Jude não é assim, sei disso. Diga sim, foi apenas o que ele disse. Era sua tentativa de me presentear ao aprender a amar o Natal de novo, e tive uma semana maravilhosa. Tem sido mágica, de verdade, mas é principalmente porque estou passando tempo com ele. Se ele não vai ser parte de todo Natal, não sei como isso poderia ser assim de novo. Uma batida na janela do meu carro me desperta, e viro para ver Jude me observando, esfregando as mãos por causa do frio. Abro a porta e saio, erguendo o rosto para encontrar seus olhos preocupados. — Desculpa — pede, sem que eu diga nada. — Foi além, essa coisa toda de público. Estou tendo dificuldade de não ser nós, sabe? — Dá de ombros e sorri suavemente, eaceno. Sei exatamente o que ele quer dizer. — É apenas… muito confuso. Não sabia que você estaria aqui, mas você estava. Pensei que me odiaria, mas essa semana tem sido maravilhosa e, em alguns dias, vou voltar para Londres. Estou apenas acabada — admito, e ele joga a cabeça para trás, solta uma risada e agarra meus braços, esfregando. — Está? Você não acabou de descobrir que seus pais pediram ao amor da sua vida para partir seu coração. — Touché. — Olha, se eu te pressionei ou fui rápido demais, peço desculpas, Nel. É apenas nostalgia e antigos sentimentos borbulhando. Não tem pressão nenhuma. — Estou apenas encerrando por dentro. Vá para casa. Te vejo amanhã? Ele abaixa um pouco a cabeça e arregala os olhos para mim. Quero voltar, pelo menos para ajudar com a limpeza e dar tchau para sua mãe, mas preciso de um pouco de espaço para clarear a cabeça. Aceno, me esticando para um abraço, e o deixo saber que estamos bem; em seguida, volto para o meu carro. Coloco o GPS para a casa dos meus pais e passo pela longa entrada da casa de repouso até a pista principal. Por que estou pensando tanto nisso? Sim, ok, há um monte de sentimentos antigos e mal resolvidos entre mim e Jude, mas se olhar para a situação colocando tudo em preto e branco, somos dois adultos de quase trinta anos, claramente atraídos um pelo outro. Não somos adolescentes que se apaixonaram, que sentiram o impacto de cada beijo, preocupados em prevenir gravidez, prestes a serem pegos fazendo alguma coisa que não deveriam. Somos adultos que sabem que sexo pode ser separado de amor, adultos que entendem que você pode ter profundos sentimentos por outra pessoa sem precisar de algo mais. Parando o carro ao lado da entrada fora da casa dos meus pais, desligo o motor, sabendo que não posso ir para casa em Londres sem ficar perto de Jude de novo, sem beijá- lo de novo, sem sentir seu corpo perto ao meu com e, assim espero, se vou ser completamente honesta, sem roupas. Sento no carro, ouvindo músicas natalinas, sozinha — quem sou eu? — e com o aquecedor ligado. Se entrar na casa dos meus pais agora, minha mãe definitivamente estará servindo chá e não conseguirei sair por horas, e minha confiança e determinação estão altas agora. Depois de uns quarenta minutos, o brilho de faróis em meus retrovisores me faz apertar os olhos. Jude estaciona na minha frente, mas logo sai, caminhando para sua casa sem nem olhar para o meu carro e perceber que estou esperando por ele. Saio assim que ele chega à porta da frente e, caminhando em sua direção, chamo: — Você demorou. Ele se vira e me olha. — O que você está fazendo escondida no escuro? — Sua voz soa divertida quando faço meu caminho até ele. — Temos uma árvore para montar, não temos? — Alcanço-o no degrau da frente, sorrindo, e ele faz o mesmo. Parece genuinamente feliz por eu ter escolhido ainda ajudá-lo, em vez de usar o espaço que disse que precisava. Ele se vira, abrindo a porta e nos deixando entrar. Entro na casa de Jude pela primeira vez desde o dia do funeral de seu pai e respiro fundo. Está diferente. Jude decorou e agora parece moderna e nova, em comparação ao estilo de casa de campo que eu estava acostumada, mas igual em várias maneiras também. É um lugar em que passei tantos momentos felizes: onde perdi a virgindade, onde tomei minha primeira bebida alcoólica, onde concordei em partir o coração de Jude ao dizer adeus ao seu pai. Senti tanta tristeza por um momento que um nó se formou na minha garganta. — Vou acender a lareira para começarmos — Jude avisa, me tirando das minhas memórias. Tiro o casaco e penduro em um dos ganchos perto da porta, sentindo o celular vibrar no bolso. Retiro de lá: é Nats. Acabei de te ver entrar na casa de Jude? Minha irmã realmente precisa sair de perto das janelas. Sim. Prometi ajudar a montar a árvore de Natal dele. Respondo, ouvindo um fósforo na sala. Haha te vejo amanhã então! Com sua resposta, franzo o cenho. Não é isso. Tento me defender. — Tudo bem? — Jude coloca a cabeça na porta e sorri para mim, se perguntando por que estou parada no corredor. — Desculpa, estou só mandando mensagem para Nats. — Ergo o telefone por algum motivo e ele acena. — A lareira vai estar crepitando em alguns minutos. Venha sentar, vou pegar algumas bebidas para nós. Entro na sala e levo um momento para olhar em volta, ignorando a vibração em minha mão. A sala parece muito linda. De um lado, há um sofá de veludo azul-marinho, com almofadas amarelo-mostardas; na janela da sacada, há uma poltrona cinza clara. As paredes são claras e há estampas e ornamentos decorando tudo de maneira peculiar. Parece que saiu direto do Pinterest, e eu amei. Lembro que estou ignorando meu telefone e abro a mensagem. Você e Jude, sozinhos na casa dele, depois da semana que tiveram. E, conhecendo vocês dois, com um vinhozinho… te vejo amanhã, Noella. Rolo os olhos com a mensagem da minha irmã. Não é isso que estamos fazendo; estamos apenas decorando a árvore, provavelmente tomando um café e conversando antes de eu voltar para casa para comer uma torrada e dividir a cama com minha sobrinha. Por mais que eu queira mais, não é isso. Somos nós, seguindo em frente para mais, sem saltar direto nisso. — Então, estou sem vinho tinto, mas tenho o branco, ou cerveja. — Jude vem da cozinha com duas taças de vinho e uma garrafa de vinho branco nas mãos. Ah! — Pode ser esse mesmo — respondo, sentando-me no chão em frente ao fogo crescente, aproveitando a sensação do tapete grosso e macio debaixo de mim. Jude apoia as taças e o vinho na mesa, me serve uma e sai da sala de novo. Ele volta com uma tábua de carnes cozidas, azeitonas, queijos e pão. Parece incrível e subitamente percebo que estou com bastante fome. Olho para o telefone. Já passou das seis e não comi desde a torrada de hoje de manhã. Não pensei nisso o dia inteiro. — Então, não sei o que tem na caixa — avisa, se juntando a mim no tapete. — É uma mistura das antigas decorações da minha mãe e um pouco do que comprei aqui e ali. Não tinha pensado muito nisso, já que planejava ficar fora de novo. Seu olhar sai da caixa marcada como “NATAL” no canto da sala para mim, que sorrio. — Por que não? — indaguei, pegando um pouco de ciabatta, colocando tomate seco e salame por cima. Jude olha para longe de novo. — O hospital precisava de gente e Tali me disse que você vinha para casa esse ano, então cancelei minhas folgas. Suas palavras me cortaram como uma faca, mas eu entendo, ele já me disse que me evitava loucamente por todos esses anos. Só era difícil saber que ainda estava fazendo isso tão recentemente, especialmente depois de como me senti próxima a ele essa semana. — Então meu pai egoísta fica doente e estraga tudo. — Tento aliviar o clima e ele se vira para mim. — Bem, estou feliz por isso — afirma, e arregalo os olhos e solto uma risada chocada. — Quero dizer, não estou feliz por isso, mas aproveitei muito a sua companhia essa semana. Esqueci como era ter você por perto. Olho em seus olhos por um momento, a luz do fogo refletindo neles, os fazendo brilhar como joias em uma sala bastante escura. Quero beijá-lo. Estou lutando contra a necessidade quando percebo seu lábio traçando o lábio inferior, e respiro fundo, me estabilizando. Jogo uma azeitona no ar e abro a boca para pegar — um dos meus talentos. — Certo, vamos lá, levanta. — Fico de pé e estendo a mão para Jude. — Temos que montar uma árvore. — Não, não coloque lá. Coloque mais para cima — sugiro, enquanto Jude tenta pendurar duas decorações de renas em galhos ao lado uma da outra. — Como seu talento para design de interiores pode ser tão lindo, mas não conseguir decorar uma árvore de jeito nenhum? — pergunto, e ele ri alto. — Sua grossa. Acho que nunca fiz isso de verdade antes — comenta, e eu congelo, um pingente de gelo na mão, virando para ele, atordoada. — Assim, quando criança, eu costumava ajudar, mas, depois de adulto, sempre comemorei o Natal em qualquer lugar menos em casa. — Dá de ombros, e me sinto culpada porque é minha culpa.— Peço desculpas, Jude, se estraguei as coisas para você porque estava me evitando. — Viro para ele, que faz o mesmo, se esticando para segurar meus braços. — Não, não é culpa sua. Tive alguns Natais incríveis, não só aqui ou em casa em Edimburgo, mas também porque fui para outros lugares: Tailândia, Austrália, Japão. Alguns lugares maravilhosos. Escolhi estar em outro lugar, porque não queria te ver, mas não significa que perdi a data ou tive experiências ruins. Sou grato por todas elas. — Ele sorri e eu aceno, virando para colocar o gelo na árvore. — Precisa de uma ajudinha aí, baixinha? — questiona, sarcástico, quando me estico para pendurar um floco de neve na posição perfeita no topo da árvore. — Não, eu consigo, obrigada — respondo, teimosa, esticando o braço o máximo que posso. Casas antigas têm tetos altos e tetos altos precisam de árvores de Natal altas, mas sou sessenta centímetros mais baixa do que preciso para essa específica. — Fala sério. — Jude apoia a mão na base da minha coluna e, graças ao meu alongamento, que levantou meu suéter, seu toque na pele exposta e sensível é eletrizante. Ele estica a outra mão para cima, acariciando meu antebraço, depois meu pulso e então minha mão. — Me deixa ajudar. — Sua voz é suave, mais baixa, e o contato de suas mãos em minha pele está fazendo meu coração bater mais rápido. Ele se vira para me olhar nos olhos e movo meu olhar para o seu, sem conseguir lutar mais. — Jude — digo seu nome, como muitas coisas: permissão para agir, implorando que ele o faça, questionando tudo que está acontecendo entre nós, e ele responde tudo. Usando a mão em minhas costas, Jude me traz para perto de si, a outra move minha mão para o seu pescoço, e o trago para encontrar meu beijo. Respiro fundo contra os seus lábios, ele me puxa para perto e seu corpo duro se pressiona contra o meu. Ofego quando sua língua encontra a minha e gentilmente rola por ela, antes de mover os beijos pela minha mandíbula e pescoço, até voltar para minha boca. Passo os dedos em seu peito, tentando encontrar os botões de seu suéter e, de alguma maneira, livrá-lo da barreira entre nós, mas me frustro quando não há nenhum. Rosno de leve quando sua língua encontra a minha outra vez. Gemo, involuntariamente, com as sensações que perpassam todo meu corpo. As mãos de Jude vagam por baixo do meu suéter, pelas laterais e as costas, me trazendo o mais perto que consegue, então pressiona a testa na minha e fala, sem ar: — Você quer isso? — indaga, e aceno. — Diga, Nel — implora, a ponta do nariz roçando o meu. — Eu quero isso — respondo, me inclinando para pressionar a boca na sua mais uma vez. Sem outra palavra, Jude me segura, ainda me beijando, e me leva para o andar de cima. Mais do que qualquer outro momento durante esta linda semana, estou muito pronta para dizer sim. Jude ergue meu suéter e levanto os braços para ele retirar. Tirando o seu, desfaço o botão do meu jeans e me mexo, passando pelos meus quadris e bunda. Ele sorri, então assume, guiando pelo resto do caminho, antes de descartar o dele no chão e sair de dentro, vindo até mim. Ele me leva de volta para cama e me encoraja a deitar. Olho seu corpo conforme ele retira a boxer, e estou feita. Não consigo mesmo acreditar que isso está acontecendo. Jude se posiciona sobre mim e apenas me observa por um momento. Não acho que ele consegue acreditar também. Abaixa e me beija, subindo os dedos por meu braço, descendo pelo lado e ao longo da renda entre minhas pernas, me fazendo ofegar em sua boca, arrancando uma risada baixa e lenta dele. Ele afaga de novo, com um pouco mais de pressão dessa vez, e beija meu ombro. Estremeço quando arrepios sobem por minha pele. — Hm, gostei disso — murmura, traçando o dedo sobre os pelos erguidos, fazendo mais aparecerem e me arrancando risadas. Jude abaixa os lábios na minha clavícula e passa a língua pela minha pele sensível; as risadas desaparecem rapidamente, sendo substituídas por puro desejo descontrolado por mais, por tudo que ele tem a me dar. Movo os quadris contra ele, que se mexe e se aloja entre minhas coxas, um formigamento de ansiedade surgindo quando seus beijos descem pelos meus seios, minhas costelas e ao meu lado. Gentilmente abaixa minha calcinha no caminho. Ergo as pernas e ele tira a renda antes de abaixar minhas pernas com cuidado, abrindo. Ofego, jogando a cabeça para trás, quando ele se move mais para baixo, sua boca me encontrando bem onde quero que ele esteja. O contato me faz suspirar. — Jude, eu, ah. — Estou incoerente, o prazer começando a assumir cada célula do meu corpo. Sinto-me apertar seus dedos, que agora lentamente se movem dentro de mim, e não consigo evitar me empurrar para baixo com as sensações que me dominam. Jude beija meu estômago, meus seios, minha clavícula e meu pescoço, e retorna para cima em meu corpo, se acomodando em cima de mim e se posicionando em minha entrada. Ele me beija, a sensação de seu corpo sobre o meu me deixa louca, meus sentimentos por ele mais fortes do que nunca. — Fique — pede, a voz baixa e rouca. — Fique comigo esta noite. Aceno em resposta, sem nem pensar duas vezes, e ele entra em meu corpo. Jogo a cabeça para trás com a sensação. Minha respiração fica presa na garganta enquanto ele me penetra e a sensação de seu corpo sobre o meu de novo faz meus sentidos chegarem ao limite. Minha pele formiga, meu pé queima e sinto emoção bem dentro de mim, prazer puro e autêntico toma cada parte do meu corpo. Envolvo as pernas em seu quadril, afundando os dedos em suas costas e omoplatas, cravando as unhas em sua pele, e ele move o corpo contra o meu. Jude me olha nos olhos ao começar a se mover mais rápido. Respiro com força e mordo o lábio para evitar gritar. — Jude — suspiro seu nome, o deixando saber que vou gozar, e ele sorri antes de abaixar os lábios nos meus, engolindo meus gemidos ao me penetrar, respirando com dificuldade e gozando comigo. Jude desacelera e para dentro de mim quando uso os braços para mantê-lo próximo do meu corpo ao estremecer e voltar para a Terra. Ele levanta a cabeça para me olhar, sorrindo, e rolo os olhos, mordendo o lábio. Ele solta uma risadinha, que não ouço há tanto tempo que faz meu estômago girar. É a risada que ele soltava sempre que me deixava excitada; quero dizer, realmente excitada. É uma risada de vitória, orgulho, puro prazer pela situação, e eu amava. — Isso foi uma surpresa — Jude comenta em meu pescoço, segurando meu corpo nu contra o seu, minhas costas pressionadas em seu peito. — Foi mesmo? — Rio. Podíamos não ter percebido, mas, se formos honestos, estávamos caminhando para isso desde que nossos olhares se encontraram naquela sala de espera. — Sim, beijar é uma coisa, mas eu não estava esperando mais do que isso. — Mentiroso. — Me fala do seu flat — pede, nós dois deitados lado a lado, os dedos entrelaçados. Eu me afasto, sentando, e viro para ele, chocada. — É um loft, para sua informação. — Arregalo os olhos para ele, que ri, se colocando sentado. Não consigo evitar que meus olhos pairem em seu torso. — Como você consegue ficar assim? — Suspiro. — O quê? — Ele ri, e me mexo para montar em seu colo. — Sério, como você tem tempo para esse corpo? — Passo os dedos por seu abdômen e ele sorri, agarrando meus quadris. Não me entenda mal, ele não é daqueles com bíceps e peitorais enormes, maiores que meus seios, mas é magro, definido e atlético. — Eu malho sempre que tenho oportunidade. — Move os quadris debaixo dos meus, e sorrio. — Sou solteiro. Moro sozinho, então, quando não estou no trabalho, vendo minha mãe ou dormindo, vou à academia. — Eu também. — Levo a mão ao meu peito nu. — Mas ainda pareço a irmã mais nova do bonequinho da Michelin. — Olho para minha barriga. Balança quando eu pulo e meu tamanho de calça é maior que o de camisa, mas eu malho regularmente e me alimento bem. Gosto do meu corpo. Amo minhas curvas, mas, comparadas à perfeição abaixo de mim, me sinto um peixe-boi. — Está brincando? — Jude ri, sentando direito e pressionandonossos peitos nus. — Seu corpo é perfeito. Você nunca esteve tão sexy. — Inclina a cabeça para a minha, e pressiono os lábios nos dele. — Mas você devia usar mais seus óculos. — Dá um largo sorriso, e eu rio sozinha. Ele deita de novo, apertando meus quadris um pouquinho e me fazendo rolar contra ele. — Na verdade, eu faço triatlo. Arregalo os olhos, meus dedos começando a traçar a definição em seu torso. Ele sorri. — Sim, eu faço dois ou três eventos por ano. Treino o ano todo, mas relaxo quando não estou competindo. — Há quanto tempo você faz isso? — questiono. Jude, o meu Jude, não era atlético. Jogou futebol na escola e era bom na corrida, mas só quando tinha que fazer. Não consigo imaginá-lo fazendo isso por diversão. — Há uns dez anos — responde, levemente segurando meus pulsos e acariciando meus antebraços com os polegares. Meus olhos encontram os seus. — Tive dificuldades ao perder o papai e você, e precisava de uma distração. Meu colega de quarto na faculdade começou a treinar e vi como ele estava focado, então me juntei a ele e amei. Fiquei viciado. Deixei suas palavras afundarem e olho para os polegares que agora desenham círculos na minha barriga macia. Tento ignorar a preocupação crescente de que alguém tão focado em ser fitness pode não querer uma gordinha amante de Doritos em sua vida a longo prazo. Realmente tento cuidar de mim mesma, mas gosto de vinho e guloseimas; gosto com mais frequência do que gostaria de admitir. — Que horas são? — pergunto, mudando de assunto antes de me sentir tão autoconsciente a ponto de mergulhar debaixo das cobertas e ir vestida nelas para casa. Observo seu corpo ao se virar para pegar o telefone. — Dez para as dez — fala, deixando de novo e segurando meus quadris. — Certo, preciso de um banho e comecei a sentir fome do nada. — Desço, levando a coberta comigo e me enrolando nela. Ele sorri, tão danadinho que faz meu estômago se apertar, e puxa a coberta. — Não se esconda de mim, Nel. Você é perfeita. Fico de pé, começando a sentir confiança com minha nudez com esse homem que confio implicitamente e graças ao seu elogio de alguns momentos atrás. Ele se levanta e usa as mãos em meus quadris para virar meu corpo para longe dele, em direção à porta, então beija meu pescoço e fala em meu ouvido. — Não posso te deixar tomar banho sozinha. — Sua voz está baixa e cheia de promessas. — Você pode cair e se machucar. Bem, isso era exatamente o que eu queria ouvir. Sorrio e me estico para pegar sua mão, o levando para fora do quarto em direção ao banheiro. — Isso não é justo — Jude diz, seus olhos percorrendo todo meu corpo quando entro na cozinha usando sua camisa e meias, depois de secar o cabelo com a toalha e enrolar em cima da cabeça. Ah, e de óculos. — Você não parece real. Ele começa a se mover para mim, as mãos estendidas, mas o afasto. — Comporte-se. Preciso comer. — Sorrio e passo ao seu lado para dentro do cômodo, me erguendo para sentar na bancada. Ele também sorri para mim. — Do que a dama gostaria? — pergunta, usando as mãos nas minhas coxas para afastá-las e se colocar no meio delas. — Você ainda faz panquecas incríveis? — devolvo, um sorriso largo. Jude ri. — Já são mais de onze da noite, Noella. — Mas é Natal. — Faço biquinho, e ele puxa meu lábio inferior com o dente. — Qualquer coisa por você. O jeito como ele diz aquelas palavras ao virar para pegar ovos gira meu estômago de uma forma que não tenho certeza de como deveria estar me sentindo. Jude e eu não temos sido nós há um tempo, mas, hoje, parece que voltamos a ser de novo. Ainda não tivemos aquela conversa e alguns dias, depois de mais de uma década separados, certamente não podemos voltar para aquele lugar simplesmente, podemos? Observo-o medir leite e farinha e começar a mexer, cantando a música que ligou momentos atrás, e me sinto contente, mais do que já me senti em um bom tempo. A sensação é boa. O vinho, a estação, a nostalgia. Tento dizer a mim mesma, mas o assisto fazer panquecas quase à meia noite para mim e sei que é mais que isso. Eu quero mais. Só não sei se ele sente o mesmo. Em todo caso, isso é ridículo. Vivemos vidas separadas, a quilômetros de distância um do outro. Aceite o que isso é, Noella, digo a mim mesma. Apenas aproveite, não há nada de errado com isso. — Então você odeia o Natal? — Rola os olhos de brincadeira, nós dois sentados em frente ao fogo, comendo a montanha de panquecas e morangos que ele preparou. — Mas não brinca quando tem que montar uma árvore. Você não tem que colocar tudo que está na caixa na árvore, sabe? — Ele sorri para minha obra-prima. — Você conhece a minha mãe, né? — Sigo seu olhar para a árvore. — Quanto mais, melhor, quando se trata de Natal. Jude ri, mas acena. Ele sabe que Sue Frost adora uma bugiganga. — Obrigado por concordar em ficar. — Ele sorri quando coloco um morango inteiro na boca, faceiro. — Teria amado sua companhia, mesmo se fosse apenas isso… — Acena para o entorno: as panquecas, o fogo, o tapete. — Mas a noite de hoje tem sido absolutamente incrível. Não digo nada, parcialmente porque minha boca ainda está cheia de morangos, parcialmente porque não há nada concreto a ser dito. Engulo a fruta na boca e sorrio, antes de colocar o prato de panquecas de lado e rastejar para frente. Jude coloca o copo de água de lado assim que subo em seu colo, passando as pernas ao seu redor, abaixando a boca na sua. “Incrível” não chega nem perto. — É só andar até lá, eles sabem onde você estava — Jude fala, comigo tendo o rosto pressionado ao seu peito. — Sim, e obviamente sabem o que estávamos fazendo, não quero encarar todo mundo. Não quero entrar na casa dos meus pais, na hora do café da manhã, e encarar toda minha família depois de ter passado a noite na casa de Jude, mas tenho. — Devo ir com você? — pergunta, e o empurro, me afastando. — Meu Deus, não. Já vai ser bem ruim desse jeito — admito, sorrindo, e ele concorda. — Sabe, vou dizer para minha mãe que você não vai trabalhar hoje, então você definitivamente será convidado para o almoço. — Dou um passo atrás para a porta, um sorriso largo, e ele dá de ombros. — Já fui — comenta, indiferente, e olho de volta para ele. — Sue me convida todo domingo e, se não estiver trabalhando, eu vou. Ela é uma cozinheira malvada. Fico de pé, olhando para ele. — Você almoça com a minha família? — questiono, e ele acena brevemente, logo parecendo um pouco preocupado. — Isso é um problema? — indaga, deitando a cabeça. — Não. — Balanço a minha, negando. — Não, é bom. — Sorrio. Ele me puxa de volta para si, beijando meus lábios rapidamente antes de eu dar um passo atrás. — Certo, vou fazer isso. — Viro, abro a porta e passo pelo jardim de Jude para a casa dos meus pais. — Elly — Poppy chama, alegre, quando entro na cozinha, e a pego no colo. Ela segura meu rosto nas mãos e o vira até poder me olhar nos olhos. — Onde você estava? — Tia Elly fez uma festa do pijama com Jude — Natalia brinca, arrogante, me dando um sorrisinho da mesa do café da manhã. Olho para ela, ignorando o calor que sobe pelo meu pescoço e bochechas. Encaro minha sobrinha, torcendo para evitar qualquer olhar, suspiro, comentário ou qualquer outra coisa quando a boca de Poppy forma um biquinho que vale uma foto no Instagram e sua testa se franze. — Você não me levou! — cospe, furiosa. Dick engasga com o café ao lutar para segurar uma risada e dou uma olhada para ele com um aviso: não. — Espero que saiba o que está fazendo — minha mãe fala, baixinho, passando por mim por trás e coloca um bule de chá na mesa, vapor saindo do bico. — Todos vocês, parem. Pops, desculpa, você já tinha dormido — explico e ela franze o cenho, depois aperta os braços ao redor do meu pescoço. — Você e Jude são meus melhores amigos — sussurra em meu ouvido e meu coração se parte. Deixo um beijo na lateral da sua cabeça e a aperto com força. — Vou subir um pouquinho — aviso, colocando Poppy no chão, desesperada para escapar do escrutínio. — Sim, aposto que você está exausta — Dick comenta sobre suaxícara de café e pego o que está mais perto de mim, um pano de prato, e jogo nele. Atinge seu rosto, e ele ri. A sorte dele é que não era um prato. Lá em cima, caio na cama, estendendo a mão para tirar o unicórnio sobre o qual pousei. Jude e eu transamos, transamos muito. Lembro-me da primeira vez como se fosse ontem. Fiz a mesma coisa — deitei na minha cama, nesse mesmo quarto, encarando o teto com um sorriso idiota no rosto. Ele ainda é sexy, um tipo diferente, mas ainda assim sexy. É muito mais suave agora do que era, obviamente aprimorou suas habilidades ao longo dos anos. Sempre foi bom o suficiente para mim, sempre me levou aonde eu precisava, sempre me excitou, me fez rir, sorrir, e me sentir quente e confusa por dentro. Isso não mudou. Ele ainda é Jude. Ainda é lindo, gentil, um baita gostoso; ainda é tudo que alguém poderia querer em um homem. Tudo que eu quero. Há uma batida na porta. — Entre — digo, em resposta, e Natalia abre a porta. Apoio-me nos cotovelos e olho para ela, o rosto sério. Ela ri. — Ah, cale a boca — fala, e inclino a cabeça, esperando uma resposta que sei que não vou receber. — Você vai me contar tudo ou não? Não consigo evitar o sorriso que se espalha em meu rosto. Ela entra no quarto e sobe na cama comigo. Depois de passar por cada detalhe com Natalia e a observar segurar a barriga em várias ocasiões quando as coisas ficam empolgantes, fazendo meus nervos se contraírem, digo a ela que realmente estou exausta e ela desce as escadas para me deixar tirar um cochilo, eu acho. Na verdade, não tenho ideia do que ela fez, porque, assim que minha cabeça tocou no travesseiro, eu apaguei. Acordo no início da tarde, o cheiro do chilli da minha mãe circulando pela casa. O único domingo do ano inteiro que ela não faz um jantar assado completo é naquele que cai antes do Natal, a menos que o Natal seja no sábado, claro, porque aí é tempo demais. Mas este Natal cai em uma terça-feira então hoje temos chilli e mal posso esperar. Jude estava certo. Sue é uma cozinheira malvada. — Oi, família — chamo, de forma dramática, ao entrar na sala e ver todos eles enchendo o sofá e assistindo O Grinch na TV. — Elly — Poppy grita e corre para abraçar minhas pernas. — Venha sentar comigo. — Ela pega minha mão e começa a me levar para o centro da sala, bem de frente para a TV, quando ouço uma batida na porta. Quando abro, não consigo evitar o grande sorriso com a visão do homem cuja cama dividi na noite passada. Ele olha timidamente para trás de mim, e eu rio. — Seu pai vai me matar? — pergunta, baixo, e me estico para frente, segurando sua mão. — Tenho certeza de que minha família prefere você do que eu. Você está de boa. Sorrio para ele e nossos olhos se encontram. Depois de espiar rapidinho por trás de mim para conferir se estamos seguros, o puxo para um beijo. — Solte-o — Dick fala, sarcástico, por trás de mim, despertando a mim e Jude de nosso momento. Ele entra na cozinha e juro que o vi sorrindo. — Vamos, vamos pegar algo para você beber. Jude me segue para a cozinha, onde cumprimenta Dick calorosamente. Quando meu cunhado e Nats começaram a sair, Jude e eu já estávamos juntos, então ele o conhece há tanto tempo quanto eu. — Temos que ter uma conversa sobre suas intenções com minha irmãzinha, doutor McDonagh? — Dick indaga, se apoiando na bancada da cozinha, tentando parecer intimidante, e rolo os olhos, antes de bater em seu ombro com o pano de prato em minhas mãos. Entrego a Jude uma garrafa de cerveja. — Só as melhores intenções aqui, Dick, você me conhece. — Jude sorri e toma um gole de cerveja. Dick se endireita. — Bem, então — vira para mim —, temos que ter uma conversa sobre suas intenções com o bom doutor, mocinha? Rio, rolando os olhos. — Ah, cala a boca. Aceno para a porta e meu cunhado, e meu Jude, me seguem para a sala. Toda a família recebe Jude com entusiasmo e o vejo evitar contato visual direto com meu pai antes de sentar no espaço que Pops deixa para ele no chão. Minha família é muito brilhante nisso. Eles nunca deixam ninguém se sentir desconfortável. Mesmo meu ex, que nenhum deles gostava, sempre se sentiu bem-vindo, mas Jude, e Dick, tem sido parte de nós desde o primeiro dia. Jude era uma história diferente, porque eles sempre o conheceram; porém, houve algumas conversas assim que nosso status de relacionamento mudou, mas eles o amavam, sempre confiaram nele, que sempre foi da família. Dick é dois anos mais velho que Natalia e me lembro claramente da noite em que ela o trouxe para casa e o apresentou a todos nós. Não tinha falado para os meus pais que ele era negro, porque sabia que não importava, mas a preocupação dele de que isso pudesse ser um problema era evidente. Isso para não mencionar que, por ter crescido no sistema, ele não entendia bem nossa dinâmica familiar. Apenas assumiu que seria rejeitado e estava pisando em ovos e esperando que o machado caísse. O que nunca aconteceu, tudo que meus pais queriam era o sorriso no rosto de Natalia, e aquele sorriso nunca se desfez. Meus pais apoiaram Nats e Dick, e Jude e eu, desde o primeiro dia, porque, quando eles ficaram juntos, não foi fácil. A família dela sempre teve tanta certeza de que ela se casaria com o filho de uma família amiga, até ele se convenceu, apesar de ela nunca ter concordado com isso. Quando conheceu meu pai e se apaixonou bem rápido, eles não ficaram nada felizes. Proibiram que ela o visse. Pensavam que ele era sinônimo de problemas, porque tocava guitarra e passava gel no cabelo. Ela nunca disse a eles, mas isso era o que ela mais gostava. Ela começou a fugir pela janela para vê-lo e, antes que percebesse, tinha uma pequena Natalia na barriga. Apesar de não gostarem dele, seus pais insistiram que se casassem de imediato. Eles o fizeram, com alegria, porque estavam apaixonados. Ainda estão. Quando tiveram Nats, e eu, juraram que nunca colocariam expectativas em suas meninas. Ensinariam o que era certo e errado, como serem gentis, corajosas e fortes, e eles confiariam em nossas escolhas, mesmo que sentissem que eram erradas e, é claro, nos apoiariam se as coisas desmoronassem. — O jantar está pronto — mamãe grita, chamando minha atenção, e eu pulo, empurrando Dick pelo caminho e correndo para a cozinha para poder tirar primeiro. Ouço as vaias e risadas da família que deixei para trás e sorrio, vitoriosa, ao chegar à mesa e pegar um prato. — Bobeou, dançou. — Sorrio quando Dick pega o prato ao lado e fecha a cara para mim. — Crianças — Natalia resmunga e senta. Jude sorri por trás dela, entrando com o papai na cozinha. — Vocês nunca mudam — comenta, divertido, sentando ao lado de Natalia. Poppy imediatamente sobe no colo dele. Jude nem pisca, passando um prato para ela e pegando um para si. — Não posso, porque, se eu mudar, ele vai comer tudo antes que eu consiga sequer olhar, e você não vai gostar de mim quando estou com fome. Jude me encara diretamente e o mundo ao nosso redor parece desmoronar quando sorri para mim. — Você está sempre com fome, Noella, ou esqueceu que me pediu panquecas meia noite? Natalia tosse bem alto, minha mãe olha de Jude para mim e vejo quando o entendimento se espalha em seu rosto de que, como eu, ele claramente esqueceu onde estava por um momento. — Que estranho — papai fala, indiferente, e Dick, seguido por todos os outros, ri. Estico a perna por baixo da mesa e esfrego o pé contra o tornozelo de Jude, tentando tranquilizá-lo. Ele morde um pedaço de pão de alho e engole em seco. — Vou te ver amanhã? — pergunto entre os beijos de Jude, na porta de casa. — Claro, é véspera de Natal. — Sorri e me beija de novo. — Além disso, temos a grande apresentação de Poppy. — Você vem? Jogo a cabeça para trás para olhar para ele, que ri. — Acha mesmo que ela me deixaria ficar de fora dessa? — indaga e eu aceno, sorrindo. — Estou no trabalho até três horas, então, desde que não apareça nenhuma grande emergência, devo voltar às quatro, de banho tomado, vestido e pronto para sair às cinco. Mas, se eu não estiver aqui fora quandovocês forem para a igreja, guarde um lugar para mim, não estarei muito longe. É bobagem. Não discutimos o que é isso, mas, parada aqui, fazendo planos como se fôssemos um casal de novo, me sinto muito normal. Sinto muito amor. Sorrio e me estico na ponta dos pés para beijá-lo de novo. — Vai dormir um pouco — sugiro contra seus lábios, e ele rosna. — Preferia que você ficasse lá em casa de novo e eu não dormisse nada. Rio. — Você tem vidas para salvar, doutor, não serei responsável por você amputar a perna errada ou algo assim. Ele ri e se afasta. — Sabe que não sou cirurgião, né? — Sorri para mim, que dou de ombros. — Ah, dá no mesmo para mim, Doc. Vai dormir. Te vejo amanhã. Volto para dentro a tempo de ver Natalia e Poppy subindo as escadas. Beijo minha sobrinha mais uma vez e entro na cozinha. — Café? — Dick pergunta e eu aceno, sentando. Ele serve duas xícaras e se junta a mim na mesa. Meus pais estão cochilando no sofá da sala. — O que está rolando lá? — indaga, acenando para a porta por onde Jude acabou de passar. Encaro aquela direção por um momento. — Não sei, de verdade. — Tomo um gole de café. — Bem, eu gosto bastante dele, você sabe. Não quero ver nenhum dos dois machucados e não quero nunca ter que quebrar as pernas dele. Sorrio, e Dick toma um gole de sua bebida, me observando por cima da xícara, então a coloca na mesa. Estico a mão para as dele. — Obrigada por nunca ter me feito quebrar as suas. Ele sorri e aperta minhas mãos. — Nunca, eu sou o marido perfeito, você sabe disso. Mas sério, Ebs, você precisa entender o que é isso antes que os dois se envolvam em algo que nenhum de vocês está em posição de querer. Sei da vida que você tem em Londres melhor do que todo mundo aqui. Já vi e experimentei com você. Se não está pronta para nada daquilo mudar, porque vai, de um jeito ou de outro se prosseguirem com o que está acontecendo aqui, então precisa deixar claro que você não está interessada nisso. Solto suas mãos e tomo outro gole, meu telefone vibrando na mesa ao meu lado. Boa noite, Nel faminta, vou te fazer panquecas à meia-noite quando quiser bjs — Não estou tentando me meter, Ebs, só quero que vocês dois saibam o que estão fazendo. Sorrio para Dick, que fica de pé, dando a volta para o meu lado da mesa, e beija o topo da minha cabeça antes de subir a escada para a hora da história com sua família. Clico em responder. Então paro. Não sei o que dizer. — Elly. — Ouço Poppy sussurrar perto do meu ouvido, mas mantenho os olhos fechados. — Elly, acorde — chama um pouco mais alto e abro um dos olhos, a fazendo rir. — Por que você acordou tão cedo, Pops? — resmungo. — Porque o Papai Noel vem aqui hoje — sussurra, e abro os dois olhos para ver a mágica e a alegria absoluta em seu rosto. É contagiosa. Sorrio e a agarro, a trazendo para mim em um abraço, me sentindo muito animada pela visita do grandão. O negócio é que, neste Natal, Poppy, com três anos e meio, está mais ciente de tudo do que antes. No ano passado, ela sabia da data, conseguia identificar o Papai Noel em fotos, mas não sabia o que significava, não de verdade, e ainda estava um pouquinho sobrecarregada com tudo. Agora, está tão empolgada e feliz, totalmente envolvida na magia da estação. — Devemos descer para ver o que temos para o café da manhã? — pergunto, subitamente percebendo que estou com muita fome, e ela pula, gira e joga os braços para o lado dramaticamente. Sufoco uma risada. — Quero chocolate e salsichas — declara, e eu aceno, tirando o edredom de cima e pulando. — Bem, então ok. — É Natal, afinal de contas. — Onde está a mamãe? — Poppy pergunta à minha mãe quando entramos na cozinha. — Mamãe está tomando banho, Pops — responde, erguendo a menina para se sentar na bancada e dando um beijo nela. Depois de um olhar conhecedor para minha mãe, subo as escadas. Bato na porta do banheiro. — Quem é? — Sou eu, Nats, posso entrar? — respondo. — Sim. Abro a porta e vejo Natalia sentada de pernas cruzadas na banheira no canto. — Está sentindo contrações? — pergunto, preocupada. — Não, não seja boba. São apenas falsas contrações, Braxton Hicks. Só pensei que um banho de banheira ajudaria. — Ela respira fundo e sento ao lado da banheira, começando a derramar água morna em suas costas. — Natalia, se você está tendo contrações, precisa nos dizer para chamarmos a parteira. Sua bolsa estourou? — pressiono. — Ella, estou bem, sério. Vou descer em breve. Só preciso de um minuto. Apoio a mão em suas costas por um momento e aceito que, por mais que sinta que seu trabalho de parto já tenha começado, preciso seguir seu direcionamento, pela maior parte do tempo. Pego o telefone do bolso do roupão e mando mensagem para Dick: Acho que o bebê está chegando, mas ela não quer deixar. Não trabalhe até depois do necessário hoje. Dick não pressiona por respostas. Ele sabe tão bem quanto eu que Natalia gosta de controlar situações pelo tempo que consegue, mas não vai arriscar a si mesma ou ao bebê. Valeu, Ebs. Volto assim que puder. Tomamos o café da manhã, com Natalia esmagando minha mão algumas vezes, respirando fundo, e preciso de todo meu esforço para não ir contra as palavras dela e chamar a parteira. Sei o que ela está fazendo; ela não quer perder a apresentação de Poppy hoje mais tarde, mas, se estiver em trabalho de parto, não há muito que ela possa fazer para parar. — Então, Pops, pronta para o seu grande momento? — meu pai pergunta, a levando para sentar no colo dele, e a menina abre um sorriso. — Claro, vovô. Ele devolve o sorriso, claramente orgulhoso dela, e eu faço o mesmo, grata por estar aqui, grata por ele estar aqui. Ouço um carro fechar a porta na frente de casa e, assumindo que é Dick voltando do trabalho bem mais cedo do que o esperado, levanto para recebê-lo e dizer como Nats está a manhã inteira. Abro a porta, mas, em vez do meu cunhado andando até mim, vejo uma mulher indo até a porta de Jude. Uma mulher atraente, da minha idade, que eu reconheço. Vou até a escada e meu movimento deve chamar a atenção dela, que me encara. — Ella, é você? — Carly Barnett, minha amiga de ensino médio, a garota cuja festa em casa foi o ponto inicial do meu relacionamento com Jude, está andando em direção à porta da frente dele. Ela é bonita, seu cabelo cacheado está solto, seus lábios vermelhos estão perfeitamente pintados e ela está elegante em seu jeans e bota de salto alto, com um casaco vermelho amarrado para acentuar sua cintura fina. — Ei, Carly. — Sorrio e aceno. — Hm, acho que ele está no trabalho. — Aponto para a casa de Jude e ela vira o rosto para olhar, então franze o cenho. — Ah, que pena. — Ela se volta para mim. — Desculpe, Ella. — Torce o nariz. — Sei que vocês costumavam ter um lance. — Um lance? O quê? Um lance tipo o amor da sua vida, épico, um em um milhão? — Provavelmente é um pouco estranho para você me ver aqui. — Ela me encara com, espera, isso é pena nos olhos dela? O que está acontecendo aqui? — Desculpa, Carly, não faço ideia a que você está se referindo. — Meu coração bate forte no peito, me perguntando o que ela dirá em breve. — Ah, imaginei que você sabia, desculpa. É só que Jude e eu temos… um lancezinho acontecendo, quando volto para casa, claro. Não consigo falar. Preciso falar. Quero dizer algo — quero detalhes, quero dar detalhes a ela do lance que tivemos há algumas noites, mas é apenas ciúme bobo. Espera, estou com ciúmes… ele não é meu para eu ter ciúmes. — Ah, entendi. — Aceno, tentando parecer inabalável com sua confissão. — Ah, foi bom te ver, Carly. Dou as costas e volto para dentro da casa, fechando a porta e tentando acalmar minha respiração. Jude tem um lance. Não importa com quem é — é um lance. E ele não é meu. — Okay, Poppy Eloise. Vamos colocar a mão na massa. — Ajudo uma estrelinha empolgada a vestir o casaco, com Dick tentando baixinho convencer Natalia a ficar em casa e chamar a parteira. — Estou bem. — Ouço seu sussurro. — Vamos ficar fora por uma hora e meia, duas no máximo. Estou bem, de verdade. — Coloco osprotetores de ouvido em Poppy e dou um toquinho em seu nariz, vendo Nats beijar Dick e olhar em seus olhos para acalmá-lo; agora, se ela também pudesse acalmar o resto de nós. Ela não está em completo trabalho de parto. As pontadas que sentiu ao longo do dia a faziam ofegar, grunhir e agarrar a coisa mais próxima de si, mas não eram impossíveis de lidar. Ela não gemeu, gritou e, pela que me disse, sua bolsa não estourou; mas estou quase certa de que seu trabalho de parto começou. Ainda está cedo, mas acho que meu sobrinho está a caminho. Papai abre a porta para que possamos ir até a igreja e vejo Jude parado no final do caminho para nossa casa, sorrindo, com um buquê de flores nas mãos. — Aqui está a estrela do show — fala, empolgado, e encontra Poppy no meio do caminho, se abaixando para abraçá-la. — Para você. — Entrega as flores para a pequena e o rosto dela se acende mais do que a árvore de Natal da mamãe. Ela olha para nós e sorri com orgulho, Natalia dando gritinhos por trás de mim e tentando não chorar. — Obrigada — fala, toda doce, para Jude e o abraça, antes de voltar correndo para Dick, que leva ela e as flores para a casa e então volta com Pops nas costas. — Pronta? — Jude pergunta, sorrindo para mim, e tento devolver o sorriso ao acenar. — Sim. Nossa família caminha junto pela vila até a igreja, mas Jude e eu ficamos para trás deles. Não é intencional, ou talvez seja, mas, de todo jeito, fico quieta e as coisas parecem diferentes agora. — O que foi? — indaga, empurrando meu ombro ao andarmos. — Nada. — Sorrio, mas não mostro os dentes e ele percebe. Para na minha frente, o que me impede de seguir, e apoia as mãos nos meus braços. — Nel, fala sério, fiz alguma coisa para te chatear? — Ele parece verdadeiramente preocupado e me lembro do quanto ele odeia chatear alguém. Inspiro fundo e solto. — Você não me contou sobre a Carly. — O que tem a Carly? — pergunta, franzindo o cenho. — Que vocês dois têm um lance. Ele dá um passo atrás. — Carly e eu não temos um lance. De onde veio isso? — Ela veio na sua casa hoje, eu disse que você estava no trabalho, ela me contou que vocês tinham um lance e me senti uma idiota. Não deveria, porque você sabe quem não tem um lance? Nós: você e eu. — Não consigo parar as palavras que deixam minha boca agora. — Quero dizer, você não é meu, porque garanti isso, e essas duas últimas semanas têm sido maravilhosas, você está tão maravilhoso quanto nunca, mas não é meu e não tenho direito de ficar com ciúmes, só que estou. Ele sorri e fecho a matraca de novo. — Você está com ciúmes? — Ele abre mais o sorriso e aceno. — Nel, dormi com Carly algumas vezes. Dá para contar em uma das mãos. Não é um lance. — Ele anda para frente e usa a mão debaixo do meu queixo para erguer meu rosto na sua direção. — Amo o fato de você estar com ciúmes, porque quero que esteja, bem, quero que sinta que tem o direito de estar. A única pessoa com quem estou interessado em ter um lance é você. — Suas mãos cobrem meu rosto e ele abaixa a boca na minha. Minha respiração fica presa na garganta com o contato, com suas palavras. Ele se afasta e olha para mim, sorrindo. — Noella, há conversas que precisamos ter, mas vamos apenas aproveitar os próximos dias como estamos fazendo, então podemos conversar. Aceno. Não acho que poderia dizer nada nem se quisesse. Ele quer um lance, comigo, e eu quero também. Assistimos nossa estrelinha dançando no palco em frente à igreja e Jude segura minha mão, os dedos entrelaçados nos meus. Ela é maravilhosa. Definitivamente faz sua parte e ofusca completamente Maria e José, mas nós amamos e os outros também. As risadas, os “ooh” e “aah” conforme ela dança e canta para o grupo da igreja me faz sentir muito orgulhosa dela; porém, mais que isso, apenas me sinto completamente contente. O mais feliz que já me senti em anos; e no Natal, de todos os dias possíveis… o que está acontecendo comigo? Olho para Jude, que deve sentir, porque se vira para me olhar, sorri e leva minha mão à sua boca, beijando a parte de trás dos meus dedos. Não sei como faremos esse lance funcionar, mas quero descobrir. Ao sairmos da igreja, recebemos uma pequena lanterna de papel com uma vela a bateria dentro. Descemos os degraus da praça da igreja e nos juntamos ao desfile de lanternas. É mágico. O coral guia a procissão, cantando músicas natalinas lindamente; na escuridão da noite, tudo ao nosso redor — lanternas, velas, tochas e alguns telefones — se acende e nos guia para casa. As pessoas não conversam, algumas cantam junto, mas estou apenas ouvindo. É um momento de esclarecimento para mim. Eu não odeio o Natal. Odeio algumas coisas que aconteceram no Natal, mas isso, a tradição, o tempo em família, o amor tangível e a alegria no ar, a sensação da mão de Jude na minha… isso é Natal. Alguns dias atrás, eu era teimosa, estava frustrada e determinada a voltar ao meu loft para passar meu tempo sozinha, sentada no sofá. Então este homem maravilhoso ao meu lado me pediu para confiar nele, para dizer sim. Paro de caminhar e paro na frente de Jude, as luzes passando ao nosso redor. Ele sorri para mim. — Obrigada por me pedir para dizer sim. — Imito seu sorriso. — Acho que, talvez, eu ame o Natal. Jude ri e me beija brevemente, então se inclina para falar diretamente no meu ouvido. — Essa pode não ser a última vez que eu vou te pedir para dizer sim, então apenas se lembre de como eu estava certo. Sem me dar chance de responder, já que meu coração bate rápido no peito, Jude beija minha têmpora e me puxa pela mão, me encorajando a seguir em frente. — Tem certeza de que não quer entrar para tomar uma bebida e nos ajudar a arrumar tudo para o Papai Noel? — pergunto ao Jude, parados na frente da varanda dos meus pais depois de voltarmos da igreja. — Eu amaria, mas tenho que trabalhar em — olha para o relógio — sete horas, o que significa que tenho que estar de pé às cinco e deveria dormir um pouco. Sorrio e fico na ponta dos pés para beijá-lo. Jude me traz para perto com a mão na base das minhas costas. Passo os braços por seu pescoço. Sem querer, gemo assim que sua boca encontra a minha e ele quebra o beijo, pressionando a testa na minha, depois solta um rosnado baixo. — Vai — digo, fechando os olhos para acalmar a respiração. — Vai dormir um pouco. Te vejo amanhã. Abro os olhos quando Jude se afasta de mim. — Você continua dando trabalho como sempre. — E me dá um largo sorriso. — Só vai. — Aponto na direção da sua casa e ele acena, virando para ir. — Precisamos fazer alguma coisa sobre essa cerca — grita, e eu rio. Ele está certo. Ter que andar o caminho inteiro apenas para circular a cerca-viva e fazer o mesmo trajeto do outro lado é bem irritante. Espero na porta até Jude chegar na dele, então, sorrindo, dizemos boa noite e voltamos para dentro. — Precisamos de leite para o Papai Noel — Poppy fala, correndo para a cozinha. — Rápido, vovó, preciso ir dormir ou ele não virá. Sorrio pelo seu entusiasmo e a pego nos braços. — Não se preocupe, Pops, você foi uma menina muito boazinha. Ele não vai deixar de vir. Ela passa os braços em meu pescoço e fala baixinho em meu ouvido: — Eu sei, mas não vou dar bobeira. Solto uma risada alta e nego com a cabeça, a carregando para a sala, minha mãe vindo com o leite. Pops coloca o copo na lareira ao lado do prato com uma cenoura e alguns biscoitos, então se vira para mim, dando risadinhas. — Estou tão empolgada. Meu coração se derrete. É apenas um mingau agora, sério. — Certo, vamos lá, Poppy Eloise, vamos te colocar na cama — Dick chama, levando a filha escada acima. Nats estica a mão para mim e a ajudo a levantar no sofá, então a observo fechar a cara e agarrar a barriga, antes de seguir o marido e a filha. Apesar da necessidade de colocar Poppy na cama, demora um pouco até a acalmar o suficiente para ir dormir. No momento que Dick e Nats descem, minha mãe e eu já estamos na segunda taça de licor Baileys na cozinha, enquanto dividimos algumas pizzas e as arrumamos ao redor das pilhas de batata cozidaem rodelas nas travessas que minha mãe retira do armário todo Natal. Não se cozinha de verdade na noite da véspera, um congelado vai para o forno e depois para mesa, o que é o bastante. — Ella — Natalia chama do corredor. Dick pega uma cerveja na geladeira e se junta ao meu pai na sala. Vou até minha irmã e a vejo segurando o corrimão com uma das mãos e a base de sua barriga com a outra. — Nats? — pronuncio seu nome em dúvida, esticando a mão para o seu braço. — Não faça alarde, mas pode chamar a parteira, por favor? Ela aperta os olhos com força e se balança, gemendo. Caramba, eu sabia. Natalia me entrega o telefone e piso do lado de fora da casa. — Oi, meu nome é Noella. Irmã da Natalia Bentley — explico, quando a parteira atende. — Temos muita certeza de que ela está em trabalho de parto. Não faço ideia do que mais deveria dizer. A parteira faz algumas perguntas, tipo: qual é a distância entre as contrações, para as quais não tenho resposta, então questiona o comportamento de Nats, sua linguagem corporal, e digo tudo a ela. — Ok, Noella, acho que você precisa trazer Natalia para o hospital. Estamos atendendo outro parto agora. Posso mandar a ambulância? Entro em pânico. Nats não quer ter o bebê no hospital, porque seu primeiro parto foi assustador. Ela quer ter em casa. Se vou ter que dizer a ela que temos que ir para lá, não pode ser em uma ambulância. — Podemos levá-la. Está tudo bem — respondo, baixinho, então desligo. Volto ao corredor e me deparo com a visão de Natalia inclinada para frente, agarrada aos braços de Dick e gemendo alto. Meus olhos se arregalam para o meu cunhado e sei que não temos tempo. O bebê está vindo. Viro e volto para fora, correndo e pulando sobre a cerca-viva, que felizmente o papai mantém baixa, então bato na porta de Jude. Depois de alguns minutos — que parecem uma hora graças aos gemidos aumentando de volume no corredor dos meus pais —, Jude atende a porta, sem camisa e meio dormindo. — Nel? — indaga, e dou um passo atrás, pronta para correr e pular no caminho de volta. — Desculpa, mas a Nats… o bebê está vindo. Precisamos de você. — Me sinto mal, mas minha irmã é a única coisa que importa agora. — Ok, vou pegar uma camisa. Jude volta para dentro e pulo a cerca de novo, entrando em casa. Dick e minha mãe estão guiando Natalia para a sala, meu pai andando pela cozinha. — Ei, Tali — Jude fala por trás de mim ao parar ao meu lado na sala. Foi rápido. Ela sorri para ele, mas já parece cansada. — Alguém ligou para a parteira? — Jude pergunta, olhando ao redor. — Liguei, eles estão em outro parto. Disseram para levá-la ao hospital, mas não acho que temos tempo. — Cruzo os braços sobre o peito e Jude os toca de leve, antes de se abraçar na frente da minha irmã. — Okay, Natalia, isso está prestes a ficar estranho — avisa, e ela ri brevemente, antes de gemer de novo. — Ella — chama, e olho para minha irmã. — Por favor, pode dar uma olhada na Pops? Sei que ela está preocupada que o barulho do trabalho de parto possa incomodar a filha, mas acho que, em geral, não quer que eu tenha que ver Jude examiná-la. Depois de conferir que Poppy está dormindo profundamente, fico parada no corredor fora da sala. Está bem mais calmo do que esperei. Sem gritos, muitos gemidos e grunhidos, porém, para minha surpresa, está calmo. — Ei, garota — papai diz ao se juntar a mim. Ele parece pálido e digo para ele se sentar. Ele senta no banco do corredor e me abaixo à sua frente. — Você está se sentindo bem, pai? — indago, preocupada com seu coração. Não seria perfeito? Um bebê inesperado na véspera de Natal e um ataque do coração. — Estou bem. Só não gosto de ouvi-la sentindo dor. Nossos olhos se encontram e percebo como estão úmidos. — Pai… — Pode não ser o melhor momento, mas tenho que dizer o que está na minha cabeça. — Não há nada que ela não possa aguentar. Ela é a pessoa mais forte que eu conheço, mas precisa de você, todos precisam. Poppy te adora e aquele garotinho prestes a fazer sua entrada no mundo… você será o herói dele. Sei que odeia a dieta, mas tem que estar aqui por eles, pai, ainda precisamos de você. Apoio a mão em seus joelhos, e ele coloca as dele por cima. — Estou tão feliz por você estar aqui, Noella Star. — Sorri, e me inclino para abraçá-lo. Silêncio reina entre nós pelo que parece ser um longo tempo. Ouvimos Nats gritar de dor apenas mais algumas vez antes de a calmaria reinar de novo e me sinto mal. Então ouvimos. O som mais bonito do mundo. Minha mãe abre a porta da sala e corre para me abraçar, depois o papai, soluçando. Dick a segue, sorrindo de orelha a orelha, com lágrimas nos olhos. — Ela é… — Ele puxa o ar para se acalmar. — Meu Deus, ela é maravilhosa. Ele está aqui. Apoiada na porta, observando minha irmã apresentar o filho ao avô, sorrio e seco uma lágrima na minha bochecha, então sinto a mão de alguém em meu quadril. Viro e vejo Jude colocar um casaco e sorrir para mim. — Obrigada — peço, genuína. Desculpa por te acordar. Ele segura minha mão e me traz para perto. — Nel, foi uma das melhores experiências da minha vida. Estou muito feliz por você ter me acordado. Segura minha bochecha com a mão e se aproxima para me beijar de leve. — Te vejo amanhã — falo, contra os seus lábios, e ele começa a se afastar. Ele olha no relógio. — Te vejo mais tarde — corrige, andando para trás em direção à porta, antes de se virar para mim. — Feliz aniversário, Nel. — Ai, meu Deus — Poppy grita, entrando na sala e vendo as pilhas de presentes. — Ele veio. — Veio, Pops — comento —, e veja. — Eu direciono sua atenção para Natalia, sentada no sofá atrás da porta com o bebê JJ nos braços. Eles insistiram em chamar o bebê de John Jude, mas me recuso a chamar meu sobrinho de John, então será JJ. Um gritinho sai da minha sobrinha ao perceber que o irmão chegou. Então começa a soluçar. — Ai, Pops — Natalia fala, lutando contra as próprias lágrimas. — Venha aqui, bebê. Deixo a sala, sorrindo ao ver Dick tirando fotos de sua família. — Ei, vovó — falo com a mamãe ao entrar na cozinha, e ela passa os braços ao meu redor. — Ah, Ella. Feliz aniversário, querida. Que ano mágico esse foi. Olha para mim, segurando meu rosto nas mãos, e percebo as lágrimas em seus olhos. — Ai, mãe — solto, sentindo a emoção me tomar, e a puxo para outro abraço. — Feliz Natal. Não ligo de ser meu aniversário. Por tantos anos, fiquei irritada de ser Natal e todo mundo focar nisso, mas, nesse, não me importo. Estou feliz demais. Tudo é absolutamente mágico. Tenho o que parece ser um lance com um homem que adoro. Estou cercada por minha família depois de uma semana incrível e, para coroar tudo aquilo, tenho um sobrinho. Um sobrinho saudável, bonito e fofinho. Meu coração está tão cheio. Começo a ajudar minha mãe a preparar o café da manhã e não consigo evitar que meu quadril se mova quando Elton John me diz para entrar no Natal com Step into Christmas… Está atrasado, Elton! — Okay, posso fazer um brinde para minha esposa brilhante, maravilhosa e deusa? — Dick começa, ficando de pé na mesa de jantar. Nats, embalando JJ, sorri para ele. — Natalia, eu te idolatro. Isso desde o segundo em que te conheci, mas, na noite passada, o que você fez… — Respira fundo. — Estou tão maravilhado, tão orgulhoso, tão apaixonado. Você é maravilhosa. Sua voz falha e ele encerra o brinde, erguendo a taça. — Ok, pare de monopolizar o bebê — peço, quando Dick se abaixa para beijar a esposa. — Vamos, entregue para mim. Pego JJ de Natalia e decido deixá-la comer um pouco de sobremesa com as duas mãos em vez de com uma só, vagando da cozinha para a sala e ouvindo os sons da minha feliz família, aproveitando um cheesecake por trás de mim. Hoje tem sido um dia maravilhoso e percebi, conforme os momentos passavam de um para o outro, que Jude estava certo. Tive Natais maravilhosos. — Ok, JJ — falo com o humanozinho em meus braços. — Essa é a árvore da sala, essa é a que tem chocolates, então é a que você precisa lembrar — aviso ao meu sobrinho. — Ahem. — Viro e encontroos olhos sorridentes de Jude, que limpa a garganta e sorri da porta. — O garoto nem tem dente ainda e você já está dizendo a ele onde encontrar doce. Caminha pela sala em minha direção. Nem o ouvi bater à porta, mas estou muito feliz por vê-lo. — Quer segurá-lo? — pergunto, sorrindo, relutante de desistir do meu momento. — Não… — Sorri, se inclinando para me beijar rapidamente. — Dá para ver que você não quer soltá-lo ainda e eu o segurei primeiro que todo mundo. — Seu sorriso aumenta, e nem consigo ficar brava, porque este belo homem trouxe meu lindo sobrinho em segurança para o mundo. — Não poderia estar mais grata por isso. — Jude. — Ouço Poppy chamar e vou para a cozinha. — Eu tenho um irmãozinho — anuncia. — O quê? — responde, soando chocado. — Você tem? Poppy assente e aponta para mim. Jude finge surpresa perfeitamente antes de parabenizá-la e abraçá-la, depois fazer o mesmo com Natalia e mamãe, desejando Feliz Natal a todos. Entrego o bebê ao pai e, olhando nos olhos de Jude, aceno para a sala. Ele se desculpa antes de me seguir. — Vai trabalhar amanhã? — pergunto, e ele passa os braços pela minha cintura, sorrindo para mim. — Sim, começo às cinco. Por quê? — Porque quero passar a noite — respondo, e ele sorri e se aproxima para me beijar. Afasto-me. — Precisamos conversar, porém. — Arregalo os olhos para avisar a ele que não será apenas brincadeira. Ele concorda, claramente sem acreditar em mim. — Jude, temos que discutir isso — reitero, acenando com a mão do peito dele para o meu. — Nel, cale a boca. — Encontra minha boca com a sua e faço o que me pede. Sei que falaremos disso. Sei que ele quer esclarecer tudo assim como eu, mas, agora, tudo que eu quero é que ele me beije, para sempre. — Boa noite, Pops — desejo, abraçando e beijando minha sobrinha, que subitamente está exausta do longo dia de presentes, doces e um irmãozinho novo. Ela me abraça, abraça Jude e, sem discutir, vai para a cama. Jude cutuca meu cotovelo e me viro para encará-lo, lutando bastante para manter o sorriso espertinho longe do meu rosto, e ele esconde os olhos e ergue a sobrancelha para mim. Ele quer que a gente vá embora. Quer que eu esteja na casa ao lado, e não acho que já quis outra coisa na vida inteira. Reparo que meu pai começa a fechar os olhos na poltrona. Tenho certeza de que Natalia estará exausta e vai para cama em breve. Pergunto para minha mãe se ela precisa que eu faça algo, mas insiste que está com tudo sob controle e sei que Dick não vai se importar se estou por perto ou não enquanto assiste The Big Quiz of the Year e os outros integrantes da família dormem por estar muito cheios de comida. — Mãe — começo, a seguindo para a cozinha. — Vou ficar na casa do Jude. — Sinto-me tímida, como se ela tivesse o poder de dizer que não tenho autorização. Ela me encara, levemente preocupada. — Ella. — Olha por trás de mim para garantir que estou sozinha. — Tem certeza de que sabe o que estão fazendo? — Ela o ama, ela me ama, sempre amou a nós, mas sei que está preocupada com nós dois. Respiro fundo para responder com honestidade. — Mãe, não. Eu não sei, mas o adoro — afirmo, e sua expressão suaviza. — Vamos conversar. Sei que precisamos disso. Ela abre os braços para mim. — Okay, amor. Só quero que você esteja feliz. Não há nada mais verdadeiro. É tudo que ela sempre quis. — Te vejo amanhã, mãe. Te amo. Ela sorri para mim. — Também te amo, querida, muito. Paro por um segundo e apenas olho para ela. Minha amável mãe. Ela é a cola que une toda a família. É a mulher que ensinou Nats e eu a amar de todo coração, a sermos boas amigas e amantes para os nossos parceiros. Ensinou a sermos gentis, leais, divertidas, bobas e nos importarmos. — Você é maravilhosa, mãe — digo, sorrindo. — Obrigada por tudo. — Beijo sua bochecha e viro para sair. Passo pela porta da sala e chamo a atenção de Jude, acenando na direção da saída para dizer a ele que estamos saindo. Ele salta, um pouco animado demais, e caminhamos para sua casa. — Comprei algo para você — comenta, nós dois sentados no tapete de sua sala, e sinto um rubor subir por minhas bochechas, não apenas da lareira. — Não é nada grande, só vi e pensei em você. É um presente de Natal barra aniversário, porque sei o quanto você ama quando as pessoas juntam os dois. Ele sorri e rolo os olhos, o fazendo rir, então ele me passa a caixa que estava esperando na lareira. Abro, incerta do que esperar, mas agradavelmente surpresa. Dentro há um enfeite de árvore de natal de cristal em formato de floco de neve. É bonito, ergo o olhar para encontrar seus olhos cheios de expectativa. Ele está esperando minha reação. — Pensei que… agora que você não odeia o Natal… deveria começar sua própria coleção — reflete, e meu coração se derrete com o tanto que foi cuidadoso. — Eu amei, Jude. Quero mais do que tudo dizer que me sinto igual a seu respeito, mas me paro. É demais, cedo demais. Em vez disso, abaixo a caixa que tenho em mãos e rastejo para o colo do homem com quem definitivamente tenho um lance e o agradeço por meus dois presentes: pelo floco de neve e por ter me pedido para dizer sim. Pressiono os lábios nos dele, que empurra os dedos em meu cabelo; a sensação me faz gemer um pouco e ele sorri contra meus lábios. — Consigo te ler como um livro aberto — diz, baixinho, antes de me beijar de novo. Eu me afasto e olho para ele, achando graça. — Ah, consegue? Okay, o que você está lendo agora? — pressiono por seus pensamentos, torcendo para que ele esteja lendo o jeito como o quero. Arrasta os dedos em minhas costas, fecho os olhos momentaneamente e ele solta uma risada. — Estou lendo que você quer me levar lá para cima e tirar proveito de mim. — Sorri, mas balanço a cabeça, negando. — Errado — declaro, apoiando as mãos em seu peito e o empurrando para o chão. — Vai ser aqui mesmo. Ergo o corpo, ainda com as pernas em cada lado dele, que estica as suas debaixo de mim. Arregalo os olhos, que encontram os dele, e aceno para sua virilha, dizendo que deve abrir o zíper. Ele ri, mas fica mais sério quando coloco a mão debaixo da saia para puxar a calcinha e chutá-la para longe, antes de me abaixar e montar nele mais uma vez. As mãos de Jude empurram minhas coxas e sobem minha saia para segurar meu quadril. Abaixo o peito no dele e o beijo, não o beijo brincalhão e quase casto de mais cedo, mas um mais profundo, apaixonado e indutor de gemidos de duas pessoas tão conectadas. Ofego em busca de ar e parto nosso beijo apenas por um momento, então retorno os lábios aos dele. A língua de Jude desliza pela minha e estico a mão entre nossos corpos ainda vestidos para agarrar a única parte nua dele, firmemente, antes de guiá-lo para onde preciso que esteja e rolar o quadril para recebê-lo. É lento e respiramos com força contra os lábios um do outro. Uso as mãos no peito de Jude para me empurrar para cima, assim consigo olhar para ele quando me preenche. Jude me encara e o vejo, apenas desejo em seus olhos, e começo a me mover. O aperto de seus dedos em meu quadril e coxa enquanto subo e levanto, depois para frente e para trás, me dá todo encorajamento de que preciso. Prazer rasga pelo meu corpo e gemo alto, jogando a cabeça para trás e fechando os olhos para bloquear tudo, exceto a sensação dele dentro de mim. — Olhe para mim, Nel — Jude chama, a voz baixa, quase um sussurro, e faço o que ele pede. Imediatamente noto o subir e descer do seu peito, o aperto firme de seus dedos, a tensão em sua mandíbula, e corro as mãos por seus braços para segurar as mãos que me seguram. Aumento o ritmo, me movendo mais rápido e intenso, ouvindo sua respiração acelerar. — Nel — diz meu nome para me avisar que está perto, e sorrio, aproveitando cada segundo de seu prazer ao tirar cada gota do meu dele, então caio para frente, respirando com força em seu peito e inalando seu cheiro. Fecho os olhos para cavalgar as últimas ondas de êxtase antes de elas se dissiparem. — Quando você vai embora? — Jude pergunta, enquanto estamos deitados na cama, meus dedos entrelaçadosnos seus, o peito nu colado nas minhas costas. Sexo natalino em frente à lareira foi uma coisa, o banho e fazer amor na cama dele depois foi outra. — Estava planejando voltar para passar o Ano-Novo em Londres, mas não tenho tanta certeza agora — admito. Depois de não querer sair de Londres no Natal, agora percebo que não quero realmente voltar. — Tenho o Ano-Novo livre — falou, suavemente — e alguns dias depois. Viro o corpo com suas palavras, pressionando o peito no dele. — Venha para Londres — digo, sem hesitação. Sento e olho para ele, que se junta a mim. — Sério, venha ficar comigo. — Ainda nem conversamos, Nel. Precisamos discutir o que é isso. — Isso é nós, Jude. É você e eu. É o que quer que queiramos que seja. — Inclino-me para pressionar os lábios nos seus. — Mas o que você quer? Porque não quero que estejamos em páginas diferentes aqui. — Gentilmente me puxa para mais perto. — Se for apenas nostalgia, tudo bem, mas não vamos tentar fazer ser mais do que isso. — Se eu não estivesse olhando em seus olhos, me preocuparia de estar me fazendo de boba, mas há apenas amor, e talvez um pouco de medo da rejeição. Diz que devo ir em frente. É minha chance de felicidade e tenho que agarrá-la. — É nostalgia, também é o Natal, é memória muscular, é animalesco, atração básica, mas, Jude, é amor. Nunca deixei de te amar, nem por um dia. Te tirei da minha cabeça, porque doía, mas você sempre foi parte da minha vida. Passei onze anos me arrependendo das minhas ações e senti sua falta. Pensei em você, me preocupei com você, mas, nesta última semana, com você perto de mim, me senti completa de novo. Me senti completa, feliz e saciada pela primeira vez em muito tempo. Eu te amo, Jude, eu sempre te amei. Ele se inclina para me beijar e sorrio contra seus lábios. Não consigo acreditar em quanta sorte eu tenho. Deveria mesmo comprar um bilhete na loteria. — Te amo, Nel. Eu te amo — responde, entre os beijos, e preciso de todo meu esforço para lutar contra as lágrimas que se formavam em meus olhos. Ele nunca me deixaria viver em paz se eu chorasse. — Vamos conseguir resolver isso, não vamos? A distância? — indago, e ele apoia a cabeça contra a minha, depois recua para mirar os meus olhos. — Noella Star, eu e você podemos fazer qualquer coisa. — Você chegou — digo, enquanto Jude me pega, e passo braços e pernas ao seu redor. As pessoas passam ao nosso redor, mas ele me beija e paro de me importar. Só o deixei para vir a Londres há dois dias e a demonstração pública de afeto é um pouco demais para as boas vindas, mas o fato de que ele está aqui, na cidade que evitou por uma década, me emociona e me excita. — Cheguei, e estou morrendo de fome — responde, me abaixando no chão da estação de trem lotada, e sorrio, animada, pegando sua mão. — Vamos. Jude saiu de um turno noturno às seis da manhã e pegou um trem para Londres às dez. Sei que ele estará acabado, mas estou muito feliz por ele estar aqui. Quero levá- lo para almoçar, cuidar dele, mas ele ficou de pé a noite inteira e acho que prefere tirar os sapatos e se jogar no meu sofá. Meu loft não é muito longe da estação, mas sei que está cansado, então peço um táxi para nós e fazemos a curta viagem — de mãos dadas, empolgados para ficar sozinhos. — Isso é maravilhoso. — Sorri, deixando a mala na porta e olhando ao redor do loft. — Você tem uma árvore de Natal? — questiona, parando para me puxar para si e me segurando perto de seu corpo. — Eu tenho. — Devolvo o sorriso. — Meio caído montar uma árvore depois do Natal com apenas algumas luzes e um enfeite de floco de neve — faço uma careta —, mas queria que ficasse acolhedor e festivo para você — admito, e sua expressão suaviza em uma de puro amor. Ele me segura bem perto, estreitando seu abraço, e beija o topo da minha cabeça. Recuo para o olhar mais uma vez e percebo como parece cansado, me sentindo culpada por ele ter vindo direto do turno. — Quer ir para a cama? — pergunto, e ele ergue a sobrancelha. — Bem tentador, mas estou realmente com fome. Rio. — Seu pestinha. Quis dizer sozinho. Vou pegar alguma comida e você pode descansar um pouco. Afastando-me dele, entro na cozinha e Jude senta na mesa de café da manhã, conforme preparo o almoço para nós dois. Enquanto ele dorme um pouco, tomo banho e começo a preparar a refeição que planejei para nosso jantar da noite de Ano-Novo. — O que é isso? — pergunta, entrando na cozinha, passando os braços pela minha cintura e beijando a pele exposta em meu ombro, graças à regata que vesti depois do banho. — O jantar — respondo e viro em seus braços para encará-lo. — Quero cozinhar para você, te mostrar a boa mulher que me tornei. Ele ri. — Nunca duvidei disso. — Jude se aproxima para me beijar, na minha bela cozinha, e acho que acabei de derreter aqui. — O que você quer que eu faça? — indaga, se afastando. — Apenas sente, fique confortável, sinta-se em casa. — Sorrio para ele e o indico para o sofá. Beijando-me mais uma vez, bem breve, Jude sai da cozinha e termino de preparar nosso jantar. — Está maravilhoso, Nel — afirma, quando terminamos o jantar, e sinto um frio na barriga de satisfação. — Estou aqui para te agradar. — Sorrio, pegando nossos pratos e levando para a cozinha. Jude fica de pé e anda até as portas de vidro do chão ao teto, observando lá fora. — A vista é surreal — declara, sem tirar os olhos de lá. Aceno, mesmo que ele não esteja me olhando. É mesmo. — Quer ir lá para fora ou assistir os fogos daqui da varanda? — indago, colocando os pratos na lavadora e fechando a porta, feliz de fazer o que ele quiser. — Vamos ficar aqui — sugere, virando para me encarar. — A vista é maravilhosa e aqui não tenho que te dividir com ninguém. Dou um sorriso largo e idiota, e ele caminha para mim. — Jude, você nunca tem que me dividir com ninguém — assumo, assim que ele chega à cozinha, me pega e me faz sentar à mesa de café da manhã, antes de gentilmente afastar minhas coxas e ficar entre elas. — Okay. — Apoia a mão na base da minha coluna e me puxa para perto, juntando nossos peitos. — Bem, então vamos ficar aqui para eu poder fazer amor com você quando o relógio marcar meia-noite. Essa é uma boa resposta. Jude se aproxima para me beijar e, quando sua língua encontra a minha, passo as pernas apertadas por sua cintura. Ele me pega e, me beijando o tempo inteiro, me carrega para o quarto. Deitada na cama, dentro do meu loft, nos braços do amor da minha vida, fico quieta. Estou contente, feliz, mas também um pouco preocupada. Em algumas horas, entraremos em um novo ano e quero que seja o começo de um novo capítulo na minha vida, uma vida com Jude nela; mas temo que os efeitos da estação desapareçam. Ele afasta meu cabelo da têmpora e me beija lá. Respiro fundo, involuntariamente, com o contato. — Ei — chama, percebendo algo errado. — O que foi? Rolo, virando o corpo para o dele, quando ele se vira para mim, nossos torsos pressionados, nossas pernas entrelaçadas, suas mãos passeando por minhas curvas até se estabelecer em meu quadril. Respiro fundo de novo. — Sei que você disse que podíamos fazer isso e sinto que podemos, mas não consigo afastar o medo de que tudo vai desaparecer assim que voltarmos às nossas vidas reais, horas de distância um do outro. Jude expira, então pressiona os lábios na minha testa. — Haverá momentos em que a distância grande demais — começa, com honestidade, contra minha pele, então se mexe e se senta, me olhando. — Haverá momentos em que vai parecer difícil demais, quando um de nós estiver dormindo e o outro trabalhando, e não pudermos nos falar por dias. Pode haver momentos em que as memórias do passado afetem as coisas que diremos um para o outro ou o jeito que as diremos. Pode até haver momentos em que vamos sentir falta das nossas vidas de solteiros, quando as coisas eram mais simples. — Suas palavras me calam e agarro o lençol que puxei para cobrir o peito. — Mas, sem sombra de dúvidas, Nel, você é o amor da minha vida. — Ele me dá um sorriso tímido, suave e quase envergonhado,que enche meu coração com muito amor. — Então vai valer a pena. Toda vez que eu descer do trem aqui em Londres ou te ver tentar estacionar o carro fora da minha casa. — Ri, e rolo os olhos. — Vamos fazer dar certo; vamos fazer valer a pena. Não duvide de nós, sempre demos um jeito. Suas palavras penetram e minhas preocupações viram nada. Ele está certo. Vamos dar um jeito. Olho para o relógio ao lado da minha cama e vejo que agora faltam apenas trinta e cinco minutos para meia-noite, e percebo que, se ele planeja manter a promessa de mais cedo, precisamos trabalhar. Tiro o lençol que cobre meu peito nu, adorando os olhos de Jude se arregalando ao me olhar, e logo estico as mãos para o seu ombro, o encorajando a vir até mim. Jude, o amor da minha vida, beija minha mandíbula, pescoço e garganta, fazendo meu corpo inteiro tremer de ansiedade pelo que virá. Exalo e relaxo contra ele. A página está prestes a virar para o próximo capítulo, um novo ano, um novo nós; e estou dizendo sim para tudo isso. 2020 foi um ano do caramba… para todos nós. Ninguém imaginou que uma pandemia global nos deixaria isolados dentro de quatro paredes ou o impacto que isso teria em nós. Durante este ano louco, de alguma forma consegui focar nos meus livros, reformulei, voltei para a comunidade que amo e escrevi isso, meu primeiro livro novo em três anos. Tenho que agradecer ao meu marido por me apoiar e ajudar. Toni-louise Tucker-Argent por se tornar minha leitora beta (ela tem lido todos os meus livros esse ano, pegando erros de digitação e alimentando meu ego de forma geral!) e, mais uma vez, Claire Allmendinger, da Bare Naked Words, por ser a melhor revisora que existe e simplesmente a dama mais amável de todas. Até a próxima… Cassandra Lewis vive em uma antiga cidade de mineradores chamada Swadlincote, no Reino Unido. Como seu marido sempre diz, “se você enfiar um alfinete no meio do mapa da Inglaterra, provavelmente vai parar na nossa casa”. Começou sua carreira como escritora enquanto tentava escapar da luta final de seu pai contra um câncer terminal e se viu rapidamente escrevendo seus três primeiros livros após a morte dele. A certeza absoluta de que ele estaria explodindo de orgulho por suas conquistas a fez continuar. Cassandra desenvolveu um amor pela palavra escrita quando jovem, algumas de suas memórias mais antigas são de ler livros como O Hobbit, What Katy Did e um de seus favoritos de todos os tempos, Mulherzinhas. Seus pais sempre contavam com orgulho o fato de que ela aprendeu a ler com dois anos, pegando o jornal do pai e deitando no tapete da sala, absorvendo quantas palavras conseguisse. Cassandra cresceu dolorosamente tímida e lutava para se sentir confortável em ambiente desconhecidos e com novas pessoas, encontrando um escapa em ler livros e escrever poesia até que a necessidade de seguir suas outras paixões, como cantar e dançar, se tornou forte demais e ela enfrentou sua própria ansiedade para estudar artes cênicas. Depois disso, o mundo ficou um pouco maior e uma mulher mais confiante e determinada emergiu, pronta para saltar naquilo que amava. A The Gift Box é uma editora brasileira, com publicações de autores nacionais e estrangeiros, que surgiu no mercado em janeiro de 2018. Nossos livros estão sempre entre os mais vendidos da Amazon e já receberam diversos destaques em blogs literários e na própria Amazon. Somos uma empresa jovem, cheia de energia e paixão pela literatura de romance e queremos incentivar cada vez mais a leitura e o crescimento de nossos autores e parceiros. 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