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'ISBN 85 08 03255 21 
Q conjunto funcionalmente articulado de 
cidades é a rede urbana, que tem sido objeto 
de interesse entre os cientistas sociais, entre 
eles os geógrafos . As classificações 
funcionais de cidades, as dimensões bás1cas 
de variação, as relações entre tamanho e 
desenvolvimento, a hierarquia urbana e as 
relações 'cidade-regiao sSo as abordagens 
que os geógrafos consideraram em seus 
estudos. 
A partir dessa prática, considerada 
criticamente, e incluindo a contnbu1ç!o de 
outros estudiosos, o autor procura 
esclarecer a natureza e o sign1f1cado da rede 
urbana. Há ainda uma proposta de pesqUisa, 
tendo em vista as diversas redes urbanas 
regionais brasileiras. 
Roberto Lobato Corrêa é geógrafo da 
Fundação IBGE e professor da Universidade 
Federal do Rio de Janeiro . Publicou, na séne 
Princípios, os volumes Regllo e 
.organização espacial e O espaço urbano . 
..kea& ele-~ do- v-o-ltulw 
• Geografia • Políti ca • Sociolog ia 
élat:ra&CÚ'ea& ck~ 
• Administração • Antropologia • Artes 
• Ciências • Civilização • Comunicações 
• Direito • Economia • Educação 
• Enfermagem • Estét ica • Farmácia 
• Filosof ia • História • Lingüíst ica 
• Literatura • Medicina • Odontologia 
• Psicologia • Saúde 
Roberto Lobato 
Corrêa 
O VOIUQftO humano 
Col!lo l'loclomon te de Lima 
N~ologlorno -
Crln980 lex lcol 
I do Maria Alves 
Amozõnlo 
O nha K. Becker 
l lntroduçlo ao maneirismo 
o à proeo barroca 
Soglsmundo Spina e Morris 
W , Croll 
1 4 Ao duoa Argentinos 
l:menll I Soares da Veiga 
Ga rcia 
h O Porlodo Rogonciol 
Arnaldo Fazoli Filho 
A Ant iguidade Tardio 
Waldir Freitas Oliveira 
Plenejamento familiar 
Gilda de Castro Rodrigues 
lntroduçêo à terapia familiar 
Magdalena Ramos 
O Linguagem e sexo 
Malcolm Coulthard 
~00 Aristocratas versus 
burgueses? -
A RevoluçAo Francesa 
T . C. W . Blanning 
~01 O Trotado do Vorsolhos 
Ruth Henig 
202 Jung 
Gustavo Barcellos 
203 A geografia llngüfstica no 
Brasil 
Silvia Figueiredo Brandão 
204 A RevoluçAo 
Norte-Americana 
M . J. Heale 
2Q& As origens da Revolução 
Russa 
Alan Wood 
20 ' Coesão e coerência textuais 
Leonor Lopes Fávero 
20 7 Como analisar narrativas 
Când ida Vilares Ga ncho 
208 Inconfidência Mineira 
Cândida Vilares Gancho 
Vera Vilhena 
209 O sistema colonial 
José Roberto Ama ral Lapa 
21 O A unificação da Itália 
John Gooch 
211 A posse da terra 
Cândida Vilares Gancho 
Helena Queiroz F. Lopes 
Vera Vilhena 
Roberto Lobato 
Corrêa 
Professor da Universidade Federal do 
Rio de Janeiro 
Geógrafo do IBGE 
2.8 edição 
Direção 
Benjamin Abdala Junior 
Samira Youssef Campedelli 
Preparação de texto 
lvany Picasso Batista 
Edição de arte (miolo) 
Milton Takeda 
Composição/Paginação em vídeo 
Divina da Rocha Corte 
Capa 
Ary Normanha 
Antonio Ubirajara Domiencio 
imprmlo e acabamento 
311111(1raf 
TEL.: 1011) 2il· Ul30 
FAX~ Iot11 ne· eoee 
ISBN 85 08 03255 2 
1994 
Todos os direitos reservados 
Editora Ática S.A. 
Rua Barão de lguape, 110- CEP 01507·900 
Tel.: PABX 278-9322 - Caixa Postal 8656 
End. Telegráfico "Bomlivro"- Fax : (011) 277·4146 
São Paulo (SP) 
I 
l. 
Sumário 
1. Introdução 5 
2. As abordagens dos geógrafos 9 
As classificações funcionais 10 
As dimensões básicas de variação 12 
Tamanho e desenvolvimento 15 
A hierarquia urbana 19 
As proposições de Christaller 21 
Os países subdesenvolvidos 32 
As relações cidade-região 40 
3. Natureza e significado da rede urbana 47 
A divisão territorial do trabalho 48 
Os ciclos de exploração 51 
As migrações 56 
A comercialização da produção rural 58 
A drenagem da renda fundiária 61 
Os investimentos de capitais 64 
A distribuição de bens e serviços 67 
A difusão de valores e ideais 70 
Rede urbana e forma espacial 70 
A rede dendrítica 71 
Redes complexas 75 
Rede urbana e periodização _________ _ 78 
O exemplo da Amazônia 80 
4. À guisa de conclusão 87 
5. Vocabulário crítico 90 
6. Bibliografia comentada 93 
1 
Introdução 
Os estudos sobre redes urbanas têm se constituído em 
uma importante tradição no âmbito da geografia. Esta im-
portância deriva da consciência do significado que o proces-
so de urbanização passou a ter, sobretudo a partir do sécu-
lo XIX, ao refletir e condicionar mudanças cruciais na so-
ciedade. No bojo do processo de u.rbanização a rede urba-
na passou a ser o meio através do qual produção, circula-
ção e co'nsumo se realizam efetivamente. Via rede urbana 
e a crescente rede de comunicações a ela vinculada, distan-
tes regiões puderam ser articuladas, estabelecendo-se uma 
economia mundial. 
A despeito dos numerosos estudos realizados, no entan-
to, a temática da rede urbana está longe de ter sido esgota-
da. Especialmente quando se considera um país de dimen-
sões continentais como o Brasil, onde a longa e desigual es-
paço-temporalidade dos processos sociais tem sido a regra, 
e onde a rapidez e a intensidade da criação de centros e 
transformação da rede urbana é ainda notável no final do 
século XX: paralelamente coexistem setores da rede urba-
na cuja gênese remonta ao século XVI, no alvorecer do ca-
pitalismo, quando a rede urbana atual começa a constituir-se. 
• 
6 
O presente estudo tem por finalidade, primeiramente, 
mostrar o que foi a produção geográfica sobre redes urba-
nas. Não deve ser encarado como uma longa, exaustiva e 
sistemática revisão bibliográfica, mas apenas indicadora 
das principais vias de abordagem do tema. Nem como um 
fim em si mesmo, mas sim como uma base teórica passível 
de ser reconstruída, originando outra de natureza crítica. 
Vários exemplos, através de mapas e gráficos, farão parte 
desse capítulo. Procurarão exemplificar princípios a respei-
to de aspectos relativos à hierarquia urbana. Não são exem-
plos da Alemanha meridional, do território francês ou do 
Estado norte-americano de Iowa, unidades territoriais que 
serviram de laboratórios para muitos estudos sobre redes 
urbanas . Os exemplos são brasileiros, envolvendo em gran-
de parte a região do planalto ocidental paulista. 
A segunda parte pode ser considerada como a mais im-
portante deste estudo. Nela apresenta-se o que entendemos 
ser as abordagens que mais evidenciam a natureza e o signi-
ficado da rede urbana. Seguramente algumas lacunas e in-
consistências aparecerão . Isto, em parte, deriva da tentati-
va de apresentar quadros de referência teórica onde se pro-
cura retrabalhar conceitos e articulaçõ~s propostos anterior-
mente. Que as lacunas e inconsistências sirvam de estímu-
los para novas reflexões. 
Uma questão agora se impõe. O que é rede urbana? 
Este questionamento se deve ao fato de não haver concor-
dância sobre o que se quer dizer com esta expressão . Há 
uma corrente que advoga a tese de que somente haveria re-
de urbana se certas características estivessem presentes, ca-
racterísticas estas verificadas nos países desenvolvidos . Se-
gundo esta corrente, nos países subdesenvolvidos não have-
ria rede urbana ou esta estaria em fase embrionária ou se-
ria desorganizada. 
A nossa posição a este respeito é diferente. Admitimos 
a existência de uma. rede urbana quando, ao menos, são sa-
. tisfeitas as seguintes condições. Primeiramente haver uma 
7 
economia de mercado com uma produção que é negociada 
por outra que não é produzida local ou region~li?ente. E~­
ta condição tem como pressuposto um grau mm1mo de di-
visão territorial do trabalho. Em segundo lugar verificar-
se a existência de pontos fixos no território onde os negó-
cios acima referidos são realizados, ainda que com certa pe-
riodicidade e não de modo contínuo. Tais pontos tendem 
a concentrar outras atividades vinculadas a esses negócios, 
inclusive aquelas de controle político-administrativo e ideo-
lógico, transformando-se assim em núcleos de povoamen-
to dotados, mas não exclusivamente, de atividades diferen-
tes daquelas da produção agropecuária e do extrativismo ve-
getal: comércio, serviços e atividades de produção industrial. 
A terceira condição refere-se ao fato da existência de 
um mínimode articulação entre os núcleos anteriormente re-
feridos articulação que se verifica no âmbito da circulação, 
etapa ~ecessária para que a produção exportada e importa-
da realize-se plenamente, atingindo os mercados consumidores. 
A articulação resultante da circulação vai dar origem 
e reforçar uma diferenciação entre núcleos urbanos no que 
se refere ao volume e tipos de produtos comercializados, 
às atividades político-administrativas, à importância como 
pontos focais em relação ao território exterior a eles, e ao 
tamanho demográfico. Esta diferenciação traduz-se em 
uma hierar'quia entre os núcleos urbanos e em especializa-
ções funcionais. 
Nos termos assim explicitados admitimos a existência 
de redes urbanas nos países subdesenvolvidos. Isto signifi-
ca que não aceitamos a tese da existência de rede urbana 
definida a partir de parâmetros arbitrários, que guardam 
uma forte conotação etnocêntrica. Tais parâmetros são, de 
um lado, o modelo formal de Christaller e, de outro, a re-
gra da ordem-tamanho de Zipf. Voltaremos a eles em bre-
ve. A idéia de rede urbana desorganizada, por outro lado, 
pressupõe a possibilidade de um dia ela tornar-se organiza-
da, semelhante à rede dos países desenvolvidos. 
8 
A nossa tese é que a rede urbana - um conjunto de 
centros funcionalmente articulados -, tanto nos países de-
senvolvidos como subdesenvolvidos, reflete e reforça as ca-
racterísticas sociais e econômicas do território, sendo uma 
dimensão sócio-espacial da sociedade. As numerosas dife-
renças entre as redes urbanas dos países desenvolvidos, en-
tre as dos subdesenvolvidos, e entre ambas, não são nenhu-
ma anomalia, mas expressão da própria realidade em sua 
complexidade .• 
2 
As abordagens dos geógrafos 
A partir do último quartel do século passado, quan-
do a geografia ganha status de disciplina acadêmica, e até 
o final dos primeiros 20 anos do presente século, quando 
finaliza o primeiro período de sua história moderna, a te-
mática da rede urbana emerge na multifacetada geografia 
alemã, entre os geógrafos possibilistas franceses, e entre 
os geógrafos britânicos envolvidos com o planejamento ur-
bano e regional. Também no bojo do determinismo ambien-
tal norte-americano aflora o tema em questão. 
O período que se estende de 1920 a 1955 caracteriza-
se, entre ouúos aspectos, pelo aumento do interesse pelo es-
tudo da rede urbana: algumas proposições teóricas e méto-
dos operacionais são estabelecidos, e amplia-se o número 
de estudos empíricos . É deste período que aparecem, entre 
outras, as proposições de Christaller e de Mark Jefferson. 
É a partir de 1955 que se verifica uma grande difusão 
dos estudos de redes urbanas. E não somente no âmbito 
da denominada geografia teorético-quantitativa que emer-
ge a partir de então, mas também com Pierre George, no 
bojo da geografia econômica derivada da escola possibilis-
ta. No Brasil é a partir de então que se iniciam os estudos 
sobre redes urbanas. 
10 
O desenvolvimento dos estudos sobre o tema em tela 
é contemporâneo, no após-guerra, da aceleração da urbani-
zação e da redefinição da divisão internacional do trabalho 
geradora de novas articulações funcionais e mudanças n~ 
rede urbana. Subjacente·a isto está a retomada da expansão 
capitalista e a difusão do sistema de planejamento em sua 
dimensão espacial, envolvendo a rede urbana. 
O tema da rede urbana tem sido abordado pelos geógra- · 
fos a partir de diferentes vias. As mais importantes dizem 
respeito à diferenciação das cidades em termos de suas fun-
ções, dimensões básicas de variação, relações entre tamanho 
demográfico e desenvolvimento, hierarquia urbana, e rela-
ções entre cidade e região. Estas vias não são necessariamen-
te excludentes entre si, interpenetrando-se mutuamente de di-
ferentes modos. Vale lembrar, por outro lado, que as aborda-
gens acima indicadas não são exclusivas dos geógrafos mas 
comp~rtilhadas com outros cientistas sociais, ainda q~e pe-
sem diferenças no modo como cada uma das vias é tratada. 
As classificações funcionais! 
Uma das mais tradicionais vias de estudo da rede urba-
na pelos geógrafos é aquela que se interessa pela classifica-
ção funcional das cidades . Esta abordagem tem como pres-
suposto a existência de diferenças entre as cidades no que 
se refere às suas funções. E que o conhecimento dessa dife-
renci~ção é relevante para a compreensão da organização 
espacml, na qual a divisão territorial do trabalho urbano é 
uma das mais expressivas características. 
Já em 1921 o geógrafo M. Aurousseau propõe uma " 
classificação de cidades em oito tipos , de acordo com a fun-
ção dominante: cidades de administração, defesa, cultura, 
1 
Sobre o tema veja-se MAYER, Harold & KOH N, Clyde, orgs . Readings 
m urban geography. Chicago, The University of Chicago Press, 1958. 
11 
produção, coleta, transferência, distribuição e recreação. 
Chauncy Harris, em 1943, ao estudar as cidades norte-ame-
ricanas, classifica-as de acordo com a atividade de maior im-
portância. Nove tipos de centros foram identificados: cida-
des industriais, de comércio varejista, de comércio atacadis-
ta, de transportes, mineração, educação , lazer, cidades di-
versificadas e com outras funções. 
A partir da década de 1950, os estudos sobre o tema 
em pauta passaram a receber um tratamento estatístico, ori-
ginando então resultados mais acurados. A contribuição de 
Howard Nelson é digna de nota pela precisão de sua classifi-
cação relativa a 897 cidades norte-americanas. O emprego 
em nove atividades foi considerado e, para cada uma das no-
ve distribuições relativas ao emprego nas cidades sob análi-
se, foram calculados a média e o desvio-padrão. Sempre que 
uma cidade apresentasse em uma atividade mais de um des-
vio-padrão acima da média, era classificada naquela ativida-
de. Um centro urbano poderia ser enquadrado de acordo 
com duas ou três atividades . Por outro lado, uma cidade 
foi rotulada como diversificada quando em nenhuma ativida-
de apresentava valor superior a um desvio-padrão acima da 
média. Deste modo vários tipos de cidade foram definidos, 
resultando em uma classificação funcionalmente complexa. 
A partir dos anos 50 procurou-se, ao lado da adoção 
de técnicas estatísticas, clarificar mais a questão das fun-
ções urbanas. Neste sentido vários autores fizeram o desdo-
bramento das atividades da cidade em básicas ou primárias, 
que são "exportadas" para fora, justificando assim a pró-
pria existência da cidade, e atividades não-básicas ou secun-
dárias, que se destinam à população urbana: exemplifica-
se com a atividade de uma loja cujas vendas são majorita-
riamente para consumidores residentes fora da cidade, e 
com um serviço que atende fundamentalmente à população 
urbana. 
A distinção em tela permite, sem dúvida, uma classifi-
cação mais acurada dos centros urbanos na medida em que 
12 
se elimi~am aquelas atividades não-básicas que existem por-
que as Cidades desempenham atividades básicas. E é relevan-
t~ em virtud.e do fato de haver estudos indicando que à me-
dida que a cidade aumenta de tamanho verifica-se o aumen-
to percentual de uma população empregada em atividades 
não-básicas. · 
. O estudo de Ullman e Dacey, onde se introduz o con-
ceito de. necessidades mínimas de população urbana, que 
se aproxima do conceito de atividade não-básica, constitui-
se em ~~a s~gnificativa contribuição para uma mais preci-
s~ ;Iassificaçao funcional de cidades. O estudo de Magnani-
m, por outro lado, sobre os centros urbanos de Santa Ca-
tarina, apoiado em dados referentes à população economi-
camente ativa do Censo Demográfico, constitui-se em exce-
lente exemplo de estudo sobre classificação de cidades utili-
zando o conceito proposto por Ullman e Dacey. 
Em relação a esta abordagem há numerosas críticas so-
br~ a natureza. dos dados utilizados, que são aqueles disponí-
veis, os conceitos e as técnicas estatísticas empregadas, bem 
como sobre a falta de objetivos geográficos definidos. No ca-
so do Brasil os dados do CensoDemográfico são incapazes 
de revelar algumas funções importantes das cidades brasilei-
ras, como a~uelas ligadas à drenagem da renda fundiária. 
Contudo , tms estudos colocam em evidência, com maior ou 
menor acurácia, a divisão territorial do trabalho no âmbito 
da rede ~rb~na . Podem assim suscitar numeroso'S questiona-
mentos , mcltando novas pesquisas sobre a rede urbana . 
As dimensões básicas de variação 
~ partir. das clas~ificações funcionais de cidades pas-
sa-se a pesqmsa das dimensões básicas de variação das re-
2 MAG~ANI ~I, Ruth L. C. As .cidades de Santa Catarina: base econômica 
e classJficaçao funciOnal. ReVIsta Brasileira de Geografia, 33 (1) , 1971. 
13 
des ou sistemas urbanos. Assim, em 1957, Howard Nelson, 
comentado por Horácio Capei, 3 comparou algumas caracte-
rísticas sociais entre centros urbanos com distinta especiali-
zação funcional, considerando o ritmo de crescimento da 
população , a estrutura etária, a escolaridade, a proporção 
de homens e mulheres na população ativa, as taxas de de-
semprego e a renda per capita. Constatou que estas caracte-
rísticas variavam entre cidades segundo as funções que de-
sempenhavam. 
Em realidade "o problema da classificação funcional 
converteu-se no problema de agrupamento das cidades se-
gundo suas características fundamentais com o fim de des-
cobrir tipos homogêneos" (p. 230), considerando-se não 
apenas as funções urbanas mas também outras característi-
cas sociais, econômicas e políticas. Esta conversão verifica-
e simultaneamente à expansão do emprego de técnicas esta-
tísticas em geografia; o uso de computadores, por sua vez, 
viabiliza a utilização de técnicas mais sofisticadas como a 
análise fatorial. 
O emprego desta técnica descritiva possibilita tratar si-
multaneamente um grande número de variáveis, agrupan-
do aquelas que estão fortemente correlacionadas entre si, 
o riginando assim fatores ou dimensões básicas de variação . 
lsto porque cada uma dessas dimensões é constituída por 
variáveis que, por outro lado, não se correlacionam com 
aquelas das outras dimensões. Em cada um desses fatores, 
cada cidade apresenta um score que é a sua posição ao lon-
go desta dimensão de variação. 
É com o estudo de Moser e Scott, datado de 1961, que 
, e inicia a procura sistemática das dimensões básicas de va-
riação dos sistemas urbanos. A partir de então numerosos 
outros estudos relativos a diversos países foram realizados, 
entre eles, os Estados Unidos, o Canadá, a Índia e a União 
3 De las funciones urbanas a las dimensiones básicas de los sistemas urba-
nos. Revista de Geografia, 6 (2), 1972. 
14 
Soviética. Visavam estes estudos descobrir empmcamente 
~ão apenas as dimensões básicas de variação de um especí-
fico sistema urbano, como também sua estabilidade ao lon-
go do tempo, e a existência de dimensões universais de va-
riação. Entre as diferentes dimensões básicas descobertas es-
tão aquelas referentes ao tamanho, especialização funcio-
nal, características sociais e crescimento demográfico. 
Mas que critérios nortearam a seleção de variáveis? Em 
alguns casos um conjunto muito grande de variáveis, sem ne-
nhuma base teórica explícita, foi considerado. Em outros pro-
curou-se ver as relações com o processo de desenvolvimento 
regional ou nacional a partir de alguns indicadores julgados 
pertinentes, e à luz de um dado corpo teórico: o modelo cen-
tro-periferia de John Friedmann foi então muito adotado co-
mo referencial teórico. Implícita nestes estudos estava a con-
cepção da cidade como centro difusor do desenvolvimento . 
No Brasil esta abordagem marcou muito os estudos so-
bre redes urbanas durante o período 1970-1977, período es-
te caracterizado pela adoção, entre muitos geógrafos, de 
técnicas quantitativas e dos modelos de desenvolvimento re-
~ional, e pelo grande envolvimento com o sistema de plane-
Jamento . Sobressaem os estudos de Faissol, 4 que considera-
ram vários conjuntos de cidades brasileiras . Estes estudos 
revelaram resultados consistentes entre si, indicando tipos 
de cent.ros que, em sua espacialização, definem regiões que 
foram mterpretadas segundo as proposições de Friedmann: 
regiões centrais, principal e secundária, e regiões periféricas . 
Já o estudo de Fredrich e Davidovich, 5 mais recente, 
está baseado em três dimensões de variação do sistema ur-
4 
Veja-se, por exemplo, FA!SSOL, Speridião. As grandes cidades brasileiras 
- dimensões básicas de diferenciação e relações com o desenvolvimento 
econômico: um estudo de análise fatorial. Revista Brasileira de Geografia 
32 (4), 1970. • 
5 
.FREDR!:H, Olga M. B. L. & DAVIDOVICH, Fany. A configuração espa-
Cial. do Sistema urbano brasileiro como expressão no território da divisão 
soc1al do trabalho. Revista Brasileira de Geografia, 4<t-(4), 1982. 
15 
bano: estrutura socioeconômica, ritmos de crescimento e 
formas de concentração espacial urbana. Ao considerar o 
sistema urbano como expressão territorial da divisão social 
tio trabalho , constitui uma recente e pouco usual interpreta-
ção a respeito do assunto. 
Tamanho e desenvolvimento 
A terceira via de abordagem considera a rede urbana 
como um todo, sem analisar ou classificar cada uma de 
suas cidades, como ocorre nas anteriores. Nesta abordagem 
es tabelece-se uma relação entre o tamanho das cidades de 
uma rede urbana e certos aspectos da vida econômica e so-
cial, tais como o desenvolvimento e sua difusão espacial, 
1 integração nacional e a existência de desequilíbrios inter-
nos. O pressuposto desta relação reside no fato de que é 
ntravés das cidades que as ligações econômicas internas e 
xternas se realizam, delas derivando o desenvolvimento: 
lamanho das cidades aparece então como uma expressão 
d desenvolvimento. 
A literatura sobre as relações entre tamanho da popula-
~· o urbana e desenvolvimento encerra uma dupla polêmi- -
·n entre os estudiosos do assunto. A primeira envolve, de 
11m lado , o conceito de primazia urbana e, de outro, a re-
"ra da ordem-tamanho da cidade. A segunda polêmica, 
QU está associada à primeira, refere-se à discussão entre 
<)S " modernistas" e os "tradicionalistas", conforme refere-
Berry em artigo na coletânea organizada por Faissol. 
O conceito de primazia urbana foi formulado inicialmen-
t por Mark Jefferson, em 1939. 6 Considerando o tamanho 
du população urbana em 51 países, encontrou-se que na maio-
rio deles a maior cidade era não só a capital político-adminis-
lnttiva, como também duas ou três vezes maior que a segun-
Tho Jaw f primate cities. Geographical Review, 29. 
16 
da cidade. Estes centros, denominados de cidades primazes, 
apresentavam uma proeminente importância econômica, cul-
tural e política. A primazia foi interpretada por Jefferson co-
mo "um símbolo de um intenso nacionalismo", e que naque-
las cidades estava a "alma e a mente da nação". A regulari-
dade com que esta primazia se verificava foi interpretada co-
mo uma lei geral e como um produto final de um processo 
de integração nacional. Entre os exemplos de primazia urba-
na estavam Grã-Bretanha, México, Dinamarca, Estados Uni-
dos e Bolívia, países com diferentes superfícies territoriais , 
níveis de desenvolvimento econômico e dinâmica urbana. 
A idéia de integração nacional estava baseada, pois, 
na presença de uma cidade primaz, independentemente do ti-
po de relações que esta mantinha com o restante do país. 
Os casos desviantes foram interpretados como sendo devidos 
a uma falta de sentimento nacional ou forte regionalismo, 
ou então a uma dependência política e econômica. Como 
exemplo aparecia a Espanha, onde um forte regionalismo im-
pedia o aparecimento de uma cidade primaz e conseqüente-
mente a integração nacional. A Índia, o Canadá e a Austrá-
lia constituem também casos desviantes, onde a dependência 
política agia no mesmo sentido. Cada uma apresentava duas 
cidades que rivalizavam entre si em termos de tamanho popu~ 
!acionai e importância econômica e cultural. Jefferson suge-
riu que estes países teriam como foco maiora cidade de Lon-
dres, capital e cidade primaz do então Império Britânico. 
Enquanto Jefferson considerou apenas a relação entre 
o tamanho das duas maiores cidades, outros autores consi-
deraram todo o con]unto de cidades como base para análi-
se da distribuição do tamanho dos centros urbanos. A pri-
meira contribuição, neste sentido, foi a de Auerbach em 
1913, que propôs um modelo de distribuição que, com G. 
K. Zipf, seria conhecido como a regra da ordem-tamanho. 7 
7 
Human behavior and the principle of least effort; an introduction to hu-
man ecology. Cambridge, Addison-Wesley, 1949. 
17 
Segundo Zipf, a distribuição do tam~~ho das ~id~des 
nade ser vista através de uma equação de senes harmomc~s. 
tamanho da cidade p de ordem r é igual à populaçao 
da cidade I, a maior delas, dividida pela sua or_d~m r ~lev~­
da a um expoente q que foi encontrado_ ser ~r?ximo a u~l­
dade. A fórmula é pr =~.A expressao graflca desta dis-
tribuição é uma linha ret~q com um ângulo de 45o num pa-
pel duplo logarítmico, onde na abscissa está a ordem d,as 
•idades, e na ordenada seus tamanhos: . . -
A explicação que Zipf deu às distnbmçoes segun~o 
a da Ordem-tamanho tem como ponto central o Pnn-
ll regr 'l'b · d 
•{pio do Menor Esforço, resultante de u~ e~u.l 1 r!o e 
f' rças opostas, a da Unificação e a da Diversiflca~ao. A 
primeira levaria a uma concentração. da p_opulaçao em 
lima única cidade, e a segunda a uma dispers~o da popula-
(,: o em cidades do mesmo tamanho . Estes_ se:I~m ca.sos ex-
tremos, respectivamente com q igu~l ao mflmto e Igual. a 
'1. •ro Com q igual a 1 a série de cidades apresentar-se-la 
,;H s~qüência 1, 1/2, 1/3, 1/4 ... 1/~ ?u 100, 50, .33, 25 ... 
l'ura Zipf, com esta distribuição eqmhbrad~, a ur~Idade na-
•lonal estava mantida através de u~ conJunto mtegr.ad~ 
d cidades . A primazia seria para Zlpf um caso. possivel. 
o . rreria todas as vezes que o valor q fosse maior que a 
unidade . . . d 
A partir dos anos 50, quando se venflca a reto:na a 
I t expansão capitalista e a questão do subdesenvolvimen-
1 o aparece, as duas formulações são col?c~da_s em confro_n-
1 >. O desenvolvimento é associado à existencm de u~~ dls-
1 !'l buição do tamanho da cidade segundo a p~oposi~ao d~ 
Zlpf; o subdesenvolvimento, por outro .lad?, e associado a 
lstência da primazia urbana. No pnmeiro cas?·. forças 
• nômicas multidirecionadas, espacialmente aleatonas, afe-
11\ri m toda a rede urbana. No segun~o: estas forças atua-
l'! un concentradamente, afetando um umco c~ntro, que ~re-
11 tria toda a riqueza para si, por isso tendo Sido denomma-
! I 
18 
do de cidade "parasítica": a rede urbana por ela comanda-
da foi vista como sendo desequilibrada. 
Numa época em que o sistema de planejamento esta-
va em ascensão, a aceitação das teses acima indicadas im-
plicaria em se ter um modelo normativo que iluminaria 
uma meta a ser alcançada, a de vencer o subdesenvolvi-
mento. Neste sentido modelos evolutivos foram formula-
dos. Um deles previa a passagem gradativa da primazia pa-
ra uma rede de cidades de acordo com a regra da ordem-
tamanho, na medida em que um dado país evoluísse do 
subdesenvolvim~nto para o desenvolvimento. Outro, mais 
complexo, admitia uma etapa anterior caracterizada pela 
existência de uma situação semelhante àquela da regra de 
Zipf. Seguia-se uma etapa marcada pela crescente ,Prima-
zia à medida que o processo de desenvolvimento se verifi-
cava. Numa fase mais moderna o padrão de tamanho de 
cidades assumiria novamente a regra formulada por Zipf: 
neste caso temos uma seqüência que segue o esquema equi-
líbrio-desequilíbrio-equilíbrio. Comum a todos os modelos 
estava a tese de que o processo de desenvolvimento dos 
países centrais repetir-se-ia em breve nos países subdesen-
volvidos. 
A polêmica a respeito da primazia e da regra da ordem-
tamanho ampliou-se com a discussão entre "modernistas" 
e "tradicionalistas". Os primeiros afirmam que o desenvol- · 
vimento nacional se encarregará de afetar a rede urbana, es-
tabelecendo um equilíbrio. Admitem que no começo do pro-
cesso de desenvolvimento haverá um desequilíbrio, com con-
centração de investimentos em uma só grande cidade, mas, 
na medida em que o desenvolvimento prossegue, verifica-
se um efeito de difusão (spread ejjects, trickle down) que 
atinge toda a rede urbana. Este processo de difusão, ou os 
impulsos de mudança econômica, são transmitidos do se-
guinte modo: 
(a) das metrópoles da core area para as metrópoles 
da periferia; 
19 
(b) dos centros de mais alta hierarquia para os de mais 
baixa num padrão de "difusão hierárquica"; 
·(c) dos ce~tros urbanos para as suas áreas de influência. 
Já os "tradicionalistas" admitem que os argumentos 
dos "modernistas" não convencem, não sendo possível se 
pensar na reprodução dos processos históricos, tal _com? 
ocorreu nos Estados Unidos, por exemplo, nos atua1s pai-
s subdesenvolvidos, pois as condições históricas são ou-
tras. É necessário que haja uma política explícita e di~igi­
(ln para se conter o crescimento exagerado da grande Clda-
d · a "inchação" das grandes metrópoles primazes. 
' Aparecem então as idéias de descentralização p~ra no-
vos centros de crescimento, dos pólos de desenvolvimento 
no Brasil criou-se, mais tarde, na década de 1970, a ex-
1 I' ssão cidades de porte médio - e da ação do Estado vi-
Indo um desenvolvimento que seria equilibrado tanto no 
1 luno social como espacial, aí inclu~ndo-se a r~d~ urbana. 
A teoria dos pólos de desenvolVImento, as 1dems de des-
' ntralização para as cidades de porte médio tornaram-se co-
l\1 luche nos países do Terceiro Mundo. Associ~~o a est~s 
I 1 i s recupera-se e vulgariza-se o conceito e a pratlca do dls-
1111 industrial expressão física e funcional, à escala intraur-
h ma, do pólo de desenvolvimento e da cidade de porte ~édio. 
Os estudos sobre as relações entre tamanho das c1dades 
d s nvolvimento estão, de uma forma ou de outra, vincula-
ll · aos interesses do planejamento em sua dimensão espa-
11 : o vigor com que o tema é privilegiado configura fase 
1 prestígio ou de crise do sistema de planejamento capitalis-
1 1. No caso brasileiro a primeira metade da década de 1970 
1 11 r !ativamente pródiga de estudos sobre o tema em pauta. 
hierarquia urbana 
studos sobre hierarquia das cidades são os mais 
n is c numerosos entre aqueles sobre redes urbanas 
20 
a que se dedicaram os geógrafos. Deriv m I (( li stl namen-
tos sobre o número, tamanho e distribuiç o I ts cidades e, 
implicitamente, sobre a natureza da dif r nci 11,: o ntre elas. 
Os numerosos estudos, teóricos e emplricos, pr curam, 
em realidade, compreender a natureza da t' cJ urbana se-
gundo um ângulo específico que é o da hi rarquia de seus 
centros . 
A teoria das localidades centrais, formulada pelo geó-
grafo alemão Walter Christaller, em 1933, c n titui a mais 
fértil e conhecida base teórica sobre o tema. ntretanto , o 
interesse pela hierarquia urbana é muito anterior a Christal-
ler. Foi um banqueiro francês, Richard Cantillon, que em 
1755 produziu o que se poderia considerar como sendo a 
primeira teoria sobre hierarquia urbana: tentando racionali-
zar em termos de tempo e espaço seus negócios bancários, 
ressalta a natureza hierárquica das cidades . Com Jean Rey-
naud, em 1841, aparece uma formulação similar à de Chris-
taller . De certo modo é semelhante à contribuição do enge-
nheiro León Lalanne que, em 1863, propôs um modelo so-
bre a organização espacial das linhas ferroviárias, cujos 
nós de circulação, as cidades , estruturavam-se de modo hie-
rárquico. 
A sociologia rural norte-americana do começo do sécu-
lo, com Galpin e Kolb, e o planejamento urbano e regio-
nal inglês, após a ?rimeira Guerra Mundial, consideraram 
também o tema que, em breve, seria tratado sistematica-
mente por Christaller. Geógrafos como Hans Bobek e Ro-
bert Dickinson abordaram também a temática da hierar-
quia urbana durante as décadas de 1920 e 1930. 
Por que este interesse? Com o capitalismo, o proces-
so de diferenciaçãodas cidades se acentua, aí incluindo-se 
a hierarquização urbana: a criação de um mercado consu-
midor, a partir da expropriação dos meios de produção e 
de vida de enorme parcela da população, e a industrializa-
ção levam à expansão da oferta de produtos industriais e 
de serv iç s. Es ta oferta , por sua vez, se verifica de modo 
21 
espacialmente desigual, instaurando-se então a hierarquia 
das cidades. Esta, por sua vez, suscita ações desiguais por 
parte dos capitalistas e do Estado: daí o interesse em com-
preender a sua natureza. 
As proposições de Christaller 
Vejamos agora as proposições de Christaller. Segun-
do ele existem princípios gerais que regulam o número, ta-
manho e distribuição dos núcleos de povoamento: grandes 
médias e pequenas cidades, e ainda minúsculos núcleos se~ 
mi-rurais, todos são considerados como localidades centrais. 
Todas são dotadas de junções centrais, isto é, atividades 
de distribuição de bens e serviços para uma população ex-
terna, residente na região complementar (hinterlândia, área 
de mercado, região de influência), em relação à qual a loca-
lidade central tem uma posição central. A centralidade de 
um núcleo, por outro lado, refere-se ao seu grau de impor-
tância a partir de suas funções centrais : maior o número de-
las, maior a sua região de influência, maior a população ex-
terna atendida pela localidade central, e maior a sua centra-
lidade. 
Christaller define ainda dois outros conceitos, o de al-
cance espacial máximo (maximum range) e o de alcance espa-
cial mínimo (minimum range threshold). O primeiro refere-
se à área determinada por um raio a partir da localidade cen-
tral: dentro desta área os consumidores efetivamente deslo-
cam-se para a localidade central visando a obtenção de bens 
e serviços. A área em questão constitui a região complemen-
tar. Para além dela os consumidores deslocam-se para ou-
tros centros que lhe estão mais próximos, implicando isto me-
nores custos de transporte. O alcance espacial mínimo, por 
sua vez, compreende a área em torno de uma localidade cen-
tral que engloba o número mínimo de consumidores que são 
suficientes para que uma atividade comercial ou de serviços 
uma função central , possa economicamente se 'instalar . ' 
1" 
I 
22 
A partir do alcance espacial máximo e mínimo verifi-
ca-se uma diferenciação da oferta de bens e serviços . Aque-
les que são consumidos com grande freqüência, diária ou se-
manalmente, necessitam de reduzido alcance espacial míni-
mo. Poucas pessoas, residentes nas proximidades imediatas 
da localidade central, são suficientes para justificar a ofer-
ta deles. O alcance espacial máximo deles é também reduzi-
do: a partir de uma relativamente pequena distância da loca-
lidade central os custos de transportes tornam-se muito ele-
vados face aos custos dos bens e serviços que são relativa" 
mente baixos. Há vários outros centros que distribuem estes 
bens e serviços: sua oferta é generalizada em numerosas lo-
calidades centrais que distam próximas umas das outras. 
Os bens e serviços que, por sua vez, são consumidos 
com uma menor freqüência, mensalmente ou de três em 
três meses, por exemplo, necessitam de um maior alcance 
espacial mínimo: como o número necessário de pessoas pa-
ra justificar a oferta deles é mais elevado, a área que con-
tém essa população é mais ampla. Por outro lado, estes 
bens e serviços suportam custos de transportes mais eleva-
dos, apresentando, por isso, um maior alcance espacial má-
ximo. Como conseqüência, poucas são as localidades cen-
trais que oferecem estes bens e serviços; elas estão, assim, 
mais distanciadas entre si. 
Para cada produto ou serviço haveria, em princípio, 
um alcance espacial específico. No entanto, aqueles que 
apresentam alcances espaciais semelhantes tendem a ser ofe-
recidos nas mesmas localidades centrais: a co-presença de-
les acaba compensando uma possível diminuição de lucros 
e criando novas condições de existência de atividades: tra-
ta-se de economias de aglomeração. 
Estabelece-se uma hierarquização da oferta de bens e 
serviços: o quadro abaixo apresenta um exemplo onde indi-
ca-se a hierarquia urbana - expressa por denominações 
através das quais as localidades centrais são usualmente re-
feridas - e funções centrais hipotéticas . 
Exemplo hipotético de hierarquia urbana 
e funções centrais 
Centros Funções centrais 
Metrópole regional abcd efgh ijk l mnop 
Capital regional efgh ijkl mnop 
Centro sub-regional ijkl mnop 
Centro da zona mnop 
Centro local 
23 
qrst 
qrst 
grst 
qrst 
qrst 
A análise desse quadro possibilita detectar a natureza 
da hierarquia urbana. Em primeiro lugar deriva diretamen-
te da hierarquia das funções centrais. A metrópole regional 
oferece a gama completa de bens e serviços que naquele ti-
po particular de sociedade é consumida pela população 
em razão de seu nível de renda e padrão cultural. A metró-
pole oferece um conjunto de bens e serviços, abcd, que so-
mente ela está apta a oferecer: são aqueles consumidos me-
nos freqüentemente, apresentando mais amplos alcances es-
paciais máximos. Mas também oferece bens e serviços de 
consumo mais freqüentes. Em realidade a metrópole ofere-
ce, entre outros, bens e serviços de demandas tão distintas 
como microcomputadores, geladeiras, calçados, artigos de 
armarinhos e alimentos em conserva; ou então cirurgião 
plástico, oftalmologista, pediatra e clínico geral. 
A capital regional, por sua vez, oferece os bens e servi-
ços efgh a qrst: o primeiro conjunto caracteriza este nível 
hierárquico, não sendo encontrados nos centros de meno-
res níveis hierárquicos. Os bens e serviços ijkl definem o 
centro sub-regional, enquanto o conjunto mnop o centro 
24 
de zona. O centro local, finalmente, oferece apenas os bens 
e serviços qrst, de consumo muito freqüente e, por isso, 
de menores alcances espaciais máximo e mínimo. 
Uma primeira observação conclusiva se impõe: a hierar-
quia das localidades centrais expressa um padrão hierárqui-
co sistemático e acumulativo de funções centrais: à medida 
que se eleva o . nível de hierarquia verifica-se um acúmulo, 
em cada nível, das funções centrais dos níveis inferiores 
mais algumas que definem o nível hierárquico em consideração. 
A localidade central de nível hierárquico mais eleva-
do, por outro lado, possui ampla região de influência: ne-
la estão contidas as regiões de influência das capitais regio-
nais, os centros de nível imediatamente baixo. Estas últi-
mas regiões, por sua vez, contêm as hinterlândias dos cen-
tros sub-regionais, e assim por diante. Assim, a hierarquia 
sistemática e acumulativa de funções e localidades centrais 
associa-se ao esquema de centros e regiões de influência sis-
tematicamente encaixados os menores nos maiores. 
As figuras la, b e c procuram exemplificar o que foi 
exposto. Referem-se à região de influência de Bauru, uma 
capital regional do Planalto Ocidental paulista. As informa-
ções aí contidas são relativas ao ano de 1978, tendo como 
fonte o estudo "Regiões de influências das cidades". A fi-
gura I a mostra que, em relação aos bens e serviços típicos 
da capital regional, caminhões pesados e oftalmologista, 
por exemplo, Bauru atua em uma relativamente ampla hin-
terlândia. Sua atuação espacial engloba os centros sub-regio-
nais de Jaú, Botucatu, Avaré e Lins, e suas respectivas hin-
terlândias. 
A figura I b, por outro lado, indica que em relação 
aos bens e serviços típicos de centros sub-regionais, trato-
res e pediatra, Bauru atua em uma hinterlândia menor, pos-
sibilitando que os quatro supramencionados centros sub-re-
gionais exerçam seus papéis como tais. Finalmente a figu-
ra I c mostra que, em relação aos bens e serviços típicos 
de centros da zona, eletrodomésticos e hospital geral, a atua-
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28 
ção de Bauru se reduz mais ainda, havendo também a redu-
ção da região dos centros sub-regionais. Numerosos cen-
tros de zona, Bariri, Conchas, Duartina e Getulina, entre 
outros, passam a atuar nos espaços de atuação dos centros 
sub-regionais e da capital regional. 
A figura 2, por sua vez, mostra, de um modo não de-
sagregado, a rede de localidades centrais em torno de Bau-
ru. Verifica-se um encaixamento sistemático, na área de in-
fluência dos centros de maior nível hierárquico, da área da-
quelas de nível hierárquico menor. Assim, na região de Bau-
ru estão encaixadas as regiões de Jaú, Botucatu, Avaré e 
Lins. Na região de Botucatu, por exemplo, aninham-se aque-
las de Conchas e São Manuel. 
Convém agora colocar em evidência dois outros aspec-
tos da natureza da hierarquia urbana, os quais podem ser 
inferidos através da análise da figura 2. Maior o nível hie-
rárquico de uma localidade central, menor o seu número e 
mais distanciada está ela de uma outra de mesmo nível. As-
sim, na região de Baúru há uma única capital regional, qua-
tro centros sub-regionais e mais de uma dezena de centros 
de zona que estão pouco distanciados entre si. Em segun-
do lugar, maior o nível hierárquico de um centro, maior a 
sua hinterlândia e maior o total de sua população atendi-
da: na região de Bauru há muito mais população do que 
na de J aú que nela está contida. 
Outro aspecto da natureza da hierarquia urbana é o 
de que, como em uma localidade central de mais alto nível 
hierárquico, o número de funções centrais é maior do que 
em um centro de nível inferior, e isto representa maior nú-
mero de empregos; verifica-se que a população total da ci-
dade de hierarquia mais elevada é maior que a dos demais 
centros: Bauru tem população maior do que a de Lins, e es-
ta maior que a de Getulina. 
Em resumo, maior o nível hierárquico de uma localida-
de central, maior o número de funções centrais, sua popula-
ção urbana, sua região de influência e o total da população 
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30 
servida. Inversamente, maior o nível hierárquico, menor o 
número de centros do mesmo nível e mais distanciados es-
tão entre si. 
Estes são os aspectos mais importantes da teoria das lo-
calidades centrais, tal qual Christaller indicou. Estes aspec-
tos, contudo, quando se tornam reais, ou seja, quando se 
considera uma rede de localidades centrais concreta, assu-
mem diferentes dimensões. A literatura sobre este assunto 
é muito vasta, e o próprio Christaller antecipou muitos dos 
resultados obtidos. Vale, no momento, indicar que a varia-
bilidade deles resulta, em grande parte, de combinações dis-
tintas dos seguintes elementos que são variáveis e não cons-
tantes: densidade e estrutura demográfica, renda, tanto 
em termos de média como de sua distribuição social e espa-
cial, padrões culturais que implicam em certos hábitos de 
consumo e preferências nos deslocamentos espaciais, pre-
ço dos produtos, facilidades de circulação, heranças do pas-
sado em termos de localização dos centros, e dinâmica re-
gional. Voltaremos em breve a este assunto, considerando 
um pouco os países subdesenvolvidos. 
A figura 3 refere-se aos arranjos espaciais propostos 
por Christaller. São trê's e dizem respeito aos modos como 
as redes de localidades centrais, sob certas condições que 
pressupõem uma forte abstração do mundo real, foram es-
truturadas. Segundo Christaller, a primeira possibilidade ba-
seia-se no princípio de mercado: nele verificam-se, para ca-
da centro de um dado nível hierárquico, três centros de ní-
vel imediatamente inferior, ou seja, o multiplicador K é 
igual a 3. Nesta possibilidade teórica o número de centros 
da rede é o menor possível. 
O princípio de transporte oferece outra possibilidade. 
A organização espacial da rede é de tal modo que existe 
uma minimização do número de vias de circulação: os prin-
cipais centros alinham-se ao longo de poucas rotas. Em com-
pensação o número de centros aumenta, pois o multiplica-
dor K é igual a 4. O princípio administrativo, por sua vez, 
FIG.3-REDE DE LOCALIDADES CENTRAIS: 
a) Princípio de 
Mercado 
K = 3 
OS ESQUEMAS DE CHRISTALLER 
bl Princípio de Transporte c) Pr incipio Admin istrativo 
K = 7 K = 4 
31 
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111 
111 
I 
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32 
apresenta a vantagem de que não há superposição de áreas 
de influência, como ocorre nos dois modelos anteriores. 
Contudo, para que isto ocorra, verifica-se o aumento do nú-
mero de centros, pois o multiplicador K é igual a 7. 
Voltemos agóra à figura 2, sobre a rede de localidades 
centrais em torno de Bauru. Há uma relativa aproximação 
da rede teórica estruturada segundo o princípio de merca-
do: mais ou menos em torno de Bauru há quatro centros 
sub-regionais. A figura 4, por outro lado, relativa à região 
de influência de Marília, uma capital regional não muito 
distante de Bauru, mostra um exemplo do princípio de trans-
porte verificado no mundo real: a capital regional, os cen-
tros sub-regionais e quase todos os centros da zona estão 
alinhados ao longo da via férrea que corta aquele setor do 
Planalto Ocidental paulista. Este padrão linear resulta, em 
grande parte, do processo de ocupação da região, tal co-
mo Monbeig8 descreveu magnificamente. Em realidade são 
numerosas as redes regionais de localidades centrais que, 
no Brasil, foram fortemente influenciadas pela circulação, 
originando um padrão linear de centros. 
Os países subdesenvolvidos 
Vejamos agora os países subdesenvolvidos. Como es-
tão integrados à economia capitalista, produzindo e com-
prando mercadorias, dispõem de uma rede de cidades cujos 
centros são, nos casos mais simples, locais de comercializa-
ção de produtos rurais exportáveis e para o limitado merca-
do interno, e distribuidores de bens e serviços. Enquanto lo-
cais de distribuição, são localidades centrais. O limitado ní-
vel de demanda e a pequena mobilidade espacial da maior 
parte da população são responsáveis pelas características 
concretas que assumem as redes de localidades centrais nes-
8 MoNBEIG, Pierre. Pioneiros e fazendeiros de São Paulo. Trad. de Ary 
França e Raul de Andrade e Silva. São Paulo, Hucitec-Polis, 1984. 
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34 
ses países. Acrescenta-se ainda a disponibilidade de pessoas 
não absorvidas pelo mercado formal de trabalho, que leva 
à criação de certas atividades terciárias e de produção que 
apresentam grande importância, de um lado, como estraté-
gia de sobrevivência e, de outro, na estrutura da distribui-
ção de bens e serviços. 
O baixo nível de demanda, resultado da superexplora-
ção da força de trabalho ou da persistência de um setor 
agrícola camponês, e a limitada mobilidade espacial podem 
originar pelo menos trêspossibilidades concretas de estrutu-
ração de redes de localidades centrais nos países subdesen-
volvidos. 
Em primeiro lugar, em razão da demanda de bens e 
serviços de consumo freqüente de fato existir, pois trata-se 
de produtos e serviços necessários ou imprescindíveis à re-
produção da população, verifica-se que o número de pe~ue­
nos centros é relativamente elevado. São centros loca1s e 
de zonas. A pequena mobilidade espacial da população le-
va ao aparecimento de numerosos desses centros, pouco dis-
tantes entre si . A capacidade de oferta de bens e serviços 
desses centros é muito inferior àquela dos centros similares 
de regiões onde o nível de demanda e a mobilidade espa-
cial são maiores. 
Ao lado dos numerosos pequenos centros, verifica-se 
a ausência de centros intermediários como, por exemplo, 
os centros sub-regionais. As capitais regionais, por sua vez, 
são menos numerosas. A ausência ou menor ocorrência de 
centros intermediários é indicadora do baixo nível de de-
manda da maior parte da população. Como eles devem ofe-
recer bens e serviços de menor freqüência de consumo, ca-
racterizados por serem menos necessários ou mesmo supér-
fluos, e caros, e para estes bens e serviços a demanda ser 
praticamente inexistente, tais centros não têm condi~ões 
de emergir. Há então um achatamento da rede de locahda-
des centrais pela ausência ou mínima ocorrência de centros 
de escalões hierárquicos intermediários. A metrópole regio-
35 
nal, por sua vez, aparece como sendo relativamente rica, 
pois acaba sendo o único centro que apresenta uma comple-
xa gama de bens e serviços, distanciando-se muito, neste as-
pecto, dos demais . A relativa grandeza metropolitana deve-
se ao fato de que, em parte, nela residem aqueles que dis-
põem de renda que lhes permitem consumir bens e serviços 
de consumo mais raro, caros e sofisticados. 
Uma segunda possibilidade, que não exclui a primei-
ra, ao contrário, convive com ela, é aquela onde emergem 
os mercados periódicos. Definem-se eles como sendo aque-
les núcl~os de povoamento, pequenos, via de regra semi-ru-
rais, que periodicamente transformam-se em localidades 
centrais: uma ou duas vezes por semana, de cinco em cin-
co dias, durante o período de safra, ou de acordo ainda 
com outra periodicidade. Fora dos períodos de intenso mo-
vimento comercial voltam a ser pacatos núcleos rurais, com 
a maior parte da população engajada em atividades primárias. 
Nos dias de mercado o pequeno núcleo transforma-se 
em um centro de mercado. Vendedores dos mais variados 
produtos, artesãos e prestadores de diversos serviços ama-
nhecem no centro com suas mercadorias e instrumentos de 
trabalho. São provenientes de outro pequeno núcleo onde 
no dia anterior atuaram em seus ofícios, ou de um centro 
m~tior onde vendem e exercem quase permanentemente a 
mesma atividade . Alguns vieram da zona rural onde dedicam-
se às atividades primárias: vieram vender sua produção e 
comprar alguns bens que não produzem. Utilizando tropas 
de burros, a cavalo, em carroças, em caminhões e utilitários, 
em embarcações e mesmo a pé, vendedores e compradores 
dirigem-se ao núcleo em seus dias de mercado. Estes são ain-
da os dias em que as pessoas se encontram, sabem das novi-
dades e vários eventos sociais, culturais e políticos se realizam. 
Os mercados periódicos representam uma forma de sin-
cronização espaço-temporal das atividades humanas, isto é, 
os dias de funcionamento de cada mercado acham-se articu-
lados aos dos demais numa lógica de tempo e espaço, en-
36 
volvendo o deslocamento periódico e sincronizado dos par-
ticipantes de um dado mercado. Em outros termos, os co-
merciantes e prestadores de serviços reúnem-se a cada dia 
em um determinado núcleo: para aí converge a clientela 
de uma área próxima ao núcleo. 
A existência dos mercados periódicos parece residir, 
de um lado, no fato de o alcance espacial mínimo ser supe-
rior ao· alcance espacial máximo. Em outras palavras, o li-
mite da área que engloba o número de pessoas necessárias 
para que os comerciantes se fixem encontra-se, em razão 
de muito baixo nível da àemanda e da pequena mobilida-
de espacial, além do limite até onde os consumidores conse-
guem efetivamente deslocar-se. Em situações como esta, ar-
gumenta Stine comentado por Corrêa, a alternativa para 
os comerciantes é tornarem-se móveis, percorrendo sistema-
ticamente os núcleos de povoamento e estabelecendo-se 
em cada um deles periodicamente. De outro lado os merca-
dos periódicos existem em razão de padrões culturais que 
persistem em áreas onde as condições econômicas possibili-
tariam uma localização fixa dos comerciantes. 
A figura 5 refere-se a um setor do Agreste e Sertão 
de Alagoas. Ali, como em todo o Nordeste brasileiro, as 
"feiras" são instituições econômico-culturais tradicionais, 
constituindo-se na forma nordestina de realização de uma 
grande parcela das trocas. A periodicidade das "feiras" 
confere-lhes ó caráter de mercados periódicos que se verifi-
cam não apenas em minúsculos centros como Coité do 
Noia e Lagoa da Canoa, mas em centros de zona como Ba-
talha e mesmo em uma capital regional como Arapiraca, 
uma cidade com mais de 80 000 habitantes. Sugere-se que 
sejam empreendidos estudos sistemáticos sobre as "feiras" 
nordestinas: certamente contribuirão muito para a compreen-
são da natureza e significado da rede urbana regional. 9 
9 CORRÊA, Roberto Lobato. A rede de localidades centrais nos países sub-
desenvolvidos. Revista Brasileira de Geografia, 50 (l ), 1988. 
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38 
À limitada demanda e pequena mobilidade espacial 
acrescenta-se a disponibilidade de pessoas que, como estra-
tégia de sobrevivência, criam atividades terciárias e de pro-
dução que, segundo Milton Santos, apresentam, entre ou-
tros aspectos, as seguintes características: trabalho intensi-
vo, organização burocrática primitiva, capitais reduzidos, 
pequenos estoques, preços sujeitos à forte barganha, reutili-
zação de produtos e elevada margem de lucro por unidade. 
Tais atividades compõem o circuito inferior da economia 
dos países subdesenvolvidos, o qual convive de modo depen-
dente com o circuito superior, composto de atividades mo-
dernas. 
É conveniente lembrar que muitos dos participantes 
dos mercados periódicos podem ser classificados como in-
tegrantes do circuito inferior: deste modo periodicidade 
do mercado e circuito inferior não são mutuamente exclu-
dentes. 
Cada um dos circuitos apresenta a sua própria espacia-
lidade. Em relação à rede de localidades centrais os dois cir-
cuitos estão presentes, estruturando-a de modo que cada 
centro atue simultaneamente atravésde ambos, dispondo 
assim de duas regiões de influência. 
A figura 6 mostra as duas regiões de influência de cen-
tros de três níveis hierárquicos, local, intermediário e metro-
politano. O centro local atua sobretudo através do circui-
to inferior. É através do circuito superior que se verifica a 
atuação espacial máxima da metrópole. Contudo, como lem-
bra Santos, a atuação metropolitana n;este circuito não se 
dá de modo espacialmente contínuo, mas sim descontinua-
mente. Isto se deve ao fato de que o circuito superior está 
voltado para as atividades modernas e população de renda 
elevada. E como estas atividades e população não se distri-
buem homogeneamente por todo o território, verifica-se a 
referida descontinuidade. O centro intermediário, por sua 
vez, apresenta alcance espacial máximo em função de seu 
circuito superior. 
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40 
A importância do tema em questão é enorme. Estudos 
empíricos realizados no Brasi~ muito contribuíram para a 
compreensão da magnitude e significado, em cada uma das 
regiões do país, dos dois circuitos da economia. 
As relações cidade-região 
Ao contrário das abordagens anteriores, o estudo das 
relações cidade-região tem sido empreendido principalmen-
te pelos geógrafos europeus, particularmente os franceses. 
Este tema constitui-se, em realidade, em uma transforma-
ção da clássica temática cidade-campo. 
Cidade e campo têm se constituído, ao longo da história 
das ciências sociais, em um dos mais significativos temas de 
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interesse de historiadores, sociólogos, antropólogos, econo-
mistas e geógrafos. Este interesse advém, de um lado, da cren-
ça empirista de que cidade e campo constituem as duas meta-
des em que a sociedade pode ser dividida e analisada. De ou-
tro, da crença marxista de que cidade e campo são dois ter-
mos de uma contradição em torno da qual a história se faz. 
Na primeira vertente de tratamento do tema destacam-
se, entre os não geógrafos, as construções dicotômicas cida-
de-campo e o continuum rural-urbano. No primeiro caso es-
tabelece-se um contraste em que a cidade. aparece como sinô-
nimo de desenvolvimento e o campo de atraso. Civitas e So-
cietas, Gesellschajt (sociedade) e Gemeinschajt (comunidade), 
racional e tradicional são alguns dos termos que designam es-
te contraste. Da discussão sobre a dicotomia cidade-campo 
emerge a tese do continuum rural-urbano, onde entre os dois 
pólos há uma gradação que traduz um processo efetivo e con-
tínuo de mudança do mundo rural para a grande cidade: esta 
mudança pressupõe a existência de relações cidade-campo. 10 
10 REI SSMAN, Leonard. The urban process; cities in industrial societies. 
New York, The Free Press, 1970. 
41 
A segunda vertente considera a gênese e a evolução 
das relações cidade-campo no âmbito da crítica contra a te-
se da autonomia da consciência dos homens e de seu papei 
na determinação da vida. Cidade e campo aparecem como 
termos antagônicos ao longo da história. As relações entre 
ambos são vistas em termos da dinâmica social, culminan-
do com a "vitória da cidade sobre o campo" a partir da 
grande indústria, como afirmam Marx e Engels na Ideolo-
gia alemã. 
A abordagem geográfica ao tema tem sido feita consi-
derando as relações entre cidade e região, isto é, uma gran-
de cidade e sua hinterlândia constituída por centros urba-
nos menores e áreas rurais, em muitos casos diferenciadas 
em termos de estruturas e paisagens agrárias. 
Foi verificado que, de acordo com o tipo de socieda-
de, as relações entre cidade e região não se processam do 
mesmo modo e com a mesma intensidade. No entanto, num 
esforço de síntese, como fez Pierre George, pode-se apon-
tar em suas linhas gerais estas relações, lembrando, porém, 
que refletem uma visão citadina da questão. As relações 
são indicadas a seguir; como se pode verificar, algumas de-
las constituem objeto de abordagens anteriormente apresen-
tadas : 
(a) A atraÇ\ãO urbana sobre a população regional. 
(b) A comercialização pela cidade dos produtos rurais. 
(c) A drenagem urbana da renda fundiária. 
(d) A distribuição pela cidade de investimentos e trabalho. 
(e) A distribuição de bens e serviços . 
Diversos ·estudos mostraram, por outro lado, que as 
diferentes combinações e especificidades regionais das rela-
ções acima apontadas levam a um duplo resultado que sin-
tetiza o conjunto delas: a cidade é um espelho de sua re-
gião, ou então esta é o resultado de uma ação motora por 
parte da cidade. Assim, Libreville, capital do Gabão, estu-
dada por Lasserre, encontra-se no primeiro caso, enquan-
to no segundo está a região lionesa, forjada pelo capital 
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da burguesia de Lyon, conforme mostra Labasse. Outros 
autores como Juillard apontam que os resultados das rela-
ções entre cidade e região podem se traduzir em. dependên-
cia, complementação ou concorrência entre ambas, ou, ai~­
da, que é possível identificar, a partir das relações entre CI-
dade e região, uma tipologia de cidades européias: villes 
rentieres du sol, villes insulaires e villes urbanisantes. 
11 
O trabalho de Dugrand sobre a região vitivinicultora 
do Baixo Languedoc, no Sul da França, é um dos mais sig-
nificativos exemplos de estudo abordando o tema em ques-
tão. Inspirado em parte nas proposições de Pierre George, 
serviu de orientação geral para o estudo sobre o Sudoeste 
paranaense, 12 uma área de pequenos produtores originários, 
em grande parte, do Rio Grande do Sul. 
Vejamos agora que sugestões foram feitas para se con-
siderar cada uma das relações acima apontadas. 
A cidade, especialmente a metrópole, exerce uma atra-
ção sobre a população de sua região de influência: seu cres-
cimento demográfico é, assim, superior ao seu crescimen-
to vegetativo. Esta atração define migrações definitivas nas 
quais os migrantes acabam tornando-se citadinos. Mas a 
metrópole exerce também uma atração cotidiana, pois mo-
radores de núcleos próximos nela encontram um relativa-
mente grande mercado de ·trabalho. Trata -se, neste caso, 
de migrações pendulares, alternantes ou jornada para o tra-
balho. 
Em relação ao primeiro tipo de migração deve ser in-
vestigada a origem da população urbana - procurando-se 
detectar qual a importância do contingente de migrantes 
na formação da população citadina - e o momento em 
que se verificou cada uma das correntes migratórias. As 
causas das migrações constituem um segundo aspecto a ser 
li CORRÊA, R,oberto Lobato . Estudo das relações entre cidade e região. 
Revista Brasileira de Geografia, 31 (1), 1969. 
12 Idem, coord. Cidade e região no Sudoeste paranaense. Revista Brasilei-
ra de Geografia, 32 (2) , 1970. 
43 
abordado: é significativo apreender as especificidades espa-
ciais destas causas. Sugere-se que sejam consideradas as for-
mas de emigração - jovens, adultos, solteiros, famílias in-
teiras etc. - e as etapas da emigração, as quais podem en-
volver a rede urbana - da zona rural para a pequena cida-
de e desta para a metrópole. 
De extrema importância é o estudo das conseqüências 
da migração nas zonas de emigração, o · qual deve abordar 
tanto a dimensão demográfica - estrutura etária, propor-
ção dos sexos etc. - como a econômica __:_ envolvendo 
por exemplo, os sistemas agrícolas e os efeitos sobre a:s ati~ 
·. vidades comerciais -e a da paisagem agrária - , nela inse-
rindo-se o habitat rural. Finalmente, o último tópico a ser 
considerado refere-se às atividades dos migrantes na cida-
de e à sua localização intra-urbana: isto fornece uma medi-
da do significadoda atração urbana sobre a população de 
sua região. 
As migrações pendulares, provenientes de núcleos loca-
lizados em periferias rurais-urbanas, podem ser· vistas co-
mo um indicador do processo de urbanização. Sugere-se 
que se considere a origem dos migrantes, isto é, a área de 
proveniência dos commuters, causas, formas e meios desta 
migração pendular, as atividades dos migrantes e as conse-
qüências do movimento migratório .na periferia rural-urbana. 
A metrópole constitui-se em um importante mercado 
consumidor de produtos rurais, quer alimentos, quer maté-
rias-primas para as suas indústrias. Dugrand sugere que, fa-
ce a estas relações entre cidade e região, considere-se os se-
guintes tópicos: os m~canismos de comercialização, a estru-
tura das empr~sas comerciais, e os tipos de centros de co-
mercialização. 
Face ao primeiro tópico é importante verificar inicial-
mente os tipos de transações comerciaisque se realizam, is-
to é, como se fazem a compra e a venda da produção do 
campo, e, em seguida, identificar os tipos de agentes vincu-
lados à comercialização - atacadistas coletores, redistribui-
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44 
dores, cooperativas, supermercados, o Estado, donos de ca-
minhão etc. - e suas práticas econômicas e políticas. 
Sobre a estrutura das empresas sugere-se examinar os 
aspectos relativos à implantação do equipamento comercial 
e aos tipos de empresas. Esta indagação envolve a gênese 
e a dinâmica do comércio, bem como a identificação das em-
presas segundo a origem do capital, a forma de organiza-
ção e as outras atividades que possuem. 
Os tipos de centros de comercialização devem ser ana-
lisados considerando-se, de um lado, o equipamento comer-
cial que possuem, tal como bancos, armazéns, silos, escritó-
rios de compra, serviços de transporte etc. e, de outro, os 
fluxos que para eles convergem e divergem, envolvendo a 
área de coleta e os centros para onde a produção é reexpe-
dida, o volume comercializado e os meios de transporte uti-
lizados. 
É necessário, finalmente, fazer-se uma avaliação do 
significado do processo de comercialização de produtos ru-
rais, tanto em relação à cidade como ao campo. 
A drenagem da renda fundiária pela cidade constitui-
se em muitas áreas um importante aspecto da vida social, 
econômica e política. A cidade constitui-se, nestes casos, 
em lugar de residência de proprietários rurais absenteístas, 
e este fato pode assumir enorme importância. Segundo Du-
grand, esta temática pode ser abordada a partir da conside-
ração de três aspectos: a importância da propriedade fun-
diária citadina, a sua estrutura interna, e as conseqüências 
da drenagem da renda fundiária. 
Sobre a importância da propriedade fundiária citadi-
na é relevante abordar, primeiramente, a sua extensão espa-
cial, isto é, em que unidades político-admiÍlistrativas estão 
localizadas, qual a sua magnitude - número e área ocupa-
da - e o que representa em termos da estrutura fundiária 
em cada uma das unidades . É assim possível saber que cen-
tros urbanos desempenham este papel de drenagem, onde 
atuam e qual a intensidade da atuação. A apreensão destes 
45 
aspectos pressupõe que se conheça a gênese e a dinâmica 
do processo de drenagem da renda fundiária rural. 
A estrutura interna da propriedade citadina pode ser 
analisada a partir da identificação, primeiramente, dos ti-
pos de propriedades de acordo com a dimensão e a finalida-
de - fim de semana, especulação, prestígio, valorização 
de capitais. Em segundo lugar, considerando a utilização 
da terra e estabelecendo a comparação com aquela das pro-
priedades dos rurícolas. Finalmente, analisando os tipos so-
ciais de proprietários - tradicional ou recente, associado 
ou não a outras atividades, regionais ou extra-regionais etc. 
É de fundamental importância que se considere as con-
seqüências da drenagem da renda fundiária, tanto no cam-
po como na cidade: isto se inicia pela análise da aplicação 
da renda fundiária e pode finalizar pela comparação do ní-
vel de consumo da população rural e dos proprietários fun-
diários citadinos. 
A grande cidade pode também investir recursos no cam-
po e em cidades menores, criando, assim, trabalho. O de-
senvolvimento agrícola, a difusão da indústria na região 
de influência, a extensão das zonas de residência peri-urba-
na, a organização de áreas de recreação e de reservas natu-
rais, e a promoção dos habitantes da região aos níveis de 
renda semelhantes aos dos habitantes da grande cidade, se-
riam resultados positivos dos investimentos realizados pela 
cidade. A idéia da cidade como centro difusor do desenvol-
vimento regional está assim presente entre os geógrafos que 
trabalharam a temática cidade-região. 
Sugere-se que sejam considerados, de um lado, os in-
vestimentos realizados pela cidade e, de outro, as conseqüên-
cias sobre a organização do espaço regional. 
Os investimentos realizados pela grande cidade devem 
ser analisados em termos da sua distribuição espacial, con-
siderando-se ainda a natureza das atividades criadas e os ti-
pos de investidores - empresas regionais ou extra-regio-
nais , proprietários fundiários , grandes corporações etc. 
46 
No que se refere às conseqüências dos investimentos é im-
portante que seja verificado que novas atividades foram cria-
das, que modificações na estrutura social do campo e das 
pequenas cidades foram introduzidas e, finalmente, quais 
os impactos dos investimentos na integração regional. 
· A integração pressupõe o desenvolvimento de ativida-
des terciárias e a efetiva distribuição de bens e serviços, cu-
ja intensidade é uma expressão do grau de integração regio-
nal à grande cidade. Um centro urbano, contudo, pode de-
sempenhar um nulo ou inexpressivo papel como foco de 
drenagem da renda fundiária ou núcleo irradiador de inves-
timentos; entretanto, será, em maior ou menor grau, uma 
localidade central. 
Segundo Dugrand, no estudo sobre o papel das cida-
des como focos de distribuição de bens e serviços, deve"se 
abordar os tipos de transações comerciais, a estrutura das 
empresas e os tipos de centros distribuidores. 
As transações comerciais podem ser analisadas segun-
do sejam elas varejista, atacadista, de representação etc., se-
gundo a forma de pagamento, a freqüência com que são 
feitas as transações, e as categorias sociais dos participan-
tes. As empresas, por .outro lado, devem ser pesquisadas 
procurando-se conhecer a gênese e a dinâmica, e definir 
os tipos de acordo com a origem do capital, a forma de or-
ganização e as outras atividades e empresas vinculadas. 
Finalmente, no que se refere aos tipos de centros de 
distribuição, a questão reporta-se àquela da hierarquia urba-
na, tendo como suporte teórico mais significativo a teoria 
das localidad·es centrais. 
Eis o tema.das relações cidade-região. É extremamen-
te rico . As relações abordadas podem ser tratadas de outro 
modo, de uma maneira mais integrada. Neste sentido serão 
retomadas mais adiante, numa tentativa de, teoricamente, 
integrá-las consistentemente. 
3 
Natureza e significado 
da rede urbana 
As abordagens anteriormente identificadas, e apresen-
tadas em seus traços mais gerais, são incapazes, ainda que 
em graus diversos, de revelar a natureza e o significado da 
rede urbana. Algumas delas descrevem um ou vários de 
seus aspectos, importantes, sem dúvida, mas insuficientes 
para darem conta da realidade social, da qual a rede urba-
na é uma dimensão,,pois são análises parcelares. Outras tra-
tam a principal cidade como se fosse dotada de autonomia, 
capaz de produzir ou difundir mudanças sociais. A aborda-
gem das relações cidade-região, apesar das enormes poten-
cialidades que apresenta, não foi capaz de revelar a nature-
za e o significado da rede urbana. 
Em realidade as abordagens consideradas são, com ra-
ras exceções, caracteristicamente de natureza positivista e 
funcionalista. A cidade - e, por extensão, a rede urbana 
- é vista como se fosse umacoisa; destituída de vida so-
cial e, portanto, de interesses antagônicos, de conflitos: é 
assim passível de um tratamento marcado por uma postu-
ra pretensamente neutra. As interpretações calcadas nas ciên-
cias naturais estão presentes nos estudos de redes urbanas, 
estas sendo concebidas como engrenagens manipuladas por 
agentes, não especificados, muitas vezes por processos alea-
48 
tórios. A história é colocada de lado, não havendo preocu-
pação com a gênese e a dinâmica da rede urbana: o tempo 
constitui uma abstração em que têm existência mecanismos 
que originam uma seqüência evolutiva marcada por equilí-
brio-desequilíbrio-equilíbrio . O caráter idealista de algumas 
das abordagens aparece quando se considera como normati-
vos alguns dos modelos sobre estrutura espacial da rede ur-
bana ou de sua evolução. 
A partir da avaliação da prática dos geógrafos, m~s 
também considerando a contribuição de não geógrafos, pro-
ceder-se-á a um esforço que contribua para identificar a na-
tureza e o significado da rede urbana. Com certeza não es-
gotaremos a questão, mas esperamos clarificar alguns pon-
tos que são particularmente pertinentes aos geógrafos. 
Esta parte está dividida em quatro capítulos que não 
são mutuamente excludentes. Representam apenas ângulos 
em que um mesmo objeto pode ser abordado. Considera-
se inicialmente a divisão territorial do trabalho. Em segui-
da as retações entre rede urbana e os ciclos de exploração, 
para depois tratar as relações entre rede urbana e forma es-
pacial. Finalmente será abordado o caráter mutável da re-
de urbana, apresentando-se alguns pontos básicos para a 
sua periodização: a rede urbana da Amazônia será toma-
da à guisa de exemplificação. 
A divisão territorial do trabalho 
A rede urbana constitui-se simultaneamente em um re-
flexo da e uma condição para a divisão territorial do traba-
lho. É um reflexo à medida que, em razão de vantagens lo-
cacionais diferenciadas, verificam-se uma hierarquia urba-
na e uma especialização funcional definidoras de uma com-
plexa tipologia de centros urbanos. 
A lógica capitalista de acumulação, caracterizada pe-
la minimização dos custos e maximização de lucros e apoia-
49 
da no progresso técnico, suscita o aumento da escala de 
produção assim como da área onde esta se realiza. Amplia-
se também a circulação, e a acessibilidade é redefinida em 
função dos novos modos de circulação. Verifica-se a valori-
zação de certas localizações em detrimento de outras: mais 
do que isto, para cada atividade, nova ou transformada, 
há padrões locacionais específicos que melhor atendem à ló-
gica capitalista. Como conseqüência algumas cidades -per-
dem importância, enquanto outras são valorizadas; criam-
se novos centros urbanos. Numa planície fértil e densamen-
te ocupada, com produção agrícola negociada extra,local-
mente, define-se uma hierarquia de localidades centrais, en-
quanto às margens de baías de águas profundas desenvol-
vem-se centros portuários; próximo às jazidas de carvão 
emergem centros mineiros ou mesmo dotados de indústrias 
de transformação. A rede urbana reflete assim a divisão ter-
ritorial do trabalho. 
A rede urbana é também uma condição para a divisão 
~erritorial do trabalho. A cidade em suas origens constituiu-
;e não só em uma expressão da divisão entre trabalho ma-
nual e intelectual, como também em um ponto no espaço 
geográfico que, através da apropriação de excedentes agríco-
las, passou de certo modo a controlar a produção rural. Es-
te papel de condição é mais tarde transmitido à rede urba-
na: sua gênese e evolução verificam-se na medida em que, 
de modo sincrônico, a divisão territorial do trabalho assu-
mia progressivamente, a partir do século XVI, uma dimen-
são mundial. 
É à primeira vista através das funções articuladas de 
suas cidades - comércio atacadista e varejista, bancos, in-
dústrias e serviços de transporte, armazenagem, contabilida-
de, educação, saúde etc. - que a rede urbana é uma condi-
ção para a divisão territorial do trabalho. Através dela tor-
na-se viável a produção das diversas ár.eas agropastoris e 
de mineração, assim como sua própria produção industrial, 
\ circulação entre cidades e áreas, e o consumo, É via re-
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de urbana que o mundo pode tornar-se simultânea e desi-
gualmente dividido e integrado. 
Mas é efetivamente devido à ação dos centros de acu-
mulação de capital, às grandes metrópoles cabeças de redes 
urbanas de extensão mundial ou nacional, que a divisão ter-
ritorial do trabalho aparece condicionada pela rede urba-
na. Através dela as decisões, investimentos e inovações cir-
culam descendentemente, criando e transformando constan-
te e desigualmente, de acordo com uma dinâmica interna 
ao capitalismo, atividades e cidades. 
A rede urbana é um· reflexo, em realidade, dos efeitos 
acumulados da prática de diferentes agentes sociais, sobretu-
do as grandes corporações multifuncionais e multilocaliza-
das que, efetivamente, introduzem - tanto na cidade co-
mo no .campo - atividades que geram diferenciações entre 
os centros urbanos. Diferenciações que, por sua vez, condi-
cionam novas ações. Neste sentido é necessário que se com-
preenda a lógica da implantação das atividades no mais 
ou menos complexo mosaico de centros e hinterlândias em 
seus diferenciados papéis e pesos. Isto implica o desvenda-
mente das motiv~ções dos diversos agentes sociais, bem co-
mo o entendimento dos conflitos de interesses entre eles e 
suas aparentes soluções. Implica ainda colocar em evidên-
cia as práticas que viabilizaram a articulação entre os distin-
:tos centros urbanos e suas hinterlândias, bem como com~ 
preender a inércia que, pelo menos durante um certo tem-
po, cristaliza um determinado padrão espacial de funciona-
lidades urbanas. 
Em relação aos países subdesenvolvidos a rede urba-
na pode ser vista, em parte, como um conjunto de cidades 
onde se verifica um papel de intermediação diferenciada 
das .decisões geradas fora da rede urbana nacional. Em ou-
tras palavras, a rede urbana dos países subdesenvolvidos 
constitui-se, em parte, na extensão de uma ampla rede ur-
bana com sede nos denominados países centrais, em metró-
poles mundiais como New York, Londres, Tóquio e Paris. 
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Neste sentido a própria rede urbana é, através da função 
da intermediação, parte da divisão internacional do trabalho. 
Mas há que se considerar, pelo menos em relação a al-
guns países ou regiões, a existência de uma relativa autono-
mia nacional ou regional: a divisão territorial do trabalho 
é parcialmente derivada de decisões e interesses internos, se-
diados nas metrópoles nacionais ou regionais e, em alguns 
casos, nas capitais regionais. Pensamos assim que se deva, 
ao se tratar as relações entre rede urbana e divisão territo-
rial do trabalho, considerar em que medida uma rede urba-
na é efetivamente condição para essa divisão ou uma rede 
de pura intermediação de ações decididas externamente à rede. 
É visando a descrição e a compreensão da divisão ter-
ritorial do trabalho que se deve direcionar os estudos sobre 
classificação funcional de cidades: a classificação não deve, 
assim, ser considerada como um fim em si, mas um come-
ço de uma pesquisa sobre uma dada rede urbana. A rede 
urbana brasileira, que tem passado por grandes transforma-
ções, aí incluindo-se o aumento do número de centros e a 
sua extensão territorial, constitui-se em excelente objeto 
de pesquisa sob a ótica da divisão territorial do trabalho e 
sua dinâmica. 
Os ciclos de exploração 
O trabalho excedente é a fonte do valor excedente Uu-
ros, rendas, mais-valia etc.). O valor excedente apropriado 
e acumulado é em parte investido em novas atividades, tan-
to de localização urbana como rural, visando a geração de 
novos e ampliados valores excedentes. Isto implica a sua 
circulação, que engendra fluxos de pessoas, bens e serviços, 
ordens, idéias e dinheiro. A parte do valor excedente desti-
nada à simples reposição dos meios de produção e ao consu-
mo dos capitalistas,

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