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1 PRÁTICAS DE PLANTIO E COLHEITA DA CANNABIS MEDICINAL 2 NOSSA HISTÓRIA A nossa história inicia com a realização do sonho de um grupo de empre- sários, em atender à crescente demanda de alunos para cursos de Graduação e Pós-Graduação. Com isso foi criado a nossa instituição, como entidade ofere- cendo serviços educacionais em nível superior. A instituição tem por objetivo formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participa- ção no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua. Além de promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicação ou outras normas de comunicação. A nossa missão é oferecer qualidade em conhecimento e cultura de forma confiável e eficiente para que o aluno tenha oportunidade de construir uma base profissional e ética. Dessa forma, conquistando o espaço de uma das instituições modelo no país na oferta de cursos, primando sempre pela inovação tecnológica, excelência no atendimento e valor do serviço oferecido. 3 Sumário PRÁTICAS DE PLANTIO E COLHEITA DA CANNABIS MEDICINAL ....... 1 NOSSA HISTÓRIA .................................................................................... 2 Introdução .................................................................................................. 5 Os Diferentes Tipos de Plantas de Cannabis ................................................................... 5 Indica ............................................................................................................................... 6 Sativa ............................................................................................................................... 6 Híbridas ........................................................................................................................... 6 Cultivo Externo Versus Interno de Cannabis .................................................................. 7 O Cultivo Outdoor de Cannabis ...................................................................................... 7 O Cultivo Indoors de Cannabis ....................................................................................... 7 Sistemas Hidropônicos .............................................................................. 8 Fibra de Coco .................................................................................................................. 8 Estufa ............................................................................................................................... 9 Plantação da Semente ...................................................................................................... 9 A Cronologia do Cultivo de Cannabis ........................................................................... 10 Fatores Ambientes Relevantes....................................................................................... 10 Germinação .................................................................................................................... 11 Mudas ............................................................................................................................ 11 A Floração do Botão ...................................................................................................... 12 A Colheita da Cannabis ........................................................................... 12 O Processo da Cura da Cannabis ................................................................................... 13 O Cultivo Bem-Sucedido da Cannabis .......................................................................... 14 DA CANNABIS SATIVA ........................................................................... 16 Características ................................................................................................................ 16 Uso na antiguidade ........................................................................................................ 18 Associações canábicas: porta de entrada legítima ao universo da cannabis medicinal ............................................................................................................ 24 Na cannabis, a busca pela cura ...................................................................................... 24 O acesso provido pelas associações canábicas .............................................................. 25 Lucros x direito universal .............................................................................................. 26 file:///C:/Users/Acer/Documents/APOSTILAS/JESSICA/CANABIS%20MEDICINAIS/APOSTILA%20PRÁTICAS%20DE%20PLANTIO%20E%20COLHEITA%20DE%20CANNABIS%20MEDICINAL.docx%23_Toc58866596 4 Primeiro oponente: o estigma ........................................................................................ 26 Habeas Corpus como fuga da burocracia ...................................................................... 27 Como as associações canábicas estão organizadas........................................................ 27 Quem pode plantar cannabis no Brasil? ........................................................................ 28 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................ 31 5 Introdução Contar com um guia do processo de cultivo da cannabis está se tornando cada dia mais relevante. Afinal, a legalização da planta está se tornando rapida- mente realidade para um número cada vez maior de nações. Gradualmente, na medida em que é aceita tanto para uso recreativo quanto medicinal, as plantas domésticas de maconha estão ganhando popularidade entre cultivadores amadores. Este muitas vezes são os familiares de pacientes que se tratam com a planta. Cultivá-las pode ser um meio recompensador e prático de produzir seu próprio produto para consumo. A cannabis foi, por muitos anos, uma planta clandestina e, por isso, tornou- se muito mais difícil encontrar guias de jardinagem para cannabis do que para rosas ou macieiras. Aqui há alguns fatos sobre o cultivo de cannabis e o que ele requer. Os Diferentes Tipos de Plantas de Cannabis Plantação de plantas de cannabis. (Shutterstock) Mesmo que o status legal da cannabis seja ainda intimidador em alguns países, o processo de cultivo é mais ou menos o mesmo de outras plantas do- mésticas. Antes de plantar uma rosa, por exemplo, você precisa decidir qual a espécie que busca. Com a cannabis não é diferente. 6 De forma geral, as espécies de cannabis são divididas em três variedades distintas: Indica, Sativa e Híbrida. Sua clandestinidade fez com que estes cultivos e suas histórias de reprodução não fossem registradas com precisão e, por isso, alguns sistemas de nomenclatura da cannabis podem não ser muito exatos. De qualquer forma, Sativa e Indica são termos úteis para características específicas da cannabis, dos quais você ouvirá falar quando entrar em contato com qualquer plantador de cannabis. Indica As cepas de Indica normalmente são mais baixas e têm folhas mais largas. A cannabis Indica frequentemente é descrita como promotora de sensações de sonolência, letargia e relaxamento, embora não haja evidência científica que suporte estas alegações. Sativa As plantas de cannabis Sativa são caracterizadas por folhas mais finas e alcançam alturas maiores. A cannabis Sativa é conhecida por sua produção redu- zida de tricomas. Quando consumida, diz-se que a cannabis Sativa produz uma sensação de high que é descrita como energizante. Novamente, essas ge- neralizações sobre a Sativa são baseadasem experiências episódicas e subjeti- vas de usuários de cannabis. Híbridas As plantas Híbridas contêm uma variedade de combinações de caracterís- ticas da Indica e da Sativa, e na realidade a maioria das plantas de cannabis hoje em dia é, provavelmente, um híbrido destas duas. Felizmente, a expansão da legalização levou à disponibilidade de métodos de teste genômicos que são mais confiáveis do que o boca-a-boca do mercado negro dos vendedores de cannabis. Ferramentas de análises de dados conseguem de- terminar perfis químicos e identificar diferenças genéticas específicas para classi- ficar linhagens distintas de cannabis. De acordo com pesquisas, fatores como a concentração de terpenos e ta- xas de THC e CBD são basicamente o que causa variações nos efeitos psicoati- vos e terapêuticos da cannabis, mais do que as origens das plantas Sativa ou Indica. 7 Cultivo Externo Versus Interno de Cannabis Como no caso de muitas outras plantas domésticas, a cannabis pode ser cultivada em ambientes externos (outdoor) ou internos (indoor), e isso pode ter implicações significativas no produto final, assim como no próprio processo de cultivo. O Cultivo Outdoor de Cannabis Cultivar a cannabis em ambientes externos pode ser uma opção desejável, uma vez que é uma forma familiar de jardinagem que não requer tempo gasto com a construção de nenhum tipo de infraestrutura. Ao determinar uma área restrita para o cultivo, sua planta também necessitará de menos nutrientes adicionais. As questões mais frequentes no cultivo de cannabis outdoors referem-se à rega em excesso e danos climáticos. O vento e a chuva podem deteriorar os in- gredientes ativos da cannabis e romper galhos, enquanto que o excesso de água pode provocar mofo e apodrecimento. Para evitar isto, as plantas podem ser pro- tegidas do vento por meio de quebra-ventos, sendo cobertas durante chuvas for- tes e regadas com moderação, na medida da necessidade. O Cultivo Indoors de Cannabis O cultivo de cannabis indoor é geralmente considerado como gerador de um produto superior devido à maior produtividade de botões. Outra razão que faz 8 com que ela seja preferida é o controle exigido por este tipo de cultivo. Ele permite, por exemplo, que atributos específicos da cannabis sejam alterados por meio de mudanças no ambiente indoor. Todo este controle deixa óbvio que a cannabis produzida em ambientes internos requer mais cuidados, equipamento específicos e tempo. Sistemas de controle de correntes de ar, de níveis de iluminação e de umidade estão disponí- veis mas representam custo, e são importantes para controlar o ambiente de suas plantas. Há outras decisões que envolvem o plantio indoor como o método de cultivo, uma vez que há muitas opções disponíveis. Sistemas Hidropônicos O sistema de cultivo hidropônico está intimamente relacionado à cannabis. Isso acontece pois suas mudas são desenvolvidas em uma solução líquida na qual diariamente são adicionados nutrientes. O benefício deste “sobressolo” é que as raízes de plantas têm acesso direto aos nutrientes necessários contidos no líquido. Assim, ao invés de gastar energia para criar raízes, a planta a usa para crescer mais e apresenta melhor produtividade. Não surpreende o fato que culti- vadores de cannabis utilizem largamente a hidroponia, uma vez que o objetivo maior do cultivo é sempre a obter o melhor resultado em termos de produção de flores. Este método é considerado bastante avançado, e exige que a temperatura da água, os níveis de pH e as concentrações de nutrientes sejam checados e alterados várias vezes por dia. Fibra de Coco Há um outro método de cultivo indoor com o qual, no entanto, você deve estar menos familiarizado: o que utiliza cascas de coco para acondicionar as mu- das. Ele permite uma excelente circulação de oxigênio nas raízes e, como na hi- droponia, requer nutrientes adicionais e rega diária. A fibra do coco é considerada uma excelente técnica intermediária entre o cultivo em solo e a hidropônica, uma vez que apresenta crescimento e produtividade superiores aos obtidos no solo, mas sem a técnica desafiadora da hidroponia. 9 Estufa Estufas são estruturas com paredes transparentes e sistemas artificiais de controle de aquecimento cujo o propósito é prover às plantas as condições ideais de cultivo. Elas são utilizadas para sistemas de cultivo mais elaborados, como o de fibra de coco ou o hidropônico. No entanto, podem também ser simplesmente uma proteção para áreas de cultivo tradicional, em solo. Mesmo que um sistema de solo possa precisar ser construído em jardinei- ras, o cultivo em estufa propicia proteção do vento e da chuva, os quais podem danificar seriamente as plantas e reduzir sua produtividade. Plantação da Semente Então, você decidiu o tipo, o local e a forma de plantar suas sementes de cannabis. E agora? 10 A Cronologia do Cultivo de Cannabis As plantas de cannabis cultivadas indoor podem ter sua temperatura, ilu- minação, água e ventilação controladas para criar condições de cultivo ideais, o que significa que não importará em que período do ano você decidirá plantar. Entretanto, para quem a cultiva ao ar livre, o período no qual a cannabis será plantada e colhida dependerá de alguns fatores, tais como sua localização geo- gráfica e o sistema climático local. Pat Goggins, editor da Leafly, resumiu a cro- nologia do cultivo da cannabis incluindo o equinócio da primavera como um bom lembrete para quando o processo de cultivo outdoor é iniciado no hemisfério norte. O solstício de verão é o melhor para exposição solar, enquanto que o equi- nócio de inverno é ideal para a colheita; já a secagem e a cura devem ser feitos bem antes do solstício de inverno. Obviamente este é um resumo simples, mas oferece um bom panorama geral da cronologia do cultivo da cannabis ao ar livre. Fatores Ambientes Relevantes Existem muitos fatores ambientais que influenciam os períodos ideais de germinação e as épocas de cultivo da cannabis. As plantas de cannabis são fa- mintas por luz solar, e assim o cultivo gira especialmente em torno da média sa- zonal de luz solar de uma específica área geográfica. As sementes podem ser 11 plantadas de março a maio (primavera-verão), com a colheita de flores sendo exe- cutada de setembro a novembro (outono). As estações no hemisfério Sul são opostas. O período de transição do estado vegetativo de uma planta de cannabis para o de floração ocorre quando a planta recebe sinais de que os dias estão encurtando. Assim, diferenças de latitude podem mudar o período em que uma planta começa a floração. Isso acontece em função de mudanças na luz do dia e a extensão do período noturno (por exemplo, o Estado de Washington versus Mar- rocos). Germinação A germinação é um momento familiar para a maioria dos cultivadores ama- dores, uma vez que é quando surge o primeiro sinal de crescimento a partir das sementes. O processo pode ser realizado através de métodos diferentes. Alguns exemplos são o da toalha de papel, o da plantação diretamente no solo, com se- menteiras, imersão noturna ou por meio de uma “estação de germinação” pré- preparada. Sete dias é, em geral, o prazo para a germinação acontecer. Alguns afir- mam que as sementes da Sativa podem demorar mais para germinar, mas essa afirmação não é apoiada por nenhuma evidência significativa. Curiosamente, al- gumas pesquisas mostraram que o perfil canabinoide das sementes pode afetar taxas de sucesso da germinação. As sementes do tipo THC-A exibiram uma taxa de 100% de germinação comparada a apenas 39% das sementes do tipo CBD-A, que germinaram após seis dias. Para iniciar o processo de germinação de sementes de cannabis, coloque- as em uma toalha de papel molhada em um lugar úmido e quente até que os brotos surjam. Outra opção é colocá-las em umvaso e aguá-las, esperando até que os brotos irrompam do solo. Mudas Com o desenvolvimento dos brotos, suas sementes de cannabis germina- das tornam-se mudas e, uma vez que as plantas pareçam fortes o suficiente (em torno de 10 dias de crescimento) e apresentem um sistema de raízes saudável, elas podem ser transplantadas para o solo ou outro meio. 12 A Floração do Botão Depois de um período de cultivo de em torno de seis a 12 semanas, sua semente de cannabis entrará no estágio de floração. A floração é a primeira visão do produto final da cannabis para o cultivador, uma vez que esta “flor” prematura se tornará a flor da cannabis que irá eventualmente ser colhida e consumida. Esses pequenos botões se parecem com botões de flores em seu estágio inicial, mas começarão a desenvolver pequenas estruturas capilares chamadas tricomas, palavra originada do termo grego para “cabelo”. Esses “cabelos” são muito importantes, uma vez que eles lhe dizem se a planta é feminina. Isso é importante porque somente as plantas femininas podem produzir flores de canna- bis. Se a sua flor precoce produz uma estrutura parecida com a de uma uva, isso significa que esta planta é masculina e deve ser removida do seu jardim, uma vez que ela será inútil caso seu objetivo seja produzir uma flor de cannabis para consumo. Plantas de cannabis podem também ser ambos, feminina e masculina (her- mafroditas), e apresentarão as estruturas tipo uva com o típico “cabelo” feminino. Tenha em mente que a produtividade de plantas hermafroditas é normalmente inferior à das femininas. A Colheita da Cannabis Os botões de cannabis continuarão a crescer por 7-11 semanas e, quando maduros completamente, estarão prontos para a colheita. O tempo é vital para a colheita das flores, e o tricomas são indicadores úteis do momento ideal. Os trico- mas são as estruturas semelhantes a uma resina que se forma fora dos botões, e se parecem com cristais de açúcar. Quando a maioria dos tricomas deixa de ser translúcida para se tornar turva, é sinal de que os botões estão prontos para a colheita. Os tricomas nas flores de cannabis mudam tipicamente de branco para marrom quando os botões estão maduros e prontos para a colheita. Para colher os botões, você pode cortar o caule principal da planta de can- nabis ou remover talos para recolher os botões mais maduros. Os talos removidos precisarão ter suas folhas podadas, o que pode ser feito imediatamente ou depois da secagem (descrita abaixo). 13 Quando realizada imediatamente, a poda fará com que a resina passe para as suas mãos e para as tesouras utilizadas; mesmo assim, ela faz com que a flor pareça visualmente atraente. Podar depois de secar também requer mais espaço de secagem para os galhos volumosos, mas reduzirá a perda de resina e seu acúmulo em ferramentas. O Processo da Cura da Cannabis Uma vez removida da planta, as flores da cannabis precisam primeira- mente secar e então curar. A secagem e a cura dos botões é um processo impor- tante que assegura a eliminação de umidade excessiva. Isso também ajuda a mi- nimizar as chances de mofo e prolonga a vida útil do produto. Os terpenos são os responsáveis por prover às variadas espécies de can- nabis seus sabores e aromas distintos. A cura é geralmente relatada como auxiliar na preservação desses sabores. Estes componentes são voláteis e, por isso, é importante não submeter as flores ao calor excessivo durante o processo de cura. A secagem pode ser feita de várias maneiras, seja em varais ou em qual- quer área ampla. É fundamental contar com ventilação apropriada, temperaturas amenas (em torno de 20ºC) e 50% de umidade, de forma a prolongar o processo. Uma vez secas, as flores podem então ser curadas. Isto é feito ao colocá- las em recipientes herméticos, deixando um terço do frasco como espaço livre para circulação de ar. Os frascos devem ser abertos ao menos uma vez ao dia nas primeiras duas semanas de cura para checagem de mofo e para fornecimento de ar fresco. Em torno de duas semanas de cura, as flores devem estar suficien- temente secas, e a partir daí as verificações e reposições de ar podem ser feitas a cada duas vezes por semana. Quatro semanas de cura costuma ser prazo o suficiente para secar e amadurecer satisfatoriamente as flores de cannabis. 14 O Cultivo Bem-Sucedido da Cannabis Com as flores maduras e secas, você chegou ao fim do seu cultivo de can- nabis. Mudanças nas sementes, métodos de cultivo e técnicas de colheita podem afetar a qualidade, a produtividade e as características do produto final. O cultivo da cannabis é similar ao de qualquer outra planta, muito embora imponha seus desafios próprios. Caso seu país tenha regulamentado a plantação de Cannabis, você agora poderá plantar e colhê-la de forma acessível, como qual- quer outro cultivador amador. Para Concluir… Existem tipos diferentes de plantas de cannabis: as variações de Indica, Sativa e Híbrida. Lembre-se que os termos Indica e Sativa não são precisos e assim é difícil prever os efeitos do produto final. A cannabis pode ser cultivada ao ar livre ou em estufas. O cultivo indoor e outdoor em países tropicais oferecem mais liberdade com relação a germinação e colheita, enquanto que cultivos outdoor em locais de alti- tude requerem mais planejamento em relação ao clima de forma a maximizar a exposição solar e aumentar as chances de uma colheita bem-sucedida. Métodos de cultivo indoor incluem sistemas hidropônicos, fibra de coco e cultivo de cannabis em uma estufa. O cultivo indoor pode ser feito em qualquer época do ano, enquanto que o outdoor é geralmente feito prevendo a colheita na primavera. 15 Após 6-12 semanas, o período de transição do estado vegetativo para a floração do botões se inicia, com a colheita sendo feita após outras 7-11 semanas de crescimento. Por fim, a cannabis é seca e curada para prevenir mofo, aumentar sua vida útil e preservar o sabor e o aroma do produto final. O cultivo coletivo de cannabis é comum em vários países onde seu con- sumo medicinal é regulamentado. Pacientes de todas as idades necessitam con- sumir, porém nem todos têm a capacidade de cultivar seu próprio fitoterápico; ou extrair e processar os princípios ativos necessários para confecção do mesmo. Dessa maneira, nos países onde o consumo medicinal é regulamentado, grupos de pacientes podem se formar para produzir, através de uma estrutura comum, o material vegetal para produção do medicamento necessário para o consumo indi- vidual. Uruguai e Chile , nossos vizinhos de continente, já possuem regulamenta- ção adiantada para cultivo coletivo de cannabis. Em ambos os países, projetos de cultivo coletivo foram implementados com sucesso. Na Espanha, cultivos coletivos chamados lá de clubes de cultivo existem há mais de 20 anos. Fundacion Daya (Chile) http://fundaciondaya.org/ 16 Fundacion Daya (Chile) DA CANNABIS SATIVA Cannabis Sativa, também conhecida por vários nomes populares (Maco- nha, erva, marijuana, cânhamo, haxixe, bagha, entre outros) é uma planta da fa- mília das Canabiáceas, Biologicamente, a Cannabis faz parte do gênero de plan- tas angiospermas que produzem flor, cultivada em várias regiões de todo o mundo, a Cannabis atualmente refere-se a drogas psicoativas e medicamentos derivados da planta. (PACIEVITCH, 2010) Características As fibras do caule da Cannabis por serem fortes e ter grande durabilidade eram utilizadas para a fabricação de papel, de cordas e até tecidos e fios para a confecção de roupas. Das sementes da Cannabis Sativa pode-se extrair óleo para a produção de cosméticos, sabão, tintas ou até mesmo em óleo comestível. (NAHAS, 1985) As folhas são finamente recortadas em segmentos lineares; as flores, unis- sexuais e inconspícuas, têm pelos granulosos que, nas femininas, segregam uma http://www.fundaciondaya.org/17 resina; o caule possui fibras industrialmente importantes, conhecidas como câ- nhamo; e a resina tem propriedades psicoativas bem documentadas podendo atuar como analgésico, anódino, antiemético, antiespasmódico, calmante do sis- tema nervoso, embriagador, estomático, narcótico, sedativo, tônico. (HONÓRIO, 2006) As plantas de Cannabis possuem, sexualidade altamente desenvolvida, possuindo flores masculinas e femininas, completamente separadas. (TAKATORI, 1996) Farmacologicamente, os dois principais constituintes da Cannabis Sativa é o Tetrahidrocanabinol (THC) e Canabidiol (CBD), apesar de sua origem natural, existem mais de 400 substâncias químicas identificadas em sua composição. (DIAS, 2017) O THC, e o canabinoide mais comum da Cannabis, é conhecido pela “onda” que dá nas pessoas que fumam ou ingerem maconha, causando euforia, relaxamento, riso fácil entre outros efeitos, também alivia dores e inflamações e é um anti-espásmico e relaxante muscular. Em testes clínicos, foi provado que o THC reduz o fator de crescimento endotelial vascular em células glioma em outras palavras, câncer no cérebro. Isso é importante porque está redução significa que os tumores de câncer no cérebro são incapazes de produzir novos vasos sanguíneos que precisam para se susten- tarem e se espalharem. Essa descoberta é uma grande promessa no tratamento do câncer de cérebro. (BLÁZQUEZ; et. al, 2004) O THC é uma resina não solúvel em água, portanto, mais eficientemente utilizada por via inalatória. Uma vez absorvidos, o THC e os outros canabinoides atingem uma concentração sanguínea de 25 a 30% do inalado, havendo distribui- ção para todos os tecidos, em padrões que variam de acordo com o fluxo sanguí- neo do usuário. (HONÓRIO, 2006) Diferente do principal canabinoide psicoativo na maconha, o delta-9- tetrai- drocanabinol, o canabidiol chega a representar mais de 40% de seus extratos e não possui efeitos psicoativos, atua no sistema nervoso central, ajudando a tratar doenças psiquiátricas ou neurodegenerativas, como esquizofrenia, mal de Parkin- son, epilepsia ou ansiedade, canabinoide tem seu efeito principalmente ao intera- gir com receptores. (PISANTI, 2017) O canabidiol é o segundo canabinoide mais comum da maconha medicinal e o mais comum encontrado nas plantas de cânhamo. A Cannabis rica em cana- 18 bidiol fornece potentes benefícios terapêuticos sem a euforia ou a letargia de mui- tas variedades com alto teor de THC. Acredita-se que o CBD e o THC têm efeito sinérgico, o que significa que quando ambos estão presentes em níveis terapêu- ticos são mais efetivos juntos do que separados. Enquanto o THC é muito conhecido por suas propriedades psicoativas, o CBD é mais conhecido por sua habilidade de lidar com a ansiedade, taquicardia, fome e sedação causada pelo THC. (RUSSO, 2011) O consumo humano da Cannabis teve início no terceiro milênio a.C. e seu uso atual é voltado para recreação ou como medicamento, além de também ser usada como parte de rituais religiosos ou espirituais. (NAHAS, 1986) A Organiza- ção das Nações Unidas (ONU), estima que cerca de quatro por cento da popula- ção mundial (162 milhões de pessoas) usam Cannabis pelo menos uma vez ao ano e cerca de 0,6 por cento (22,5 milhões) a consomem diariamente. (ONU, 2016) Uso na antiguidade A relação do homem com a Cannabis Sativa é algo presente na humani- dade há milhares de anos, nos mais diversos lugares e épocas. Sua grande im- portância histórica se deve ao fato da Cannabis ter a fibra natural mais resistente e forte do que todas as outras, podendo ser cultivada em praticamente qualquer tipo de solo. Entre os anos de 1000 a.C. até meados do século XIX, a Cannabis produzia a maior parte dos papéis, combustíveis, artigos têxteis e sendo, dependendo da cultura que a utilizava, a primeira, segunda ou terceira medicina mais usada. (TEI- XEIRA, 2015) Sobre a origem da Cannabis, existem três teses. Para Gabriel Nahas (1986), seriam os chineses os principiantes no uso da Cannabis como erva medicinal, e na utilização de suas fibras para confecção de papel; segundo Enci- clopédia Barsa (1997), a origem da Cannabis estaria na Índia, tendo como emba- samento textos escritos na era Védica 2.500 a.C; para Rogério de Souza Costa e Bernard Gontiès (1997), existe outra tese de que a Cannabis teria origem na re- gião do mar Cáspio e Pérsia, que correspondem na atualidade aos países do Pa- quistão, Irã e Afeganistão. (BERNARD GONTIÈS, 2003) Os primeiros registros históricos do uso da Cannabis Sativa foram feitos há 8.000 anos a.C. na China, onde a planta foi utilizada para fabricação de papel. O 19 uso da Cannabis como droga teve início há mais de 4.000 anos. Sua descoberta foi atribuída ao imperador e farmacêutico chinês Shen Nieng, cujo trabalho em farmacologia advogava o uso da planta, prescrevia o uso de Cannabis no trata- mento do reumatismo e apatia, e como sedativo. (CARLINI, 1980) A utilização da Cannabis na medicina chinesa é descrita na mais antiga farmacopeia do mundo chamada de Pen-ts´Chin no uso da planta em tratamentos de diversos problemas, como dores reumáticas e intestinais, malária e também para o sistema reprodutor feminino. (ZUARDI, 2005) Na Enciclopédia Barsa (1997, p.179), “há mais de dois mil anos os chineses usavam a maconha como anestésico em cirurgias, prática repetida no Renasci- mento por alguns cirurgiões europeus”. A Cannabis se propagou da China à Índia, para o norte da África, chegando à Europa cerca de 500 anos depois de Cristo e por fim à América do Norte. As principais utilizações, na América eram como fonte de fibras, emprega- das para confeccionar cordas. Seu óleo era utilizado na fabricação de tintas, en- quanto que as sementes eram usadas como ração para o gado. (McGUIGAN, 2006) Na Índia era utilizada em rituais religiosos ou como medicamento. Na mito- logia, a Cannabis era a comida preferida do deus Shiva, portanto, tomar bhang, uma bebida que contém maconha, seria uma forma de se aproximar da divindade. Na tradição Mahayana do budismo, fala-se que antes de Buda alcançar a ilumi- nação, ficou seis dias comendo apenas uma semente de maconha por dia e nada mais. Como medicamento a planta era usada para curar prisão de ventre, cólicas menstruais, malária, reumatismos e até dores de ouvido. (GRAEFF, 1989) No ano 1000 a.C., também na Índia, o cânhamo, com denominação de “Changha”, foi usado de forma terapêutica, sendo indicado para constipação in- testinal, falta de concentração, malária e até para doenças ginecológicas. Não obstante, no território indiano, o uso religioso da Cannabis antecedeu ao terapêu- tico, com o intuito de “libertar a mente das coisas mundanas e concentrá-la no Ente Supremo”. (GRAEFF, 1989, p.123) Segundo Gabriel Nahas (1986, p.28), a indicação da Cannabis para alterar o estado mental e não estritamente como remédio tem início no continente indi- ano, onde esta erva era considerada sagrada, com presença constante em rituais religiosos. Os sacerdotes cultivavam em seus jardins, e utilizavam as flores, folhas e caules cozidos com o intuito de fabricar um líquido potente denominado “bhang”. 20 Este autor ainda coloca que “este licor promovia supostamente uma união mais íntima com Deus quando bebido antes de cerimônias religiosas”. Na ancestral Índia a Cannabis era utilizada pelos Hindus com funções es- pirituais, como promotor à meditação e para usos médicos no tratamento das in- sónias, febres, tosse seca, oftalmologia e disenteria. (ESCOHOTADO, 2004) Atu- almente na Índia a Cannabis é usada pelos devotos do Deus Shiva, o Deus res- ponsável pela destruição e renovação do universo. A planta é considerada um presente do Deus para o homem. Todos os anos na Índia acontecem festividades no país, como o Mahâshivarâtri “Grande noite de Shiva” e o festival de Holi “Guerra de cores”, ondeos devotos consomem uma grande quantidade de uma bebida feita à base de leite e maconha chamada “Bhang” e de bolinhos que são ingeridos em oferenda a Shiva. (KALANT, 2001) Quando a Cannabis chegou ao Oriente Médio, vinda da índia houve uma grande aceitação desta droga, como o consumo de álcool era proibido pela religião mu- çulmana, os povos passaram a fazer uso da maconha, tendo em vista a sua ca- pacidade de produzir estado de euforia sem que levasse ao pecado mortal. (NAHAS, 1986) Posto isto, durante as invasões árabes dos séculos IX a XII, introduziu-se a Cannabis no norte da África, atingindo desde o Egito até o leste da Tunísia, Argélia e o oeste de Marrocos. Porém, é válido destacar o amplo consumo que deu-se no Egito durante auge do desenvolvimento cultural, social e econômico. Inicialmente essa droga era consumida pelas classes privilegiadas, como forma de autoindulgência. (NAHAS, 1986) As propriedades têxteis da Cannabis Sativa fizeram com que sua fibra fosse muito aproveitada pelos romanos e gregos na fabricação de tecidos, papéis, cordas, palitos e óleo. (ZUARDI, 2006) Na Grécia, eram encontradas, com frequência nos livros de medicina no século XIII, prescrições de maconha por parte de feiticeiros e curandeiros em di- versas enfermidades. Durante os rituais ao herói micênico Dionísio, em celebra- ções públicas e nos rituais da natureza, no terceiro dia de manifestações, utilizava- se de uma bebida denominada “panspermia”, produzida de diversas ervas, inclu- indo-se a maconha. Há registros do uso da Cannabis Sativa nas celebrações em Mistérios de Eleusis onde se realizava reuniões secretas para cerimônias iniciáti- cas e orgiósticas e, em procissões e rituais de purificações. (GONTIÉS, 1997) A 21 introdução da Cannabis na Europa ocorre no século XXI, após a invasão do Ge- neral Napoleão Bonaparte ao Egito. Nesta invasão Bonaparte era acompanhado por médicos franceses, que recolheram amostras da planta para posteriormente a estudarem na Europa. (ZUARDI, 2006) Segundo Louis Lewin, foi Napoleão Bonaparte quem criou a primeira lei proibindo a Cannabis, isso aconteceu quando o general francês conquistou o Egito em 1798, pois ao consumir a planta, os egípcios ficavam mais violentos. Assim, em 8 de outubro de 1800, o general Napoleão Bonaparte, promulgou no Egito as seguintes proibições quanto ao uso da Cannabis: Art.I: Fica proibido em todo Egito fazer uso da bebida fabricada por certos muçulmanos com a Cannabis (haxixe), bem como fumar as sementes da Cannabis, os bebedores e fumantes habituais desta planta perdem a razão e são acometidos de violentos delírios que lhes proporciona cometer abusos de todos tipos; Art.II: A preparação da bebida de haxixe fica proibida em todo Egito. As portas de todos os bares ou albergues onde é servida serão fechadas com um muro e seus proprietários colocados na cadeia por uma duração de três meses; Art.III: Todos os pacotes de haxixe que chegarão a alfândega serão con- fiscados e queimados publicamente. (1970, p.331) No mesmo sentido, Gabriel Nahas acrescentou que Napoleão em seu discurso disse que: “[...] o consumo do forte licor feito por certos muçulmanos com a erva denominada haxixe, bem como o fumo das drogas copas florais do cânhamo, ficam proibidas em todo o território do Egito”. (1986, p.30) As plantações da maconha na Europa eram destinadas à fabricação de produtos com a fibra do cânhamo e raramente era consumida como droga aluci- nógena. O frio europeu era uma das razões pelas quais a erva não era fumada no continente. Os princípios ativos da planta, THC e canabidiol, se desenvolvem em quantidade maior em ambientes quentes e ensolarados durante a maior parte do ano. Fumar maconha não fazia sentido para os europeus, porque não fazia efeito algum. (OLIVEIRA, 2012) Durante a Renascença, a maconha era um dos principais produtos agríco- las da Europa, tendo grande importância econômica: as fibras do cânhamo eram usadas para fazer tecidos, papel e telas para pinturas. No século XV, Johannes Gutemberg teve sua maior e mais famosa obra “A Bíblia de Gutemberg”, a pri- meira Bíblia impressa, feita com papel de cânhamo. (OLIVEIRA, 2012) Na Bélle 22 Époque (final do século XIX), a Cannabis virou moda entre os artistas e escritores franceses, mas era também utilizada como fármaco para dilatar brônquios e curar dores. Dentre os intelectuais que faziam o uso, podemos citar: Eugene Delacroix, Victor Hugo, Charles Buadelaire, Honoré de Balzac e Alexandre Dumas. Eles se reuniam para fumar haxixe e pesquisavam sobre o efeito da droga no tratamento de doenças mentais. (GONÇALVES, 2016) Na América do Norte, mais precisamente nos Estados Unidos, a planta do tipo fibra foi cultivada nos litorais desde 1970, usadas na fabricação de cordas, barbantes, tapetes, velas, sacos e cintos. Já das sementes extraia-se o óleo para sabões, tintas, dentre outros. A medicina americana se inspirou na inglesa, utili- zando-se da pasta da Cannabis para várias doenças, principalmente como rela- xante muscular. (NAHAS, 1986) A maconha foi trazida para a América do Sul através dos colonizadores europeus, principalmente por espanhóis e portugueses, sendo que as primeiras plantações foram feitas no Chile, por espanhóis. (BLANC, 2015) Com a chegada dos portugueses no Brasil, que já faziam o uso da maconha em suas caravelas, utilizando a fibra de cânhamo para fazer as velas e o cordame. A maconha não é uma planta nativa brasileira, ela foi introduzida no país pelos escravos africanos. De Acordo com Elisaldo Carlini (2005), A história do Brasil está intimamente ligada à planta Cannabis Sativa, desde a chegada à nova terra das primeiras ca- ravelas portuguesas em 1500. Não só as velas, mas também o cordame daquelas frágeis embarcações, eram feitas de fibra de cânhamo, como também é chamada a planta. Frederico Guilherme Graeff (1989), ao dissertar acerca da introdução da maconha no Brasil, salienta que esta se deu a partir dos escravos africanos, cuja denominação era fumo de Angola, e que logo houve uma aceitação do seu uso. Costa e Gontiès (1997) enfatizam também estudos de Pio Correia (1931) que afir- mam que as sementes do fumo da angola, tenham chegado ao território brasileiro no século XV vindas em bonecas de pano embrulhadas na ponta das tangas pelos escravos africanos. Estes autores ainda apontam que a maconha era bastante utilizada princi- palmente no Norte e Nordeste do Brasil, tendo em vista que esta desenvolvia-se nas lavouras de cana de açúcar. Elisaldo Carlini (2005) cita trecho de documento oficial, emitido pelo Ministério das Relações Exteriores, em 1959: “A planta teria sido introduzida em nosso país, a partir de 1549, pelos negros escravos, como 23 alude Pedro Corrêa, e as sementes de cânhamo eram trazidas em bonecas de pano, amarradas nas pontas das tangas”. Até então, era usada livremente e, so- mente no século XVIII é que a Coroa portuguesa se pronunciou sobre seu uso, incentivando a plantação de maconha, tendo se disseminado o uso, entre os ne- gros para fins não médicos. Os índios, por sua vez, passaram a cultivar sua própria plantação. Há quem alegue que a esposa do Rei D. João VI, Dona Carlota Joaquina, enquanto morava no país, tomava chá de maconha. (CARLINI, 2005) No século XVIII passou a ser preocupação da Coroa portuguesa o cultivo da maconha no Brasil. Mas ao con- trário do que poderia se esperar, a Coroa procurava incentivar a cultura da Can- nabis então. Em 1783, o Império Lusitano instalou no Brasil a Real Feitoria do Linho- cânhamo (RFLC), uma importante iniciativa oficial de cultivo de Cannabis com fins comerciais por causa da demanda de produtos a base de fibras que não podiam ser suprimidas apenas com o cultivo em terras portuguesas. [...] aos 4 de agosto de 1785 o Vice-Rei [...] enviava carta ao Capitão General e Governador daCapi- tania de São Paulo [...] recomendando o plantio de cânhamo por ser de interesse da Metrópole [...] remetia a porto de Santos [...] „dezesseis sacas com 39 alquei- res‟ de sementes de maconha [...]. (FONSECA, 1980, p. 34) Segundo Nireu Ca- valcanti (2014) a primeira plantação oficial de Cannabis no Brasil foi por iniciativa da própria Coroa Portuguesa remonta a 1716. Na época, o Rio de Janeiro centralizava as operações. Além de plantar a Cannabis em larga escala, seria responsável pela produção e distribuição de se- mentes para Santa Catarina, Rio Grande e Sacramento (atual Uruguai). Ainda de acordo com os seus estudos, "naquele ano, foram enviados de Lisboa 40 casais de agricultores da província de Trás-os-Montes para povoarem a Colônia do Sacramento e lá iniciarem o plantio do cânhamo e de outros espéci- mes agrícolas". As notícias dos efeitos medicinais e psicoativos da maconha só foram chegar ao Brasil na metade do século XIX, após divulgação dos trabalhos do Prof. Jacques Moreau, da faculdade de medicina da Tour na França e por es- critores e poetas franceses, sendo o uso médico o mais aceito pela classe médica brasileira. Exemplo disso eram as Cigarrilhas Grimault, cigarros “medicinais”, in- 24 dicados na época para asma, insônia, dificuldade de respirar entre outros sinto- mas e, em 1905, ainda circulavam propagandas do produto no Brasil. (CARLINI, 2005) Associações canábicas: porta de entrada legítima ao universo da cannabis medicinal As associações canábicas no Brasil são, hoje, a maior porta de entrada de pacientes ao universo da cannabis medicinal. Essa posição é fruto de anos de acolhimento de pacientes e de luta jurídica, que vão muito além do fornecimento de medicamento às populações que não se incluem nesse mercado pelo caminho traçado pela medicina tradicional, que se configura pelo muitas vezes inacessível (em termos financeiros) roteiro “médico – prescrição – importação do medica- mento no exterior”. Seu papel, na verdade, não se limita ao fornecimento de óleos, cremes ou outros produtos com cannabis. Em função de sua atuação política e social, as associações canábicas tornaram-se o mais poderoso elemento da luta pela de- mocratização do acesso à cannabis medicinal no Brasil. Na cannabis, a busca pela cura Organizações sem fins lucrativos (ONGs), elas nascem de forma orgânica – motivadas pelo apelo de mães e familiares, na maioria dos casos –, resultado da necessidade e da urgência de encontrar solução e alívio para problemas de saúde que não são bem atendidos, ou absolutamente desatendidos, pela medi- cina tradicional. 25 Ao oferecer informação, acolhimento e produtos à base da planta, como óleos e pomadas (confira aqui algumas das associações já estabelecidas no Bra- sil), associar-se a uma delas é na verdade o primeiro passo de uma jornada que vai além do uso terapêutico da cannabis. Ela inclui também estabelecer novas relações com outros pacientes, adquirir conhecimento e exercer o direito de esco- lha. O acesso provido pelas associações canábicas “Uma característica das associações é formar o pensamento do uso da cannabis na perspectiva do paciente e servir como rede para pressão e busca de direitos no judiciário e no legislativo. Temos tido bons resultados justamente por causa da pressão das associações”, diz o advogado Emílio Figueiredo, fundador, com outros colegas, do coletivo jurídico Reforma, uma rede que presta assistên- cia, muitas vezes voluntária, a pacientes que buscam na Justiça o direito de culti- var cannabis para tratamento médico. Emílio atua no mundo da cannabis há mais de dez anos e está empenhado na criação de uma federação representativa para as associações. “Já temos co- ordenações em todas as regiões do Brasil, além de uma minuta de estatuto pronta e aprovada”, conta. No total, 24 organizações estão na lista de fundadoras. A fe- 26 deração simboliza a maturidade do movimento, além de sinalizar que seus inte- grantes concentram forças para as próximas batalhas no aspecto da regulamen- tação da cannabis no Brasil. Lucros x direito universal Um dos objetivos da federação é garantir o lugar das associações na regu- lação das leis de mercado em condições menos desiguais. Aliás, há uma disputa em curso. “Dez anos atrás, ninguém falava de cannabis medicinal como um grande slogan”, diz Emílio. “Quem falava estava na Marcha da Maconha ou culti- vava maconha em casa. No entanto, agora a gente vê a apropriação dessa luta por vários entes industriais e de classe, como associações de empresas da indús- tria química e de insumos farmacêuticos. A cannabis chegou ao mainstream.” Reflexão semelhante foi proposta pelo neurocientista Sidarta Ribeiro em debate promovido pela startup The Green Hub, no último dia 21 de outubro. “A cannabis se presta maravilhosamente bem para um ecossistema bastante diverso com micro, pequenos e grandes produtores. Assim, se isso for garantido, barateia custo e tem escala. É preciso uma regulamentação que contemple o acesso de todo mundo. Sem autocultivo e sem o direito de as associações fazerem isso sem fins lucrativos, isso não vai rolar.” Primeiro oponente: o estigma As associações de familiares e pacientes começaram a surgir no Brasil em 2014 com a missão de garantir a pacientes brasileiros o acesso a medicamentos formulados com cannabis. Era um momento em que a planta ainda lutava forte- mente contra o estigma provocado por décadas de proibição, motivada pela Guerra às Drogas americana. Assim, elas trouxeram consigo uma condição dife- rente de outros medicamentos existentes no mercado: a ideia de que, para parti- cipar deste universo, é preciso antes desconstruir preconceitos (os próprios e os dos outros). Cada associação canábica no Brasil tem uma dinâmica própria e o que elas fazem está determinado em estatuto. Nem todas, pelo menos até o momento, estão aptas a fornecer medicamentos, realizar cultivo ou investir em pesquisas, por exemplo. Portanto, há aquelas que são focadas em conhecimento, educação. Outras, em eventos. Mas, no fim das contas, existe entre elas um fio condutor de https://www.thegreenhub.com.br/ 27 cooperação e de troca de experiência que tende a fortalecer o associativismo e, é claro, a cultura da cannabis. Habeas Corpus como fuga da burocracia A Associação de Apoio à Pesquisa e aos Pacientes de Cannabis Medicinal do Rio de Janeiro (Apepi) tem entre suas atividades oficinas de plantio. “É um universo completo”, diz a estudante Carolina Freitas, que trabalha no setor de acolhimento a pacientes da Apepi. Ela conta que fica evidente entre os participan- tes que plantar o próprio remédio é por si só uma atividade terapêutica. “Depois de experimentá-lo, as pessoas querem buscar o habeas corpus para não estarem submetidas à burocracia”, comenta. O custo do altocultivo é também muito redu- zido em relação aos valores dos medicamentos hoje disponíveis, inacessíveis à maior parte da população brasileira. A união de pessoas promovida pelas associações canábicas no Brasil, uni- das por um mesmo fim e sem objetivo de lucro, é no entanto uma cena que não encontra paralelo em outros países. “O que chega mais perto é o que aconteceu na Califórnia na primeira onda de legalização após 1996, e não na atual. Na época, os pacientes se organizavam em coletivos para poderem cultivar e trocar o remédio. Isso já foi dominado pelas empresas. Ou seja, o pêndulo foi para outro lado”, diz Emílio. Como as associações canábicas estão organizadas A associação é uma organização orgânica, a qual nasce sem grande aporte de capital. No Brasil, as empresas tradicionais respondem a exigências estruturais maiores. Porém, associações do terceiro setor, para existir, precisam contar ape- nas com pessoas reunidas em torno de um objetivo comum. No entanto, apenas existir é pouco: a ação é a basede tudo. E a atividade do dia a dia necessita de suportes diversos, como jurídico, administrativo, além do psicológico. Emílio completa: “Quando falamos sobre associações canábicas no Brasil que cultivam e produzem o óleo, precisamos lembrar que elas contam com suporte agronômico, botânico, farmacêutico, químico, médico etc.”. Assim, estru- turá-las de forma profissional é hoje seu maior desafio. https://apepi.org/ https://www.growroom.net/guia-habeas-corpus-cultivo-maconha/ 28 Quem pode plantar cannabis no Brasil? Sem contar cidadãos que obtiveram autorização judicial para cultivo do- méstico no país por meio de processos jurídicos, só duas organizações, até agora, podem plantar cannabis para produzir os óleos no Brasil. Primeiro, saiu o alvará da Abrace Esperança, da Paraíba, em 2017. Depois, em julho de 2020, a Apepi também obteve a liminar. Atividade da cannabis medicinal, Margarete Brito e sua família em marcha A Apepi se formou em 2014, em reuniões de mães de filhos com epilepsia refra- tária no Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). As primeiras famílias a se engajarem na iniciativa conheciam os efeitos positivos dos óleos da cannabis na diminuição das crises de convulsão provocadas pela epilepsia severa. A advogada Margarete Brito, fundadora e coordenadora executiva da Apepi, era uma daquelas mães. A filha Sofia, que na época tinha 4 anos e tem uma síndrome rara, usa canabidiol. Referência no ativismo da legali- zação da maconha medicinal, Margarete foi a primeira pessoa no Brasil a obter, em 2016, um habeas corpus preventivo para o autocultivo da cannabis. Inicialmente, as atividades da Apepi resumiam-se a encontros para compartilhar experiências entre pacientes e buscar apoio, soluções e formas de comprar me- dicamento, conta Romário Nelvo, doutorando e mestre em Antropologia Social do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ele hoje trabalha na https://cannigma.com/pt-br/conditions/epilepsia/ https://www.huffpostbrasil.com/2018/09/09/margarete-brito-uma-mae-na-luta-pelo-acesso-a-maconha-medicinal-no-brasil_a_23521635/ https://www.huffpostbrasil.com/2018/09/09/margarete-brito-uma-mae-na-luta-pelo-acesso-a-maconha-medicinal-no-brasil_a_23521635/ 29 frente de acolhimento da Apepi. “Uma vez que agora a cannabis medicinal é au- torizada no Brasil desde que o médico a prescreva, um dos esforços da Apepi é facilitar, baratear e agilizar o acesso”, diz Romário. “O que as pessoas mais têm é urgência, muitas vezes psicológica, de ver que o medicamento está na mão e que ela pode começar a luta pela saúde. As pessoas que precisam do medica- mento não têm o tempo da burocracia, do Estado, da vigilância sanitária.” Associações canábicas no Brasil promovem acolhimento Carolina Freitas, estudante de História na Universidade Estadual do Rio de Ja- neiro e de Direito na Universidade Estácio de Sá, descobriu em 2015 que tinha epilepsia refratária. Usou medicamentos alopáticos até 2017, quando encontrou na cannabis uma solução mais eficaz. Envolvida na luta pela democratização e legalização, foi chamada por Margarete para trabalhar no acolhimento da Apepi. Para isso, teve de calibrar a comunicação, aprender a ouvir e a lidar com realida- des diferentes. “Muitas pessoas chegam cansadas, com as receitas nas mãos, e acham que com- prarão a cura. Assim, precisamos explicar pacientemente que não se trata de mi- lagre”, afirma. “Elas querem respostas, às quais precisamos estar preparados para oferecer, e também saber admitir quando não sabemos.” A Apepi tem um perfil multifacetado, na opinião de Carolina. A história desta as- sociação canábica começou com a necessidade das mães e, em determinado momento, assumiu uma característica política muito forte, de debate, democrati- zação de acesso e de compartilhamento de conhecimentos sobre a planta, dosa- ges etc. “Se em 2014 essa luta surgiu pela união das mães de filhos epilépticos, hoje em dia vemos um número crescente de adultos com Alzheimer e Parkin- son buscando tratamento.” https://cannigma.com/pt-br/brasil/da-medicina-tradicional-a-cannabis-medicinal/ https://cannigma.com/pt-br/brasil/da-medicina-tradicional-a-cannabis-medicinal/ 30 Cultivo de Cannabis em Campina Grande, Abrace Esperança Apesar de manter em seu site uma lista colaborativa de médicos que pres- crevem receitas para canabidiol, a Apepi oferece também atendimento próprio. Há uma agenda, as consultas custam R$ 280 – ou quanto o paciente puder pagar – e são feitas por profissionais especializados em medicina da família. Associados que podem e querem contribuem com mais; por conseguinte, gestos assim cos- tumam ajudar a fechar as contas da associação. 31 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS LARANJEIRA, Ronaldo. Maconha: A diferença entre o remédio e o veneno. Veja, 2017. Disponível em: . Acesso em: 12 mar. 2018 LEWIN, Louis. Phantastica: Drogues psychédeliques, stupéfiantes- narcotiques, excitantes, hallucinogenes, Paris, 1970. MCGUIGAN, Mattew. Cannabinoids. in: Goldfrank, L.R. et al. Toxicologic emergencies. 8.ed. Nova York: McGraw-Hill, 2006. MONTEIRO, Marcelo. Uso medicinal da maconha no Brasil fica mais próximo, 2014. Disponível em: . Acesso em: 04 abr. 2018 NAHAS, Gabriel. A MACONHA OU A VIDA VOL 1, ed. Nordica, 1985. ________. A MACONHA OU A VIDA VOL 2, ed, Nordica, 1986. NETZAHUALCOYOTZI, Pietra. La marihuana y el sistema endocanabinoide: De sus efectos recreativos a la terapéutica. Rev Biomed, 2009. OBID, Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas, 2011. Disponível em: . 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