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A epistemologia e a filosofia política de Platão

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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ 
CURSO: Direito 
DISCIPLINA: Filosofia (ARA0099) – 2022.2 
PROFESSOR: Danilo Mariano Pereira 
UNIDADE I: Filosofia na Antiguidade (Grécia Antiga) 
AULA III: Epistemologia e a filosofia política de Platão 
Temas de Aprendizagem 
- A obra e a vida de Platão: trajetória e importância histórica para a filosofia 
- Principais conceitos: mundo das ideias, Mito da Caverna e dialética 
- A filosofia política de Platão: idealismo, holismo, ditadura dos sábios, juspositivismo etc. 
Situação-Problema 
“Que o filósofo seja rei, que o rei seja filósofo, nisso reside uma fórmula surpreendente para 
um filho de Atenas que viveu o milagre da experiência democrática. (...). A leitura que os tempos 
históricos fizeram de Platão reconheceu nele um totalitário, cuja proposta de um governo do melhor 
é, na verdade, um modelo acabado de ditadura”. (Mascaro, 2018, p. 68). 
Para Platão, não se constrói uma sociedade justa por meio do simples debate de ideias, à moda 
dos sofistas. Para ele, é preciso conhecer a essência do justo, por meio da filosofia, da ciência, do 
conhecimento etc. Logo, é preciso que pessoas sábias, portadoras de tal conhecimento, encarreguem-
se da administração pública, da criação das leis e da magistratura. O problema é que isso acarreta 
uma espécie de “ditadura dos sábios”, que impõem sobre a sociedade sua visão acerca da justiça. 
Pergunta-se: Em que consiste a epistemologia de Platão? Como se chega à verdade, de acordo 
com sua filosofia? E como essa epistemologia se desdobra em uma filosofia política e do direito? 
Referências 
MASCARO, Alysson Leandro. “A filosofia do direito grega”. In: Filosofia do direito. 6ª 
edição. São Paulo: Editora Atlas, 2018. 
Atividade Verificadora da Aprendizagem 
Um governante sábio (um rei-filósofo) pode conhecer o bem comum e o interesse público 
mais do que o próprio povo? Qual é o papel da ciência e do conhecimento na política? 
 
Platão: trajetória e importância histórica para a filosofia 
Platão é considerado o primeiro grande autor da história da filosofia. 
Platão (428-347 a. C.) é a primeira grande expressão genial da história da filosofia. 
Seu legado escrito, constituído em geral sob a forma dos chamados Diálogos, preservou-se 
em sua maioria até os dias atuais. Preocupado com as questões últimas e mais profundas da 
filosofia, Platão é responsável por um grande sistema de pensamento que deixou indeléveis 
marcas na visão de mundo ocidental, desde seu tempo até hoje. Pode-se dizer mesmo que 
uma espécie de metafísica das ideias como sendo o senso comum médio da filosofia 
principiou com Platão. (Mascaro, 2018, p. 58). 
Descendente de uma família nobre, parte da elite política de Atenas, Platão tornou-se o mais 
importante discípulo de Sócrates. Inicialmente, isso acarretou a perda do prestígio e da carreira 
política que poderia ter herdado, pois os discípulos de seu antigo mestre foram alvo de dura 
perseguição em Atenas. Posteriormente, no entanto, quando a filosofia passou a ser valorizada e 
cultivada em toda a Grécia antiga, Platão conquistou o status de figura pública extremamente 
respeitada. Sua filosofia do direito, ao tratar de temas como justiça, Estado, política, leis etc., levou-
o inclusive a assumir cargos públicos em algumas cidades. Porém, saiu-se terrivelmente mal nessa 
tarefa, o que levou até mesmo a modificar radicalmente suas ideias ao final da vida. 
O mais importante aluno de Sócrates, Platão descendia de família nobre e 
aristocrática de Atenas. Seus parentes inclusive foram responsáveis pelo governo ateniense 
em tempos que lhe foram imediatamente anteriores. Desde jovem Platão acompanhou os 
passos do ensino de Sócrates, tendo vivenciado proximamente seu julgamento e execução, 
guardando desse fato profundas implicações para seu posterior pensamento filosófico, 
político e jurídico. Talhado desde o berço familiar para a política, Platão renunciou, a 
princípio, à atuação na liderança política, situação reforçada pela perseguição ateniense a 
Sócrates e seus discípulos, o que lhe fez ter como ocupação inicial, mais do que agir, 
compreender os fundamentos da política e da justiça. Somente em etapa posterior, já com seu 
sistema filosófico fundado, Platão dedicou-se à prática política, sugerindo leis para Atenas e 
Siracusa, por exemplo. Em muitas dessas ocasiões, logrou grande insucesso pessoal, sofrendo 
inclusive prisões. (Mascaro, 2018, p. 58-59). 
Platão criou a primeira grande escola de filosofia da Antiguidade, a Academia, na qual foi 
professor de pensadores notáveis, como Aristóteles, o mais importante deles. 
Seus textos, na forma de diálogos (reais ou fictícios) entre Sócrates e seus interlocutores, 
revelam a importância, que aprendeu com seu mestre, da problematização, do questionamento, da 
reflexão que busca aprofundar as ideias em busca da verdade e do conhecimento. 
Em Atenas, após as perseguições e o exílio devidos à condenação de Sócrates e a 
sorte que recaiu sobre seus discípulos, Platão leciona naquela que fundou e que seria a 
primeira grande escola de filosofia do passado, a Academia. Dentre os melhores jovens 
filósofos que formou, esteve Aristóteles, seu mais brilhante discípulo. O pensamento de 
Platão é vasto, utilizando-se dos diálogos como meio de exposição de seu pensamento. No 
geral, os diálogos relatam conversas que têm por principal interlocutor Sócrates, travando 
palestras com inúmeros personagens. A história da filosofia dedicou-se, sempre com muita 
controvérsia, a saber da veracidade de tais diálogos. É possível que, em vários casos, tenha 
mesmo Sócrates desenvolvido tais ideias. Mas, também, é certo que, principalmente nos 
diálogos escritos em sua maturidade, Platão utiliza Sócrates muito mais como mote para o 
desenvolvimento de suas próprias ideias do que propriamente como personagem de quem se 
relate fielmente seus fatos havidos. (...). A importância dos diálogos de Platão é muito grande 
na filosofia. Além disso, têm uma estrutura muito específica. Os diálogos platônicos não são 
tratados de filosofia do modo como se conhece na sua forma moderna, de ensaio ou 
monografia. (Mascaro, 2018, p. 59-60). 
Principais conceitos: mundo das ideias, Mito da Caverna e dialética 
Platão é muito conhecido pela noção de mundo das ideias, que constitui uma espécie de plano 
transcendental, um outro mundo, no qual se encontram as essências das coisas, as ideias perfeitas, as 
formas puras, isto é, a verdade. Esse mundo ideal se contrapõe ao mundo real, que é o mundo das 
aparências ou impressões sensíveis, isto é, este plano imanente em que nos encontramos e o qual 
acessamos de forma direta e imediata por meio da experiência. Para Platão, o papel dos filósofos é 
justamente superar este mundo das aparências, imperfeito, enganoso, inferior, para buscar o mundo 
das essências, perfeito, ideal e superior. 
Essa visão revela não apenas a face quase religiosa do pensamento de Platão, mas 
principalmente sua visão idealista e sua convergência com o racionalismo, segundo o qual a verdade 
e o conhecimento não estão nas experiências ou no mundo empírico, mas sim nas ideias, no 
pensamento, que construímos (ou acessamos, pois trata-se de um mundo) por meio da razão. 
Nesse sentido, Platão se contrapõe antecipadamente à tradição empirista da filosofia que 
surgiria e se consolidaria posteriormente, a começar por seu próprio discípulo Aristóteles. 
[para Platão], é impossível fixar a razão nos limites da apreensão sensível das coisas. 
A realidade é contingente, falha, limitada. É preciso, pois, fazer um movimento de busca de 
uma realidade suprassensível, que alcance o nível das Ideias (eîdos). Platão, portanto, 
distingue o mundo das realidades sensíveis daquele nos quais as Ideias se assentam. 
(Mascaro, 2018, p. 60). 
Toda essa elaboração filosófica aparece codificada no famoso Mito da Caverna, que constitui 
uma das passagens mais importantes da obra de Platão e nos conduzàs reflexões, segundo as quais, 
(i) aquilo que vemos com nossos próprios olhos são apenas sombras, projeções deformadas daquilo 
que verdadeiramente existe; (ii) o mundo em que vivemos é, na verdade, uma prisão e nós estamos 
condenados a acreditar nas ilusões que nos rodeiam; e (iii) a verdade é uma libertação, que nos permite 
sair deste mundo sombrio e chegar à luz, a um plano superior, onde se encontram as coisas que 
verdadeiramente existem em suas próprias formas e conteúdos. 
Não deixa de ser irônico o fato de que Platão emprega um mito como ferramenta conceitual – 
justo ele que encampou o projeto de uma filosofia como modo de pensamento alternativo à mitologia. 
Ademais, é importante dizer que Platão deu sua própria contribuição ao enredo da história, 
acrescentando o assassinato do homem que escapou da caverna por seus companheiros, em referência 
explícita a Sócrates, executado por seus concidadãos, incapazes de aceitar a verdade por ele revelada. 
Há um símbolo marcante para tratar das Ideias em Platão. É o conhecido Mito da 
caverna, exposto no Livro VII dA República. Na narrativa dada a Platão a tal mito, havia 
presos agrilhoados que, de dentro de uma caverna e de costas à luminosidade do exterior, 
observavam a movimentação da realidade externa e, a partir das sombras dos objetos e seres 
que estavam no exterior da caverna, faziam juízo a seu respeito, sobre sua forma, sua 
aparência, seu tamanho. Na verdade, no entanto, viam apenas as sombras desses seres 
projetadas no interior da caverna. Em uma certa ocasião, libertando-se dos grilhões que os 
prendiam, um daqueles que se situavam na caverna sobe ao alto, e tal subida é difícil, já que 
o corpo até então agrilhoado não está acostumado ao movimento. Ao chegar ao exterior, 
cega-se, num primeiro momento, com a luz solar que brilhava. Mas, após se acostumar a 
enxergar sob a claridade da luz, passa a compreender que as sombras que via projetadas na 
caverna, na verdade, eram imagens distorcidas. A verdade não estava naquilo que suas 
percepções corrompidas viam a partir das sombras. A luminosidade do ser só brilhou quando 
da libertação das imagens e dos conceitos imperfeitos. 
No mito proposto pela boca de Sócrates na República, há ainda a incompreensão 
daqueles que, de dentro da caverna, ouvem daquele que subiu, em sua volta, o relato da 
verdade do mundo exterior. Suas imagens distorcidas que sempre viram não correspondem 
ao relato tido por fantasioso e absurdo do homem que se libertou. A luz que brilhou e 
possibilitou que o liberto da caverna visse a plena verdade não é bem aceita pelos seus, que 
passam a persegui-lo e o matam, numa simbologia muito forte, da parte de Platão, a respeito 
do próprio destino que os atenienses deram a Sócrates. (Mascaro, 2018, p. 61). 
Em termos de análise mitológica, cabe perguntar como o homem da caverna conseguiu 
destruir seus grilhões e escapar dessa prisão. Filosoficamente, isso significa perguntar-se pelo 
método, isto é, pelo procedimento a ser adotado pelos filósofos, a ferramenta a ser por eles empregada 
na busca pela verdade. Essa é uma preocupação central na obra de Platão, afinal, Sócrates já ensinara 
que a verdade não está disponível para um acesso fácil por qualquer pessoa, mas, sim, deve ser 
permanentemente buscada por meio de um exercício árduo, ao qual os filósofos devem se dedicar de 
forma diligente, persistente e disciplinada. 
Esse método é a dialética, que consiste no contraste de ideias, na contraposição entre visões 
opostas, com o objetivo de chegar a uma ideia superior, a uma visão elevada em comparação às que 
se tem inicialmente. Revelado no próprio comportamento de Sócrates, o método da dialética tem 
como fundamento a necessidade de se questionar, problematizar, indagar, não apenas o outro, mas, 
sobretudo, a si mesmo. Portanto, trata-se de um tipo especial de diálogo, que permite aos participantes 
superar suas impressões sensíveis e atingir a verdade. 
Nesse sentido, deve-se salientar a diferença entre a dialética, proposta por Platão, e a retórica, 
praticada pelos sofistas. A retórica é um diálogo que tem a forma de uma disputa, um confronto. Cada 
participante desse diálogo tem o objetivo de convencer o outro, de triunfar, de sobrepujar o outro por 
meio da força argumentativa. Quando isso não é possível – como frequentemente ocorria nos debates 
democráticos –, os participantes devem tratar de chegar a um acordo, a um interesse mútuo, um 
consenso, entendido como o meio do caminho, que evita as perdas em demasia por ambas as partes. 
Já a dialética é um diálogo que tem a forma de uma cooperação, uma aliança. Os participantes, 
contrapondo suas diferenças, buscam atingir a verdade, que não está contida em nenhum dos dois, 
mas sim em um plano transcendental, superior, ao qual eles chegarão juntos ao final dessa interação. 
A dialética é o método que permite sair do mundo sensível e alcançar as ideias. 
Enquanto atrito de percepções, fatos, opiniões e diálogos, a dialética supera o nível das 
imagens e das definições dos dados sensíveis. Ao contrário dos sofistas, que dialogavam para 
que no limite as partes chegassem a um acordo, a uma concessão, a um meio-termo entre 
duas opiniões, na dialética platônica trata-se do atrito de entendimentos para que, ao final, 
numa espécie de salto, chegue-se à verdade. O contraste com os sofistas – que dialogavam 
para facilitar as convenções, o mero consenso – serve para explicitar que a busca platônica é 
pela essência, por aquilo que paire soberano por sobre as falsas opiniões, o Bem. A essência 
não está contingente aos fatos, a cada fenômeno que se vê, mas, sim, impõe-se como Forma, 
no geral. Não é a compreensão de cada objeto da realidade que exprime sua verdade. É a 
compreensão da essência, da Ideia suprema, que levará ao verdadeiro. A posterior aplicação 
da Ideia na realidade constitui-se na ciência, uma ciência perfeita, porque de conclusões 
extraídas a partir do princípio essencial. (Mascaro, 2018, p. 60-61). 
A filosofia política de Platão: idealismo, holismo, ditadura dos sábios, juspositivismo etc. 
Além da epistemologia, a obra de Platão se notabilizou por sua filosofia política e do direito. 
Nesse campo de conhecimento, uma das características mais importantes do pensamento desse autor 
é uma visão, segundo a qual, não é possível separar justiça e direito. Para ele, o direito é a arte de 
promover justiça, o que constitui seu objetivo essencial. Assim, uma lei que se mostra incapaz de 
promover justiça não deve sequer se considerada como uma lei, pois ela não tem razão de ser, é 
essencialmente espúria. Logo, não há motivo para se cumprir uma tal lei. Na prática, esse pensamento, 
característico das obras de juventude de Platão, introduz uma defesa do que hoje chamaríamos de 
desobediência civil, isto é, um descumprimento deliberado de uma lei em face de seu caráter injusto. 
Na sua obra máxima, A República, Platão expõe o primeiro importante sistema de 
reflexão sobre o direito e o justo da história da filosofia. Sobre o próprio direito, ainda, há 
um outro grande tratado platônico, As leis, que foi o último escrito de sua vida, e também a 
sua obra mais extensa. Além disso, questões jurídicas e sobre o justo encontram-se presentes 
em muitos outros diálogos, como, por exemplo, em O político. 
A concepção platônica sobre o justo é muito peculiar e especial. Difere totalmente 
da visão que o jurista moderno tenha sobre o direito. Para o pensamento de Platão, torna-se 
muito difícil dissociar direito de justiça, o que é reforçado pelo fato de que a mesma palavra, 
díkaion, é utilizada de maneira intercambiável no texto platônico para essas duas ideias. 
(Mascaro, 2018, p. 62-63). 
Nesse sentido, a visão de Platão é fortemente contrária ao juspositivismo. Para ele, o mérito 
de uma lei não jaz no fato de ela ser uma lei positiva, isto é, ter sido concebida e instituída pelo Estado. 
O mérito da lei faz, sim,em sua virtude, em sua capacidade de promover justiça. 
Para Platão, de um modo surpreendente ao olhar moderno – acostumado, de maneira 
juspositivista, ao direito como técnica normativa –, é possível até mesmo considerar que uma 
lei injusta não seja direito (...). No pensamento filosófico de Platão, não se pode considerar 
que o conhecimento do direito seja, simplesmente, uma apreensão empírica dos fatos 
jurídicos ou das normas jurídicas. Platão não é um juspositivista. Pelo contrário, o 
juspositivismo, que descuida de outras questões que não a mera lei, matou Sócrates. Assim 
sendo, não é do afazer quotidiano dos que se ocupam da lei que se pode extrair o justo e o 
direito. (Mascaro, 2018, p. 63). 
Se o objetivo essencial das leis é promover justiça, é preciso que tanto os legisladores (os 
cidadãos que se reúnem para definir as regras da polis) quanto os governantes (aqueles encarregados 
de cumprir as leis instituídas na pólis) conheçam a essência da justiça. 
E o conhecimento sobre a essência de qualquer coisa não se obtém por meio da retórica 
praticada pelos sofistas, isto é, o confronto de ideias, a disputa de interesses ou a busca por um acordo 
ou convenção que satisfaça igualmente as partes envolvidas nessa disputa, mas sim da dialética 
praticada pelos filósofos, isto é, do exercício humilde, disciplinado e diligente de busca pela verdade. 
Levantando-se contra a democracia de Atenas, sua própria pólis – que se ocupava 
dos trâmites das normas mas não de sua essência nem de sua justeza –, Platão considera que 
a assembleia democrática, ao fazer as leis, o faz tal qual uma mesma assembleia de cidadãos 
buscando, por maioria de votos, fazer prescrições médicas a um doente. O sofista, que 
argumentava para conseguir a aprovação de uma lei do interesse daquele que lhe pagava, ou 
mesmo que atuava numa função próxima à do moderno advogado, sofre uma censura 
fundamental por parte de Platão, pelo seu debate que não se fixa em torno do justo, mas 
apenas nos quadrantes do convencimento da maioria. Por isso, se se quiser pensar no direito 
e no alcance do justo, devido à inabilidade e à falta de conhecimento filosófico e dialético do 
povo, dever-se-á afastar a busca do justo do debate sofista e descompromissado, levando-a, 
necessariamente, ao caminho de seu encontro na ideia, sendo que o filósofo, o sábio ao qual 
a ideia se revela na alma, é aquele que pode alcançar o justo. (Mascaro, 2018, p. 63). 
Antes de apresentar sua própria definição filosófica sobre a essência da justiça, Platão narra 
episódios da vida de Sócrates em que seu mestre questiona, aprofunda e refuta algumas visões 
existentes no senso comum da época. Nesse exercício, seu ponto mais importante é a recusa da 
concepção de justiça como o simples cumprimento de obrigações individuais em relação aos outros. 
Para Platão, a essência da justiça não está na conduta de quem faz tudo aquilo que de si se espera, 
pois, ao fazê-lo, pode-se, inadvertidamente, contribuir para a promoção e a perpetuação de injustiças. 
No sentido vulgar e comum, o direito se esparrama pelos fatos e pelas opiniões das 
pessoas na sociedade. Em A República, logo em sua entrada, no Livro I, Platão expõe, pela 
boca de Sócrates, as mais variadas opiniões comuns a respeito da justiça (...). A primeira das 
refutações de Sócrates se dá quanto às ideias de Céfalo, pai de Polemarco. Homem rico e 
bom, de responsabilidade e sabedoria apreciadas por muitos – reconhecidas inclusive pelo 
próprio Sócrates –, Céfalo expõe uma noção de justiça como cumprimento dos deveres em 
face dos outros e das coisas. Aquele que cumpre com suas obrigações seria justo. Sócrates, 
no entanto, mesmo reconhecendo em tal visão uma ponderação valiosa, refuta-a, rejeitando, 
então, um caráter do justo como mero cumprimento obrigacional, num sentido de pagamento 
comercial (...). Céfalo, fabricante de armas, não poderia ser considerado justo apenas por 
entregar a alguém o que fosse seu. Restituir uma arma a quem não tivesse condições mentais 
para portá-la seria uma injustiça contra a própria sociedade. (...). Trata-se, da parte de 
Sócrates, de um rompimento bastante precoce em face de uma visão do justo adstrita às partes 
ou às coisas, ou mesmo mercantil, para postular uma análise das implicações sociais – e, 
portanto, totais – dos atos e de suas distribuições justas. (Mascaro, 2018, p. 64). 
Consequentemente, para Platão, justiça não é um atributo das condutas individuais, mas sim 
uma condição que se verifica na pólis, isto é, na sociedade. Em outras palavras, justiça é justiça social. 
Nisso reside, para Platão, a essência da justiça. O cumprimento das obrigações individuais somente 
será uma conduta justa se tais obrigações tiverem sido designadas ao indivíduo tendo como referência 
a construção de uma sociedade justa. Não se pode dizer que a conduta desse indivíduo seja justa se, 
ainda que constituindo uma obrigação, essa conduta contribua para as injustiças da sociedade. 
A questão do justo, assim sendo, desloca-se, em Platão, do plano do indivíduo para 
o plano da pólis. Será a pólis justa a medida dos homens justos, e não o contrário. Isso quer 
dizer, havendo distorções graves na sociedade, não se há de dizer que os afazeres jurídicos 
individuais possam lhes ser considerados alheios. A justiça, para Platão, é necessariamente 
justiça social. (...). Na visão moderna do direito, a ideia de Platão é profundamente rechaçada. 
Hoje, cada homem, pagando seus impostos, não roubando e não matando, considera-se justo, 
e, ainda assim, a sociedade em que vivem os homens é injusta. (...). Platão, desde o início, 
supera tal dilema: não há homem justo numa sociedade injusta, porque a medida da justiça é 
social. (Mascaro, 2018, p. 65-66). 
A visão de Platão sobre justiça e sociedade não é apenas anti-individualista, mas efetivamente 
holística e orgânica. Isso significa que os indivíduos – mais precisamente, as classes sociais, isto é, 
os grupos de indivíduos que formam uma sociedade – só podem ser pensados como partes de um 
tudo, ou seja, como partes que devem cumprir bem seu papel para o bom funcionamento do todo, da 
mesma forma que células, tecidos e órgãos diferentes se conjugam para fazer funcionar um corpo. 
Tal visão pode ser verificada nas propostas mais ou menos concretas de Platão para temas 
como educação, política econômica e organização social. Para ele, o papel das instituições 
educacionais é identificar aptidões e desenvolver nos indivíduos as virtudes e competências que lhes 
permitam desempenhar as funções correspondentes às diversas classes sociais que constituem essa 
sociedade. Para isso, é preciso acabar com os privilégios, que permitem a certos indivíduos escolher 
livremente o próprio destino e condenam outros às posições inferiores. No plano da política 
econômica, isso implica a própria abolição da propriedade privada e o fim da concepção de família 
nuclear como entidade autônoma na sociedade, configurando uma espécie de “comunismo platônico”. 
Para tal justiça social, uma série de realizações há de se constituir. A busca das 
aptidões mais apropriadas a cada qual dentro da sociedade remete a filosofia de Platão à 
preocupação com a educação. É por meio da paideia, da educação, que se há de descobrir as 
variadas classes sociais, dos artesãos, dos guerreiros e mesmo dos filósofos, às quais 
correspondem as virtudes da moderação, da coragem e da sabedoria. A possibilidade de uma 
igual educação a princípio a todos é que demonstrará as melhores aptidões de alguns em 
relação aos demais. (...). 
Mas, para que se alcance esse nível de igualdade efetiva de oportunidades a todos, 
é preciso que se estruture um arranjo econômico e social distinto daquele havido ao seu 
tempo. Para Platão, é preciso, no plano mais alto da justiça, fazer perecer, em certas 
circunstâncias, institutos como os da família unicelular e da propriedade privada que se legue 
como sucessãoaos filhos, pois que dissolvem a igualdade de condições e o vínculo maior 
entre todos na sociedade. As variadas experiências de Platão na pólis de Siracusa, quando 
convidado para lá legislar, dão dimensão dessa tentativa de transformar as bases dos arranjos 
sociais. Tal comunismo platônico é sua tentativa radical de estruturar o justo a partir dos 
alicerces concretos da sociedade, e não simplesmente no nível das normas ou das vontades 
individuais. (Mascaro, 2018, p. 66-67). 
Como foi dito, todo esse conhecimento acerca da suposta essência da justiça não é acessível 
por meio da retórica sofista, tampouco dos dogmas e mitos religiosos, mas sim por meio da filosofia. 
Logo, os filósofos, entendidos, literalmente, como os donos da verdade, devem ser governantes. Sua 
sabedoria, que captura a essência das coisas, deve se impor sobre todas as impressões sensíveis que 
constituem a visão de cada cidadão. Nesse sentido, trata-se de uma espécie de “ditadura dos sábios”, 
isto é, uma submissão da vontade popular ao poder absoluto do rei-filósofo. 
Que o filósofo seja rei, que o rei seja filósofo, nisso reside uma fórmula 
surpreendente para um filho de Atenas que viveu o milagre da experiência democrática. Mas 
tal ideia se revela, no sistema platônico, uma decorrência necessária de suas amarras gerais. 
A leitura que os tempos históricos fizeram de Platão reconheceu nele um totalitário, cuja 
proposta de um governo do melhor é, na verdade, um modelo acabado de ditadura. De fato, 
a leitura de Platão presta-se a tal assunção do sábio sobre os demais. (Mascaro, 2018, p. 68). 
No entanto, ao mesmo tempo em que defende a submissão do povo aos sábios, Platão defende 
não apenas a desobediência civil em face de leis injustas, mas também o golpe de Estado em face de 
governantes injustos. Ironicamente, Platão chega a defender a imposição da verdade pela força, 
verificada na ascensão, por ele saudada, de um governante justo por meio do assassinato do injusto. 
Mas, mitigando a leitura totalitária, é também fundamental lembrar que, para Platão, 
a medida do justo está na pólis. Assim sendo, não é o soberano legislador o momento mais 
institucionalizante da filosofia platônica. É a sua sabedoria – ou seja, a sua justiça 
concretizada na justa pólis, que lhe é espelho – a âncora do poder. O governante não sábio, 
que torna uma sociedade injusta ou a conserva como tal, não deve permanecer no poder. (...). 
No limite, a filosofia política de Platão vaga diretamente do extremo do autoritarismo do 
sábio ao outro extremo da desobediência civil em face do não sábio. Nesse sentido, expõe 
Michel Villey: Mais vale a justiça viva e perfeita do filósofo-rei, dotado de poderes absolutos. 
(...). Platão chega até a fazer a apologia da ilegalidade – do golpe de Estado contra as leis – 
praticada pelo ditador (supondo-se que este seja um filósofo); talvez tenha pensado aqui em 
defender seu amigo Díon, que assassinara o tirano de sua cidade, Siracusa, contra as leis 
daquela cidade (Mascaro, 2018, 68-69). 
Na velhice, Platão modificou radicalmente suas ideias. Depois de algumas experiências mal 
sucedidas em cargos políticos, ele passou a defender uma visão que converge justamente com o 
juspositivismo, que ele tanto criticara na juventude. Além disso, seu idealismo radical deu lugar a 
uma ideia contrária, isto é, um certo empirismo jusfilosófico. Isso porque, para o Platão velho, a 
essência da justiça jaz, não em alguma formulação filosófica transcendental, mas sim nos costumes, 
isto é, no plano imanente das experiências de cada povo. Por essa visão, sociedade justa é a que 
respeita os costumes de seu povo. As leis positivas, por sua vez, são vistas como produtos dos 
costumes, o que as torna portadoras de um mérito intrínseco, independentemente de seu conteúdo. 
Tal capacidade, Platão atribui às leis mesmo que elas tenham sido impostas por príncipes que ditam, 
arbitrariamente, o modo de vida de seu povo. Assim, a única característica que permanece nessa fase 
da obra de Platão é a apologia da ditadura. 
Na fase de sua velhice, no seu último livro, As leis, Platão mitiga de algum modo 
suas posições. Reconhecendo a dificuldade real de que, na prática, o filósofo venha a se tornar 
rei, e que haja além disso uma sucessão de reis filósofos, e tendo mesmo enfrentado 
perseguições graves por conta de sua legislação revolucionária e radical, Platão (...) concede 
à verificação dos costumes das pólis uma potencial fonte de criação de normas. Nesse caso, 
os juízes hão de se tornar, então, escravos das leis, já que elas podem exprimir o justo. (...) 
Platão acaba por sair do extremo da quebra das amarras jurídicas para uma forma peculiar de 
positivismo jurídico (...). Trata Villey: É digno de nota que Platão, tendo partido de tão alto, 
acabe terminando, no fim das contas, numa espécie de positivismo jurídico bastante 
grosseiro. É este, com efeito, o defeito dessa doutrina ambiciosa demais, ideal demais. Por 
ter mirado alto demais, acaba caindo muito abaixo. O direito deveria emanar apenas do 
filósofo; como não há filósofo ou, se o filósofo existe, ele não está no governo, entrega-se o 
direito à ditadura do príncipe. (Mascaro, 2018, p. 69).

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