Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

{R
od
a 
de
 C
ap
oe
ir
a 
e 
 
O
fí
ci
o 
do
s 
M
es
tr
es
 d
e 
C
ap
oe
ir
a 
}
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
} }}}}}}}}}}}}}}} } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}
}}} } } } } } } } } } } } } } } } } } }
dossiê iphan 12 Roda de Capoeira e 
Ofício dos Mestres de Capoeira }
{
dossiê iphan 12 Roda de Capoeira e 
Ofício dos Mestres de Capoeira }
{
Quem vem lá sou eu, 
quem vem lá sou eu, 
Berimbau mais eu, 
capoeira sou eu.
 Domínio público
TÉCNICOS RESPONSÁVEIS PELO 
ACOMPANHAMENTO
na Superintendência do Iphan na Bahia 
Maria Paula Adinolfi
na Superintendência do Iphan em Pernambuco 
Elaine Muller
Equipe Técnica de Produção do Dossiê 
COORDENAÇÃO
Wallace de Deus Barbosa
ASSISTENTE DE COORDENAÇÃO
Maurício Barros de Castro
CONSULTORES
Frederico José de Abreu 
Matthias Rohrig Assunção
Instituto do Patrimônio Histórico e 
Artístico Nacional
DEPARTAMENTO DO PATRIMÔNIO IMATERIAL – 
DPI/IPHAN
SEPS Quadra 713/913 Sul, Bloco D, 
Edifício IPHAN, 4º andar 
CEP 70.390-135 Brasília – DF 
Telefone: (061) 2024-5401 
Email: dpi@iphan.gov.br
PRESIDENTA DA REPÚBLICA
Dilma Rousseff
MINISTRA DA CULTURA
Marta Suplicy
PRESIDENTA DO IPHAN
Jurema de Sousa Machado
DIRETORA DO DEPARTAMENTO DE 
PATRIMÔNIO IMATERIAL
Célia Maria Corsino
DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE 
ARTICULAÇÃO E FOMENTO
Luiz Philippe Peres Torelly
DIRETOR DO DEPARTAMENTO 
DE PATRIMÔNIO MATERIAL
Andrey Rosenthal Schlee
DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE 
PLANEJAMENTO E ADMINISTRAÇÃO
Marcos José Silva Rêgo
SUPERINTENDENTE DO IPHAN 
NA BAHIA
Carlos Amorim
SUPERINTENDENTE DO IPHAN 
EM PERNAMBUCO
Frederico Almeida
SUPERINTENDENTE DO IPHAN 
NO RIO DE JANEIRO
Ivo Barreto
Departamento de Patrimônio Imaterial
COORDENAÇÃO-GERAL DE IDENTIFICAÇÃO 
E REGISTRO
Mônia Luciana Silvestrin
COORDENAÇÃO-GERAL DE SALVAGUARDA
Rívia Ryker Bandeira de Alencar
COORDENAÇÃO DE IDENTIFICAÇÃO
Ivana Medeiros Pacheco Cavalcante
COORDENAÇÃO DE REGISTRO
Flávia de Sá Pedreira
COORDENAÇÃO DE APOIO À SUSTENTABILIDADE
Alessandra Rodrigues Lima
COORDENAÇÃO DE CONHECIMENTOS 
TRADICIONAIS ASSOCIADOS
Ana Gita de Oliveira
CENTRO NACIONAL DE FOLCLORE E 
CULTURA POPULAR – CNFCP
Cláudia Márcia Ferreira
Pesquisa Histórico-Documental e de Campo
Rio de Janeiro 
PESQUISADORES
Carlo Alexandre Teixeira
Cristiana Nastari Villela
David Nascimento Bassous
Hugo de Lemos Bellucco
Johnny Alvarez Menezes
ESTAGIÁRIOS
Bárbara Tinoco
Bernardo Guimarães
Filipe Gonçalves
Salvador
PESQUISADORES
Adriana Albert Dias
Amélia Conrado
Ricardo Biriba
ESTAGIÁRIOS
Lucylane Oliveira
Nilo Ricardo Lobo
Recife
PESQUISADORES
Izabel Cordeiro
Marco Aurélio Lauriano de Oliveira
Maria Jaidene Pires
Vânia Fialho
ESTAGIÁRIOS
Annelise Lins Meneses
Graciane Costa Gomes dos Santos
Joice Poliana da Paixão Sales
Karina Lira da Silva
Paula Natanny Rocha Bezerra
Sílvia Carla Lafaiete
FOTOGRAFIA E PESQUISA ICONOGRÁFICA
Eduardo Monteiro
PÁGINA 2
RODA DE CAPOEIRA DE BAIRRO, 
PROVAVELMENTE CORTA BRAÇO, 
NA LIBERDADE.
FOTO PIERRE VERGER.
PÁGINA 4
CENAS DE CAPOEIRA NA BAHIA. MESTRE 
JUVENAL E ALUNO.
FOTO: PIERRE VERGER@FUNDAÇÃO 
PIERRE VERGER.
PÁGINA AO LADO
CENAS DE CAPOEIRA NA BAHIA. MESTRE 
JUVENAL E ALUNO – DEFESA DE ATAQUE 
COM FACA.
FOTO: PIERRE VERGER@FUNDAÇÃO 
PIERRE VERGER.
Vídeo
ROTEIRO
Wallace de Deus Barbosa
Maurício Barros de Castro
Registro da Roda de Capoeira e do Ofício 
dos Mestres de Capoeira
Processo n° 01450.002863/2006-80
PROPONENTE
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
DADOS DO PROCESSO
Pedido de registro aprovado na 57ª Reunião do 
Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, em 15 de 
julho de 2008.
Roda de Capoeira
Inscrição no Livro de Registro das Formas de 
Expressão em 21 de outubro de 2008.
Ofício dos Mestres de Capoeira
Inscrição no Livro de Registro dos Saberes em 
21 de outubro de 2008.
Frederico G. Brigges, Gianny Melo, Isaac 
Mendes Belisario, J. B. Debret, J. B. Von Spix, 
J. M. Rugendas, John Rose, Luis Edmundo, 
Marcel Gautherot, Mestre Pastinha, Mestre 
Bimba, Nestor Silva, Pierre Verger, Sales, 
Sandro Guimarães, Tt Catalão, Xim-Xim, 
Zacharias Vagener
MONTAGEM
André Sampaio 
LOCUÇÃO
Luiz Motta
FINALIZAÇÃO DE ÁUDIO
Luiz Eduardo do Carmo
IMAGENS DO RIO DE JANEIRO
Luiz Araújo
IMAGENS DE RECIFE
Antônio Luiz Carrilho
Hamilton Costa Filho
IMAGENS DE SALVADOR
Tenille Bezerra
Bruno Saphira
Wallace de Deus Barbosa
IMAGENS ADICIONAIS
Gabriela Gusmão
Wallace de Deus Barbosa
Edição do Dossiê
COORDENAÇÃO DE EDIÇÃO 
Yeda Barbosa
PROJETO GRAFICO
Victor Burton
REVISÃO DE TEXTOS
Alexandra Bertola
Angélica Torres Lima
Gilka Lemos
Rosalina Gouveia
Grace Elisabeth de Oliveira Cruz
DIAGRAMAÇÃO
Avellar e Duarte Serviços Culturais
FOTOGRAFIAS E ILUSTRAÇÕES
Acervo Técnico Do Iphan, Acervo Técnico 
do Centro Nacional de Folclore e Cultura 
Popular, Agostino Brunias, Albano Neves 
e Souza, Augustus Earle, Calixto Cordeiro, 
Carybé, Cristiano Junior, Eduardo Monteiro, 
Francisco Moreira da Costa, Frederic Mialhe, 
9Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
10 apresentação
13 introdução
18 Referências Históricas
19 Origens e mitos fundadores
22 Primeiros registros 
iconográficos
22 As cidades da capoeira
47 O nascimento de uma nova 
tradição da capoeira / 1930-1940
52 O processo de folclorização e 
esportização / 1950-1970 
62 A globalização da capoeira
64 O Aprendizado e as 
Escolas de Capoeira 
71 Da rua para a academia. O 
nascimento das primeiras escolas 
de capoeira
82 Algumas trajetórias da 
capoeira nos dias atuais
90 Descrição das Rodas de 
Capoeira
91 Etnografia e performance
94 Os movimentos e golpes
98 O canto, os toques e a dinâmica 
das rodas
102 Os Instrumentos
105 Berimbau
108 Atabaque
110 Pandeiro
32 Agogô e reco-reco
112 Os Mestres e as Rodas: 
Patrimônio Vivo
120 Recomendações de 
Salvaguarda
126 Notas
130 fontes bibliográficas
anexos
138 Anexo 1 – Parecer do relator
144 Anexo 2 – Certidão de 
Registro da Roda de Capoeira
87 Anexo 3 – Certidão de 
Registro do Ofício dos Mestres de 
Capoeira
sumáriosumário
11Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
A Coleção Dossiê dos Bens Culturais Registrados destina-se a tornar 
amplamente conhecidos e 
valorizados, como Patrimônio 
Cultural do Brasil, os bens 
registrados de natureza imaterial. 
Os dossiês têm por base os estudos 
que fundamentaram o Registro 
do Bem Cultural e refletem as 
etapas de pesquisa, análise e 
reconhecimento desse patrimônio. 
O patrimônio imaterial 
brasileiro é composto por aqueles 
bens que contribuíram para a 
formação da sociedade brasileira. 
O compromisso do Estado 
brasileiro para com sua preservação, 
reconhecimentoe valorização 
decorre do Registro de um bem 
imaterial, previsto no Decreto 
nº 3.551/2000. São quatro os 
Livros de Registro, de acordo com 
a natureza do Bem Registrado: 
das Celebrações, dos Lugares, das 
Formas de Expressão e dos Saberes. 
A divulgação dos processos 
de Registro e dos resultados do 
trabalho institucional contribui 
para a extensão do reconhecimento 
desse patrimônio pela sociedade 
brasileira e favorece as condições de 
sua permanência. São apresentados 
nos dossiês elementos que definem 
a identidade dos Bens Culturais, 
seu universo de ocorrência, os 
grupos sociais envolvidos e as 
práticas e saberes a eles inerentes. 
Este 12º volume da Coleção 
apresenta o Registro do Modo 
da Roda de Capoeira e Ofício 
dos Mestres de Capoeira, 
respectivamente inscritos nos Livros 
de Registro das Formas de Expressão 
e dos Saberes. Esse registro 
abarca a manifestação cultural 
em todo o território nacional. 
A prática da capoeira, presente 
em vasta documentação histórica 
que percorre os últimos 300 anos, 
continua pujante nos saberes 
e práticas de seus mestres, um 
patrimônio vivo continuamente 
transmitido às novas gerações. 
Essa característica também impõe 
importante desafio às pesquisas, 
pela necessidade que se tem 
de delimitar o recorte para os 
estudos e para a definição e o 
reconhecimento desse Bem. 
Para a salvaguarda de um bem 
cuja territorialidade é tão extensa, 
concorrem inúmeras variáveis. 
A prática da capoeira, que hoje 
extrapola a fronteira nacional, 
estendendo-se a mais de uma 
centena de países, confere ainda 
maior sentido a uma política 
pública para sua salvaguarda, ao 
trazer à tona a dura realidade de 
seus mestres, cujo reconhecimento 
e sabedoria são inquestionáveis, mas 
que findam suas vidas enfrentando 
dificuldades e esquecimento. ¢
Jurema Machado
Presidente do Iphan
CENAS DE CAPOEIRA NA BAHIA
MESTRE JUVENAL E ALUNO.
FOTO: PIERRE VERGER@FUNDAÇÃO 
PIERRE VERGER.
apresentação
13Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Évasto o universo de quem se aventura a pesquisar a capoeira. 
Arte que apresenta registros 
iconográficos e documentais desde 
o século 18, a capoeira tem diversas 
vertentes, ensinadas por mestres, 
contramestres, professores e 
instrutores. Além disso, cobre um 
amplo território geográfico que 
mapeia os cinco continentes, uma 
vez que as rodas de capoeira estão 
difundidas em mais de 150 países.
O desafio do Inventário para 
Registro e Salvaguarda da Capoeira 
como Patrimônio Cultural do Brasil, 
realizado entre 2006 e 2007, 
era construir um diálogo entre o 
tempo histórico passado e o tempo 
presente. Como patrimônio vivo, 
a capoeira se mantinha no cenário 
atual por meio dos mestres que 
representavam o saber. Ao mesmo 
tempo, acumulava produção 
documental que atravessava os 
últimos três séculos. Havia, 
portanto, a necessidade de reconstituir 
brevemente a história da capoeira 
e fazer um registro instantâneo 
de seu momento presente.
Diante desses requisitos, a 
pesquisa se concentrou em três 
eixos principais: pesquisa 
historiográfica; trabalho de campo; 
abordagem de temas relacionados à 
capoeira, como a reflexão sobre o 
aprendizado e a descrição das rodas. 
A constituição deste dossiê, que 
pretende justificar a importância 
da capoeira como bem cultural do 
Brasil, amparou-se nessas três linhas 
de caráter metodológico distinto. 
Por isso, buscou-se a formação 
de uma equipe multidisciplinar 
que pudesse dar conta dos 
diversos vetores do projeto. 
Também era importante 
definir o recorte territorial da 
pesquisa. Um reforçado imaginário 
produzido por livros, filmes e 
telenovelas relacionou a capoeira à 
escravidão rural, à sua prática nas 
senzalas sob o olhar desconfiado 
do senhor de engenho. A 
capoeiragem, porém, fincou raízes 
nas áreas urbanas1. A perspectiva 
que parecia mais coerente remetia 
para o desenvolvimento da arte 
nas principais cidades portuárias 
brasileiras, tendo surgido como 
prática urbana de resistência de 
escravos de ganho, na maioria das 
vezes reunidos nos agrupamentos 
conhecidos como maltas. 
Cidades como Salvador, Rio 
de Janeiro e Recife receberam um 
grande contingente de africanos 
escravizados e se tornaram 
verdadeiros “santuários” da 
capoeira antiga. Os maiores 
acervos de documentos sobre a 
capoeiragem pertenciam ao Rio 
de Janeiro e a Salvador. Diante 
da amplitude de uma pesquisa de 
campo – a capoeira propagava-
se pelo território nacional e por 
CENAS DE CAPOEIRA NA BAHIA
MESTRE JUVENAL E ALUNO.
FOTO: PIERRE VERGER@FUNDAÇÃO 
PIERRE VERGER.
introdução
14Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
outros países –, optou-se pela 
pesquisa nos lugares históricos 
como ponto de partida para a 
reconstituição de sua trajetória. 
Nesses locais, os mestres seriam 
ouvidos; suas escolas e rodas, 
visitadas e registradas. 
De início, as capitais da Bahia 
e do Rio de Janeiro, por serem 
consideradas os locais históricos 
mais importantes da capoeira, 
foram delimitadas como campo 
de pesquisa. Isso, porém, não 
significava a realização de um 
registro historiográfico restrito às 
duas cidades. Estas eram território 
possível de ser coberto, uma vez 
reconhecida a impossibilidade de 
se alcançar toda a extensão 
territorial da capoeira.
No Plano de Ação que baseou 
a formulação da Proposta de 
Trabalho, havia uma menção a 
Pernambuco como um estado 
de importante passado histórico 
referente à capoeira, que deveria 
ser de algum modo citado em 
ocasião oportuna. No entanto, 
mais do que citar, percebemos 
a importância de incluir Recife 
no processo do registro.
A ocasião das comemorações 
do centenário do frevo coincidiu 
com a percepção da influência 
da capoeira na criação do passo 
da dança, principal expressão do 
carnaval pernambucano. Essa 
CAMPO DE MANDINGA.
ILUSTRAÇÃO DO LIVRO “O JOGO 
DA CAPOEIRA - 14 DESENHOS DE 
CARYBÉ”.
15Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
ILUSTRAÇÕES COM FUNDO 
COLORIDO EXTRAÍDAS DO LIVRO 
“O JOGO DA CAPOEIRA – 24 
DESENHOS DE CARYBÉ”.
ILUSTRAÇÔES: CARYBÉ.
descoberta revelava a presença da 
capoeiragem na cultura local de 
Recife e indicava a necessidade de 
uma investigação mais demorada 
sobre a história dos bravos e 
valentões, como eram conhecidos 
os capoeiras de Pernambuco.
Delimitado o território, 
foram constituídas as equipes, 
de perfil multidisciplinar, na 
Bahia, no Rio de Janeiro e em 
Pernambuco. Um grupo de 
profissionais que contemplava as 
áreas de antropologia, história, 
psicologia, educação física e artes 
cênicas. A maioria deles também 
atuava como capoeirista, incluindo 
um mestre de capoeira, Carlo 
Alexandre Teixeira, conhecido 
como Mestre Carlão. Além da 
formação das equipes locais, 
foram realizados, nos três estados, 
os encontros Capoeira como 
Patrimônio Imaterial do Brasil.
16Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
O objetivo desses encontros 
foi reunir mestres, alunos e 
pesquisadores para apresentar o 
projeto do inventário e discutir 
sua importância; definir as 
possibilidades de registro e fazer 
um levantamento de pautas 
que seriam utilizadas como 
referências para a elaboração 
das Recomendações do Plano 
de Salvaguarda da Capoeira. 
A perspectiva que se apresenta 
baseia-se em que a cultura é 
dinâmica, e não cristalizada; 
portanto, o registro não é 
suficiente para salvaguardar as 
manifestações, mas uma etapa 
necessária para traçar um plano 
que elabore e encaminhe políticas 
públicas para seus atores. 
Os principais pontos levantados 
nesses encontros foram: 
a necessidade de aposentadoria 
especial para os velhos mestres de 
capoeira; a importância dos mestres 
de capoeira como divulgadores 
da cultura brasileira no cenário 
internacional, tornando-se 
necessário criar alternativas para 
facilitar seu trânsito por outros 
países; a necessidade da criação de 
mecanismos que facilitem o ensino 
da capoeira em espaços públicos;o reconhecimento do ofício e do 
saber do mestre de capoeira, para 
que ele possa ensinar em escolas 
e universidades; a criação de um 
Centro de Referências da Capoeira, 
centralizando toda a produção 
acadêmica sobre a capoeira, 
realizada por estudiosos de diversas 
disciplinas; um plano de manejo 
da biriba, madeira usada para 
confeccionar o berimbau e que 
pode ser extinta no correr dos anos.
Trata-se de um conjunto de 
encaminhamentos que norteou 
as Recomendações do Plano de 
Salvaguarda da Capoeira e que 
indicou ser necessário reconhecer, 
como Patrimônio Cultural do 
Brasil, o saber do mestre de 
capoeira, como ofício, e a roda de 
capoeira, como forma de expressão.
Em termos institucionais, 
o processo do inventário foi 
alocado no Laboratório de 
Pesquisas em Etnicidade, Cultura 
e Desenvolvimento (Laced), do 
Museu Nacional (UFRJ), por 
meio da Fundação Universitária 
José Bonifácio (FUJB/UFRJ). A 
coordenação do projeto também 
contou com a supervisão da 
Diretoria de Patrimônio Imaterial 
do Iphan, das Superintendências do 
Iphan na Bahia e em Pernambuco 
e do Centro Nacional de Folclore e 
Cultura Popular – CNFCP/Iphan. 
O texto desenvolvido neste 
dossiê procurou reconstituir de 
forma breve a história da capoeira, 
bem como descrever sua prática, 
sua cultura material e seus rituais. 
Esse trabalho de pesquisa 
17Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
DETALHE DE IMAGEM DE MESTRE 
PASTINHA, EXTRAÍDA DA PUBLICAÇÃO 
CAPOEIRA ANGOLA MESTRE PASTINHA 
E SUA ACADEMIA.
FOTO: ACERVO TÉCNICO DO IPHAN.
pretendeu justificar sua 
importância como bem cultural, 
a partir da documentação escrita 
e dos relatos dos mestres que 
continuam em atividade. A 
Roda de Capoeira e o Ofício 
dos Mestres de Capoeira foram 
reconhecidos como patrimônio 
cultural brasileiro por meio da 
inscrição no Livro de Registro das 
Formas de Expressão e no Livro 
de Registro dos Saberes, volume 
primeiro, respectivamente, do 
Instituto do Patrimônio Histórico 
e Artístico Nacional, em 21 de 
outubro de 2008, conforme 
decisão proferida na 57ª Reunião 
do Conselho Consultivo do 
Patrimônio Cultural, realizada 
no dia 15 de julho de 2008. O 
conselheiro relator do processo 
de registro foi Arno Wehling. ¢
18Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
19Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
A capoeira, uma manifestação cultural que se caracteriza 
por suas múltiplas dimensões, 
é ao mesmo tempo dança, luta 
e jogo. Dessa forma, mantém 
ligações com práticas de sociedades 
tradicionais, nas quais não havia 
a separação das habilidades nas 
suas celebrações, característica 
inerente à sociedade moderna. 
Ainda que alguns praticantes 
deem prioridade ora à sua face 
cultural, a seus aspectos musicais 
e rituais, ora à sua face esportiva, 
à luta e à ginástica corporal, a 
dimensão múltipla não é deixada 
de lado. Em todas as práticas 
atuais de capoeira, permanecem 
coexistindo a orquestração musical, 
a dança, os golpes, o jogo, embora 
o enfoque dado se diferencie de 
acordo com a singularidade de 
cada vertente, mestre ou grupo.
As origens da capoeira 
remetem basicamente a três mitos 
fundadores: a capoeira nasceu 
na África Central e foi trazida 
intacta por africanos escravizados; 
a capoeira é criação de escravos 
quilombolas no Brasil; a capoeira 
é criação dos índios, daí a origem 
do vocábulo que nomeia o jogo.
As três hipóteses geram 
questões ainda não resolvidas. 
Embora estudos recentes tenham 
comprovado a existência de 
danças guerreiras similares à 
capoeira, não apenas na África 
Central, mas em outros países 
que fizeram parte da diáspora 
negra (a Ladja da Martinica é 
uma delas), não se pode negar 
que as culturas são construídas 
a partir das influências que as 
cercam, o que gera tanto rupturas 
quanto continuidades. Portanto, 
além da comprovação da raiz 
africana, é preciso reconhecer as 
mudanças e as contribuições que 
ocorreram em solo brasileiro.
Da mesma forma, afirmar 
que não existia prática corporal 
semelhante à capoeira na África, 
restringido seu surgimento ao 
contexto dos escravos que a teriam 
criado nos quilombos, como forma 
de resistência escrava, esbarra em 
pressupostos históricos. Além da 
comprovada ligação com práticas 
ancestrais africanas, a capoeira foi 
desenvolvida nos centros urbanos 
em formação, principalmente em 
CENAS DE CAPOEIRA NA BAHIA
 - PRÓXIMO AO MERCADO MODELO.
FOTO: PIERRE VERGER@FUNDAÇÃO 
PIERRE VERGER.
Origens e mitos 
fundadores
Referências históricas 
20Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
cidades portuárias, como Rio de 
Janeiro, Salvador e Recife, onde 
chegaram grandes levas de escravos. 
Por fim, a patente indígena na 
criação da capoeira é uma hipótese 
de difícil sustentação. Não há 
documentação ou mesmo relatos 
de índios que reivindiquem essa 
paternidade. O termo “capoeira” 
faz parte da língua tupi e significa 
“mato ralo”, o que remete a uma 
das explicações sobre sua origem. 
Diz respeito ao mito do escravo 
fugitivo que surpreenderia seus 
algozes na capoeira, local da 
cilada. Além de ter uma lógica 
de difícil assimilação – a do 
perseguido que inverte a situação 
e submete o perseguidor –, as 
raízes etimológicas também 
são controversas e apontam 
para outra possível origem da 
arte. Waldeloir Rego, em seu 
livro clássico, expõe hipóteses 
de Henrique de Beaurepaire 
Rohan e Brasil Gerson:
 
“Tendo como base capão, do 
qual Adolfo Coelho tirou o étimo 
de capoeira para o português, 
Beaurepaire Rohan faz o mesmo 
para o vocábulo capoeira na 
acepção brasileira, apresentando 
em defesa de sua opinião a 
seguinte explicação: – ‘Como o 
exercício da capoeira, entre dois 
ABAIXO:
BATUQUE EM SÃO PAULO.
GRAVURA DE JOHANN BAPTIST 
VON SPIX. 
DOMÍNIO PÚBLICO.
À DIREITA:
BATUQUE. GRAVURA DE JOHANN 
MORITZ RUGENDAS.
21Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
indivíduos que se batem por mero 
divertimento, se parece um tanto 
com a briga de galos, não duvido 
que este vocábulo tenha sua origem 
em Capão, do mesmo modo que 
damos em português o nome da 
capoeira a qualquer espécie de 
cesto em que se metem galinhas’. 
Brasil Gerson, o historiador das 
ruas do Rio de Janeiro, fazendo 
a história da Rua da Praia de D. 
Manoel, informa que lá ficava o 
nosso grande mercado de aves e 
que nele nasceu o jogo da capoeira, 
em virtude das brincadeiras dos 
escravos que povoavam toda a rua, 
transportando nas cabeças as suas 
capoeiras cheias de galinhas”2.
A dificuldade em estabelecer 
as origens da capoeira nos 
aspectos geográficos, culturais e 
etimológicos pode ser explicada 
por causa de sua diversidade. 
Manifestação intimamente 
ligada às culturas locais, ganhou 
contornos específicos de 
acordo com os contextos em 
que se desenvolveu. A capoeira, 
dessa forma, é reconhecida 
como fenômeno cultural 
urbano, cuja história permeia 
o passado e o presente. ¢
22Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
O mais antigo registro referente à capoeira foi encontrado 
pelo jornalista Nireu Cavalcanti3. 
O documento data de 1789 e se 
refere à libertação de um escravo 
chamado Adão, preso nas ruas 
do Rio de Janeiro por praticar a 
capoeiragem. Isso mostra que a 
repressão acontecia antes mesmo 
da criminalização da capoeira, em 
1890, durante o governo provisório 
do marechal Deodoro da Fonseca.
AS CIDADES DA CAPOEIRA
 Na década de 1890, a 
historiografia se voltou para os 
estudos da capoeira no Rio de 
Janeiro do século 19. Os dois 
principais pesquisadores a explorar 
esse recorte foram Carlos Eugênio 
Líbano Soares e Luís Sérgio Dias. 
O primeiro percorreu, em dois 
livros, o período que cobre os anos 
de 1808 a 1890. Essa trajetória, 
que se inicia com a chegada da 
corte portuguesa ao Brasil, alcança 
o fim da Monarquia, a instauração 
da República e termina no ano em 
que a capoeira foi criminalizada 
e a maioria dosseus praticantes, 
na capital, desterrada para a ilha 
de Fernando de Noronha.
Entre 1808 e 1850 (ano em 
que foi proibido o tráfico de 
escravos), existiu o que Soares 
definiu como “capoeira escrava”, a 
qual, segundo o pesquisador, não 
se restringe a “uma prática cultural 
excludente de negros libertos ou 
livres, mas a uma tradição rebelde 
que tinha fortes raízes escravas... 
e ‘seduzia’ aqueles de outra 
condição social e jurídica, por 
sua maneabilidade e resistência”4. 
O termo, portanto, não se aplica 
apenas aos negros escravos, mas 
ao contexto da escravidão.
Difundida na capital por 
africanos, a capoeira se tornou 
motivo para troca de relações 
culturais e sociais mais amplas. 
Tanto que, no segundo momento 
estudado por Soares, 1850-
1890, é possível encontrar entre 
os seus praticantes nomes de 
letrados, aristocratas e militares. 
O que marca este volume, no 
entanto, é a história das maltas, 
como eram chamados os grupos 
de capoeiras que disputavam a 
geografia da cidade. Segundo 
Soares, a visibilidade dos negros 
e dos “homens pobres de todas 
as origens” revela a mobilidade 
que os capoeiras alcançaram 
no contexto de segregação 
social sofrida pelas identidades 
africanas e afrodescendentes 
que se espalhavam pela cidade. 
Conforme o autor, referindo-
se ao século 19, “a capoeira 
foi um fenômeno que marcou 
fortemente a vida social do Rio 
de Janeiro no século passado”5. 
Primeiros
registros 
iconográicos 
23Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Enquanto Soares prioriza a 
formação e a distribuição desses 
grupos de capoeiras, Luís Sérgio 
Dias focaliza o temor que eles 
representavam para a sociedade 
carioca de meados do século 196. 
A marginalização e a 
criminalização sofridas por seus 
praticantes fizeram com que 
as principais fontes dos dois 
historiadores se encontrassem 
nos arquivos policiais. 
No Rio de Janeiro, a capoeira 
foi duramente perseguida. Seus 
praticantes eram conhecidos 
por desafiar a ordem policial, 
hostilizar a população, provocar 
brigas e correrias, marcadas por 
cabeçadas, rasteiras e navalhadas. 
Muitos dos confrontos aconteciam 
entre as temidas maltas, as quais 
demarcavam seus territórios por 
meio das freguesias – como eram 
conhecidos os bairros delimitados 
pela localização das igrejas católicas. 
As relações entre os capoeiras se 
davam no cotidiano da escravidão 
urbana, dividida entre a casa do 
senhor e a rua, espaços onde 
o escravo cuidava dos afazeres 
domésticos e trabalhava no 
comércio local, o que motivava, 
muitas vezes, disputas territoriais. 
Além disso, os capoeiras causavam 
arruaças e brigas nos desfiles 
das bandas militares. Conforme 
escreveu Luiz Edmundo: “Em 
1888, um ano antes da proclamação 
da República, cafajestes armados 
até os dentes ainda saem à frente 
das nossas bandas militares, 
atravessam as ruas principais, as 
mais policiadas da urbe, em pleno 
exercício da capoeiragem”7. 
 Antes da proclamação da 
República, em 1889, os escravos 
capoeiras ganharam prestígio 
devido a sua participação na 
Guerra do Paraguai, que ocorreu 
JOGO DA CAPOEIRA.
GRAVURA DE 
JOHANN MORITZ RUGENDAS.
24Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
entre 1864 e 1870. Também 
ficaram famosos por sua atuação 
durante as eleições, quando 
pressionavam eleitores para votar 
nos candidatos dos partidos que 
defendiam, fossem conservadores 
ou liberais. Além disso, criaram 
uma milícia conhecida como 
Guarda Negra8, que era a favor da 
Monarquia e atacava republicanos. 
“Fundaram o Partido Capoeira 
e, antes de serem definitivamente 
perseguidos, dividiram a cidade 
em territórios de duas grandes 
maltas: Nagoas e Guaiamuns”9. 
As maltas Nagoas e Guaiamuns 
representavam os dois partidos 
políticos da época, respectivamente, 
liberais e conservadores. Isso 
garantiria “a perene permanência 
das maltas contra as investidas 
frequentes da ação policial”10. A 
capoeira alcançou diversas classes 
sociais na época colonial, tendo sido 
praticada não apenas por escravos, 
mas também por homens livres 
– pobres e ricos, entre os quais 
europeus que viviam na capital do 
Império. O poeta português Plácido 
de Abreu, que morreu na Revolta 
da Armada, praticava capoeira, 
frequentou o universo das maltas e 
descreveu suas características num 
romance que escreveu sobre o tema11. 
Na introdução da obra, Plácido 
de Abreu apresenta as principais 
25Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
características daqueles dois 
bandos que ficaram conhecidos 
como os dois grandes celeiros 
da capoeiragem carioca no Rio 
antigo. Desde as cores pelas quais se 
distinguiam – branco e vermelho – 
até as localidades a que pertenciam 
e onde ocorriam seus treinos:
“Guayamú é o capoeira que 
pertence aos seguintes partidos: 
S. Francisco (grande centro, do 
qual foi chefe o célebre Leandro 
Bonaparte), Santa Rita, Ouro 
Preto, Marinha, S. Domingos de 
Gusmão, além de outros pequenos 
bandos agregados a estes”. 
“A denominação que tem estes 
grupos é casa ou província, e a cor 
por que são conhecidos é a vermelha. 
“Nagôa é o capoeira que 
pertence aos seguintes partidos: 
Santa Luzia (Centro do qual foi 
chefe Manduca da Praia), S. José, 
Lapa, Sant’Anna, Moura, Bolinha 
de Prata, além de outros grupos 
menores, filiados àqueles. 
“A cor por que são 
conhecidos é a branca...
“Há pouco tempo ainda o bando 
guayamú costumava ensaiar os 
noviços no morro do Livramento, 
lugar denominado Mangueira.
“Os ensaios faziam-se 
regularmente nos domingos de 
manhã e constavam dos exercícios 
de cabeça, pé e golpes de navalha e 
de faca. Os capoeiras de mais fama 
serviam de instrutores àqueles 
que começavam. A princípio, os 
golpes eram ensaiados, fazendo-
se uso da mão limpa. Quando 
o discípulo aprendia as lições, 
começava a ser ensaiado com armas 
de madeira e por fim serviam-se 
dos próprios ferros, acontecendo 
muitas vezes ficar ensanguentado 
o lugar dos exercícios. 
“Os nagôas faziam os mesmos 
ensaios, com a diferença de que 
o lugar escolhido por eles era a 
praia do Russel, para os partidos 
de S. José e Lapa, Morro do 
Pinto, para o de Sant’Anna”12.
O “submundo” da capoeira 
era frequentado não só por 
intelectuais e profissionais 
liberais; “até figuras prestigiosas 
no plano político, como o Barão 
do Rio Branco, quando jovem, e 
Floriano Peixoto, entre outros, 
foram apontados como praticantes 
da arte da capoeiragem”13. Ainda 
assim, mesmo os que faziam 
parte da elite foram perseguidos 
por Sampaio Ferraz, “chefe 
de polícia que comandou a 
campanha que desterrou os 
capoeiras para Fernando de 
Noronha durante o governo 
de Deodoro da Fonseca”14. 
A primeira codificação penal 
brasileira, intitulada de Código 
criminal do Império do Brasil, datada de 
1830, não fazia referência explícita 
À ESQUERDA
PAISAGEM DE SÃO SALVADOR.
GRAVURA DE JOHANN MORITZ 
RUGENDAS.
À DIREITA:
MONTAGEM FEITA A PARTIR DE 
DETALHE DA GRAVURA JOGO DE 
CAPOEIRA, DE JOHANN MORITZ 
RUGENDAS E DESENHO DE UM 
BERIMBAU.
ILUSTRAÇÃO: ACERVO TÉCNICO DO 
IPHAN.
26Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
aos praticantes da capoeira, mas os 
chefes de polícia os enquadravam 
no capítulo que tratava dos vadios e 
mendigos. Com o fim da escravidão 
e o início da República, a capoeira 
é inserida, “com todas as letras”, 
no Código Penal Brasileiro, por 
meio do Decreto nº 847, de 11 de 
outubro de 1890, que assim dizia:
“Art. 402. Fazer nas ruas 
e praças públicas exercícios de 
agilidade e destreza corporal, 
conhecidos pela denominação 
capoeiragem; andar em correrias, 
com armas ou instrumentos capazes 
de produzir uma lesão corporal, 
provocando tumulto ou desordens, 
ameaçando pessoa certa ou incerta, 
ou incutindo temor ou algum mal.
Pena: de prisão cellular de 
dois meses a seis meses” . 
Munida, nesse momento, 
de um instrumento jurídico 
específico de incriminação da 
capoeira, a polícia reprimiu com 
extrema violênciaos praticantes 
dessa tradição. Assim, o século 19 
é marcado, principalmente nos 
arredores das cidades do Rio de 
Janeiro e de Recife, por histórias 
de combates e conflitos entre as 
maltas dos capoeiras e os policiais. 
De acordo com Soares, as maltas 
eram formadas “por três, vinte 
e até mesmo cem indivíduos” e 
constituíam a “forma associativa 
de resistência mais comum entre 
escravos e homens livres pobres do 
Rio de Janeiro da segunda metade do 
século 19”. Embora colocados como 
criminosos, os capoeiras tiveram uma 
recuperação social promovida pela 
“vertente nacionalista da belle époque”, 
que buscava defender a capoeira 
como ginástica brasileira. Nesse 
sentido, Coelho Neto “representou 
o ponto alto da versão que defendia 
a transformação da capoeira em 
esporte nacional”. Conforme Soares: 
“Coelho Neto não apenas 
realça as qualidades ginásticas 
da capoeira. Ele a celebra como 
a verdadeira educação física do 
Brasil, que deve ser ensinada nas 
escolas, nos quartéis, nos lares, 
em quaisquer lugares onde a 
instrução seja importante”.16 
Soares lembra ainda que 
Coelho Neto apresentara a Luiz 
Murat um projeto instituindo 
a obrigatoriedade do ensino da 
capoeira em escolas e quartéis. 
Tal intenção acompanha a visão 
nacionalista que se construiu a partir 
daquela época, investindo na capoeira 
como representação autêntica da 
brasilidade, como podemos perceber 
neste trecho da crônica intitulada, 
sugestivamente, O nosso jogo: 
“Em 1910, Germano Harlocher, 
Luiz Murat e quem escreve estas 
linhas pensavam em mandar um 
projeto à Câmara dos Deputados 
27Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
À ESQUERDA
MITO: A IMAGEM ROMANTIZADA 
E ANACRÔNICA DO MULATO DA 
CAPOEIRA PROJETADA NO TEMPO 
COLONIAL.
DESENHO DE LUÍS EDMUNDO.
À DIREIRA
AQUARELA DE AUGUSTUS EARLE.
tornando obrigatório o ensino da 
capoeiragem nos institutos oficiais 
e nos quartéis. Desistiram, porém, 
da ideia, porque houve quem a 
achasse ridícula, simplesmente 
porque tal jogo era... brasileiro”.
“Enfim, vamos aprender a 
dar murros – é esporte elegante, 
porque a gente o pratica de 
luvas, rende dólares e chama-
se box, nome inglês”17.
A inclusão da capoeira no 
projeto nacionalista se estenderia 
ao longo das décadas seguintes. 
A ideia de nação que passava a 
ser construída por intelectuais 
da belle époque, na qual se avaliava 
o lugar da capoeira na cultura 
brasileira, teria continuidade nos 
escritos de Mello Moraes Filho, 
que retomaria essa imagem já na 
década de 1920, afirmando: 
“A capoeira, como arte, 
como instrumento de defesa, 
é a luta própria do Brasil”.18 
Apesar do “desaparecimento” 
da capoeira no Rio de Janeiro do 
final do século 19 e início do 20, 
um mestre de capoeira paulista, 
conhecido como Sinhozinho, 
apelido de Agenor Moreira Sampaio, 
manteve uma academia em Ipanema, 
entre os anos 1920 e 1960. Nela, 
eliminou o canto e os instrumentos 
musicais, preocupando-se apenas 
com as questões física e marcial. À 
maneira de Mestre Bimba, sem que 
nunca o tivesse conhecido, misturou 
a capoeira que aprendeu nas ruas 
à luta greco-romana e ao boxe. 
Conforme explicou Muniz 
Sodré: “É que, no Rio da década 
de 1920, como já se encontrava 
praticamente extinta a perigosa 
técnica de luta das maltas, restava 
o aproveitamento ginástico ou 
pugilístico (regrado, controlado 
por academia) da velha capoeiragem 
por jovens bem-nutridos da alta 
28Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
À ESQUERDA
PAISAGEM DE SÃO SALVADOR.
GRAVURA DE JOHANN MORITZ 
RUGENDAS.
À DIREITA
PASSEIO DE DOMINGO À TARDE.
AQUARELA SOBRE PAPEL DE JEAN-
BAPTISTE DEBRET.
classe média”. Confirmando essa 
tendência, “surgiu, em 1928, 
no Rio de Janeiro, um Manual 
de gymnastica nacional (capoeiragem) 
methodizada e regrada, escrito por 
Annibal Burlamaqui, o Zuma 
nas rodas de capoeira”19.
Essa nova visão da capoeira 
nos quadros da sociedade urbana 
da capital revela que, junto com 
a ampliação dos espaços onde 
a capoeira pôde ser praticada, 
ocorreu um processo de 
socialização altamente marcado 
pela versão mais atlética e 
esportiva que, nas décadas de 
1920 e 1930, autores como 
Coelho Neto e Mello Moraes 
Filho afirmavam como projeto. 
Na Bahia, o período mais 
estudado e documentado, 
de maneira ordenada, é o da 
República Velha, mais precisamente 
entre 1890 e 193020. Até há 
pouco tempo, as únicas fontes 
históricas sobre a capoeira baiana 
no século 19 eram as crônicas 
escritas por Manuel Querino 
e Antônio Vianna, relatos de 
viajantes estrangeiros, algumas 
poucas notícias de jornal, a tradição 
oral e a gravura San Salvador, 
de Rugendas. Ao contrário da 
capoeira do Rio de Janeiro, que 
tem uma grande documentação 
referente a esse período e que já 
foi bastante estudada, o universo 
da capoeiragem da Bahia no século 
19 é permeado de mitos, fantasias, 
muitas suposições e alguns 
documentos. Mesmo 
assim, aos poucos, vai sendo 
montado o mosaico de peças que 
compõe a capoeira baiana do 
tempo dos escravos.
Manuel Querino, negro, 
baiano, nascido em meados do 
século 19, deixou muitas pistas aos 
estudiosos sobre o assunto. Pode 
ser considerado o precursor dos 
estudos sobre o tema21. Registra 
cantigas, golpes, instrumento 
musical, gírias, indumentárias, 
costumes, cismas, rixas, ritos, 
ocasiões e lugares dos conflitos, 
além de apontar as diferentes 
finalidades que eram atribuídas 
à capoeira, como esporte, luta e 
folguedo. Sabe-se, por meio dele, 
que, desde aquele período, o jogo 
era praticado por diferentes 
grupos sociais. 
Querino relata também 
o envolvimento dos capoeiras 
com a capangagem eleitoral e a 
participação do grupo na Guerra 
do Paraguai. A capoeira relatada e 
interpretada por ele aparece com 
diferentes significados, conflito e 
brincadeira, dança e luta, presente 
no mundo da festa, da política 
e das ruas. Quanto à origem da 
luta, ele a atribui ao “angola”, 
“typo completo e acabado do 
capadócio”, “introdutor da 
29Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
capoeiragem na Bahia”22.
Antônio Vianna, a outra fonte 
primordial sobre este tema, que 
vivenciou desde menino aspectos 
da capoeira baiana, registra em 
suas crônicas ricas e importantes 
descrições sobre a cultura da 
capoeiragem, as indumentárias 
e os instrumentos, cantigas e 
golpes, ampliando o volume 
de informações anteriormente 
apontadas por Querino. 
Antônio Vianna mostra 
a influência da luta greco-
romana sobre a capoeira. Narra 
ainda aspectos do cotidiano dos 
capoeiras: valores, armas usadas, 
lugares por eles frequentados, 
hábitos alimentares, cismas, brigas 
entre capoeiras e os conflitos 
entre estes e a polícia. Ao citar a 
figura de Lamite, capoeirista tido 
como um valentão, o autor coloca 
em evidência algumas táticas dos 
capoeiras usadas para conquistar 
autonomia territorial e armar 
redutos para a prática de sua arte23. 
Em Vianna, também se 
encontra uma das raras descrições 
de batuque (luta), em que aparece 
a sua interface com a capoeira. 
Seus registros recaem, mais 
frequentemente, nos ambientes 
de festa, trabalho e conflito que 
aconteciam na região portuária, em 
especial no Cais Dourado, por ele 
destacado como uma das principais 
zonas da capoeiragem, entre o final 
do século 19 e início do 20. Além 
disso, ele já revela o preconceito 
social em relação ao capoeira.
Seguindo as pistas deixadas 
por Querino e Vianna, Antônio 
Liberac foi o primeiro a estudar 
sistematicamente a capoeira 
baiana do século 19. No início 
de sua pesquisa, Liberac, que já 
havia estudado a capoeira no Rio 
de Janeiro, vasculhou centenas 
30Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
de registros de entrada de presos 
na Casa de Detenção da cidade 
de Salvador. Ao contrário de 
sua investigação sobre o Rio de 
Janeiro, que resultou no encontro 
de numerosas fontes jurídico-
policiais, em Salvador ele não 
localizou na documentação sequer 
uma menção aoscapoeiras24. 
Por esse motivo, para identificar 
seus sujeitos, o autor rastreou, 
na imprensa da época e nos 
processos-crimes consultados, os 
termos “capadócio”, “valentões”, 
“bambas”, “navalhistas”, 
“cabeçada”, “rasteira”, “pontapé”, 
“vadiação”, “rabo de arraia”, 
“berimbau”, entre outros. 
Segundo Liberac, eles faziam 
parte da cultura da capoeiragem, 
uma vez que a palavra capoeira 
aparecia muito raramente nessa 
documentação e nem sempre 
como sinônimo de jogo/
luta propriamente dito. 
O objetivo do autor era fazer 
uma análise comparativa entre as 
capoeiras carioca e baiana de 1890 
a 1950. Uma de suas conclusões 
é a de que a capoeira da Bahia, 
embora não tenha tido a mesma 
visibilidade histórica que a do Rio 
de Janeiro, certamente fez parte 
do universo cultural da sociedade 
soteropolitana do século 19. 
Pela nova documentação 
apresentada por Liberac, é possível 
visualizar a presença da capoeira 
baiana na cultura de rua de 
Salvador, onde se destaca como 
uma arma eficiente nos conflitos 
corpo a corpo com os agentes 
policiais. Constatou, através de 
queixas e reclamações nos jornais, 
a vigência do preconceito social 
e racial em relação à capoeira, 
assim como acontecia com outras 
manifestações afrodescendentes. 
Observou que, na imprensa baiana, 
GRUPO DE GAROTAS FRANCESAS.
LITOGRAVURA DE ISAAC MENDES 
BELISARIO.
31Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
o candomblé, a capoeira e o samba 
muitas vezes eram encontrados 
estreitamente interligados no 
universo de um mesmo indivíduo. 
E embora confirme que a capoeira 
fazia parte, principalmente, do 
universo popular masculino, 
mostra que, já nesse período, 
existiam pessoas da elite e também 
mulheres pobres que dominavam 
os códigos da capoeiragem. 
Recentemente, Frede Abreu, 
dando continuidade ao estudo 
realizado por Liberac, escreveu 
um livro no qual amplia o 
volume de documentação sobre 
o tema, incluindo novas notícias 
de jornais, processos crimes, 
relatos de viajantes estrangeiros, 
memórias e algumas imagens de 
época25. O autor dialoga com 
diferentes estudiosos da escravidão 
na Bahia (e no Rio de Janeiro), 
buscando as pistas por eles deixadas 
sobre a capoeiragem baiana. 
Também relativiza a capoeira como 
fenômeno exclusivamente urbano, 
uma vez que fotografias e gravuras 
da capital da Bahia do século 19 
mostram que, embora fosse 
um núcleo urbano desenvolvido, 
Salvador conservava amplas 
áreas de mata. 
No entanto, grande parte da 
documentação apresentada no 
livro se restringe à zona urbana, na 
qual o autor destacou, em especial, 
a interface da capoeira com o 
mundo do trabalhador de rua, 
principalmente dos carregadores, 
ocupação exclusiva de negros 
naquele período. Percebeu que 
o rito dos trabalhadores na Bahia 
de carregar peso, descrito por 
alguns viajantes estrangeiros, 
tinha várias semelhanças com o 
ritual da capoeira. Em ambos 
há uma combinação de três 
elementos básicos: música, dança 
e esforço físico, indispensáveis 
para a realização das duas 
atividades. Dessa forma, Frede 
suspeita que “a cadência dos 
passos dos carregadores da Bahia 
tenha se figurado nos passos da 
capoeira”, da mesma maneira que, 
anteriormente, diferentes autores 
suspeitaram que a marcha-rancho 
do carnaval carioca tenha sido 
prefigurada na cadência dos passos 
dos carregadores de café no Rio de 
Janeiro26. Ainda sobre a imbricação 
da capoeira no universo das ruas, o 
autor revelou que o cancioneiro da 
capoeira se enriqueceu dos cantos 
de trabalho e que o trabalhador 
de rua, em momentos lúdicos e de 
conflitos, também se utilizava dos 
golpes e movimentos da capoeira.
No seu livro, Frede Abreu 
torna conhecidos alguns nomes 
de capoeiras do século 19, dentre 
eles João Pernambucano, Marcus 
Rabeca, Celestino Estivador, 
Domingos, Alexandre Evaristo e 
LE DOU, A GRANDE FESTA 
DOS ESCRAVOS, VIAGEM AO 
SURINAME, PUBLICADO PELA 
SOCIEDADE DE BELAS ARTES.
DESENHO DE PIERRE 
JACQUES BENOIT.
32Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Manuel dos Passos Ramos. Mostra 
que muitos locais e ocasiões de 
prática de desordem divulgados 
pelos jornais eram também 
espaços de capoeiragem. Nesse 
período, é fato conhecido que 
homens do povo (maioria negra), 
fossem eles desordeiros ou não, 
eram recrutados à força pelas 
autoridades policiais para servir 
à Marinha de Guerra Brasileira 
e ao Exército, como forma de 
punição. Alguns escravos também 
se alistavam voluntariamente 
nessas instituições militares, como 
meio de conseguir a liberdade. 
Por meio da localização de 
alguns processos livres e coercitivos 
de recrutamento de capoeiras 
para as forças armadas e para a 
Guerra do Paraguai, observou-
se ainda que os capoeiras baianos 
não escaparam dessa prática 
corrente, o que confirma o relato 
de Manuel Querino. Nessa época, 
a capoeiragem já se constituía 
uma atividade popular muito 
apreciada por parte da população 
baiana e fazia parte do cotidiano 
das ruas da cidade de Salvador, 
atraindo também a atenção da 
juventude, o que era motivo de 
preocupação para as autoridades. 
A República Velha foi a 
época privilegiada pelos estudos 
históricos sobre a capoeira 
baiana na cidade de Salvador. Os 
caminhos de pesquisa trilhados por 
seus primeiros estudiosos foram 
diferentes dos passos de investigação 
dados pelos principais historiadores 
da capoeira carioca. É que, no 
Rio de Janeiro, a criminalização 
da capoeira pelo famoso artigo 
402, do Decreto nº 847, de 11 de 
outubro de 1890, produziu uma 
série de documentos que até hoje 
não foram localizados na Bahia. 
Assim, Antônio Liberac, com 
a experiência adquirida na sua 
pesquisa sobre a capoeira carioca, 
buscou localizar os capoeiras nos 
processos-crimes referentes ao 
artigo 303, que tratava dos crimes 
por lesão corporal. Conseguiu 
reunir 92 processos-crimes, 
entre os anos de 1890 e 1930, 
encontrados por meio dos nomes 
mencionados pela tradição oral 
e dos elementos que, de acordo 
com o autor, faziam parte da 
cultura da capoeiragem.
ABAIXO
RECORTE DA PINTURA DE 
AGOSTINO BRUNIAS QUE RETRATA 
O COMBATE DE VARA NA ILHA DE 
SÃO DOMINGOS.
PINTURA DE AGOSTINO BRUNIAS.
À DIREITA
DIA DE REIS, HAVANA CUBA.
LITOGRAVURA DOADA POR 
FREDERIC MIALHE.
33Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Os demais historiadores 
deste tema, Adriana Albert 
e Josivaldo Oliveira, dando 
continuidade aos estudos sobre o 
assunto, privilegiaram a imprensa 
baiana como fonte de pesquisa, 
especificamente a coluna policial, 
onde estavam localizadas as 
notícias de desordens. Em algumas 
delas, era explícita a referência 
ao capoeira em função do uso da 
própria palavra “capoeira” ou de 
termos diretamente relacionados 
a ela. Na maioria das notícias 
levantadas, os capoeiras não 
eram diferenciados dos demais 
indivíduos. Pois, todos eram 
chamados de forma generalizada 
de “desordeiros”, “capadócios”, 
“valentões” etc.27. Era grande, 
portanto, o desafio para penetrar 
no universo da capoeira baiana. 
Mas, graças aos manuscritos 
do Mestre Noronha e ao livro do 
Mestre Pastinha, foi possível seguir 
os passos desses capoeiras pelas 
ruas de Salvador. Suas memórias 
foram pontos de partida para os 
novos estudos, porque esses mestres 
registraram nomes e apelidos dos 
capoeiras referentes ao período 
focalizado, além de alguns fatos 
de suas vidas que permitiram 
identificar, nos jornais da época, 
mais de 115 notícias envolvendo 
capoeiras. Nessas duas fontes 
34Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
aparecem também ocupações, 
manias, cismas, costumes, locais 
e ocasiões de capoeira e uma série 
de outras informações. Por isso, 
devem ser consideradas essenciais 
para a construção da história da 
capoeira baiana na época28.
Os estudos revelam que grande 
parte dos capoeiras era formada 
por trabalhadores, ao contrário 
do que escreviam os jornalistas da 
época, que se referiam a eles como 
um bandode vadios e vagabundos. 
Contudo, assim como a maioria 
da população soteropolitana29, 
os capoeiras eram trabalhadores 
de rua, viviam de ocupações 
esporádicas e intermitentes. 
Ou seja, tinham um ritmo de 
trabalho bastante irregular, o 
que lhes proporcionava períodos 
de ociosidade, entremeados 
por momentos de diversão. 
Mesmo sendo trabalhadores, os 
capoeiras também podiam ser 
desordeiros, uma vez que muitos 
deles simplesmente viviam no 
mundo das ruas, batiam tambor, 
jogavam capoeira e algumas 
vezes até matavam. Em síntese, 
transgrediam os padrões e as 
regras da ordem pública. 
A maioria dos capoeiras dessa 
época trabalhava como carregador 
e estivador, atividades muito 
ligadas à região portuária. Outros 
eram carroceiros, peixeiros, 
marítimos, engraxates, pedreiros, 
marceneiros, chapeleiros, donos 
de botecos e casas de jogo, 
vendedores ambulantes, leões de 
chácara e até mesmo policiais. 
Além do padrão ocupacional 
apresentado, esse volume de 
documentação permitiu a 
construção do perfil dos capoeiras 
daquela época. A maioria deles 
tinha apelido, havia nascido entre 
as últimas décadas do século 19 e 
os primeiros anos do século 20, 
quase todos no estado da Bahia, 
com maior incidência em Salvador 
e no Recôncavo Baiano. Com 
relação ao grau de instrução, a 
maior parte dos capoeiras era 
analfabeta; quanto à ocupação, 
como já foi dito, muitos realizavam 
trabalho braçal, principalmente 
na região portuária. 
Constatou-se também que 
grande parte dos capoeiras 
em Salvador era de cor negra, 
embora, desde o século 19, alguns 
códigos culturais da capoeiragem 
já tivessem se expandido para o 
universo de diversos segmentos 
sociais, inclusive da elite e da 
juventude baiana. Durante a 
República Velha, a capoeiragem 
baiana era uma manifestação de 
rua, afrodescendente, e muitos 
dos seus praticantes tinham 
ligações com candomblé, samba 
e batuque. O vínculo entre os 
capoeiras e essas práticas podia 
35Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
se originar na própria família, 
no ambiente de trabalho ou, 
também, nas festas populares.
No contexto da República 
Velha, as elites baianas sonhavam 
em transformar a capital da 
Bahia numa metrópole moderna 
e civilizada, nos moldes da 
sociedade europeia. Para tanto, 
acreditavam ser necessário reformar 
a arquitetura da cidade e, mais 
do que isso, o que se pretendia 
era “desafricanizar as ruas”30, 
ou seja, erradicar de Salvador 
todos os hábitos e costumes do 
povo que lembrassem a África. 
Grande parte da população 
soteropolitana compunha-se de 
negros e mestiços, e o cotidiano 
da cidade era marcado por diversas 
manifestações da cultura negra. 
Com o movimento pretendido 
de reforma e higienização do 
espaço urbano, multiplicaram-se as 
reclamações moralistas da imprensa 
e foi acirrada a repressão policial 
contra tais práticas culturais. 
Portanto, não é de se surpreender 
que, nessa época, uma boa parte das 
camadas populares soteropolitanas, 
fosse ela desordeira de fato, ou 
não, tivesse sua vida marcada por 
recorrentes confrontos com a lei.
Com os capoeiras não podia 
ser diferente. Uma característica 
que marcava fortemente o 
cotidiano dos capoeiras eram 
os frequentes conflitos com a 
polícia. Todavia, o que os demais 
estudos históricos já citados 
mostram é que esses indivíduos 
não só entravam em conflito 
com a polícia, como também 
brigavam com outros capoeiras, 
trabalhadores, desordeiros e, às 
vezes, agrediam mulheres, até suas 
próprias companheiras. Muitas 
dessas brigas envolvendo capoeiras 
foram registradas na imprensa 
baiana. Algumas delas viraram 
“caso de justiça”, e os capoeiras 
responderam a processo por 
desordem ou por lesão corporal. 
Essas notícias, alguns processos 
crimes e o seu cruzamento com 
as crônicas e a tradição oral – que 
registraram os principais pontos 
da cidade e ocasiões de capoeira – 
possibilitaram que os estudiosos da 
capoeiragem baiana do começo do 
século 20 traçassem a geografia da 
capoeira na cidade de Salvador. 
À ESQUERDA
DANÇA DE NEGRAS.
DESENHO DE MARTINEZ COMANON 
Y BUJANDA.
ABAIXO
BANDA DE JAW-BONE E JOHN-
CANOE.
LITOGRAVURA DE 
ISAAC MENDES BELISARIO.
36Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Das vinte freguesias que 
compunham a cidade de Salvador, 
três se destacaram como áreas de 
maior concentração de capoeiras, 
a seguir apresentadas em ordem 
decrescente: o Pilar, que ficava 
na cidade baixa, e a Sé e a rua do 
Paço, que ficavam na cidade alta. 
Essas freguesias eram relativamente 
próximas e tinham algumas 
características em comum que 
explicam porque os capoeiras se 
encontravam nelas. Eram áreas 
de trabalho, próximas ao porto 
e ao bairro comercial, local de 
moradia de muitas famílias pobres 
e ambiente de diversão para as 
camadas populares, com casas de 
jogo, botequins, vendas e zonas 
de prostituição nelas localizadas.
Essa proximidade do ambiente 
de trabalho e de vadiagem, onde 
a “ordem” e a “desordem” se 
misturavam, fazia com que essas 
freguesias fossem consideradas 
zonas perigosas, principalmente 
à noite, quando o comércio 
fechava suas portas e as ruas 
eram ocupadas por indivíduos 
chamados de vadios e vagabundos, 
conforme o “conceito” policial 
e de imprensa da época31.
Dentro dessas três freguesias 
ficavam a ladeira do Tabuão, a 
Baixinha, a Baixa dos Sapateiros, 
o Terreiro de Jesus, o Cruzeiro 
de São Francisco, a rua do 
Saldanha, a praça Castro Alves 
e o Cais Dourado, conhecidos 
como tradicionais pontos de 
capoeiragem, desde o século 1932. 
Nesses locais, formou-se uma 
importante geração de capoeiras 
que, posteriormente, se tornaram 
célebres: Onça Preta, Noronha, 
Pastinha, Bimba, Cobrinha 
Verde, Maré e Livino Diogo.
É importante destacar que, em 
todos os locais citados, a capoeira 
se manifestava de diversas formas e 
não apenas como arma de conflito, 
como em geral era descrita nos 
jornais. Nessa época, “a capoeira era 
também um tipo de divertimento 
popular, uma brincadeira, e tinha 
muitos significados. Luta em 
diferentes situações, brincadeira 
de rua realizada nas folgas do 
serviço, nas festas de largo e até 
mesmo durante o trabalho”33, o 
que aponta certa continuidade 
entre a capoeiragem oitocentista e a 
capoeira republicana em Salvador. 
As festas populares da 
Bahia ficaram tradicionalmente 
conhecidas como ocasiões em que 
os capoeiras se reuniam para fazer 
sua brincadeira. Tudo indica que 
foi no ambiente da festa que a 
capoeira conquistou seu espaço 
na sociedade soteropolitana. 
Muitas delas são lembradas 
por Mestre Noronha em seus 
manuscritos, porque ele e outros 
mestres tinham por costume 
37Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
realizar, nessas ocasiões, uma 
“grande roda de capoeira”34.
Todavia, mesmo quando 
praticada como forma de 
brincadeira, nas festas populares ou 
durante o trabalho, a capoeira era 
vista com maus olhos pela imprensa 
baiana. E apesar de processos 
por crime de capoeiragem não 
terem sido encontrados nos 
arquivos de Salvador, os capoeiras 
podiam ser presos, simplesmente, 
por estar realizando o jogo.
 Pode-se afirmar que a 
República Velha foi o momento 
de maior turbulência da capoeira 
baiana e também de maior 
repressão policial, que atingiu não 
só a capoeira como os terreiros 
de candomblé e o samba. Neste 
processo, os historiadores da 
capoeira baiana destacaram duas 
autoridades policias: o chefe de 
polícia Álvaro Cova e o famoso 
delegado Pedro Gordilho, 
popularmente conhecido por 
Pedrito, ambos perseguidores 
dessas manifestações.
Nem sempre, porém, capoeiras 
e policiais estavam em posições 
opostas. Uma característica forte da 
capoeiragem baiana na República 
Velha, como acontecia no Rio de 
Janeiro da época do Império, é a sua 
relação com a capangagem política. 
Isso fica bastante em evidência 
em todos os estudos realizados 
sobre capoeiragem e registrado, 
também, na tradição oral. Na 
Bahia, os capoeirasInocêncio Sete 
Mortes, Estevinho, Duquinha, 
Samuel da Calçada, Sebastião 
de Souza e Pedro Mineiro, 
entre outros, atuaram como 
capangas. Em troca dos favores 
prestados, recebiam proteção 
policial e, por isso, suas práticas 
de desordem eram toleradas.
Recife também teve 
capoeiristas valentes que se 
tornaram lendários, como 
Nascimento Grande, Adama, 
Chico Cândido, Antônio 
Florentino e muitos outros. 
Como no Rio de Janeiro, a 
capoeira pernambucana sofreu 
forte repressão, defrontando-
se com o estigma do crime e 
da marginalidade. Por outro 
lado, os capoeiras recifenses 
também estiveram envolvidos na 
capangagem eleitoral e na proteção 
OS “BRABOS” DO RECIFE.
DESENHO DE NESTOR SILVA.
38Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
de figuras políticas, bem como 
na constituição da Guarda Negra 
e na campanha do Paraguai. 
No que se refere ao Carnaval, 
há ainda mais um paralelo com 
a história da capoeira no Rio de 
Janeiro: se a ginga dos capoeiristas 
influenciou o carnaval carioca, 
por meio da dança do mestre-sala 
e porta-bandeira, no carnaval 
de Pernambuco, sua presença é 
ainda mais ostensiva, já que os 
capoeiras foram os criadores do 
passo do frevo no Carnaval35.
Apesar de sua importância 
histórica, poucos são os estudos 
e pequeno o levantamento 
bibliográfico e documental 
sobre a capoeira em Recife. 
Mesmo assim, o reconhecimento 
da influência da capoeira na 
cultura urbana da capital de 
Pernambuco é um fato. Mas 
é uma trajetória ainda pouco 
conhecida, se compararmos ao 
que já tem sido levantado há 
algum tempo por pesquisas em 
torno do Rio de Janeiro e de 
Salvador. Enquanto estas cidades 
têm um acervo significativo de 
histórias e personagens, a crônica 
da capoeira no Recife permanece 
um campo relativamente 
restrito em referências 
detalhadas sobre o cotidiano 
dos capoeiristas ao longo da 
história e de sua presença 
viva nos espaços da cidade. 
As indicações existentes na 
bibliografia consultada revelam, 
sobretudo, a relação dos antigos 
capoeiras com as rivalidades 
entre as bandas de música nos 
primórdios do Carnaval e com 
a origem do “passo”. A maioria 
das referências sobre o passado 
dos capoeiras nessa cidade refere-
se à sua presença no carnaval de 
rua. A frequência de libertos e 
escravos de ganho nos “clubes 
pedestres”, durante a segunda 
metade do século 19, sugere que a 
experiência urbana da escravidão 
no Império é um traço inseparável 
da história da capoeira no Recife. 
Gilberto Freyre reproduz 
uma imagem típica e muito 
divulgada da ação fatal dos 
capoeiras na cidade do Recife: 
“Às vezes havia negro 
navalhado; moleque com os 
intestinos de fora que uma rede 
NAGOAS E GUAYAMÚS – ROUPAS 
TÍPICAS - ILUSTRAÇÃO DA KOSMOS, 
REVISTA ARTÍSTICA, CIENTÍFICA E 
LITERÁRIA.
CALIXTO CORDEIRO – K.LIXTO.
39Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
branca vinha buscar (as redes 
vermelhas eram para os feridos; as 
brancas para os mortos). Porque 
as procissões com banda de 
música tornaram-se o ponto de 
encontro dos capoeiras, curioso 
tipo de negro ou mulato da 
cidade, correspondendo ao dos 
capangas e cabras dos engenhos. 
“O forte do capoeira era a 
navalha, ou a faca de ponta; sua 
gabolice, a do pixaim penteado 
em trunfa, a da sandália na 
ponta do pé quase de dançarino 
e a do modo desengonçado de 
andar. A capoeiragem incluía, 
além disso, uma série de passos 
difíceis e de agilidades quase 
incríveis de corpo, nas quais 
o malandro de rua se iniciava 
como que maçonicamente”36. 
Nessa descrição, Gilberto 
Freyre reproduz as principais linhas 
que, ainda hoje, configuram o 
perfil dos antigos bravos e valentes: 
sua atuação nas bandas de música, 
nas procissões e nas festas de rua, 
seu caráter urbano e sua ligação 
com a malandragem e o crime. 
Mas é, principalmente, através 
da história do Carnaval que a 
memória da capoeira antiga do 
Recife se constrói. A referência às 
primeiras corporações de ofício, 
formadas por carregadores do 
porto, nas origens dos “clubes de 
rua”, confirma essa característica 
e aproxima a capoeira do Recife 
dos primeiros folguedos urbanos. 
Os desfiles das corporações 
reuniam trabalhadores de diversos 
ramos, que batizariam os primeiros 
clubes. Katarina Real37 nos dá 
notícia de alguns desses clubes, 
intimamente associados aos laços de 
ofício entre trabalhadores urbanos, 
já no final do século 18: Clube 
dos Ferreiros, dos Vasculhadores, 
dos Espanadores e outros, 
prosseguindo a prática daquelas 
corporações que empunhavam 
seus estandartes e “marchavam” 
pelas ruas no Corpus Christi e nas 
Festas de Reis, envolvendo a massa 
de trabalhadores pobres – entre os 
quais se destacavam, justamente, 
os libertos e os descendentes 
de escravos. A tradição dos dois 
grandes rivais, o Clubes das 
Pás e o Vassourinhas, também 
traz a marca dessa origem. 
Pereira da Costa38, em um 
estudo publicado na Revista do 
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro 
(IHGB), refere-se à presença das 
bandas militares naqueles desfiles 
do século 18 e, neles, à atuação dos 
capoeiras. O autor lembra “duas 
excelentes bandas de música que, 
pelo ano de 1856, existiam entre 
nós”: a do “quarto batalhão de 
artilharia” e outra, pertencente a 
“um corpo da Guarda Nacional”, 
formando “dois partidos de 
40Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
capoeiras que eram violentos 
rivais, o Quarto, que apoiava o 4° 
Batalhão, e o Hespanha, que apoiava 
a banda da Guarda Nacional”. 
Pereira da Costa lembra ainda 
que tal rivalidade encerra-se com 
a ida do Quarto para a Guerra 
do Paraguai, em 1865. Esses dois 
partidos reproduziam a rivalidade 
entre as bandas de música, cujo 
encontro resultava em lutas e 
hostilidades entre os grupos de 
capoeiristas que as acompanhavam. 
Essa realidade, muito semelhante 
à das maltas do Rio de Janeiro 
nas bandas militares, durante a 
segunda metade do século 19, 
prolonga-se pelo Carnaval dos 
clubes pedestres do início do século 
20 e, nesse percurso, mistura-se 
ao variado repertório do Carnaval 
de Recife. Pereira da Costa registra 
os versos de hostilidade que 
bramavam entre si os “bravos”, 
enfrentando-se à saída das bandas: 
Viva o Quarto, 
Fora o Espanha!
Cabeça Seca
É que apanha!
Ou esses: 
Não venha, 
chapéu de lenha!
Partiu, 
Caiu,
Morreu, 
Fedeu!
“Saísse uma música para 
uma parada ou uma festa 
e lá estavam infalíveis os 
capoeiras à frente, gingando, 
piruetando, manobrando 
cacetes e exibindo navalhas”39.
Dessa participação dos 
capoeiras na folia das ruas 
nasceria o passo característico 
da coreografia que acompanha a 
música do frevo. Essa conhecida 
relação da capoeira com o passo, 
remetendo às raízes do frevo, 
nasce, então, nos “partidos” de 
capoeira que acompanhavam 
as bandas militares, durante os 
desfiles dos clubes pedestres. 
Katarina Real observa em seu 
estudo que essas origens do passo 
têm uma história em comum 
com o processo de aclimatação de 
manifestações africanas observado 
também no Rio de Janeiro: “As 
origens dos passos do frevo vêm 
diretamente da capoeira de angola 
trazida ao Brasil pelos negros 
angolenses, dança guerreira na 
sua forma original que produziu 
não somente o passo como 
também a pernada carioca”40. 
Outro parentesco facilmente 
identificável entre a história da 
capoeira nas duas cidades se refere à 
atuação dos capoeiristas na política 
partidária do século 19. Mário Sette 
menciona o prestígio que muitos 
“bravos” adquiriam por intermédio 
41Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
de suas relações com figuras da 
política, para quem serviam de 
capangas eleitorais: “Os capoeiras, 
em regra, pertenciam a este ou 
àquele figurão dos tempos. Nos dias 
de eleição retribuíam com serviços 
valiosos a proteção e a impunidade”41.
Entre esses “bravos” da 
capoeiragem, o memorialista 
cita João Sabe Tudo e o lendário 
Nascimento Grande, lembrado por 
Gilberto Freyre42 como exemplo 
dos elementosligados à capoeira 
que, muitas vezes, contribuíam 
ou negociavam com o sistema 
político. Nos dois registros, 
o personagem da capoeira 
pernambucana assume uma 
posição análoga à que, na crônica 
da capoeira carioca, os membros 
das maltas desempenhavam no 
Rio de Janeiro. Tal semelhança 
não passou despercebida por 
Mário Sette, conforme demonstra 
a seguinte passagem: “Do 
começo foram os capoeiras a 
modalidade mais ágil e pública 
dos valentes. A capoeiragem no 
Recife, como no Rio antigo, 
criou tais raízes que se julgava um 
herói sobrenatural quem tivesse 
forças para acabar com ela”43.
A progressiva criminalização 
da capoeira, na cidade do 
Recife, acompanha as práticas 
de normatização do espaço e 
de perseguição aos “bravos” e 
“valentes”, que também se observam 
nas outras grandes capitais da 
Primeira República, a partir de 
1890. Como afirma Evandro 
Rabello, os códigos de postura 
decretados pela administração 
municipal, naquele contexto, 
faziam proibir a aglomeração, em 
locais públicos, de ex-escravos 
e demais elementos ligados às 
práticas culturais afro-brasileiras. 
Na capital federal, esse momento 
PINTURA ORIGINAL DO ABBY 
ALDRICH ROCKEFELLER FOLK ART 
MUSEUM, INTITULADA DE DANÇA DA 
PLANTAÇÃO, CAROLINA DO SUL.
PINTURA DE JOHN ROSE.
42Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
tem no chefe de polícia Sampaio 
Ferraz, nomeado por Deodoro 
da Fonseca, um símbolo extremo 
da política de perseguição e de 
deportações que se abateram sobre 
os capoeiristas nas cidades. 
Depois de recordar antigos 
capoeiras recifenses de renome 
– além de Nascimento Grande, 
Chico Cândido, Amaro Preto, 
Sabe Tudo, José Siri e outros 
–, Valdemar de Oliveira lembra 
que, em Pernambuco, a caçada à 
capoeira nos primeiros tempos 
da República também teve seus 
representantes. Entre eles, destaca-
se a figura de Santos Moreira, 
principal responsável pela série de 
deportações, desterros e extermínio 
de numerosos capoeiristas 
durante a República Velha. 
 “Havia de chegar a vez de 
todos eles. O Chefe da Polícia do 
governo Sigismundo Gonçalves, 
o desembargador Santos Moreira, 
segue o exemplo de Sampaio 
Ferraz: manda alguns para o 
cemitério (‘por terem reagido à 
prisão’), outros para a Detenção, 
os mais temíveis para Fernando. 
Das ruas cada vez mais bem 
iluminadas do Recife (até isso teria 
concorrido para o progressivo 
extermínio dos desordeiros), 
foram desaparecendo, pouco 
a pouco, os brabos”44. 
Note-se que, durante a crise 
final do Império, vinha ocorrendo 
um aumento da visibilidade dos 
capoeiras, após a Guerra do 
Paraguai, com a formação da Guarda 
Negra e a presença difusa de libertos 
que participaram do conflito, 
pelas capitais, provocando uma 
transformação no estatuto daqueles 
“homens de cor” que, em parte, 
ficavam investidos de uma nova 
identidade social. Estabelecendo 
O VELHO ORFEU AFRICANO 
(ORICONGO).
AQUARELA DE JEAN-BAPTISTE 
DEBRET.
43Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
um paralelo com a reflexão de 
Carlos Eugênio Líbano Soares sobre 
a condição dos capoeiras no Rio 
de Janeiro oitocentista, Evandro 
Rabello45 sugere que os “capoeiras-
soldados” do Recife estiveram à 
frente das primeiras manifestações 
públicas abrangendo a prática da 
capoeiragem, liderando as disputas 
entre os clubes e as agremiações 
carnavalescas, como também os 
conflitos em que se envolviam 
partidos e tendências políticas rivais. 
A mobilidade social dos 
libertos que assumiam alguma 
posição no exército e na polícia 
correspondia à sua liderança 
nos partidos de capoeira que 
se enfrentavam em torno das 
bandas ou nas disputas eleitorais. 
Assim, a presença ambígua dos 
capoeiristas de Recife nas fileiras 
do exército fazia-os assumir um 
papel importante para a visibilidade 
da capoeira nas ruas. Evandro 
Rabello chama a atenção para tal 
aspecto, demonstrando que essa 
inserção dos capoeiras nas forças 
oficiais poderia assumir um sentido 
inusitado e estratégico para garantir 
a continuidade daquela tradição: 
“Registros jornalísticos 
demonstram a presença ativa 
de soldados fardados exibindo-
se publicamente nas rodas de 
capoeiragem. Esses capoeiras 
fardados sentiam-se mais protegidos 
das investidas repressoras da polícia, 
já que os próprios soldados do 
exército, quando envolvidos em 
desordens, recusavam-se a aceitar a 
autoridade da polícia provincial”46. 
Rabello faz uma compilação 
de matérias do Diário de Pernambuco 
e do Jornal Pequeno em torno do 
Carnaval. Em algumas dessas 
matérias, aparece a conhecida 
imagem do capoeira marginal 
e desordeiro, envolvido em 
assassinatos e brigas, como 
justificativa para medidas 
repressivas em nome da 
“pacificação” dos desfiles. Assim, 
em matéria de 1923, o Jornal 
Pequeno noticiava o aparecimento 
de um bloco carnavalesco que, 
supostamente, fazia renascer a 
personagem do capoeira como 
vândalo. Aos olhos do autor 
anônimo da matéria, essa categoria 
de bravos parecia ter sumido 
NEGROS QUE VÃO LEVAR AÇOITES.
FREDERICO GUILLERME BRIGGS.
44Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
com a introdução da cavalaria 
da polícia no acompanhamento 
dos cordões. Diz o jornal: 
“A essas exibições públicas, 
que pela impropriedade nada 
tinham de carnaval, deu o nosso 
povo a denominação de frevo. 
“Sempre que esses cordões 
saíam à rua, precedidos 
de numerosa orquestra ou 
fanfarra, arrastavam um grande 
acompanhamento, em que 
predominavam tipos afeitos a 
desordens, capoeiras profissionais, 
enfim, elementos da pior espécie. 
Por isso mesmo, registravam-se no 
mais aceso dos frevos, cacetadas, 
facadas, bofetadas e até mortes. 
“Quando as desordens não 
eram provocadas por velhas 
rixas de foliões, provocavam-
nas os tipos de maus instintos. 
“Daí a providência da 
polícia fazendo acompanhar 
os clubes nesses passeios por 
patrulhas de cavalaria. 
“Ontem à noite, porém, surgiu 
na cidade inesperadamente uma 
troça, cordão ou bloco que tomou o 
nome pouco significativo de “Braço 
é braço”. E depois de andar, acima 
e abaixo, azucrinando os ouvidos e 
interrompendo a normalidade da 
vida citadina, lá pelos lados de S. 
José, valente-capoeira recordando 
os velhos tempos disparou para o 
ar a sua respeitável pistola. Foi o 
bastante para fechar o tempo...
“Para que os desordeiros de 
ofício não escapassem ao castigo, 
fez-se necessário que a cavalaria 
entrasse em cena e mostrasse que 
a divisa de tal clube não estava 
certa. Nem sempre braço é braço. 
Às vezes, braço... é espada”47.
A produção desse estigma em 
torno da figura do capoeirista, 
atribuindo-lhe a responsabilidade 
pela “desordem”, é o tom geral 
dos artigos compilados no livro 
de Rabello com referências ao 
Carnaval e à capoeira. O dado 
da cavalaria, tema comum nas 
histórias de perseguição da 
polícia a capoeiristas, remete à 
observação de Gilberto Freyre 
sobre a repressão às manifestações 
públicas de ex-escravos e da faixa 
mais pobre da população, que 
abrigava a maioria dos capoeiras: 
“Só brancos, soldados ou 
fidalgos feudalmente a cavalo faziam 
fugir moleques afoitos, capoeiras 
desembestados, capadócios 
atrevidos. Veio até quase nossos 
dias o prestígio do simples grito 
‘lá vem a cavalaria!’, isto é, a tropa 
a galope, fazer dispersarem-se 
desordeiros ou insurretos a pé”48.
A existência desse mecanismo 
repressivo, defendido pelo 
artigo do jornal e confirmado 
por outros comentaristas em 
45Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
relação à capoeira, em geral, 
bem como nas histórias contadas 
pela própria comunidade 
de capoeiristas, em torno da 
origem do toque de berimbau, 
denominado “Cavalaria”, revela 
mais uma vez que a história da 
capoeira do Recife tem traços 
muito semelhantes ao que já foi 
observado por diversos cronistas 
e pesquisadores nas outras duas 
cidades onde a capoeira constituiu 
as suas mais sólidas tradições: 
Rio de Janeiro e Salvador. 
É possível, nesse sentido,imaginar a existência de registros 
mais detalhados, correspondentes 
aos que já existem sobre as outras 
duas capitais. As semelhanças 
apontadas com o percurso da 
capoeira no Rio de Janeiro sugerem 
que, em Recife, a memória sobre a 
capoeira se relaciona com a própria 
história de deportações e “limpeza” 
ocorridas nas cidades onde a 
presença negra se impôs, antes e 
depois da Abolição. No Recife, 
a estudiosa e capoeirista Mônica 
Carolina Beltrão registra, entre os 
lugares frequentados por grupos de 
capoeiras, as ruas do Imperador, 
do Rosário, das Trincheiras e do 
Pátio do Carmo, bem como os 
bairros de Santo Antônio, São 
José, Afogados, Torre e Madalena. 
Em resumo, a ênfase na 
presença da capoeira para 
a formação das tradições 
carnavalescas de Recife é uma 
marca da bibliografia sobre o 
assunto. Mas não há ainda uma 
pesquisa de fôlego sobre o universo 
da capoeiragem. E nem mesmo 
um estudo sistemático que se 
detenha sobre as trajetórias da 
capoeira para além de sua presença 
inquestionável na história do 
frevo e do passo e de seu vínculo 
primordial com a ação de escravos 
e libertos nas antigas bandas de 
música. Essa lacuna não passou 
despercebida a Mônica Beltrão:
“Tendenciosamente, os 
capoeiras foram vinculados a 
tais agremiações, até porque, 
após a abolição da escravatura, 
os desfiles das bandas passaram a 
ser o principal atrativo cultural 
da cidade. Não obstante, 
eternizaram a relação entre tais 
bandas e os valentes, submergindo 
o registro de outras manifestações 
populares que contavam com 
a presença dos capoeiras, 
maiormente as que envolviam 
costumes afrodescendentes como 
o maracatu”49. 
Retornando ao conjunto de 
fontes jornalísticas apresentadas no 
livro de Rabello, confirma-se que a 
questão acima citada, levantada pela 
pesquisadora, é importante para a 
ampliação do universo da capoeira 
em Pernambuco. Temos, por 
CERIMÔNIA DE ADVINHAÇÃO E 
DANÇA - BRASIL.
DESENHO DE ZACHARIAS 
WAGENER.
46Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
exemplo, um indício da participação 
de capoeiras na brincadeira do 
bumba meu boi, conforme um 
relato de 1897, do Jornal de Pernambuco: 
“Em um bumba meu boi, 
brinquedo aliás selvagem que 
efetua-se todos os sábados e 
vésperas de dias santificados, houve 
anteontem pancadaria e a mocidade 
vadiou. Noves fora. Um pobre 
diabo com duas tremendas facadas. 
Quanto ao mais, tudo vai bem”50.
Igualmente, nas rivalidades 
entre os maracatus Oriente 
Pequeno e Leão Coroado, Rabello 
anota a frequência de brigas e 
hostilidades envolvendo grupos 
de “valentes”. Assim, para um 
levantamento da presença de 
capoeiristas em outras situações 
da vida urbana de Recife, seria 
preciso ampliar a busca da relação 
das forças repressivas com as 
demais práticas reunindo escravos, 
libertos e seus descendentes. Além 
disso, o caráter de divertimento 
popular da capoeira – como 
mais um brinquedo ou um 
folguedo entre outros que aqui 
se desenvolveram a partir de 
matrizes africanas – ainda não 
foi devidamente ressaltado ou 
mapeado nas fontes de época. 
Nestas, a ênfase na relação dos 
“valentes” com a desordem pública 
nos blocos de música ainda é o 
principal, senão o único, sinal 
da presença da capoeira na 
historiografia sobre a cidade.
É necessário buscar, por 
exemplo, a presença negra nas 
referências sobre as sedições e 
revoltas populares em Pernambuco, 
durante o século 1051, a participação 
de escravos e libertos no ciclo de 
levantes liberais e a trajetória dos 
“soldados-capoeiras” de Recife que 
retornaram da Guerra do Paraguai. 
Essas temáticas, envolvendo 
estratégias de luta e modos de 
resistência e negociação dos 
escravos e libertos, relacionam-se 
diretamente com a experiência dos 
capoeiras. Os arquivos da justiça 
e da polícia pernambucana, além 
dos periódicos e das crônicas, são 
espaços onde se pode fazer esse 
levantamento imprescindível, na 
busca de indícios dessa inserção 
dos capoeiristas de Recife em 
seu ambiente sociocultural. ¢
CAPOEIRAGEM SEC. XIX - 
MALTAS CARIOCAS.
DESENHO DE SALES.
47Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
O período denominado “anos 30” foi eleito pela literatura sobre 
a capoeira baiana como divisor da 
sua história. O destaque dado a essa 
década está associado à invenção da 
capoeira regional por Mestre Bimba, 
a partir de 1928, e sua consolidação 
nos anos 30. O surgimento dessa 
capoeira traz implícitas outras 
questões relacionadas à capoeira 
baiana como um todo, envolvendo 
desde a sua prática até o seu modo 
de se relacionar com a sociedade.
É necessário dizer que esse 
fenômeno acontece num contexto 
histórico em que se dá um processo 
de renovação institucional das 
manifestações culturais negras em 
busca de legitimação, legalização 
jurídica, construção de autonomia 
territorial, visibilidade na imprensa, 
aceitação social, afirmação cultural 
e maior expansão da sua prática 
para outras camadas sociais. De 
acordo com Vivaldo da Costa 
sociedade sobre as manifestações 
culturais afro-brasileiras.
 No caso da capoeira da Bahia, 
é relevante o papel desempenhado 
por Édison Carneiro, pioneiro 
ao publicar, em 1936, um artigo 
de página inteira sobre capoeira 
na imprensa baiana, ressaltando 
seus aspectos culturais, texto 
posteriormente inserido no 
seu livro Negros bantos53. Essa é a 
primeira vez que a capoeira baiana 
Lima, para a Bahia, “era aquele 
um tempo em que os impulsos 
amortecidos e reprimidos do 
negro começaram a se reorganizar 
através de diversos mecanismos 
e estratégias de resistência 
cultural e afirmação política. 
Organizavam-se os movimentos 
sindicais e os candomblés”52. 
E, pode-se acrescentar, 
organizavam-se também as 
academias de capoeira.
Entre as décadas de 1930 
e 1940, cresce o interesse de 
intelectuais brasileiros e de 
alguns estrangeiros por essas 
manifestações, que se tornam 
seus objetos de estudo e pesquisa. 
Entre eles estavam Gilberto 
Freyre, Édison Carneiro, 
Arthur Ramos, Jorge Amado, 
Donald Pearson. Na realidade, 
esses intelectuais tiveram uma 
participação importante na 
construção de uma nova visão da 
RODA DE CAPOEIRA.
FOTO: MARCEL GAUTHEROT.
O nascimento 
de uma nova 
tradição da 
capoeira / 
1930-1940
48Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
recebe uma pequena descrição 
etnográfica. Carneiro narra como 
era o ritual da roda, apresenta 
o berimbau como instrumento 
indispensável à realização da 
brincadeira, cita e interpreta 
algumas cantigas, vinculando-as 
ao universo cultural africano. 
Para o autor, a capoeira é uma 
herança dos negros bantus. Atento 
à contemporaneidade da capoeira 
de seu tempo, o estudo revela as 
disputas entre a Capoeira Regional 
e a Capoeira dita de Angola, as 
tensões daí provenientes, e projeta 
um futuro não muito promissor 
para a capoeira por ele denominada 
“folclórica” ou “legado de Angola”. 
Sendo vítima do progresso, essa 
manifestação (ou prática) estaria 
em vias de extinção, avalia o autor, 
que reconhece, porém, a existência 
de alguns pontos da cidade onde 
é grande a vitalidade dessa arte. 
Tais pontos, provavelmente, se 
tornaram verdadeiros redutos de 
capoeiragem nos anos posteriores. 
Édison Carneiro foi um 
dos principais organizadores do 
II Congresso Afro-Brasileiro, 
realizado em janeiro de 1937. Esse 
Congresso, além de promover a 
apresentação de pesquisas sobre 
os costumes africanos, também 
foi palco de reivindicações e 
de protestos em favor do povo 
negro e das suas manifestações 
culturais. De acordo com 
Assunção e Vieira, estudiosos da 
capoeira, ele “contribuiu para a 
maior aceitação do candomblé 
e da capoeira pelas elites e para 
o consequente abrandamento 
da repressão policial”54. 
Estava prevista para esse 
congresso a criação da União dos 
Capoeiras Baianos, o que não 
ocorreu. No entanto, a capoeira 
marcou sua presença com uma 
MONTAGEM DE RECORTES DE 
ILUSTRAÇÕES DE LIVROS
A) MESTRE PASTINHA – QUEBRA 
MILHO COMOGENTE MACACO.
MACACO QUE QUEBRA DENDÊ 
MACACO.
B) CANJIQUINHA – A ALEGRIA DA 
CAPOEIRA
C) MESTRE PASTINHA – 
RECORTE DA CAPA DO LIVRO DE 
MESTRE PASTINHA – QUANDO AS 
PERNAS FAZEM MIZERÊR
ILUSTRAÇÕES DE MESTRES 
PASTINHA E CANJIQUINHA.
49Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
apresentação da Capoeira de 
Angola, liderada pelo conhecido 
capoeira Samuel Querido de 
Deus, juntamente com Aberrê, 
Bugaia, Eutychio, Barbosa, Maré, 
Edgar, entre outros nomes de 
famosos da capoeira de angola. 
Capoeiristas da Regional não 
estiveram presentes ao congresso. 
Esse evento, de natureza cultural, 
foi muito importante para a 
capoeira baiana nos anos 1930.
Outro evento, também 
fundamental para se compreender 
a capoeiragem baiana nessa época, 
foram as lutas no ringue do parque 
Odeon, nas quais participaram 
diversos capoeiristas baianos. Esse 
evento, em que Mestre Bimba 
consagrou-se campeão baiano 
de capoeira, foi alvo de estudo 
de Frederico José de Abreu55. 
Nesse trabalho, o autor analisa 
e torna disponível ao grande 
público cerca de 80 notícias de 
jornal, publicadas entre 29 de 
agosto de 1935 e 20 de janeiro 
de 1937, em cinco periódicos 
baianos (A Tarde, Diário da Bahia, 
O Estado da Bahia, Diário de Notícias 
e O Imparcial). A quantidade de 
dados encontrados traz à tona a 
grande visibilidade que a capoeira 
ganha, nessa época, na imprensa. 
Para o autor, as lutas no ringue 
representam, simbolicamente, a 
divisão entre a Capoeira Angola e 
a Regional. Frede Abreu observa 
que, apesar de ser um evento 
pugilístico, por meio das súmulas 
das lutas e dos debates a seu 
respeito publicados na imprensa 
tornam-se visíveis muitos aspectos 
socioculturais da capoeira na 
época. Dentre eles, são revelados 
não apenas as diferentes formas 
de jogar capoeira, como também 
o novo método de ensino do 
Mestre Bimba, as visões que os 
MONTAGEM DE RECORTES DE 
ILUSTRAÇÕES DO LIVRO DE 
MESTRE PASTINHA
DESENHOS DA CAPA E 
ILUSTRAÇÃO DO LIVRO DE 
MESTRE PASTINHA – QUANDO 
AS PERNAS FAZEM MIZERÊR.
ILUSTRAÇÕES DE MESTRE 
PASTINHA.
50Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
capoeiras tinham da sua própria 
arte e os diferentes modos de os 
capoeiras se relacionarem com 
a sociedade e o poder público.
O autor ainda destaca, nesse 
livro, episódios que possibilitam 
acompanhar o processo histórico 
de legitimação e legalização do 
ensino da capoeira atribuído a 
Mestre Bimba. De certa forma, 
Abreu reforça a contribuição 
pessoal do mestre para os 
destinos da capoeira moderna. 
Ele ressalta suas iniciativas para a 
oficialização jurídica da capoeira; 
seu ajustamento a um novo espaço 
(a academia); sua maior expansão 
para outros segmentos sociais; e sua 
penetração em outras instituições 
(quartéis, palácios, escolas, clubes 
esportivos etc.). Assim, com a 
inserção desses novos elementos, 
a capoeira passava a ser exercida 
como ofício. A importância de 
Mestre Bimba nesse momento 
tão fértil para a capoeira baiana 
é apontada por muitos outros 
estudos produzidos sobre ele, 
alguns escritos por seus alunos. 
Em 1928, Mestre Bimba 
afirmou ter criado sua Capoeira 
Regional. Para Muniz Sodré, as 
ideias de Zuma influenciaram 
na criação da nova modalidade: 
“Contato houve, é certo, entre os 
discípulos de Bimba e o manual 
de Annibal Burlamaqui”56. De 
qualquer maneira, o contexto 
histórico posterior também 
privilegiou a proposta da Capoeira 
Regional, principalmente no 
Estado Novo, instalado em 
1937, mesmo ano em que se 
consagrou o início do processo 
de descriminalização da capoeira, 
quando Bimba recebeu autorização 
para manter seu Centro de Cultura 
Física e Capoeira Regional. Mais 
tarde, em 1954, se apresentaria 
para Getúlio Vargas, em Salvador, 
e para o governador do estado, 
Juracy Magalhães. Na ocasião, 
o presidente teria se referido à 
capoeira como o único esporte 
genuinamente nacional.
A desmarginalização da 
capoeira se deu num mesmo 
movimento em que o Estado 
brasileiro resolveu nacionalizá-
la, motivo que levou o governo 
do estado da Bahia, em plena era 
Vargas, a permitir o funcionamento 
da escola de Mestre Bimba. 
Este, por outro lado, defende 
a capoeira como luta criada no 
Brasil. A ideia da capoeira como 
“arte marcial brasileira” norteou 
as primeiras iniciativas públicas 
que tiveram impacto no cotidiano 
do capoeirista, uma perspectiva 
polêmica que permanece defendida 
por uns e criticada por outros, 
principalmente pelos mestres de 
Capoeira Angola, que afirmam 
sua ancestralidade africana.
51Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
O mais importante deles foi 
Mestre Pastinha, articulador do 
Centro Esportivo de Capoeira 
Angola – Ceca. Essa instituição, 
inicialmente organizada de forma 
associativa – juntamente com os 
que frequentavam a Gengibirra, 
ponto de visibilidade de capoeira 
nos anos 1930, Amorzinho, 
Noronha, Totonho de Maré, 
Livino Diogo, Onça Preta, 
Olímpio, Zeir, Victor H. U. e 
Alemão, filho de Maré –, na década 
de 1940, foi individualizada como 
academia de Mestre Pastinha. 
A importância de Mestre 
Pastinha à frente da Capoeira 
Angola foi fundamental para que 
esta se tornasse visível e ocupasse 
espaços em que, até então, não 
havia penetrado. O valor da 
Academia de Mestre Pastinha para a 
capoeira é tão grande que se tornou 
o modelo dominante e hegemônico 
de jogar Capoeira Angola, 
suplantando outros importantes 
mestres dessa modalidade.
Tanto Bimba quanto Pastinha 
foram os principais responsáveis 
pela expansão inicial, para outros 
estados do Brasil, da maneira 
tradicional baiana de jogar 
capoeira. Dessa forma, ambos 
ganham o respeito da sociedade 
e passam a se relacionar com 
intelectuais, artistas e políticos 
da época, que vão legitimá-los 
não só como mestres de capoeira, 
mas também como porta-vozes 
da cultura popular. Na primeira 
metade do século 20, esses dois 
mestres se transformam nas 
principais referências da capoeira 
da Bahia e estabelecem a base 
de sustentação da modernização 
da prática da capoeira. 
A capoeira passa a ser 
conhecida nacionalmente, no 
século 20, a partir da Bahia. 
Não apenas Mestre Bimba, 
mas também a escola de Mestre 
Pastinha, no Pelourinho, ganha 
destaque, tornando-se ponto 
da velha guarda da Capoeira 
Angola, de intelectuais e turistas 
que iam apreciar as rodas. Como 
resultado, ocorrem as primeiras 
viagens de grupos de capoeira pelo 
território brasileiro. A partir dos 
anos 50, uma farta documentação 
baseada em notícias de jornais 
começa a ser produzida. ¢
FOTO DE MESTRE PASTINHA E 
JORGE AMADO – ILUSTRAÇÃO 
DO LIVRO “CAPOEIRA ANGOLA” 
POR MESTRES PASTINHA.
FOTO: ACERVO TÉCNICO IPHAN.
52Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
nacional e fonte alimentadora 
de diversas linguagens artísticas 
(música, dança contemporânea, 
teatro, artes plásticas etc.).
Seus principais mestres 
– Bimba e Pastinha – já eram 
conhecidos nacionalmente e, 
em viagens para outros estados 
do Brasil, difundiam a capoeira 
baiana, que a cada dia ia se 
afirmando no cenário nacional 
como “o jogo da capoeira”. 
Nesse período, quando se faz 
referência à capoeira, esta é 
imediatamente associada à Bahia, 
que passa a ser considerada o 
seu berço. Além disso, nesse 
momento, tal manifestação 
não é mais vista como marca do 
atraso e da barbárie, mas como 
símbolo da cultura baiana e 
brasileira. É a partir dos anos 
1950 que o berimbau passa a 
ser usado como um símbolo de 
identidade da cultura baiana, 
em especial o berimbau pintado, 
obra do Mestre Waldemar. 
Nesse novo cenário da 
capoeiragem baiana, dois mestres 
ganham destaque: Waldemar da 
Paixão/da Liberdade e Cobrinha 
Verde. Suas academias de Capoeira 
Angola do final dos anos 1940 
e ao longo de toda a década de 
1950 desempenharam um papel 
relevante na história da capoeira da 
Bahia. Suas rodas domingueiras, 
localizadas respectivamente na 
Liberdade e no Chame-Chame, 
além de reunirfamosos capoeiristas 
da época, como Bimba, Traíra, 
Najé, Onça Preta, Cabelo Bom, 
Bráulio, Bugalho e muitos outros, 
também atuaram na formação de 
uma nova geração de capoeiristas, 
que teve um papel importante 
nos anos 1960 e 1970. 
As academias desses mestres 
se estabeleceram nos bairros 
periféricos de Salvador e, dessa 
Apesar de os anos 1950 terem sido bastante efervescentes para 
a capoeira baiana e de haver um 
aumento do interesse de famosos 
intelectuais de diversas áreas pela 
arte da vadiação, existe uma lacuna 
muito grande no campo da pesquisa 
sobre essa época, inviabilizando 
uma análise mais profunda da 
prática da capoeira e do cotidiano 
dos capoeiras no período. 
Até hoje não foi feito 
um levantamento sistemático 
das notícias e das reportagens 
publicadas sobre o assunto nos 
jornais e nas revistas da época. No 
entanto, por meio de depoimentos 
orais e de algum material já 
coletado na imprensa baiana, 
pode-se supor que nesse período a 
capoeira estava bastante difundida, 
com um número significativo 
de praticantes, espalhada 
por diversas camadas sociais, 
foco de atenção do noticiário 
O processo de 
folclorização 
e esportização 
1950-1970
53Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12 53
maneira, serviram como agências 
culturais capazes de agregar, em 
torno desse meio de diversão, 
tanto os habitantes do local como 
pessoas de fora e até estrangeiros, 
atraídos pela fama dos grandes 
mestres. É preciso acrescentar 
que a academia de Waldemar, 
no bairro da Liberdade, foi 
considerada um dos principais 
pontos de capoeira nos anos 1950 
e serviu de local de observação para 
estudiosos de diversas áreas, como 
a musicóloga Eunice Catunda, o 
fotógrafo Pierre Verger, o artista 
plástico Caribé, o romancista Jorge 
Amado, o escultor Mário Cravo, 
o cineasta Alexandre Robato – 
diretor do filme Vadiação (1954) 
–, atraídos pela excelência da 
capoeira ali jogada. Parte da 
história da academia encontra-se 
no livro de Frede Abreu, chamado 
Barracão do Waldemar, nome pelo qual 
ficou conhecido esse espaço57. 
RODA DE MESTRE VALMIR - 
FICA BAHIA.
FOTO: TT CATALÃO – ACERVO 
TÉCNICO IPHAN.
54Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Da mesma forma que nos 
anos 1950, a capoeiragem baiana 
dos anos 1960 e 1970 não foi 
alvo de investigação, embora se 
saiba, de antemão, que existe 
uma grande documentação sobre 
aquelas duas décadas, como provou 
Raimundo Alves de Almeida, 
o Mestre Itapoan. Tomado o 
referido período da capoeira baiana 
como referência58, ele reuniu 
material basicamente composto 
de notícias de jornais e revistas, 
livros, artigos, anais de congressos 
publicados na Bahia e no Brasil.
Entre as notícias, deve-se 
destacar um importante evento: 
o Festival de Artes Negras, realizado 
em 1966, em Dakar, capital 
do Senegal. Mestre Pastinha 
liderou o grupo de Capoeira 
Angola nesse festival, que 
ficou registrado na memória 
da capoeira como um episódio 
emblemático, principalmente 
por ligar a capoeira à África. 
Na década de 1960, a fama 
de Pastinha e Bimba continua 
em ascensão, suas academias 
funcionam com grande vitalidade; 
já as academias dos mestres 
Waldemar e Cobrinha Verde, 
e tantas outras localizadas na 
periferia de Salvador, estão em 
decadência. Entre os anos 1960 e 
1970, dois momentos devem ser 
55Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
mencionados, exatamente porque 
influenciaram profundamente 
os rumos da capoeira baiana. 
O primeiro foi o início 
do processo de esportização da 
capoeira, homologado em 1972 
pelo Conselho Nacional de 
Desportos – CND, que submeteu 
a prática da capoeira às regras do 
pugilismo. Datam daí a realização 
dos campeonatos nacionais, as 
tentativas de unificação da capoeira, 
no sentido de eliminar as distinções 
entre as capoeiras Angola e 
Regional; e ainda os treinamentos 
voltados para fazer do capoeirista 
um atleta; e a simplificação dos 
ritos que não se adequavam às 
práticas esportivas. Essa tendência 
esportiva fomenta a vigência de 
sistema de graduação e tentativas 
de criação de uma nomenclatura 
também unificada. Enquanto 
algumas academias, principalmente 
de Regional e algumas de Angola, 
ajustaram-se às exigências de uma 
prática esportiva, outras mais 
tradicionais, tanto Angola quanto 
Regional, não se adaptaram e 
ficaram à margem desse processo. 
O segundo está relacionado 
ao processo de folclorização da 
cultura negra na Bahia, associado 
ao crescimento da indústria 
turística em Salvador, que, nos 
anos 1960 e 1970, introduz no 
repertório de atrações para a sua 
clientela, além das belezas naturais 
dos monumentos e do barroco 
das igrejas, as manifestações da 
cultura negra, principalmente 
o candomblé, a capoeira e o 
samba. As demandas provenientes 
desse novo contexto tiveram um 
forte impacto nas academias 
de capoeira. Muitos dos seus 
membros passaram a compor 
grupos folclóricos, que surgiram 
liderados por empresários, 
pesquisadores e capoeiristas, os 
quais, embora ainda não fossem 
mestres, tinham capacidade 
de gerir o próprio grupo. 
Nas décadas de 1960 e 
1970, dois mestres de capoeira – 
Canjiquinha e Caiçara – surgem 
como figuras importantes no 
universo da capoeira baiana, 
ambos mostrando capacidade 
de se ajustar diretamente às 
novas exigências do folclore, 
estilizando as manifestações 
e, no caso da capoeira, 
transformando o jogo/ritual em 
show. A atuação desses mestres, 
no sentido da transformação 
do jogo em espetáculo, vai 
romper com a bipolarização da 
capoeira da Bahia em torno dos 
mestres Pastinha e Bimba. 
As principais lideranças da 
capoeira na época se voltam de 
forma preferencial para atender às 
demandas do mercado turístico, 
por causa de sua rentabilidade. 
À ESQUERDA
MÃO DE MESTRE CURIÓ 
TOCANDO BERIMBAU.
FOTO: TT CATALÃO – ACERVO 
TÉCNICO IPHAN
AO LADO
RECORTE DE FOTO DE MARCEL 
GAUTHEROT
56Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Ainda que pouco significativo 
do ponto de vista financeiro, 
os ganhos com as apresentações 
folclóricas superavam os que se 
podia conseguir com o ensino da 
capoeira. Esse fato comprometeu 
o funcionamento de muitas 
academias, principalmente 
em relação à formação de 
novos capoeiristas, porque as 
atividades das academias eram 
mais voltadas ao treinamento/
ensaio dos shows folclóricos do 
que às aulas propriamente ditas. 
Apesar dos problemas trazidos 
pela folclorização da cultura negra, 
não se pode deixar de reconhecer 
que esse fenômeno contribuiu 
significativamente para a expansão 
da capoeira baiana pelo Brasil. Além 
disso, com a migração de baianos 
para o sudeste brasileiro, em busca 
de melhores oportunidades de vida, 
uma leva de mestres capoeiristas 
chegou ao Rio de Janeiro, nos anos 
1950. O mais importante deles 
foi Arthur Emídio, que vinha de 
Itabuna, região do cacau na Bahia.
Mestre Arthur Emídio trouxe 
uma capoeira que não tinha 
ligação com a Capoeira Angola de 
Pastinha nem com a Regional de 
Bimba. Tinha uma movimentação 
veloz e eficaz marcialmente, 
tanto que chegou a competir nos 
ringues com lutadores de outras 
artes marciais. No entanto, foi 
derrotado por um aluno de Mestre 
Sinhozinho, chamado Ismanir.
Ainda que tivesse ênfase na 
marcialidade, Arthur Emídio, 
ao contrário de Sinhozinho, 
mantinha a orquestração musical 
e fazia apresentações folclóricas. 
Instalou sua academia na Zona 
Norte do Rio de Janeiro e se 
tornou um dos capoeiristas mais 
famosos da cidade. Mestres cariocas 
importantes como Leopoldina, 
57Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
PÁGINA À ESQUERDA
RODA DE CAPOEIRA – 
MESTRE NAGÔ.
FOTO: ACERVO TÉCNICO IPHAN.
À DIREITA
RODA DE CAPOEIRA – 
MESTRE TONI VARGAS.
FOTO: ACERVO TÉCNICO IPHAN.
Celso do Engenho da Rainha, 
Paulo Gomes, Djalma Bandeira e 
Vilmar foram seus alunos, o que 
dá uma dimensão de sua influência 
na capoeira praticada na Zona 
Norte carioca,nos anos 1950. 
Conforme relatou Mestre Vilmar:
“Eu aprendi com o mestre 
Djalma Bandeira, que dava aula em 
Olaria a mando do mestre Artur 
Emídio, que na época, para difundir 
a capoeira, foi lutar com os Gracies 
nos ringues, porque, antigamente, 
o Brasil parava para ver essas lutas na 
TV Continental. Então, de um lado 
o Artur Emídio, que foi o propulsor 
da capoeira no Rio de Janeiro, e 
do outro o Djalma Bandeira dava 
aula de capoeira. E eles se juntavam 
nos fins de semana para fazer a 
exibição em locais considerados de 
elite, como a Universidade Rural, 
a ACM na Lapa e a Sociedade 
Pestalozzi do Brasil. Foi quando eu 
fui indicado para dar aula, pois os 
garotos gostavam de mim porque 
eu tocava berimbau e gingava e 
eles achavam aquilo incrível”59.
Enquanto Mestre Arthur 
Emídio ensinava capoeira na Zona 
Norte do Rio de Janeiro, um 
outro movimento de capoeiristas 
surgiu na Zona Sul carioca. Em 
1964, os irmãos Rafael e Paulo 
Flores retornaram de uma viagem 
à Bahia, onde treinaram capoeira 
durante alguns meses com Mestre 
Bimba. Resolveram continuar com 
os treinos no terraço do prédio 
em que moravam em Laranjeiras. 
Outros jovens foram chegando, 
como Gato e Gil Velho, que tinham 
tido experiência de capoeira com 
alunos de Mestre Sinhozinho. Em 
1966, Mestre Bimba esteve no Rio 
para realizar o show folclórico Vem 
Camará e visitou os jovens, que 
haviam se intitulado Grupo Senzala.
58Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
No ano seguinte, 1967, o 
Senzala ganhou a competição de 
música e jogo chamada Berimbau 
de Ouro, que tinha Mestre Arthur 
Emídio como juiz. O grupo da Zona 
Sul carioca também venceu nos dois 
anos seguintes e alcançou enorme 
sucesso entre a juventude da cidade. 
Ainda assim, a percepção de que 
estavam distantes dos fundamentos 
da capoeira baiana fez com que os 
principais capoeiristas do Senzala 
retornassem a Salvador, “visitando e 
treinando em diferentes academias, 
participando das mais tradicionais 
rodas de Capoeira Angola”60.
Devido a essas experiências 
entre os dois estilos, o Senzala não se 
definiu por nenhum deles. Manteve 
os ensinamentos de Bimba com 
os movimentos e instrumentos da 
Capoeira Angola. Também foram 
muito influenciados pelas artes 
marciais japonesas, principalmente 
o caratê. No entanto, os alunos de 
Mestre Bimba não foram os únicos a 
criar um novo estilo baseado em seus 
ensinamentos, visando a uma ênfase 
na esportização, em contraste com 
a folclorização a que era associada 
a capoeira baiana. O principal 
exemplo foi Carlos Sena. De acordo 
com Matthias Röhrig Assunção:
 
“Nascido em Salvador, ele 
começou a treinar com Bimba, 
em 1949. Ele se tornou um dos 
melhores alunos do mestre, e 
diretor de sua academia em 1954. 
Ainda em 1955, ele decidiu abrir sua 
própria escola, chamada Senavox, 
e a ensinar uma capoeira diferente, 
mais estilizada. O que distinguia 
Sena era sua crítica à “estagnação do 
folclorismo cultural” das exibições de 
capoeira e seu esforço para esportizar 
a capoeira. Ele criou um elaborado 
sistema de regulamentações formais 
que supostamente regrariam treinos 
e rodas... Sena, entre outros, 
proclamou ter inventado o sistema 
de cordas e sistematicamente 
utilizava uma saudação para 
capoeira: “Salve”. As regras 
inventadas por ele agradaram as 
forças armadas e simpatizantes 
do regime militar... Ele também 
contribuiu para as Regras 
Técnicas da Capoeira adotadas pela 
Confederação Brasileira de Boxe, em 
1972. Durante os anos 1960, Sena 
foi frequentemente considerado 
representante de um novo estilo, 
diferente da Capoeira Angola e 
Regional, usualmente chamado de 
capoeira estilizada ou Senavox”61.
Apesar do sucesso inicial e de 
sua boa conexão com os militares, 
a Senavox não prosperou. A 
insistência na hierarquia e na 
disciplina militar entrou em 
desacordo com o processo de 
deslegitimação social da ditadura 
nos anos 1970. Quanto à polêmica 
MAGNO E RODA DE 
CAXIAS – RUSSO.
FOTO: ACERVO TÉCNICO 
IPHAN.
59Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
em relação à criação do sistema 
de cordas, o certo é que seu uso 
foi institucionalizado em 1972, 
apoiado pelo nacionalismo militar. 
A Confederação Brasileira de 
Boxe determinou que a capoeira, 
assim como acontecia com as artes 
marciais orientais, deveria graduar 
seus alunos, mas ao contrário das 
faixas, utilizaria “cordéis” com 
as cores da bandeira brasileira: 
branco, verde, amarelo e azul.
Embora essas cores não fossem 
adotadas por todos os grupos, o 
sistema de cordas passou a fazer 
parte da capoeira, de forma 
predominante, a partir dos anos 
1970. Um modelo novo, que fundia 
elementos das capoeiras Regional 
e Angola, surgia no Sudeste do 
Brasil, difundindo-se pelo país e, 
mais tarde, pelo mundo. Além do 
Senzala, outros grupos que seguiam 
essa tendência iam surgindo em São 
Paulo. Desde 1960, um grupo de 
mestres baianos começou a ensinar 
na capital paulista: “Suassuna, 
Brasília, Joel, Gilvan, Paulo Limão, 
Silvestre, Ananias e, durante os 
anos 70, Airton Onça e Acordeon. 
Alguns eram pupilos dos famosos 
angoleiros Canjiquinha (Brasília, 
Ananias) ou Caiçara (Paulo Limão, 
Silvestre), enquanto outros tinham 
vindo da escola regional de Bimba 
(Airton Moura, Acordeon)”62 
60Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Foram também responsáveis pela 
criação da Federação Paulista de 
Capoeira, em 1974, instituição 
que endossava as regulamentações 
esportivas criadas para a capoeira.
Influenciados pelas sequências 
de Mestre Bimba, os grupos 
cariocas e paulistas incorporaram 
à sua prática movimentos e 
instrumentação da Capoeira 
Angola. Uma das suas características 
principais é o uso de cordas 
para graduar os jogadores. Essa 
modalidade ainda não tem 
um nome consensual entre os 
capoeiristas. Uns preferem chamá-
la “capoeira contemporânea”, 
outros “capoeira de vanguarda” e 
há ainda os que a nomeiam como 
“capoeira atual” ou, simplesmente, 
“capoeira hegemônica”. Os grupos 
que se tornaram os principais 
representantes dessa tendência no 
Rio de Janeiro são Senzala, Abadá 
e Capoeira Brasil; e em São Paulo, 
Cordão de Ouro e Cativeiro. 
Na mesma época em que essa 
modalidade se definia e difundia, 
em Recife, cidade histórica da arte, 
a capoeira encontrava-se resumida 
a três academias. Conforme 
contou Mestre Coca-Cola: 
“Quando eu montei minha 
academia de capoeira, em 71, por 
aí, começamos a trocar ideias com 
mais duas academias daqui; uma era 
de Paulo Guiné, de Três Carneiros, 
e a outra, de Pirajá, do Morro da 
Conceição. Não sei informar em 
que ano eles começaram, acredito 
que foi nesse mesmo período, 
porque Pirajá era daqui, foi para 
o Rio de Janeiro e voltou. Eu sei 
que comecei a jogar capoeira em 
63-64, mas a academia é da década 
de 70. Antes existia uma ou outra 
pessoa que jogava capoeira, como o 
Luciano Vitela lá de Piedade e o Lula 
RODA DE CAXIAS RUSSO.
FOTO: TT CATALÃO – ACERVO 
TÉCNICO IPHAN.
61Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
e o Paulo Cristo, que aprenderam 
também com o Marcos Natal. 
Eu penso que esse meu mestre, 
o Marcos Natal, foi quem deu o 
pontapé inicial, porque foi com 
ele que começamos a aprender. Ele 
passou uns cinco, seis anos aqui e foi 
embora para o Rio, porque a família 
dele foi transferida para lá”63.
De acordo com Mestre Coca-
Cola, o seu “primeiro mestre”, 
chamado Marcos Natal, era de São 
Gonçalo, município do estado do 
Rio de Janeiro. A reorganização 
da capoeira em Recife e Olinda, 
a partir dos anos 1970, se deu em 
grande parte devido a essa expansão, 
que teve num primeiro momento a 
influência da capoeira baiana, mas 
que depois se difundiria a partir 
do Rio de Janeiro e de São Paulo. 
Contraditoriamente àquela 
expansão da capoeira, os velhos 
mestres da Bahia viviam em sérias 
dificuldades. Mestre Bimba 
morreu, em 1974, em situação 
precária e longe de sua terra 
natal – em Goiás. Em1981, foi 
a vez de Mestre Pastinha morrer 
pobre e cego, num cortiço 
do Pelourinho. A Capoeira 
Angola, principalmente, vivia 
um momento de esquecimento. 
Um dos principais responsáveis 
pela sua revitalização foi Mestre 
Moraes, baiano que se iniciou na 
Capoeira Angola ainda criança, 
aos oito anos, quando começou 
a ter aulas no Centro Esportivo 
Capoeira Angola – Ceca, de Mestre 
Pastinha. Em 1980, criou o Grupo 
de Capoeira Angola Pelourinho – 
GCAP, no Rio de Janeiro. No ano 
seguinte, Mestre Moraes retornou a 
Salvador e liderou um movimento 
de revalorização dos antigos 
mestres angoleiros, promovendo 
oficinas no forte Santo Antônio, 
onde fixou sua academia e já se 
encontrava Mestre João Pequeno.
Apesar dos deslocamentos 
e das mudanças de contexto, 
as tradições locais e o passado 
histórico influenciaram a capoeira 
que se redefinia nas cidades. Em 
Recife, a capoeira se mantém 
voltada para a luta, o jogo é mais 
duro, o que remete à tradição dos 
antigos capoeiras pernambucanos, 
conhecidos como bravos e valentes. 
No Rio de Janeiro, a figura do 
capoeira é sempre ligada à do 
malandro, personagem emblemático 
da cultura popular carioca, a partir 
dos anos 1920. Salvador, por sua vez, 
permanece no imaginário coletivo 
como “berço” e “Meca” da capoeira, 
cidade santuário das antigas 
tradições. Apesar de afirmações 
como essas gerarem polêmicas e 
controvérsias, é correto afirmar 
que a capoeira baiana influenciou 
de forma decisiva o modo como 
o jogo é praticado desde os anos 
1920 no Brasil e no mundo. ¢
62Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
EMBAIXO
MARCA – YOUTH IN ACTION .. . 
SERVICE THROUGH MOVEMENT.
FOTO: TT CATALÃO – ACERVO 
TÉCNICO IPHAN.
À DIREITA
RODA DO GRUPO DE CAPOEIRA 
ANGOLA N GOLA, COM MESTRE JOSÉ 
CARLOS.
FOTO: XIM-XIM.
Mestre Arthur Emídio foi, provavelmente, o primeiro 
capoeirista a viajar para o exterior, 
entre os anos 1950 e meados da 
década de 1960. Ele se apresentou 
na Argentina, no México, nos 
Estados Unidos e na Europa. Além 
disso, fez demonstrações para os 
presidentes brasileiros Vargas e 
Kubitschek e para os governantes 
norte-americanos Eisenhower e 
Kennedy. Depois dele, em 1966, 
Mestre Pastinha e seus discípulos 
fizeram a antológica viagem para 
a África, onde participaram 
do Festival de Artes Negras.
Uma das formas de os 
capoeiristas conhecerem o mundo 
era participando de grupos 
folclóricos. Em algum momento 
da excursão, ou ao fim dela, alguns 
resolviam se estabelecer e ensinar 
capoeira nas cidades onde se 
encontravam. Foi o que aconteceu 
com Mestre Jelon Vieira, integrante 
do grupo Viva Bahia, que não 
voltou ao Brasil após uma série de 
shows pela Europa. Ele permaneceu 
em Londres e, em 1975, foi se 
apresentar em Nova York, onde 
resolveu estabelecer residência. Ao 
lado de Loremil Machado, foi o 
pioneiro da difusão da capoeira nos 
Estados Unidos. Em 1979, chegaria 
Mestre Acordeon, responsável 
pelo ensino do jogo na Costa 
Oeste, na Califórnia. A capoeira, 
dessa forma, cobriu as duas faces 
do território norte-americano.
Em 1990, Mestre João 
Grande chegaria a Nova York 
e inauguraria a primeira escola 
de Capoeira Angola dos Estados 
Unidos: Capoeira Angola Center, 
com sede em Manhattan. Aos 72 
anos, ele praticava e ensinava a 
tradicional Capoeira Angola em 
solo estrangeiro. Esquecido no 
Brasil, foi redescoberto por Mestre 
Moraes, seu antigo discípulo, 
trabalhando num posto de gasolina 
em Salvador. Mestre João Grande 
tinha 53 anos quando voltou a 
praticar capoeira. A partir desse 
momento de retomada de sua arte, 
trilhou caminhos inesperados. 
Maurício Barros de Castro 
assim descreveu sua trajetória:
“Convidado, em 1990, para 
participar do Festival de Artes 
Negras de Atlanta, nos Estados 
A globalização 
da capoeira
63Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Unidos, foi chamado para 
ministrar aulas em Nova York, 
onde passou a morar e instalou, 
em 1992, sua escola: Capoeira 
Angola Center. Em 1993, adquiriu 
o Green Card, visto que permitia 
ao estrangeiro morar e trabalhar 
no País. Mesmo que seja pouco 
lembrado no Brasil, Mestre João 
Grande é prestigiado no exterior, 
a ponto de uma universidade do 
estado de Nova Jersey, o Upsala 
College, tê-lo titulado, em 1994, 
como doutor honoris causa. O 
prestígio do mestre angoleiro 
entre os norte-americanos não se 
limitou a esse título. Em 2001, ele 
recebeu uma alta homenagem do 
governo dos Estados Unidos”64. 
De acordo com um jornal local 
de Salvador, um dos poucos veículos 
da mídia que noticiou o fato, 
Mestre João Grande “é o primeiro 
brasileiro a ser agraciado com o 
prêmio da National Heritage Fellowships 
(Comunidades do Patrimônio Nacional), 
o mais alto título concedido nos 
Estados Unidos para personalidades 
que lidam com as artes folclórica 
e nacional no País”65. Em 1994, 
foi a vez de Mestre Cobra Mansa 
chegar e se instalar em Washington, 
onde fundaria, ao lado de Mestre 
Jurandir, a Fundação Internacional 
de Capoeira Angola – Fica.
Na Europa, possivelmente, 
o primeiro a ensinar foi Mestre 
Nestor Capoeira. Depois de obter 
a graduação máxima do Grupo 
Senzala, a corda vermelha, em 
1969, decidiu viajar para o exterior. 
Em 1971, aterrissou em Londres, 
onde começou a ministrar aulas 
de capoeira numa academia de 
dança. Mestre Nestor Capoeira 
percorreu a Europa por três anos, 
ensinando em diferentes cidades, 
antes de retornar ao Brasil.
Embora os Estados Unidos e a 
Europa fossem os principais pontos 
de crescimento internacional 
da capoeira, paralelamente, a 
arte também se desenvolveu no 
Japão, no Canadá, em Israel e na 
África do Sul. Recentemente, foi 
difundida pelo Leste Europeu 
(Polônia, Estônia, Sérvia e 
Finlândia), América Latina 
(México e Venezuela) e África 
(Angola e Moçambique). 
Atualmente, a capoeira se 
encontra presente em mais de 
150 países, atraindo praticantes e 
estudiosos dos cinco continentes 
do planeta. A sua globalização, 
feita sem incentivo governamental, 
ocorreu devido às errâncias 
dos capoeiristas, verdadeiros 
embaixadores informais da 
cultura brasileira. Assim, este se 
torna um momento oportuno 
para que o Estado brasileiro 
reconheça a capoeira como 
Patrimônio Cultural do Brasil. ¢
64Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
65Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
MESTRE PASTINHA PRATICANDO 
CAPOEIRA.
FOTO: PIERRE VERGER@FUNDAÇÃO 
PIERRE VERGER.
À DIREITA
ESTANDARTE BRABOS E VALENTÕES.
FOTO: FRANCISCO MOREIRA 
DA COSTA.
A capoeira vem se mantendo até os nossos dias graças, 
sobretudo, à transmissão dos 
ensinamentos do mestre para o 
aluno, de geração para geração, 
por meio de suas práticas e 
rituais. Nessas transmissões, 
destaca-se a importância do 
aprendizado da capoeira, já 
que é por meio de práticas de 
iniciação e desenvolvimento 
que esta cultura tem se mantido 
viva. É possível afirmar também 
que, durante sua longa história, 
a capoeira vem se modificando, 
incorporando e abandonando 
algumas dessas tradições de 
aprendizado e transmissão. 
O aprendizado na capoeira 
se divide em três momentos 
históricos, que caracterizam 
fases marcantes e distintas. A 
primeira destaca as formas de 
aprendizado existentes no período 
em que a capoeira foi amplamente 
criminalizada, do ano de 1890 
até o início de seu processo de 
descriminalização, em 1937. 
Posteriormente, alcança o período 
conhecido como “escolarização da 
capoeira”, em que são formadas 
as primeiras academias oficiais e 
institucionalizadas, destacando-
se principalmente as vertentes 
da Capoeira Regional, de Mestre 
Bimba, e da Capoeira Angola, 
codificada por Mestre Pastinha. 
Por último, recorta o período que 
vai da década de 1980 até os nossos 
dias, ou fase contemporânea da 
capoeira, em que podemos observar 
o crescimento e a difusão da 
capoeira baiana (Regional e Angola) 
por todo o Brasil e o mundo, numa 
proliferação de grupos e vertentes.Desde o período colonial 
brasileiro, a capoeira foi 
considerada uma prática 
marginal e os seus participantes 
apresentados como delinquentes 
que a sociedade devia vigiar, 
controlar e punir. Como não havia 
academia organizada, a reunião 
dos capoeiras se dava em torno dos 
acontecimentos festivos ou nos 
ambientes de trabalho, durante as 
horas de descanso, assim como nas 
ruas, em botequins e quitandas. 
Essa característica informal 
e não profissionalizante dos 
capoeiras em tal época vai marcar 
profundamente o modo como as 
O Aprendizado e as 
Escolas de Capoeira 
66Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
práticas de aprendizado foram 
concebidas. Perseguidos pela 
sociedade oficial e legal, sua 
organização era móvel e dinâmica, 
dissimulada e malandra.
A capoeira era aprendida 
e desenvolvida no dia a dia 
de trabalho, festas e disputas. 
Carregando seus instrumentos 
e suas armas, caso fosse preciso 
usá-las, os capoeiras se dirigiam 
para a rua, onde praticavam 
sua arte e desenvolviam suas 
habilidades. Como não havia um 
lugar específico para o treino e 
o jogo da capoeira, o ensino e a 
transmissão das tradições desta 
arte giravam em torno de espaços 
abertos e públicos. Um lugar 
especial de treino, registrado por 
fotógrafos como Pierre Verger e 
Marcel Gautherot, é a praia, marca 
das cidades portuárias onde a 
capoeira se desenvolveu, território 
por excelência da vadiação.
Consideradas ilegais e 
principalmente imorais, tais 
relações de ensino e aprendizagem 
se davam num ambiente de enorme 
cumplicidade e dissimulação. 
A capoeira vivia uma relação 
ambígua com o espaço, sendo 
por um lado pública e por outro 
lado dissimulada, com rigorosas 
estratégias de acobertamento. É 
nesse cenário que os aprendizes 
da capoeira deveriam se inserir 
para conhecimento da arte. 
Uma primeira e importante 
característica dessa forma de 
aprendizagem é a relação entre 
o mestre e o aluno. Como não 
havia espaços institucionais 
específicos para o treino e o 
cultivo da capoeira, o aprendiz 
deveria se vincular diretamente 
aos mestres e praticantes. Seu 
engajamento na capoeira teria 
que ser pleno, aproveitando 
À DIREITA
FOTO: MARCEL GAUTHEROT.
PÁGINA À DIREITA
FOTO: MARCEL GAUTHEROT.
67Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
sempre as oportunidades para 
extrair certo conhecimento dos 
mestres. Aprendia-se nos terreiros 
abertos, em frente às quitandas, 
aos botequins e festas, e até mesmo 
no quintal das residências. Sobre 
isso, afirmou Waldeloir Rego: 
“Não havia academias de 
capoeira, nem ambiente fechado, 
premeditadamente preparado para 
se jogar capoeira. Antigamente, 
havia capoeira onde havia uma 
quitanda ou uma venda de cachaça, 
com um largo bem em frente, 
propício ao jogo. Aí, aos domingos, 
feriados e dias de santos, ou após 
o trabalho se reuniam os capoeiras 
mais famosos, a tagarelarem, 
beberem e jogarem capoeira”66. 
Outra característica muito 
importante dessa forma singular 
de aprendizado é a inexistência, 
por parte dos mestres, de uma 
metodologia ou pedagogia 
68Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
específica para a transmissão de 
sua arte. Pode-se dizer que o 
mestre não privilegiava uma técnica 
de ensino formal. Além disso, 
seu objetivo era vadiar e jogar, 
não especificamente ensinar. O 
foco não era o aprendizado ou 
a transmissão. O mestre não era 
um professor no sentido estrito 
da palavra. Ele só ensinava se o 
aprendiz se mantivesse atento, 
observando e arriscando-se a 
realizar os principais movimentos. 
De algum modo, o aprendizado 
ficava a cargo do aprendiz, que, 
engajado na capoeira, inseria-
se a partir da observação e da 
vivência de suas rotinas. 
O aprendizado da capoeira se 
produzia por “oitiva”, ou seja, sem 
método ou pedagogia formalizada. 
Pela vivência do jogo, por sua 
observação, o mestre introduzia 
os jovens interessados no universo 
da capoeira. Conforme explicou 
Frede Abreu, “era na roda, sem 
a interrupção de seu curso, que 
se dava a iniciação, com o mestre 
pegando nas mãos do aluno 
para dar um volta com ele”67. 
O aprendiz convivia desde o 
início com as situações próprias 
do jogo, por meio de exemplos 
concretos e reais da prática da 
capoeira. O lugar por excelência 
do aprendizado era a experiência 
concreta e encarnada das rodas de 
rua, onde o aprendiz tinha que 
encontrar um lugar na tradição. 
Outra característica importante era 
a relação dos jogadores iniciados 
com os recém-chegados à roda. 
Os mais experientes não tratavam 
o jogador como principiante, 
do qual exigiam postura de um 
capoeira. É na roda que se aprende 
e, entrando nela, o aprendiz não 
tinha facilidades, não lhe era dado 
o privilégio de ser principiante. 
Diante de tremendas exigências, 
o aprendiz teria que estar sempre 
atento e se virar de algum modo 
com os golpes que lhe chegavam. 
Mestre Waldemar, importante 
capoeirista da Bahia, descreveu 
assim o seu encontro e aprendizado 
em 1936, em Periperi, subúrbio 
ferroviário de Salvador: 
“Eles [os mestres] vinham para 
Periperi, aquela roda danada. Foi 
quando eu peguei a aprender com 
LIÇÃO PARTICULAR DE 
CAPOEIRA – AULA.
FOTO: CRISTIANO JUNIOR.
69Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
eles. Eu era rapazinho. Comprava 
duzentos reis de vinho tinto, aquele 
copo branco de alça, ele tomava 
e dizia: ‘pegue na boca de minha 
calça!’. Eu levava pra pegar na boca 
da calça dele e ele virava aquela 
cambalhota desgraçada e já cobria 
[com] o rabo de arraia. Quando eu 
ia levantando ele dizia: ‘não levante 
não, lá vai outro!’. Os alunos deles 
jogavam com a gente como que 
[se] a gente já era [fosse] bom”68. 
Neste jogo, não há lugar para 
atitudes de principiantes: ao entrar 
na roda, o aprendiz é tratado como 
capoeirista, jogando como se já 
soubesse jogar. O que significa 
que, para os mestres tradicionais, 
a postura do discípulo não pode 
ser passiva, pois só a partir da 
prática, com as rasteiras e os golpes, 
pode aprender a se esquivar, 
experimentando concretamente os 
movimentos, suas falhas e acertos.
Outra característica importante 
era que nenhum mestre desse 
período vivia do ensino da capoeira, 
o que facilitava uma relação de 
proximidade com seu mestre. 
Muitas vezes, essa proximidade 
era tão grande que o aprendiz 
acabava frequentando os espaços 
familiares e até aprendendo as 
profissões dos mestres. Sobre essas 
situações reais e concretas do dia 
a dia, vivenciadas pelos aprendizes 
da capoeira antiga, escreveu Abib: 
“Às vezes, esse aprendizado se 
dava também individualmente, nos 
quintais e nos terreiros das casas, 
onde a proximidade entre o mestre 
e o aprendiz era um fator essencial. 
Muitas vezes, como lembra o mestre 
Moraes – coordenador do Grupo 
de Capoeira Angola Pelourinho, 
em Salvador – em seu depoimento, 
o aprendiz de capoeira era também 
aprendiz de ofício do seu mestre 
de capoeira, que podia ser um 
marceneiro, um sapateiro ou 
um artesão, profissões comuns 
entre os mestres de capoeira de 
antigamente. Moravam no mesmo 
bairro e tinham, geralmente, a 
mesma situação econômica, pois 
eram oriundos da mesma classe 
social. A convivência entre mestre 
e aprendiz era então um fator 
que auxiliava muito o processo de 
aprendizagem da capoeira”69. 
A capoeira, como é 
ensinada nesse momento de 
sua história, prioriza desde 
o início um aprendizado em 
que o aluno se vira para, “de 
oitiva”, ouvindo, observando 
e vivenciando, desenvolver nas 
situações reais o seu jogo – uma 
técnica bem diferente das práticas 
formais de aprendizagem, 
nas quais o vínculo do aluno 
e do professor é estritamente 
ligado às habilidades que serão 
70Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
desenvolvidas, com exercícios 
repetidos exaustivamente de 
modo serial e descontextualizado, 
para somente no futuro serem 
realizados em seu conjunto. 
Os aprendizes da capoeira 
recebiam instruçõese dicas dos 
seus mestres, mas essas instruções 
não se reduziam a regras gerais, 
modelos ou código de condutas. 
Durante as rodas ou nas conversas 
do cotidiano, os mestres instruíam 
os aprendizes, mas era a experiência 
do aluno que guiava as instruções 
do mestre, e não o contrário. Na 
tradição, o conhecimento não 
é um patrimônio formal, mas 
algo que auxilia na resolução de 
problemas concretos do dia a dia. 
Se a relação com o mestre 
é direta, o ensino não é 
responsabilidade direta do mestre. 
O mestre não ensina diretamente, 
ele apenas ajuda a criar as condições 
propícias para que o aprendiz 
experimente jogar, cantar, tocar 
e vadiar. Nessa forma de prática, 
o aprendiz, de algum modo, é o 
responsável direto pelo processo 
de aprendizado. Suas motivações 
e seu engajamento nas rodas e 
nos grupos de capoeiragem são 
o que o tornam um capoeira. 
Era no ambiente ao mesmo 
tempo perigoso e festivo que 
os mestres antigos da capoeira 
ensinavam e transmitiam o 
conhecimento, sem escolas formais, 
grupos com estatutos, uniformes 
e métodos específicos. A vadiação 
da capoeira reinava sem muita 
visibilidade institucional, nas 
bordas da ilegalidade. Aprender 
capoeira estava, de alguma maneira, 
vinculado a práticas diversas e 
múltiplas que criativamente se 
dissimulavam, para sobreviver 
numa sociedade que, além de não 
as reconhecer, as criminalizava. ¢ 
À DIREITA
FOTO: MARCEL GAUTHEROT.
PÁGINA À DIREITA
FOTO: MARCEL GAUTHEROT.
71Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Após anos de criminalização e marginalidade, a capoeira – 
principalmente a partir da década 
de 1920 – vai aos poucos sendo 
absorvida pela sociedade formal 
brasileira. Tal absorção permitiu 
que experimentasse inúmeras 
transformações. Dessas, interessa 
descrever o surgimento das 
primeiras escolas ou academias de 
ensino e aprendizagem de capoeira. 
O primeiro mestre a abrir uma 
escola de capoeira foi Mestre Bimba 
(Manuel dos Reis Machado), em 
1932, na cidade de Salvador, Bahia, 
no Engenho Velho de Brotas. Por 
volta de 1937, consegue o primeiro 
registro oficial do governo para sua 
academia. A Secretaria da Educação, 
Saúde e Assistência Pública registra 
sua academia como uma escola de 
educação física, com o nome de 
Centro de Cultura Física e Capoeira 
Regional, destacando o papel 
desportivo e marcial da arte. 
Mestre Bimba nasceu em 23 de 
novembro de 1899, no bairro do 
Engenho Velho, freguesia de Brotas, 
em Salvador. Seu pai era praticante 
do batuque, antiga tradição de 
disputa e luta em que dois jogadores, 
reunidos numa roda, disputam 
um combate à base de pernadas e 
rasteiras. Um deles unia firmemente 
as duas pernas, permanecendo 
imóvel. O outro buscava, com golpes, 
desequilibrar o oponente, que se 
esforçava para se manter no lugar sem 
cair ou se deslocar da base. Tudo isso 
acompanhado de cantigas marcadas 
por palmas, tambor e pandeiro. 
Aos 12 anos de idade, Mestre 
Bimba é iniciado na capoeiragem 
pelo africano Bentinho, capitão 
da Companhia de Navegação 
Baiana. Começa, portanto, seu 
aprendizado da arte da capoeiragem 
do “modo antigo”, nas rodas das 
festas e feiras populares; jogando, 
nas horas vagas de seu trabalho, 
como estivador no Cais do Porto, 
na rua onde executava pequenos 
serviços. Frequentando, enfim, 
os espaços públicos de Salvador. 
É justamente com essa tradição 
que Mestre Bimba buscará uma 
ruptura, inventando a Capoeira 
Regional baiana. Segundo ele, a 
capoeira deveria se transformar 
para se inserir na sociedade. 
Tais transformações teriam 
de abandonar toda e qualquer 
Da rua para 
a academia. O 
nascimento 
das primeiras 
escolas de 
capoeira
72Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
vinculação da capoeira com a vida 
malandra, enfatizando os seus 
aspectos desportivos e marciais. 
Mestre Bimba tenta, portanto, 
transformar a capoeira numa 
ginástica genuinamente nacional. 
A Capoeira Regional nasce 
tentando buscar um rompimento 
com a imagem do capoeira vadio e 
desordeiro, em nome do capoeira 
esportista saudável e disciplinado. 
A construção de uma academia, 
reconhecida oficialmente pelo 
Estado, em que a prática e o treino 
da capoeira são realizados, foi 
a forma encontrada por Mestre 
Bimba para levar essa tradição para 
além dos bairros populares. Assim, 
a capoeira regional começa a atrair 
o interesse cada vez maior de um 
público diversificado, de diferentes 
camadas sociais, com destaque 
para estudantes universitários. 
Esse movimento de Mestre 
Bimba vai, de certo modo, ao 
encontro do projeto de construção 
de uma identidade brasileira que 
desembocará no Estado Novo. 
Movimentos semelhantes ocorrem 
com o samba e o candomblé. Tal 
confluência de interesses políticos 
é aproveitada por Mestre Bimba e 
sua nascente Capoeira Regional. 
Outra marca empreendida 
por Mestre Bimba é a necessidade 
de afirmar o caráter marcial da 
capoeira. Mestre Bimba realiza 
uma análise pessimista em relação 
aos caminhos que a capoeira 
tradicional vinha percorrendo, 
em que os contornos alegóricos 
e exibicionistas são por ele 
questionados. A seu ver, os 
aspectos marciais da capoeira 
estariam cedendo espaço para 
um jogo cada vez mais lúdico 
e alegórico. Nesse sentido, a 
Capoeira Regional dará destaque 
à eficiência do combate marcial, 
misturando movimentos da 
capoeira antiga, conhecida como 
Capoeira Angola, com o batuque 
e, principalmente, incorporando 
movimentos de ataque e de defesa 
de outras artes marciais, como 
o jiu-jítsu. Modificações que 
promoveram a Capoeira Regional 
como uma singular e eficiente 
arte marcial de origem brasileira. 
Com o intuito de propagar a 
eficiência da Capoeira Regional 
como combate, Mestre Bimba e 
alguns de seus principais alunos 
começam a participar de torneios 
e lutas, enfrentando oponentes de 
diversas modalidades marciais. A 
violência da capoeira, que antes 
era exercida nas ruas, muitas vezes 
em combates com a polícia, passa 
agora a ser realizada num ringue, 
com regras e juízes credenciados. 
O resultado dessas disputas, 
muitas vezes favoráveis à Capoeira 
Regional, chega aos principais 
jornais da época. No entanto, vale 
73Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
À ESQUERDA
GINGA – PASSO BÁSICO DA 
CAPOEIRA- DESENHOS DE MESTRE 
BIMBA UTILIZADOS NO CURSO DE 
CAPOEIRA REGIONAL.
ILUSTRAÇÃO DE MESTRE BIMBA.
ABAIXO
DESENHOS PARA MATERIAL DO 
CURSO DE CAPOEIRA REGIONAL DE 
MESTRE BIMBA.
IMAGEM ESCANEADA - ACERVO 
TÉCNICO DO IPHAN.
lembrar que muitos angoleiros 
também buscaram o ringue como 
forma de afirmação da sua arte.
Mestre Bimba e sua capoeira 
passam a ser reconhecidos e sua 
academia procurada cada vez 
mais por jovens interessados em 
aprender esse esporte marcial 
nacional. Deixando de lado o 
sentido lúdico, malandro e vadio, 
a Capoeira Regional se desenvolve 
como uma prática desportiva e 
sistemática de luta. Ainda assim, 
nos anos posteriores, ocorre seu 
afastamento dos ringues de luta. 
Mestre Bimba começa a restringir 
os embates dos capoeiras às rodas. 
Não interessava mais desafiar 
e ser desafiado em lutas com 
outras modalidades, mas afirmar 
a particularidade da capoeira 
como uma luta esportiva, cujas 
regras deveriam ser respeitadas. 
Tal posicionamento ainda 
mantém intacto o valor marcial 
de defesa e ataque da capoeira, 
mas enfatiza a necessidade de 
treinar e de jogar apenas com os 
próprios capoeiristas, segundo os 
critérios e regras da capoeira. Sua 
escola se desenvolve e, no final da 
década de 1940, as relações sociais 
de Mestre Bimba encontram-
se ampliadas, liderando assim o 
movimento de escolarização da 
capoeira na Bahia. Sobre esse 
movimento de retirada da prática 
da capoeira das ruas e espaços 
públicos para os espaços privados 
das academias, nos fala Pires:
“A roça do lobo era um fundo 
de quintal, um terreiro. Esse local 
aparece nos primeiros movimentos 
de retirada da capoeira das ruas 
para levá-la até o que é hoje,em sua forma de organização de 
base: as academias, instituições 
socioculturais, enquadradas em 
uma demanda comercial. Bimba 
fundou a roça do lobo nos anos 
40, e uma reportagem, que 
relaciona Bimba à cultura negra, 
escrita por Ramagem Badaró, 
em 1944, nos dá uma visão 
desse local de treinamento”.70
Por meio da Capoeira 
Regional, Mestre Bimba põe 
em execução uma padronização 
e institucionalização da prática 
da capoeira, com a criação de 
estatutos, manuais de técnicas 
74Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
de aprendizagem, descrição 
objetiva dos golpes, toques e 
cantos, utilização de uniformes 
e indumentárias especiais, 
entre outras coisas. No que 
diz respeito ao aprendizado da 
Capoeira Regional, podemos 
perceber a inclusão, nesta 
prática, de todos os referenciais 
pedagógicos e educacionais 
de uma escola tradicional. 
O espaço de aprendizado é 
agora um ambiente fechado, uma 
academia, onde são desenvolvidas 
rotinas sistemáticas de treinos 
e de atividades voltadas para 
o aprendizado da capoeira, 
acompanhadas por um rígido 
sistema de avaliações. As rodas 
passam a ser o lugar em que 
os aprendizes podem aplicar o 
que treinaram. Nessas rotinas, 
Mestre Bimba inclui: exame de 
admissão, sequências básicas de 
ensino, sequências de cintura 
desprezada, batizado, formaturas, 
cursos de especialização e toques 
de berimbau. De certa maneira, 
Mestre Bimba contrapôs aos 
velhos jeitos de se ensinar, por 
ele denominados “oitiva”, um 
método didaticamente articulado 
de ensino da capoeira.
Mestre Xaréu, aluno de Bimba, 
explicou que o exame de admissão 
se resumia a três exercícios básicos 
– cocorinha, queda de rins e ponte 
–, cuja finalidade era verificar o 
equilíbrio, a força e flexibilidade 
do jovem aprendiz71. Mestre Bimba 
dizia que, ao contrário dos meninos 
que aprendiam capoeira na rua, 
que traziam consigo no corpo 
toda a ginga referente à prática da 
capoeira, a maioria dos seus alunos 
desconhecia completamente esses 
movimentos. Sendo assim, seria 
necessário um exame adicional para 
verificar aspectos básicos do corpo 
dos recém-chegados à academia. 
As sequências que inventou foram 
o primeiro método de ensino 
da capoeira. Trata-se de uma 
série de movimentos de ataque, 
defesa e contra-ataque que podia 
ser ministrada para iniciantes 
numa forma simplificada. 
A repetição levaria o aprendiz 
a realizar determinadas sequências 
mínimas necessárias para um 
jogo. Mestre Bimba acreditava 
que a prática desses exercícios 
com afinco e regularidade levaria 
o aluno, no final de mais ou 
menos um mês, a estar apto a jogar 
capoeira com relativa eficiência e 
segurança. É claro que esse recém-
praticante não estaria totalmente 
pronto, mas a técnica permitiria 
que ele pudesse se iniciar nas 
rodas. Na “sequência de cintura 
desprezada”, utilizava balões e 
um conjunto de movimentos 
ligados, também conhecidos como 
projeções, em que o capoeirista 
75Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
EXTREMA ESQUERDA
EMBLEMA – MESTRE BIMBA.
FOTO: ACERVO TÉCNICO IPHAN.
projetava os companheiros para 
o alto e estes deviam cair em pé 
ou agachados, jamais sentados. 
Seu objetivo era desenvolver 
autoconfiança, responsabilidade, 
agilidade e destreza. 
O batizado é um dos momentos 
de grande significado para o 
aluno, já que, após todos esses 
treinamentos iniciais, ele será 
apresentado ao grupo e poderá 
participar pela primeira vez de 
uma roda. Coloca-se em cada 
calouro um nome de guerra, que 
passa a ser a sua identidade no 
grupo. Para seu jogo de estreia, é 
escolhido um aluno veterano, que, 
na qualidade de padrinho, entra 
na roda para desafiar o calouro. 
No fim do jogo, o mestre, no 
centro da roda, levanta a mão do 
calouro, pronuncia seu apelido 
e o apresenta à comunidade. 
A partir desse momento, o 
aluno poderá participar das 
atividades regulares do grupo. 
Sua aprendizagem começa, na 
verdade, com o batizado.
Após todo percurso de 
desenvolvimento das habilidades 
básicas do jogo da Capoeira 
Regional, realizando com eficiência 
e plasticidade os repertórios de 
golpes, toques dos instrumentos e 
cantos, o aluno pode se formar. A 
formatura é um dia especial para o 
mestre e seus alunos. Trata-se de 
um ritual semelhante à formatura 
de qualquer escola de ensino 
formal, com direito a paraninfo, 
orador, madrinha e medalha. 
No início, Mestre Bimba 
realizava a festa de formatura 
no sítio Caruano, no nordeste 
de Amaralina, na presença de 
convidados e de toda a academia 
regional baiana. Os formandos, 
todos de branco, eram chamados 
por Mestre Bimba e, diante de 
convidados e equipes da academia, 
exibiam seus repertórios de 
movimentos, toques e cantos. Ao 
final dessa exibição, os iniciantes 
deveriam passar pela prova de 
fogo, jogando com um capoeirista 
graduado, ritual que ficou 
conhecido como “tira medalha”. 
Nesse desafio, o graduado 
tentaria, com os pés, tirar a 
medalha do peito do formando, 
que ficaria, assim, com sua roupa 
e sua dignidade manchadas. Se no 
final do jogo a medalha estivesse 
ainda no peito do formando, 
este era considerado, pela escola 
regional baiana, formado. Por 
último, eram realizadas atividades 
festivas com apresentações 
de maculelê, samba de roda, 
samba duro e candomblé.
O curso de especialização foi 
criado por Mestre Bimba para 
ser realizado secretamente com 
os seus principais alunos. Tinha 
como objetivo aprimorar golpes 
76Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
de defesa e de ataque advindos 
de adversários perigosos e bem 
treinados e era dividido em dois 
módulos. O primeiro deles, com 
duração de 60 dias, era realizado 
dentro da academia, onde Mestre 
Bimba desenvolvia estratégias de 
combate específicas e sofisticadas. 
O segundo, que também durava 
60 dias, era ministrado na 
Chapada do Rio Vermelho e 
tinha como principais atividades 
as chamadas “emboscadas”. 
Seus alunos veteranos 
eram colocados na mata com 
o objetivo de, à espreita, 
aguardar a passagem do aluno 
especialista. A meta dos alunos 
que buscavam a especialização 
era chegar a um determinado 
ponto específico, lutando com 
“soldados” que, sorrateiramente, 
os emboscavam. Ao final do curso, 
Mestre Bimba realizava uma 
festa nos moldes da formatura 
e entregava aos seus alunos de 
elite um “lenço vermelho”. 
Com interesse em inserir 
essa prática tradicional da cultura 
popular brasileira nas esferas oficiais 
da sociedade brasileira, a Capoeira 
Regional de Mestre Bimba assume 
um perfil específico de uma prática 
desportiva e marcial com elementos 
culturais e artísticos: música e 
dança. Sua capoeira era organizada 
nos moldes de uma atividade física 
e marcial, cuja escola obedecia a 
rígidas técnicas de ensino e avaliação, 
que permitiam ao aprendiz realizar, 
a partir de seus treinamentos, 
os movimentos e as habilidades 
próprios desse jogo. Treinamentos 
divididos, tal como na escola ou 
nas Forças Armadas, em etapas 
hierarquicamente bem definidas, 
nas quais determinados objetivos 
deviam ser alcançados ao final. 
Para isso, eram estabelecidos 
rigorosos exames de avaliação. 
Essa sistemática estruturação do 
ensino da capoeira leva a uma 
mudança radical no perfil dos 
jogos, dos ritos e das rodas. A 
ênfase agora é atlética, esportiva 
e marcial, predominando o 
espírito competitivo de esforços 
individuais na busca de superações. 
Essa preocupação competitiva da 
Capoeira Regional tem levado, 
muitas vezes, como veremos 
mais adiante, a uma perda de 
marcas da capoeira antiga, dos 
aspectos culturais de caráter 
mítico, de malandragem e 
vadiação. Há uma redução dessa 
tradição a seus aspectos atléticos 
e marciais, próprios das escolas 
ou academias de educação física. 
Aproveitando o caminho aberto 
por Mestre Bimba, Mestre Pastinha 
funda, em 1941, o Centro Esportivo 
de Capoeira Angola – Ceca. Nascido 
em 1889, na cidade de Salvador, 
Pastinha, segundo seus relatos, 
77Roda de Capoeira eOfício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
À ESQUERDA
MOVIMENTOS DA CAPOEIRA.
FOTO: RECORTES DE FOTO DE 
MARCEL GAUTHEROT.
ABAIXO
REPORTAGEM SOBRE MESTRE 
PASTINHA JORNAL – 13 DE 
AGOSTO DE 1975.
FOTO: ESCANEADO PARA ACERVO 
TÉCNICO DO IPHAN.
iniciou seu processo de aprendizado 
da capoeira por volta dos 10 anos. 
Seu mestre foi Benedito, um negro 
natural de Angola. Do mesmo 
modo que Bimba e tantos outros 
mestres, Pastinha aprendeu a 
capoeira “de oitiva”, frequentando 
e vadiando nas rodas da cidade 
de Salvador. Durante toda a sua 
adolescência, frequentou a Escola 
de Marinheiros, onde, segundo 
seu relato, ensinou capoeira nas 
horas vagas para colegas de arma. 
Saiu da Marinha aos 20 anos. 
Trabalhou como engraxate e 
vendeu gazetas, no garimpo e na 
construção do porto de Salvador. 
Assim como Mestre Bimba, 
Mestre Pastinha não via com bons 
olhos o momento que a capoeira 
baiana atravessava no início do 
século 20, cercada de grupos 
desordeiros e de violentos embates 
entre si e com a polícia. Práticas 
que, na sua visão, não traziam 
qualquer benefício para a ascensão 
social da capoeira. A situação 
de ilegalidade e de perseguição 
em que se encontrava impedia o 
desenvolvimento de todas as suas 
potencialidades de arte. Para ele:
“(...) a capoeira que veio 
com os africanos no tempo da 
colonização não teve maior 
desenvolvimento por razões 
óbvias. Os negros africanos, no 
Brasil colônia, eram escravos, 
e nessa condição tão desumana 
não lhes era permitido o uso de 
qualquer espécie de arma (...) 
viu-se, nessas circunstâncias, 
a capoeira, tolhida em seu 
desenvolvimento, sendo praticada 
às escondidas ou disfarçada 
cautelosamente com danças e 
músicas de sua terra natal”.72
Tal como Mestre Bimba, 
Mestre Pastinha pautará sua 
vida tentando achar caminhos 
oficiais que permitissem retirar 
a capoeira do gueto em que ela 
se encontrava. Ambos os mestres 
aprenderam capoeira na rua e 
vivenciaram todas as características 
dessa época, como problemas com 
a polícia. Insatisfeitos com esse 
estado de coisas, Mestre Bimba 
e Mestre Pastinha procurariam 
modificá-lo, cada um a seu jeito. 
Essa desilusão faz com que 
Mestre Pastinha fique mais 
78Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
ou menos 20 anos afastado da 
capoeira, entre as décadas de 
1920 e 1940. Após esse tempo, 
reencontra a capoeira de outro 
modo. Sua prática já não é 
proibida nem violentamente 
reprimida pela polícia; já existem 
centros ou academias oficiais de 
cultivo e treinamento daquela 
arte e a sociedade como um 
todo já começa a olhar para a 
capoeira e para seus integrantes 
de modo menos resistente. 
Outro centro importante de 
Capoeira Angola formado nessa 
época foi o terreiro de Mestre 
Waldemar. Situava-se na rua Pero 
Vaz, no bairro da Liberdade. Um 
barracão construído de madeira, 
com cobertura de palha, cercado 
por ripas de madeira que separavam 
os jogadores do restante da plateia. 
Nesse lugar, eram realizados treinos, 
rodas de capoeira e de candomblé 
e outros tipos de encontros 
festivos. Assim como Mestre 
Waldemar, destacam-se também 
os mestres Caiçara, Canjiquinha, 
Cobrinha Verde, entre outros 
que pertencem ao bastião da 
Capoeira Angola dessa época. 
É nesse cenário que, no início 
da década de 1940, Mestre Pastinha 
retorna, assumindo a direção do 
Ceca, em que permaneceria até a 
sua morte, em 1981. Ao longo desse 
tempo de dedicação à Capoeira 
Angola, ele ajudará, de modo 
marcante, a definir os fundamentos 
dessa prática de capoeira até os 
nossos dias. Com características 
próprias, a Capoeira Angola não 
poderia se misturar com as outras 
práticas desportivas e marciais, como 
o judô, o jiu-jítsu, a luta livre, entre 
outras. Mestre Pastinha aponta: 
“É lógico que nos referimos 
à Capoeira Angola, a legítima 
capoeira trazida pelos africanos, 
e não à mistura de capoeira com 
boxe, luta livre americana, judô, 
jiu-jítsu etc., que lhe tiram suas 
características, não passando de 
uma modalidade mista de luta ou 
defesa pessoal, onde se encontram 
golpes e contragolpes de todos os 
métodos de luta conhecidos”73. 
Mestre Pastinha buscava 
diferenciar a Capoeira Angola da 
Capoeira Regional, que se difundia 
cada vez mais. Referenciado 
pela ancestralidade africana, 
denominava a modalidade angola 
de “capoeira mãe”. Defensor 
radical de sua arte, Mestre Pastinha 
acreditava que o aluno não podia, 
de modo algum, dedicar-se a 
treinamentos atléticos e marciais 
impróprios à prática da capoeira. 
Esses movimentos, toques e cantos 
devem ser vivenciados a partir de 
todas as performances ritualísticas. 
Ciente das dificuldades em 
manter esses rituais, Mestre 
79Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Pastinha avalia ser necessário 
constituir, em seu centro de 
Capoeira Angola, regras e 
hierarquias que possam ajudar 
no aprendizado. Assim, novas 
regras são incorporadas à prática 
da capoeira e seus treinos. Na 
roda, apresenta a figura do juiz, 
ou daquele que responde pela sua 
organização, mantendo-a dentro 
dos fundamentos da capoeira. 
Na rotina diária do Centro, 
Mestre Pastinha cria funções 
específicas ocupadas por 
capoeiristas mais avançados, 
responsáveis pela orquestra, 
instrutores de movimentos – 
chamados “trenel” –, arquivistas, 
contramestres e mestres. Escolhe 
um uniforme que passará a 
identificar os seus alunos, calça 
preta e camisa amarela, em 
homenagem às cores de seu clube 
de coração: Ypiranga Futebol 
Clube. Impede seus alunos 
principais do jogo, construídas 
coletiva e socialmente. 
Busca na tradição conceitos 
centrais, como “malícia”. Ser 
angoleiro, para Pastinha, é 
usar a malícia o tempo todo, 
nos golpes, nas defesas e nos 
contragolpes. Iludir o adversário 
sempre que possível, evitando 
assim movimentos mecânicos e 
previsíveis. Dessa forma, destaca no 
aprendizado da capoeira condições 
para que cada aprendiz desenvolva 
estilos próprios de dissimulação, 
beleza, continuidade e elegância 
em seus movimentos, toques e 
cantos. Seus treinos não visam 
uma repetição dos exercícios, mas 
uma expressão de estilos próprios. 
Para Mestre Pastinha, ninguém 
joga igual a ninguém. Mesmo 
em um jogo de movimentos e de 
golpes definidos, é a expressão 
destes que marca a singularidade 
e o estilo de cada jogador. 
de jogar descalços e sem camisa. 
Proíbe alguns movimentos. 
Enfatiza o lado lúdico e artístico da 
capoeira, destacando os treinos de 
cantos e toques de instrumentos. 
Define a “bateria” ou a “orquestra” 
com três berimbaus (gunga, 
médio e viola), dois pandeiros, 
um atabaque, agogô e reco-reco. 
Destaca a importância dos toques 
e cantos na condução dos ritmos 
do jogo. Enfatiza a necessidade de 
desmistificar a capoeira como a 
arte dos valentões, mostrando que 
aquela não deveria ser exercida 
pela valentia, mas pela busca da 
integridade física e espiritual. 
Se necessário, a capoeira seria 
uma excelente arte de defesa e 
ataque, mas seus fins principais 
não podiam ser esses. Destaca 
a necessidade dos valores éticos 
e políticos da capoeira, como a 
lealdade aos companheiros e à 
capoeira, a obediência às regras 
À ESQUERDA E À 
DIREITA
FLIPLIVRO DE ARISTIDES 
E NEWDAO.
80Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Diante de todas as 
características acima mencionadas, 
podemos destacar a importância 
da ritualística na Capoeira Angola, 
elemento principal na transmissão 
do saber. Mestre Pastinha elaborou 
com minúcias os procedimentos 
de entrada e saída do jogo, a 
importância das chamadas de 
mandinga – quando os oponentes 
paralisam o jogo num desafio de 
intensa representação simbólica –, 
a relação estreita entre os toques 
e os cantos com o tipo de jogo, 
entre outras coisas. Assim é buscada 
a manutenção dos referenciais 
dos rituais afrodescendentes. 
Tratando a capoeira como um rito, 
Mestre Pastinha busca impedir a 
sua total absorção pelas práticas 
físico-desportivo-marciais. 
A capoeiraé sem dúvida uma 
atividade física, um esporte e uma 
luta, mas é também uma reza, um 
lamento, uma brincadeira, uma 
vadiação, uma dança, um canto, 
uma comunhão. Mestre Pastinha 
busca com isso aproveitar os novos 
espaços que a sociedade do seu 
tempo finalmente abriu para a 
capoeira, sem com isso aderir 
plenamente às mudanças impostas 
a ela por esses novos espaços. 
O aprendizado da Capoeira 
Angola que Mestre Pastinha ajudou 
a construir incorporou às formas 
antigas do aprendizado da capoeira 
elementos próprios das escolas 
formais, como estatuto, cartilhas de 
procedimentos, treinos e exercícios 
específicos, hierarquias e rotinas. O 
descompromisso alegre da vadiação, 
a malícia ácida da malandragem, 
a espiritualidade dos rituais 
religiosos, a beleza das danças e 
toques, a celebração e a comunhão 
de um povo não cabem em técnicas 
ou conceitos. Por isso, a escola 
de Pastinha tenta fundamentar 
sua transmissão na capoeira 
antiga, privilegiando a vivência, 
ou melhor, a convivência entre 
os capoeiras, que, “pegando pelas 
mãos os aprendizes”, nos convidam 
a desenvolver coletivamente os 
múltiplos aspectos dessa rica 
tradição. O desafio de mestre 
Pastinha talvez seja conciliar o novo 
das técnicas e os procedimentos 
das escolas formais com os ritos e 
as mandingas da antiga capoeira. 
O aprendiz tem que tomar 
para si a responsabilidade de 
sua aprendizagem. É ele quem 
deve ditar o ritmo. Para Mestre 
Pastinha, um bom aprendiz não 
é o que obedece cegamente ao 
mestre, mas aquele que busca tomar 
atitudes próprias. O capoeirista, 
para fortalecer sua academia ou 
seu grupo, deve chamar para si a 
responsabilidade, tornando-se 
mais atento, vigilante e convicto. 
Ao mestre caberia a função de 
orientá-lo nesse caminho. ¢
81Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
MESTRE MORAES, BAHIA.
FOTO: ACERVO TÉCNICO 
IPHAN.
82Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Entre as décadas de 1930 e 1980, a capoeira viveu mudanças 
que fundamentaram a capoeira 
contemporânea. As escolas de 
capoeira baiana, principalmente 
as vertentes da Regional de Mestre 
Bimba e a Angola de Mestre 
Pastinha, expandem-se, alcançando 
o Brasil e o mundo. Dessas sementes 
nascerão diversos grupos, cuja 
filiação aos dois estilos nem sempre 
será explícita, mas talvez seja 
Algumas 
trajetórias da 
capoeira nos 
dias atuais
MESTRE CURIÓ.
FOTO: EDUARDO MONTEIRO.
83Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
certo dizer que, implicitamente, 
a capoeira, tal como ela hoje se 
apresenta, deve em muito às duas 
escolas. Essa herança é percebida na 
organização em grupos e academias 
específicas para a prática da capoeira.
Podemos perfeitamente 
dizer que a capoeira antiga, 
que existia de modo informal, 
vinculada diretamente a um éthos 
muito próprio das cidades e de 
suas comunidades, praticamente 
desaparece. A rua, as quitandas 
e as festas públicas vão cedendo 
lugar para as academias e os 
espaços privados da prática da 
capoeira. O aprendiz agora 
deve se matricular numa escola 
ou num grupo de capoeira, 
frequentando regularmente 
esses espaços e respeitando suas 
regras e seus procedimentos. 
Não se aprende mais ao modo 
antigo, por “oitiva”, numa vivência 
coletiva em espaços abertos e 
PÁGINA SEGUINTE
À ESQUERDA
MESTRE BRANDÃO E JOGO DE 
DENTRO.
FOTO: EDUARDO MONTEIRO.
À DIREITA
RODA DO GRUPO DE CAPOEIRA 
ANGOLA N GOLA - 2007.
FOTO: XIM-XIM.
À DIREITA, EMBAIXO
RODA DO GRUPO DE CAPOEIRA 
ANGOLA N GOLA - 2007.
FOTO: XIM-XIM.
públicos. A rua, que era o espaço 
próprio para a vadiação, passou a 
ser ocupada, principalmente, para 
demonstrações, como propaganda 
dos grupos privados. Ainda assim, 
algumas rodas de rua permanecem 
célebres, como a Roda Livre 
de Duque de Caxias (RJ). De 
qualquer maneira, os grupos de 
capoeira ganharam contornos de 
instituições, na maioria das vezes 
informais, que se proliferam 
com nomes, uniformes e regras 
de procedimentos particulares. 
A Capoeira Angola, diante 
dos desafios de enquadrar-se aos 
novos tempos, sem perder o contato 
com as tradições, experimenta uma 
difusão mais tímida, atravessada por 
inúmeras crises. Já a Regional, com 
proposta modernizadora, alcança um 
crescimento ampliado e diversificado.
Um dos motivos mais marcantes 
do crescimento da Capoeira 
84Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Regional é a assimilação das práticas 
físicas e esportivas. Tratada como 
um genuíno esporte nacional, 
a Capoeira Regional se infiltra 
rapidamente nas escolas, no 
currículo das universidades de 
educação física, nas academias 
militares, assim como nas academias 
de musculação e ginástica.
Mestre Xaréu, num livro 
recente intitulado Capoeira na 
universidade: uma trajetória de resistência, 
Instrução de Capoeira, fundado 
em outubro de 1955), em 1980, 
publicou um inusitado trabalho 
denominado Capoeira: arte marcial 
brasileira. Essa publicação mostra a 
preocupação do autor com exames, 
corpo docente, regulamento 
de competição e súmulas. Ele 
fundamenta, também, seu projeto 
nos valores educacionais e reconhece 
ser a capoeira uma “... incomparável 
forma de educação física ...”.74
vem indicando a trajetória da 
Capoeira Regional em direção à 
escolarização. A partir de 1972, 
o “esporte” capoeira estreita 
suas relações com a formação 
dos educadores físicos. Assim:
“Mestre Carlos Senna, ex-
aluno de Mestre Bimba, um 
defensor ferrenho da capoeira 
esporte e fundador da Senavox 
(Centro de Pesquisa, Estudo e 
85Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
A perspectiva da capoeira como 
uma forma completa de educação 
física deve ser compreendida, 
segundo Mestre Xaréu, como um 
conceito ampliado de atividade 
física, contemplando os aspectos da 
capoeira. Esta passa a ser entendida 
como um esporte popular, com 
vigoroso substrato cultural, que 
suscitaria nos alunos interesses 
maiores do que aprender golpes 
e movimentos. Amplia-se assim 
A capoeira penetra de 
três modos nos programas de 
educação física: incluída nos 
métodos de ginástica tradicional; 
como conteúdo distinto de 
ginástica escolar; ou como 
disciplina esportiva de caráter 
optativo. Destacam-se assim os 
efeitos da prática da capoeira 
sobre a força, flexibilidade, 
resistência, habilidade específica 
e composição corporal.
86Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
o conceito da capoeira para 
instrumento completo de educação 
integral dos jovens estudantes. 
Sobre isso, diz Mestre Xaréu: 
“É importante frisar que o 
ensino/aprendizagem da capoeira 
não deve ser voltado apenas para 
o aspecto técnico de aprender 
determinada forma de luta e de 
esporte. O ensino de golpes, 
contragolpes, esquivas e sequências 
deverá ser acompanhado de 
transmissão de todos os elementos 
que envolvem a sua cultura, história, 
origem e evolução, ao tempo 
em que se estimulará a pesquisa, 
debate e discussão em seminários, 
para que o educando tenha 
participação efetiva no contexto 
da capoeira como um todo”.75
Esse encontro com as 
escolas formais e suas pedagogias 
centradas no conhecimento 
intelectual tem transformado o 
À DIREITA
MESTRE TONI VARGAS, GRUPO 
SENZALA, RIO DE JANEIRO.
FOTO: TT-CATALÃO.
À DIREITA, EMBAIXO
MESTRE TONI VARGAS, GRUPO 
SENZALA, RIO DE JANEIRO.
FOTO: TT-CATALÃO.
87Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
PAINEL DE MARCAS.
FOTO: ACERVO TÉCNICO 
IPHAN.
88Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
ABAIXO
RODA DE CAPOEIRA REALIZADA EM 
SEDE DE ASSOCIAÇÃO.
FOTO: EDUARDO MONTEIRO.
À DIREITA
RODA DE CAPOEIRA, ENCONTRO DA 
CAPOEIRA EM SANTA TEREZA, RIO 
DE JANEIRO, 2007.
FOTO: XIM-XIM.
ensino da capoeira numa prática 
pedagógica sistemática, em que o 
conhecimento não é construído 
num ambiente de tradição 
popular, mas nas academias dos 
mestres ou nas cadeiras formais 
dos bancos universitários.Nesse ponto, existe um conflito 
estabelecido entre o mestre sem 
formação escolar e o professor 
de educação física, considerado 
apto a substituí-lo. De um lado, 
o saber da cultura popular; de 
outro, o conhecimento formal e 
conceitual das universidades. 
Nos últimos anos, a capoeira 
ganhou o Brasil e o mundo e as 
escolas contemporâneas tiveram que 
se reorganizar a partir de princípios 
próprios e distintos. Há uma 
recuperação dos valores tradicionais 
da Capoeira Angola no que tange 
às formas de ensino e aprendizado, 
em que se pretende trazer de 
volta o método tradicional da 
89Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
“oitiva”, resistindo, a seu modo, ao 
processo de escolarização formal. 
Dessa maneira, estamos diante 
de duas tradições de ensino e 
aprendizado que atravessaram 
a história da capoeira. O 
modelo da escola tradicional, 
voltado para a sistematização, 
racionalização e competição, em 
que o importante é o resultado 
ou a eficiência do processo de 
aprendizado, e o modo inspirado 
na forma antiga de aprender, na 
qual a vadiação, a brincadeira 
e a estética tornam-se base. 
Não é justo afirmar que a 
Capoeira Angola é o patrimônio 
da forma antiga de aprender 
e a Capoeira Regional é o da 
forma escolar e formal. Podemos 
apenas constatar nelas o que 
historicamente se apresenta como 
forma hegemônica de aprender e 
ensinar. Existem grupos e grupos 
de Capoeira Angola e Regional. 
Se olharmos bem de perto para 
cada um deles, poderemos 
perfeitamente encontrar, no 
aprendizado do dia a dia, marcas 
dessas duas tendências, com uma 
predominância do modo escolar 
e formal. A história e a tradição 
da capoeira e de suas formas de 
aprendizado ainda continuam 
abertas, num jogo incompleto, 
sem vencedor ou vencido. ¢
90Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
91Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
À ESQUERDA
RODA DE CAPOEIRA DE 
DOMINGO EM BAIRRO 
– JOGO DE DENTRO, 
TESOURA.
FOTO: PIERRE VERGER@
FUNDAÇÃO PIERRE 
VERGER.
Etnograia e 
performance
Apesar do advento das escolas de capoeira, as rodas permanecem 
como espaços não apenas do jogo, 
mas também do aprendizado. 
Afinal, quando se joga também 
se aprende e, além disso, 
alguns mestres ainda mantêm 
o antigo hábito de passar lições 
durante o ritual. No entanto, 
é difícil precisar o período em 
que as rodas se converteram 
em marca da capoeira. 
Estas se tornaram característica 
da capoeira a partir da Bahia. 
Enquanto no Rio de Janeiro 
as maltas eram duramente 
perseguidas, principalmente com a 
criminalização de 1890, na capital 
baiana a prática era mais tolerada, 
o que pode ter contribuído para 
o desenvolvimento das rodas 
como uma expressão ritual que 
combina música, luta, dança e 
engendra uma série de significados 
simbólicos e mítico-religiosos.
Na Bahia, as rodas se 
tornaram famosas como espaços 
de “vadiação”, brincadeira e 
lazer. Aconteciam próximas a 
biroscas e botequins, regadas a 
cachaça, muitas vezes distribuída 
pelo próprio dono do 
estabelecimento, como espécie 
de contrapartida ao fato de o 
jogo atrair público e fregueses.
As rodas também faziam 
parte das festas religiosas de 
largo, porque os capoeiristas, 
em sua maioria, frequentavam 
candomblés e igrejas, eram 
devotos de santos e orixás. 
Esta relação estreita pode 
ser uma das explicações para 
o oferecimento de comida 
durante as rodas de capoeira 
festivas, aquelas que comemoram 
determinada data ou evento. 
As celebrações realizadas pelas 
escolas, por grupos e academias 
vão desde a comemoração pela 
passagem de aniversário dos 
mestres responsáveis por essas 
instituições a rodas em memória 
daqueles que já partiram e 
deixaram um legado no meio 
social. Outras celebrações se 
realizam em datas comemorativas, 
eventos que são a síntese de 
todo o processo que ocorre na 
formação, na organização, nas 
aulas e nos princípios aprendidos. 
Como explica o Mestre Curió: 
Descrição das 
Rodas de Capoeira 
92Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
“Tenho alunos em diversos 
países com grupos estruturados, 
onde anualmente viajo para dar 
uma assistência mais de perto. 
Todos os anos fazemos o Evento 
da Escola, que é um momento 
de encontro e de discussões com 
temas de interesse não só para a 
Capoeira Angola, mas também 
para a comunidade negra. Nesse 
Evento, oferecemos um grande 
Caruru para os presentes, 
homenageamos os alunos mais 
destacados, efetuamos a tradicional 
troca das carteiras; e realizamos 
o ritual do apelido com os alunos 
mais novos. Este é o momento de 
reencontro com mestres de outras 
escolas, alunos de outros países, 
amigos e familiares, é o momento 
mais importante da Escola”.76
O tradicional caruru oferecido 
por Mestre Curió, ao contrário 
do calendário, cujo dia reservado 
para os santos é 27 de setembro, 
realiza-se no dia 26 de janeiro, 
aniversário de sua academia: 
Escola de Capoeira Angola Irmãos 
Gêmeos de Mestre Curió. O 
motivo da devoção é o fato de 
ter irmão e dois filhos gêmeos.
O caruru, conforme 
conhecemos hoje em dia, é um 
prato feito à base de quiabos 
cortados em rodelas, camarão 
seco, castanha ou amendoim e 
azeite de dendê. É preparado e 
servido em ocasiões especiais, 
como na Festa de Santa 
Bárbara, em Salvador, em que 
é chamado de Caruru de Santa 
Bárbara, ou por ocasião do dia 
de Cosme e Damião, em que 
recebe o nome de Caruru das 
Crianças, ou Caruru dos Erês.
Em dezembro, por ocasião 
da Festa de Santa Bárbara, o 
caruru é servido nas ruas de 
Salvador. O Caruru de Santa 
93Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Bárbara também é oferecido a 
Iansã, que é uma das três esposas 
de Xangô e que, segundo o 
lendário, alimenta-se também 
da comida predileta do marido.
Apesar de fora da data 
usual, o caruru de Mestre Curió 
segue o modo como os baianos 
homenageiam todos os anos, 
em setembro, São Cosme e São 
Damião. O trabalho começa 
cedo, pois tudo precisa ser 
feito no dia: caruru, xinxim de 
galinha, vatapá, arroz, feijão 
fradinho, feijão preto, farofa, 
acarajé, abará, banana-da-
terra frita e os roletes de cana. 
Depois, o caruru é servido a sete 
crianças, que comem juntas, 
com as mãos, numa grande 
bacia ou num tacho. Os sete 
meninos correspondem aos sete 
irmãos: Cosme, Damião, Doú, 
Alabá, Crispim, Crispiniano 
e Talabi. Só após a refeição 
das crianças, chega a vez dos 
convidados participarem da festa.
Na família do Mestre Curió, 
a tradição do caruru vem dos 
antepassados. Além da vontade 
de prosseguir com a tradição 
familiar, Mestre Curió decidiu 
“tomar essa responsabilidade” 
pela impressionante coincidência 
na sua vida, o fato de ter um 
irmão e dois filhos gêmeos. 
O caruru, que ele oferece em 
janeiro, mês do seu aniversário 
e do seu grupo de capoeira, 
acontece na sua academia para os 
sete meninos, alunos e convidados 
e, depois, em sua própria casa.
Enquanto a Capoeira 
Angola manteve uma ritualística 
semirreligiosa, a Capoeira 
Regional buscou uma forma 
mais laica. Curiosamente, 
Mestre Bimba denominou de 
batizado o rito de passagem 
em que seus alunos deixavam 
À ESQUERDA
MESTRE CURIÓ E MESTRE 
MARTINHO, 2007.
FOTO: EDUARDO MONTEIRO.
À DIREITA
MESTRE CURIÓ.
FOTO: VANDERLEI CATALÃO – 
ACERVO TÉCNICO IPHAN.
94Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
RODA DE CAPOEIRA, ENCONTRO DA 
CAPOEIRA EM SANTA TEREZA, RIO 
DE JANEIRO, 2007.
FOTO: XIM-XIM.
de ser iniciantes para serem 
iniciados. Além da referência à 
cerimônia religiosa cristã, nas suas 
rodas, costumava contar com a 
participação de sua esposa, Dona 
Alice, que era mãe de santo.
Portanto, Mestre Bimba 
também mantinha ligações com 
o universo religioso na prática 
da capoeira, o que foi deixado de 
lado pelas gerações posteriores 
que modernizaram sua Capoeira 
Regional. Embora mantivessem 
o batizado, transformaram-no 
em uma demonstração esportiva 
em queocorre a mudança das 
graduações simbolizada nas 
trocas de cordel, hierarquização 
inspirada nas faixas das 
artes marciais orientais.
No entanto, mesmo as 
vertentes de capoeira que não 
privilegiam o aspecto religioso 
mantêm o hábito de servir comida 
aos convidados nas ocasiões de 
festa, o que, durante a pesquisa 
de campo, pôde ser observado 
em momentos distintos. Num 
batizado do Grupo Senzala, 
na Barra da Tijuca, no Rio 
de Janeiro, foi constatado o 
oferecimento de frutas aos 
presentes. Da mesma forma, na 
roda de rua de Duque de Caxias, 
na Baixada Fluminense, são 
comuns os churrascos que animam 
os momentos de comemoração.
A roda de capoeira, onde quer 
que aconteça, continua atraindo 
rapidamente as pessoas que passam 
e param para observar, se divertir, 
ficar em suspense, devido ao jogo 
de corpo entre duas pessoas, 
regido por instrumentos musicais 
de percussão e cânticos. ¢
O acervo gestual da capoeira tem características próprias que 
variam de acordo com a vertente 
do jogador, que por sua vez possui 
uma expressão própria e individual, 
manifestada na roda. Neste lugar, 
os capoeiristas colocam em prática 
os golpes e os movimentos que 
aprenderam nos treinos.
Com certeza, a movimentação 
da capoeira se modificou ao longo 
dos séculos, o que torna difícil 
Os movimentos 
e os GOlpes
95Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
comparar o jogo primitivo com 
o contemporâneo. Por meio 
dos registros históricos e de 
crônicas, no entanto, é possível 
identificar alguns movimentos 
que permaneceram no decorrer 
do tempo, como a cabeçada, a 
rasteira e o rabo de arraia.
Um movimento que faz parte 
de todas as vertentes de capoeira é a 
ginga, homenagem dos capoeiristas 
à Rainha Nzinga, de Angola, 
guerreira temida por seus inimigos 
e conhecida por sua habilidade 
nas negociações com portugueses 
e africanos. Ora tendia para um 
lado, ora para outro, negociando 
com malícia no jogo com seus 
adversários, mas muitas vezes também 
agindo de forma violenta contra 
eles77. A sua presença na memória 
dos africanos escravizados é uma 
das hipóteses para a denominação 
do gesto primordial da capoeira.
Embora não seja um golpe, a 
ginga é o principal movimento da 
capoeira, o primeiro que um aluno 
aprende, dentro ou fora da roda. 
Consiste num bailado invertido, 
quando a mão direita está à frente, 
o pé esquerdo se encontra atrás do 
corpo, e vice-versa. É a partir da 
ginga que surgem os deslocamentos 
e golpes. Uma das principais 
formas de o capoeirista se deslocar 
durante o jogo é o “aú”, através 
96Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
do qual o jogador se movimenta 
de um lado para o outro usando 
apenas os braços. Uma outra 
maneira própria de o capoeirista 
se movimentar é com ajuda da 
bananeira, quando troca “os pés 
pelas mãos”, ficando de cabeça para 
baixo, sustentado pelos braços e 
com as pernas tremulando no ar. 
Vale lembrar que a nomenclatura 
dos golpes costuma variar de 
acordo com o tempo histórico, 
regiões e vertentes. A bananeira, 
para alguns, por exemplo, é 
chamada de “parada de mão”.
Tanto a Capoeira Angola 
como a Regional utilizam esses 
movimentos, mas de maneiras 
distintas. É comum associar à 
primeira uma movimentação mais 
lenta e próxima do chão, enquanto 
a segunda se caracterizaria por 
movimentos jogados em pé e mais 
velozes. Apesar de, em certa medida, 
isso ocorrer, a velocidade e a altura 
do salto dado pelo capoeirista 
dependem de sua condição 
individual, independentemente de 
estilo. Uma peculiaridade do jogo 
de Capoeira Angola, no entanto, 
é a “chamada”, momento em que 
um dos jogadores deixa de dar 
continuidade à brincadeira e para 
em posições diversas, chamando 
o outro para tocar as suas mãos. 
Quando isto acontece, dão alguns 
passos, como numa dança, para 
depois retornar à brincadeira. 
Ainda que seja de difícil 
explicação, a “chamada de Angola” 
é um artifício usado para muitos 
fins, como por exemplo quando o 
capoeirista quer armar uma cilada 
para o outro, podendo inclusive não 
fazer nada, apenas dar três passos 
para um lado e três para o outro. 
Mestre Bimba, por sua vez, tornou 
característicos da sua Capoeira 
Regional os chamados “balões”, 
como o que denominou de “cintura 
97Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
SEQUÊNCIA DE MOVIMENTOS 
DE CAPOEIRA.
FOTO: PIERRE VERGER@
FUNDAÇÃO PIERRE VERGER.
desprezada”. Assunção explica 
melhor como eles aconteciam:
“Os movimentos acrobáticos 
usando a ‘cintura desprezada’ 
constituíram a principal inovação 
da Capoeira Regional. Através dela, 
o capoeirista era capaz de reagir 
contra tentativas de agarrá-lo, 
exatamente o que praticantes da 
maioria das outras tradições de lutas 
de agarrar iriam fazer num combate 
de estilo livre. Estes movimentos 
(a maioria deles chamados de 
“balões”) consistiam em projeções 
de um capoeirista, que tinha que 
se lançar e cair sobre seus pés o 
mais suave possível, escapando de 
forma acrobática de uma situação 
em que sua cabeça havia sido 
colocada sob os braços do outro. 
Os balões logo se tornaram um 
dos mais polêmicos movimentos 
de Bimba, pois na capoeira 
tradicional não havia agarramento. 
As performances acrobáticas dos 
balões se transformaram num 
símbolo da beleza da Regional ou, 
de acordo com outras observações 
da época, uma ‘adulteração’ 
da “genuína capoeira”78.
A crítica à “adulteração” da 
“genuína capoeira” mostra que 
muitas vezes os mantenedores 
da modalidade tradicional não 
assumem os movimentos como 
inventados e recriados. Assim como 
na Capoeira Regional, mestres 
de Capoeira Angola recriaram a 
movimentação, incluindo novos 
golpes, excluindo outros, o 
que relaciona a capoeira a uma 
memória corporal que se mantém 
no presente devido a uma constante 
seleção de imagens gestuais. 
Um exemplo disso é a invenção 
da vertente modernizadora 
da Capoeira Regional que 
introduziu saltos de ginástica 
olímpica nas rodas de capoeira.
98Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Toda roda de capoeira se inicia com uma canção. Na Capoeira 
Angola, o ritual é aberto com um 
cântico em forma de lamento, 
chamado ladainha. Um grito 
gutural, “iê”, é emitido pelo 
cantador, antes de se iniciar 
o canto, instaurando silêncio 
na roda. A ladainha é entoada, 
normalmente, pelo capoeirista/
mestre que toca o berimbau 
principal, de som grave, chamado 
berra-boi ou gunga. 
Quando se inicia a ladainha, 
os capoeiristas que vão jogar 
permanecem “agachados” ao 
pé do berimbau, à espera do 
momento para jogar, envoltos 
em um silêncio religioso que 
apenas se rompe com o canto 
sofrido, louvando a memória dos 
mestres antigos, saudando Deus 
e santos católicos, orixás, figuras 
lendárias, ou ainda os casos de 
perseguição aos capoeiristas:
Tava em casa
Sem pensar nem imaginar
Delegado no momento 
Já mandou foi me intimar
É verdade meu colega
Com toda diplomacia
Prenderam o capoeira
Dentro da delegacia
Para dar depoimento
Daquilo que não 
sabia, camaradinho...
A ladainha não é o único 
cântico da roda. A maior parte 
do ritual se desenrola com o 
canto das chulas e dos corridos, 
cuja expressão musical se dá, 
na sua execução, de forma bem 
semelhante às canções de samba 
de roda baiano e às variações 
do partido-alto carioca: “Seus 
cantos são tirados por um solista 
e respondidos pelo coro” .
Durante a chula, são feitas as 
saudações, respondidas a seguir 
pelo coro. Nesse momento, 
ainda não se pode jogar:
Ê, maior é Deus,
Ê, viva meu mestre,
Ê, quem me ensinou
Ê, a capoeira...
O jogo só se inicia após os 
cantos corridos. Como o nome 
indica, as canções são mais aceleradas 
do que as ladainhas e chulas, embora 
não sejam rápidas. Na Capoeira 
Regional de Mestre Bimba não há 
ladainhas, o que abre as rodas são 
quadras musicais que também são 
respondidas pela audiência da roda 
e têm estrutura semelhante aos 
corridos. A capoeira que funde as 
duas modalidadesutiliza o padrão 
de canto da Capoeira Angola, 
iniciando suas rodas com ladainhas 
e utilizando a instrumentação da 
capoeira antiga. Um outro aspecto 
importante das rodas de capoeira 
são os toques de berimbau. 
O canto, os 
toques e a 
dinâmica das 
rodas
99Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Um toque é um conjunto-
padrão de notas emitidas pelo 
berimbau. O instrumentista usa 
o dobrão (moeda) para alterar o 
comprimento da corda e produzir 
três diferentes tonalidades 
sonoras: um tom baixo, com 
a corda solta; um tom alto, 
com o dobrão pressionando a 
corda; e um tom estridente, 
em que o dobrão é usado para 
abafar a vibração da corda .
DESENHOS DE MESTRE 
BIMBA - CURSO DE 
CAPOEIRA REGIONAL.
FOTO: ACERVO 
TÉCNICO IPHAN.
 O principal deles é o toque de 
Angola, cadenciado e lento, que 
abre a roda de capoeira. Os toques 
são tão importantes para a capoeira 
que alguns os relacionam aos estilos. 
Édison Carneiro, por exemplo, 
escreveu que a capoeira possuía 
nove modalidades, entre elas a 
Capoeira Angola. Um erro, segundo 
Waldeloir Rego: “O que houve 
foi uma bruta confusão de Édison 
Carneiro, misturando golpes de 
capoeira com toques de berimbau” . 
De fato, os angoleiros costumam 
rejeitar a simplificação da Capoeira 
Angola ao toque de Angola, que é 
apenas um dos elementos da arte.
Além do toque de Angola, 
fazem parte das rodas o São Bento 
Grande e o São Bento Pequeno, 
versões mais rápidas do toque 
de Angola, mas que seguem sua 
estrutura rítmica. Um outro 
toque inventado pelos capoeiristas 
100Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
antigos, que permanece nas rodas 
atuais, ainda que em raras ocasiões, 
é a Cavalaria. O ritmo, que imita o 
som de cavalos trotando, era tocado 
para avisar da chegada do Esquadrão 
da Cavalaria. Liderado pelo temido 
chefe de polícia conhecido como 
Pedrito, o esquadrão atacava as 
rodas e perseguia os capoeiras na 
década de 1920, em Salvador.
Assim como a Cavalaria, outros 
toques são basicamente instrumentais 
e não acompanham o canto nas 
rodas, como Santa Maria, Jogo de 
Dentro e Iúna, criado por Mestre 
Bimba para ser tocado nas rodas de 
alunos formados. No entanto, o toque 
também é associado a momentos 
fúnebres. Na verdade, existem muitos 
toques, alguns controversos, criados 
por outros mestres, tornando difícil 
enumerar todos com exatidão.
Nas rodas que fundem 
elementos das capoeiras Angola 
e Regional, cada toque requer 
uma forma diferente de jogar. 
No Grupo Senzala, como não 
se segue uma vertente exclusiva, 
é possível, em uma roda, serem 
tocados diversos toques diferentes. 
Quem dita o que se deve jogar 
é o berimbau comandado pelo 
mestre ou professor. Se o toque 
for de Angola, joga-se Capoeira 
Angola; se for São Bento Grande, 
joga-se Capoeira Regional.
101Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
SEQUÊNCIA DE MOVIMENTOS DA 
CAPOEIRA.
MATERIAL ESCANEADO DO 
FLIPLIVRO DE ARISTIDES E NEWDAO.
Nas rodas de Capoeira Angola 
não se muda o estilo de capoeira, 
mas há variação de toques, como 
o jogo de dentro, “um dos toques 
mais rápidos e bonitos da Capoeira 
Angola. Durante esse toque, 
capoeiristas procuram demonstrar 
todas as suas habilidades, 
jogando o mais próximo possível 
do solo e do oponente”82.
Os toques e jogos na roda 
de Capoeira Angola também são 
comandados pelo berimbau, que 
determina ainda o tempo do jogo, 
geralmente mais longo entre os 
angoleiros. Quando o tocador bate 
repetidas vezes no berimbau, é sinal 
de que o jogo acabou. É preciso 
apertar as mãos e dar lugar a outra 
dupla. Nas rodas de Capoeira 
Regional e dos grupos que usam 
cordel, os jogos têm curta duração e 
não são comandados pelo berimbau. 
É o chamado jogo de “compra”, 
quando um jogador entra na roda, 
interrompe o jogo e escolhe um 
dos jogadores para jogar, e assim 
por diante. As rodas, de uma 
maneira geral e independentemente 
do estilo, terminam com 
corridos de despedida:
Adeus, adeus,
Já vou-me embora
Eu vou com Deus
E Nossa Senhora.
102Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
103Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
os instrumentos
Quando utilizados no território da roda, os instrumentos 
não são apenas objetos. Afinal, 
eles tomam parte em todo 
o cerimonial que envolve a 
roda, ganhando significados 
e sentidos que os tornam 
sensíveis. Os corpos interagem 
com o som dos instrumentos, 
incorporando-os. A música da 
capoeira, como qualquer música, 
será regida por tempo, pulso, 
síncope, compassos, colcheias 
e semicolcheias, rufos, canto e 
melodias, criando uma teia de 
símbolos que provocam na roda 
essa condição mágica que distorce 
o tempo e o espaço. 
Esse complexo musical é 
necessário para o deslocamento 
dos jogadores e do público para 
uma temporalidade própria. Um 
espaço limítrofe situado num 
território extracotidiano poderá 
ser mobilizado e disponibilizado 
através do universo simbólico 
da música, dos ritmos e cantos, 
expressões corporais dramáticas, 
golpes, quedas e ritos, numa esfera 
de atividade que tem sua tendência 
própria: a tendência do jogo.
É preciso admitir que a 
roda de capoeira como hoje a 
conhecemos perde o sentido sem 
a utilização do elemento música 
e dos objetos musicais que a 
constituem. Como não falar então 
da cultura material da capoeira 
e dos seus objetos fundamentais, 
os instrumentos musicais?
Os instrumentos descritos 
a seguir podem ser encontrados 
principalmente na tradição 
musical praticada na Capoeira 
Angola. Essa modalidade é a que 
se manteve mais vigorosa como 
depositária da estrutura musical 
que preserva estreitas relações 
com as matrizes africanas. Isso 
não só pelas formas harmônica e 
FOTO: PIERRE VERGER@FUNDAÇÃO 
PIERRE VERGER.
ABAIXO, À DIREITA
TOCADOR DE BERIMBAU 
ANGOLANO.
DESENHO A.NEVES E SOUZA.
104Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
rítmica presentes na composição 
sonora da tríade de berimbaus 
grave, médio e agudo, mas também 
pelo aspecto melódico e de 
conteúdo das letras cantadas nas 
ladainhas, chulas e nos corridos, 
mantidas vivas até hoje graças 
à memória oral da capoeira.
Mestre Bimba, quando 
criou sua Capoeira Regional, 
manteve apenas um berimbau 
e dois pandeiros. Vertentes 
modernizadas de seu estilo, por 
sua vez, reincorporaram nas 
suas rodas e treinos a tríade de 
berimbaus e outros instrumentos, 
como atabaque e agogô.
BERIMBAu
A presença dos berimbaus é 
essencial para que determinado 
evento seja concebido como uma 
roda de capoeira. A princípio, a 
assimilação do berimbau dentro 
da capoeira fez-se a partir do 
disfarce de seu caráter subversivo 
e marcial, que sob o manto da 
dança e da música escondia 
um tipo de luta corporal. Mas, 
por outro lado, representa 
uma comprovação daquilo que 
chamamos multidimensionalidade 
das culturas africanas, condição 
que se impõe em toda manifestação 
artística afrodescendente. 
Assim, a aparição e a presença 
dos instrumentos musicais, sejam 
eles berimbaus ou quaisquer 
outros, surgem dessa condição 
imanente da cultura africana ou 
afro-americana, em que aspectos 
musicais, dançantes, culinários, 
religiosos e, também, do vestuário 
se fundem dentro de uma mesma 
expressão, oriundos que são 
das culturas “diaspóricas”. Estas 
trouxeram em sua estrutura o 
aspecto da multidimensionalidade, 
do qual a música e os 
instrumentos musicais são parte 
constituinte e fundamental. 
Waldeloir Rego chega a citar 
um levantamento que assinala a 
presença do berimbau em Cuba. 
Lembre-se ainda da modalidade 
do berimbau de boca, encontrado 
de forma abundante na África, 
mas também na Europa. Essa 
ocorrência “em vários cantos 
do universo”83, segundo Rego, 
corresponde à indefinição de sua 
origem, possivelmente africana. 
Atualmente, não é preciso 
esforço para associar a capoeira 
ao berimbau, que há muito vem 
impregnando o imaginário dessa 
prática cultural.O instrumento 
está de tal forma associado a esse 
105Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
PAINEL DA RODA DO 
MESTRE VALMIR COM 
INSTRUMENTOS - 
BERIMBAU E PANDEIRO.
FOTO: TT CATALÃO - 
ACERVO TÉCNICO IPHAN.
território que seria inconcebível 
uma roda de capoeira sem a 
aplicação efetiva desse arco musical.
A forma do berimbau é 
simples e seus materiais, em certa 
medida, ainda são facilmente 
coletados na natureza, exceto, 
obviamente, pela corda de arame 
de aço, chamada no meio da 
capoeiragem simplesmente de 
arame. Provavelmente, o berimbau 
foi uma das primeiras criações de 
objetos musicais que emitem som 
por meio da vibração de uma corda. 
A parte mais importante do 
berimbau utilizado nas rodas de 
capoeira é a vara ou verga da árvore 
conhecida como biriba (Eschweilera 
ovata), comumente encontrada ao 
longo da mata atlântica do estado da 
Bahia. Afixado às duas extremidades 
da verga vem um arame. Na 
ponta superior do berimbau, 
um pedaço circular de couro 
de sola pregado servirá de polia 
106Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
para se envergar o instrumento. 
A cabaça, com uma abertura ou 
boca, que pode variar de tamanho, 
deverá ser presa na parte de baixo 
da verga, a uma distância de 
aproximadamente um palmo acima 
da sua extremidade inferior. 
Completando a composição do 
berimbau, há ainda um dobrão de 
cobre que, ao entrar em contato 
com o arame, altera a tonalidade 
do som que ressoa da cabaça. A 
baqueta ou vaqueta é uma vareta 
de madeira fina que não deverá 
passar da medida convencionada 
de dois palmos e não inferior a 
um palmo e meio de mão. Por 
fim, o último artigo corresponde 
a um instrumento musical à parte 
que o acompanha – o caxixi –, 
chocalho que produz um som 
agudo. Confeccionado em palha 
de vime trançada num pedaço 
circular de cabaça, funciona 
como a base na qual a semente 
conhecida como Lágrima de Nossa 
Senhora vai vibrar para emitir 
um som semelhante ao da chuva 
caindo nas folhas das árvores. 
Infelizmente, a biriba está 
cada vez mais escassa, devido à 
intensa exploração dessa árvore 
para comercialização de berimbaus. 
Atualmente, chegam ao mercado 
internacional através dos sites 
que trabalham com venda de 
107Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
instrumentos de percussão, ou 
pelas mãos dos mestres de capoeira 
que cruzam o mundo. A utilização 
do berimbau em terras brasileiras 
era comum em diversas cenas 
do cotidiano carioca. Fez parte, 
por exemplo, da indumentária 
do vendedor ambulante no 
Rio de Janeiro colonial.
Além de sua permanência ao 
longo dos séculos, é notável que 
sua forma praticamente não tenha 
sido alterada, pois apenas alguns 
materiais foram substituídos por 
outros, o que não comprometeu a 
sua estrutura básica. Constata-se, 
dessa forma, a vitalidade e o poder 
de permanência desse instrumento 
musical, possibilitando que 
ele ultrapassasse o tempo, as 
culturas e as fronteiras.
Nas rodas tradicionais de 
capoeira, são utilizados três 
berimbaus criadores da célula 
rítmica binária que caracteriza 
a maior parte dos toques da 
capoeira. São eles: o berimbau 
gunga, grave e maior de todos; 
o berimbau médio, como o 
próprio nome indica, localiza-se 
numa sonoridade intermediária; 
e o berimbau viola ou violinha, 
responsável pelos agudos dessa 
tríade instrumental. A disposição 
dos instrumentos da capoeira 
numa roda se orienta por 
convenções normalmente criadas 
pelos velhos mestres durante 
suas trajetórias e experiências. 
Esses berimbaus guardam 
aspectos que os relacionam 
diretamente ao candomblé, como 
também a outras tradições de 
origem africana, principalmente 
no que se refere aos três atabaques 
dessa religião afro-brasileira, 
assemelhando-se à organização e 
estruturação rítmica do candomblé. 
Um paralelo relacionando 
a musicalidade dessas duas 
DETALHE BERIMBAU.
FOTO: FRANCISCO MOREIRA 
DA COSTA.
ABAIXO
MESTRE COCA-COLA.
FOTO: FRANCISCO MOREIRA 
DA COSTA
108Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
manifestações culturais, a capoeira 
e o candomblé, mostrará células 
rítmicas muito semelhantes.
O gunga, berimbau que 
emite uma sonoridade mais grave 
e de maior porte, aparece na 
roda desempenhando um papel 
de marcação, determinando 
e orientando qual ritmo será 
executado durante todo o tempo 
de uma roda. A sua posição é 
destacada na hierarquia dos 
instrumentos. Ele é o responsável 
direto, tanto pela ativação dos 
códigos que provocam o início 
das cerimônias, como pelo 
encerramento da roda. Da mesma 
forma que o gunga, o atabaque 
mais grave do candomblé, 
denominado “rum”, na maioria 
das vezes está posicionado à direita 
dos outros dois atabaques. Ao 
contrário, porém, do gunga, sua 
função não é de marcação, mas 
de variação e improviso. Mesmo 
com essa diferença, tanto o rum 
quanto o gunga encarnam o 
papel de liderança e de comando 
nas ações musicais dos rituais.
O berimbau viola 
corresponde, de acordo com a 
analogia que vimos demonstrando, 
ao atabaque de menor porte, 
chamado “lé”, no candomblé. 
Enquanto o viola faz as variações 
e improvisos, o lé responde pela 
marcação do ritmo. A sonoridade 
desses dois instrumentos preenche 
aquele espaço dos sons agudos 
nos rituais dessas manifestações. 
Finalmente, o berimbau médio 
encontra seu análogo no atabaque 
“rumpi”, já que tanto um quanto 
o outro atuam como ponte entre 
dois polos sonoros. Dessa forma, 
harmonizam o diálogo entre as 
sonoridades graves e agudas dos 
outros dois berimbaus e atabaques: 
gunga e viola, na capoeira, e 
rum e lé, no candomblé.
ATABAQuE
O atabaque é também 
usado dentro do jongo e do 
caxambu. Sem dúvida, foi um 
dos primeiros instrumentos 
adotados na capoeira, como fica 
demonstrado numa das gravuras 
de Rugendas, feita no século 19, 
um dos raros registros antigos 
da existência da capoeira no 
Brasil. No fantástico cenário 
retratado por Rugendas, apenas 
um instrumento – o atabaque – 
se destaca em uma manifestação 
que apresenta traços da 
movimentação da capoeira84. 
Sem o conjunto de 
instrumentos hoje característicos 
a essa prática, observa-se a 
participação de um público 
atento e participativo em torno 
de um atabaque, que marca o 
ritmo da dança-luta retratada. 
Segundo a etnografia de 
Rego, nas escolas de Capoeira 
109Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
INSTRUMENTOS DE 
MESTRE NESTOR.
FOTO: TT CATALÃO 
– ACERVO TÉCNICO 
IPHAN.
Angola dos mestres Pastinha 
e Canjiquinha não se observa 
a sua utilização, embora se 
reconheça, na maioria dos 
registros, que o atabaque 
formava o acompanhamento 
musical da capoeira. 
Assim como o pandeiro, 
o atabaque é um instrumento 
muito antigo e recorrente no 
mundo árabe e na África, tendo 
sido divulgado na Europa já 
na época das cortes medievais. 
O atabaque da capoeira tem 
a mesma forma do n’goma, 
de origem angolana, e seus 
tamanhos variam dentro da 
configuração encontrada 
nos atabaques rum, rumpi e 
lé. O mais adotado, porém, 
na capoeira é o rum, devido 
a seu tamanho maior e, 
consequentemente, por 
emitir um som mais grave. 
110Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
MESTRE RUSSO COM PANDEIRO.
FOTO: TT CATALÃO.
PANDEIRO
Além dos berimbaus e do 
atabaque, há ainda os pandeiros. 
Como todos os instrumentos 
utilizados na capoeira, têm sua 
trajetória no Brasil vinculada 
aos povos de origem africana. 
Entretanto, sua presença 
na cultura universal perde-
se nos tempos, do Oriente 
antigo às rodas de samba. Em 
Portugal, existe o adufe, que 
em muito se assemelha ao 
nosso pandeiro, levando-nos 
a crer que esse instrumento 
também chegou pelas mãos 
dos portugueses durante o 
período da colonização. 
Existem diversos tipos de 
pandeiro, mas o ideal para a 
orquestra da roda de capoeira 
deve ser encourado com couro 
de cabra e sua carcaça, ou 
moldura, feita em madeira 
resistente e ao mesmotempo 
111Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
AGOGÔ.
ACERVO DO CENTRO NACIONAL DE 
FOLCLORE E CULTURA POPULAR.
flexível. As platinelas, pequenos 
pratos de latão, completam 
o instrumento, dando-lhe 
o som agudo tão importante 
para o equilíbrio entre os 
timbres grave e abafado do 
pandeiro. Esse som é emitido 
continuamente durante a 
percussão do instrumento e lhe 
confere uma sonoridade que, 
de longe, pode ser percebida.
execução de alguns toques e em 
outros momentos do seu ritual. 
O agogô pode se apresentar sob 
mais de uma forma. Com três 
campânulas, quatro ou mais. Na 
capoeira, porém, a versão de duas 
campânulas é a mais utilizada. 
O instrumento chamado 
reco-reco normalmente é feito 
a partir de algumas espécies de 
bambu ou da própria cabaça, 
quando esta apresenta uma forma 
mais alongada. A forma simples e 
rústica faz do reco-reco e do agogô 
os instrumentos de mais fácil 
execução na orquestra da capoeira. 
O som do reco-reco é produzido 
quando se desliza uma baqueta 
de madeira por sobre uma área 
entrecortada de sulcos transversais. 
A fricção da baqueta sobre a 
superfície da peça de bambu ou 
cabaça produz o som característico 
desse instrumento. ¢
AGOGô E RECO-RECO
O agogô empregado na 
capoeira tem duas campânulas de 
ferro e deve ser percutido com 
uma baqueta, preferivelmente 
feita em madeira para amenizar 
o som metálico produzido pelo 
agogô. Como a maior parte dos 
instrumentos da capoeira, a 
sua assimilação está relacionada 
ao candomblé, que também 
se utiliza do agogô durante a 
112Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
113Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Ao percorrer os olhos rapidamente pelos jornais 
da década de 1970 em diante, 
percebe-se que alguns analistas e 
estudiosos da cultura popular da 
época traçam um quadro sombrio 
para os destinos da capoeira, em 
muito influenciados pelos danos 
socioeconômicos e culturais 
provocados pelo turismo/
folclorização e esportização. 
Esse período coincide com 
a decadência das academias 
tradicionais de capoeira da Bahia 
– as de Bimba e Pastinha –, com 
a situação de pobreza em que 
se encontravam os principais 
mestres, razão da saída de Mestre 
Bimba para Goiânia, em Goiás. 
O período marca, ainda, a morte 
de muitos deles em quadro de 
indigência, num momento em 
que a capoeira já começava a dar 
mostras da possibilidade de ser 
explorada economicamente.
No final da década de 
1970, militantes do movimento 
negro, estudiosos, políticos, 
carnavalescos e estudantes 
universitários começam a denunciar 
a folclorização da cultura negra e 
reivindicam, aos poderes públicos, 
medidas que pudessem coibir 
esse processo. Na Bahia, algumas 
instituições públicas tomaram 
iniciativas que procuravam atender 
a essas reivindicações e acabaram 
sacramentando algumas conquistas 
em prol das manifestações negras. 
Em 1977, o Departamento de 
Assuntos Culturais da Prefeitura 
Municipal de Salvador inicia um 
projeto diretamente relacionado 
à capoeira, que encontra adesão 
da comunidade capoeirística. 
A iniciativa consegue abranger 
desde os mais tradicionais mestres 
ainda em condições de participar, 
como Cobrinha Verde, Atelino, 
Waldemar, Canjiquinha, 
Caiçara, entre outros, até a 
nova geração composta de 
praticantes pertencentes a 
segmentos da classe média, 
muitos deles universitários. 
Esse projeto tinha por 
objetivo agregar todos os 
estilos de capoeira e todas as 
tendências que estavam em voga 
(esporte, folclore, educação). 
Por meio de fórum de debates 
e de apresentações de capoeira, 
À DIREITA
RODA DE CAPOEIRA.
FOTO: PIERRE VERGER@FUNDAÇÃO 
PIERRE VERGER.
ABAIXO
MESTRE JOÃO PEQUENO.
FOTO: EDUARDO MONTEIRO.
Os Mestres e as Rodas: 
Patrimônio Vivo
114Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
MESTRE CURIÓ.
FOTO: TT CATALÃO – ACERVO 
TÉCNICO IPHAN.
listou os pontos impulsivos 
e restritivos para a prática da 
capoeiragem. Além dos mestres 
e de capoeiristas, convidados 
e consultores eventuais e 
periódicos, participavam do 
projeto intelectuais baianos, 
estudiosos da cultura negra, 
membros do Movimento 
Negro Unificado (MNU), 
educadores e dirigentes de 
outras entidades públicas. 
No ano de 1983, o projeto 
relacionado à capoeira do 
Departamento de Assuntos 
Culturais da Prefeitura Municipal 
de Salvador culminou com a 
realização do Primeiro Seminário Regional 
de Capoeira e do Festival de Ritmo de 
Capoeira, que devem ser entendidos 
como a primeira iniciativa 
governamental em prol da capoeira.
Nesses eventos, foram 
levantadas as principais questões 
que envolviam a capoeira da época 
e indicados alguns rumos de 
atuação para orientar as políticas 
públicas em seu benefício: a 
revitalização da Capoeira Angola; a 
introdução da prática da capoeira 
nas escolas; o incentivo às pesquisas 
e aos estudos sobre o tema; a 
importância de encontrar formas 
de amparo aos velhos mestres e 
suas famílias; a realização de novos 
eventos de capoeira; a busca de 
novos espaços para a sua prática. 
Muitos desses itens levantados 
encontram ressonância no 
momento atual da capoeira. Apesar 
de a arte ter se difundido no 
Brasil e no exterior, isso ocorreu 
por meio do saber dos mestres, 
que, sem amparo ou recurso, se 
lançaram na aventura da errância 
em busca de condições melhores 
de vida, dentro e fora do País.
Há, portanto, uma contradição 
inerente à difusão da capoeira. Por 
115Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
À DIREITA
MESTRE LUA RASTA.
FOTO: TT CATALÃO – 
ACERVO TÉCNICO IPHAN.
ABAIXO 
MESTRE VIRGÍLIO, IGREJA 
DO BONFIM, BAHIA.
FOTO: TT CATALÃO – 
ACERVO TÉCNICO IPHAN.
um lado, percebe-se que o jogo 
não corre o risco de desaparecer, 
é praticado por milhões de pessoas 
em todo o mundo e estudado por 
pesquisadores de universidades 
nacionais e internacionais. No 
entanto, os mestres encontram 
brutais dificuldades para manter seu 
ensinamento, enfrentam problemas 
financeiros, falta de espaço para 
ministrar aulas e barreiras para 
divulgar a arte no exterior.
Esse é um ponto que 
mostra a necessidade de um 
reconhecimento oficial da 
importância da capoeira por parte 
do Estado brasileiro. Exemplos 
como o de Mestre João Grande, 
que recebeu diversas homenagens 
nos Estados Unidos, revelam 
a apropriação da capoeira por 
governos multiculturalistas, 
que buscam reconhecê-la como 
parte da diáspora africana e 
patrimônio próprio. O Brasil, 
nesse contexto, não seria o local 
onde a capoeira se desenvolveu, 
mas ponto de passagem para 
sua difusão internacional.
A perspectiva deste Dossiê é 
a de que, embora marcada pela 
influência africana, a capoeira 
– como hoje é conhecida – 
estabeleceu-se no Brasil. Foram 
também os mestres brasileiros os 
responsáveis por articular aspectos 
116Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
culturais a uma manifestação 
que poderia ficar restrita à face 
marcial. Ao contrário disso, 
a capoeira é reconhecida por 
sua riqueza musical e gestual, o 
que a aproxima também de uma 
dança especial, reminiscência 
de jogos de combate de 
sociedades tradicionais.
A roda de capoeira, nesse 
sentido, é a forma de expressão 
que permitiu o aprendizado e a 
expansão do jogo. Nela se encenam 
golpes e movimentos acrobáticos, 
cânticos antigos são reatualizados 
e outros são inventados, 
acompanhados por uma orquestra 
de instrumentos que produz uma 
sonoridade múltipla e, ao mesmo 
tempo, característica da arte.
A roda é um momento 
determinante da prática da capoeira 
que não pode ser ignorado. Seja 
na Capoeira Angola, Regional 
ou a que funde as duas vertentes, 
a roda é um espaço de criação 
artística e de performance cultural 
em que se realiza plenamente a 
multidimensionalidade da capoeira.
Portanto, a roda também precisa 
ser registrada, assim como os 
mestres, depositários do saber 
imaterial da capoeira. No dossiê do 
processode Registro, encontram-se 
anexadas 16 entrevistas com mestres 
de diversas vertentes, reconhecidos 
pela comunidade capoeirística 
como importantes mantenedores 
da cultura. São eles, distribuídos 
pelas cidades de Salvador, Rio de 
Janeiro e Recife, os mestres: 
SAlVADOR
Mestre João Pequeno 
(João Pereira dos Santos)
Mestre Curió
(Jaime Martins dos Santos)
Mestre Virgílio
(Virgílio Maximiniano Ferreira)
Mestre Bamba
(Rubens Costa Silva)
Mestre Gajé
(José Izidro de Carvalho)
Mestre Xaréu
(Hélio Campos)
Mestre Demolidor
(Augusto Januário Passos da Silva)
Mestre Lua Rasta
(Gilson Fernandes)
RIO DE JANEIRO
Mestre Vilmar
(Vilmar da Cruz Brito)
Mestre Nestor Capoeira
(Nestor Sezefredo dos Passos Santos)
Mestre Gil Velho 
(Gilberto Cavalcanti)
Mestre Russo (Jonas Rabelo)
Mestre José Carlos
(José Carlos Gonçalves)
117Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Mestre Peixinho 
(Marcelo Azevedo Guimarães – RJ)
Mestre Rafael Flores
(Rafael Flores Viana – RJ)
Mestre Celso do 
Engenho da Rainha
(Celso Carvalho Nascimento – RJ)
Mestre Pelé da Bomba
(Natalício Neves da Silva – BA)
Mestre Felipe de Santo Amaro
(Felipe Santiago – BA)
Mestre Gigante 
(Francisco de Assis – BA)
Mestre Bigodinho
(Reinaldo Santana – BA) ¢
Mestre Leopoldina (Demerval 
Lopes de Lacerda – RJ)
Mestre Moraes
(Pedro Moraes Trindade – BA) 
Mestre Lua de Bobó
(Edvaldo Borges da Cruz – BA)
Mestre Suassuna
(Inaldo Ramos Suassuna – BA)
Mestre Itapoan
(Raimundo César Alves 
de Almeida – BA)
Mestre Acordeon
(Ubirajara Guimarães 
Almeida – BA)
Mestre Decânio
(Ângelo Augusto Decânio Filho – BA)
Mestre Camisa Roxa
(Edvaldo Carneiro e Silva – BA)
Mestre Camisa
(José Tadeu Carneiro Cardoso – BA)
RECIfE
Mestre Coca-Cola
(Marco Aurélio Moreira)
Mestre Mulatinho
(João Ferreira Mulatinho)
Mestre Meia-Noite
(Gilson Santana)
Além desses, são importantes 
depositários do saber da 
capoeira os seguintes mestres:
Mestre João Grande 
(João Oliveira dos Santos – BA)
Mestre Arthur Emídio
(Arthur Emídio – RJ)
Mestre Boca Rica
(Manoel Silva – BA)
Mestre Pirajá
(Marcondes Luiz Ferreira 
da Silva – PE)
PÁGINAS 118 E 119
ALGUNS DOS MESTRES
DE CAPOEIRA
FOTOS:
ACERVO TÉCNICO DO 
IPHAN, FRANCISCO MOREIRA 
DA COSTA, EDUARDO 
MONTEIRO, GIANNY MELO, 
SANDRO GUIMARÃES, TT 
CATALÃO E XIM-XIM.
118Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
119Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
120Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
121Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Em 19 de agosto de 2004, o ministro da Cultura, Gilberto 
Gil, viajou para Genebra, na 
Suíça, sede europeia da ONU, 
a convite do então secretário-
geral Kofi Annan. Na ocasião, 
o ministro levou 15 capoeiristas 
brasileiros e estrangeiros para 
homenagear o embaixador Sérgio 
Vieira de Mello, morto um ano 
antes, em um atentado terrorista 
na cidade de Bagdá, no Iraque. O 
ministro da Cultura aproveitou 
para lançar, nessa oportunidade, 
as bases de um Programa 
Brasileiro e Internacional para 
a Capoeira. Segundo afirmou 
o ministro em seu discurso: 
“Atualmente, a capoeira é 
praticada em mais de 150 países. 
Nas Américas, no Japão, na 
China, em Israel, na Coreia, 
na Austrália, na África e em 
praticamente toda a Europa. A 
capoeira disseminou-se pelo 
mundo com entusiasmo. Mesmo 
sem falar português, um chinês, 
um árabe, um judeu ou um 
americano podem repetir o 
compasso da mesma música, a 
arte do mesmo passo e a ginga 
do mesmo toque. A diáspora 
da capoeira no mundo é uma 
realidade que já conta com o aval 
de instituições educacionais como 
o Unicef, que referenda trabalhos 
de iniciativa dos capoeiristas 
brasileiros em vários países”85.
Esse foi o primeiro passo 
do Ministério da Cultura para 
o estabelecimento de políticas 
públicas para a capoeira. Além 
do Inventário para Registro e Salvaguarda 
da Capoeira como Patrimônio Imaterial 
do Brasil, foi lançado, em 2006, 
o edital do Capoeira Viva, parceria 
do MinC com a Petrobras, já em 
segunda edição, que apresenta 
linhas de fomento para grupos e 
mestres nas áreas de pesquisa, 
formação de acervo e ações 
socioculturais. A capoeira 
também foi privilegiada em 
outras linhas de atuação, 
como o edital de incentivo a 
documentários (DOC TV) e 
os Pontos de Cultura. Diante 
dessas propostas, torna-se 
importante recomendar as 
seguintes medidas de salvaguarda.
RECONHECIMENTO, PElO 
MINISTÉRIO DA EDuCAçãO 
(MEC), DO NOTóRIO SABER DO 
MESTRE DE CAPOEIRA 
Espera-se que o registro 
do saber do mestre de capoeira 
como Patrimônio Cultural do 
Brasil possa favorecer a sua 
desvinculação obrigatória do 
Conselho Federal de Educação 
Física, ao qual a capoeira está 
subordinada. Entende-se que 
o saber do mestre não tem 
RODA DE CAPOEIRA DE 
BAIRRO, PROVAVELMENTE 
CORTA BRAÇO, NA LIBERDADE.
FOTO: PIERRE VERGER@
FUNDAÇÃO PIERRE VERGER.
recomendações de 
salvaguarda
122Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
equivalente no aprendizado 
formal do profissional de 
Educação Física, mas, sim, que 
se estabelece como acervo da 
cultura popular brasileira. Dessa 
forma, espera-se contribuir para 
que mestres de capoeira sem 
escolaridade, mas detentores do 
saber, possam ensinar capoeira em 
colégios, escolas e universidades. 
Recomenda-se que essa proposta 
seja de implantação imediata. 
PlANO DE PREVIDêNCIA 
ESPECIAl PARA OS VElHOS 
MESTRES DE CAPOEIRA
Este foi um dos pontos mais 
abordados durante os Encontros 
Capoeira como Patrimônio 
Imaterial do Brasil. Diante 
de um histórico de mestres 
importantes, como Bimba e 
Pastinha, entre outros, que 
morreram em sérias dificuldades 
financeiras, sugere-se elaborar, 
junto à Previdência Social, um 
plano especial para mestres 
acima de 60 anos que tenham 
tido dificuldades de contribuir 
com a entidade ao longo dos 
anos. Como justificativa, 
reconhece-se a contribuição do 
velho mestre de capoeira para 
difusão da cultura brasileira. 
Como se trata de uma ação de 
emergência, para acolhimento 
dos mestres atuais que vivem em 
123Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
absoluto estado de carência, 
recomenda-se que esta proposta 
tenha implantação imediata e 
que perdure até que os mestres 
vindouros possam dispensar 
esta ação de salvaguarda. 
ESTABElECIMENTO DE 
uM PROGRAMA DE 
INCENTIVO DA CAPOEIRA 
NO MuNDO 
Outro ponto importante 
destacado nos Encontros diz 
respeito à dificuldade de os 
mestres circularem pelos países 
onde são convidados para 
ensinar capoeira. Espera-se 
que o Ministério das Relações 
Exteriores possa inserir a capoeira 
nos seus programas de apoio à 
difusão da cultura brasileira. 
Desse modo, pode facilitar o 
trânsito de mestres e grupos de 
capoeira que oferecem cursos e 
apresentam rodas no exterior.
CRIAçãO DE uM CENTRO 
NACIONAl DE REfERêNCIAS 
DA CAPOEIRA
 Os estudos sobre a capoeira estão 
dispersos entre os departamentos de 
ensino de Antropologia, História, 
Educação, Educação Física, Psicologia, 
Artes, entre outros. A natureza 
polifônica e multifacetada do jogo 
e da cultura da capoeira enseja 
reflexões em diversos campos do 
saber (da biomecânica aos estudos 
das performances). Como a produção 
relativa à prática da capoeira no 
Brasil contemporâneo encontra-se 
dispersa, justifica-se a criação de 
um Centro Nacional de Referências 
da Capoeira, virtual, no Brasil, de 
caráter multidisciplinar e multimídia, 
abrigando produções científicas, 
acadêmicas, mas também produções 
audiovisuais, sonoras, entre outras. 
Espera-se que esta iniciativa 
possa facilitar consultas acerca das 
referências existentes sobre a capoeira.
PlANO DE MANEJO DA BIRIBA 
E OuTROS RECuRSOS
A prática da capoeira no Brasil 
e no exterior gerou a produção 
de um repertório significativo 
de commodities que passam a 
circular através da internet e das 
redes constituídas pelas franquias 
dos grandes grupos decapoeira 
de renome internacional. Hoje se 
presencia a constituição e reprodução 
de um crescente mercado de bens 
culturais constituídos por itens da 
cultura material da capoeira: cordéis, 
abadás, berimbaus, instrumentos 
(pandeiro, reco-reco, atabaque), 
dobrões e demais itens, muitos 
confeccionados artesanalmente, 
valendo-se de técnica e matéria-
prima nativa do Brasil, como é o 
caso da biriba (Eschweilera ovata) – 
madeira com que se confeccionam 
tradicionalmente os berimbaus. Para 
sua confecção utilizam-se também 
madeiras da mata atlântica, ameaçadas 
4º ENCONTRO DE CAPOEIRA, 
AGOSTO DE 2007.
FOTO: ACERVO TÉCNICO 
DO IPHAN.
124Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
de extinção, tais como: matamatá 
branco, pau d’arco, pau pombo, 
açoita cavalo, itaúba preta, guaiúba, 
pitomba, tatajuba, marupá, tauari e 
o morototó. Outras espécies vegetais, 
como a cabaça ou coité (Crescentia 
cujete), também são utilizadas, além 
do vime, do bambu, da palha e de 
sementes para a produção dos caxixis. 
São instrumentos normalmente 
confeccionados por uma rede local, 
por meio artesanal, para fazer frente 
a uma demanda cada vez maior de 
mercadorias. Sugerimos um plano de 
manejo de espécies nativas ameaçadas, 
para fazer frente à necessidade de 
matéria-prima para a confecção dos 
berimbaus e demais instrumentos. 
fóRuM DA CAPOEIRA
Realização de encontros 
periódicos, em parceria com 
universidades, para discutir questões 
importantes da comunidade da 
capoeira. O objetivo do Fórum é 
CAPOEIRISTA TOCANDO 
BERIMBAU.
FOTO: TT CATALÃO – 
ACERVO TÉCNICO IPHAN.
À DIREITA
MESTRE ITAPOAN, LAGOA 
DE ABAETÉ, BAHIA.
FOTO: TT CATALÃO – 
ACERVO TÉCNICO IPHAN.
125Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
estimular o encontro dos mestres 
com os estudiosos da capoeira. 
É notório que alguns mestres de 
capoeira possuem saber acadêmico, 
mas não é o caso da maioria. Espera-
se, portanto, integrar a tradição oral 
ao ambiente de pesquisa acadêmica. 
BANCO DE HISTóRIAS DE 
MESTRES DE CAPOEIRA
Pretende-se oferecer oficinas 
de história oral para capoeiristas 
base nas referências indicadas 
durante o processo do Inventário 
para Registro e Salvaguarda da Capoeira 
como Patrimônio Cultural do Brasil. 
Cabe mencionar que 
as recomendações aqui 
identificadas foram revistas, 
restringindo-se seu escopo às 
ações afins à área cultural, 
conforme demandas 
apresentadas nos Encontros Pró 
Capoeira, pelos detentores.¢
interessados em registrar as 
trajetórias de vida de antigos mestres 
de capoeira. O objetivo é que esse 
Banco de Histórias possa alimentar 
e fazer parte do Centro Nacional 
de Referências da Capoeira. 
REAlIzAçãO DE INVENTáRIO 
DA CAPOEIRA EM PERNAMBuCO
Espera-se auxiliar e incentivar 
o aprofundamento de pesquisas 
sobre a capoeira em Recife, com 
126Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
NOTAS
1. Ainda assim, é preciso levar em 
conta que os centros urbanos da época 
tinham vasto entorno rural, de modo que 
havia engenhos e até mesmo quilombos 
nos bairros afastados do centro do Rio 
de Janeiro e outras cidades coloniais. 
Como exemplo, ver SILVA, Eduardo. 
As camélias do Leblon e a abolição da escravatura: 
uma investigação de história cultural. São 
Paulo: Companhia das Letras, 2003.
2. REGO, Waldeloir. 
Capoeira Angola – ensaio socioetnográfico. 
Salvador: Itapuã, 1968, p. 33. 
3. Ver CAVALCANTI, Nireu 
Oliveira. Crônicas históricas do Rio 
Colonial. Rio de Janeiro: Civilização 
Brasileira-Faperj, 2004.
4. SOARES, Carlos Eugênio 
Líbano. A capoeira escrava e outras tradições 
rebeldes no Rio de Janeiro (1808-1850). 
Campinas: Unicamp, 2001, p. 25.
5. SOARES, Carlos Eugênio 
Líbano. A negregada instituição: os capoeiras 
na Corte Imperial (1850-1890). Rio 
de Janeiro: Access, 1999, p. 3. 
6. Ver DIAS, Luís Sérgio. Quem tem 
medo da capoeira? Rio de Janeiro: Secretaria 
Municipal das Culturas, Departamento 
Geral de Documentação e Informação 
Cultural, Arquivo Geral da Cidade do Rio 
de Janeiro/ Divisão de Pesquisa, 2001.
7. EDMUNDO, Luiz. O Rio de 
Janeiro do meu tempo. Rio de Janeiro: 
Imprensa Nacional, 1938, p. 842.
8. Ver GOMES, Flávio dos Santos. 
“No meio das águas turvas (racismo e 
cidadania no alvorecer da República: 
Guarda Negra na Corte – 1888-1889”. 
Estudos afro-asiáticos, n. 21, 1991. 
9. CASTRO, Maurício Barros de. 
Na roda do mundo: Mestre João Grande entre 
a Bahia e Nova York. Tese de doutorado. 
São Paulo: Departamento de História 
Social (FFLCH-USP), 2007, p. 139.
10. SOARES, Carlos Eugênio 
Líbano. Op. cit., p. 41.
11. ABREU, Plácido de. Os capoeiras. 
Rio de Janeiro: Tipografia da Escola 
Seraphim Alves de Brito, 1886. 
12. ABREU, Plácido de. Op. cit., p. 3.
13. DIAS, Luís Sérgio. Op. cit., p. 97.
14. CASTRO, Maurício Barros de. 
Op. cit., p. 140.
15. BARBIEIRI, César. Um 
jeito brasileiro de aprender a ser. Brasília: 
Defer/GDF. Centro de Informação 
e Documentação Sobre a Capoeira 
(Cidoca/DF), 1993, p. 117.
127Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
16. SOARES, Carlos Eugênio 
Líbano. Op. cit., p. 40 e 12. 
17. NETO, Coelho “O nosso jogo”. In: 
Bazar. Porto: Livraria Chardron, 1928, p. 140. 
18. MORAES FILHO, Mello. 
“Capoeiragem e capoeiras célebres”. 
In: Festas e tradições populares no Brasil. Belo 
Horizonte-São Paulo: Itatiaia-Edusp, 
1979, p. 263.
19. SODRÉ, Muniz. Mestre 
Bimba: corpo de mandinga. Rio de 
Janeiro: Manati, 2002, p. 62.
20. Ver PIRES, Antônio Liberac 
C. S. Bimba, Pastinha e Besouro de Mangangá. 
Três personagens da capoeira baiana. Tocantins-
Goiânia: Neab-Grafset, 2002 e A capoeira 
na Bahia de Todos os Santos. Um estudo sobre 
cultura e classes trabalhadoras (1890-1937). 
Tocantins-Goiânia: Neab-Grafset, 
2004. DIAS, Adriana Albert. Mandinga, 
manha & malícia – uma história sobre os capoeiras 
na cidade da Bahia (1910/1925). Salvador: 
Edufba, 2006. “Os ‘fiéis’ da navalha: 
Pedro Mineiro, capoeiras, marinheiros 
e policiais em Salvador na República 
Velha.” In: Revista Afro-Ásia, n. 32, Salvador: 
Ceao, 2005. OLIVEIRA, Josivaldo Pires 
de. No tempo dos valentes: os capoeiras na cidade 
da Bahia. Salvador: Quarteto, 2005.
21. Ver QUERINO, Manuel. Bahia 
de outrora. Salvador: Progresso, 1955 e 
Costumes africanos no Brasil. Recife: Fundação 
Joaquim Nabuco-Massangana, 1988.
22. QUERINO, Manuel. Costumes 
africanos no Brasil. Recife: Fundação Joaquim 
Nabuco-Massangana, 1988, p. 73.
23. Ver VIANNA, Antônio. Casos e 
coisas da Bahia. Salvador: Fundação Cultural 
do Estado da Bahia, 1984 e Quintal de 
Nagô e outras crônicas. Salvador: Centro 
de Estudos Baianos/UFBA, 1979.
24. Ver PIRES, Antônio Liberac C. 
S. Movimentos da cultura afro-brasileira: a formação 
histórica da capoeira contemporânea (1890-
1950). Tese de doutorado. Campinas: 
Instituto de Filosofia e Ciências 
Humanas da Universidade Estadual de 
Campinas, 2001 e Capoeira no jogo das 
cores: criminalidade, cultura e racismo na cidade 
do Rio de Janeiro (1890-1937). Dissertação 
de mestrado. Campinas: Departamento 
de História da Unicamp, 1996.
25. Ver ABREU, Frederico José 
de. Capoeiras – Bahia, século XIX: imaginário e 
documentação. Vol. I. Salvador: Instituto 
Jair Moura, 2005. É importante 
ressaltar que, segundo o autor, há em 
seu acervo mais documentos referentes 
à capoeira baiana deste período que 
não foram inseridos neste livro.
26. ABREU, Frederico 
José de. Op. cit., p. 95.
27. Capadócio é “o indivíduo que se 
dá ares de importância nos modos e nas falas para 
enganar os outros; espertalhão, finório, velhaco”. 
Ver: SILVA, Antônio de Moraes. 
Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de 
Janeiro: Empresa Literária Fluminense 
de A. A. da Silva Lobo, 1890, p. 403. 
28. Ver COUTINHO, Daniel 
(Noronha). O ABC da Capoeira Angola: 
os manuscritos de Mestre Noronha. Brasília: 
Defer-Cidoca, 1993. PASTINHA, 
Mestre. A herança de Mestre Pastinha: 
manuscritos e desenhos. Estatutos do 
Centro Esportivo de CapoeiraAngola 
(Coleção São Salomão 2), s.d. e 
Capoeira Angola. Salvador: Fundação 
Cultural do Estado da Bahia, 1988. 
29. CASTELLUCCI, Aldrin A. 
Silva. Salvador dos operários: uma história da 
greve geral de 1919 na Bahia. Dissertação de 
mestrado. Salvador: UFBA, 2001, p. 18.
30. A expressão é de FILHO, Alberto 
Heráclito Ferreira. “Desafricanizar 
as ruas: elites letradas, mulheres 
pobres e cultura popular em Salvador 
RECORTE DE IMAGEM DE 
MARCEL GAUTHEROT.
FOTO: MARCEL 
GAUTHEROT.
128Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
(1890-1937)”. In: Revista Afro-Ásia, nº 
21 e 22. Salvador: Ceao, 1998-9. 
31. Vale lembrar que, desde o 
final do século XIX, o termo “vadio” 
era usado tanto para se referir àqueles 
que não tinham trabalho como para 
designar todos os que viviam de ocupações 
esporádicas. A palavra vadiação também 
qualificava as brincadeiras, jogos e 
divertimentos de rua cultivados pelo povo 
e repudiados pelos que sonhavam com uma 
população que vivesse disciplinadamente 
pelos supostos padrões europeus. 
32. Cais Dourado designava toda 
a região onde estava situada a praça 
do Ouro, com vários botequins e o 
Mercado do Ouro – importante espaço 
do comércio ambulante e de venda de 
produtos em atacado, especialmente 
farinha de mandioca e açúcar. 
33. DIAS, Adriana Albert. A malandragem 
da mandinga: o cotidiano dos capoeiras em Salvador na 
República Velha (1910-1925). Dissertação de 
mestrado. Salvador: UFBA, 2004, p. 44.
34. COUTINHO, Daniel 
(Noronha). Op. cit., p. 19 e 21.
35. Ver OLIVEIRA, Valdemar de. 
Frevo, capoeira e passo. Recife: Companhia 
Editora de Pernambuco, 1985. 
36. FREYRE, Gilberto. Sobrados e 
mucambos. São Paulo: Global, 2006, 
p. 150-151.
37. REAL, Katarina. O folclore no 
Carnaval de Recife. Rio de Janeiro: MEC, 1967.
38. PEREIRA DA COSTA, 
Francisco Augusto. “Folclore 
pernambucano: subsídios para 
a história da poesia popular em 
Pernambuco”. Separata da Revista do 
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, 
tomo LXX. Rio de Janeiro, 1908.
39. SETTE, Mário. Maxambombas e 
maracatus. Recife: Fundação de Cultura 
da Cidade do Recife, 1981, p. 87.
40. REAL, Katarina. Op. cit., p. 27. 
41. SETTE, Mário. Op. cit., p. 87. 
42. FREYRE, Gilberto. Op. cit., p. 
650. 
43. SETTE, Mário. Op. cit., p. 86. 
44. OLIVEIRA, Valdemar de. Op. 
cit., p. 89. 
45. RABELLO, Evandro. Memórias da 
folia: o Carnaval do Recife pelos olhos da imprensa. 
Recife: Funcultura, 2004, p. 30-31. 
46. Idem.
47. Apud RABELLO, 
Evandro. Op. cit., p. 184.
48. FREYRE, Gilberto. Op. cit., p. 651.
49. BELTRÃO, Mônica. A 
capoeiragem no Recife antigo: os valentes de 
outrora. Recife: Nossa Livraria, 2007. 
50. Apud RABELLO, 
Evandro. Op. cit., p. 148.
51.Para uma introdução a esse 
assunto, ver CARVALHO, Marcus. 
“Rumores e rebeliões. Estratégias de 
resistência escrava no Recife”. In: Revista 
Tempo, 6(3). Niterói: Universidade 
Federal Fluminense, dezembro, 1998. 
52. LIMA, Vivaldo da Costa e 
OLIVEIRA, Valdir F. “O candomblé da 
Bahia na década de 30”. In: Cartas de Édison 
Carneiro a Arthur Ramos – De 4 de janeiro de 1936 a 
6 de dezembro de 1938. São Paulo: Corrupio, 
1987, p. 39.
53. CARNEIRO, Édison. Negros 
bantos: notas de etnografia religiosa e de folclore. Rio 
de Janeiro: Civilização Brasileira, 1936.
54. VIEIRA, Luiz Renato e 
ASSUNÇÃO, Matthias R. “Mitos, 
controvérsias e fatos: construindo a 
história da capoeira”. In: Estudos Afro-
Asiáticos (34): 81-121. Dez/1998, p. 84.
55. Ver ABREU, Frederico José 
de. Bimba é bamba: a capoeira no ringue. 
Salvador: Instituto Jair Moura, 1999.
56. SODRÉ, Muniz. Op. cit., p. 64.
129Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
57. ABREU, Frederico. O 
barracão do Mestre Waldemar. Salvador: 
Organização Zarabatana, 2003.
58. Ver ALMEIDA, Raimundo 
Alves de. Bibliografia crítica da 
capoeira. Brasília: Defer, Centro de 
Informação e Documentação sobre 
a Capoeira (Cidoca/DF), 1993.
59. Texto extraído da entrevista 
realizada por Maurício Barros de 
Castro e Matthias Rohrig Assunção 
com Mestre Vilmar (Vilmar da Cruz 
Brito) em agosto de 2007, para o 
Inventário para Registro e Salvaguarda da 
Capoeira como Patrimônio Cultural do Brasil 
– Iphan, no Rio de Janeiro (RJ).
60. ASSUNÇÃO, Matthias Rohrig. 
Capoeira. The history of an Afro-brazilian martial 
art. Londres: Routledge, 2005, p. 174.
61. ASSUNÇÃO, Matthias 
Rohrig. Op. cit., p. 196-197.
62. Idem, p. 177.
63. Texto extraído da entrevista 
realizada por Graciane Costa e Annelise 
Meneses com Mestre Coca-Cola 
(Marco Aurélio Moreira) em julho 
de 2007, para o Inventário para Registro 
e Salvaguarda da Capoeira como Patrimônio 
Cultural do Brasil – Iphan, em Recife (PE).
64. CASTRO, Maurício 
Barros de. Op. cit., p. 12-13.
65. VITA, Marcos. “Ginga na Casa 
Branca”. In: Correio da Bahia. Caderno Aqui 
Salvador. Salvador, 7 de julho de 2001, p. 1.
66. REGO, Waldeloir. 
Op. cit., p. 35-6.
67. ABREU, Frederico 
José de. Op. cit., p. 20.
68. Apud ABREU, Frederico 
José de. Op. cit.¸p. 16.
69. ABIB, Pedro Rodolpho 
Jungers. Capoeira angola: cultura popular no 
jogo dos saberes na roda. Tese de doutorado. 
Campinas: Universidade Estadual 
de Campinas, 2004, p. 89.
70. PIRES, Antônio 
Liberac. Op. cit., p. 51.
71. Ver CAMPOS, Hélio (Mestre 
Xaréu). Capoeira na universidade: uma trajetória 
de resistência. Salvador: SCT-Edufba, 2001.
72. PASTINHA, 
Mestre. Op. cit., p. 31.
73. Idem, p. 35.
74. CAMPOS, Hélio. Op. cit., p. 70.
75. Idem, p. 87.
76. Texto extraído de entrevista 
realizada por Amélia Conrado e 
Ricardo Biriba com Mestre Curió 
(Jaime Martins dos Santos) em outubro 
de 2007, para o Inventário para Registro e 
Salvaguarda da Capoeira como Patrimônio Cultural 
do Brasil – Iphan, em Salvador – BA.
77. Ver GLASGOW, Roy. 
Nzinga – Resistência africana à investida do 
colonialismo português em Angola, 1582 -1666. 
São Paulo: Perspectiva, 1982.
78. ASSUNÇÃO, Matthias 
Röhrig. Op. cit., p. 135.
79. LOPES, Nei. O negro no Rio 
de Janeiro e sua tradição musical: partido-
alto, calango, chula e outras cantorias. Rio 
de Janeiro: Pallas, 1992, p. 36.
80. Grupo de Capoeira Angola 
Pelourinho. Washington: Smithsonian 
Folkways Recordings, 1996, p. 32.
81. REGO, Waldeloir. 
Op. cit., p. 32.
82. Grupo de Capoeira Angola 
Pelourinho. Op. cit., p. 34.
83. REGO, Waldeloir. 
Op. cit.,. p. 71-76.
84. Ver RUGENDAS, Johann 
Moritz. Viagem pitoresca através do Brasil. Belo 
Horizonte-São Paulo: Itatiaia-Edusp, 1981.
85. GIL, Gilberto. Brasil, paz 
no mundo. Disponível em http://
www2.cultura.gov.br. ¢
130Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
fontes 
bibliográicas
ABIB, Pedro Rodolpho Jungers. 
Capoeira Angola: cultura popular no jogo dos 
saberes na roda. Campinas: 
Universidade Estadual de Campinas, 
2004. (Tese de doutorado)
ABREU, Plácido de. Os capoeiras. Rio 
de Janeiro: Tipografia da Escola 
Seraphim Alves de Brito, 1886.
ABREU, Frederico José de. Bimba 
é bamba: a capoeira no ringue. Salvador: 
Instituto Jair Moura, 1999.
______. “A capoeira baiana no século 
XIX”. In: Revista Iê Capoeira, ano I, n° 
07. São Paulo: On Line, 2000.
______. O barracão do Mestre 
Waldemar. Salvador: Organização 
Zarabatana, 2003.
______. Capoeiras – Bahia, século 
XIX: imaginário e documentação, 
vol. I. Salvador: Instituto 
Jair Moura, 2005.
ALMEIDA, Raimundo César Alves 
de (Mestre Itapuan). Bimba, perfil do 
mestre. Salvador: CED-UFBA, 1982.
______. Bibliografia crítica da capoeira. 
Brasília: Defer, Centro de 
Informação e Documentação sobre 
a Capoeira – Cidoca/DF, 1993.
ARAÚJO, Rosângela Costa. O 
universo musical da capoeira angola. 
Salvador: Grupo de Capoeira 
Angola Pelourinho, Comissão de 
Documentação e Acervo, 1994. 
______. Sou discípulo que aprende, meu 
mestre me deu lição: tradição e educação 
entre os angoleiros baianos (anos 80-
90). Faculdade de Educação, 
Universidade de São Paulo, 1999. 
(Dissertação de mestrado)
AREIAS, Almir das. O que é capoeira?São Paulo: Brasiliense, 1984.
ASSUNÇÃO, Matthias 
Röhrig. Capoeira. The history 
131Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
of an Afro-brazilian martial art. 
Londres: Routledge, 2005.
AZEVEDO, Aluísio. O cortiço. Rio 
de Janeiro: Tecnoprint, s.d.
BARBIERI, César. Um jeito 
brasileiro de aprender a ser. Brasília: 
Defer, Centro de Informação 
e Documentação Sobre a 
Capoeira – Cidoca/DF, 1993.
______. Capoeira na universidade: uma 
trajetória de resistência. Salvador: 
SCT, Edufba, 2001.
BELTRÃO, Mônica. A capoeiragem 
no Recife antigo: os valentes de outrora. 
Recife: Nossa Livraria, 2007.
BOLA SETE, Mestre. A 
capoeira angola na Bahia. Rio de 
Janeiro: Pallas, 1997.
BRETAS, Marcos. “A queda do 
império da navalha e da rasteira 
(A República e os capoeiras)”. 
In: Estudos Afro-Asiáticos, 20. Rio 
de Janeiro: Centro de Estudos 
Afro-Asiáticos, 1991.
CANJIQUINHA. Alegria da capoeira. 
Salvador: A Rasteira, 1989.
CAMPOS, Hélio (Mestre 
Xaréu). Capoeira na escola. 
Salvador: Presscolor, 1990.
______. Capoeira na universidade: uma 
trajetória de resistência. Salvador: 
SCT, Edufba, 2001. 
CAPOEIRA, Nestor. O pequeno 
manual do jogador de capoeira. Rio 
de Janeiro: Ground, 1981.
CARNEIRO, Edison. Negros 
bantos: notas de etnografia religiosa 
e de folclore. Rio de Janeiro: 
Civilização Brasileira, 1936.
CARVALHO, Marcus. “Rumores e 
rebeliões. Estratégias de resistência 
escrava no Recife”. In: Revista Tempo, 
6(3). Niterói: Universidade Federal 
Fluminense, dezembro, 1998.
CASTELLUCCI, Aldrin A. 
Silva. Salvador dos operários: uma 
história da greve geral de 1919 na 
Bahia. Salvador: UFBA, 2001. 
(Dissertação de mestrado).
CASTRO, Maurício Barros 
de. Na roda do mundo: Mestre João 
Grande entre a Bahia e Nova York. 
São Paulo: Departamento de 
História Social (FFLCH-USP), 
2007. (Tese de doutorado)
CATUNDA, Eunice. “Capoeira 
no Terreiro de Mestre 
Waldemar”. In: Revista de Cultura 
Moderna, 30. São Paulo, 1952. 
CAVALCANTI, Nireu Oliveira. 
Crônicas históricas do Rio colonial. 
Rio de Janeiro: Civilização 
Brasileira-Faperj, 2004.
RECORTE DE IMAGEM 
DE MARCEL GAUTHEROT.
FOTO: MARCEL 
GAUTHEROT.
132Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
COUTINHO, Daniel. O ABC da 
capoeira angola: os manuscritos de Mestre 
Noronha. Brasília: Defer, Centro 
de Informação e Documentação 
sobre a Capoeira, 1993.
DAWSON, Daniel. Capoeira 
angola and Mestre João Grande: the 
saga of a tradition; the development of 
a master. Nova York, 1993.
DESCH OBI, T.J. “Combat and 
the crossing of the Kalunga”. 
In: HEYWOOD, L.M. Central 
Africans and cultural transformation in 
the American Diaspora. Cambridge: 
Cambridge University Press, 2002.
DECANIO, Ângelo. A herança 
de Pastinha: a metafísica da Capoeira. 
Salvador: Texto Mimeo, 1996. 
______. A herança de Mestre Bimba: lógicas e 
filosofias africanas da capoeira. Salvador, 
1996. (texto mimeografado)
______. “O processo de escolarização 
da capoeira no Brasil”. In: Revista 
Brasileira de Ciências do Esporte, v. 
16, n. 13, p.173-182. Santa 
Maria (RS), maio, 1995.
______. “Capoeira e/na 
educação física”. In: Revista 
SPRINT. Rio de Janeiro, nº 
79: 10-14, Jul/Ago, 1995.
______. A escolarização da capoeira. 
Brasília: Royal Court, 1996.
DIAS, Adriana Albert. Mandinga, 
manha & malícia – uma história sobre os 
capoeiras na cidade da Bahia (1910/1925). 
Salvador: Edufba, 2006.
______. A malandragem da mandinga: 
o cotidiano dos capoeiras em Salvador 
na República Velha (1910-1925). 
Salvador: UFBA, 2004. 
(Dissertação de mestrado)
______. “Os ‘fiéis’ da navalha: Pedro 
Mineiro, capoeiras, marinheiros e 
policiais em Salvador na República 
Velha”. In: Revista Afro-Ásia, 32. 
Salvador: CEAO, 2005. 
DIAS, Luís Sérgio. Quem tem 
medo da capoeira? Rio de Janeiro: 
Secretaria Municipal das 
Culturas, Departamento Geral 
de Documentação e Informação 
cultural, Arquivo Geral da 
Cidade do Rio de Janeiro, 
Divisão de Pesquisa, 2001.
DOSSAR, Kenneth. “Capoeira 
Angola: an ancestral connection?”. 
In: American Visions, 3, 1988. 
______. “Capoeira Angola: 
dancing between two worlds”. In: 
Afro-Hispanic Review, volume 
XI, numbers 1-3, 1992.
DOWNEY, Greg. Learning capoeira: 
Lessons in Cunning from an Afro-
Brazilian Art. Nova York: Oxford 
University Press, 2005.
133Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
EDMUNDO, Luiz. O Rio de Janeiro 
do meu tempo. Rio de Janeiro: 
Imprensa Nacional, 1938. 
FALCÃO, José Luiz Cirqueira. 
“A capoeira também educa”. 
In: Revista SPRINT, Ano X, n. 
54. Rio de Janeiro: 1991. 
______. A escolarização da “Vadiação”: a 
capoeira na Fundação Educacional do Distrito 
Federal. Rio de Janeiro: Escola de 
Educação Física e Desportos, UFRJ, 
1994. (Dissertação de mestrado).
FILHO, Alberto Heráclito 
Ferreira. “Desafricanizar as ruas: 
elites letradas, mulheres pobres 
e cultura popular em Salvador 
(1890-1937)”. In: Revista Afro-Ásia, 
21-22. Salvador: CEAO, 1998/9.
FREYRE, Gilberto. Sobrados e 
Mucambos. São Paulo: Global, 2006. 
FREIRE, Roberto “É luta, é 
dança, é capoeira”. In: Realidade. 
São Paulo, fevereiro, 1967.
 
FRIJERIO, Alejandro. “Capoeira: 
de arte negra a esporte branco”. In: 
Revista Brasileira de Ciências sociais, 10(4), 
junho. Rio de Janeiro, 1989.
______. “Artes negras: uma 
perspectiva afrocêntrica”. In: Revista 
Estudos Afro-Asiáticos, 23. Rio de 
Janeiro: Centro de Estudos Afro-
Asiáticos (CEAA), dezembro, 1989.
GIL, Gilberto. Brasil, paz no 
mundo. Disponível em http://
www2.cultura.gov.br
GLASGOW, Roy. Nzinga – Resistência 
africana à investida do colonialismo 
português em Angola, 1582 -1663 . 
São Paulo: Perspectiva, 1982. 
GOMES, Flavio dos Santos. 
“No meio das águas turvas 
(racismo e cidadania no 
alvorecer da República: A 
Guarda Negra na Corte - 1888-
1889)”. In: Estudos Afro-Asiáticos, 
21. Rio de Janeiro, 1991. 
GRUPO de Capoeira Angola 
Pelourinho. Washington: 
Smithsonian Folkways 
Recordings, 1996. 
JOÃO PEQUENO, Mestre. Uma 
vida de capoeira. São Paulo, 2000.
LEWIS, J. Lowell. Ring of liberation. 
Deceptive Discourse in Brazilian 
Capoeira. Chicago: The University 
of Chicago Press, 1992. 
LIMA, L. A. N. & COSTA, 
Eduardo T. “Os jogos recreativos 
nas aulas de capoeira”. In: 
Gladson de Oliveira Silva. 
Capoeira. São Paulo: Centro 
de Práticas Esportivas da 
Universidade de São Paulo, 1991.
134Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
LIMA, Vivaldo da Costa & 
OLIVEIRA, Valdir F. “O 
candomblé da Bahia na década 
de 30”. In: Cartas de Édison Carneiro 
a Arthur Ramos – de 4 de janeiro de 
1936 a 6 de dezembro de 1938. São 
Paulo: Corrupio, 1987.
LOPES, Nei. O negro no Rio de 
Janeiro e sua tradição musical: partido-
alto, calango, chula e outras cantorias. 
Rio de Janeiro: Pallas, 1992.
LOUREIRO, Fábio Luiz. Capoeira 
na educação física escolar: princípios estéticos 
da capoeira e a formação da consciência 
crítica. Natal: UFRN, 1990. 
(Monografia de pós-graduação latu-
sensu em Educação Física Escolar)
MARINHO, Inezil Penna. 
Subsídios para a história da capoeiragem. 
Rio de Janeiro: SCP, 1956.
MORAES FILHO, Mello. 
“Capoeiragem e capoeiras 
célebres”. In: Festas e tradições 
populares no Brasil. Belo Horizonte/
São Paulo: Itatiaia/Edusp, 1979.
MOREIRA, Antônio (coord.). 
Canjiquinha, alegria da capoeira. 
Salvador: A Rasteira, 1989.
MOURA, Jair. Mestre Bimba: a 
crônica da capoeiragem. Salvador: 
Fundação Mestre Bimba, 1991.
NETO, Coelho “O nosso jogo”. 
In: Bazar. Porto: Chardron, 1928.
OLIVEIRA, Josivaldo Pires de. No 
tempo dos valentes: os capoeiras na cidade da 
Bahia. Salvador: Quarteto, 2005.
OLIVEIRA, Valdemar de. Frevo, 
capoeira e passo. Recife: Companhia 
Editora de Pernambuco, 1985.
PASTINHA, Mestre. Capoeira 
Angola. Salvador: Fundação Cultural 
do Estado da Bahia, 1988.
______. A herança de Mestre Pastinha: 
manuscritos e desenhos. Estatutos do 
Centro Esportivo de Capoeira Angola. 
Coleção São Salomão 2, s.d.
PEREIRADA COSTA, Francisco 
Augusto. “Folclore pernambucano: 
subsídios para a história da 
poesia popular em Pernambuco”. 
In: Separata da Revista do Instituto 
Histórico e Geográfico Brasileiro, tomo 
LXX. Rio de Janeiro, 1908. 
PIRES, Antônio Liberac C. 
S. Bimba, Pastinha e Besouro de 
Mangangá. Três personagens da capoeira 
baiana. Tocantins/Goiânia: 
Neab/Grafset, 2002.
______. A capoeira na Bahia de Todos os 
Santos. Um estudo sobre cultura e classes 
trabalhadoras (1890-1937). Tocantins/
Goiânia: Neab/Grafset, 2004.
______. A capoeira no jogo das cores: 
criminalidade, cultura e racismo na 
135Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
cidade do Rio de Janeiro (1890-1937). 
Campinas: Departamento de 
História da Unicamp, 1996. 
(Dissertação de mestrado)
______. Movimentos da cultura afro-
brasileira – a formação histórica da 
capoeira contemporânea (1890-1950). 
Campinas: Instituto de Filosofia e 
Ciências Humanas da Universidade 
Estadual de Campinas, 2001. 
(Tese de doutorado)
QUERINO, Manuel. A Bahia de 
outrora. Salvador: Progresso, 1955. 
______. Costumes africanos no Brasil. 
Recife: Fundação Joaquim 
Nabuco-Massangana, 1988.
RABELLO, Evandro. Memórias 
da folia: O Carnaval do Recife 
pelos olhos da imprensa. Recife: 
Funcultura, 2004.
REAL, Katarina. O folclore 
no Carnaval de Recife. Rio de 
Janeiro: MEC, 1967. 
REGO, Waldeloir. Capoeira 
angola – ensaio sócio-etnográfico. 
Salvador: Itapuã, 1968. 
REIS, Letícia Vidor de Souza. 
O mundo de pernas para o ar: a 
capoeira no Brasil. São Paulo: 
Publisher Brasil, 2000.
______. “Mestre Bimba e Mestre 
Pastinha: a capoeira em dois 
estilos”. In: SILVA, Vagner 
Gonçalves (org.). Artes do 
corpo. São Paulo: Selo Negro, 
Coleção Memória Afro-
Brasileira, v. 2, 2004.
RUGENDAS, Johann Moritz. 
Viagem pitoresca através do Brasil. 
Belo Horizonte/São Paulo: 
Itatiaia/Edusp, 1981.
SALVADORI, Maria Ângela 
Borges. Capoeira e malandros. Pedaços 
de uma tradição popular (1890-1950). 
Campinas: Instituto de Filosofia e 
Ciências Humanas da Universidade 
Estadual de Campinas, 1990. 
(Dissertação de mestrado).
SANTOS, L. S. Educação, educação 
física e capoeira. Curitiba: Imprensa 
Universitária de Maringá, 1990.
SANTOS, Marcelino dos. 
Capoeira e mandingas: Cobrinha Verde. 
Salvador: A Rasteira, 1991.
SETTE, Mário. Maxambombas e 
maracatus. Recife: Fundação de 
Cultura da Cidade do Recife, 1981.
SILVA, Antônio de Moraes. 
Dicionário da Língua Portuguesa. 
Rio de Janeiro: Empresa 
Literária Fluminense de A. 
A. da Silva Lobo, 1890.
SILVA, Eduardo. As camélias do 
Leblon e a abolição da escravatura: 
uma investigação de história cultural. 
São Paulo: Companhia 
das Letras, 2003.
136Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
SOARES, Carlos Eugênio Líbano. 
A negregada instituição: os capoeiras na 
Corte Imperial (1850 – 1890). Rio 
de Janeiro: Access, 1999.
______. A capoeira escrava e outras 
tradições rebeldes no Rio de Janeiro (1808-
1850). Campinas: Unicamp, 2001. 
SODRÉ, Muniz. Mestre 
Bimba: corpo de mandinga. Rio de 
Janeiro: Manati, 2002.
______. A verdade seduzida: por um 
conceito de cultura no Brasil. Rio 
de Janeiro: DP&A, 2005. 
______. Brasil, o simulado e o real: 
ensaios sobre o cotidiano nacional. Rio 
de Janeiro: Rio Fundo, 1991. 
TAVARES, Júlio César. Dança da 
Guerra: arquivo-arma. Universidade 
de Brasília, 1984. (Dissertação 
de mestrado, Sociologia)
TEIXEIRA, Carlo Alexandre. 
O imaginário poético da capoeira 
angola: a performance de um 
universo paralelo. Faculdade de 
Comunicação, IACS-UFF, 2001. 
(Dissertação de mestrado)
TRAVASSOS, Sônia Duarte. Capoeira: 
difusão e metamorfose culturais entre Brasil e 
EUA. Rio de Janeiro: Departamento 
de Antropologia do Museu Nacional, 
Universidade Federal do Rio de 
Janeiro, 2000. (Tese de doutorado)
VASSALLO, Simone Pondé. 
“Capoeiras e intelectuais: a 
construção coletiva da capoeira 
‘autêntica’ ”. Estudos Históricos, 
32. Rio de Janeiro, 2003. 
VIANNA, Antônio. Casos e coisas da 
Bahia. Salvador: Fundação Cultural 
do Estado da Bahia, 1984.
______. Quintal de Nagô e outras 
crônicas. Salvador: Centro de 
Estudos Baianos, UFBA, 1979.
VIEIRA, Luís Renato. O jogo da 
capoeira: corpo e cultura popular no 
Brasil. São Paulo: Itapuã, 1968.
______. Da vadiação à regional: 
uma interpretação da modernidade 
cultural no Brasil. Faculdade 
de Sociologia, UnB, 1990. 
(Dissertação de mestrado)
VIEIRA, Sergio Luiz de Souza. 
Da capoeira como patrimônio 
cultural. PUC-SP, 2004 (Tese...)
______ e ASSUNÇÃO, Matthias 
R. “Mitos, controvérsias e 
fatos: construindo a história 
da capoeira”. In: Estudos Afro-
Asiáticos (34):81-121. Dez/1998.
VITA, Marcos. “Ginga na Casa 
Branca”. In: Correio da Bahia. 
Salvador, 7 de julho de 2001. 
Caderno Aqui Salvador. ¢
RODA DE CAPOEIRA – 
INSTRUMENTOS.
FOTO: PIERRE VERGER@
FUNDAÇÃO PIERRE 
VERGER.
137Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
138Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Trata-se de processo cujo objetivo é o registro da capoeira 
como patrimônio cultural do 
Brasil. A abertura do processo 
por solicitação do Presidente do 
Iphan, em 17 de fevereiro de 2006, 
culminou gestões, de iniciativas 
diversas, que se encontram 
devidamente consignadas, para 
sua inclusão no registro do 
patrimônio imaterial brasileiro. 
A instrução do processo 
mostra-se extensa e abrangente, 
compreendendo material 
diversificado, como teses e outros 
textos acadêmicos sobre o assunto, 
depoimentos de capoeiristas, 
memórias de encontros, inclusive 
específicos sobre sua inclusão 
como patrimônio cultural, a 
publicação Inventário para Registro e 
Salvaguarda da Capoeira como Patrimônio 
Cultural do Brasil e pareceres técnicos, 
como o da antropóloga do Iphan, 
Maria Paula Fernandes Adinolfi 
e o da Procuradoria Federal no 
Iphan – o primeiro relativo ao 
mérito da proposta, o segundo 
sobre seus aspectos legais. 
Seguiu-se todo o iter 
processual, cujos últimos passos 
foram os mencionados pareceres 
técnicos, com manifestação 
favorável e o despacho da gerente 
de Registro do Departamento de 
Patrimônio Imaterial no mesmo 
sentido, propondo a dupla 
inscrição, da Roda de Capoeira 
no Livro das Formas de Expressão 
e do Ofício dos Mestres de 
Capoeira no Livro dos Saberes. 
O parecer da Procuradoria 
Federal no Iphan reconhece a 
relevância da proposta com base 
no parecer técnico precedente, 
recomendando a observância das 
normas referentes à publicação, o 
que se deu pelo Aviso publicado 
no Diário Oficial de 13 de 
junho de 2008. Seguiu-se o 
Anexo 1
Parecer do 
relator
Processo 
N° 01450.002863/2006-80
Registro dos Bens Culturais 
de Natureza Imaterial
Roda de Capoeira e Ofício dos 
Mestres de Capoeira
139Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
encaminhamento do Presidente do 
Iphan ao Conselho Consultivo. 
Na presente relatoria, foram 
considerados basicamente dois 
juízos, o de pertinência em relação 
aos objetivos do patrimônio 
imaterial e o de relevância da 
matéria. Quanto ao primeiro 
aspecto, deve ser registrado que 
o Patrimônio Cultural Brasileiro 
encontra-se constituído, segundo 
o art. 216 da Constituição Federal, 
pelos “bens de natureza material e 
imaterial, tomados individualmente 
ou em conjunto, portadores 
de referência à identidade, à 
ação, à memória dos diferentes 
grupos formadores da sociedade 
brasileira, nos quais se incluem: 
I- as formas de expressão; II- os 
modos de criar, fazer e viver; III- 
as criações científicas, artísticas e 
tecnológicas; IV- as obras, objetos, 
documentos, edificações e demais 
espaços destinados às manifestações 
artístico-culturais; V- os 
conjuntos urbanos e sítios de valor 
histórico, paisagístico, artístico, 
arqueológico, paleontológico, 
ecológico e científico”. 
Posteriormente, o patrimônio 
imaterial seria contemplado em 
legislação específica, como o 
Decreto n° 3.551, de 2000, pelo 
qual se instituiu o Registrode Bens 
Culturais de Natureza Imaterial, 
com seus respectivos Livros de 
Registro, a saber, Livro de Registro 
dos Saberes, das Celebrações, das 
Formas de Expressão e dos Lugares. 
A legislação brasileira acompanhou 
tendência mundial, cujo foro mais 
expressivo foram as reuniões da 
Unesco, procurando contemplar, 
ao lado da preservação dos bens 
materiais, aqueles de características 
imateriais ou intangíveis. 
A par da legislação, esse 
movimento corresponde a uma 
crescente tomada de consciência, 
RODA DE MESTRE VALMIR – 
FICA BAHIA.
FOTO: TT CATALÃO – 
ACERVO TÉCNICO IPHAN.
140Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
no âmbito cultural e científico, do 
significado de questões como as 
da memória social e da identidade 
cultural, particularmente presentes 
em manifestações como a capoeira. 
Mas, o que é a capoeira e qual 
a pertinência em considerá-la 
patrimônio cultural imaterial? 
O tema já foi extensamente 
tratado no âmbito acadêmico e fora 
dele, e o próprio processo, além do 
inventário publicado, relaciona os 
principais textos que lhe desenham 
os traços históricos, antropológicos 
e estéticos. Entretanto, podemos 
nos referir a duas autoridades, por 
todos. Câmara Cascudo define a 
capoeira como “jogo atlético de 
origem negra, introduzido no Brasil 
pelos escravos bantos de Angola, 
defensivo e ofensivo, espalhado pelo 
território e tradicional no Recife, 
cidade do Salvador e Rio de Janeiro, 
onde são recordados os mestres, 
famosos pela agilidade e sucessos. 
(...) No Rio de Janeiro e Recife a 
capoeira é jogo de rua... com uma 
nomenclatura especial para os golpes 
(...) Na Bahia, o capoeira luta com 
adversários, mas possui um aspecto 
particular e curioso, exercitando-se 
amigavelmente, ao som de cantigas 
e instrumentos de percussão...”. 
Muniz Sodré diz que “O 
ritmo e o rito dão vida e alma à 
capoeira. São eles que favorecem a 
epifania dos corpos em movimento, 
trazendo beleza atlética para 
o gingado e para a execução 
harmoniosa dos golpes e balões. 
Não se trata, portanto, de mero 
esporte, nem de mera técnica de 
defesa e ataque, mas de um jogo, 
isto é, uma totalidade articulada 
de formas inventadas...”. 
Nas duas definições estão 
presentes a luta, o canto, a dança 
e a música, mas o traço mais 
importante é o que aparece no final 
da definição de Muniz Sodré e no 
início da de Câmara Cascudo: o 
jogo. A capoeira é essencialmente 
um jogo, no que a expressão tem 
de mais intrinsecamente humana. 
Quando o historiador holandês 
Johan Huizinga escreveu sua 
obra clássica Homo ludens, desde 
logo explicitou que não estava 
interessado no conhecimento 
do elemento lúdico na cultura, 
como se ele fosse apenas uma 
expressão humana entre outras, 
mas considerava o elemento 
lúdico da cultura, aquilo que 
expressava algo inerente à condição 
humana e às suas manifestações, 
que são, todas elas, culturais. 
A cultura tem, assim, como um 
de seus atributos, a ludicidade. E 
a capoeira, sobretudo por ser um 
jogo, sublinha particularmente 
esta ludicidade, cuja regulação 
interna e cuja exteriorização 
correspondem a formas de 
expressão, a criações artísticas e 
RODA DE CAPOEIRA.
FOTO: ACERVO 
TÉCNICO DO IPHAN.
141Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
a modos (particulares) de criar, 
viver e fazer. Estão cumpridos 
três requisitos constitucionais – e 
não apenas um – para que seja 
pertinente a admissão da capoeira 
como bem cultural imaterial. 
Quanto à relevância da capoeira 
como patrimônio imaterial, dois 
aspectos podem ser considerados: 
o do seu significado sociocultural 
e o do seu reconhecimento, ou 
de sua recepção. A percepção 
do significado sociocultural de 
um fenômeno como a capoeira 
começa por uma preliminar, a do 
reconhecimento da multiplicidade 
de seus aspectos, o que vale 
dizer que qualquer abordagem 
do tema é necessariamente 
complexa. Reduzi-lo a um ou 
outro aspecto é necessariamente 
empobrecer nosso entendimento. 
Essa multiplicidade se revela 
de diferentes formas. Quanto à 
sua finalidade, ela é jogo, esporte, 
técnica de defesa pessoal, ritmo, 
dança, espetáculo. Quanto à sua 
caracterização, ela pressupõe 
aspectos absolutamente próprios, 
que a distinguem de outros 
jogos, esportes, técnicas ou 
espetáculos, mas também implica 
diferenças regionais e temporais 
importantes, como a Capoeira 
Regional, a Capoeira de Angola 
ou a capoeira contemporânea. 
Quanto à sua incidência 
geográfica, embora nacionalmente 
distribuída, adensa-se no Rio 
de Janeiro, em Recife e em 
Salvador. Se o critério escolhido 
for socioantropológico, então é 
preciso sublinhar que, se na Bahia 
constituiu-se frequentemente em 
ponto de apoio para a identidade 
negra, no Rio de Janeiro 
disseminou-se pelas camadas 
pobres em geral, sem vínculos 
étnicos mais específicos. Admitir 
de antemão a multiplicidade de 
aspectos da capoeira tem, pelo lado 
afirmativo, o mérito de alargar sua 
compreensão, sublinhando-lhe 
as nuances. Pelo lado contrário, 
o de questionar aquilo que já 
foi chamado de “mitificação 
da capoeira”, desconstruindo 
afirmações como a das “origens 
remotas”, a de uma suposta 
“unidade” e até a da “queima dos 
arquivos” sobre a escravidão. 
Nos dois primeiros casos, estão 
em questão, como em quase todos 
os mitos, a ilusão da antiguidade 
– quanto mais antigo, mais 
respeitável – e a ilusão da essência 
– existe uma pureza essencial e 
originária, a cujo retorno a prática 
contemporânea deve aspirar. 
No episódio da “queima dos 
arquivos”, a equivocada impressão 
de que um decreto do governo 
provisório da República, baixado 
com o objetivo de dificultar a 
tramitação de ações indenizatórias 
142Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
de ex-proprietários de escravos, 
eliminou a documentação sobre 
a escravidão e por extensão 
situações a ela associadas. 
A capoeira é, portanto, 
relevante na vida brasileira por 
pelo menos três aspectos. Ela é 
uma prática de sociabilidade. 
Como jogo, e nas suas diferentes 
configurações, a capoeira induz 
à socialização, à cooperação e à 
hierarquização, explicitando, 
também, uma ética perfeitamente 
codificada. Como diz a antropóloga 
do Iphan Maria Paula Fernandes 
Adinalfi, no parecer 31/2008 
incluído no processo, sob esse 
aspecto, a capoeira representa “a 
formação de redes de sociabilidade 
e constituição da identidade e 
da autoestima de grupos afro-
brasileiros, (...) a convivência 
respeitosa e harmoniosa entre 
diferentes grupos étnico-
raciais, etários e de gênero, no 
País e fora dele, promovendo, 
mais que uma ideologia, uma 
prática de diversidade cultural 
e de combate ao racismo e 
outras formas de preconceito 
(...) a socialização de crianças e 
jovens e o desenvolvimento de 
formas de ensino-aprendizagem 
capazes de envolver múltiplas 
dimensões de sua formação (física, 
psíquica, ética, efetiva, lúdica)”. 
Ela é uma prática cultural. 
A capoeira constitui-se num 
referencial do legado cultural 
africano, especialmente bantu, no 
cadinho heterogêneo da formação 
brasileira. Mas, como prática 
cultural historicamente ativa, 
ela se modifica no curso de sua 
historicidade, gerando as formas 
regionais e a “contemporânea”. 
Os elementos constitutivos da roda 
são talvez o principal aspecto dessa 
prática, já que envolvem dança, 
canto, toque de instrumentos, 
luta, golpes, brincadeiras, 
rituais e símbolos. Mas a eles se 
acrescentam o ofício de mestre de 
capoeira, supondo conhecimentos 
e habilidades específicas e sua 
instrução aos neófitos. 
Este ofício, por sua vez, com 
seu “mestre”, remete ao papel 
desta figura medieval (o mestre de 
ofícios) em outras manifestações 
culturais que se estendem do Brasil 
colonial ao contemporâneo, como 
o mestre das festas do Divino ou 
da Folia de Reis, entre outros. 
Por isso, a capoeira constitui-se 
também uma visão de mundo, 
que se expressa em diferentes 
configurações, como a lúdica, a 
estética, a física e a desportiva.Africanidade, historicidade, 
sobrevivência estrutural no tempo 
e visão de mundo dão forma 
à prática cultural da capoeira, 
assegurando-lhe a personalidade. 
Ela é uma estratégia identitária. 
143Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Certamente atribuir à 
capoeira o caráter de jogo ou 
mesmo “luta nacional brasileira” 
é cair num exagero nacionalista. 
Desde os estudos do antropólogo 
Melville Herskovits, na década 
de 1940, mostrou-se a relação 
da capoeira com “danças 
de combate” semelhantes, 
encontradas em diferentes 
culturas da África e da própria 
América. Entretanto, isso 
não significa elidir o fato de 
que, em diferentes momentos 
da história brasileira, a 
capoeira constituiu-se como 
uma estratégia identitária de 
grupos étnicos, inclusive de 
resistência negra e como tal 
foi percebida não só por seus 
praticantes, como por aqueles 
que procuraram reprimi-los. 
Por esse fato e pela 
disseminação da capoeira ao 
longo do século 20, ela sem 
dúvida contribuiu e contribui 
para a identidade nacional 
brasileira, sendo um de seus 
traços marcantes e expressando-
se como tal em variados 
aspectos da produção cultural, e 
particularmente artística, do país. 
Por último, mas não menos 
significativo ou verdadeiro, a capoeira 
tem especial reconhecimento e 
recepção em diferentes universos. 
A adesão social é característica 
primordial desse reconhecimento/
recepção. De prática social e 
etnicamente restrita, e condenada, 
à prática social e transversalmente 
disseminada na sociedade, 
transcorreram algumas gerações, 
mas é a realidade moderna. O 
interesse acadêmico que despertou, e 
desperta, tornou-a objeto de estudo 
de antropólogos, historiadores, 
comunicadores, pedagogos e 
especialistas em educação física, 
entre outras especialidades. 
Saindo do limbo das 
instituições oficiais, desde 
o governo Vargas, chegou a 
elemento de política pública, com 
a formulação de um programa 
no âmbito do Ministério da 
Cultura, cujos elementos são, 
entre outros, o reconhecimento 
da capoeira como patrimônio 
cultural imaterial brasileiro e a 
valorização do saber dos mestres 
de capoeira, de que aqui se trata. 
* * * Pelo exposto, o parecer 
é favorável à inscrição da Roda de 
Capoeira no Livro de Registro 
das Formas de Expressão e do 
Ofício dos Mestres de Capoeira 
no Livro de Registro dos Saberes.
Salvador, 15 de julho de 2008.
Arno Wehling
Membro do Conselho 
Consultivo do Iphan
RODA DE MESTRE VALMIR 
– FICA BAHIA.
FOTO: TT CATALÃO – 
ACERVO TÉCNICO IPHAN.
144Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Anexo 2
certidão de 
registro 
da Roda de 
Capoeira
145Roda de Capoeira e Ofício dos Mestres de Capoeira { }dossiê iphan 12
Anexo 3
Certidão de 
registro do 
Ofício dos 
Mestres de 
Capoeira
Este livro foi produzido no verão 
de 2014 para o Instituto do 
Patrimônio Histórico e Artístico 
Nacional.
Foi composto nas tipografias 
Rosewood (títulos) e Mrs Eaves 
(textos), corpo 12/14.4, em papel 
couché matte 150 g/m (miolo).
DaDos InternacIonaIs De catalogação
na PublIcação (cIP)
bIblIoteca aloísIo Magalhães, IPhan
r685 roda de capoeira e ofício dos mestres de capoeira / Instituto 
do Patrimônio histórico e artístico nacional. – brasília, 
DF : Iphan, 2014.
148 p. : il. color. ; 25 cm. – (Dossiê Iphan ; 12)
I s b n : 9 7 8 - 8 5 - 7 3 3 4 - 2 5 8 - 1
 1. Patrimônio Imaterial. 2. capoeira. I. Instituto do 
Patrimônio histórico e artístico nacional. II. série.
 c c D 7 9 3 . 3 1

Mais conteúdos dessa disciplina