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Natalia Quintino Dias Diabetes mellitus (DM) O Diabetes Mellitus (DM) é uma doença metabólica, decorrente da incapacidade da insulina de exercer adequadamente seus efeitos, seja por diminuição dos níveis séricos, ou por resistência à sua ação. Definição: grupo de doenças metabólicas caracterizadas por hiperglicemia crônica associada a defeitos no metabolismo intermediário. O DM se dá diante de um desequilíbrio metabólico, que leva ao excesso de glicose na circulação. Metabolismo intermediário X hiperglicemia O balanço entre anabolismo e catabolismo na regulação da glicemia se traduz na disputa entre insulina vs. hormônios contrarregulatórios (glucagon, adrenalina, cortisol e GH/IGF-1). Insulina A regulação da liberação da insulina é feita pelo GLUT-2 — transportador de glicose que “ajuda” o pâncreas a detectar a variação glicêmica —, quando a glicose entra no pâncreas, ocorre uma cascata de reações. Natalia Quintino Dias A: fosforilação da glicose em glicose-6-fosfato (por ação da glucoquinase), permitindo entrar no ciclo de Krebs e formar ATP. B: O ATP ativa os canais de potássio sensíveis a ATP, levando à despolarização da membrana plasmática. C: há ativação dos canais de cálcio sensíveis à voltagem da membrana plasmática e, com isso, a passagem desse cátion do meio extra para o intracelular. D: ativação das proteínas dos grânulos secretórios de insulina, com sua secreção de forma “racional” pelas células beta pancreáticas. Na circulação periférica, a insulina é responsável pela ativação do GLUT-4, canal transportador de glicose na maior parte dos órgãos. Principais GLUTs e suas funções GLUT 1: hemácias, placenta e feto (não mediada por insulina). GLUT 2: células betapancreáticas, fígado (não mediada por insulina). GLUT 3: entrada de glicose nos neurônios (não mediada por insulina). GLUT 4: transportadores insulina-dependente, mais abundante nas membranas celulares do músculo esquelético, cardíaco e tecido adiposo. A insulina estimula o anabolismo em todas as vias: - Proteínas: síntese proteica. A insulina é um dos hormônios mais anabólicos do corpo! Tanto que, alguns “loucos”, utilizam desse artifício para ganho de massa muscular, ou seja, mesmo sem DM, fazem uso desse hormônio para hipertrofia — até funciona… mas é altíssimo o risco de hipoglicemia, convulsões e até óbito! - Lipídeos: lipogênese, por meio da conversão do acetil-CoA em malonil-CoA, para a síntese de ácidos graxos. A falta de insulina faz com que o acetil-CoA não seja convertido em malonil- -CoA, e sim em corpos cetônicos: acetoacetato, beta-hidroxibutirato e acetona — resultando na cetoacidose diabética (CAD)! Essa via não sofre resistência insulínica, por isso é tão raro um DM2 com essa complicação. - Carboidratos: glicogenogênese = síntese de glicogênio hepático e muscular. Incretinas As principais incretinas são os hormônios GLP-1, produzidos pelas células L, no íleo e no cólon, e o GIP, sintetizado pelas células K, no duodeno e na primeira porção do jejuno. Esses hormônios “conversam” com o pâncreas, estimulando a produção da insulina e têm efeitos sacietógenos no hipotálamo (redução da ingestão alimentar). O portador de DM2 tem menor efeito incretínico e esta via é alvo de duas classes de medicamentos - inibidores de DPP4 e agonistas do receptor de GLP1. Outro hormônio importante para o controle glicêmico é a amilina, secretada pelas células beta, junto à insulina. Ela “informa” ao intestino que o pâncreas entendeu que existe alimento no trato gastrointestinal e “reforça” que não é necessário mais comida; como resposta, ocorre a redução do esvaziamento gástrico, além de aumento da saciedade, com diminuição da liberação do glucagon (evitando aumentos excessivos de glicemia). Em situações de resistência insulínica, o pâncreas secreta mais insulina e, consequentemente, mais amilina. O excesso de amilina deposita-se sob forma de depósitos de substâncias amiloides no pâncreas e sistema nervoso central, levando à falência pancreática e aumentando o risco de doença de Alzheimer, respectivamente. Hormônios contrarreguladores Os hormônios contrarreguladores (glucagon, adrenalina, cortisol, GH/IGF1) têm efeitos opostos ao da insulina sobre a glicemia, ou seja, são hiperglicemiantes. Eles estimulam as reações de aumento de glicose, tendo a via final comum no fígado, por meio da gliconeogênese — síntese hepática de glicose a partir de moléculas não glicídicas (lactato dos músculos, glicerol do tecido adiposo e aminoácidos da proteólise celular). Para isso acontecer, os principais processos são: - Catabolismo dos lipídios: lipólise — quebra dos triglicérides, liberando ácidos graxos livres. - Catabolismo das proteínas: proteólise — quebra de proteínas em aminoácidos. Essa é uma das razões da perda de peso na falta de insulina. Natalia Quintino Dias Diagnóstico A única situação que não precisamos de confirmação é se glicemia ≥200 mg/dL com sintomas. As principais manifestações clínicas da hiperglicemia são os 4 P’s: - poliúria; - polidipsia; - polifagia; - perda de peso; - turvação visual; - complicação aguda (cetoacidose ou estado hiperosmolar hiperglicêmico); - tendência a infecções: candidíase vaginal, balanopostite, infecções cutâneas; e/ou dificuldade de cicatrização. Pode-se confirmar a medida alterada com outra modalidade de exame. Por exemplo, se glicemia de jejum 155 mg/ dL e em outra coleta o paciente tem hemoglobina glicada (HbA1c) 7,7%, está feito o diagnóstico. HBA1C A hemoglobina glicada é uma estimativa da média glicêmica dos últimos 90 dias (sendo 50% do último mês). Ela reflete o controle glicêmico, pois a HbA1c é a parte da hemoglobina que reage de forma não enzimática com a glicose, ou seja, quanto maior o percentual de HbA1c, maior a glicemia nesse período. Fórmula: glicemia média = 28,7 x A1C – 46,7. Há circunstâncias que podem alterar falsamente a HbA1c. Isso pode ocorrer em situações em que há mudanças na meia-vida das hemácias. - Aumento do turnover das hemácias = HbA1c mais baixa, já que as hemácias permanecem em circulação durante um período MENOR que o habitual, sendo assim, são menos "glicadas". - Redução do turnover = HbA1c mais alta, permanecem em circulação durante um período MAIOR que o habitual, sendo assim, são mais "glicadas". Proteínas glicadas (frutosamina e albumina) Esses exames têm o mesmo racional da HbA1c, mas estimam um período menor, refletindo as últimas 2-3 semanas (meia-vida da maior parte das proteínas). No entanto, a correlação com complicações microvasculares do diabetes ainda não foi tão bem definida por esse método; logo, ele não é utilizado para diagnóstico, somente para seguimento. 1,5 Anidroglucitol (1,5AG) sérico O 1,5AG é excretado via renal por meio da glicosúria (que ocorre geralmente quando glicemia >180 mg/dL). Quanto mais alto o 1,5AG, melhor o controle glicêmico. Pouco disponível na prática clínica. Natalia Quintino Dias Classificação O DM é dividido em quatro grupos, de acordo com sua base fisiopatológica: -> Diabetes autoimune – tipo 1 ou LADA (Diabetes Autoimune Latente do Adulto): destruição autoimune de células beta, levando à deficiência absoluta de insulina. -> Diabetes tipo 2: relacionado à síndrome metabólica e à resistência à ação da insulina. Evolutivamente, ocorre também perda progressiva da secreção de insulina. -> Diabetes Mellitus gestacional: diabetes identificado no 2º ou 3º trimestre de gravidez na mulher, sem que haja evidência do diagnóstico antes da gestação. -> “Outros tipos” específicos de diabetes por diversas causas: síndrome de diabetes monogênica (como diabetes neonatal e diabetes de início na maturidade dos jovens — MODY), doençasde pâncreas exócrino (como fibrose cística e pancreatite crônica) e medicamentos (como o uso de glicocorticoides, tratamento de HIV/AIDS, ou após transplante de órgão). Diabetes tipo 1 A forma autoimune do DM inclui o tipo 1A (decorrente da destruição seletiva autoimune das células beta das ilhotas de Langerhans pancreáticas), tipo 1B (idiopático) e o LADA (Diabetes Autoimune Latente do Adulto). O DM1 acomete principalmente crianças e adolescentes, sendo responsável por 85-90% dos casos de diabetes na infância. O LADA diferencia-se do DM1 por incidir, geralmente, em adultos (>30/35 anos) e pelo bom controle sem insulina por, ao menos, 6 meses após a abertura do quadro (período conhecido como "Lua de mel"). Inclusive, esse é o critério diagnóstico mais relevante, já que existem diversos relatos de idosos que abrem quadro de DM1. Nesse caso, o que vai diferenciar as 2 situações é que no DM1 a "lua de mel" SEMPRE será menor que seis meses. Patogênese A evolução do DM1 é dividida em 4 fases: - Pré-clínica: HLA de risco e/ou anticorpo positivo. - Início clínico: hiperglicemia grave e abrupta, com necessidade precoce de insulina. - Remissão transitória: período de “lua de mel” — período de até seis meses em que o portador de DM1 pode voltar a apresentar secreção endógena de insulina, com bom controle. - Diabetes estabelecido. Autoanticorpos O DM1 é marcado pela insulite linfocitária autoimune mediada por linfócitos T, com invasão de células mononucleares nas ilhotas pancreáticas e produção de autoanticorpos contra antígenos pancreáticos, como: - anticorpo anti-ilhotas (ICA); - anti-insulina (IAA); - antidescarboxilase do ácido glutâmico (anti- - GAD65); - antitirosina fosfatase (anti-IA2); e - antitransportador de zinco 8 (ant-ZnT8). Os autoanticorpos antecedem o diagnóstico em vários anos e estão presentes em 80-90% dos pacientes no início do quadro. Seus títulos reduzem com o passar do tempo, permanecendo positivos em menos que 30% dos pacientes após 20 anos do diagnóstico. Pessoas com DM1 têm maior risco de outras doenças autoimunes, como tireoidite de Hashimoto, doença de Graves, doença de Addison, miastenia gravis, doença celíaca, anemia perniciosa, entre outras. Natalia Quintino Dias Suscetibilidade genética É mediada principalmente pelo HLA (Antígeno leucocitário humano), no complexo principal de histocompatibilidade. Como o HLA tem forte componente de hereditariedade, existe uma chance maior de alguém desenvolver DM1 se houver história familiar positiva, sendo variável conforme o parentesco: Mãe: 4%; Pai: 8%; Irmão: 10%; ambos os pais: 30%; e Irmãos gêmeos: 25-50%. Apesar de haver maior chance de abrir DM1 se houver antecedente familiar, contrariando a cultura popular, a aglomeração familiar no DM1 é menos frequente que o DM2: 5 % vs. 75%, respectivamente. Traduzindo, a cada 100 pacientes com DM1, somente 5 têm alguém na família com o mesmo diagnóstico (embora, na população geral, a prevalência seja menor que 0,5%), enquanto no DM2, a cada 100 pessoas com esse diagnóstico, 75 têm alguém na família com DM2 (na população geral é cerca de 7,5%). Fatores ambientais O fator genético sozinho não é determinante do desenvolvimento de DM1, está associado a algum fator ambiental. Os principais “suspeitos” são: - Diminuição da exposição bacteriana em fases iniciais da vida: comprometendo a programação do sistema imunológico e favorecendo as respostas autoimunes e alérgicas. - Infecções: vírus Coxsackie B, rubéola, citomegalovírus e até coronavírus (incluindo a covid-19). - Toxinas e metais pesados: pesticidas, nitrato, mercúrio e cádmio. - Recém-nascidos pequenos para a idade gestacional (PIG): o crescimento e o ganho de peso rápidos na infância podem sobrecarregar e induzir ao estresse metabólico das células beta, aumentando, assim, a sensibilidade delas ao processo autoimune. - Fatores psicossociais. Diabetes tipo 2 O mecanismo fisiopatológico preponderante no DM2 é a resistência à ação da insulina (RI), que pode levar à perda progressiva de secreção de insulina de células beta pancreáticas. É a principal causa de DM, sendo responsável por 90% dos diagnósticos. A incidência e prevalência vem crescendo exponencialmente (devido ao aumento da expectativa de vida, obesidade, consequência de maus hábitos alimentares e sedentarismo). Fisiopatologia A Resistência Insulínica (RI), além de levar à menor captação e utilização da glicose por tecidos periféricos (ex.: músculo esquelético), faz com que haja menor inibição da lipólise e da gliconeogênese hepática, ou seja, o fígado não percebe a glicose e, com isso, aumenta a produção desta - a normalização dessa via patogênica é um dos principais mecanismos da metformina. Resistência insulínica= É o mau funcionamento de enzimas relacionadas à transdução do sinal da insulina; assim, o receptor de insulina, em vez de fosforilar a tirosina, ativa a serina, diminuindo a translocação do GLUT4 para a membrana celular e, portanto, prejudica a eficácia da captação de glicose pelos tecidos periféricos. Além da RI, há também a perda progressiva de secreção de grande parte das ilhotas pancreáticas mediada por: - Depósito pancreático de amilina: polipeptídeo amiloide armazenado com a insulina nos grânulos de secreção das células beta. Seu acúmulo leva à apoptose celular. - Hiperglicemia crônica: glicotoxicidade. - Hiperlipidemia: lipotoxicidade (a RI leva ao aumento de ácidos graxos circulantes devido ao aumento da lipólise, que por sua vez aumenta a RI). Fatores de risco Situações relacionadas à síndrome metabólica, como obesidade (principalmente a visceral), sedentarismo e dieta hipercalórica, estão muito associadas ao DM2, mas fatores genéticos também têm forte impacto na gênese da hiperglicemia, tanto que 20% dos DM2 não têm obesidade. Rastreio de DM2 Adultos O rastreio é indicado para: -- Indivíduos com >35 anos; -- Mulheres que apresentaram diabetes gestacional. -- Pessoas com sobrepeso/obesidade (IMC ≥25kg/m2) +, pelo menos, um fator adicional: ---- parente de primeiro grau com DM; ---- história de doença cardiovascular; Natalia Quintino Dias ---- hipertensão arterial (≥140 x 90 mmHg ou em uso de anti-hipertensivos); ---- HDL <35 mg/dL e/ou triglicerídeos >250 mg/dL; ---- síndrome dos ovários policísticos; ---- etnias de alto risco: afro-americanos, nativo americanos, ásio-americanos…; ---- sedentarismo; ---- presença de condições associadas à resistência à insulina (acantose nigricans, uso de antipsicóticos e corticoides, causas relacionadas a outros tipos de DM - câncer de pâncreas, infecção por HIV, hepatite C). Se normal, repetir o rastreio a cada três anos. Crianças É indicado o rastreio aos 10 anos ou início de puberdade, ou caso sobrepeso/obesidade IMC ≥ percentil 85 ou kg/m2 ou peso 120% acima do normal para altura) + 2 fatores adicionais: -- Todos os fatores dos adultos; -- mãe com DM, ou DM gestacional na gravidez do paciente; -- DM2 em familiares de primeiro ou segundo grau; e/ou; -- sinais de RI (acantose, hipertensão, dislipidemia, SOP, baixo peso ao nascer). Se exame normal e o paciente mantiver os fatores de risco, repetir a cada três anos. DM1 X DM2 Manifestações clínicas A maior parte dos pacientes são assintomáticos. Os sintomas clássicos de hiperglicemia, como os famosos “Ps” – poliúria, polifagia, polidipsia e perda de peso –, além de fadiga, noctúria e turvação visual, ocorrem frequentemente quando o paciente está muito descompensado, independentemente do tipo de DM. A poliúria surge quando a glicemia está significativamente acima de 180 mg/dL, excedendo o limite renal para reabsorção de glicose, o que leva ao aumento da excreção urinária deglicose. A glicosúria leva a diurese osmótica (isto é, poliúria) e hipovolemia que, por sua vez, causam polidipsia e fadiga. A glicosúria também é causa de uma outra manifestação associada à descompensação da glicemia: candidíase e infecção urinária de repetição. DM1 – cetoacidose pode ser a apresentação inicial. DM2 – manifestações associadas a resistência insulínica, com acantose nigricans em áreas de dobra cutânea (pescoço, axilas, virilha), obesidade e aumento da cintura abdominal. Laboratório Avaliação da secreção pancreática de insulina: está muito baixa ou “zero” no DM1; e aumentada, normal ou discretamente baixa no DM2. Essa avaliação é feita utilizando o peptídeo C, que é secretado pelas células beta, junto à insulina, após a clivagem da pró-insulina, no entanto, quase toda a insulina é depurada na circulação portal. Natalia Quintino Dias Tipos específicos de DM - Doenças pancreáticas: fibrose cística, álcool, cirurgias, neoplasias. - Infecções: HIV, hepatites - sobretudo hepatite C. - Diabetes induzida por drogas: antipsicóticos atípicos, excesso de levotiroxina, tiazídicos, fenitoína, clozapina, betabloqueadores, ciclosporina, glicocorticoides e antiretrovirais. - Diabetes pós-transplante: medicações imunossupressoras aumentam o risco de diabetes. - Doenças endócrinas: acromegalia, doença/síndrome de Cushing, feocromocitoma. - Formas monogênicas de diabetes: MODY, DM neonatal, lipodistrofias hereditárias, síndrome de Wolfram, DM mitocondrial. Os tipos de DM monogênicas caracterizam-se por herança autossômica; o DM1 tem herança complexa relacionada ao HLA e a hereditariedade do DM2 é poligênica, associada a inúmeros polimorfismos. Síndromes de diabetes monogênicas Algumas síndromes monogênicas levam à disfunção das células beta, as mais frequentes são: “diabetes neonatal” e “diabetes semelhante ao do adulto no jovem” (MODY). O MODY tem herança autossômica dominante e é caracterizado por: • Hereditariedade (diagnóstico em duas ou mais gerações do mesmo lado da família); • Presença de abertura do quadro de diabetes com menos de 25 anos. • Ausência de anticorpos. Já o diabetes neonatal pode ter herança autossômica dominante, recessiva ou até ligada ao X, dependendo do gene envolvido. Os pacientes abrem esse tipo de DM, em geral, nos primeiros 6 meses de vida até, no máximo, o primeiro ano. O MODY tem mais de 10 subtipos, definidos de acordo com a mutação apresentada (+ importante são os 3 primeiros). No Brasil, os subtipos mais comuns de MODY são o MODY-GCK e MODYHNF1A, respectivamente. Uso de sulfonilureias: o estímulo secretagogo faz um by-pass ao defeito que as células beta possuem. Para o diagnóstico específico das formas monogênicas é necessário testes genéticos para identificação da mutação e, apesar do custo relativamente alto, os testes são muito Natalia Quintino Dias importantes na prática, já que frequentemente esses pacientes são confundidos com portadores de DM1 e recebem insulinoterapia desnecessariamente. Assim, ao se fazer o diagnóstico correto, tem-se a possibilidade de deixar o tratamento menos complexo e melhorar a qualidade de vida do paciente. Insuficiência pancreática As causas + comuns são: - Fibrose cística; - Pancreatite; - CA de pâncreas. O perfil glicêmico da insuficiência pancreática é peculiar, pois, além de faltar insulina, tem falta de glucagon (contrainsulínico). Assim, o paciente tem hiperglicemia pós-prandial mas, em períodos de jejum (como na madrugada), pode ocorrer hipoglicemia, pois falta o estímulo para a glicogenólise. Via de regra, a insuficiência pancreática inicia-se pela falência exócrina; portanto, para investigar se o DM é por insuficiência endócrina, um passo importante da investigação é avaliar a função exócrina do pâncreas, que pode ser feita por meio do balanço de gordura nas fezes e quantificação da elastase fecal. Complicações crônicas da DM As principais complicações são: Microvasculares -- Retinopatia: edema macular, retinopatia não proliferativa e proliferativa. -- Neuropatia: difusa (polineuropatia sensitiva distal simétrica [principal] e neuropatia autonômica); mononeuropatia e radiculopatia (amiotrofia). -- Doença renal diabética: glomerulopatia (principal); tubulopatias e infecções do trato geniturinário. Macrovasculares -- infarto agudo do miocárdio (IAM). -- acidente vascular encefálico (AVE). -- doença arterial obstrutiva periférica (DAOP). São as principais causas de óbitos de pessoas com DM, que tem 2-6x mais risco de eventos cardiovasculares. A nefropatia diabética é a principal causa de insuficiência renal crônica dialítica (no Brasil ainda é hipertensão, mas no mundo é DM). A retinopatia diabética é a principal causa de cegueira adquirida. A neuropatia diabética e as complicações vasculares em membros inferiores são as principais causas de amputação não traumática. Todas essas complicações estão diretamente relacionadas à hiperglicemia crônica, mas alguns fatores de risco podem piorar as complicações, como: - Hipertensão: eventos cardiovasculares (CV), nefropatia e retinopatia. - Dislipidemia: CV, nefropatia e retinopatia. - Tabagismo: CV, nefropatia, retinopatia e neuropatia. - Álcool: neuropatia. Fisiopatologia Microvasculares Alguns subtipos celulares (endotélio da retina e dos glomérulos renais e vasa nervorum) são incapazes de regular a entrada de glicose no meio intracelular. Desse modo, a hiperglicemia desencadeia uma cascata de reações dentro dessas células que estreitam a luz dos vasos, havendo redução do fluxo sanguíneo e apoptose celular, levando a alterações estruturais e funcionais. Essa fisiopatologia ocorre principalmente em • Endotélio da retina: retinopatia. • Endotélio dos glomérulos renais: nefropatia. • Vasa nervorum: neuropatia. As principais vias patológicas responsáveis por essas alterações são: - Glicação enzimática irreversível de fatores proteicos plasmáticos e teciduais, também conhecidos como produtos de glicosilação avançada, do inglês AGE (Advanced Glycosylation end Products): a lesão endotelial ocorre por ligação do AGE ao colágeno dos vasos, formando microtrombos com consequente obstrução microvascular. - Via da hexosamina: a sobrecarga da via glicolítica mitocondrial leva também à glicosilação de fatores de transcrição (TGF-alfa, TGF-beta 1 e PAI1), potencializando a formação de microtrombos. - Via dos polióis: a glicose intracelular é reduzida em sorbitol pela aldose redutase que, em altas Natalia Quintino Dias concentrações, aumenta a osmolalidade celular, danificando o funcionamento. - Ativação da PKC: a hiperglicemia aumenta a síntese do diacilglicerol, um ativador da proteína KinaseC (PKC), enzima que tem efeitos protrombóticos e promove o espessamento da membrana basal capilar e proliferação endotelial (essa via está mais ativa em glomérulos e retina). Macrovascular Os principais elementos estão relacionados à hiperglicemia e à resistência insulínica (DM2): - A hiperglicemia ativa diretamente a formação de citocinas pró-inflamatórias, moléculas de adesão, além de aumentar a atividade plaquetária, contribuindo para o estado pró-coagulante. - A resistência à insulina leva à dislipidemia (as alterações típicas são hipertrigliceridemia, queda de colesterol HDL e molécula de LDL pequena e densa). Também age diretamente no endotélio vascular, ativando vias que promovem o aumento de fatores protrombóticos. Além das vias patológicas clássicas, fatores como inflamação, liberação de neuropeptídios (substância P, calcitonin gene-related peptide/CGRP, peptídeo relacionado com o gene da calcitonina e fator de necrose tumoral alfa/TNF – α), estresse oxidativo, desequilíbrio energético, desestruturaçãoproteica, efeitos mediados por cortisol e diferenças na expressão genética relacionadas a polimorfismos associam-se a um risco aumentado de complicações, tanto micro como macrovasculares. Doença renal diabética A doença renal diabética (DRD) é caracterizada por alterações renais, estruturais e funcionais, secundárias ao DM. Sua prevalência é de até 40% em DM1 e 20% no DM2. A cadeia de eventos que leva a essa complicação é marcada cronologicamente por: Hipertrofia e hiperfiltração glomerular: alterações hemodinâmicas devido à hiperglicemia e ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona, que levam ao aumento do fluxo sanguíneo glomerular, resultando em hipertensão capilar e glomerular e consequente aumento da taxa de filtração glomerular (TFG). Esse estágio é chamado de “hiperfiltração glomerular” e pode ou não progredir, por isso ainda chamamos de DRD, tanto que quase todos os DM1 desenvolvem essa fase, mas menos da metade evolui para DRD. Expansão da membrana basal glomerular e espessamento mesangial: caso seja mantida a hiperglicemia crônica, haverá ativação daquelas vias patológicas responsáveis pelas complicações microvasculares, com diminuição da produção de óxido nítrico e formação elevada de AGE, fator de crescimento transformador beta (TGF-beta), fator de crescimento endotelial vascular (VEGF) e várias outras citocinas pro-inflamatórias, aumentando o estresse oxidativo. E, mediada por esse ambiente inflamatório, ocorre a vasoconstricção e começam a surgir as marcas da glomeruloesclerose diabética — hipertrofia das células mesangiais e acúmulo de matriz, caracterizado histopatologicamente por: • Espessamento da membrana basal dos capilares e alterações em podócitos (só visível com microscopia eletrônica). • Glomeruloesclerose (intercapilar) difusa (achado mais comum). • Glomeruloesclerose (intercapilar) nodular ou lesão de Kimmelstiel-Wilson (lesão mais característica). Microalbuminúria, seguido de proteinúria manifesta: as lesões glomerulares da fase anterior fazem o glomérulo perder sua capacidade de filtração, havendo passagem de proteína por ele, o que acaba sustentando um círculo vicioso de alterações hemodinâmicas glomerulares. Rins em fase terminal/uremia: à medida em que a doença renal diabética progride, há aumento no grau de fibrose intersticial/atrofia tubular, o que leva ao declínio na TFG. Natalia Quintino Dias Rastreamento e classificação O rastreio é indicado em todos os indivíduos com: DM2: logo ao diagnóstico; e DM1: após 5 anos de doença, desde que após início da puberdade ou >10 anos de idade, e naqueles com HAS, independentemente do tempo de doença. Após iniciar o rastreamento, este deve ser realizado pelo menos uma vez por ano. Os exames laboratoriais para rastreamento são: - Dosagem da creatinina sérica para o cálculo da filtração glomerular estimada (TFGe), pelas equações Cockroft-Gault, MDRD ou CKD-EPI. - Medida da excreção urinária de albumina (EUA) e creatinina, realizada em amostra de urina isolada, com a determinação da relação albumina: creatinina. É preciso ter 2 de 3 amostras de urina alteradas em um intervalo de 3 a 6 meses após a primeira alteração. Além disso, para uma avaliação adequada, o paciente não pode estar apresentando condições que possam elevar a proteinúria transitoriamente, como: Exercícios intensos; Infecções e/ou febre; Mau controle glicemico; Ingestão de proteínas em excesso; e HAS mal controlada, ICC e litíase renal. É definida como doença renal do diabetes a partir de microalbuminúria A2 e/ou DRC grau 3 ou maior, na ausência de sinais e sintomas de outras causas de doença renal. Sinais de alarme para suspeitar de outras de causas de nefropatia Ausência de retinopatia diabética TFG baixa no diagnóstico ou diminuindo rapidamente Proteinúria ou síndrome nefrótica de aumento rápido Hipertensão refratária Presença de sedimento urinário ativo Sinais ou sintomas de outra doença sistêmica > Redução de 30% na TFG em 2-3 meses após o início de um inibidor da ECA ou BRA Quando se faz o diagnóstico de DRD, é indicado monitorar a TFGe e a EUA ao menos 2 vezes ao ano. Tratamento Os principais pilares são: • Controle adequado da glicemia. • Uso de inibidores de SGLT2 e/ou agonistas do receptor de GLP1. • Controle da HAS: ≤140/80 mmHg ou ≤130/80 mmHg (situações especiais: jovens, risco elevado de AVC etc.). • Bloqueio farmacológico do sistema renina- angiotensina-aldosterona (com IECA OU BRA). • Controle da dislipidemia. • Cessação do tabagismo. • Suporte para complicações da DRC. Controle da pressão arterial/uso de inibidor do sistema renina-angiotensina. Na presença de albuminúria A2 ou A3 confirmada, é imperativo iniciar um inibidor do sistema renina- angiotensina-aldosterona, pois o bloqueio dessa via tem efeito renoprotetor, independentemente de HAS. Natalia Quintino Dias Para isso, utiliza-se: IECA ou BRA. Essas classes têm ação antiproteinúrica e renoprotetora, isto é, reduzem a progressão para estágios mais avançados da DRC. Por isso devem estar na maior dose possível, a fim de reduzir a albuminúria e atingir a meta pressórica. -> NUNCA associar IECA + BRA – risco aumentado de hipercalemia e piora aguda da função renal. -> Contraindicar se estenose bilateral de artéria renal OU creatinina >3,0 mg/dL. -> Suspender/não iniciar em situações de insuficiência renal aguda. Essas drogas dilatam a arteríola eferente (artéria que “saE” do glomérulo) para reduzirem a pressão de intraglomerular, mas, numa situação de perfusão renal “limítrofe”, a redução da pressão intraglomerular pode precipitar insuficiência renal aguda pré-renal e a elevação de potássio. Se paciente com DM + HAS mas sem proteinúria, quaisquer das classes consideradas como primeira linha para HAS podem ser usadas. Controle do DM Diante de qualquer complicação crônica microvascular, o controle glicêmico deve ser intensificado, uma vez que reduz efetivamente a progressão dessas complicações. Inibidores da SGLT2: ao reduzirem a reabsorção da glicose tubular renal, diminuem: peso, pressão arterial sistêmica e intraglomerular e, com isso, conseguem melhorar de maneira significativa os desfechos renais desfavoráveis, tais como: redução da TFGe, aumento da albuminúria em progressão para diálise e até mesmo morte de causas cardiovasculares. • Empaglifozina; • Dapaglifozina; • Canaglifozina. Agonistas de GLP1: também possuem efeitos diretos no rim e reduzem o risco de nova ou a piora da nefropatia. • Liraglutida; • Dulaglutida; • Semaglutida. Essas medicações são para o tratamento do DM2, portanto não há evidência de benefício para DM1 com nefropatia. Suporte para complicações da DRD As complicações relacionadas à insuficiência renal crônica ocorrem mais precocemente no paciente diabético, e quando a TFG < 60 mL/min/1,73 m² já é necessário rastrear alterações eletrolíticas, acidose metabólica, anemia e doença óssea. E quando TFG < 30 mL/min/1,73 m² é recomendado seguir com nefrologia. Retinopatia diabética (RD) Ela é causada por lesões progressivas na microvasculatura da retina, que geram maior permeabilidade vascular, exsudação retiniana e áreas de má perfusão. A progressão da hipóxia promove a liberação local de fatores angiogênicos (IGF-1 e VEGF), culminando com proliferação patológica de neovasos (neovasculogênese), podendo levar à perda visual ou até à cegueira. A retinopatia diabética (RD) engloba as formas não proliferativas (leve, moderada e grave), proliferativa e edema macular e é uma das causas mais importantes de perda visual em todo o mundo, sendo a principal causa de deficiência visual em pacientes entre 25 e 74 anos de idade. Outras lesões oftalmológicas também são mais comunsno DM, como glaucoma neovascular e catarata subcapsular. Rastreamento O rastreio anual por meio da fundoscopia indireta inicia-se a partir do diagnóstico no DM2 e, no DM1, a partir de cinco anos de doença ou antes, se gestação e puberdade. O primeiro exame deve ser completo e realizado por um oftalmologista, preferencialmente especialista em DM. Além de ser feita a fundoscopia indireta com dilatação pupilar com colírio midriático, o exame deve abranger a busca por outras doenças, como glaucoma e catarata. Quem determinará a periodicidade desse exame é o próprio oftalmologista, mas geralmente é anual. Classificação A retinopatia é classificada em retinopatia diabética não proliferativa (RDNP) e proliferativa. Quando ocorre lesões especificamente na mácula, é chamada de edema macular. Natalia Quintino Dias Para a prova, leu “neovasos”, “descolamento ou hemorragia vítrea” = retinopatia diabética proliferativa. Outra complicação oftalmológica é o edema macular, uma complicação muito grave que pode aparecer em qualquer um desses estágios, mesmo nos mais leves, caso os exsudatos duros atinjam a fóvea, podendo levar à perda de visão. Como avaliar o fundo de olho No fundo de olho normal, temos o nervo óptico (círculo brilhante) e a mácula (círculo opaco). Edema do nervo óptico (edema de papila), que caracteriza a retinopatia hipertensiva estágio 4. Natalia Quintino Dias Quando temos alteração dos vasos (observe a Figura 2), visualizamos: o microaneurisma (A), um ponto vermelho bem pequeno, que é o primeiro estágio; a evolução desse achado é a hemorragia em chama de vela (C), ponto bem maior e um pouco borrado. Os pontos brilhantes são os exsudatos duros (B), que progridem para os algodonosos (D). Tratamento Controle pressórico rigoroso. Controle lipídico. Cessação do tabagismo. Tratamento da anemia (se existente, pode piorar a retinopatia). Tratamento da nefropatia e da proteinúria (complicações bastante associadas). Otimização do controle glicêmico. Exercícios aeróbicos de moderada a alta intensidade e exercícios de resistência estão contraindicados nos pacientes com RD não proliferativa grave e RD proliferativa pelo risco de hemorragia vítrea e descolamento de retina. Uso de ácido acetilsalicílico: ele não é contraindicado e pode ser utilizado como proteção cardiovascular em pacientes com RD, inclusive na forma proliferativa. Alguns tratamentos específicos são utilizados principalmente para as formas proliferativas da retinopatia e do edema macular. O principal é a panfotocoagulação a laser, que tem o objetivo de regredir os neovasos, evitando a progressão da complicação, mas não reverte a acuidade visual que foi perdida. Neuropatia A neuropatia diabética (ND) é definida como a presença de sintomas e/ou sinais de disfunção de nervo periférico em pessoas com DM, após a exclusão de outras causas. Até 10% das neuropatias em portadores de DM não são por consequência do diabetes, sendo fundamental, na história e nos exames laboratoriais, avaliar os principais diagnósticos diferenciais, como: neuropatia alcoólica, mieloma múltiplo, deficiência de B12, vasculite, hipotireoidismo, hanseníase, hepatites e HIV. Fibras nervosas: fibras C e D (delta) são as fibras relacionadas ao Calor e à Dor, sendo que a Delta é mielínica, ou seja, é mais rápida e, por isso, também é responsável pela dor AGUDA. Perdoe o português, mas para decorar vale tudo… Lembre-se: fibra C = Cem(sem) mielina. Classificação A forma mais comum de neuropatia diabética é a polineuropatia sensitiva (ou sensitivo-motora), que é simétrica distal. A amiotrofia (atrofia muscular) diabética cursa com dor e perda de sensibilidade na parte proximal dos membros inferiores, associada à fraqueza e atrofia uni ou bilateral. Parece estar associada a fatores autoimunes e inflamatórios, motivo pelo qual são utilizados no tratamento corticosteroides e imunoglobulina. Neuropatia sensorial aguda Forma rara de neuropatia, com sintomas dolorosos e de difícil controle. Pode ser desencadeada por grande variabilidade glicêmica (como no início de Natalia Quintino Dias insulina ou descompensação aguda). É autolimitada, mas pode permanecer de 6 a 12 meses após a estabilização dos níveis da glicemia. Polineuropatia difusa sensitiva crônica (distal e simétrica) É a forma mais comum da ND, em especial a polineuropatia sensitiva distal (PSD), representando cerca de 80% das ND, e já está presente no diagnóstico em até 20% dos pacientes com DM2. Desenvolve-se de maneira lenta, progressiva e simétrica, tem progressão comprimento- dependente; por isso, geralmente, inicia-se em membros inferiores, mas pode evoluir para os membros superiores, padrão esse conhecido como “botas e luvas”. Inicialmente, os sintomas mais comuns são relacionados com a lesão de fibras finas (tipo C e tipo A delta), manifestando-se com dor e disestesia (queimação, parestesias, hiperestesia, dor com piora noturna e formigamento). A associação da disautonomia é frequente e podemos encontrar também desidrose e pele ressecada. Isso não quer dizer que o envolvimento de fibras grossas (fibras A alfa e beta) sempre vem depois. Eles podem ser até mais precoces, mas suas manifestações incluem dormência e perda da sensibilidade tátil (protetora), o que muitas vezes não é percebido clinicamente, sendo fundamental o rastreamento por meio do monofilamento de 10 gramas e com diapasão de 128 Hz, para testar a sensibilidade vibratória. Neuropatia difusa autonômica Caracteriza-se pelo envolvimento de fibras finas amielínicas (fibras C) do sistema nervoso periférico. O vago é o principal nervo acometido (pois é o mais longo). Geralmente, é assintomática e subdiagnosticada. Estima-se que aproximadamente 50% dos pacientes com DM1 e 70% dos pacientes com DM2 apresentem algum envolvimento autonômico, embora apenas 14% apresentem formas moderadas a graves da doença. As principais manifestações clínicas da neuropatia autonômica diabética são: hipoglicemia assintomática, taquicardia em repouso, hipotensão ortostática, gastroparesia, constipação, diarreia, incontinência fecal, disfunção erétil, bexiga neurogênica e disfunção sudomotora com aumento ou diminuição da sudorese. Natalia Quintino Dias Amiotrofia (radiculopatia motora proximal) Essa forma de neuropatia é associada a alterações microvasculares que levam à isquemia das fibras nervosas; por isso, é mais frequente em idosos. Assim como na neuropatia aguda, está relacionada a grande variabilidade glicêmica (hiper e hipoglicemias). Mononeuropatia craniana Das formas de neuropatia focal, é a mais comum. O par craniano mais acometido é o oculomotor (III par), seguido pelo troclear (VI) e facial (IV). O quadro clínico é de início abrupto e inclui diplopia e ptose (queda da pálpebra superior). A progressão do défice dá-se em 1 ou 2 dias. Metade dos pacientes tem dor associada e ocorre recuperação espontânea em 2 a 3 meses. Rastreamento Deve ser rastreada anualmente a partir do diagnóstico de DM2 e, se DM1, a partir de cinco anos de doença ou na puberdade. O rastreamento deve englobar o exame geral do pé, com o objetivo de identificar a neuropatia e evitar a progressão para o “pé diabético”, que já seria uma complicação grave. - Inspeção: procurar alterações dermatológicas e musculoesqueléticas, locais de hiperemia, ulcerações, rachaduras, calosidades e pontos de infecção, incluindo a região interdigital. - Palpação: avaliar dor e calor, além de palpação dos pulsos pediosos e tibiais posteriores, bilateralmente. - Avaliação neurológica, buscando identificar não apenas a presença da disfunção, mas também o risco futuro de complicações. Dessa forma, deve incluir a avaliação da:• Sensibilidade protetora: monofilamento de 10g para avaliar pé de risco; o Função de fibra fina: sensibilidade dolorosa: usando um objeto pontiagudo e outro com ponta romba. Sensibilidade térmica: usando um objeto “frio” e outro “quente”. o Função de fibra grossa: Sensibilidade vibratória: usando um diapasão de 128 Hz. Reflexo aquileu. O próprio monofilamento de 10 g. A principal etapa é o monofilamento de 10 gramas, pois identifica o pé insensível, em risco de ulceração e, consequentemente, de amputação. Porém, se sensibilidade preservada, não afasta ND. O rastreio para neuropatia autonômica também é indicado. Ela é realizada por meio da frequência cardíaca de repouso (positivo se FC >100 bpm) e na medida da pressão em decúbito e ortostase (com diferença de 3 a 5 minutos entre elas): se queda sistólica maior que 20 mmHg ou diastólica >10 mmHg, está feito o diagnóstico. Outro teste que deve ser realizado em todos os pacientes com DM maiores que 50 anos ou naqueles com um fator de risco cardiovascular adicional é o índice tornozelo-braquial (ITB), método de rastreamento da doença arterial obstrutiva periférica (complicação macrovascular). Tratamento O controle da hiperglicemia, HAS e dislipidemia e a orientação para cessação do tabagismo, dieta adequada e atividade física podem reduzir a progressão da ND. Mas a principal parte do tratamento é sintomática, para controle da dor. A própria otimização do controle glicêmico já pode auxiliar no controle da dor, porém há algumas medicações, como: - Antidepressivos tricíclicos: apesar de “potentes”, principalmente a imipramina e a amitriptilina, possuem muitos efeitos colaterais, incluindo sintomas anticolinérgicos. São contraindicados em pacientes com doença cardiovascular estabelecida e neuropatia autonômica pelo risco maior de morte súbita. - Anticonvulsivantes: pregabalina (primeira opção), gabapentina e carbamazepina. - Inibidores de receptação de serotonina e norepinefrina (SNRI): duloxetina e venlafaxina. - Inibidores de recaptação de serotonina: paroxetina e citalopram. Natalia Quintino Dias - Agentes tópicos: capsaicina tópica (inicialmente pode haver exacerbação dos sintomas, com melhora depois de 2 a 3 semanas de uso, sendo indicado o uso por até 8 semanas), clonidina tópica (inibe o estímulo simpático). Evitar uso de opioides, reservados apenas para casos de refratariedade. Pé diabético O pé diabético (PD) representa uma situação de infeção, ulceração e/ou destruição dos tecidos profundos do pé. O PD é um misto das complicações e tanto pode ter componente neuropático como isquêmico, com graus variados de doença arterial periférica. O diagnóstico de infecção é CLÍNICO e os principais sinais que indicam INFECÇÃO DE ÚLCERA DIABÉTICA são: secreção purulenta e celulite adjacente. Etiologias As úlceras são classificas em 3 grupos: Neuropáticas (mais frequente – 60% dos casos) São indolores e associadas a calosidades, pele seca com fissuras e rachaduras, veias dorsais dilatadas, hiperemia e deformidades locais. A base da úlcera contém tecido granuloso, e clinicamente o paciente apresenta pulsos palpáveis, com ausência ou redução dos reflexos tendinosos profundos. Quando associada à infecção, é chamada de gangrena úmida. Isquêmicas (10% dos casos) Localizam-se geralmente nas extremidades dos dedos, costumam ser dolorosas e associadas à pele cianótica, unhas atrofiadas e micóticas, pulsos diminuídos e palidez do membro. As úlceras têm margens irregulares, não têm exsudato (por isso, quando infectadas, chamamos de gangrena seca) e podem apresentar tecido necrótico. Em geral, calos e deformidades estão ausentes (diferentemente das neuropáticas). Neuroisquêmicas (30% dos casos) São úlceras com características mistas, neuropáticas e isquêmicas. A clínica depende de qual é o mecanismo fisiopatológico predominante. Avaliação Para classificar a lesão, deve-se levar em consideração profundidade, presença de isquemia ou de infecção, entre outros fatores associados à úlcera. Tratamento As principais abordagens são: Cuidados locais: limpeza com soro fisiológico e curativos periódicos, desbridar as áreas necróticas de forma manual ou química e retirar calosidades adjacentes preventivamente. Nunca usar antibiótico tópico (proscrito). Controle de fatores clínicos associados: bom controle glicêmico e pressórico e tratamento de edema periférico, além da cessação do tabagismo. Alívio da carga e da pressão: a principal causa de não fechamento das úlceras em pés diabéticos é a não remoção da carga; para isso, usamos gesso de contato total. Esse tratamento é contraindicado na presença de infecção ou isquemia, e uma Natalia Quintino Dias alternativa é o uso de botas imobilizadoras, como robofoot. Tratamento da infecção Em infecções leves, as bactérias Gram-positivas (estreptococo e estafilococo) costumam ser os únicos agentes. Casos graves estão associados à infecção por Gram-negativos (E. coli, Klebsiella, Enterobacter) e aos anaeróbios, sendo, portanto, polimicrobianas. A base do tratamento é a antibioticoterapia de amplo espectro e o desbridamento cirúrgico. O ATB é iniciado de forma empírica. A escolha do ATB e a forma de administração dependem da gravidade do quadro e da flora esperada. - Em quadros brandos, o antibiótico pode ser feito por via oral, enquanto nos graves deve ser feito, obrigatoriamente, por via endovenosa. - Os antibióticos tópicos não possuem comprovação de eficácia e são contraindicados. Opções: Casos leves – duração de 7-14 dias - Amoxicilina com clavulanato; - Cefalexina; - Ciprofloxacino + clindamicina. Casos graves – duração de 14-28 dias - Vancomicina + Ciprofloxacino + metronidazol; - Vancomicina + meropenem. Além da antibioticoterapia, o desbridamento cirúrgico dos tecidos desvitalizados é fundamental para a boa recuperação, sendo a amputação necessária nos graus 4 e 5 (gangrena) e em casos de osteomielite grave e/ou refratária. Na falta de resposta, devemos pensar em osteomielite. Seu diagnóstico é feito pela ressonância magnética (melhor exame) ou por um probe inserido na úlcera: se chegar até o osso, o diagnóstico de osteomielite é quase certo. Nos casos de osteomielite, deve ser realizada biopsia óssea para tratamento guiado e estender o tempo de antibioticoterapia por pelo menos oito semanas. Artropatia de Charcot A neuroartropatia de Charcot (NC) é uma síndrome caracterizada por processo inflamatório descontrolado e persistente que afeta ossos, articulações e partes moles do pé, predispondo a ocorrência de osteólise e colapso da articulação do médio pé, chamado de “pé em mata-borrão”. O sintoma mais precoce é calor local, e confirmamos por meio da radiografia simples ou ressonância magnética do local suspeito. O tratamento principal consiste em repouso, imobilização e retirada de carga. Medidas de prevenção Inspeção diária pelo próprio paciente. Cortar unhas retas. Em caso de neuropatia, usar calçados apropriados. Não andar descalço. Cuidar de calos e alterações ungueais (podologia). Enxugar bem os pés, inclusive entre os dedos. Procurar auxílio médico, caso úlcera. Usar meias brancas (mais fácil para identificar feridas). Hidratar o pé (exceto entre os dedos). Complicações macrovasculares São: o infarto agudo do miocárdio (IAM), acidente vascular encefálico (AVC) e doença arterial obstrutiva periférica (DAOP). Deve-se realizar a estratificação de risco cardiovascular do paciente. A partir de risco intermediário, já é indicado iniciar estatina. Na prática: DM acima de 40 anos + quaisquer outros fatores de risco = alto risco = estatina de alta potência. Têm duas exceções que fogem à essa regra: -- Pacientes com < 40 anos, mas quetêm DM2 e alto risco cardiovascular, que têm indicação de receber estatina de moderada intensidade. -- Pacientes que já tiveram algum evento cardiovascular, e esses sim, independentemente da idade e do nível de colesterol, devem receber estatina de alta intensidade. Outra utilidade da estratificação do risco CV é na definição da meta pressórica, sendo os alvos para: - Maior risco cardiovascular (risco calculado em 10 anos ≥15%): pressão arterial < 130/80mmHg. Natalia Quintino Dias - Menor risco de doença cardiovascular (risco <15%): PA de 140/90mmHg. Deve-se considerar AAS (75-162 mg/dia) em diabéticos com mais de 50 anos e pelo menos um fator de risco principal adicional (história familiar de doença CV prematura, hipertensão, dislipidemia, tabagismo ou doença renal crônica/albuminúria) e que não apresentam risco aumentado de sangramento (por exemplo, idade >70 anos, anemia, doença renal dialítica). É importante estimular a mudança de estilo de vida, incluindo cessação do tabagismo, dieta e atividade física. Tratamento Alvos do tratamento Perfil glicêmico Os alvos para cada paciente devem ser individualizados. Alguns critérios permitem que o tratamento seja menos rigoroso: - Presença de doença macrovascular estabelecida (IAM ou AVC). - Baixa expectativa de vida. - Baixa motivação para realizar o tratamento. - Impossibilidade pessoal ou social de exercer todos os requisitos para o cuidado com o diabetes. - Falta de recursos. - Risco de hipoglicemia (principal). Para a maior parte dos adultos com DM, o alvo é de HbA1c ≤ 7%. Para recém-diagnosticados: HbA1c < 6,5%. Em idosos ou paciente com mais complicações: HbA1c < 8%. Glicemia pré-prandial < 100mg/dL (SBD) OU 80- 130mg/dL (ADA). Glicemia pós-prandial < 160mg/Dl (SBD) OU < 180mg/dL (ADA). Imunizações O Ministério da Saúde recomenda que crianças e adultos com diabetes realizem todas as doses das vacinas, de acordo com o calendário vigente, além de ser indicada: - Vacina contra influenza: a partir 6 meses de idade, devendo ser administrada anualmente. - Vacina contra herpes-zoster: adultos > 60 anos, independentemente de história prévia da doença. - Vacina contra hepatite B. - Vacina contra pneumonia pneumocócica. Dieta A Associação Americana de Diabetes (ADA) reforça alguns pilares no tratamento nutricional: - Reduzir a ingestão calórica. - Manter uma alimentação balanceada: 15% de proteínas, 25% de gorduras e 60% de carboidratos. - Restringir para menos de 7% as calorias do dia compostas por gorduras saturadas e zero de gordura trans na alimentação cotidiana. - Trocar açúcar por adoçante e evitar bebidas adoçadas. - Limitar a ingestão de álcool: no máximo uma dose por dia para mulheres e duas doses por dia para homens. - Aumentar a ingestão de fibras: 14 g de fibras para cada 1.000 kcal da dieta. Antidiabéticos não insulínicos Podem ser utilizados isoladamente, combinados entre si ou mesmo com insulina, a fim de que se alcance a meta glicêmica preconizada para cada paciente. Natalia Quintino Dias São divididos em 5 grupos, de acordo com o efeito metabólico: -- Insulinas. -- Sensibilizadores de insulina: biguanidas e iazolidinedionas (glitazonas). -- Secretagogos: glinidas e sulfonilureias. -- Incretinomiméticos: agonistas do receptor de GLP-1 e inibidores de DPP4. -- Espoliadores de glicose: inibidores de SGLT-2 (glicosúricos) e inibidores da absorção intestinal de glicose. Doença renal crônica - Aqueles que podem ser usados na DRC grave: tiazolidinediona, iDPP4 e aGLP-1. - Os que não deveriam ser prescritos em pacientes com TGF menor que 30 mL/ min: metformina, glifozinas, acarbose e maioria das sulfonilureias. - E não esqueça dos ajustes da metformina conforme a função renal, já que é a droga de escolha para iniciar o tratamento na maioria dos diabéticos. Sensibilizadores de insulina São medicações que reduzem a resistência insulínica, sem aumentar a secreção pancreática de insulina; portanto, com baixo risco de hipoglicemia. Biguanidas Atualmente, a metformina (MTF) é a única biguanida utilizada na prática clínica. A metformina reduz a resistência hepática à insulina por meio da ativação do AMP-quinase (AMPK). Assim, o fígado começa a “perceber” melhor a glicose e: - Reduz a produção hepática de glicose. - Aumenta oxidação de ácidos graxos (reduzindo ácidos graxos livres na circulação). Natalia Quintino Dias - Aumenta a captação de glicose. - E nas células intestinais, a MTF bloqueia a oxidação da glicose, desviando o metabolismo celular para via anaeróbia, com produção de lactato. O lactato intestinal entra na circulação portal e será convertido de volta em glicose no fígado; no entanto, essas reações acabam dissipando energia, o que contribui para a discreta perda de peso. Essa via também explica o risco aumentado de acidose lática. Modo de prescrever Deve ser administrada após as refeições, iniciando- se com 500 ou 850 mg/dia e aumentando semanalmente, em duas ou três refeições, até 2.550 mg/ dia. As apresentações de liberação lenta (Glifage XR) podem ser administradas uma vez ao dia ou divididas em 2 ou 3 vezes. Contraindicações e efeitos colaterais Os principais efeitos adversos e limitantes do uso da MTF são os sintomas gastrointestinais (diarreia, náuseas, dor e desconforto abdominal), que podem ocorrer em 5-15% dos pacientes. Geralmente, os efeitos são transitórios e podem melhorar com redução temporária de dose, administração com refeições ou uso de formulações de longa duração (Glifage XR). A MTF pode reduzir a absorção da vitamina B12; por isso, é sugerida a monitorização. O efeito mais grave da MTF é a acidose láctea, que é muito rara. Alguns cuidados são preconizados a fim de evitar essa complicação: é contraindicada na doença renal crônica grave (taxa de filtração glomerular < 30mL/ minuto/1,73 m²), doença hepática avançada ou qualquer condição que predisponha à hipóxia ou redução da perfusão tecidual. Além disso, deve ser suspensa em casos de insuficiência renal aguda ou em situações de risco para piora da função renal, como antes de procedimentos cirúrgicos ou uso de contrastes iodados, e reiniciada dois dias após, se a creatinina sérica estiver normal. Tiazolidinedionas A única medicação comercialmente disponível dessa classe é a pioglitazona. Maior parte das drogas dessa classe teve seu uso descontinuado por hepatotoxicidade (troglitazona) e possível aumento do risco cardiovascular (rosiglitazona). Mecanismo de ação As glitazonas são agonistas do ativador do receptor nuclear gama do peroxissomo (PPAR – γ). Essa ação diminui a resistência insulínica periférica e hepática, resultando no aumento da disponibilidade insulinodependente de glicose (aumento da captação pelos tecidos) e diminuição da liberação de glicose hepática. O PPAR – γ tem alta expressão no tecido adiposo, por isso a pioglitazona promove adipogênese em tecido subcutâneo, o que pode levar a ganho de peso, mas reduz depósitos ectópicos (viscerais) de gordura no músculo e no fígado, melhorando inclusive a esteatose hepática. Modo de prescrever A dose da pioglitazona é de 15 a 45 mg/dia. Não necessita de ajuste para função renal, mas, nessa circunstância, deve-se avaliar o risco de piora do edema. Contraindicações e efeitos colaterais O efeito colateral mais comum é o ganho de peso, em torno de 4 a 5 kg. Já o mais grave é o aumento do risco de insuficiência cardíaca, causada por retenção hídrica. A retenção hídrica ocorre porque há aumento da expressão de canais de sódio nos túbulos renais que estimula a reabsorção de sódio, sendo contraindicada em pacientes com insuficiência cardíaca sistólica. Outro efeito colateral relevante é a redução da massaóssea com aumento do risco de fratura, que ocorre pela ação de classe no PPAR – γ do osso, estimulando a diferenciação de células-tronco mesenquimais em adipócitos, em vez de osteoblastos. Secretagogos de insulina Essas medicações “forçam” as células beta pancreáticas a produzirem insulina, independentemente da glicemia. A hiperinsulinemia pode aumentar risco de hipoglicemia e ganho de peso (a insulina é um hormônio anabólico). Mecanismo de ação As sulfonilureias e as glinidas aumentam a secreção de insulina pelas células beta pancreáticas. O mecanismo base dessas 2 classes de secretagogos é através da ligação no sítio sulfonil (das sulfonilureias) ou benzamido (das glinidas), ambos Natalia Quintino Dias no canal das sulfonilureias (SUR1), que se fecha, levando ao influxo de cálcio e estimulação da secreção de insulina. Sulfonilureias As sulfonilureias foram os primeiros antidiabéticos orais usados na prática clínica. São classificadas em primeira geração: tolbutamida e clorpropamida; e em segunda geração, que tem menor risco de hipoglicemia: glibenclamida (gliburida), gliclazida, glipizida e glimepirida. Contraindicações e efeitos colaterais O efeito colateral mais preocupante é a hipoglicemia e suas complicações: rebaixamento do nível de consciência, queda, arritmias, demência, eventos cardiovasculares. Quanto ao ganho de peso, ele decorre do efeito anabólico da insulina, podendo haver aumento de 1 a 4 kg, em geral no início do tratamento, com estabilização seis meses após o uso da medicação. Glinidas As meglitinidas têm ação mais rápida e já começam a agir após 5 a 10 minutos de sua administração, com pico de ação mais curto (uma hora) e menor duração — 1,5 a 5 horas (repaglinida e nateglinida, respectivamente). Com esse perfil, são úteis para cobrir o incremento da glicemia após as refeições. Portanto, são administradas 1-30 minutos antes das principais refeições. Contraindicações e efeitos colaterais Semelhantes às sulfonilureias. Incretinomiméticos Existem duas classes de medicações que atuam nessa via: 1. Os agonistas do receptor de GLP-1 (aGLP-1), que estimulam diretamente essa via de modo extremamente potente. 2. Os inibidores da dipeptidil peptidase tipo IV (iDPP4), que aumentam a atividade do GLP1 endógeno, por impedir sua degradação pela dipeptidil peptidase. Efeito incretínico: nome dado ao incremento adicional da liberação de insulina, quando a glicose é administrada por via oral em relação à via parenteral. Esse fenômeno foi identificado no início do século passado, mas ninguém entendia o motivo, até que, nas últimas décadas, descobrimos quem são as incretinas: os hormônios GLP-1 (peptídeo 1 tipo glucagon) e o GIP (peptídeo insulinotrópico dependente de glicose) produzidos pelas células “L” e “K” intestinais, respectivamente. Então, as incretinas são produzidas quando o alimento chega ao intestino, sendo uma forma dele informar ao resto do organismo: “ei, se preparem que a glicose está chegando”. Assim, ele “solicita” que as células beta do pâncreas comecem a produzir insulina e que as células alfa diminuam a secreção de glucagon. Além disso, agem até no hipotálamo, ativando a via anorexigênica. Todo esse mecanismo é glicose-dependente, o que é ótimo, pois o estímulo farmacológico possibilita um bom controle glicêmico, com baixo risco de hipoglicemia e sem ganho de peso. Agonista do receptor de GLP-1 Além de melhorar o controle glicêmico, promove uma importante perda de peso, reduz a progressão da nefropatia e diminui o risco de doença cardiovascular (CV). As medicações dessa classe terminam em gluTIDA – liraGLUTIDA, semaGLUTIDA, dulaGLUTIDA, exenaTIDA e lixisenaTIDA. Mecanismo de ação Agem ativando o receptor do GLP-1 em diversos órgãos, sendo as principais ações no: Pâncreas: potencializa a secreção de insulina em resposta à alimentação e reduz secreção de glucagon. Fígado: aumenta estoques de glicogênio. u Cérebro: aumenta saciedade, auxiliando no controle de peso. Estômago: reduz o esvaziamento gástrico, atuando nos mecanismos da saciedade, também contribuindo para a perda de peso. Tecido adiposo: aumenta termogênese, lipólise e, com isso, o gasto energético. Músculo: aumenta a captação de glicose. Além das ações glicêmicas, há redução da pressão arterial — no rim, aumenta a eliminação de sódio (inibe bomba Na+/H+ no túbulo proximal) e tem efeito vasodilatador. Por todos esses mecanismos, essa é uma das classes mais potentes em relação à queda de HbA1c, pois, além do efeito glicêmico que faz reduzir até 1,8% na HbA1c, há o efeito “comportamental” — já que sua ação anorexigênica facilita a adesão à dieta, o que Natalia Quintino Dias possibilita perda de peso e, INDIRETAMENTE, a redução da resistência insulínica, podendo até dobrar seu impacto na queda da HbA1c. Modo de prescrever Recomenda-se iniciar o tratamento com doses baixas, e aumentar progressivamente, a cada 7 a 14 dias, até a dose máxima, com titulação ainda mais lenta em idosos. A maior parte dos medicamentos dessa classe são aplicados por via subcutânea (SC), com exceção da semaglutida oral (Rybelsus), que, além da via de administração a dose também é diferente, sendo utilizada nas doses de 3, 7 e 14 mg por dia, além da necessidade de aplicação diária, é necessário tomar em jejum e ao menos 30 minutos antes da refeição. Contraindicações e efeitos colaterais Em geral, são bem tolerados, mas, inicialmente, pode haver sintomas gastrointestinais, como náuseas (relacionadas à redução do esvaziamento gástrico), que melhoram com a redução/progressão mais lenta das doses. Reações nos locais de aplicação podem ocorrer e são mais comuns nas formulações semanais. É contraindicado em portadores de neoplasia endócrina múltipla do tipo 2 ou pacientes com história familiar de carcinoma medular. Gliptinas (DPP4) As gliptinas (sitagliptina, linagliptina, alogliptina, vildagliptina e saxagliptina) são inibidores da dipeptidil peptidase tipo IV. O DPP4 degrada o GLP-1, por isso, ao inibi-los, os níveis séricos GLP-1 aumentam, melhorando o controle glicêmico, mas sem impacto no peso. É comum em questões de prova confundirmos o mecanismo iDPP4 com aGLP-1. Lembre-se de que DPP4 DESTRÓI/Degrada. Contraindicações e efeitos colaterais Não se deve associar os iDPP4 com os aGLP-1. Os inibidores de DPP4 são bem tolerados, embora estejam associados a um discreto aumento do risco de infecções de vias aéreas superiores, além de cefaleia, mialgia e artralgia. Geralmente, esses sintomas melhoram espontaneamente, mas, caso persistam, desaparecem após descontinuação da droga. Não é recomendado o uso de saxagliptina e alogliptina em pacientes com insuficiência cardíaca. Espoliadores de glicose Essa classificação não existe em livros Estão incluídos os inibidores da enzima alfa- glicosidase, que “espoliam” a glicose por meio do intestino; e os inibidores do canal SGLT-2, os quais “espoliam” a glicose por via renal, ou seja, perdem pela urina. Inibidores da alfa-glicosidase São oligossacarídeos complexos, que inibem por competição as enzimas alfa-glicosidases da borda em escova dos enterócitos nas vilosidades intestinais, impedindo a quebra do amido, dextrina e dissacarídeos, em monossacarídeos, por isso reduzem sua absorção. A acarbose é único da classe disponível no Brasil. Ela age, principalmente, na glicemia pós-prandial e, por isso, é administrada antes das três refeições principais, sendo iniciada com 25 mg (1 a 2 vezes dia), aumentando lentamente até 50-100 mg, a cada refeição. Contraindicações e efeitos colaterais A principal limitação da classe são os efeitos gastrointestinais (diarreia, flatulência e desconforto abdominal) relacionados à passagem de carboidratosnão digeridos pelo cólon, no qual vão ser metabolizados pela flora local, com produção de gás metano. É contraindicada em pacientes com disfunção renal grave. Inibidores de SGLT-2 Os inibidores do cotransportador sódio-glicose 2 (iSGLT-2) são derivados da molécula florizina, extraída da casca da macieira, e têm mecanismo de ação único, por meio do aumento da excreção de glicose pela urina. No Brasil, temos disponíveis a empaglifozina, canaglifozina e dapaglifozina. Mecanismo de ação Essas medicações inibem os canais SGLT-2, que são cotransportadores de sódio e glicose no segmento S1 do túbulo contorcido proximal, responsáveis por reabsorver mais de 90% da glicose filtrada pelos rins e, assim, impedem que a glicose seja reabsorvida. Dessa forma, o mecanismo tem como principal efeito a glicosúria. Natalia Quintino Dias Esse mecanismo é autolimitado na redução da glicemia, pois a glicosúria é compensada pelo aumento da produção de glucagon. Benefícios da classe: A perda de glicose pela urina (até 80 g) leva a um déficit calórico (320 kcal), inclusive com redução de peso (2 a 4 kg). Além disso, aumento da excreção urinária de sódio e água reduz os níveis de pressão arterial (4-6 mmHg). Contraindicações e efeitos colaterais O efeito colateral mais comum é o aumento de infecções do trato gênito urinário, pelo aumento da glicose na região genital, com maior proliferação de bactérias e fungos, mas geralmente as infecções são leves. Apesar de raro, a cetoacidose (CAD) euglicêmica pode ocorrer, pois os iSGLT2 reduzem glicemia, sem aumentar o nível ou a ação da insulina; portanto, pode promover a síntese de cetoácidos em pacientes insulinopênicos: DM-1, DM-2 descompensado e/ou durante internação hospitalar, sendo contraindicado nesses grupos. Outro efeito colateral é o aumento no LDL, no entanto há elevação do HDL. Apesar desse efeito, os iGLT2 estão associados à redução de mortalidade por eventos cardiovasculares. Estratégia para o plano terapêutico no DM2 Iniciar com MEV + uso de metformina (1ª escolha devido ao baixo custo, efetividade e ausência de ganho de peso – discreta redução). --> Checar a tolerabilidade dentro do 1º mês e HbA1c de 3-6 meses, além da função renal e vitamina B12 esporadicamente. A insulinoterapia pode entrar em qualquer momento do tratamento de DM2, mas em casos de situações “extremas” deve-se implementar: - Hiperglicemia importante (glicemia de jejum >250 mg/dL ou ao acaso >300 mg/dL ou HbA1c >10% ou >9% com medicamentos otimizados). - Pacientes muito sintomáticos (polis), com presença de cetonúria e/ou cetonemia ou estado catabólico intenso. Algumas drogas não insulínicas podem ser mantidas, como sensibilizadores da insulina (metformina e pioglitazona) e drogas que reduzem risco cardiovascular, como agonistas de GLP-1. Mas, deve ser evitadas as sulfonilureias, glinidas e inibidores de DPP-4, pois nesse estágio sua ação será pouco relevante para o controle glicêmico, já que as células beta, nesse momento, não respondem a essas medicações. Em pacientes pouco sintomáticos, mas com HbA1C acima da meta ou pacientes virgens de tratamento com glicemia entre 200-300 mg/dL, pode-se associar um ou mais antidiabéticos em combinação com a metformina, para atingir seu nível alvo de HbA1c. - Pacientes com alto risco cardiovascular: iSGLT-2 e/ou aGLP-1. - Nos obesos: preferência aos aGLP-1, seguidos pelos iSGLT-2. Evita-se associar as sulfonilureias, glinidas e pioglitazona, que estão associadas ao aumento de peso. - Em pacientes com insuficiência cardíaca: inibidores do SGLT-2. - Em pacientes com doença renal do diabetes: inibidores do SGLT-2. Os aGLP-1 também podem ser usados. - Caso o paciente seja idoso com alto risco de queda, de preferência, evita-se medicações que possam causar hipoglicemia diretamente (glinidas e sulfonilureias; insulinas — quando possível), e os iSGLT-2, pelo risco de hipotensão postural. Em termos de potência (do + forte para o mais fraco): insulina > MTF =aGLP-1= SU > glinida > iSGLT-2 = TZD > acarbose = iDPP4. Tratamento do pré-diabetes MEV e/ou Metformina (MTF) – se MEV não for possível ou insuficientes -> início: HbA1c >6% e/ou GJ >110 mg/dL. Insulinoterapia para o DM1 A principal marca do diabetes tipo 1 é a ausência, ou quase ausência, da função das células beta, o que, além de levar à hiperglicemia, pode levar a intenso catabolismo, o que vai contribuir para outros distúrbios metabólicos, como hipertrigliceridemia e cetoacidose. Portanto, o tratamento com insulina é essencial para esses indivíduos e deve ser iniciado ao diagnóstico, para prevenir a descompensação metabólica. O tratamento no DM1 deve mimetizar a fisiologia pancreática, a qual tem dois momentos de Natalia Quintino Dias liberação da insulina: a secreção basal e a pós- prandial. Para isso, utiliza-se: - Ação prandial: insulinas rápidas ou ultrarrápidas (prandiais) para “queimar” o carboidrato ingerido nas refeições. - Ação basal: insulinas de ação intermediária, longa ou ultralonga, visando controlar o débito hepático de glicose. As doses iniciais variam de 0,4 a 1,0 UI/kg/dia — 40-50% da dose de insulina basal e 50-60% da dose de insulina prandial/bolus. Em algumas situações é necessário alterar a dose: - Aumento: puberdade, gestação, uso de corticoides e estresse metabólico (infecções e/ou doenças graves), nestas situações pelo aumento na resistência à insulina e dos hormônios contrarreguladores. - Redução: idosos, baixo peso ou pacientes com insuficiência renal. Cobertura prandial (rápida e ultrarrápida) Para a cobertura prandial, utiliza-se insulina rápida (regular: 30 minutos antes de cada refeição) ou ultrarrápida (de 15 minutos a até imediatamente antes de cada refeição). A dose de insulina pré-refeição corresponde a aproximadamente 50-60% da dose total diária e é dividida em três doses (antes do café, do almoço e do jantar), fixas pré-refeições (deve-se manter a mesma quantidade de carboidratos em todas as refeições, todos os dias) ou com base na metodologia de contagem de carboidratos. Insulina regular Possui a mesma sequência de aminoácidos da insulina humana endógena e é complexada com zinco. Depois que a insulina regular é injetada por via subcutânea, os hexâmeros dissociam-se em dímeros e monômeros e são absorvidos. Essa cinética leva a um atraso na entrada da insulina na corrente sanguínea, por isso é recomendada a aplicação ao menos 30 minutos antes da refeição, com o objetivo de cobrir o incremento glicêmico pós-refeição. Natalia Quintino Dias A insulina regular também é usada por via intravenosa em ambientes hospitalares. A grande novidade é a insulina regular em pó seco para inalação oral, batizada de Afrezza® e aprovada pela Anvisa em 2019. É vendida em cartuchos para administração de 4, 8 ou 12 UI, e seu uso possibilita a redução no número de picadas de agulha, o que representa um enorme ganho na qualidade de vida do paciente. A questão é o preço… o custo de 100 UI da insulina é mais de R$1.500,00, enquanto a insulina regular é vendida em farmácias por R$30,00 e até fornecida pelo SUS. Além do custo, outro limitante são os problemas pulmonares, sendo contraindicada em pacientes com asma, doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e fibrose pulmonar, além de fumantes. O uso requer teste de função pulmonar inicial, com testes repetidos após seis meses de uso e anualmente a partir de então. Insulinas ultrarrápidas Os análogos de insulina de ação têm início mais rápido e duração de ação mais curta do que a insulina regular para cobertura pré-refeição, por isso têm menor risco de hipoglicemia. Na prática, as mais utilizadas desse grupo são: LiSpro, GluliSina e ASparte. Repare que todas têmo “S” no nome, e a dica para prova está aí! São as “Super insulinas", pois são “Super rápidas”. A novidade é a insulina faSter aSparte (fiaSp), com 3 “s” no nome! Ou seja, é uma insulina 3 vezes mais rápida que as “ultrarrápidas comuns”, chegando a iniciar sua ação em até 3 minutos (ao invés de 9 minutos como as outras ultrarrápidas). Cobertura basal (ação intermediária, lenta ou ultralenta) As insulinas basais podem ser aplicadas: - 1x ao dia: Glargina U100, Glargina U300 e Degludeca; - 2x ao dia: Glargina U100, Detemir e NPH; - Ou em 3 ou 4 aplicações (NPH). Insulina NPH (intermediária) É uma suspensão cristalizada de insulina regular, protamina e zinco. Essa suspenção lhe dá um aspecto leitoso característico, o que, inclusive, ajuda alguns pacientes a diferenciá-la da insulina regular, que possui aspecto visual transparente. O problema da NPH é que ela tem um pico de ação, ou seja, “do nada” aumenta a produção de insulina, havendo um risco aumentado de hipoglicemia se o alimento não for consumido durante o período de pico. Insulinas lentas As insulinas lentas e ultralentas são análogas da insulina, ou seja, não são exatamente iguais as secretadas pelo nosso pâncreas, com o objetivo de produzir perfis de insulina com ação mais fisiológica e reduzir o risco de hipoglicemia. As duas principais representantes do grupo são a Glargina U100 e a Detemir. A duração da ação da insulina Glargina U100 é geralmente de 24 horas, permitindo a dosagem de uma vez ao dia. Já a Detemir raramente chega a 24 horas de ação, necessitando ser administrada 2 vezes ao dia. Outra desvantagem é que tem um pico perceptível entre 6 e 8 horas, o que aumenta o risco de hipoglicemia, em comparação com a Glargina. Por sua vez, a Detemir está relacionada a menor ganho de peso e há maior respaldo da literatura para utilização em grávidas. Insulinas ultralentas (lentas de segunda geração) São as insulinas Degludeca e Glargina U300: Degludeca: é quase idêntica à insulina humana. Essa propriedade confere uma longa duração de ação (chega a mais de 42 horas) e reduz a variabilidade na concentração plasmática. Glargina U300: a formulação mais concentrada de insulina Glargina contém 300 UI/mL em vez de 100UI/mL. Com duração de até 36 horas. Natalia Quintino Dias Como duram mais de 24 horas, essas insulinas são aplicadas uma vez ao dia, e para atingir uma concentração sérica estável são necessários de 3 a 5 dias. Monitorização A monitoração da glicemia capilar deve documentar a glicemia pelo menos antes das refeições. Fica a critério do médico acrescentar a monitorização 2 horas após as refeições e ocasionalmente às 3h da madrugada; esse horário é útil, principalmente, para diagnosticar hipoglicemias assintomáticas durante o sono. Ajustes Se a glicemia apresentar grande incremento ou queda após as refeições, temos que ajustar a insulina prandial (rápida ou ultrarrápida). Se a glicemia de jejum ou pré-prandial estiver alta, avalie se houve incremento ou “não decaimento” em relação à glicemia pós-refeição anterior. Caso caia menos que 30-60 mg/dl ou até aumente, está faltando insulina basal naquele horário (ou o paciente fez um “lanchinho” não contabilizado). Caso o(a) paciente mantenha hiperglicemia após o ajuste de dose, antes de fazer novas alterações na insulina prandial à nível ambulatorial, devemos aguardar ao menos 3 dias da mudança anterior para que a insulina entre em equilíbrio na circulação. Insulinoterapia para DM2 Na teoria, a insulinoterapia é uma opção em qualquer momento do tratamento, porém, não é prática habitual, e se inicia após anos da doença. Essa refratariedade ao tratamento habitual geralmente está relacionada ao esgotamento da reserva pancreática de insulina ou à glicotoxicidade. Glicotoxicidade A glicotoxicidade ocorre devido ao aumento do estresse oxidativo no pâncreas, relacionado a altas concentrações de glicose sérica. Essa situação “atordoa” as células beta, reduzindo a secreção de insulina e aumentando a resistência à própria ação da insulina. Clinicamente, identifica-se essa situação se: - Hiperglicemia importante: glicemia de jejum >250mg/dL; glicemia ao acaso >300mg/dL ou HbA1c >10 %; paciente muito sintomático (polis) e/ou com evidência de catabolismo significativo (Síndrome Consumptiva). - Pacientes em recuperação de complicações agudas, como estado hiperglicêmico hiperosmolar e situações de estresse: infarto agudo do miocárdio, infecções, cirurgias etc. Geralmente, durante a glicotoxicidade, é necessária insulinoterapia. Os inibidores de SGLT-2 são contraindicados nessa fase, pois proporcionam a redução da glicemia sem aumento da ação da insulina e podem aumentar glucagon, o que leva a um risco aumentado de cetoacidose diabética, mesmo no DM2. Também devem ser evitadas as sulfonilureias, glinidas e inibidores de DPP-4, pois nesse estágio sua ação será pouco relevante para o controle glicêmico, já que as células beta, nesse momento, não respondem a essas medicações. Mas é possível manter algumas drogas não insulínicas também, como sensibilizadores da insulina (metformina e pioglitazona) e drogas que reduzem risco cardiovascular, como agonistas de GLP-1. A glicotoxicidade pode ser transitória, e voltando a glicemia aos níveis normais -> pode retornar ao tratamento com medicações não insulínicas. Refratariedade aos antidiabéticos não insulínicos A insulinoterapia também é opção quando o controle glicêmico está fora da meta e não há possibilidade de uso de antidiabéticos não insulínicos. Os principais motivos para não introdução de outros antidiabéticos na prescrição são: • Prescrição já está totalmente otimizada; • Contraindicações clínicas; e/ou • Limitações financeiras às associações que ainda seriam possíveis. É mais comum os “escapes” no perfil glicêmico ocorrerem em períodos de jejum, pois durante a noite há aumento dos hormônios contrarreguladores (GH, cortisol etc.), aumentando a produção hepática de glicose, que já é alta no DM2. Esse incremento desproporcional Natalia Quintino Dias no início da manhã é chamado de fenômeno do alvorecer. Nesses casos, uma aplicação diária de insulina basal (de ação intermediária ou análogos de longa ou ultralonga ação), antes de dormir, costuma ser suficiente. -- Os análogos de insulina de ação prolongada são preferidos, pois estão associados a menos episódios de hipoglicemia noturna quando comparados à NPH. -- A dose inicial sugerida é de 10 unidades ou 0,1 a 0,2 unidades/kg/dia, mantendo concomitantemente a medicação oral utilizada. Com a progressão da doença, podem ser necessárias múltiplas doses de insulina. Nesse caso, pode-se manter algumas drogas orais, como sensibilizadores da insulina (metformina e pioglitazona), e drogas que reduzem risco cardiovascular, como análogos de GLP-1 e inibidores de SGLT-2. Mas devem ser evitadas as sulfonilureias, pois podem favorecer hipoglicemias, e as glinidas, acarbose e inibidores de DPP-4, pois, nesse estágio, sua ação será pouco relevante para o controle glicêmico. Após iniciada a insulina basal, deve-se monitorizar a glicemia em jejum para titulação da dose, até glicemia de jejum entre 80-130 mg/dL (o alvo glicêmico deve ser individualizado). Geralmente é avaliada durante 3-4 dias, sendo orientado: - Se glicemia >130 mg/dL: aumentar de 2-4 unidades. - Se qualquer valor de glicemia < 70mg/dL: reduzir a dose. Após o acerto da dose -> monitoriza HBA1c. - Se estiver dentro da meta, mantém o tratamento. - Se HbA1c alta, orienta-se a monitorização pré e pós-prandial e iniciamos a insulina de ação rápida ou ultrarrápida antes da(s) refeição(es) que tiver(em) incremento maior que 50 mg/dL. Efeito Somogyi VS. Fenômeno do Alvorecer Efeito
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