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14 - Endometriose

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 Natalia Quintino Dias 
 
Endometriose 
A endometriose caracteriza-se pela presença de 
tecido endometrial – glândula e/ou estroma 
endometrial – em localização ectópica, fora da 
cavidade endometrial. Confirma-se a presença 
desses tecidos à microscopia, associados ou não a 
macrófagos repletos de hemossiderina. 
Acomete cerca de 10% das mulheres em idade 
fértil, e atualmente acredita-se que mais de 7 
milhões de brasileiras tenham a doença. 
A endometriose pode apresentar-se na forma de 
lesões vermelhas, acastanhadas ou negras, assim 
como pode se distinguir entre lesões pigmentadas 
– típicas – e não pigmentadas – atípicas –, as quais 
incluem vesículas, lesões “em chama de vela” e 
aderências. As lesões vermelhas e as não 
pigmentadas são precoces e mais ativas e parecem 
reagir melhor ao tratamento hormonal, em 
comparação com lesões ovarianas ou profundas. 
As aderências podem ser extensas e envolver o 
intestino, a bexiga e os ureteres, levando, inclusive, 
à hidronefrose. Nos ovários, a lesão mais comum é 
o endometrioma, um cisto de conteúdo espesso e 
cor escura achocolatada. 
De acordo com a profundidade com que o implante 
endometrial penetra no tecido, classifica-se a 
doença em superficial ou profunda; esta última 
determina implantes que penetram mais de 5 mm 
na espessura do tecido. A endometriose profunda 
pode infiltrar o espaço retrouterino, o septo 
retovaginal, a bexiga e a parede intestinal. Casos no 
pulmão, mamas, ossos, sistema nervoso central, 
fígado, vesícula biliar, rins e uretra já foram 
descritos, mas são extremamente raros. 
Ainda não está claro se as diferentes formas 
diferem com relação à dor, à infertilidade ou ao 
prognóstico. 
Localização 
Diversos locais podem ser acometidos pela 
doença, isolados ou simultaneamente. A forma 
mais comum é a multifocal, e os sítios principais 
são o peritônio pélvico, principalmente nas 
fossetas ovarianas e nos ligamentos uterossacros, 
os órgãos pélvicos – ovários, tubas, bexiga, 
sigmoide e reto – e, mais raramente, órgãos 
extrapélvicos, como fígado, pulmões, pleura e 
outros. 
Para a endometriose pélvica, forma mais frequente 
de manifestação da doença, os ovários – superficial 
ou profundamente –, os ligamentos uterossacros e 
o fundo de saco de Douglas representam as 
localizações preferenciais. Os focos de 
endometriose no ovário tornam-se encapsulados, 
formando cistos denominados endometriomas. 
A endometriose extragenital, na maioria dos casos, 
é assintomática, mas deve ser suspeitada quando 
há dor ou massa fora da pelve com sintomas 
cíclicos. O local mais comum de acometimento é o 
intestino, principalmente na região do sigmoide e 
do reto (85%), seguido pelo apêndice cecal e 
intestino delgado. 
Etiopatogenia 
As hipóteses etiopatogênicas para explicar o 
desenvolvimento da doença são muitas. 
Hipóteses etiopatogênicas mais aceitas: 
•Teoria da menstruação retrógrada – teoria de 
Sampson: defende ser o refluxo do sangue 
menstrual, por meio das tubas uterinas pérvias, o 
responsável pelo distúrbio. O sangue menstrual 
contém células viáveis, com capacidade de 
implantação, que, por fatores locais e sob estímulo 
estrogênico, formariam focos de tecido 
endometrial ectópico. Apesar da plausibilidade 
biológica, essa teoria é muito contestada, pois a 
maioria das mulheres apresenta menstruação 
retrógrada e não tem endometriose; 
•Teoria da metaplasia celômica: algumas células 
indiferenciadas – pluripotenciais – situadas nos 
ovários, no peritônio e em outros locais sofrem 
diferenciação em células de endométrio. A 
incitação para tal diferenciação seria o estímulo 
hormonal sobre esse epitélio celômico 
indiferenciado, que se transforma em tecido 
endometrial, em vez do tecido correspondente – 
tecido peritoneal, ovariano etc.; 
•Teoria combinada ou teoria de Javert: aceita 
ambas as hipóteses concomitantemente e explica, 
em parte, a ocorrência dos focos pélvicos – pelo 
refluxo de células endometriais, de acordo com a 
teoria de Sampson; por outro lado, os focos 
longínquos seriam explicados pela metaplasia 
celômica; 
•Teoria imunológica: proposta de meados da 
década de 1990, considera uma série de alterações 
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imunológicas, principalmente relacionadas à 
resposta imune celular Th1, como fator principal. 
Essa teoria explicaria o fato de apenas algumas 
mulheres desenvolverem endometriose, mesmo 
com a maioria delas apresentando menstruação 
retrógrada. Os defeitos imunológicos estudados e 
já comprovados nessa teoria incluem alteração na 
ação citotóxica e no reconhecimento de antígenos 
das células NK (Natural Killer) e alteração na 
secreção de diversas citocinas – IL-1, IL-6, IL-8, TNF-
alfa, IL-12, IL-18 e outras. Apesar de não ser uma 
teoria comprovada, a endometriose tem 
importante associação com alterações 
imunológicas; 
•Teoria da implantação: propõe que células 
endometriais manipuladas durante cirurgias – 
parto cesárea – podem ser implantadas na 
cavidade endometrial e na parede pélvica, criando 
focos de endometriose. Tal teoria foi desenvolvida 
na tentativa de explicar o aparecimento de focos 
de endometriose cicatricial. 
Nenhuma das teorias conseguiu comprovar a 
etiologia da endometriose até o momento. 
Epidemiologia e fatores de risco 
A prevalência não pode ser determinada com 
exatidão, em parte porque o diagnóstico de certeza 
só pode ser feito por laparoscopia, nem sempre 
realizada mesmo nos casos suspeitos. Além disso, 
pacientes assintomáticas só são diagnosticadas se 
submetidas a cirurgia por indicações diversas, e 
pacientes sintomáticas podem ter sintomas 
variados e não específicos. 
Estima-se que cerca de 10% de todas as mulheres 
na menacma tenham endometriose, em torno de 
30% das inférteis e cerca de 50% daquelas com 
queixa de dor pélvica crônica. Sabe-se que a 
prevalência em mulheres negras é menor do que 
em mulheres brancas. 
A endometriose é diagnosticada, em média, na 
terceira década de vida. É descrita a associação a 
mulheres com baixo índice de massa corpórea e 
níveis de ansiedade acima da média. 
Por ser uma doença estrogênio-dependente, todos 
os fatores que propiciam o ambiente 
hiperestrogênico podem favorecer seu 
aparecimento. 
A endometriose é a causa mais comum de 
dismenorreia secundária; entre as mulheres com 
queixa de dor pélvica crônica, a incidência chega a 
atingir 45 a 70%. 
Fatores de risco 
• Antecedente familiar com parente de primeiro 
grau com endometriose; 
• Menarca precoce e menopausa tardia; 
• Nuliparidade; 
• Gestação tardia; 
• Fluxo menstrual aumentado – em volume e/ou 
duração; 
• Estenose cervical e outras obstruções do fluxo de 
saída menstrual; 
• Raça branca; 
• Nível socioeconômico elevado; 
• Quadros de ansiedade, depressão e outros 
transtornos psiquiátricos 
Fatores protetores 
• Tabagismo; 
• Uso de contraceptivos hormonais; 
• Multiparidade; 
• Primeira gestação precoce – antes dos 18 anos. 
Quadro clínico 
A doença pode acometer a mulher durante toda a 
menacma, mas é mais comum ao redor da terceira 
década de vida. Entre as queixas, incluem-se as 
principais: 
• Dismenorreia progressiva – dor pélvica cíclica 
(não tem relação com a extensão ou estadiamento 
da doença); 
• Dor pélvica crônica; 
• Dispareunia de profundidade; 
• Infertilidade; 
• Alterações intestinais e urinárias durante a 
menstruação. 
-> Os sintomas intestinais podem ocorrer sob a 
forma de alteração do hábito intestinal – 
obstipação ou diarreia –, desconforto, distensão 
abdominal e sangramento cíclico – hematoquezia. 
A dismenorreia progressiva, refratária ao 
tratamento medicamentoso habitual, é o principal 
sintoma. Com a progressão da doença, os 
implantes endometrióticos aprofundam-se e lesam 
nociceptores, causando dor neuropática, 
clinicamente expressa por dor pélvica crônica. Esta 
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geralmenteé diária, de grande intensidade e piora 
durante o período menstrual. 
A dispareunia de profundidade está relacionada a 
implantes nos ligamentos uterossacros, ligamentos 
cardinais e fundo vaginal. Em casos extremos, pode 
impedir o ato sexual. 
As alterações anatômicas causadas pela doença 
avançada ou pelo processo inflamatório causado 
por ela podem ter como consequência a 
infertilidade. 
Durante a anamnese deve-se investigar os 
antecedentes familiares – perfil genético, 
principalmente acometendo parentes de primeiro 
grau – e outras doenças. É frequente a associação 
a doenças autoimunes, sistêmicas, como 
fibromialgia, e psiquiátricas, como depressão e 
ansiedade. Em parentes de primeiro grau com 
histórico, há incidência de 6,9% da doença, 
corroborando com a teoria poligênica multifatorial 
do processo. 
Principais sítios de acometimento: 
 
Ovários – 65% 
Ligamentos uterossacros – 28-60% 
Fundo de saco posterior – 30-34% 
Folheto posterior do ligamento largo – 16-35% 
Fundo de saco anterior – 15-35% 
Exame físico 
Pode ser normal, principalmente nos estágios 
iniciais, ou revelar dor à palpação localizada, 
sobretudo no fundo de saco posterior ou nos 
ligamentos uterossacros, fixação dos órgãos 
pélvicos pelas aderências que acompanham a 
doença, retroversão uterina fixa, dor ao toque, 
principalmente de útero/anexos e fundo de saco, 
dor à mobilização do colo, aumento anexial – 
quando há acometimento ovariano com a 
formação de endometriomas – e empastamentos 
nodulares em fundo de saco ou espessamento dos 
ligamentos uterossacros. 
Para melhor identificação dos nódulos e 
empastamentos no fundo de saco vaginal, 
recomenda-se examinar a paciente durante o 
período menstrual. 
Diagnóstico 
A suspeita da doença baseia-se na história clínica, 
no exame físico e em exames laboratoriais. O 
diagnóstico definitivo é feito por videolaparoscopia 
diagnóstica. No entanto, o diagnóstico de 
presunção é possível por meio da combinação de 
sinais, sintomas e exames laboratoriais e de 
imagem, permitindo iniciar um plano terapêutico 
de baixo risco e bem tolerado. 
Exames laboratoriais 
São inespecíficos, como provas de atividade 
inflamatória (proteína C reativa, por exemplo), e 
proteína sérica amiloide A (normal até 5UI/ml) e 
CA-125 (35 UI/ml) não são mais utilizados. 
Exames de imagem 
Podem ser de grande importância no diagnóstico. 
Nenhum deles pode fornecer o diagnóstico final, o 
qual só pode ser obtido com a realização de 
videolaparoscopia. 
Ultrassonografia pélvica e transvaginal: Pode 
mostrar-se normal ou revelar cistos ovarianos de 
conteúdo espesso homogêneo, com aspecto “em 
vidro moído”, achado característico do 
endometrioma. 
Alguns ultrassonografistas mais experientes 
conseguem evidenciar comprometimento da 
parede intestinal, inclusive das camadas, 
percentual da alça intestinal envolvida, bloqueio 
pélvico, nódulos retrouterinos e outros implantes. 
Atualmente, dá-se preferência à ultrassonografia 
transvaginal com preparo intestinal, que permite a 
visualização dos focos ectópicos e determina a 
extensão intestinal da doença. 
Tomografia computadorizada da pelve: É útil no 
afastamento de outras hipóteses que contemplem 
o diagnóstico diferencial de dor pélvica crônica, 
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bem como na identificação de repercussões 
intestinais e urinárias – por exemplo, hidronefrose. 
Ressonância magnética: É recomendado que seja 
considerada técnica de 2ª linha, sendo solicitada 
após a ultrassonografia com preparo intestinal 
para avaliação da endometriose pélvica. É útil 
antes da cirurgia para estadiamento pré-
operatório adequado. 
Ecocolonoscopia ou ultrassonografia transretal: 
Também possibilita avaliar a existência de 
acometimento intestinal e, quando presente, a 
profundidade das lesões em relação às camadas da 
parede intestinal – serosa, muscular, submucosa e 
mucosa. 
Videolaparoscopia: É o padrão-ouro para o 
diagnóstico. É ideal, pois permite o estadiamento e 
pode ser utilizada como arma terapêutica. A 
visualização de toda a cavidade pélvica e 
abdominal, portanto, dos implantes 
endometrióticos, é possível por intermédio dessa 
técnica. Os implantes podem ser negros, castanhos 
ou marrons pelo depósito de hemossiderina 
(descrição clássica da lesão endometriótica) ou ter 
formas como lesões brancas, lesões vermelhas 
“em chama de vela”, aderências e defeitos 
peritoneais (síndrome de Allen-Master). 
Classificação 
É classificada de acordo com os achados 
intraoperatórios, que se considera: tamanho, 
profundidade, localização dos implantes 
endometrióticos e gravidade das aderências. 
Estágios da classificação: 
• Estágio 1 – doença mínima: implantes isolados e 
sem aderências significativas; 
• Estágio 2 – doença leve: implantes superficiais 
com menos de 5 cm agregados e espalhados, sem 
aderências significativas; 
• Estágio 3 – doença moderada: múltiplos 
implantes superficiais e profundos, aderências 
peritubárias e periovarianas evidentes; 
• Estágio 4 – doença grave: múltiplos implantes 
superficiais e profundos, incluindo endometriomas 
e aderências densas e firmes. 
O estágio 4 corresponde à doença mais extensa, 
sem correlação, porém, com o prognóstico e o 
nível de dor. A dor é influenciada pela 
profundidade de implantação endometriótica e 
sua localização em áreas de maior inervação. 
Histologicamente, ainda se divide a endometriose 
em superficial e profunda. A profunda é definida 
como uma massa de endometriose sólida situada a 
mais de 5 mm de profundidade no peritônio. 
Encontra-se, geralmente, no septo retovaginal 
(também conhecido como septo retocervical), 
reto, cólon retossigmoide, bexiga, ureter e outras 
estruturas fibromusculares pélvicas, como os 
ligamentos uterinos e a vagina. 
Aspectos macroscópicos das lesões 
As lesões atípicas se apresentam através de 
vesículas, lesões vermelhas em chama de vela, 
defeitos peritoneais (janela peritoneal) e finas 
aderências (em véu de noiva) no hilo ovariano ou 
no fundo de saco posterior. 
As lesões típicas são consideradas de acordo com 
sua evolução e idade, a saber: 
→ Vermelhas: são muito ativas. Podem se 
apresentar como petéquias. 
 
→ Pretas: são menos ativas. Descritas como 
“queimadura por pólvora”. Podem se apresentar 
como nódulos pretos, castanho-escuros (café com 
leite) ou azulados, ou como pequenos cistos 
contendo hemorragia antiga circundada por um 
grau variável de fibrose. 
 
→ Brancas: são consideradas resquícios 
cicatriciais. 
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A evolução natural de uma lesão inicial translúcida, 
passando pelas fases vermelhas até preta e 
cicatricial, ocorre num período aproximado de 7-10 
anos. Com a progressão da idade, ocorre uma 
diminuição do número de lesões avermelhadas e 
um incremento das lesões escuras ou das 
cicatriciais. 
No entanto, nem todas as lesões seguem 
rigorosamente a evolução natural. Fatores 
etiopatogênicos individuais podem determinar ou 
alterar a evolução das lesões. Apenas 47% das 
lesões não tratadas seguem o curso evolutivo 
natural. 
Aspecto microscópico das lesões 
São observadas glândulas e estroma endometriais 
com ou sem macrófagos repletos de 
hemossiderina. 
 
Diagnóstico diferencial 
Todas as doenças que cursam com dor pélvica, 
dispareunia e infertilidade, associadas ou 
isoladamente, são possíveis diagnósticos 
diferenciais. O estadiamento não está 
correlacionado à severidade dos sintomas, fato 
que torna a endometriose um importante 
diagnóstico diferencial de diversas doenças, 
especialmente as ginecopatias: miomatose, 
adenomiose, doença inflamatória pélvica crônica, 
torção ovariana, neoplasias ovarianas, gravidez 
ectópica e infecção do trato urinário. 
Tratamento 
O objetivo é maximizar o tratamento 
medicamentoso e evitar procedimentos cirúrgicos 
repetidos. Por isso, a decisão terapêutica deve serindividualizada, e também se devem considerar 
apresentação clínica, severidade dos sintomas, 
localização e extensão da doença, desejo 
reprodutivo, idade, efeitos colaterais das 
medicações e taxa de complicações cirúrgicas, 
além do objetivo da paciente. 
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A abordagem inclui uso de analgésico, tratamento 
hormonal, intervenção cirúrgica e terapia 
combinada, visando melhorar o quadro, diminuir 
ou eliminar os sintomas, melhorar a qualidade de 
vida e evitar a progressão da doença. 
Tratamento clínico 
O princípio da terapia medicamentosa é bloquear 
a produção estrogênica ovariana, evitando a 
proliferação endometrial e o sangramento dos 
implantes no momento da privação hormonal. 
Portanto, o objetivo do tratamento é manter a 
paciente em amenorreia, cuja obtenção facilita a 
remissão e o manejo dos sintomas. 
Contraceptivos orais ou injetáveis 
mensais/trimestrais, esteroides como danazol e 
gestrinona, implante subcutâneo de liberação de 
progestogênios e sistemas intrauterinos 
liberadores de levonorgestrel: todas essas 
medicações de base hormonal visam promover a 
atrofia dos focos e alcançar um estado de 
hipoestrogenismo funcional. 
O que define o tratamento da endometriose após 
a videolaparoscopia é o desejo da paciente de 
gestar. Pacientes que desejam gestar apresentam 
as maiores taxas de fertilidade nos primeiros dias 
subsequentes à videolaparoscopia. Para tais 
pacientes, não se recomenda a prescrição do 
tratamento medicamentoso, pois este vai interferir 
negativamente na fertilidade. Já para as pacientes 
que não desejam gestar, há muitas opções 
terapêuticas. 
Para pacientes que não desejam gestar: 
- Contraceptivos orais combinados: Têm a grande 
vantagem do baixo custo e da facilidade 
posológica, promovem bom controle dos sintomas 
e devem ser usados de modo contínuo. São ideais 
para o início do tratamento, pois promovem 
melhor atrofia dos focos ectópicos. Não há 
preferência por preparados específicos, e o 
importante é que a paciente use continuamente 
para permanecer em amenorreia. 
- Progestogênios: Podem ser administrados por via 
oral de forma contínua (desogestrel 75 mg, por 
exemplo) ou injetável (150 mg de acetato de 
medroxiprogesterona trimestralmente), e visam à 
atrofia endometrial progressiva. Os principais 
progestogênios empregados por via oral, 
atualmente, são o desogestrel e o dienogest. Por 
via intramuscular usa-se com frequência o acetato 
de medroxiprogesterona. O tratamento pode ser 
feito também com o uso de implantes subcutâneos 
de liberação de etonogestrel, com boa resposta no 
decréscimo da intensidade dos sintomas 
relacionados à dor. 
Há estudos demonstrando melhora do quadro 
álgico com uso de Dispositivo Intrauterino (DIU) de 
levonorgestrel, especialmente a recorrência de 
dismenorreia no uso após tratamento cirúrgico. 
- Gestriona: Trata-se de um progestogênio com 
ação antiestrogênica e alguns efeitos 
androgênicos, como acne, seborreia e hirsutismo. 
Pelos seus efeitos colaterais e pela eficácia 
moderada no combate aos sintomas, atualmente é 
pouco utilizada. A dose é de 1,25 ou 2,5 mg, Via 
Oral (VO), 2x/sem. 
- Danazol: É um derivado da 17-
alfaetiniltestosterona, portanto com ação 
androgênica e agonista da progesterona, 
eliminando os picos de FSH e LH do meio do ciclo. 
Além disso, promove estado hipoestrogênico e 
hiperandrogênico, atrofiando o tecido endometrial 
ectópico. A dose usual é de 200 a 800 mg/d, por 
seis meses. Tem efeitos colaterais nem sempre 
bem tolerados, motivo pelo qual tem sido cada vez 
menos usado e, que, muitas vezes, levam à 
interrupção do tratamento, como fogachos, ganho 
ponderal, seborreia, acne, hirsutismo e 
engrossamento da voz, bem como piora do perfil 
lipídico com elevação do LDL e diminuição do HDL. 
A dose utilizada é de 200 mg, VO, 2x/d. 
- Análogos do GnRH: Atuam na secreção das 
gonadotrofinas hipofisárias. Deve-se lembrar que, 
para haver o ciclo menstrual normal, o GnRH deve 
ser liberado de modo pulsátil, em picos cuja 
frequência oscila durante as fases proliferativa e 
secretora. Quando se administra uma substância 
análoga do GnRH, esses pulsos fisiológicos são 
suprimidos, assim como a secreção de FSH e LH, 
determinando um estado de hipogonadismo 
hipogonadotrófico. Logo após a primeira 
administração dessas drogas, pode haver fase de 
ação agonista, com aumento da produção de FSH e 
LH e dos esteroides sexuais, seguido por 
dessensibilização dos receptores de GnRH por 
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meio de downregulation, com supressão do FSH, 
do LH e dos esteroides sexuais. Por determinarem 
um estado de “menopausa artificial” ou 
“pseudomenopausa”, alguns efeitos colaterais 
característicos da síndrome do climatério podem 
ser referidos: fogachos, atrofia vaginal, insônia, 
cefaleia, depressão. No entanto, uma das 
principais consequências deletérias do uso dos 
análogos do GnRH é a perda de massa óssea, o que 
limita seu uso ao período de seis meses. É possível 
reduzir os efeitos colaterais e a perda óssea com a 
associação de pequenas doses de estrogênios ao 
tratamento, método conhecido como add-back 
therapy, utilizando estrogênios conjugados 0,625 
mg/d. Apesar de excelentes para o controle dos 
sintomas de endometriose, os análogos do GnRH 
são reservados para casos específicos em função 
dos seus efeitos colaterais. 
- DIU com levonorgestrel: A liberação contínua de 
progesterona promove a atrofia do endométrio e a 
regressão dos focos de endometriose. As pacientes 
que entram em amenorreia com o uso do 
endoceptivo apresentam excelentes taxas de 
regressão dos sintomas álgicos cíclicos. 
Tratamento empírico: A abordagem inicial para 
mulheres com suspeita de endometriose que não 
desejam engravidar no momento, sem evidência 
de endometriomas maiores de 6 cm na 
ultrassonografia e sem sinais de obstrução ureteral 
e/ou intestinal é a prescrição de contraceptivos 
contínuos. 
-> Na ausência de contraindicação ao uso de 
estrogênios, lança-se mão dos contraceptivos 
combinados. 
-> Já para as que têm contraindicação, são 
preferidos os anticoncepcionais com apenas 
progestogênios. 
A mulher deve ser reavaliada em três a quatro 
meses, mantendo a terapêutica em caso de 
melhora dos sintomas até a manifestação do 
desejo de engravidar ou o alcance da menopausa. 
Para mulheres não responsivas à terapia descrita 
ou com evidência de lesões anexiais sugestivas de 
endometriomas maiores de 6 cm ou ainda com 
lesões que provocam sinais ou sintomas 
obstrutivos no trato urinário ou gastrointestinal, é 
indicada a laparoscopia. 
Para pacientes que desejam gestar e preenchem 
critérios para infertilidade – um ano de tentativas 
sem sucesso –, também estará indicada a 
videolaparoscopia. 
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Tratamento cirúrgico 
O tratamento cirúrgico permite o diagnóstico da 
doença, conforme já relatado para a 
videolaparoscopia, bem como reduz o quadro de 
dor por meio da destruição dos implantes 
endometrióticos, e acesso a cisto ou massa 
pélvicos. 
Considera-se cirurgia nos seguintes casos: 
❖ Dor persistente, apesar da tentativa de 
tratamento por seis a 12 meses; 
❖ Contraindicação ou recusa do tratamento 
clínico; 
❖ Exclusão de malignidade na massa anexial; 
❖ Obstrução intestinal ou do trato urinário, 
endometriomas ovarianos com diâmetro 
superior a 6 cm, acometimento de apêndice 
(por ser um diferencial de tumor carcinoide), 
de íleo (pelo risco de oclusão intestinal) e de 
ureter (pelo risco de exclusão renal). 
Planejamento cirúrgico: O planejamento cirúrgico 
deve considerar o resultado cirúrgico desejado 
pela paciente, aconselhamento sobre a extensão e 
abordagem da cirurgia programada com seus 
possíveis riscos – lesão, principalmente da bexiga e 
do intestino, possibilidade de redução da reserva 
ovariana, além do próprio ato operatório em si.O ideal é que, a partir do momento da indicação 
cirúrgica, o tratamento seja resolutivo, avaliando-
se a necessidade de equipe cirúrgica 
multidisciplinar (urologista, cirurgião geral e 
proctologista). Eventualmente, apenas uma 
videolaparoscopia pode não ser suficiente para o 
tratamento; não raro é necessária a reabordagem 
videolaparoscópica. Todavia, o ideal é o menor 
número possível de intervenções cirúrgicas. 
As cirurgias laparotômicas também podem ser 
realizadas para diagnóstico e tratamento, porém 
têm a desvantagem de limitar a visualização da 
cavidade pélvica e abdominal e cursar com maior 
formação de aderências que podem ocasionar 
persistência da dor pélvica. 
O tratamento cirúrgico é dividido em conservador 
– primeira linha – e definitivo. 
• Conservador: executam-se a ablação ou 
excisão dos focos, a lise de aderências e a 
investigação da permeabilidade tubária. 
• Definitivo: O tratamento definitivo inclui 
ooforectomia bilateral com ou sem 
histerectomia, reservada para casos de 
manejo difícil com falha de outras opções 
terapêuticas e de prole constituída. Tal prática 
leva à menopausa precoce, com sintomas 
vasomotores, perda óssea e impacto 
cardiovascular. Nessas pacientes, uma 
pequena quantidade de tecido ovariano pode 
sobrar após cirurgia na pelve congelada, 
contribuindo para síndrome do ovário 
remanescente, que cursa com recorrência da 
dor pélvica. 
No climatério, a terapia de reposição hormonal de 
pacientes com histórico de endometriose pode ser 
realizada. Mesmo em pacientes submetidas à 
histerectomia, a terapia de reposição hormonal 
deve ser combinada de estrogênios e 
progestogênios para que não ocorra o estímulo de 
estrogênio isolado sobre o foco ectópico, o que 
poderia piorar a evolução da doença. 
Endometrioma: A abordagem do endometrioma 
visa à melhora dos sintomas, prevenção de 
complicações relacionadas com massa anexial – 
ruptura e torção –, exclusão de malignidade, 
quando tem aparência atípica e volume grande, 
melhora da subfertilidade e preservação da função 
ovariana. É possível fazer acompanhamento clínico 
e ultrassonográfico semestral por dois anos em 
mulheres assintomáticas e com imagem menor 
que 6 cm. 
O tratamento cirúrgico está indicado quando o 
endometrioma apresenta 6 cm ou mais. O padrão-
ouro é a ooforoplastia com cistectomia – ressecção 
da cápsula do endometrioma –, de menor recidiva 
do que ablação e fenestração no âmbito do 
tratamento cirúrgico conservador. O tratamento 
cirúrgico dos endometriomas menores de 6 cm fica 
reservado para as pacientes com desejo de gestar. 
Nestes casos, a cistectomia segue sendo a melhor 
opção. 
Prevenção de recidiva 
A recidiva acontece em cerca de 40% dos casos. 
A forma mais eficaz de preveni-la ou retardá-la é a 
gravidez, com maiores chances de ocorrer a 
reincidência em até um ano a partir da cirurgia. Se 
esse não é o desejo da paciente, os 
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anticoncepcionais hormonais contínuos ou o 
dispositivo intrauterino de progesterona permitem 
controle razoável da doença. 
A histerectomia isolada não impede a recidiva, e a 
ooforectomia deve ser evitada em pacientes 
jovens, com ou sem desejo reprodutivo, exceto em 
casos extremos. 
Endometriose e infertilidade 
A endometriose pode levar à infertilidade tanto 
nos estágios mais avançados, por alterações 
anatômicas causadas pelas aderências ou cistos 
endometrióticos, quanto nos mais iniciais. Estima-
se que 50% dos casos apresentam infertilidade 
associada. 
Nos estágios iniciais, já se demonstra um 
microambiente peritoneal desfavorável à 
gestação. Existem os distúrbios ovulatórios – com 
altas taxas de anovulação –, a síndrome do folículo 
luteinizado não roto e as alterações nas 
concentrações de substâncias inflamatórias e 
células no fluido peritoneal, capazes até de 
fagocitar gametas e embriões. 
. Quando a endometriose é classificada como grave 
(estádios III e IV), o auxílio da reprodução assistida 
de alta complexidade é extremamente comum. 
Nesse caso, o tratamento cirúrgico deve ser 
realizado previamente para melhor sucesso da 
terapia de reprodução assistida. As técnicas de 
reprodução assistida indicadas para pacientes com 
endometriose são a Fertilização In Vitro (FIV) ou a 
injeção intracitoplasmática de espermatozoide 
(ICSI). 
Endometriose e câncer 
De acordo com uma meta-análise publicada em 
2012, foi observado que a doença aumenta o risco 
de câncer de ovário em duas a três vezes, 
principalmente dos tumores epiteliais de baixo 
grau, incluindo os adenocarcinomas 
endometrioides, os tumores borderline serosos e 
os adenocarcinomas de células claras. Ainda não se 
sabe exatamente o nexo causal dessa associação, 
mas os estudos demonstraram resultados 
estatisticamente significativos.

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