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TRANSTORNOS RELACIONADOS AO USO DE SUBSTÂNCIAS Dr. Samuel Aurélio Saúde Mental 9º T - 2022.1 VISÃO GERAL DO USO DE SUBSTÂNCIAS E DEPENDÊNCIA QUÍMICA Todas as vezes que pensamos em dependência química, temos que pensar em 02 componentes, o comportamental e o neurobiológico. · Componente Comportamental: diz respeito aos valores e conhecimentos do paciente. Ele, e todo mundo, sabe que é errado usar droga, mas ocorre uma alteração comportamental onde a moral deixa de ser o suficiente para suprimir o desejo pelo uso. · “Prejuízo na capacidade de inibir a busca por determinada droga em resposta a informações ambientais, que normalmente deveriam suprimir o comportamento” · Componente Neurobiológico: o uso de qualquer substância gera uma sensibilização do sistema de recompensa, ou seja, vai ocorrer a liberação de neurotransmissores que tornam a experiência do uso prazerosa, e isso vai perpetuar o uso. · Uma vez sensibilizado, o sistema de recompensa não é mais dessensibilizado, ou seja, forma-se uma memória, é por isso que não existe “ex dependente-químico”. · “O componente neurobiológico está ligado a uma alteração do sistema de recompensa, a outros sistemas de neurotransmissão relacionados ao uso inicial da droga e a exposição crônica a determinada substância psicoativa” GLOSSÁRIO DO USO DE SUBSTÂNCIAS CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS (DSM-V) É o mesmo critério para todas as substâncias, embora esteja descrito o uso de álcool. · A) Um padrão problemático de uso de álcool, levando a comprometimento ou sofrimento clinicamente significativos, manifestado por pelo menos dois dos seguintes critérios, ocorrendo durante um período de 12 meses: · 1. Álcool é frequentemente consumido em maiores quantidades ou por um período mais longo do que o pretendido. · 2. Existe um desejo persistente ou esforços mal sucedidos no sentido de reduzir ou controlar o uso de álcool. · 3. Muito tempo é gasto em atividades necessárias para a obtenção de álcool, na utilização de álcool ou na recuperação de seus efeitos. · 4. Fissura ou um forte desejo ou necessidade de usar álcool. · 5. Uso recorrente de álcool, resultando no fracasso em desempenhar papéis importantes no trabalho, na escola ou em casa. · 6. Uso continuado de álcool, apesar de problemas sociais ou interpessoais persistentes ou recorrentes causados ou exacerbados por seus efeitos. · 7. Importantes atividades sociais, profissionais ou recreacionais são abandonadas ou reduzidas em virtude do uso de álcool. · 8. Uso recorrente de álcool em situações nas quais isso representa perigo para a integridade física. · 9. O uso de álcool é mantido apesar da consciência de ter um problema físico ou psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado pelo álcool (ex: paciente cirrótico que continua usando o álcool) · 10. Tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspectos: · a) Necessidade de quantidades progressivamente maiores de álcool para alcançar a intoxicação ou o efeito desejado. · b) Efeito acentuadamente menor com o uso continuado da mesma quantidade de álcool. · 11. Abstinência, manifestada por qualquer um dos seguintes aspectos: · a) Síndrome de abstinência característica de álcool. · b) Álcool (ou uma substância estreitamente relacionada, como benzodiazepínicos) é consumido para aliviar ou evitar os sintomas de abstinência – o paciente utiliza a substância para aliviar os efeitos que a falta dessa própria substância faz no organismo. CICLO DE DEPENDÊNCIA !!!! É válido para qualquer substância que ativa o sistema de recompensa. Esse ciclo é composto por 03 etapas: antecipação (é o período que antecede o uso, onde é feito o resgate da memória afetiva relacionada a substância), intoxicação e abstinência. Reforço Positivo: não existe sofrimento relacionado ao uso da substância, a passagem da antecipação para a intoxicação é marcada pelo impulso, ou seja, o indivíduo reconhece o risco e assume ele por prazer (atitude impulsiva, é consciente e impulsionada pelo prazer). A intoxicação é a recompensa esperada, e a abstinência não é marcada pelo surgimento de sintomas pela ausência da substância. · É uma vontade egossintônica, ou seja, vai de acordo com o próprio ego. Reforço Negativo: quando a vinculação com a substância é nociva à saúde, ou seja, quando há dependência, há a transição do reforço positivo para o negativo, nesses casos, antecipação é marcada por preocupação e culpa, e passagem para a intoxicação é marcada pela compulsão, ou seja, o indivíduo sofre ao pensar na substância porque reconhece a nocividade, mas ainda assim não consegue controlar a necessidade do uso. A abstinência tem sintomas de uma síndrome de abstinência e um afeto negativo relacionado. · É uma vontade egodistônica, ou seja, ao contrário do próprio ego. Em outras palavras… · Dependência pode ser entendida como uma progressão do reforço positivo para o negativo e uma progressão do transtorno impulsivo para o compulsivo. A exposição inicial a uma DPA causa uma sensação de prazer/recompensa, tal experiência “ensina” o cérebro a antecipar a recompensa na exposição seguinte. · Quando consumida, prazer/recompensa são experimentados mais uma vez, embora isso possa ser seguido por arrependimento. O uso ocasional e controlado permanece uma escolha impulsiva, ou seja, motivada pelo reforço positivo dos efeitos gratificantes da substância. · Para aqueles indivíduos com fatores de risco para a dependência ou no decorrer da exposição excessiva, o uso de SPA vai causar alterações neurológicas que levam ao desenvolvimento de fissuras, diminuição da recompensa = tolerância, síndrome de abstinência e estado afetivo negativo após a interrupção do consumo. · A dependência pode ser definida como um transtorno compulsivo motivado pelo reforço negativo. Sintomas de abstinência e afeto durante a privação levam a fissura e preocupação com a obtenção da droga, e o uso da substância proporciona o alívio desses sintomas. FATORES DE RISCO PARA DEPENDÊNCIA O caminho entre a experimentação e a dependência é marcado por uma série de fatores de risco. · Experimentação precoce · Privação social · Estresse · Uso regular da droga · Características da droga: potencial de adicção · É o tempo de ação X a capacidade de intoxicação. Quanto maior o potencial de adicção da droga, maior a chance de o paciente vir a desenvolver dependência. · Neuroadaptações relacionadas à dependência: genética, transtornos comórbidos e exposição pré-natal Fatores Ambientais: · Exposição pré-natal · Exposição precoce (uso do pais) · Uso precoce · Privação social precoce · Estresse psicológico · Presença de doença mental Características da Droga: · Especialidades farmacológicas da substância · Via de administração: afeta os índices de absorção da droga pelo organismo Fatores Genéticos: · A genética afeta a vulnerabilidade e a dependência · Não existe um único gene diretamente relacionado, a dependência é resultado de inúmeros fatores, assim como a maioria dos outros transtornos psiquiátricos. · Existe relação com mecanismos epigenéticos, ou seja, alteração da expressão gênica. · Ex: estresse pré-natal ou no início da vida que alteram o circuito cerebral e, assim, aumentam o risco de dependência PADRÕES DE DEPENDÊNCIA RELACIONADOS A UMA SUBSTÂNCIA Álcool e Opióides: inicialmente, causam intoxicação intensa, com uso crônico pode gerar tolerância (permanece alguma intoxicação), a interrupção pode levar a abstinência grave. · Antecipação = fissura profunda e intensa. · Intoxicação = tolerância à intoxicação (quanto mais utiliza, mais tolerância desenvolve e utiliza cada vez mais quantidade) · Abstinência = disforia profunda, dor física e emocional (ansiedade e irritabilidade). Estimulantes (anfetaminas, cocaína e crack): inicialmente, intoxicação intensa e consumo excessivo, ocorre ampla tolerância com o consumo crônico, preocupação excessiva com o consumo e fissuras. A abstinência não é tão intensa. · Antecipação/Preocupação= fissura profunda e intensa · Intoxicação/Binge = profunda tolerância à intoxicação· Abstinência = disforia Maconha: inicialmente consumo excessivo/, intoxicação intensa, que faz a transição para o consumo regular, afeta a programação de atividade diária do indivíduo, entretanto não há mais intoxicação. Pode ocorrer disforia durante a abstinência, mas fissura comumente não é intensa · Antecipação: não há fissura, portanto não há sintomas físicos e nem emocionais · Intoxicação = inicialmente intensa com transição para ingestão regular titulada · Nos primeiros usos os efeitos são muito intensos, mas conforme o indivíduo a utilizar a maconha com frequência, na mesma quantidade, os efeitos tornam-se menos intensos · Abstinência = leve disforia e sintomas de ansiedade Nicotina: o padrão de uso é geralmente demasiado compulsivo e titulado, afetando a programação das atividades diárias do indivíduo, entretanto, não há intoxicação. A abstinência pode levar disforia intensa, irritabilidade, distúrbios do sono e fissuras. · Antecipação/preocupação = fissura muito intensa e forte · Intoxicação = ingestão titulada altamente compulsiva que afeta a vida diária · Abstinência = disforia muito intensa irritabilidade, distúrbios do sono CONSIDERAÇÕES CLÍNICAS · É comum indivíduos com um transtorno por uso de substância fazerem uso de mais de uma delas, o que complica o manejo dos pacientes. · Infelizmente, há poucas pesquisas em relação ao tratamento de pacientes que fazem uso de múltiplas substâncias. · Indivíduo com transtorno por uso de substâncias também têm risco maior de: · Suicídio · Comportamento agressivo · Comorbidades psiquiátricas. · Quando o transtorno psiquiátrico e o uso de substâncias ocorrem simultaneamente, em geral é necessário tratar as duas condições. · Não se pode pressupor que o sucesso do tratamento do transtorno psiquiátrico vai resolver o transtorno por uso de substância · Pesquisas e a opinião de clínicos especialistas apoiam o tratamento integrado do uso de substâncias e do transtorno psiquiátrico. · Presença de um transtorno por uso de substância de modo geral afeta a escolha do medicamento para um transtorno psiquiátrico TRATAMENTO DAS DEPENDÊNCIAS No geral é comportamental, só vamos prescrever medicações quando há presença de transtorno comórbido (ex: ácido valpróico quando há alternância de humor muito grande). Também fazemos contenção química para redução da fissura, com o uso de Prometazina, porque é sedativo, ou com Levomepromazina. O único transtorno com tratamento eficaz comprovado é pelo uso de Nicotina, usamos Bupropiona, e pelo uso do álcool, com uso da Naltrexona (bloqueia as vias do sistema de recompensa, ou seja, tira o prazer gerado pelo consumo do álcool) Ordem do Tratamento: 1) Abstinência de álcool 2) Transtorno de humor 3) Transtorno de ansiedade 4) TDAH 5) Cigarro