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Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento O tratamento da obesidade requer uma abordagem multidisciplinar que obrigatoriamente requer mudanças do estilo de vida, as quais implicam reeducação alimentar e aumento da atividade física. Para muitos pacientes, a terapia medicamentosa também se faz necessária, já que facilita e/ou aumenta a adesão à dieta, propiciando uma perda ponderal maior e mais duradoura. Dois importantes conceitos sobre a obesidade são cruciais: O primeiro estabelece a obesidade como doença crônica multifatorial, não passível de “cura” por meio de terapias a curto prazo. O segundo indica que a obesidade deve ser abordada de modo multidisciplinar, envolvendo mudanças no estilo de vida e recursos farmacológicos, a exemplo do diabetes melito. As recentes diretrizes da Endocrine Society recomendam a farmacoterapia para indivíduos com IMC > 30 kg/m2 ou IMC ≥ 27 kg/m2 na presença de, pelo menos, uma condição mórbida relacionada à obesidade, como DM2, dislipidemia, hipertensão arterial sistêmica (HAS) ou apneia do obstrutiva do sono. Atualmente os únicos agentes antiobesidade disponíveis em nosso meio são a sibutramina (agente sacietógeno) e o orlistate (inibidor das lipases intestinais). Alguns psicotrópicos, como a fluoxetina, têm sido também empregados, mas trata-se de indicação off-label, com limitada eficácia. Nos últimos 4 anos, 4 novos fármacos foram aprovados pelo FDA (Food and Drug Administration): (1) lorcaserina (em 2012); (2) a combinação de naltrexona e bupropiona em uma formulação de liberação prolongada (em 2014); (3) a combinação de fentermina e topiramato em formulação de liberação prolongada (em 2014); e (4) liraglutida 3,0 mg (Saxenda®), em 2014. Sibutramina Características farmacológicas. A sibutramina é um inibidor de recaptação de serotonina e norepinefrina. Diferentemente dos anorexígenos catecolaminérgicos, trata-se mais de um agente sacietógeno, visto que seu efeito principal sobre a regulação da ingestão de alimentos parece estar relacionado muito mais com o aumento da saciação e com o prolongamento da sensação de saciedade do que com um efeito direto de supressão da fome. Dose. A dose atualmente recomendada para a sibutramina (Sibus®; Biomag® etc.; comp. 10 e 15 mg) é de 10 a 20 mg/dia. Efeitos colaterais. A sibutramina é em geral bem tolerada. Em vários estudos, os efeitos adversos (EA) mais comuns foram cefaleia, secura de boca, constipação intestinal e insônia (em 10 a 30% dos pacientes). EA menos frequentes foram aumento do apetite, tonturas, taquicardia, sudorese, náuseas, dor abdominal e hipermenorreia. Devido a seu efeito adrenérgico, a sibutramina pode determinar elevação da pressão arterial (PA) e da frequência cardíaca (FC), geralmente discreta. Contraindicações. O uso da sibutramina está contraindicado em gestantes e indivíduos com sabida hipersensibilidade ao medicamento. Segundo as recomendações da Anvisa, deve também ser evitado em pacientes com hipertensão inadequadamente controlada (PA > 140/95 mmHg), histórico de doença cardiovascular ou cerebrovascular, bem como em diabéticos tipo 2 com pelo menos um fator de risco adicional (i. e., hipertensão controlada por medicação, dislipidemia, prática atual de tabagismo ou nefropatia diabética), pessoas com idade > 65 anos, crianças e adolescentes. Orlistate O orlistate é um potente inibidor de lipases do trato gastrintestinal (TGI). Como consequência, cerca de 30% dos triglicerídeos provenientes da dieta permanecem não digeridos e não são absorvidos pelo intestino delgado, atravessando o TGI e sendo eliminados nas fezes. O orlistate não apresenta atividade sistêmica, e sua absorção intestinal é desprezível em doses de até 800 mg/dia. O orlistate não atua sobre os circuitos neuronais reguladores do apetite; contudo, ele promove uma liberação mais precoce do GLP- 1, que tem efeito incretínico e sacietógeno Posologia. A dose recomendada para o orlistate (Xenical®, cáp. 120 mg) é de 120 mg antes de cada refeição. No entanto, mesmo na posologia de 60 mg 3 vezes/dia, a medicação mostrou-se mais eficaz que o placebo. Efeitos metabólicos. Foi demonstrado que o uso de orlistate propicia melhora de vários parâmetros metabólicos, e o efeito sobre o perfil lipídico é superior ao esperado para a perda ponderal. Tal fato se deve à redução de 25 a 30% da absorção intestinal de colesterol e triglicerídeos (TG) promovida pelo orlistate. Em pacientes com DM2, o impacto sobre o controle glicêmico induzido pelo orlistate também supera o esperado para a perda ponderal alcançada. O mecanismo postulado para esse efeito envolve melhora na sensibilidade à insulina, absorção lenta e incompleta dos lipídios da dieta, redução nos níveis plasmáticos de ácidos graxos pós-prandiais, diminuição no tecido adiposo visceral e estímulo à secreção de GLP-1. Tolerabilidade. Uma série de efeitos colaterais gastrintestinais pode limitar o uso do orlistate, como dor abdominal, fezes oleosas, incontinência fecal e flatos com descarga oleosa. Quanto maior a ingestão de gorduras na alimentação, mais frequentes são esses sintomas. Orlistate também está associado a diminuição na absorção intestinal de vitaminas lipossolúveis, fármacos antiepilépticos, varfarina, ciclosporina e L-tiroxina. Contraindicações. O uso do orlistate é contraindicado em gestantes e durante a amamentação, bem como em pacientes com colestase ou síndrome de má absorção crônica. Combinação de orlistate e sibutramina. A associação de orlistate com sibutramina foi avaliada em alguns estudos. Contudo, de um modo geral, sua eficácia não foi superior à monoterapia com a sibutramina. Psicotrópicos Fluoxetina e sertralina são inibidores de recaptação de serotonina e podem favorecer a redução do peso, mas não são considerados agentes antiobesidade. Indica-se seu uso apenas quando à obesidade estão associados transtorno depressivo ou transtorno da compulsão alimentar periódica (TCAP). Em estudos utilizando a fluoxetina (20 a 40 mg/dia) por um período de 6 meses, observou-se perda ponderal modesta com reganho a partir do sexto mês, o que torna essa medicação inadequada para o uso a longo prazo. A bupropiona (Bup® etc., comp. 150 mg), aprovada para tratamento de transtornos do humor e tabagismo, é um inibidor Tratamento da Síndrome metabólica Tratamento farmacológico da Obesidade Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento duplo da recaptação de monoaminas (dopamina e norepinefrina) e tem sido avaliada em estudos para obesidade, tanto em monoterapia quanto em associação. Os resultados são variáveis, com perda ponderal entre 5 e 10% do peso inicial. O topiramato (Amato® etc., comp. 25, 50 e 100 mg) é aprovado para tratamento da epilepsia e profilaxia da enxaqueca. Seu mecanismo de ação relaciona-se com a modulação dos receptores do ácido gama-aminobutírico (GABA), com reflexos no comportamento alimentar. Apesar de eficaz para perda ponderal, as doses habitualmente necessárias para o tratamento da obesidade estão associadas a efeitos colaterais diversos, o que levou à interrupção do seu programa de desenvolvimento como agente antiobesidade. No entanto, ele foi recentemente aprovado pelo FDA em associação à fentermina, usando-se doses menores. Novos fármacos e estratégias terapêuticas Novas medicações e estratégias terapêuticas para a obesidade foram desenvolvidas nos últimos anos, seja em monoterapia (lorcaserina, tesofensina, liraglutida e cetilistate) ou com a combinação de fármacos (fentermina + topiramato, bupropiona + naltrexona e zonisamida + bupropiona). Monoterapia Lorcaserina Aprovada pelo FDA em junho de 2012, a lorcaserina é um agonista seletivo do receptor serotoninérgico 5-HT2c. Essa substância tem seletividade funcional da ordem de 15 e 100 vezes maior pelo receptor5-HT2c do que pelos receptores 5-HT2a e 5-HT2b, respectivamente. O receptor 5-HT2c, presente no hipotálamo, modula a ingestão alimentar pela ativação do sistema neuronal relacionado com a POMC (pró-opiomelanocortina), levando à hipofagia. Essa maior especificidade pelo 5-HT2c seria importante para reduzir o risco de valvulopatia cardíaca, provavelmente associada ao estímulo do receptor 5-HT2b e detectada com outros agentes serotoninérgicos antiobesidade mais antigos e menos seletivos (fenfluramina e dexfenfluramina), o que motivou sua retirada do mercado em 1997. Eficácia. Estudos de fase 3 com a lorcaserina demonstraram eficácia mantida após 2 anos de tratamento e boa tolerabilidade. Liraglutida A liraglutida (Victoza®) é um análogo do GLP-1 que foi desenvolvido para o tratamento do DM2 na dose de até 1,8 mg/dia. Além de eficazmente melhorar o controle glicêmico, ela induz perda de peso. Melhores resultados na perda ponderal foram, contudo, obtidos com a dose de 3,0 mg/dia em estudos de fase 3 o que motivou sua recente aprovação pelo FDA, pela European Medicines Agency (EMA) e pela Anvisa para tratamento da obesidade, com o nome comercial de Saxenda. Os mecanismos mediadores na redução de peso pela liraglutida são provavelmente relacionados com uma combinação de efeitos no trato gastrintestinal (TGI) e no cérebro (aumento da saciedade e diminuição do apetite). O papel das náuseas, principal reação adversa da liraglutida, na perda de peso é mais evidente com a dose de 3,0 mg/dia. Dose. Liraglutida deve ser iniciada na dose de 0,6 mg/dia por injeção subcutânea, 1 vez/dia. A dose diária pode ser aumentada em 0,6 mg por semana até um máximo de 3,0 mg/dia, de acordo com a tolerabilidade do paciente. Tolerabilidade. As reações adversas mais comuns relatadas foram náuseas, hipoglicemia em casos de DM2, diarreia, constipação intestinal, vômitos, cefaleia, dispepsia, fadiga, tonturas, dor abdominal e elevação da lipase. Contraindicações. O uso da liraglutida 3,0 mg está contraindicado diante de história pessoal ou familiar de carcinoma medular de tireoide, em pacientes com neoplasia endócrina múltipla tipo 2, bem como durante a gestação. Embora uma relação de causa/efeito não tenha sido confirmada, recomenda-se evitar análogos do GLP-1 em pacientes com história ou suspeita de pancreatite. Associações medicamentosas Fentermina com topiramato A fentermina, molécula de ação central associada à liberação de norepinefrina com propriedades simpaticomiméticas, é aprovada nos EUA para tratamento da obesidade em monoterapia (37,5 mg/dia) durante curto período de tempo (< 12 semanas). A ação central do topiramato está associada ao bloqueio dos canais de sódio e cálcio, à potencialização da ação do GABA e à inibição da anidrase carbônica. Dose. Quando se usa a combinação fentermina/topiramato ER, é necessário o escalonamento da dose. Os estudos clínicos apoiam iniciar com a dosagem de 3,75 mg/23 mg, 1 vez/dia, e mantê-la por, pelo menos, 2 semanas. Havendo boa tolerabilidade, um aumento para 7,5 mg/46 mg está indicado. Posterior acréscimo deve ser considerado somente se não tiver havido perda de, ao menos, 3% no peso corporal após 12 semanas. Neste caso, a dose pode ser aumentada para 11,25 mg/69 mg e, depois, se necessário, para 15 mg/92 mg. A redução da dose deve também ser gradual, em 3 a 5 dias, devido à observação de convulsão quando o topiramato foi suspenso abruptamente em pacientes com epilepsia. Tolerabilidade. Nos estudos citados, os principais efeitos colaterais observados foram: xerostomia, alteração do paladar, infecção do trato respiratório superior, insônia, parestesias e constipação intestinal. Contraindicação. Como o topiramato é teratogênico, ele não pode ser usado durante a gestação. Outras contraindicações da combinação fentermina/topiramato são amamentação, glaucoma e hipertireoidismo. Naltrexona com bupropiona A combinação de naltrexona, um antagonista do receptor opioide, e a bupropiona, um inibidor da recaptação de norepinefrina, foi recentemente aprovada nos EUA (Contrave®) e na Europa Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento (Mysimba®), em formulação de liberação sustentada (SR), para perda de peso em indivíduos com sobrepeso ou obesidade. Mecanismo de ação. Supõe-se que o efeito anorético dessa associação resulte da ativação dos neurônios da POMC no núcleo arqueado. A bupropiona estimularia a POMC hipotalâmica, enquanto a naltrexona bloquearia a autoinibição da POMC por meio de β-endorfinas endógenas. Dose. O esquema recomendado é a tomada, 2 vezes/dia, de 2 comprimidos de naltrexona/bupropiona 8 mg/90 mg. Tolerabilidade. Os efeitos colaterais mais comuns com nal- trexona/bupropiona nos estudos clínicos foram náuseas, constipação intestinal, cefaleia, vômitos e tonturas. Náuseas, cefaleia e vômitos foram as principais causas de interrupção do tratamento. Novos fármacos antiobesidade em desenvolvimento clínico Bupropiona com zonisamida Acredita-se que a zonisamida, um antiepiléptico que apresentou perda ponderal como efeito colateral nos estudos clínicos com pacientes epilépticos, aumentaria os níveis de serotonina e dopamina no cérebro, atuando como supressor do apetite. Outro mecanismo de ação é sua atividade inibitória na atividade da anidrase carbônica. É provável que esses mecanismos sejam responsáveis pelo seu efeito anorético e consequente perda ponderal. Beloranib Beloranib é um composto de uma nova classe de medicamentos para perda de peso que influenciam o metabolismo, como consequência da inibição seletiva da metionina aminopeptidase. Especificamente, os inibidores dessa enzima reduzem a biossíntese de gordura, bem como aumentam a oxidação de gordura e a lipólise. Eles são, portanto, únicos no seu duplo efeito de aumentar o metabolismo da gordura e diminuir a sensação de fome. No entanto, sua eficácia e sua segurança a longo prazo ainda não foram demonstradas. Tesofensina A tesofensina é um inibidor triplo da recaptação das monoaminas (norepinefrina, serotonina e dopamina) em nível pré-sináptico. Inicialmente desenvolvida para tratamento de condições neurológicas, produziu perda ponderal não intencional nos estudos clínicos, chegando a 4% do peso inicial, quando comparada ao grupo placebo, mesmo sem intervenção dietética. Cetilistate A exemplo do orlistate, o cetilistate é um inibidor das lipases pancreáticas e gastrintestinais. Nas doses de 80 ou 120 mg 3 vezes/dia, ele vem sendo avaliado em estudos de fase 3 no Japão. Em estudos comparativos com o orlistate, tem mostrado eficácia similar, mas melhor tolerabilidade, causando menos efeitos gastrintestinais. A condição na qual os valores glicêmicos estão acima dos valores de referência, mas ainda abaixo dos valores diagnósticos de DM, denomina-se pré-diabetes. A resistência à insulina já está presente e, na ausência de medidas de combate aos fatores de risco modificáveis, ela evolui frequentemente para a doença clinicamente manifesta. Na maioria dos casos de pré-diabetes, a “doença” é assintomática e o diagnóstico deve ser feito com base em exames laboratoriais. Mesmo o DM estando presente do ponto de vista laboratorial, seu diagnóstico clínico pode tardar até anos pelo fato de a doença ser oligossintomática em grande parte dos casos, por isso a importância do rastreamento na presença dos fatores de risco. As categorias de tolerância à glicose têm sido definidas com base nos seguintes exames: Glicemia em jejum Coletada em sangue periférico após jejum calórico de no mínimo 8 horas; TOTG Previamente à ingestão de 75 g de glicose dissolvida em água, coleta-se uma amostra de sangue em jejum para determinação da glicemia; coleta-se outra, então, após 2 horas da sobrecarga oral. Importante reforçar que a dieta deveser a habitual e sem restrição de carboidratos pelo menos nos 3 dias anteriores à realização do teste. Permite avaliação da glicemia após sobrecarga, que pode ser a única alteração detectável no início do DM, refletindo a perda de primeira fase da secreção de insulina; Hemoglobina glicada (HbA1c) Oferece vantagens ao refletir níveis glicêmicos dos últimos 3 a 4 meses e ao sofrer menor variabilidade dia a dia e independer do estado de jejum para sua determinação. Vale reforçar que se trata de medida indireta da glicemia, que sofre interferência de algumas situações, como anemias, hemoglobinopatias e uremia, nas quais é preferível diagnosticar o estado de tolerância à glicose com base na dosagem glicêmica direta. Outros fatores, como idade e etnia, também podem interferir no resultado da HbA1c. A confirmação do diagnóstico de DM requer repetição dos exames alterados, idealmente o mesmo exame alterado em segunda amostra de sangue, na ausência de sintomas inequívocos de hiperglicemia.3 Pacientes com sintomas clássicos de hiperglicemia, tais como poliúria, polidipsia, polifagia e emagrecimento, devem ser submetidos à dosagem de glicemia ao acaso e independente do jejum, não havendo necessidade de confirmação por meio de segunda dosagem caso se verifique glicemia aleatória ≥ 200 mg/dL. O diagnóstico laboratorial do diabetes mellitus (DM) pode ser realizado por meio de glicemia de jejum, glicemia 2 horas após teste oral de tolerância à glicose (TOTG) e hemoglobina glicada (HbA1c). A insulina exerce um papel importante no metabolismo dos lipídios e aminoácidos em diferentes órgãos, tecidos e células. Contudo, o conceito de resistência à insulina na prática clínica é mais utilizado para se referir aos efeitos estimulantes da insulina sobre a captação de glicose periférica, principal mente pelos músculos esqueléticos e Interpretar a glicemia em jejum e curva glicêmica visando o diagnóstico de diabetes. Analisar os marcadores de resistência a insulina Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento tecido adiposo, e aos efeitos inibidores da insulina sobre a produção hepática de glicose. A regulação desses processos metabólicos faz que a insulina seja responsável pela manutenção da homeostase da glicose dentro de uma estreita faixa de variação ao longo dos estados alimentados e jejum. Com exceção do teste de clamp euglicêmico-hiperinsulinêmico, que não possui aplicação na prática clínica, os principais métodos, índices e marcadores de resistência à insulina com aplicação prática serão vistos adiante. Teste de clamp euglicêmicohiperinsulinêmico Universalmente considerada o padrão-ouro para a avaliação da ação da insulina in vivo, seu objetivo é elevar abruptamente a concentração de insulina plasmática até o nível experimental desejado (hiperinsulinemia) e, ao mesmo tempo, manter a concentração de glicose plasmática constante e em níveis basais (euglicêmicos). A hiperinsulinemia é mantida por meio da infusão intravenosa contínua de doses suprafisiológicas de insulina. A euglicemia, por sua vez, é mantida por meio da infusão intravenosa contínua de soro glicosado. Dessa forma, ambos os níveis de insulina e glicose são “clampeados” ou fixados durante o procedimento, ocorrendo uma retroalimentação negativa com a secreção de insulina pelo pâncreas e de glicose pelo fígado. No teste de clamp, o indivíduo migra de uma condição de jejum na qual o sistema nervoso utiliza ~ 50% da glicose circulante e a musculatura esquelética utiliza ~ 15%, para uma condição em que a musculatura passa a ser o maior consumidor de glicose, utilizando ~ 85%. Em geral, a última hora do teste corresponde ao período em que ocorre o estado de equilíbrio entre infusão de glicose e captação muscular de glicose, também chamado de steady state. Nesse período, a taxa de infusão de glicose necessária para manter a glicemia constante proporciona uma medida direta da ação da insulina na captação tecidual de glicose de corpo total, sendo esse o momento para a obtenção dos cálculos da sensibilidade à insulina. A utilização de glicose marcada caracteriza um refinamento da técnica e permite a avaliação da sensibilidade à insulina hepática e periférica separadamente Teste de tolerância oral à glicose O teste de tolerância oral à glicose (TTOG) é um teste simples, amplamente utilizado na prática clínica para o diagnóstico de intolerância à glicose e diabetes tipo 2. Para a avaliação da resistência à insulina, utiliza-se um protocolo com um número maior de coletas de sangue. Após 8 a 12 horas de jejum são coletadas amostras de sangue antes e depois da ingestão oral, em 5 minutos, de uma solução contendo 75 g de glicose diluída em 300 mL de água. O protocolo mais tradicional inclui coletas de sangue nos tempos 0, 30, 60, 90 e 120 minutos, para a determinação das concentrações de glicose e insulina. Por ser um teste oral, as variabilidades nas taxas de esvaziamento gástrico, de absorção e utilização de glicose do trato gastrintestinal, e no grau de captação e produção hepáticas de glicose resultam em alta variabilidade nos resultados do teste; tornando-se impossível estimar com precisão o consumo de glicose induzido pela insulina. O TTOG fornece informações úteis sobre tolerância à glicose, e não sobre resistência à insulina. Índice HOMA-IR O índice HOMA-IR se baseia na relação de retroalimentação que existe entre produção hepática de glicose e produção de insulina pelas células beta para a manutenção da homeostase glicêmica no estado de jejum. O fígado é responsável por produzir cerca de 90% da glicose no estado de jejum, cujos 2/3 são utilizados por tecidos não dependentes da insulina, principalmente o sistema nervoso central. Os tecidos dependentes da insulina, musculatura esquelética e fígado utilizam o terço restante. A insulina, por sua vez, regula a produção hepática de glicose e a captação de glicose para prevenir hiper ou hipoglicemia. Níveis elevados de glicose ou insulina sugerem resistência à insulina. Nesse contexto, o índice HOMA-IR expressa a resistência à insulina hepática e pressupõe que a resistência à insulina hepática e a periférica são equivalentes. O seu cálculo requer a mensuração da glicemia e da insulinemia obtidas em uma mesma amostra de sangue, após jejum de 8 a 12 horas. Em que o denominador de 22,5 é um fator de normalização, pois o produto de uma glicemia de jejum normal de 4,5 mmol/L por uma insulinemia de jejum normal de 5 µU/mL, obtido de um indivíduo “ideal e normal”, resulta em HOMA = 1. QUICKI O índice quantitativo de verificação da sensibilidade à insulina (quantitative insulin sensitivity check index, QUICKI) pode ser obtido no estado de jejum. Possui a mesma base conceitual do índice HOMA IR, mas o QUICKI tem interpretação inversa, pois avalia a sensibilidade à insulina, e não a resistência à insulina, visto que insulina e glicemia encontram-se no denominador da fórmula.37 Seu cálculo pode ser realizado da seguinte maneira: QUICKI = 1 / (log Glicemia basal + log Insulinemia basal) em que glicemia basal é expressa em mg/dL e insulinemia basal é expressa em microunidades por mL. A transformação logarítmica das variáveis glicemia e insulina tem como objetivo normalizar a sua distribuição para acomodar a alta variabilidade observada em indivíduos com hiperglicemia e hiperinsulinemia, além de hipoinsulinemia para aqueles com falência acentuada das células β. Essa correção favorece a correlação linear obtida com a sensibilidade à insulina avaliada pelo teste de clamp euglicêmico- hiperinsulinêmico. A mesma correção, contudo, pode ser feita para o índice HOMA IR. Não há ponto de corte específico para o índice QUICKI, e a necessidade de transformação logarítmica pode dificultar sua aplicação. No estudo original, os autores encontraram asseguintes médias e desvios-padrão para o índice: não obesos: 0,382 ± 0,007; obesos: 0,331 ± 0,010; diabéticos: 0,304 ± 0,007. Índice TyG O índice TyG foi proposto em 2008 como um marcador de resistência à insulina ainda mais acessível à prática clínica que o HOMA IR.38 Ele se baseia no produto entre glicemia e trigliceridemia de jejum, obtidas na mesma amostra de sangue, calculado pela fórmula: Ln [Triglicérides de jejum (mg/dL) x Glicemia de jejum (mg/dL)/2] sendo Ln o logaritmo neperiano. A base fisiopatológica que fundamenta o uso do índice TyG para a identificação da resistência à insulina inclui o comprometimento na oxidação e a utilização de ácidos graxos. O aumento do fluxo de ácidos graxos livres do tecido adiposo para o fígado resulta em anormalidades do metabolismo da gordura, aumentando o conteúdo de triglicérides (TG) hepáticos, que são fortes determinantes da resistência à insulina hepática, com consequente aumento da produção de colesterol da lipoproteína de densidade muito baixa (VLDL-c) e de TG circulantes.38 O índice TyG passou por validação em relação à técnica de clamp na população mexicana39 e, posteriormente, na população brasileira,40 tendo sido propostos pontos de corte para a população adulta mexicana (4,55 para mulheres e 4,68 para homens). Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento Fenótipo cintura hipertrigliceridêmica O fenótipo cintura hipertrigliceridêmica baseia-se na presença concomitante de circunferência da cintura (CC) e TG aumentados. Nos anos 2000, demonstrou-se que a combinação desses dois componentes da síndrome metabólica era capaz de predizer risco cardiovascular em homens, visto que a CC correlacionava-se positivamente com os níveis de apolipoproteína B e insulina e, ainda, que os TG plasmáticos correlacionavam-se positivamente com a concentração de partículas pequenas e densas de colesterol da lipoproteína de baixa densidade (LDL-c). Cerca de 80% dos indivíduos com o fenótipo (CC ≥ 90 cm e TG ≥ 177 mg/dL) apresentavam, simultaneamente, essa tríade aterogênica.42 Posteriormente, o mesmo achado foi confirmado em mulheres, considerando CC ≥ 85 cm e TG ≥ 133 mg/dL.43 Em 2006, um estudo demonstrou que o fenótipo era um bom marcador para identificar risco de síndrome metabólica em adolescentes iranianos,44 o que foi posteriormente confirmado em outras publicações brasileiras.45-47 Em homens suíços adultos com amplo espectro de adiposidade corporal, Carlsson et al.48 definiram o fenótipo cintura hipertrigliceridêmica como a presença de CC ≥ 90 cm e TG ≥ 177 mg/dL. Os autores do estudo identificaram associação altamente significante entre o fenótipo e a sensibilidade à insulina avaliada pela técnica de clamp. Após seguimento de longo prazo, mostrou-se que os indivíduos com o fenótipo tiveram risco aumentado para o desenvolvimento de diabetes.48 No Brasil, um estudo demonstrou que adolescentes com o fenótipo cintura hipertrigliceridêmica apresentavam mais resistência à insulina, de acordo com o teste de clamp, 46 e definiu pontos de corte específicos por gênero e estágio puberal (meninas púberes: CC > 84,0 cm e TG > 87,0 mg/dL; meninas pós-púberes: CC > 88,5 cm e TG > 78,0 mg/dL; meninos púberes: CC > 94,0 cm e TG > 79,0 mg/dL; meninos pós-púberes: CC > 99,0 cm e TG > 86,0 mg/dL). Pontos de corte específicos para a população adulta brasileira ainda não foram determinados. Marcadores de adiposidade central A quantidade de tecido adiposo visceral acumulada na região abdominal apresenta relação direta com o grau de resistência à insulina. Na prática clínica, uma alternativa bastante acessível e pouco invasiva é a predição de resistência à insulina por meio de algumas medidas antropométricas (Quadro 2). A CC e o diâmetro abdominal sagital, ou “altura abdominal”, estão entre os melhores indicadores antropométricos de gordura visceral e resistência à insulina. Outra alternativa é a relação cintura-altura, que se baseia no pressuposto de que a medida de CC possui relação de proporcionalidade com a medida da altura corporal de cada indivíduo. Em indivíduos saudáveis, espera-se menor CC para alturas menores, bem como maior CC para alturas mais elevadas. A proposta inicial da relação cintura-altura foi a presença de um ponto de corte universal de 0,5 para a identificação de obesidade abdominal e risco cardiovascular em ambos os sexos e em qualquer faixa etária.54 Estudos posteriores à publicação inicial, contudo, têm encontrado valores ligeiramente diferentes quando se analisam separadamente gênero e distintas faixas etárias. A circunferência do pescoço (CP) também se presta para triagem de resistência à insulina e se correlaciona positivamente com excesso de peso, fatores de risco cardiovascular e componentes da síndrome metabólica, espessura das camadas íntima e média da artéria carótida60 e resistência à insulina em si.61,62 Sua grande vantagem está na facilidade de obtenção da medida, pois não necessita de posição supina nem de remoção das vestimentas do local de aferição. No Quadro 2 estão ilustrados os indicadores antropométricos de resistência à insulina comentados, com algumas considerações práticas. Na população brasileira, o maior obstáculo para a utilização dos marcadores antropométricos substitutivos de resistência à insulina está na falta de padronização dos pontos de corte. Futuros estudos nacionais, de seguimento prospectivo, com grandes amostras e em indivíduos saudáveis, poderão avaliar o desfecho “resistência à insulina” e identificar os pontos de corte ideais por sexo e faixa etária. Os estudos transversais disponíveis, envolvendo amostras de variados tamanhos e diferentes pontos de corte, estão apresentados na Tabela 2. Alguns deles investigaram a relação entre as medidas antropométricas com marcadores diretos de resistência à insulina, como o índice HOMA IR e/ou o teste de clamp. Outros estudos utilizaram marcadores de obesidade, que por si só não são sinônimos de alteração metabólica, visto que há indivíduos obesos com fenótipo metabólico de indivíduos saudáveis, embora não sejam maioria. Outros, ainda, avaliaram a associação dessas medidas antropométricas com o acúmulo de gordura visceral51 ou com a presença de componentes da síndrome metabólica e de risco cardiovascular.Por fim, nota-se uma diversidade de locais anatômicos utilizados para a aferição da mesma medida antropométrica. Define-se dislipidemia como qualquer alteração nos níveis dos lípides (ou lipídios) com relação a valores referenciais para uma determinada amostra populacional. Os distúrbios do metabolismo lipídico têm uma forte relação com a doença vascular aterosclerótica – em especial a doença arterial coronariana (DAC) – e, no caso da hipertrigliceridemia grave, há um aumento substancial no risco de pancreatite aguda. Classificação das dislipidemias As dislipidemias primárias ou sem causa aparente podem ser classificadas genotipicamente ou fenotipicamente por meio de análises bioquímicas. Na classificação genotípica, as dislipidemias se dividem em monogênicas, causadas por mutações em um só gene, e poligênicas, causadas por associações de múltiplas mutações que isoladamente não seriam de grande repercussão. Dislipidemia Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento A classificação fenotípica ou bioquímica considera os valores de CT, LDL-C, TG e HDL-C e compreende quatro tipos principais bem definidos: a) hipercolesterolemia isolada: elevação isolada do LDL-C (≥ 160 mg/dl); b) hipertrigliceridemia isolada: elevação isolada dos TGs (≥ 150 mg/dl) que reflete o aumento do número e/ou do volume de partículas ricas em TG, como VLDL, IDL e quilomícrons. Como observado, a estimativa do volume das lipoproteínas aterogênicas pelo LDL-C torna-se menos precisa à medida que aumentam osníveis plasmáticos de lipoproteínas ricas em TG. Portanto, nestas situações, o valor do colesterol não-HDL pode ser usado como indicador de diagnóstico e meta terapêutica; c) hiperlipidemia mista: valores aumentados de LDL-C (≥ 160 mg/dl) e TG (≥ 150 mg/dl). Nesta situação, o colesterol não-HDL também poderá ser usado como indicador e meta terapêutica. Nos casos em que TGs ≥ 400 mg/dl, o cálculo do LDL-C pela fórmula de Friedewald é inadequado, devendo-se, então, considerar a hiperlipidemia mista quando CT ≥ 200 mg/dl; d) HDL-C baixo: redução do HDL-C (homens < 40 mg/ dl e mulheres < 50 mg/dl) isolada ou em associação a aumento de LDL- C ou de TG. Tratamento não medicamentoso das dislipidemias A terapia nutricional deve sempre ser adotada. O alcance das metas de tratamento é variável e depende da adesão à dieta, às correções no estilo de vida − perda de peso, atividade física e cessação do tabagismo − e, principalmente, da influência genética da dislipidemia em questão. A utilização de técnicas adequadas de mudança do comportamento dietético é fundamental. Os níveis séricos de colesterol e TG se elevam em função do consumo alimentar aumentado de colesterol, de carboidratos, de ácidos graxos saturados, de ácidos graxos trans e de excessiva quantidade de calorias. Por isso a seleção adequada destes itens poderá contribuir de maneira eficaz no controle das dislipidemias. Tratamento farmacológico das dislipidemias A decisão para o início da terapia medicamentosa das dislipidemias depende do: - Risco cardiovascular do paciente: em pacientes de muito alto ou alto risco cardiovascular, o tratamento da dislipidemia deve incluir medicamentos já em associação com as modificações do estilo de vida a serem propostas. Para os pacientes de risco moderado ou baixo, o tratamento será iniciado apenas com as medidas do estilo de vida, com a associação, em uma segunda etapa, de medicamentos, se necessário, para obtenção das metas definidas do LDL-c. O tempo de reavaliação após a implantação das medidas de modificações do estilo de vida pode ser de 3 a 6 meses. - Tipo de dislipidemia presente: define a escolha da classe terapêutica. Os medicamentos hipolipemiantes costumam ser divididos nos que agem predominantemente nas taxas séricas de colesterol e naqueles que agem predominantemente nas taxas de TG. Medicamentos com ação predominante na colesterolemia Na hipercolesterolemia isolada, os medicamentos recomendados são as estatinas, que podem ser administradas em associação à ezetimiba, à colestiramina e, eventualmente, aos fibratos ou ao ácido nicotínico. Estatinas Até o presente, a redução do LDL-c por inibidores da HMG-CoA redutase ou pelas estatinas permanece a terapia mais validada por estudos clínicos para diminuir a incidência de eventos cardiovasculares. A depleção intracelular de colesterol estimula a liberação de fatores transcricionais e, consequentemente, a síntese e a expressão na membrana celular de receptores para captação do colesterol circulante, como o LDLR. Assim, a ação das estatinas pode potencialmente influenciar em todo conjunto das lipoproteínas circulantes que interagem com o LDLR, como a LDL, a VLDL e os remanescentes de quilomícrons. A redução do LDL-c varia entre as estatinas. A cada vez que dobramos a dose de qualquer uma destas estatinas, a redução média adicional do LDL-c é de 6 a 7 %. Embora estudos mostrem diferenças na potência das estatinas quanto à sua capacidade de levar à redução do LDL-c, todas foram capazes, em estudos clínicos randomizados, de reduzir eventos e mortes cardiovasculares. Assim, esta atualização recomenda que seja empregada a estatina que estiver disponível no serviço, procurando-se atingir as metas terapêuticas recomendadas, com o ajuste de doses e a eventual associação de fármacos. As estatinas reduzem os TG, em geral, tanto mais quanto maior sua capacidade de reduzir o LDL-c. Com relação à HDL-c, as estatinas podem elevar suas taxas, mas, em geral, com pequeno aumento porcentual. Efeitos colaterais são raros no tratamento com estatinas. Dentre estes, os efeitos musculares são os mais comuns e podem surgir em semanas ou anos após o início do tratamento. Variam desde mialgia, com ou sem elevação da Creatinoquinase (CK), até a rabdomiólise. A dosagem de CK deve ser avaliada no início do tratamento, Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento principalmente em indivíduos de alto risco de eventos adversos musculares, como pacientes com antecedentes de intolerância à estatina; indivíduos com antecedentes familiares de miopatia; o uso concomitante de fármacos que aumentem o risco de miopatia. A dosagem rotineira de CK não é recomendada em pacientes já em uso de estatina, exceto se ocorrerem sintomas musculares (dor, sensibilidade, rigidez, câimbras, fraqueza e fadiga localizada ou generalizada), introdução de fármacos que possam interagir com estatina ou quando se eleva a dose desta. A avaliação basal das enzimas hepáticas (ALT e AST) deve ser realizada antes do início da terapia com estatina. Durante o tratamento, deve-se avaliar a função hepática quando ocorrerem sintomas ou sinais sugerindo hepatotoxicidade (fadiga ou fraqueza, perda de apetite, dor abdominal, urina escura ou aparecimento de icterícia). Ezetimiba A ezetimiba inibe a absorção de colesterol na borda em escova do intestino delgado, atuando seletivamente nos receptores NPC1-L1 e inibindo o transporte intestinal de colesterol. A inibição da absorção de colesterol (em grande parte do colesterol biliar) leva à diminuição dos níveis de colesterol hepático e ao estímulo à síntese de LDLR, com consequente redução do nível plasmático de LDL-c de 10 a 25%. A ezetimiba isolada constitui opção terapêutica em pacientes que apresentam intolerância às estatinas. A ezetimiba associada a doses toleradas de estatina é uma alternativa em pacientes que apresentam efeitos adversos com doses elevadas de estatina. A ezetimiba é empregada na dose única de 10 mg ao dia. Pode ser administrada a qualquer hora do dia, com ou sem alimentação, não interferindo na absorção de gorduras e vitaminas lipossolúveis. Raros efeitos colaterais têm sido apontados e estão em geral relacionados com o trânsito intestinal. Por precaução, recomenda-se que ela não seja utilizada em casos de dislipidemia com doença hepática aguda. Resinas As resinas, ou sequestradores dos ácidos biliares, atuam reduzindo a absorção enteral de ácidos biliares. Como resultado, ocorre depleção do colesterol celular hepático, estimulando a síntese de LDLR e de colesterol endógeno. Como consequência deste estímulo à síntese, pode ocorrer aumento da produção de VLDL e, consequentemente, de TG plasmáticos. Três resinas foram desenvolvidas: a colestiramina, o colestipol e o colesevelam. No entanto, no Brasil, somente a colestiramina está disponível. Em adição às estatinas, não existe estudo clínico que comprove benefício adicional. Assim, a adição de colestiramina ao tratamento com estatinas pode ser recomendada quando a meta de LDL-c não é obtida apesar do uso de estatinas potentes em doses efetivas. A redução do LDL-c é dose-dependente e pode variar de 5% a 30% nas doses de 4 a 24 g ao dia. Devem ser administradas longe de outros medicamentos, pois podem interferir na absorção de muitos deles. Recomenda-se que sejam tomados os remédios rotineiros 1 hora antes da tomada da colestiramina e/ou 4 horas depois desta. Por não ser absorvida para a circulação sistêmica, tem sido recomendada para crianças hipercolesterolêmicas, isoladamente ou em associação com estatinas, e é o único fármaco liberado para mulheres no período reprodutivo sem método anticoncepcional efetivo, e durante os períodos de gestação e amamentação. A colestiramina (único inibidor disponível no Brasil) é apresentadaem envelopes de 4 g. A posologia inicial é de 4 g ao dia, podendo-se atingir, no máximo, 24 g ao dia. Posologias superiores a 16 g ao dia são dificilmente toleradas. A apresentação na forma light pode melhorar sua tolerância, mas contém fenilalanina, o que restringe seu uso em portadores de fenilcetonúria. Os principais efeitos colaterais relacionam-se ao aparelho digestivo, por interferir na motilidade intestinal: obstipação (particularmente em idosos), plenitude gástrica, náuseas e meteorismo, além de exacerbação de hemorroidas preexistentes. Raramente, pode ocorrer obstrução intestinal e acidose hiperclorêmica em idosos e crianças, respectivamente. Diminui, eventualmente, a absorção de vitaminas lipossolúveis (A, D, K e E) e de ácido fólico. A suplementação destes elementos em crianças ou, eventualmente, em adultos pode ser necessária. Entre os efeitos bioquímicos, é possível o aumento dos níveis de TG, secundário ao estímulo à síntese hepática de VLDL. Como consequência, seu uso deve ser evitado na hipertrigliceridemia, particularmente se houver níveis acima de 400 mg/dL. Medicamentos que atuam predominantemente nos triglicérides No tratamento da hipertrigliceridemia isolada são prioritariamente indicados os fibratos e, em segundo lugar, o ácido nicotínico ou a associação de ambos. Pode-se ainda utilizar, nesta dislipidemia, os ácidos graxos ômega 3, isoladamente ou em associação com outros fármacos. Na hiperlipidemia mista, a taxa sérica de TG deve orientar como o tratamento farmacológico será iniciado. Caso estas taxas estejam acima de 500 mg/dL, deve-se iniciar o tratamento com um fibrato, adicionando-se, se necessário, ácido nicotínico e/ou ômega 3. Nesta situação, a meta prioritária é a redução do risco de pancreatite. Após reavaliação, caso haja a necessidade de redução adicional da colesterolemia, pode-se adicionar uma estatina e/ou outros redutores da colesterolemia. Nestes casos, o uso do genfibrozila deve ser evitado nas associações de fibratos e estatinas. Caso as taxas de TG estejam abaixo de 500 mg/dL, deve-se iniciar o tratamento com uma estatina isoladamente e, se necessário, associando-se a ezetimiba, priorizando-se a meta de LDL-c ou não HDL-c. Fibratos São fármacos derivados do ácido fíbrico que agem estimulando os receptores nucleares denominados “Receptores Alfa Ativados da Proliferação dos Peroxissomas” (PPAR-α). Este estímulo leva ao aumento da produção e da ação da LPL, responsável pela hidrólise intravascular dos TG, e à redução da ApoC-III, responsável pela inibição da LPL. O estímulo do PPAR-α pelos fibratos também leva a maior síntese da ApoA-I e, consequentemente, de HDL. Reduz as taxas séricas de TG de 30 a 60%. No entanto, a redução deve ser mais pronunciada quanto maior o valor basal da trigliceridemia. Aumentam o HDL-c de 7 a 11%. Sua ação sobre o LDL-c é variável, podendo diminuí-lo, não o modificar ou até aumentá-lo. Parecem ter efeitos pleiotrópicos, mas não se conhece a relevância clínica dos mesmos. Na tabela 7 estão descritos os fibratos disponíveis e seus respectivos efeitos no perfil lipídico. Os efeitos do fenofibrato sobre a doença microvascular do paciente com diabetes melito tipo 2 foram examinados em dois grandes estudos de forma isolada ou associado com a sinvastatina. O tratamento reduziu a incidência e a progressão da retinopatia, diminuiu micro e macroalbuminúria, e retardou a perda de função renal. Além disso, diminuiu as amputações, principalmente distais. Os fibratos são indicados no tratamento da hipertrigliceridemia endógena quando houver falha das medidas não farmacológicas. Quando os TG forem muito elevados (> 500 mg/dL) são recomendados, inicialmente, junto das medidas não farmacológicas Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento e no tratamento da dislipidemia mista com predomínio de hipertrigliceridemia. É infrequente a ocorrência de efeitos colaterais graves durante tratamento com fibratos, levando à necessidade da interrupção do tratamento. Podem ocorrer: distúrbios gastrintestinais, mialgia, astenia, litíase biliar (mais comum com clofibrato), diminuição de libido, erupção cutânea, prurido, cefaleia e perturbação do sono. Raramente, observa-se aumento de enzimas hepáticas e/ou CK, também de forma reversível com a interrupção do tratamento. Casos de rabdomiólise têm sido descritos com o uso da associação de estatinas com gemfibrozila. Recomenda-se, por isso, evitar esta associação. Recomenda-se também cautela nas seguintes condições clínicas: portadores de doença biliar; uso concomitante de anticoagulante oral, cuja posologia deve ser ajustada; pacientes com função renal diminuída; e associação com estatinas. Ácido nicotínico (niacina) O ácido nicotínico reduz a ação da lipase tecidual nos adipócitos, levando à menor liberação de ácidos graxos livres para a corrente sanguínea. Como consequência, reduz-se a síntese de TG pelos hepatócitos. Reduz ainda o LDL-c em 5 a 25%; aumenta o HDL-c em 15 a 35%; e diminui o TG em 20 a 50%. Não há evidência de benefício com este fármaco em indivíduos com LDL-c controlado. O ácido nicotínico pode, excepcionalmente, ser utilizado em pacientes com HDL-C baixo isolado, mesmo sem hipertrigliceridemia associada, e como alternativa aos fibratos e estatinas ou em associação com esses fármacos em portadores de hipercolesterolemia, hipertrigliceridemia ou dislipidemia mista. Devido a menor tolerabilidade com a forma de liberação imediata (rubor e prurido) e à descrição de hepatotoxicidade com a forma de liberação lenta, tem sido preconizado seu uso na forma de liberação intermediária, com melhor perfil de tolerabilidade. Como os efeitos adversos relacionados ao rubor facial ou prurido ocorrem com maior frequência no início do tratamento, recomenda-se dose inicial de 500 mg ao dia com aumento gradual − em geral para 750 mg e, depois, para 1.000 mg, com intervalos de 4 semanas a cada titulação de dose, buscando-se atingir 1 a 2 g diárias. O pleno efeito sobre o perfil lipídico apenas é atingido com o decorrer de vários meses de tratamento. Com a forma de liberação intermediária e o uso de doses atualmente mais baixas de niacina, outros efeitos como alterações gastrintestinais, hiperglicemia e hiperuricemia tornaram-se mais raros. Ácidos graxos ômega 3 Ácidos graxos ômega 3 são poli-insaturados derivados dos óleos de peixes e de certas plantas e nozes. O óleo de peixe contém tanto o ácido DHA quanto o ácido EPA, mas os óleos de origem vegetal contêm predominantemente o ácido ALA. Em altas doses (4 a 10g ao dia), reduzem os TG e aumentam discretamente o HDL-c, podendo, entretanto, aumentar o LDL-c. Seus efeitos no perfil lipídico são dosedependentes e resultam de uma variedade de mecanismos, entre os quais a diminuição da produção de VLDL e o aumento de seu catabolismo. Nos anos mais recentes, com maior emprego de estatinas, não foram evidenciados benefícios na DCV, sendo recomendado seu uso principalmente como adjunto da terapia das hipertrigliceridemias. Outra fonte de ácidos graxos ômega 3 é o óleo de krill, ele é uma fonte singular de EPA e DHA, pois a maior parte dos ácidos graxos ômega 3 ocorre naturalmente em fosfolípides e não na forma de TG, com uma razão da biodisponibilidade dos ácidos graxos ômega 3 de krill para os ácidos graxos ômega 3 marinhos da ordem de 2:1. Por ser hidrossolúvel, o óleo de krill apresenta melhor digestibilidade, minimizando o odor residual de peixe. Vale ressaltar que o krill não tem o risco de contaminação por mercúrio. Novos fármacos Inibidores da proteína de transferência de ésteres de colesterol A CETP é responsável pela transferência de ésteres de colesterol da HDL para lipoproteínas que contêm ApoB, em troca equimolar por TG. Como é previsível, a inibição da CETP aumenta a concentraçãode colesterol na HDL e diminui nas lipoproteínas que contêm ApoB, incluindo VLDL e LDL. Quatro inibidores da CETP foram desenvolvidos: torcetrapibe, anacetrapibe, dalcetrapibe e evacetrapibe. Atualmente, o anacetrapibe é o único inibidor do CETP que permanece em avaliação no estudo REVEAL (Randomized EValuation of the Effects of Anacetrapib Through Lipid-modification) com perspectiva de término para o ano de 2017. Inibidores da pcsk-9 Sabe-se que a funcionalidade e o número de LDLR expressos na superfície dos hepatócitos constitui fator determinante dos níveis plasmáticos de LDL. A LDL circulante se liga aos LDLR na superfície do hepatócito, libera seu conteúdo para o endossoma e, posteriormente, o receptor é reciclado de volta à superfície do hepatócito, para captar mais partículas de LDL do plasma. Em condições normais, o LDLR refaz este ciclo aproximadamente 150 vezes, até que seja degradado. A PCSK9 é uma enzima que desempenha um papel importante no metabolismo lipídico, modulando a densidade de LDLR. Sintetizada no núcleo celular e secretada pelos hepatócitos, liga-se aos LDLR na circulação, favorecendo sua degradação. Estudos realizados em animais e mutações em seres humanos demonstraram que o ganho de função da PCSK9 ocasionava aumento da degradação dos LDLR com elevações dramáticas nas concentrações de LDL. Em contrapartida, mutações com perda de função da PCSK9 têm o efeito oposto: aumentam a densidade do LDLR na superfície dos hepatócitos com consequente aumento da remoção de partículas de LDL e redução do LDL-c. Assim, a inibição da PCSK9 previne a ligação do LDLR à PCSK9 e a subsequente degradação lisossomal do LDLR, aumentando a densidade de receptor na superfície do hepatócito e a depuração das partículas circulantes de LDL. Dois inibidores da PCSK9 totalmente humanos foram aprovados no Brasil para comercialização em 2016, o alirocumabe e o evolocumabe. Ambos são aplicados por meio de injeção subcutânea − o alirocumabe a cada 2 semanas, na dose de 75 mg ou 150 mg, enquanto o evolucumab com injeção de 140 mg, a cada 2 semanas, ou 420 mg, uma vez ao mês. Esta classe farmacológica reduz de forma bastante intensa as concentrações de LDL-c em comparação ao placebo (redução média de 60%). Quanto à indicação dos inibidores da PCSK9 (evolocumabe e alirocumabe) no tratamento das dislipidemias, esta atualização recomenda a utilização somente em pacientes com risco cardiovascular elevado, em tratamento otimizado com estatinas na maior dose tolerada, associado ou não à ezetimiba, e que não tenham alcançado as metas de LDL-c ou não HDL-c recomendadas. O uso dos inibidores da PCSK9 em geral é seguro e bem tolerado. É descrita a ocorrência de nasofaringite, náuseas, fadiga e aumento da incidência de reações no local da injeção (vermelhidão, prurido, edema ou sensibilidade/dor). Inibidor da proteína de transferência de triglicérides microssomal A lomitapida é um fármaco que inibe a MTP, reduzindo a formação de quilomícrons no intestino e VLDL pelo fígado. Pelo fato da VLDL ser um precursor metabólico da LDL, as concentrações plasmáticas de LDL são reduzidas. Está indicado somente nos Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento casos de HF Homozigótica (HoHF), mas seu uso ainda não foi aprovado no Brasil. A lomitapida é administrada via oral na dose inicial de 5 mg/dia e com dose de manutenção que varia de 5 a 60 mg/dia, sendo que a dose deve ser individualizada de acordo com as metas terapêuticas e com a resposta ao tratamento. Tem sido descrito, em alguns pacientes, aumento das transaminases, em geral reversível com a redução ou a descontinuação do fármaco, ou mesmo, transitório com a manutenção do tratamento. Na maioria das vezes, não foram descritos elevação concomitante das bilirrubinas, fosfatase alcalina e nem surgimento de sintomas. Por seu próprio mecanismo de ação, estudos com ressonância magnética em pacientes com HoHF demonstraram acúmulo de gordura hepática. Porém, o acúmulo de gordura no fígado varia de paciente para paciente, mas é acentuado pelo consumo de álcool. Os efeitos deste acúmulo de gordura em longo prazo, decorrentes desta intervenção medicamentosa, não são conhecidos. Apesar de a MTP estar envolvida na absorção de vitaminas lipossolúveis estudos não demonstraram nenhum efeito significativo do tratamento com lomitapida sobre os níveis plasmáticos de vitaminas A e D. Lomitapida reduz os níveis plasmáticos de vitamina E, que é transportada principalmente por LDL. No entanto, portadores de HF têm níveis altos de vitamina E e, mesmo após o tratamento com lomitapida, as taxas desta vitamina ficaram dentro ou acima do normal. Vale salientar que, pelo fato da lomitapida ser amplamente metabolizada pelo CYP3A4, deve-se ter precaução com sua coadministração com inibidores do CYP3A4 (antifúngicos, diltiazem, verapamil, antibióticos como ciprofloxacino, claritromicina e eritromicina, e os inibidores da protease). O uso associado da lomitapida 60 mg/dia com a sinvastatina 40 mg/dia aumentou a exposição a sinvastatina em 1,7 vez comparada a sinvastatina isolada, aumentando o risco de efeito colateral pela sinvastatina. Em contrapartida, estudos com outros hipolipemiantes não demonstraram interações significativas. Inibidores da síntese de apolipoproteína b (antissenso anti-apob) O antissenso da ApoB é indicado em portadores de HoHF. Ainda não aprovado no Brasil, o mipomersen, único representante da classe, é administrado por via subcutânea e consiste de oligonucleotídeos que atingem o núcleo do hepatócito e se hibridizam ao RNA mensageiro da ApoB, formando um RNA de fita dupla, que é reconhecido e degradado por uma Ribonuclease H RNase H e, portanto, impede a formação (tradução) da proteína (ApoB). Além de reduzir a formação de VLDL, os produtos de sua metabolização também são reduzidos, como IDL, LDL e Lp(a). Eventos adversos são comuns, principalmente reações no local de aplicação, aumento de enzimas hepáticas e esteatose, que, em geral, declinam com o tempo de uso do fármaco, mas outro evento adverso comum, os sintomas de resfriado, tende a persistir mesmo em longo prazo. Tempo de tratamento – critérios de interrupção O tratamento deve ser feito de modo contínuo. Mialgias durante o uso dos medicamentos, elevação de creatinofosfoquinase (CPK) 10 vezes acima do valor normal, aumento de aminotransferases/transaminases (AST-TGO/ ALT-TGP) 3 vezes acima do valor normal ou o surgimento de contraindicações determinarão sua suspensão. 7.6 Benefícios esperados 1. Estatinas: prevenção de eventos cardiovasculares maiores, incluindo morte, IAM, acidente vascular cerebral e revascularização, entre outros. 2. Fibratos: prevenção de eventos cardiovasculares maiores quando utilizados em pacientes com hipertrigliceridemia associada a HDL baixo e prevenção de pancreatite aguda. 3. Ácido nicotínico: prevenção de eventos cardiovasculares maiores. Monitorização Após iniciado o tratamento com estatinas objetivando a prevenção de eventos cardiovasculares, não se faz necessária monitorização de perfil lipídico, uma vez que o tratamento será contínuo. Para pacientes que utilizam outros medicamentos que não estatinas, apesar de utilidade questionável na avaliação prognóstica, a aferição do perfil lipídico pode ser feita anualmente com o intuito de dirimir dúvidas e aumentar o conhecimento e a adesão dos pacientes. Para pacientes cujo objetivo terapêutico é a prevenção de pancreatite secundária a hipertrigliceridemia, a monitorização sérica de triglicerídeos pode ser realizada semestralmente. Para usuários de estatinas e fibratos, provas de função hepática (aminotransferases/transaminases) e muscular (CPK) devem ser realizadas no início do tratamento, após 6 meses, e toda vez que for alterada a dose do medicamento ouforem associados outros fármacos que aumentem o risco de toxicidade. Tratamento Medicamentoso da Hipertensão Arterial Sendo a síndrome metabólica constituída de inúmeros fatores de risco cardiovascular, deve-se considerar o tratamento farmacológico da hipertensão arterial nela presente a partir de 140/90mmHg ou 130/85mmHg na presença de diabetes mellitus. O tratamento da HA visa, em última análise, a redução da morbimortalidade CV. Há evidências científicas através de estudos clínicos de desfechos que mostram benefícios do tratamento realizado com o uso de: a) Diuréticos (DIU) b) Inibidores da Enzima Conversora de Angiotensina (IECA) c) Bloqueadores dos receptores AT1 da angiotensina II (BRA) d) Bloqueador dos canais de cálcio (BCC) Com relação aos alfabloqueadores e vasodilatadores diretos, não há informações efetivas sobre desfechos de morbimortalidade. Meta de redução da pressão arterial Redução da pressão arterial para cifras inferiores a 130mmHg/ 85mmHg pode ser útil em pacientes com elevado risco cardiovascular. Nos pacientes diabéticos, recomenda-se reduções da pressão arterial para níveis inferiores a 130/80mmHg e para os pacientes com proteinúria maior que 1g/24h, cifras inferiores a 120/75mmHg deverão ser a meta. Tratamento da HAS voltado para SM Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento Para os pacientes portadores de doença cardiovascular estabelecida e com idade superior a 50 anos, recomenda-se atingir essa meta em menos de seis meses. Para isso, pode ser utilizada a maioria dos hipotensores, não havendo diferenças entre eles em relação aos benefícios cardiovasculares. Escolha do medicamento anti-hipertensivo 1. Diuréticos Como anti-hipertensivos, recomendam-se os diuréticos tiazídicos e similares em baixas doses. As doses altas de diuréticos não implicam necessariamente em benefício hipotensor adicional, mas certamente potencializam efeitos colaterais tais como a hipocalemia e desajustes metabólicos glicídicos e lipídicos. Em monoterapia anti-hipertensiva dificilmente promoverá o controle da pressão arterial dos pacientes com síndrome metabólica e que a maioria dos hipertensos necessitará de associações medicamentosas, sugere-se que esse hipotensor seja associado a drogas que bloqueiam o sistema reninaangiotensina (IECA E BRA) e minimizam a hipocalemia (Espironolactona). Tiazídicos Mecanismo de ação: (1) hipovolemia, que induz “secreção não osmótica de ADH” pela ativação de barorreceptores no coração, arco aórtico e bulbo carotídeo; (2) perda da capacidade de diluição urinária, pois os tiazídicos inibem a reabsorção de NaCl no túbulo contorcido distal, aumentando o aporte de NaCl ao túbulo coletor de modo que a urina não chega a este segmento do néfron extremamente hipotônica (como deveria acontecer), o que diminui o percentual de água livre que consegue ser excretado; (3) potencialização do efeito do ADH no túbulo coletor, fenômeno induzido pelos tiazídicos em pacientes geneticamente predispostos. Atribui-se a hiperglicemia e a hiperlipidemia a um bloqueio na liberação de insulina diretamente induzido por essas drogas. • O risco de DM2, de fato, está aumentado em usuários de tiazídicos… A hiperuricemia é uma complicação inerente aos DIU em geral. Ocorre pela maior reabsorção renal de ácido úrico, sendo um aumento compensatório na reabsorção de sal e água (o fluido tubular fica hiperconcentrado, criando um gradiente físico-químico para a difusão do ácido úrico de volta à circulação). Se possível, devemos evitar os diuréticos em pacientes com história de gota. Todos os diuréticos predispõem à impotência sexual, e a clortalidona é a droga que acarreta maior risco. Contudo, passadas 4-6 semanas, o VEC volta ao normal (pelo aumento compensatório na reabsorção renal de sal e água) ocorrendo uma redução da Resistência Vascular Periférica (RVP), o que efetivamente reduz a PA do paciente. Efeitos colaterais: Os principais paraefeitos dos tiazídicos podem ser memorizados através da regra “4 HIPO e 3 HIPER”. O mais comum é a hipocalemia, presente em 5- 10% dos pacientes (especialmente com a clortalidona), o que aumenta o risco de morte súbita cardíaca por arritmias, como a fibrilação ventricular. A coexistência de hipomagnesemia potencializa o risco. A hiponatremia geralmente se instala nas primeiras semanas de uso (se não aparecer neste período, provavelmente não ocorrerá depois) Diuréticos de Alça Mecanismo de ação: Ao bloquearem a reabsorção de Na/K/2Cl no ramo ascendente espesso da alça de Henle, promovem uma natriurese muito mais intensa que os tiazídicos, espoliando o paciente de volume. • Logo, só devem ser usados como anti-hipertensivos quando a HAS estiver associada à hipervolemia. Em pacientes não francamente hipervolêmicos o risco de hipovolemia torna-se proibitivo. Além do mais, os DIU de alça podem precisar de múltiplas tomadas diárias. Em relação ao cálcio, os DIU de alça exercem efeito oposto ao dos tiazídicos: eles INIBEM a reabsorção renal de cálcio, aumentando a calciúria e predispondo à hipocalcemia! • Logo, devem ser evitados se houver história de nefrolitíase, mas constituem terapia de escolha na vigência de hipercalcemia aguda sintomática. Poupadores de K+ Mecanismo de ação: Bloqueiam o receptor de aldosterona (ex.: espironolactona, eplerenona), ou então, o canal epitelial de sódio (ENaC) induzido pela aldosterona nas células do túbulo coletor (ex.: amilorida, triantereno). • Lembre-se que é no túbulo coletor que ocorre a reabsorção de sódio em troca da secreção de K+ e H+, por ação da aldosterona. • Os antagonistas do receptor de aldosterona são as drogas de 1ª escolha para tratamento da HAS no hiperaldosteronismo primário. Como já dito, a espironolactona também é considerada a droga de 4ª escolha para associação em portadores de "HAS resistente" (HAS a despeito do uso de três drogas na dose máxima tolerada, sendo uma delas um diurético). Já os bloqueadores do ENaC costumam ser coformulados com os tiazídicos, constituindo boa opção quando o paciente desenvolve hipocalemia. 2. Inibidores da enzima conversora da angiotensina São eficazes no tratamento da hipertensão arterial. Também reduzem a morbidade e a mortalidade cardiovascular dos pacientes hipertensos com síndrome metabólica e elevado risco para doença aterosclerótica; dos pacientes com doenças cardiovasculares e ainda retardam o declínio da função renal em pacientes com nefropatia diabética. Inibidores da Enzima Conversora de Angiotensina Mecanismo de ação: Reduzem a formação de angiotensina II a partir da angiotensina I, reduzindo também a degradação de bradicinina (vasodilatador endógeno), a qual é igualmente mediada pela ECA. O resultado final é uma vasodilatação arterial periférica (queda da RVP). Os IECA são excelentes anti-hipertensivos, e são particularmente úteis na presença de: (1) ICFER e IAM anterior extenso – onde diminuem a cardiotoxicidade do excesso de angiotensina II produzido em resposta à queda do débito cardíaco Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento (ativação do SRAA), evitando o processo de “remodelamento cardíaco” progressivo; (2) Nefropatia diabética ou DRC de qualquer etiologia – ao promoverem vasodilatação seletiva da arteríola eferente do glomérulo reduzem a pressão hidrostática intraglomerular e, consequentemente, o estresse mecânico gerado pela hiperfiltração (que de outro modo causaria esclerose glomerular) e a própria proteinúria. Este é o famoso efeito nefroprotetor. Efeitos colaterais: Tosse seca (principal: 5-20% dos pacientes, explicada pelo aumento de bradicinina no parênquima pulmonar), angioedema, erupções cutâneas, IRA na doença renovascular (bilateral ouem rim único), pancreatite e leucopenia. Raramente são implicados no surgimento de nefropatia membranosa. • Os IECA são contraindicados na gestação (teratogênicos), devendo ser usados com cautela por mulheres em idade fértil. 3. Antagonistas do receptor AT1 da angiotensina II São eficazes no tratamento do paciente hipertenso. São reconhecidamente nefro e cardioprotetores nos pacientes diabéticos do tipo 2 com nefropatia estabelecida. Em pacientes hipertensos portadores de elevado risco cardiovascular, um estudo que utilizou um antagonista do receptor AT1 da angiotensina II demonstrou que este agente foi superior ao betabloqueador na redução da morbidade e da mortalidade cardiovascular. Bloqueadores do Receptor AT1 de Angiotensina II Mecanismo de ação: Bloqueiam o receptor AT1 de angiotensina II (responsável pelos efeitos de vasoconstrição, proliferação celular e liberação de aldosterona pelo córtex adrenal). Com isso os níveis de angiotensina II tendem a aumentar na circulação, o que acaba estimulando os receptores AT2, que possuem efeito vasodilatador. Por não inibirem diretamente a ECA, os BRA não produzem aumento de bradicinina. Os BRA são úteis nas mesmas situações que os IECA, e têm basicamente os mesmos paraefeitos que estes últimos, com exceção da tosse seca e do angioedema (quando tais complicações ocorrem em um usuário de IECA, indica-se a troca por um BRA). • Na gestação não devem ser usados, pois os BRA são igualmente teratogênicos. O Losartan possui uma vantagem específica adicional: ele exerce EFEITO URICOSÚRICO, reduzindo a uricemia. • Representa uma boa escolha de anti-hipertensivo para pacientes com história de gota (melhor que os diuréticos, por exemplo, que, ao contrário, reduzem a uricosúria e aumentam a uricemia) 4. Antagonistas dos canais de cálcio Esses hipotensores são bastante eficazes em reduzir a pressão arterial e não provocam alterações no metabolismo lipídico e no de carboidratos. Isto se aplica tanto aos diidropiridínicos quanto aos não-diidropiridínicos, embora seus efeitos em longo prazo em relação à progressão da nefropatia diabética ainda não tenham sido determinados. Bloqueadores de Canais de Cálcio Mecanismo de ação: Bloqueiam canais de cálcio presentes na membrana de certos tipos celulares, reduzindo o influxo de cálcio para o citoplasma. O cálcio é cofator para a contração muscular, sendo igualmente importante para o funcionamento do tecido de condução cardíaca. Podem ser de dois tipos: (1) di-idropiridínicos; (2) não di-idropiridínicos. Os di-idropiridínicos são vasosseletivos, isto é, atuam especificamente em canais de cálcio localizados nas células musculares lisas da parede das arteríolas, promovendo vasodilatação e redução da RVP, sem interferir na contratilidade miocárdica. Por este motivo são os BCC mais utilizados como anti- hipertensivos, especialmente os de meia-vida longa, como a anlodipina. Já os não di-idropiridínicos são cardiosseletivos, atuando em canais de cálcio localizados nos cardiomiócitos e no tecido de condução. Por este motivo, podem deprimir a contratilidade miocárdica (redução do débito cardíaco), além de ocasionar bradicardia, devendo ser evitados na ICFER (em particular o verapamil, que é o mais inotrópico negativo). • São especialmente úteis nos hipertensos que necessitam reduzir a FC mas não podem utilizar BB, como os portadores de angina pectoris que também têm asma ou DPOC. Efeitos colaterais: (1) di-idropiridínicos = edema maleolar (principal) que pode evoluir com dermatite ocre no terço distal da perna; cefaleia; tonteira; rubor facial e hiperplasia gengival (raro); (2) não di-idropiridínicos = agravamento da ICFER, bradicardia, bloqueio AV, constipação (verapamil). Durante anos a nifedipina foi utilizada pela via sublingual no tratamento das crises hipertensivas (abria-se a cápsula e despejava- se seu conteúdo embaixo da língua). O efeito hipotensor é rápido e poderoso quando a droga é ministrada dessa maneira… Contudo, se percebeu que tal conduta aumenta a mortalidade! A vasodilatação quase que instantânea pode promover uma queda muito brusca da pressão arterial, além de desencadear taquicardia reflexa, o que aumenta o consumo miocárdico de oxigênio, propiciando o surgimento de isquemia miocárdica e cerebral… As atuais formulações são do tipo “retard” ou “oros”, isto é, nifedipina de liberação prolongada para uso exclusivamente oral, o que evita os referidos fenômenos. Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento 5. Betabloqueadores São eficazes no tratamento da hipertensão arterial tendo também sido comprovada a sua eficácia na redução da morbidade e da mortalidade cardiovascular. Estão especialmente indicados como a primeira opção para o tratamento da hipertensão arterial associada à doença coronariana. Do ponto de vista metabólico, podem induzir ao aumento de peso, à intolerância à glicose e aumentar o risco para o desenvolvimento de diabetes mellitus tipo 2, hipertrigliceridemia e redução do HDL- colesterol e ainda menor capacidade para a realização de exercícios físicos. Os betabloqueadores são formalmente contra-indicados em pacientes com asma brônquica, doença pulmonar obstrutiva crônica e bloqueio atrioventricular de 2o e 3o graus. Devem ser utilizados com cautela em pacientes com doença vascular de extremidades. Betabloqueadores Mecanismo de ação: O efeito anti-hipertensivo é explicado pelo bloqueio dos receptores beta- -1-adrenérgicos (localizados no coração), que reduz o DC através de uma diminuição do cronotropismo (frequência cardíaca), do inotropismo (contratilidade miocárdica) e do dromotropismo (condução atrioventricular). Tais ações também justificam os efeitos antianginosos e antiarrítmicos dos BB. O bloqueio dos receptores beta-1 reduz a secreção de renina pelo aparelho justaglomerular, ao inibir a ação de catecolaminas localmente liberadas pelos nervos renais (resultado final: menor ativação do SRAA). Por outro lado, o bloqueio dos receptores beta-2-adrenérgicos (localizados nos vasos sanguíneos, brônquios e hepatócitos) promove vasoconstricção, broncoconstricção e inibição da liberação hepática de glicose estimulada por catecolaminas (ex.: em resposta à hipoglicemia aguda). Veremos adiante que os BB diferem entre si em relação à seletividade pelos receptores beta-1 e beta-2, e que alguns medicamentos específicos possuem ações terapêuticas “adicionais” não relacionadas ao bloqueio dos receptores beta… Atualmente, existem três gerações de BB (Tabela 20). Os BB também podem ser mais ou menos lipossolúveis, o que se relaciona com a capacidade de cruzar a barreira hematoencefálica e agir no SNC. A droga de maior lipossolubilidade é o propranolol, que por este motivo se mostra especialmente útil na presença de: (1) Tremor essencial; (2) Síndromes hipercinéticas; e (3) Cefaleias vasculares, como a enxaqueca. O propranolol ainda pode ser usado no tratamento da hipertensão porta, pelo fato de reduzir o débito cardíaco (bloqueio beta-1) ao mesmo tempo em que bloqueia receptores beta-2 localizados nos vasos esplâncnicos, inibindo a vasodilatação e consequente aumento de fluxo sanguíneo no leito mesentérico (eventos básicos na gênese da hipertensão porta). Os BB, especialmente os não seletivos, são CONTRAINDICADOS na vigência de intoxicação pela cocaína! A cocaína é um poderoso simpatomimético que estimula todos os receptores adrenérgicos (alfa e beta). Os BB não seletivos, ao bloquearem receptores beta-2 vasodilatadores, permitem que o estímulo alfa-1 (vasoconstrictor) atue sem oposição, o que pode provocar espasmo arterial, com agravamento paradoxal da crise hipertensiva e isquemia miocárdica (arritmias, IAM, morte súbita). • Poreste mesmo motivo, tais drogas também são contraindicadas na angina de Prinzmetal (angina vasoespástica), já que podem piorar o espasmo coronariano. Como vimos, os BB não produzem reduções significativas da morbimortalidade CV na população hipertensa em geral, e por isso não são mais considerados anti-hipertensivos de “1ª linha”. Não obstante, nas seguintes situações eles constituem boas opções terapêuticas, devido às vantagens adicionais que podem trazer: (1) ICFER (benefício de redução da mortalidade confirmado apenas para três medicamentos: carvedilol, metoprolol e bisoprolol); (2) Doença coronariana (preferência pelos beta-1 seletivos); (3) Taquiarritmias; (4) Cefaleias vasculares, como a enxaqueca; (5) Tremor essencial; e (6) Hipertireoidismo. Efeitos colaterais: Broncoespasmo, bradicardia, distúrbio da condução AV, insônia/pesadelos/depressão (BB lipossolúveis), disfunção erétil, intolerância à glicose (bloqueio à liberação de insulina pelo pâncreas) e dislipidemia (aumento de LDL e triglicerídeos + redução do HDL). Os BB de 1a e 2a geração são formalmente contraindicados na asma, na DPOC e no BAV de 2º e 3º graus. Os BB de 3a geração carvedilol e nebivolol não prejudicam o metabolismo glicídico e lipídico, pelo contrário, parecem até melhorá-lo (o aumento do fluxo sanguíneo periférico promovido por essas drogas talvez se associe a uma redução da resistência à insulina, ao favorecer uma maior captação de glicose pelos tecidos)! O nebivolol também provoca menos disfunção erétil, por aumentar o óxido nítrico. 6. Inibidores adrenérgicos A síndrome metabólica usualmente se acompanha de hiperatividade simpática e os inibidores adrenérgicos podem auxiliar na obtenção da meta de reduzir a pressão arterial nesses pacientes. Os Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento simpaticolíticos de ação central (alfametildopa, clonidina, moxonidina, rilmenidina) têm efeitos metabólicos neutros, porém seus efeitos colaterais limitam seu uso clínico, ficando reservados como auxiliares para os pacientes que não respondem adequadamente aos demais hipotensores. AGONISTAS ALFA-2a E AGONISTAS IMIDAZÓLICOS Mecanismo de ação: Os primeiros estimulam receptores alfa-2a adrenérgicos (inibitórios) localizados nos núcleos simpáticos do SNC, diminuindo o tônus adrenérgico central (ação “simpatolítica”) e, consequentemente, a RVP e o DC. Diminuem também a secreção de renina, devido à menor liberação de catecolaminas pelos nervos renais. Já os segundos estimulam receptores imidazólicos (também inibitórios) nos mesmos núcleos simpáticos do SNC, promovendo efeito simpatolítico semelhante. Apesar de não serem anti-hipertensivos de 1ª linha, ambas as classes têm vantagens adicionais se utilizadas na presença de: (1) Síndrome das pernas inquietas; (2) Retirada de opioides; (3) Flushes da menopausa; (4) Diarreia por neuropatia diabética; (5) Hiperatividade simpática da cirrose alcoólica. Ao contrário dos BB, não induzem intolerância à glicose nem aumentam o colesterol. • O metildopa é o anti-hipertensivo de escolha para o tratamento crônico da HAS durante a GESTAÇÃO. Além de não ser teratogênico, produz dilatação arteriolar placentária, sendo particularmente útil no controle da pré- eclâmpsia. Efeitos colaterais: Sonolência, sedação, xerostomia, disfunção erétil e hipotensão postural (esta última devido à perda da porção eferente do reflexo de vasoconstricção periférica ativado por barorreceptores presentes na circulação). A metildopa pode provocar reações autoimunes, como a anemia hemolítica por anticorpos “quentes” (IgG). Alfabloqueadores Mecanismo de ação: Bloqueiam seletivamente os receptores alfa-1-adrenérgicos (vasoconstrictores) localizados na parede das arteríolas, reduzindo a RVP. Os mesmos receptores também estão presentes na musculatura lisa do estroma prostático, úteis nos hipertensos que também têm queixas de prostatismo (melhora dos sintomas de obstrução urinária da HPB, pelo "relaxamento" da uretra prostática). Ao contrário dos BB, melhoram o metabolismo glicídico/lipídico… A melhora da glicose se dá pelo aumento do fluxo sanguíneo aos tecidos, o que reduz a resistência à insulina. Já a melhora dos lipídios ocorre provavelmente por ativação direta da lipoproteína lipase e da lecitina-colesterol- -aciltransferase (LCAT), enzimas que reduzem LDL e triglicerídeos. Vasodilatadores Arteriais Diretos Mecanismo de ação: Pouco compreendido, mas sabe-se que a RVP é reduzida em função de um grande relaxamento da musculatura lisa arteriolar. A vasodilatação é muito mais intensa do que aquela observada com alfabloqueadores e BCC di-idropiridínicos, acarretando maior risco de "hipovolemia relativa" (a capacidade do leito arterial aumenta, porém, não há aumento concomitante do volume circulante efetivo). • É muito mais frequente o surgimento de taquicardia reflexa, havendo também uma maior ativação do SRAA, que pode culminar em retenção de líquido (edema) se um diurético não for associado. A associação de BB diminui a taquicardia reflexa. Tais drogas devem ser evitadas na vigência de síndrome coronariana aguda, aneurisma dissecante de aorta e hemorragia cerebral, já que a taquicardia reflexa e o aumento de fluxo sanguíneo podem agravar todas essas complicações! Os vasodilatadores arteriais diretos promovem importantes benefícios em relação ao controle lipêmico: queda do LDL e aumento do HDL, possivelmente por ativação de enzimas envolvidas no metabolismo dessas lipoproteínas. • O minoxidil tem como vantagem adicional a melhora da calvície, devido à dilatação da arteríola nutridora do folículo piloso, o que aumenta o estímulo trófico sobre a raiz capilar. A hidralazina é o anti- hipertensivo de escolha para o controle das crises hipertensivas durante a gestação (ex.: eclâmpsia), pelo fato de não ser teratogênica e poder ser ministrada pela via intravenosa. Efeitos colaterais: Cefaleia, rubor facial, taquicardia reflexa e edema. A hidralazina pode causar LES fármaco-induzido de maneira dose-dependente. O minoxidil promove hirsutismo em 80% dos casos, além de derrame pericárdico em cerca de 3% dos pacientes. Inibidores Diretos da Renina Apenas o alisquireno está disponível... Esta droga inibe a reação inicial do SRAA (transformação do angiotensinogênio em angiotensina I pela renina), diminuindo, desse modo, a vasoconstricção periférica (angiotensina II) e a secreção de aldosterona. Parece exercer ações adicionais através do bloqueio de um receptor próprio de renina, além de inibir a síntese intracelular de angiotensina. Reduz a PA na mesma medida em que as drogas de 1a linha, porém, não há comprovação de que reduza a morbimortalidade cardiovascular. Principais paraefeitos (raros): rash cutâneo, diarreia, aumento de CPK. Contraindicado na gravidez Associação de hipotensores A associação de anti-hipertensivos deve obedecer à premissa de não se associar fármacos com mecanismos similares de ação. As seguintes associações de classes distintas de anti-hipertensivos são atualmente reconhecidas como eficazes: a) Betabloqueadores e diuréticos; b) IECA e diuréticos; c) BRA e diuréticos; d) Antagonistas dos canais de cálcio e betabloqueadores; e) Antagonistas dos canais de cálcio e IECA. Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento Para os casos de hipertensão resistente à dupla terapia, podem-se associar três ou mais medicamentos. Nessa situação, o uso de diuréticos é fundamental. Esquema terapêutico O esquema terapêutico nos pacientes hipertensos com SM está centrado na meta da redução da pressão arterial em curto prazo de tempo (de três a seis meses), utilizando-se a monoterapia ou a associação de fármacos como sugerido naFigura 1. Considerando-se que 75% dos pacientes necessitam da associação de hipotensores, sugere-se este esquema desde o início do tratamento. Já para os pacientes com Diabetes mellitus e SM, sugere-se a utilização de bloqueadores do sistema renina- angiotensina como parte do esquema terapêutico. Diante de lesão renal com proteinúria acima de 1g/dia, devem-se reduzir os níveis tensionais a cifras inferiores a 120mmHg/ 75mmHg, sendo que o esquema terapêutico deve incluir compulsoriamente um bloqueador do sistema renina-angiotensina. Nas doenças que cursam com resistência à insulina, determinado nível de insulinemia promove menor captação e utilização da glicose por tecidos periféricos (ex.: músculo esquelético). Do mesmo modo, outros tecidos também se mostram resistentes aos efeitos da insulina, como o tecido adiposo (menor inibição da lipólise) e o fígado (menor inibição da gliconeogênese, ocasionando maior produção hepática de glicose). A gênese da “exaustão” secretória das células beta também vem sendo elucidada... Nas fases iniciais, ocorreria uma hipossensibilidade da célula beta à glicose, devido à menor expressão do canal de glicose GLUT 2 na membrana. A causa desse fenômeno é desconhecida. O fato é que haveria, como consequência, uma resposta subnormal na secreção de insulina pós-prandial, justificando a hiperglicemia neste período. Outro fator que contribuiria para uma menor resposta pancreática ao pico de glicose pós-prandial é a deficiência de incretinas (cuja causa é igualmente desconhecida). Nas fases mais avançadas, ocorre algum grau de destruição das células beta, momento em que costuma ser necessário insulinizar o paciente. A explicação é a seguinte: à medida que a resistência à insulina progride, forçando a célula beta a sintetizar mais insulina, ocorre acúmulo intracelular de uma substância cossintetizada: a amilina. Esta se precipita dentro da célula beta, formando depósitos amiloides patogênicos. O que leva as células a responderem mal à insulina? Evidências recentes sugerem que, nos tecidos que captam glicose em resposta à insulina (ex.: músculo esquelético), ocorre uma menor incorporação de canais GLUT 4 na superfície celular, resultando em menor entrada de glicose no citoplasma! Também parece haver um defeito na síntese do glicogênio, além de outras alterações bioquímicas. Um mecanismo plausível que explica todos esses fenômenos é a toxicidade dos ácidos graxos livres. Veja: os depósitos de gordura centrípeta (abdome e tórax) têm comportamento biológico diferente da gordura mais periférica (quadril e membros). A gordura central é mais lipolítica, e promove maior liberação de ácidos graxos livres na circulação! Estes, por sua vez, são captados e se acumulam em tecidos como o fígado e os músculos. O excesso de ácidos graxos livres dentro da célula seria capaz de alterar o funcionamento de enzimas relacionadas à transdução do sinal da insulina, diminuindo a eficácia do processo (ex.: em vez de fosforilar resíduos de tirosina, tais enzimas passariam a fosforilar resíduos de serina, resultando em ativação “parcial” dos substratos intracelulares que funcionam como “segundos-mensageiros”). Além de ácidos graxos, o tecido adiposo também libera citocinas inflamatórias na circulação! O TNF-alfa, por exemplo, exerceria um efeito semelhante ao que acabamos de descrever para os ácidos graxos livres dentro da célula... Enfim, essa teoria não apenas explica os defeitos “pós-receptor” que parecem mediar a resistência à insulina no DM tipo 2 como também, e principalmente, estabelece um nexo causal entre DM tipo 2 e obesidade visceral. 1. Estados Pré-Diabéticos Existem pacientes que têm glicemia alterada, mas ainda não preenchem critérios formais para o diagnóstico de DM. Sabemos que eles pertencem a um grupo muito especial: são os indivíduos “pré- diabéticos”, isto é, pessoas com alta probabilidade de desenvolver DM tipo 2 em curto prazo (em média, 30% nos próximos cinco anos). Observe a Tabela 5. A boa notícia é que a doença pode ser evitada nesta situação, mas somente se determinadas medidas preventivas forem seguidas à risca. Outro dado interessante (e preocupante) é que o paciente pré- diabético também demonstra um risco cardiovascular aumentado (mesmo que nunca se torne diabético)! De forma semelhante, as medidas preventivas são eficazes em reduzir esse risco. Antes de prosseguir, vamos responder uma importante pergunta prática (que com frequência está presente em provas de residência). É preciso algum exame adicional no indivíduo que apresenta glicemia de jejum alterada? A resposta é sim... Antes de taxar o paciente como “pré-diabético”, devemos descartar a existência de DM lançando mão de um exame mais sensível. Este exame é o TOTG 75 (teste de tolerância oral à glicose, com 75 g de glicose anidra ministrados pela via oral e dosagem da glicemia 2h depois). Tal método pode “desvendar” a existência de DM previamente não detectado (glicemia ≥ 200 mg/dl) numa fração significativa dos casos!!! Nos dias de hoje, o tratamento do DM tipo Resistência a Insulina Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento 2 envolve necessariamente uma abordagem medicamentosa (ver adiante). Por outro lado, a conduta nos estados pré-diabéticos é baseada em medidas higienodietéticas, isto é, ORIENTAÇÃO NUTRICIONAL + ATIVIDADES FÍSICAS REGULARES (“Modificações Terapêuticas no Estilo de Vida” – MEV), visando à redução do peso corporal e reversão do estado de resistência à insulina... A cessação do tabagismo também tem se mostrado importante, pois o cigarro é comprovadamente um agravante da resistência insulínica. Várias drogas já se mostraram capazes de prevenir ou retardar o surgimento de DM tipo 2 no paciente pré-diabético. As mais estudadas foram: metformina, acarbose, tiazolidinedionas e orlistat. No entanto, em termos quantitativos, nenhuma droga se mostrou superior às MEV (ex.: em cinco anos, um programa de dieta + atividade física pode reduzir o risco de DM tipo 2 em até 60%, ao passo que o uso dos medicamentos listados reduz esse risco, no máximo, em 30%). Análises de custo-efetividade sugerem que todas as drogas estudadas, exceto a metformina, NÃO devem ser prescritas com este intuito! O motivo é que os custos (com medicamentos e tratamento dos efeitos colaterais) provavelmente superam os benefícios. A metformina é segura e barata, porém, só vale a pena ser indicada na prevenção do DM tipo 2 em pacientes de muito alto risco. Assim, segundo a ADA (American Diabetes Association), são critérios para o seu emprego no “pré- -diabetes”: • IMC ≥ 35; • Idade < 60 anos; • História de diabetes gestacional. Nestes pacientes o uso de metformina seria tão eficaz quanto as MEV para a prevenção do DM tipo 2. O ideal, evidentemente, é que mesmo com a prescrição de metformina o paciente tente aderir às MEV. ✓ Cirurgia hipofisária O tratamento de escolha para a DC é a remoção do tumor hipofisário por via transesfenoidal, que possibilita a reversão clínica e laboratorial do hipercortisolismo na maioria dos casos. A maior parte dos corticotropinomas é pequena, apresentando diâmetro médio de 4 a 5 mm; na maioria das séries, apenas 10% são macroadenomas (≥ 10 mm). Sua localização é, muitas vezes, difícil, e os resultados cirúrgicos são bastante heterogêneos. Por esse motivo, recomenda-se que o paciente seja operado, preferencialmente, por um cirurgião experiente nessa técnica. Levando-se em conta as recidivas precoces e tardias, a taxa de remissão total na DC é de 50 a 60%. As recidivas geralmente ocorrem dentro de 5 anos após a cirurgia, mas podem acontecer após 10 anos ou mais. Portanto, pacientes com DC precisam ser acompanhados por um longo período após a CTE. ✓ Radioterapia A radioterapia dirigida ao tumor hipofisárioresidual representa uma opção secundária de tratamento em pacientes com DC persistente ou recidivante após a cirurgia. Em comparação com a cirurgia, os principais inconvenientes associados à radioterapia incluem o tempo de longa duração entre o tratamento e a resposta clínica e hormonal, bem como o risco considerável de hipopituitarismo, Diferentes modalidades têm sido desenvolvidas para irradiar o tumor hipofisário, incluindo o tumor residual associado à DC persistente ou recorrente. Os principais tipos de radioterapia são geralmente categorizados como convencional (CRT) e estereotáxico (SRT). A radiocirurgia (SRS) e a CSRT são baseadas em princípios semelhantes ao fornecer uma alta radiação, mas muito direcionada para o alvo, poupando as estruturas adjacentes normais. Elas diferem, contudo, no tipo de radiação liberada e nas tecnologias empregadas. Uma única dose elevada de radiação é biologicamente mais eficaz do que a mesma dose liberada em frações. Contudo, uma dose única elevada de radiação é mais tóxica para o tecido normal circundante, particularmente para a via óptica. Portanto, a radiocirurgia somente é indicada para os pacientes com tumores pequenos, os quais estejam a, pelo menos, 0,5 cm do quiasma óptico. Em contrapartida, a radioterapia convencional pode ser empregada mesmo para tumores grandes porque o fracionamento da dose total reduz a toxicidade de radiação para o tecido normal circunvizinho. ✓ Farmacoterapia Indicações Historicamente, a terapia medicamentosa teve um papel menor no controle da DC, uma vez que nenhum fármaco havia apresentado eficácia e perfil de segurança suficientes para ser utilizado rotineiramente na prática clínica como tratamento da DC. Além disso, nenhum medicamento atualmente disponível utilizado para controlar a doença tem uma indicação formal para DC. No entanto, nos últimos anos, os resultados promissores de diferentes ensaios clínicos com novos fármacos supostamente capazes de controlar a doença têm começado a mudar o papel da farmacoterapia no tratamento da DC. A terapia medicamentosa é aconselhável nas seguintes condições: A. Antes da cirurgia, como o tratamento adjuvante, em pacientes com doença grave ou complicações sérias, tais como infecções, doenças cardiovasculares e psicose, a fim de controlar o excesso de cortisol e melhorar a síndrome clínica antes da abordagem cirúrgica; B. Após uma cirurgia malsucedida (frequentemente, hipofisária e, raramente, adrenal), como tratamento coadjuvante, inclusive em pacientes que receberam radioterapia hipofisária, mas que estão aguardando seus efeitos se manifestarem; C. Como opção terapêutica alternativa para pacientes com SC ACTH-dependente de origem obscura, enquanto se aguarda um diagnóstico definitivo de SC hipofisária ou ectópica e D. Como opção terapêutica alternativa, em pacientes que não são candidatos à cirurgia ou recusam cirurgia hipofisária e adrenal e/ou radioterapia. Duas categorias diferentes de medicamentos são usadas atualmente no tratamento da DC: fármacos bloqueadores da esteroidoigênese adrenal e agentes neuromoduladores, que atuam no nível da hipófise. Além disso, um antagonista do receptor glicocorticoide, o mifepristone, está sendo investigado atualmente como terapia para pacientes com SC de diversas etiologias, incluindo a DC (Quadro 39.5).58 Notavelmente, nenhum dos agentes disponíveis no momento são aprovados especificamente para o tratamento de DC. Tratamento da Síndrome de Cushing Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento Fármacos bloqueadores das adrenais Agentes bloqueadores das adrenais têm a capacidade de reduzir a produção de esteroide adrenal por meio da inibição de uma ou várias enzimas da esteroidogênese adrenal, por interferência na atividade de enzimas do citocromo P450 (Figura 39.4). Assim, eles podem ser usados para o tratamento de todos os tipos de SC. Contudo, geralmente não são utilizados como tratamento a longo prazo da doença, mas sobretudo na preparação para a cirurgia ou após a cirurgia e/ou radioterapia, enquanto a eficácia definitiva desses procedimentos é obtida. Os principais representantes desse grupo são cetoconazol (o mais usado em todo o mundo), metirapona, etomidato e mitotano (Quadro 39.6). É digno de nota que o mitotano, diferentemente dos demais fármacos, tem um efeito adrenolítico, por induzir lise de células adrenais. Cetoconazol Na prática clínica, o agente mais comumente usado é o antifúngico cetoconazol, que geralmente é bem tolerado e tem boa eficácia, porém frequentemente associa-se à perda de controle do hipercortisolismo, um fenômeno conhecido como “escape”. Esse fenômeno decorre da hipersecreção de ACTH, consequente à inibição da secreção de cortisol e leva a um aumento progressivo da dose do fármaco durante o período de tratamento. O melhor parâmetro de resposta ao tratamento é o cortisol livre urinário (UFC), que deve ser avaliado a intervalos mínimos de 30 dias. Como monoterapia, na dose de 400 a 1.200 mg/dia, o cetoconazol (Nizoral®, Cetoconazol®, comp. 200 mg) normaliza os níveis do UFC em, aproximadamente, 70 a 80% dos pacientes (Quadro 39.7). Contudo, várias semanas podem ser necessárias para que ocorram os benefícios plenos da dose, e há baixo risco de tratamento excessivo e hipoadrenalismo. Recomenda-se iniciar com 400 mg/dia, aumentando-se essa dose gradativamente. A maioria dos pacientes requer 600 mg/dia.2,3 O cetoconazol é mais bem absorvido em meio ácido. Assim, ele deve ser tomado após as refeições (2 a 3 ×/dia). Acloridria e os uso de inibidores da bomba de prótons (p. ex., omeprazol pantoprazol etc.) diminuem a absorção do cetoconazol. Os efeitos colaterais mais comuns são desconforto gastrintestinal e erupção cutânea. O efeito colateral mais temido é hepatite, que é muito rara (incidência estimada em 1/15.000) (Quadro 39.8). Contudo, pelo menos um caso fatal em uma criança já foi relatado. Anormalidades reversíveis das enzimas hepáticas ocorrem em cerca de 10% dos pacientes. Marcadores precoces para a hepatotoxicidade são transaminases séricas, fosfatase alcalina e bilirrubinas séricas, parâmetros que devem ser monitorados em intervalos frequentes durante o tratamento. Se houver elevação das enzimas hepáticas acima de 3 vezes o limite superior da faixa normal, deve-se suspender o tratamento. Devido a sua ação antiandrogênica leve, o cetoconazol pode causar ginecomastia e diminuição da libido em homens. Metirapona A metirapona é o inibidor mais potente da síntese do cortisol e da aldosterona. Os níveis de cortisol sérico se reduzem no período de 4 h de uma dose inicial, e é necessário cuidado para se evitar o hipoadrenalismo. Como monoterapia, na dose de 500 e 6.000 mg/dia (iniciar com 250 mg 3 ×/dia) a metirapona conduz a uma normalização dos níveis de cortisol em cerca de 75 a 80% dos pacientes (Quadro 39.7). A principal limitação da metirapona é representada pela utilização em mulheres, uma vez que o acúmulo de precursores do cortisol tem como resultado níveis elevados de andrógenos, o que é, muitas vezes, manifestado na forma de distúrbios menstruais, acne e hirsutismo. Além disso, tanto em homens quanto em mulheres, o aumento nos níveis de circulação de precursores mineralocorticoides, principalmente a deoxicorticosterona, pode induzir hipertensão, hipocalemia e edema, limitando o tratamento prolongado com metirapona. Os efeitos hiperandrogênicos podem ser minimizados pela combinação com cetoconazol. Etomidato O etomidato (Hypnomidate®, Etomidato®) é um anestésico e o único inibidor da esteroidogênese adrenal, que pode ser usado por via intravenosa (IV) entre os disponíveis para o tratamento de hipercortisolismo. Esse fármaco tem um rápido início de ação e é particularmente útil em condições em que se faz necessáriauma rápida redução da cortisolemia e a via oral é problemática. Entre tais condições estão complicações agudas ou potencialmente fatais de SC, como graves hipertensão, psicose, infecções e/ou doenças cardiovasculares. A infusão contínua de etomidato, na dose de 0,03 a 0,3 mg/kg/h (Quadro 39.7), reduz as concentrações séricas de cortisol em 11 a 24 h. Fármacos neuromoduladores Neste grupo há uma longa série de compostos com mecanismos de ação diversos que foram ou têm sido testados como potenciais Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento inibidores de secreção de ACTH por tumores hipofisários corticotróficos (Quadro 39.9). No passado, ciproheptadina e valproato sódico, atuando sobre os receptores da serotonina e do ácido G-aminobutírico, respectivamente, mostraram-se eficazes no controle da secreção de ACTH e do cortisol em alguns casos esporádicos de DC. Uma melhor resposta foi observada com o agonista dopaminérgico bromocriptina, que se revelou efetivo em mais de um terço dos casos a curto prazo, mas os resultados a longo prazo foram decepcionantes, mesmo com o uso de doses tão altas quanto 40 mg/ dia ou mesmo mais. Posteriormente, a utilização do análogo da somatostatina octreotide produziu resultados igualmente decepcionantes, com resposta favorável em apenas uma minoria de casos testados e por um curto período. Recentemente, tem havido um interesse renovado na utilização de fármacos neuromoduladores para a DC, com estudos testando três categorias de agentes, incluindo agonistas do PPARG (receptor ativado por proliferadores de peroxissomo gama), o agonista dopaminérgio cabergolina e o análogo da somatostatina, pasireotide. Agonistas do PPARG A rosiglitazona, agonista do PPARG usado no tratamento do diabetes tipo 2 (DM2), mostrou-se capaz de reduzir os níveis de cortisol e de ACTH, assim como de impedir o crescimento do tumor em um modelo animal de DC. Apesar da documentada expressão do PPARG nos corticotropinomas em humanos, os estudos com rosiglitazona em pacientes com DC infelizmente revelaram resultados quase uniformemente decepcionantes. Em particular, em um estudo com 10 pacientes com DC tratados com 4 a 16 mg/dia de rosiglitazona durante 1 a 8 meses, não houve diminuição consistente do cortisol livre urinário, do ACTH nem do cortisol sérico. No entanto, a sensibilidade à insulina melhorou na maioria dos pacientes, independentemente da secreção de ACTH ou cortisol, provavelmente devido à propriedade intrínseca do fármaco. Os efeitos colaterais incluíram edema, aumento de peso, sonolência e agravamento do hirsutismo.71 Em um estudo clínico maior, 14 pacientes com DC foram tratados com 8 a 16 mg/dia de rosiglitazona por 1 a 7 meses. Como resultado, observaram-se, em seis (43%) pacientes, redução do ACTH plasmático e do cortisol sérico, além de normalização do UFC, 30 a 60 dias após a introdução da rosiglitazona. É interessante notar que em 2 desses 6 casos, seguidos por 7 meses, evidenciou-se uma discreta melhora clínica e um melhor controle da glicemia. Nenhuma resposta à rosiglitazona foi observada em pacientes com SN. O uso da pioglitazona, outro agonista do PPARG, mostrou resultados semelhantes aos obtidos com rosiglitazona no tratamento de DC. Embora as respostas aos agonistas do PPARG tenham sido decepcionantes, pode-se aventar a hipótese de que, com doses mais elevadas ou o uso de agentes mais potentes, seria possível se obter uma eficácia maior no tratamento da DC. Atualmente, o uso de agonistas do PPARG não pode ser recomendado para o tratamento de DC, exceto para o tratamento de eventual DM2 associado e/ou em combinação com diferentes medicamentos eficazes no controle do hipercortisolismo. Cabergolina Nos últimos anos, o possível papel de agonistas dopaminérgicos no tratamento de DC tem sido reconsiderado devido à demonstração da expressão nos tumores corticotróficos hipofisários de receptores da dopamina, particularm ente o tipo 2 (D2), bem como os relatos de remissão da doença durante o uso da cabergolina (Dostinex® – comp. 0,5 mg), potente agonista dopaminérgico com alta afinidade pelo D2. Com efeito, foi mostrado que o tratamento a curto prazo (3 meses) com cabergolina em 10 pacientes com DC persistente após a cirurgia sem êxito, em dose que variou de 1 a 3 mg por semana, resultou em diminuição da secreção de cortisol em 60% dos casos e normalização em 40%. O tratamento a longo prazo (12 a 24 meses) com cabergolina em uma população maior de 20 pacientes com DC persistente evidenciou que 40% dos pacientes foram controlados pela administração de cabergolina em doses que variaram de 1 a 7 mg por semana. Pasireotide O possível papel dos análogos da somatostatina também foi reavaliado no tratamento de DC com o desenvolvimento de um novo agente, pasireotide, que tem elevada afinidade de ligação para os subtipos de receptores sst1, sst2, sst3 e, principalmente, sst5. O racional para o uso do pasireotide é o fato do sst5 ser o receptor somatostatinérgico predominantemente expresso nos corticotropinomas. Em contraste, o octreotide tem maior afinidade pelo sst2, o que explicaria sua baixa eficácia na DC. Os efeitos colaterais mais frequentemente observados foram diarreia e náu seas (em mais da metade dos pacientes), bem como hiperglicemia. Terapia combinada A terapia combinada pode ser mais eficaz do que a monoterapia em pacientes com DC persistente. Em primeiro lugar, medicamentos de associação podem induzir controle da secreção de cortisol dentro de um prazo aceitável. Em segundo lugar, no caso de toxicidade, a combinação de medicamentos pode levar à utilização de menores doses de cada fármaco, possibilitando a redução de eventos adversos. Finalmente, a combinação de medicamentos pode ter efeitos sinérgicos na secreção de ACTH por tumores pituitários corticotróficos, com potenciação na redução da secreção de cortisol. Um estudo recente examinou a eficácia da farmacoterapia combinada por etapas em pacientes com DC, usando pasireotide como modalidade inicial de tratamento, sequencialmente combinado com cabergolina e cetoconazol de acordo com os níveis de UFC. Antagonista do receptor do glicocorticoide O mifepristone é um antagonista do receptor de glicocorticoide que está sendo avaliado como terapia possível para todos os tipos de SC. A afinidade relativa de ligação do mifepristone ao receptor de glicocorticoide é mais do que 10 vezes superior à do cortisol, tornando esse fármaco muito potente em bloquear o efeito periférico de cortisol.58,87 O mecanismo de ação de mifepristone implica que nenhum valor hormonal pode ser utilizado como marcador da eficácia de medicamentos, uma vez que o ACTH plasmático ou os níveis de cortisol no soro, saliva e na urina aumentam como consequência do bloqueio do receptor glicocorticoide; assim, apenas os parâmetros clínicos podem ser considerados durante o seguimento do tratamento com mifepristone. Uma importante limitação para o uso do mifepristone é o fato de ele não reduzir os níveis circulantes de cortisol (que podem aumentar), tornando difícil a monitorização da eficácia do tratamento, assim como a identificação de um eventual hipoadrenalismo. Portanto, os ajustes de dose e o seguimento devem se basear principalmente em parâmetros clínicos, como peso, pressão arterial ou presença de um marcador clínico específico da doença. Insuficiência adrenal deve ser suspeitada em caso de fraqueza, fadiga, náuseas, vômitos e episódios de hipoglicemia. Isadora Pedreira. Módulo XXIV- Problema 02 fechamento É o melhor método para diferenciar nódulos benignos e malignos. A sensibilidade e a especificidade ultrapassam 90%. Na presença de bócio multinodular, indica-se a realização de PAAF nos quatro maiores nódulos. Idealmente,a PAAF deve ser sempre guiada por USG, mesmo quando o nódulo é palpável, pois isso aumenta a acurácia diagnóstica. É importante compreender que o material coletado pela PAAF permite apenas uma análise citológica (isto é, células “soltas” são visualizadas individualmente). Uma análise histológica (definição da arquitetura tecidual) requer a obtenção de um espécime cirúrgico. O nódulo submetido à PAAF deve ser classificado conforme o sistema de Bethesda. Uma das grandes limitações da PAAF é sua incapacidade de definir se o tumor folicular (Bethesda 4) é maligno ou benigno. A citologia folicular pode representar tanto um adenoma (tumor benigno) quanto um carcinoma (tumor maligno) folicular. Hoje, já é possível realizar a pesquisa de mutações genéticas que indicam malignidade, porém, nem sempre esta metodologia estará disponível. Em tal circunstância, tradicionalmente, a conduta consiste em proceder à cirurgia (lobectomia). A presença de malignidade pode ser definida pela análise histológica, através da demonstração de: (1) invasão da cápsula tumoral; e/ou (2) invasão de vasos (sanguíneos e/ou linfáticos). Exceção pode ser feita ao encontro de células de Hürthle na PAAF de um tumor folicular: nesta situação, pode-se partir direto para a cirurgia, pois a chance de malignidade é grande. Quais são as indicações de PAAF? 1. Nódulos de qualquer tamanho associados à linfadenopatia cervical suspeita; 2. Nódulos > 0,5 cm com características sugestivas de malignidade na USG; 3. Nódulos ≥ 1 cm, sólidos ou não sólidos com microcalcificações; 4. Nódulos mistos (cístico-sólidos) com ≥ 1,5 cm e características sugestivas de malignidade na USG ou ≥ 2 cm, independentemente das características na USG; 5. Nódulos espongiformes ≥ 2 cm. Atenção: nódulos císticos “puros” não necessitam de PAAF, pois sempre são benignos. No entanto, a PAAF pode ser realizada nesses nódulos por motivos estéticos, para “esvaziar” o nódulo e/ou melhorar sintomas locais. NÃO é preciso suspender anticoagulantes ou antiplaquetários a fim de realizar a PAAF! Nódulos sem indicação de PAAF, ou que foram submetidos à PAAF e tiveram resultado benigno, devem ser acompanhados com US a cada 6-18 meses. Se houver crescimento acelerado (> 50% do volume ou > 20% em pelo menos duas dimensões, com um aumento mínimo de 2 mm do nódulo sólido ou componente sólido de um nódulo misto) uma nova PAAF deve ser realizada imediatamente. Referências: SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. Atualização da diretriz brasileira de dislipidemias e prevenção da aterosclerose – 2017. Volume 109, Nº 2, Supl. 1, Agosto 2017. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas da dislipidemia: prevenção de eventos cardiovasculares e pancreatite. BRASÍLIA – DF 2020 VILAR, Lucio. Endocrinologia clínica. 5. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2013. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Diabetes, 2015-2016 Punção Aspirativa por PAAF