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@anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 1 OBJETIVOS 1. Discutir a assistência pré-natal; 2. Estudar o diagnostico clinico e laboratorial da gravidez; 3. Exame físico da gravida; 4. Medicamentos e exames complementares do pré-natal. Assistência Pré-Natal INTRODUÇÃO A American Academy of Pediatrics (AAP) e o American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG) descrevem os cuidados pré-natais como um programa abrangente de cuidados envolvendo a abordagem coordenada de cuidados médicos e psicossociais que idealmente devem ser iniciados antes da concepção, estendendo-se por todo o período gestacional até o parto. Desse modo, os programas de pré-natal devem incluir: − Cuidados pré-concepcionais; − Diagnóstico precoce da gestação; − Avaliação pré-natal inicial; − Consultas de acompanhamento pré-natais até o parto. Os principais OBJETIVOS do acompanhamento médico ou de enfermagem no pré-natal são: − Identificar gestantes com fatores de risco para desfechos desfavoráveis (p. ex., diabetes gestacional, hipertensão arterial sistêmica [HAS], prematuridade); − Prevenir os agravos mais comuns para o binômio materno-fetal (p. ex., transmissão vertical de infecções); − Tratar enfermidades intercorrentes (p. ex., infecção do trato urinário [ITU], infecções vaginais, enfermidade sexualmente transmissível [EST]); − Educar a gestante para um estilo de vida saudável (p. ex., abandono do fumo e do álcool, correção dietética, uso seguro de medicamentos); − Preparar o casal para o momento do nascimento e o puerpério. A triagem das gestantes com risco pré-natal deve ser realizada continuamente durante toda a assistência pré- natal de maneira meticulosa e racional. Gestantes adolescentes devem merecer atenção especial durante a assistência pré-natal, pois apresentam maior frequência de pré-natal inadequado (menor número de comparecimento às consultas) e de recém-nascidos (RNs) de baixo peso, quando comparadas às gestantes não adolescentes. Além disso, pré-eclâmpsia, anemia e prematuridade também têm sido mais associadas à gestação na adolescência. Já na primeira consulta de pré-natal deverá ser determinado se a gestação em questão está exposta a fatores de risco prévios que possam influenciar os desfechos pré-natais. INDICADORES DE RISCO GESTACIONAL Biológicos Idade materna < 16 ou > 35 anos Peso inicial inferior a 50 kg Estatura inferior a 150 cm História familiar de doenças hereditárias Clínicos Hipertensão Nefropatia Diabetes EST Cardiopatia Ambientais Saneamento básico inexistente ou inadequado Estilo de vida não saudável Comportamentais Fumo Etilismo Uso de drogas ilícitas Atividade em trabalho braçal exaustivo Sedentarismo Relacionados à assistência à saúde Má qualidade da assistência Cobertura insuficiente ao pré-natal Falta de integração interinstitucional Socioculturais / Econômico Baixa escolaridade Gestantes solteiras Adolescência e não aceitação da gravidez Baixa renda Obstétricos História de infertilidade Gravidez anterior com qualquer intercorrência, incluindo distocia e/ou cicatriz uterina prévia Condições atuais Pré-natal ausente ou tardio Hemorragia anteparto Gestação múltipla @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 2 HAS Rupreme Aloimunização Gestação prolongada Restrição de crescimento fetal Polidrâmnio Anemia Apresentação anômala EST, enfermidade sexualmente transmissível; HAS, hipertensão arterial sistêmica; Rupreme, ruptura prematura de membranas. CUIDADOS PRÉ-CONCEPCIONAIS Idealmente, é recomendado que todo casal que esteja planejando uma gravidez faça pelo menos uma consulta pré-concepcional para aconselhamento e avaliação de eventuais riscos. Nessa consulta, deve ser feita uma anamnese cuidadosa, incluindo história médica pregressa do casal e de sua família, um exame físico geral e ginecológico, incluindo medida da pressão arterial (PA), do peso e da altura (incluindo índice de massa corporal [IMC]) e avaliação da flora vaginal e citopatológica do colo uterino, se indicado. É recomendado também o rastreamento sorológico de vírus da imunodeficiência humana (HIV), sífilis, antígenos e anticorpos da hepatite B, uma medida da glicemia de jejum para detectar e corrigir eventual hiperglicemia e um hemograma para detectar uma anemia não percebida. Além disso, deve ser recomendado que a futura gestante inicie, pelo menos 30 dias antes da concepção mantendo até a 12° semana de gestação, uma reposição de ácido fólico, o que pode diminuir o risco de defeitos de fechamento do tubo neural no futuro bebê. A dose recomendada é de 0,4 mg/dia por via oral (VO), com exceção das pacientes de alto risco (diabetes, antecedente de defeito de fechamento do tubo neural), que devem receber 4 mg/dia. DIAGNÓSTICO DE GESTAÇÃO O diagnóstico precoce da gestação é fundamental para uma assistência pré-natal de qualidade, pois possibilita o início também precoce do acompanhamento pré-natal e dos cuidados de saúde. Além disso, facilita a identificação correta da idade gestacional (IG), o que é decisivo para o acompanhamento correto da gestação. O diagnóstico de gestação é feito com base em dados clínicos (história e exame físico) e testes subsidiários. Apesar de ser menos sensível e específica do que os testes laboratoriais, a avaliação clínica de sinais e sintomas fornece dados iniciais a respeito do grau de probabilidade de tratar-se realmente de gestação ou sobre a necessidade de buscar diagnósticos alternativos. A HISTÓRIA TÍPICA é a de uma mulher na menacme, com vida sexual ativa, sem uso de método contraceptivo, referindo atraso menstrual ou amenorreia secundária. − Menacme é o período em que a mulher se encontra em idade fértil. DIAGNÓSTICO LABORATORIAL DE GESTAÇÃO O diagnóstico laboratorial de gestação é feito com base na detecção da fração β da gonadotrofina coriônica humana (β-hCG) urinária ou sérica. Ambas têm alta sensibilidade; porém, os testes urinários são menos sensíveis do que os séricos. β-hCG é produzida pelo trofoblasto e aparece na circulação materna pouco após a implantação trofoblástica, tornando-se detectável no plasma ou na urina em 8 a 9 dias após a ovulação. Níveis plasmáticos menores do que 5 mUI/mL são considerados negativos, e maiores do que 25 mUI/mL são considerados positivos. Sintomas de presunção: •Náuseas e vômitos no primeiro trimestre; •Aumento do volume e da sensibilidade nas mamas; •Polaciúria e nictúria; •Percepção de movimentos fetais pela paciente; •Mudanças no apetite (desejos alimentares); •Fadiga, tontura, sialorreia, distensão abdominal e constipação, dispneia, congestão nasal, cãibras, lombalgia. Sinais de presunção: •Atraso menstrual de 10 a 14 dias ou amenorreia secundária; •Congestão mamária e mastalgia, pigmentação das aréolas e surgimento dos tubérculos de Montgomery, aparecimento de colostro, rede venosa visível; •Alterações na vulva e na vagina (coloração violácea vaginal, cervical e vulvar); •Alterações no muco cervical (maior quantidade de muco e ausência de cristalização com padrão arboriforme); •Alterações cutâneas (estrias, hiperpigmentação da face – cloasma e linha nigra). Sinais de probabilidade: •Alterações em formato e consistência do útero (flexão do corpo sobre o colo uterino no toque bimanual – sinal de Hegar) e sinal de Nobile-Budin (preenchimento do fundo de saco vaginal pelo útero percebido ao toque vaginal); •Consistência cervical amolecida; •Aumento do volume abdominal. Sinais de certeza: •Ausculta de batimentos cardiofetais (BCFs) (pela ultrassonografia [US] transvaginal a partir da 6a semana; pelo sonar Doppler a partir da 10a semana de gestação; e pelo estetoscópio de Pinard a partir da 18a à 20a semana); •Sinal de Puzos (rechaço fetal intrauterino ao toque); •Percepção de movimentos e partes fetaispelo examinador (a partir de 18-20 semanas). @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 3 Os níveis de β-hCG crescem exponencialmente nas primeiras semanas, atingindo um pico de até 150.000 mUI/mL em torno de 8 a 10 semanas. Entre a 10° e a 20° semana, os níveis tendem a cair e mantêm-se estáveis a partir da 20° semana. − A causa mais comum de testes falsos-negativos de testes vendidos em farmácia é a sua realização muito precoce, quando os níveis de β-hCG ainda estão muito baixos. DIAGNÓSTICO ULTRASSONOGRÁFICO DE GESTAÇÃO O diagnóstico de gestação também pode ser confirmado por meio de US. O saco gestacional é visível precocemente (4-5 semanas de atraso menstrual). A partir de 6 semanas, deve ser possível detectar BCFs pela US. − BCFs: Ausculta de batimentos cardiofetais DETERMINAÇÃO DA IDADE GESTACIONAL E DATA PROVÁVEL DO PARTO A idade gestacional (IG) referida corresponde ao número de semanas desde o primeiro dia da data da última menstruação (DUM) de um ciclo regular e ovulatório até a data estimada. A data provável do parto (DPP) pode ser calculada pela regra de Näegele, somando-se 7 dias ao primeiro dia da DUM e subtraindo-se 3 ao mês em que ocorreu a DUM. Outra ferramenta útil para estimar a IG é a medição da altura uterina (AU). O uso de uma curva-padrão de crescimento uterino permite correlacionar a IG calculada e a medida da AU a cada consulta. Uma das formas mais confiáveis para a datação da gestação é a avaliação por US obstétrica. Feita no primeiro trimestre por via transvaginal, faz-se a medida do comprimento cabeça-nádega (CCN). CONSULTA PRÉ-NATAL Os objetivos principais de cada consulta pré-natal devem ser: − Definir o estado de saúde da mãe e do feto; − Avaliar a IG e compará-la com o crescimento uterino (medida em cm da sínfise púbica até o fundo uterino); − Realizar um plano de cuidado obstétrico continuado. Na primeira consulta pré-natal, devem ser feitos anamnese e exame físico completos, atentando-se para aspectos epidemiológicos e antecedentes familiares e pessoais, com atenção especial para antecedentes ginecológicos e obstétricos. É muito importante também realizar na primeira consulta pré-natal uma avaliação de aspectos socioculturais, incluindo triagem para uso de drogas, risco de violência doméstica, nível de segurança no local de moradia, pobreza extrema, fome, aceitação da gestação, etc. Nas consultas subsequentes, a avaliação deve ser mais dirigida aos aspectos específicos da gestação, sendo necessário questionar sempre sobre movimentação fetal, contrações uterinas e perdas vaginais. A FREQUÊNCIA DAS CONSULTAS deve diferir entre gestações de alto e baixo risco. No caso de gestantes sem fatores de risco detectados, o Ministério da Saúde (MS) recomenda pelo menos seis consultas: uma no primeiro, duas no segundo e três no terceiro trimestres. O intervalo entre elas não deve ultrapassar 8 semanas. No fim do terceiro trimestre, as consultas necessitam ser mais frequentes, e a gestante deve ser orientada sobre sinais de trabalho de parto (TP) e a procurar atendimento se o parto não ocorrer 7 dias após a DPP (i.e., se a gestação atingir 41 semanas). No fim da gestação, deve-se explicar à paciente os sinais previstos de início do TP (ritmo, frequência e intensidade das contrações) e ressaltar a possibilidade de ruptura da bolsa de líquido amniótico, os sinais de alerta para indicar uma consulta em emergência obstétrica e os procedimentos que poderão ser realizados durante sua internação. ALTERAÇÕES FISIOLÓGICAS DA GESTAÇÃO PELE E ANEXOS Alterações Fisiopatologia Manejo Estrias Ruptura de fibras elásticas Não há tratamento especifico Linha nigra Hiperpigmentação curanea na linha media no abdome Não há tratamento; costuma desaparecer após o parto SISTEMA MUSCULOESQUELÉTICO Alterações Fisiopatologia Manejo @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 4 Dores lombares Mudança no eixo gravitacional do corpo; relaxamento ligamentar, fadiga e contraturas musculares Melhoram com medidas gerais (alongamento, calor local, analgésicos, correção postural); evitar uso de calçado com salto alto Dores hipogástricas Pressão do útero sobre a musculatura abdominal, pelve e bexiga, associada ao relaxamento ligamentar Melhoram com repouso; é importante diferenciar de contrações uterinas Cãibras Causa desconhecida; ocorrem em 30% das gestações, com mais frequência à noite; associadas à presença de varizes Melhoram com repouso, aumento da ingesta hídrica e de cálcio SISTEMA DIGESTÓRIO Alterações Fisiopatologia Manejo Náuseas e vômitos Matinais, não devem persistir além do 2º trimestre; relacionados a fatores hormonais e psicogênicos Tranquilização; às vezes, medicamento antiemético; afastar hiperêmese gravídica e causas secundárias nos casos refratários Sialorreia Pode acompanhar náuseas no 1º trimestre Não há tratamento específico Pirose Compressão gástrica pelo útero, com aumento do refluxo gastresofágico Fracionamento das refeições; uso de cabeceira elevada; evitar a posição supina após as refeições e a ingestão de alimentos agravantes; uso de substâncias antiácidas nos casos refratários Constipação Redução da motilidade intestinal, pela ação hormonal e pela compressão exercida pelo útero sobre as porções terminais do intestino Aumento da ingesta hídrica e de fibras alimentares SISTEMA CIRCULATÓRIO E ENDÓCRINO Alterações Fisiopatologia Manejo Sincope e tonturas Hipotensão e hipoglicemia Repouso; alimentação adequada Varizes e edema em membros inferiores Compressão venosa pelo útero gravídico, dificultando o retorno venoso Elevação de membros inferiores; uso de meias elástica Hemorroidas Compressão do útero sobre o plexo hemorroidário, mais sintomáticas na presença de constipação Normalização do hábito intestinal com fibras e hidratação adequada; uso de banhos de assento e anestésicos locais; regridem após o parto SISTEMA UROGENITAL Alterações Fisiopatologia Manejo Polaciúria Compressão do útero sobre a bexiga, com redução da capacidade vesical. Afastar infecção urinaria Leucorreia Aumento das secreções vaginais por ação hormonal; secreção esbranquiçada, sem irritação da mucosa vulvar e vaginal Afastar vaginite ESTADO NUTRICIONAL E GANHO DE PESO DURANTE A GESTAÇÃO O ganho de peso na gestação deve ser vigiado, verificando-se se evolui dentro da faixa de normalidade. A @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 5 ausência de ganho de peso ou a perda de peso podem estar associadas a um crescimento fetal insuficiente; o ganho de peso repentino (700 g ou mais em 1 semana) deve levantar suspeita de retenção líquida (edema) relacionada com a pré-eclâmpsia. Gestantes com ganho excessivo de peso tendem a ter fetos macrossômicos, grandes para a IG ao nascimento, e maior dificuldade para perder peso no puerpério. Para acompanhar o crescimento ponderal da gestante, pode-se usar o peso estimado antes de engravidar e considerar como aumento normal um ganho semanal de 400 g no segundo trimestre e de 300 g no terceiro trimestre. A suplementação rotineira de vitaminas não é recomendada, pois, em geral, uma alimentação saudável é suficiente para suprir as necessidades diárias de forma adequada. A exceção é feita nos casos em que há risco nutricional, como em pacientes com gestação múltipla, abuso de drogas, vegetarianas estritas, epilépticas ou com diagnóstico de hemoglobinopatias. Uma suplementação de ferro elementar – na dose de 30 a 40 mg/dia, a partir de 20 semanas de IG – é recomendadainclusive para gestantes sem anemia ferropriva, uma vez que o balanço de ferro é negativo ao fim da gestação. O uso intermitente de 1 a 3 ×/semana parece ser igualmente efetivo e mais bem tolerado. Nas gestantes com anemia ferropriva, a suplementação deve ser de 40 a 120 mg diários até a sua resolução. Constipação intestinal é uma queixa comum entre as gestantes. A suplementação dietética com fibras vegetais é efetiva na redução da constipação na gravidez. VIGILÂNCIA DA PRESSÃO ARTERIAL A medida da PA deve ser realizada a cada consulta de pré- natal, permitindo o diagnóstico precoce de HAS e de outros distúrbios hipertensivos na gestação, como pré- eclâmpsia. Considera-se hipertensão arterial quando os níveis de pressão sistólica forem > 140 mmHg ou os níveis de pressão diastólica forem > 90 mmHg, medidos pelo menos duas vezes com intervalo de pelo menos 6 horas. MEDIDA DA ALTURA UTERINA – Crescimento fetal A medida da AU a cada consulta, de preferência pelo mesmo examinador, é uma maneira fácil e universalmente acessível para acompanhar o crescimento uterino. O registro gráfico da AU permite fazer a avaliação indireta do crescimento do feto, compará-lo com a IG presumida e detectar desvios de crescimento. Correlação entre o tamanho uterino e a idade gestacional Semanas Tamanho uterino Até a 6ª semana Não ocorre alteração do tamanho uterino Na 8ª semana O útero corresponde ao dobro do tamanho normal Na 10ª semana Corresponde a três vezes o tamanho habitual Na 12ª semana Ocupa toda a pelve, sendo palpável na sínfise púbica Na 16ª semana Encontra-se entre a sínfise púbica e a cicatriz umbilical Na 20ª semana Situa-se na cicatriz umbilical A partir da 20ª semana Existe uma relação aproximada entre as semanas de gestação e a medida da AU; quanto mais próximo do término da gestação, menos fiel é a correspondência A MEDIDA DA AU é feita colocando-se um extremo da fita métrica sobre a borda superior da sínfise púbica e o outro, no fundo uterino. A paciente deve ser colocada em posição de litotomia, com a bexiga vazia, para reduzir a interferência de fatores extrínsecos na medida da AU. Distribuição da altura uterina de acordo com a idade gestacional. Fonte: Adaptada de Oppermann e colaboradores. A cada consulta, deve-se marcar no gráfico o ponto de intersecção da AU com a IG e verificar se a curva do @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 6 crescimento está situada entre os percentis 10 e 90. Se a AU seguir aumentando em um mesmo percentil, deve-se seguir o calendário mínimo de pré-natal. Se ocorrer queda ou elevação abrupta da curva, deve-se atentar para um possível erro na medida ou prosseguir investigação diagnóstica para distúrbio do crescimento fetal. Nesses casos, uma avaliação ultrassonográfica do feto torna-se indispensável. AUSCULTA DOS BATIMENTOS CARDIOFETAIS A determinação da frequência cardíaca fetal (FCF) foi o primeiro recurso propedêutico utilizado para avaliar as condições fetais na gravidez e no parto. A identificação dos BCFs pode ser feita a partir da 5ª ou 6ª semana de gestação com a US, a partir da 10ª ou 11ª semana com o sonar Doppler e a partir da 20ª semana com o estetoscópio de Pinard. A possibilidade de ouvir os batimentos cardíacos do bebê traz à mãe uma sensação de tranquilidade, ao passo que sua eventual não identificação pode gerar ansiedade intensa. Portanto, é de boa conduta alertar a gestante previamente que uma eventual dificuldade de ausculta pode estar relacionada a outros fatores além da vitalidade do feto. Obesidade, dificuldade de identificar o dorso fetal, polidrâmnio e defeitos nos aparelhos de sonar Doppler podem dificultar a ausculta. Em caso de gemelaridade, o correto é utilizar dois sonares e avaliar simultaneamente a frequência e o ritmo cardíaco dos fetos. Observa-se a frequência dos batimentos durante 1 minuto, que deve situar-se entre 110 e 160 bpm. Variações para menos ou para mais correspondem, respectivamente, à bradicardia e à taquicardia fetal e representam motivos para avaliação mais detalhada de bem-estar fetal. A existência de acelerações transitórias (elevações da frequência de pelo menos 15 batimentos por, no mínimo, 15 segundos) é sinal de boa vitalidade e está frequentemente associada às movimentações fetais, aos estímulos mecânicos sobre o útero ou à contração uterina. No terceiro trimestre da gestação, se o dorso fetal estiver situado à direita da mãe, o decúbito dorsal materno pode levar à compressão da aorta e da veia cava inferior (hipotensão supina postural), causando síndrome de compressão aorto-cava. A diminuição do fluxo sanguíneo uterino e da perfusão placentária pode acarretar queda da FCF (efeito Poseiro). A lateralização da paciente para a esquerda deve normalizar essa situação. A determinação do LOCAL de melhor ausculta dos BCFs depende da IG. Nas gestações de até 16 semanas, o ponto de ausculta deve situar-se próximo ao púbis. Com o avanço do crescimento uterino, privilegiando o eixo longitudinal, em geral o feto se situará nesse eixo, o que pode ser comprovado por meio das manobras de Leopold- Zweifel. Dividindo-se o abdome materno em quatro quadrantes, procura-se auscultar os BCFs no quadrante em que devem estar o dorso e a cabeça fetal. FIGURA Manobras de palpação de Leopold-Zweifel. AVALIAÇÃO LABORATORIAL NO PRÉ-NATAL HEMOGRAMA O hemograma deve ser solicitado na primeira consulta pré-concepcional ou pré-natal com objetivo de avaliar os níveis de hemoglobina (Hb) e hematócrito (Ht). Durante a gestação, observa-se grande aumento do volume plasmático, assim como aumento da produção de @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 7 hemácias. Como o aumento plasmático é superior ao da massa eritrocitária, ocorre hemodiluição, em geral com queda de cerca de 2 pontos na concentração de Hb em torno do fim do segundo trimestre e início do terceiro trimestre da gestação. Essa alteração é erroneamente chamada de “anemia fisiológica da gestação”. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), valores de Hb abaixo de 11 g/dL ou de Ht abaixo de 33%, em qualquer período gestacional, indicam anemia. TIPAGEM SANGUÍNEA E COOMBS INDIRETO A tipagem sanguínea e o fator Rh precisam ser solicitados na primeira consulta de pré-natal a todas as gestantes, com o intuito de identificar eventual incompatibilidade Rh no casal e prevenir a aloimunização perinatal. Se a gestante for Rh-negativa, deve ser solicitado em seguida o teste de Coombs indireto, a fim de identificar sensibilização prévia. Se este for negativo, a partir da 24ª semana, deve- se repeti-lo mensalmente. Se for positivo, considerar gestante previamente aloimunizada e seguir conduta específica. Em gestantes com história prévia de transfusão sanguínea, mesmo sendo Rh-positivas, devem ser também solicitados teste de Coombs indireto e pesquisa de anticorpos irregulares, pois pode ter havido aloimunização por outros antígenos. GLICEMIA DE JEJUM E TESTE ORAL DE TOLERÂNCIA À GLICOSE Na primeira consulta pré-concepcional ou pré-natal, deve ser solicitada a glicemia de jejum. O rastreamento deve ser repetido entre a 24ª e a 28ª semana de gestação com o teste oral de tolerância à glicose (TOTG), que é a medida da glicemia no jejum e 1 e 2 horas após uma carga de 75 g de glicose VO. Para a realização do TOTG, recomenda-se jejum de 8 horas e restrição de carboidratos nos 3 dias anteriores ao teste. UROCULTURA Toda gestante deve ser submetida a uma urocultura na primeira consulta de pré-natal, com objetivo de identificar e erradicar a bacteriúria assintomática (BA) e prevenir a ocorrência de pielonefrite na gestação. Gestantes hígidas, assintomáticas, com urocultura negativa na primeira consulta, sem nefropatias e sem história de infecções urináriasde repetição não necessitam repetir o exame durante o pré-natal. Havendo cistite (infecção baixa sintomática) ou pielonefrite, após o tratamento há indicação de repetir mensalmente a urocultura nos casos em que a gestante não estiver fazendo uso de quimioprofilaxia. Os testes rápidos com fitas e testes enzimáticos não devem ser utilizados para orientar tratamento nas pacientes assintomáticas, pois não têm capacidade de identificar BA. SOROLOGIA PARA SÍFILIS O rastreamento para sífilis é obrigatório em todo o pré- natal. Deve ser solicitado um teste de Veneral Disease Research Laboratory (VDRL) na primeira consulta, o qual deve ser repetido no terceiro trimestre. Devido ao aumento dos casos de sífilis congênita no Brasil, o MS tornou obrigatório repetir a testagem em todas as gestantes no momento do parto. Se o teste realizado for o VDRL e este for positivo, deve-se solicitar um teste treponêmico (teste rápido para sífilis ou teste de absorção fluorescente contra treponema) a fim de descartar falsos-positivos. SOROLOGIA PARA VÍRUS DA IMUNODEFICIÊNCIA HUMANA A testagem do HIV deve ser realizada na primeira consulta do pré-natal a fim de identificar gestantes soropositivas e iniciar o tratamento para diminuir a carga viral e o risco de transmissão vertical. Se negativo, deve-se repetir o teste no terceiro trimestre e no momento da internação hospitalar. O teste também tem sido feito por meio de testes rápidos ou por sorologia como o enzimaimunoensaio (Elisa). Se o teste rápido for negativo, encerra-se a investigação naquele momento e repete-se no terceiro trimestre e no momento da internação hospitalar. Se o resultado for positivo, repete-se sequencialmente; se confirmar positividade, inicia-se o aconselhamento e o tratamento. Se os resultados forem discordantes ou indeterminados, segue-se a investigação. O pré-natal da gestante soropositiva deve ser diferenciado, incluindo avaliação clínica mais especializada e preferencialmente acompanhada por um infectologista. Devem ser solicitados exames como o teste de Mantoux, citomegalovírus, anti-HCV (vírus da hepatite C), carga viral e CD4. SOROLOGIA PARA HEPATITE B Com o objetivo de reduzir a transmissão materno-infantil da hepatite B, o MS recomenda a triagem sorológica durante a gestação. O exame deve ser realizado na primeira consulta do pré-natal, independentemente da IG. A testagem também tem sido feita por meio de testes rápidos ou por sorologia pelo antígeno de superfície do vírus da hepatite B (HBsAg). Se a gestante for negativa, e o anti-HBs for não reagente, recomenda-se a imunização antes ou durante a gestação, em qualquer trimestre. Se o anti-HBs for reagente, não há mais necessidade de repetir o teste ao longo da gestação, uma vez que a gestante já está imunizada. Gestantes portadoras do antígeno (HBsAg reagente) devem ser encaminhadas no parto para unidades obstétricas que assegurem a administração de vacina e da imunoglobulina específica para o vírus da hepatite B (HBIg) ao RN. @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 8 Quando a gestação ocorre em paciente portadora de infecção crônica pelo vírus da hepatite B com perfil imunológico HBsAg reagente ou antígeno do envelope do vírus da hepatite B (HBeAg) reagente, ocorre grave risco para o RN, pois, sem a imunoprofilaxia adequada no momento do parto, mais de 90% das crianças desenvolverão infecção aguda pelo HBV e poderão progredir para infecção crônica com complicações da doença hepática crônica na idade adulta. SOROLOGIA PARA TOXOPLASMOSE Solicitar rotineiramente sorologia (imunoglobulina G [IgG] e imunoglobulina M [IgM]) para toxoplasmose é justificado apenas em regiões de alta prevalência dessa parasitose (p. ex., Rio Grande do Sul). Na ausência de anticorpos IgG e IgM no primeiro exame, repete-se no segundo e terceiro trimestres da gestação e inicia-se a instrução da adoção de práticas preventivas, como evitar a ingestão de carnes cruas e malcozidas, lavar bem as frutas e as verduras e evitar contato com animais (principalmente gatos). Na presença de anticorpos IgG-positivos e IgM-negativos, considera-se a gestante imune e não há necessidade de repeti-los ao longo da gestação, com exceção das gestantes imunodeprimidas. Se no primeiro exame solicitado detectar-se a presença de IgM positivo, deve-se solicitar imediatamente o teste de avidez de IgG. Anticorpos IgG com alta avidez indicam infecção antiga e excluem infecção aguda nos últimos 3 a 4 meses. Anticorpos com baixa avidez podem significar infecção aguda. SOROLOGIA PARA VÍRUS DA HEPATITE C Não se recomenda a pesquisa de anti-HCV de rotina no pré-natal devido aos baixos índices de detecção em gestantes e ao fato de ainda não existir imunoprofilaxia ou intervenção medicamentosa que possa prevenir a transmissão vertical da hepatite C. Deve-se realizar a sorologia nas gestantes com fatores de risco como infecção por HIV, uso de drogas ilícitas, antecedentes de transfusão ou transplante antes de 1993, mulheres submetidas à hemodiálise, mulheres com elevação de aminotransferases sem outra causa clínica evidente e profissionais de saúde com história de acidente com material biológico. SOROLOGIA PARA RUBÉOLA E PARA CITOMEGALOVÍRUS Não há recomendação do MS para a realização de rastreamento de rotina na gestação para essas infecções. RASTREAMENTO PARA ESTREPTOCOCO DO GRUPO B. A identificação de gestantes portadoras (vagina, reto, bexiga) de estreptococo do grupo B (EGB) ou Streptococcus agalactiae abre oportunidade para erradicação intraparto do EGB e diminuição do risco de sepse neonatal por essa bactéria. Desde 2002, nos Estados Unidos, o CDC passou a recomendar o rastrea-mento a todas as gestantes portadoras a partir da 35ª semana de gestação, ou antes, quando houver TP pré-termo. A coleta é feita por meio de swab na região vaginal e anal. O tratamento pré-natal só deve ser feito se houver BA por EGB. As mulheres portadoras do EGB na vagina e no reto somente devem ser tratadas durante o TP. RASTREAMENTO PARA DOENÇAS DA TIREOIDE Alguns autores sugerem que o rastreamento não é custo- efetivo e deve ser solicitado apenas em situações de risco, como diabetes, áreas com deficiência de iodo, história familiar ou pessoal de hipotireoidismo, abortos de repetição, obesidade, radiação prévia em cabeça ou pescoço. O diagnóstico de hipotireoidismo primário na gestação é feito por meio da TSH, quando os valores forem superiores a 2,5 mUI/mL no primeiro trimestre e de 3 mUI/mL ou mais no segundo e no terceiro trimestres. Se houver presença de TSH elevada, recomenda-se solicitar tiroxina (T 4) livre para determinar o grau de hipotireoidismo, e, se a T 4 livre for normal, sugere-se medir os anticorpos tireoperoxidase (TPO). RASTREAMENTO PARA DOENÇA FALCIFORME A DF é diagnosticada por meio da eletroforese de Hb, que identifica a doença e o traço falcêmico. O rastreamento universal da DF em gestantes sem anemia e sem etnia afrodescendente não está justificado, embora seja recomendado pelo MS do Brasil. EXAME BACTERIOSCÓPICO DE SECREÇÃO VAGINAL E CITOPATOLOGICO CERVICAL É recomendado que toda gestante, na primeira consulta de pré-natal, faça um exame a fresco de secreção vaginal para identificar vulvovaginites e alterações da flora vaginal. O tratamento da vaginose bacteriana (Gardnerella vaginalis) pode diminuir o risco de TP pré-termo. Também na primeira consulta, se a gestante não estiver em dia com seu calendário de prevenção de câncer de colo uterino, deve-se coletar um raspado cervical para citopatologia com espátula de Ayre. ULTRASSONOGRAFIA Recomenda-se pelo menos uma US no pré-natal, que deve ser solicitada no primeiro trimestre. Se realizada em torno da 12ª semana, além de auxiliar na identificação relativamente precisa da IGe, com isso, diminuir o risco de erroneamente considerar uma gestação como pré-termo @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 9 ou prolongada (pós-datismo), permite o rastreamento de aneuploidias e gestações gemelares. Em gestantes de baixo risco, não há indicação para solicitar USs repetidas. Avaliações ultrassonográficas de rotina para acompanhar o crescimento do feto ou avaliar o volume do líquido amniótico não devem ser feitas, pois além de aumentarem o custo da assistência pré-natal, não têm utilidade prática e com frequência geram angústia e apreensão no casal, além de risco significativo de induzir a equipe médica a intervenções desnecessárias. O ACOG refere que, nas pacientes de baixo risco, o médico não está obrigado a realizar US sem que haja indicação específica, mas que, caso o exame seja pedido pela paciente, é ra-zoável respeitar essa solicitação. Também não há indicação para realização de rotina de US Doppler ou de ecocardiografia fetal em gestantes com baixo risco para pré-eclâmpsia, para RCF e para cardiopatias fetais. VACINAÇÕES A vacinação nas mulheres em idade reprodutiva deve estar idealmente completa antes da gestação, para que a mãe e o feto usufruam da imunização. Os anticorpos da classe IgG atravessam a placenta e conferem proteção passiva à criança até aproximadamente os 15 meses de vida. Esses anticorpos também são transmitidos pelo leite materno. As vacinas indicadas na gestação são: − Vacina contra gripe A e sazonal – A vacinação contra gripe é segura em qualquer IG, e gestantes são consideradas grupo de risco para infecção respiratória grave, devendo ter preferência nos programas de vacinação; − Vacina contra hepatite B – O esquema completo é de três doses (0,1-6 meses), iniciando a partir do primeiro trimestre e podendo estender-se até após o parto; − Vacina contra difteria e tétano (dT) – O esquema de vacinação completo da dupla adulto é de três doses, devendo ser reforçada a cada intervalo de 5 anos. Se a mulher não tomou nenhuma dose dessa vacina antes de engravidar, é necessário tomar duas doses da dupla adulto, com intervalo de no mínimo 30 dias e complementar com a dTpa. Caso a mulher tenha tomado uma dose da dT antes da gestação, ela deverá reforçar o esquema com mais uma dose da dT após a 20ª semana. Se a dT tiver sido aplicada nos últimos 5 anos, não há necessidade de imunizar; − Vacina contra difteria, tétano e coqueluche (dTpa) – A vacina dTpa deve ser recomendada, não importa o intervalo de tempo da última dose de dT, pois é essa a vacina que vai proteger contra a coqueluche no RN. Para as mulheres que se preveniram com duas ou mais doses da dT, recomenda-se a dTpa administrada com apenas uma dose. Mulheres grávidas devem tomar uma dose da dTpa em cada gestação, independentemente de terem tomado anteriormente. O MS recomenda a dTpa entre a 27ª e a 36ª semana de gestação, período que gera maior proteção ao RN. A dose também pode ser administrada até, no máximo, 20 dias antes da DPP. As vacinas contra Pneumococcus, Neisseria meningitidis e Haemophilus influenzae e a vacina antirrábica podem ser aplicadas na gestação. As vacinas atenuadas (bactérias ou vírus enfraquecidos) apresentam risco teórico de contaminação do feto, sendo contraindicadas na gestação; são elas: bacilo Calmette- Guérin (BCG), tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola), varicela e febre amarela. A vacina contra febre amarela, apesar de contraindicada, pode ser administrada em gestantes quando o risco de contrair a doença for elevado. A vacina contra papilomavírus humano (HPV) é contraindicada na gestação devido à falta de estudos confirmando a sua segurança. As vacinas do tipo inativadas, como a vacina contra hepatite A e a vacina meningocócica conjugada, não apresentam riscos para a gestante e para o feto; porém, devem ser aplicadas preferencialmente fora do período gestacional. REPOSIÇÃO DE VITAMINAS Alguns suplementos com vitaminas utilizados no pré-natal podem levar à ingestão de quantidades excessivas com riscos de toxicidade, especialmente para o feto. Vitaminas com risco potencial para o feto são A, B6, C e D. Doses diárias de vitamina A entre 10.000 a 50.000 UI estão associadas a malformações semelhantes às produzidas pela isotretinoína. Não está indicada a dosagem rotineira de vitamina D em gestantes. Não são conhecidos os níveis séricos que indiquem com clareza uma deficiência dessa vitamina. Sua produção depende basicamente da exposição solar (radiação ultravioleta B [UVB]). A exposição adequada ao sol e a ingestão dietética não medicamentosa de doses não superiores a 5 µ g ao dia durante a gravidez são ideais para a saúde materna, fetal e infantil. REPOSIÇÃO DE IODO Uma deficiência significativa de iodo durante a gestação está associada com hipotireoidismo fetal, distúrbios neurológicos e aumento da mortalidade neonatal e infantil. As consequências da deficiência leve a moderada de iodo na gestação ainda são inconclusivas. A suplementação na gestação parece racional apenas nas situações de deficiência significativa. @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 10 Não há recomendação no Brasil para suplementação rotineira nas gestantes, uma vez que a carência de iodo é muito rara. A OMS recomenda que as gestantes tenham ingesta de iodo de 250 µ g diários. INGESTÃO DE POLIFENÓIS O termo polifenóis ou compostos fenólicos refere-se a um amplo e numeroso grupo de moléculas encontradas em hortaliças, frutas, cereais, chás, erva-mate, café, cacau, vinho, suco de frutas e soja. As evidências atuais confirmam que, se ingeridos dentro de quantidades habituais, os alimentos ricos nessa substância são seguros para a gestante e para o feto em qualquer etapa da gestação. SIFILIS A sífilis é uma infecção sistêmica causada pelo Treponema pallidum. A recomendação oficial do governo brasileiro determina que todas as gestantes sejam testadas no primeiro trimestre da gestação e também que nenhuma puérpera tenha alta hospitalar sem que se saiba o resultado do exame de rastreamento para sífilis. Para o Centers for Disease Control and Prevention (CDC),2 todas as gestantes devem ser testadas no início da gestação. Em populações de alto risco, as pacientes devem ser retestadas com 28 semanas de gestação e durante o parto. Gestantes com perdas fetais também devem ser testadas. Como se trata de uma doença que tem sua lesão primária indolor, deve-se estar atento durante o exame de pacientes de risco quando o diagnóstico de lesões vaginais não for realizado, já que a paciente não se queixa, contribuindo para a progressão e a disseminação e também aumentando o risco de contaminação por outras DSTs. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Considera-se sífilis adquirida recente quando a evolução for menor de 1 ano, e tardia (latente tardia e terciária), após esse período. O risco de transmissão congênita está diretamente relacionado ao estágio da doença e é extremamente alto nos primeiros 4 anos após a infecção da mãe. A sífilis congênita é considerada recente (diagnosticada até o segundo ano de vida) e tardia (diagnosticada após o segundo ano de vida). Manifestações clínicas da sífilis Estágio Manifestação clínica Sífilis primária Úlcera – Cancro, adenopatia Sífilis secundária Rash, adenopatia, hepatite, artrite, glomerulonefrite Sífilis latente Assintomática Sífilis terciária Cutânea – Lesão comatosa Cardiovascular – Aneurisma da aorta, insuficiência aórtica SNC – Tabes dorsalis, convulsão, demência, paresias, alterações psiquiátricas, pupilas de Argyll-Robertson DIAGNÓSTICO A escolha do método diagnóstico depende da fase da infecção materna. Entretanto, o rastreamento com VDRL (venereal disease research laboratory) ou teste rápido (TR) é obrigatório para todas as gestantesno primeiro e no terceiro trimestres da gestação. A identificação do treponema pode ser feita por exame de campo escuro, ou por imunofluorescência direta dos exsudatos da lesão. Estes podem ser utilizados no diagnóstico das lesões sifilíticas em atividade, como cancro duro, condiloma plano, sifílides e sífilis congênita precoce. O método de eleição é o exame de campo escuro (a coloração torna imóveis os treponemas cujo diagnóstico diferencial com os outros treponemas não pode ser realizado). SOROLOGIA − Reações não treponêmicas (testes reagínicos não específicos) – VDRL, reagina plasmática rápida (RPR). − Reações treponêmicas – Teste de imobilização do treponema (TPI, do inglês Treponema pallidum imobilization), teste de absorção fluorescente contra treponema (FTA-ABS, do inglês fluorescent treponemal antibody-absortion), hemaglutinação para Treponema pallidum (TPHA, do inglês Treponema pallidum haemagglutination), enzimaimunoensaio (Elisa), testes imunocromatográficos (TRs). − Testes rápidos (TRs) – São práticos e de fácil execução, com resultado em no máximo 30 minutos. Podem ser realizados em amostra de sangue total arterial ou venoso. Se há suspeita clínica de sífilis, são necessários dois testes diagnósticos. Solicita-se VDRL quantitativo como rastreamento. Caso seja positivo, é necessária a confirmação com um teste treponêmico. O FTA-ABS IgM pode fazer diagnóstico da sífilis primária incipiente, pois aparece precocemente, com o cancro duro. O VDRL é o teste mais frequentemente utilizado; torna-se positivo cerca de 30 a 50 dias após a inoculação. É utilizado em todos os casos, exceto na sífilis primária, @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 11 podendo ser realizado no soro ou líquido cerebrospinal (LCS). Resultados negativos não excluem o diagnóstico de sífilis primária, assim como falsos-positivos podem existir na vigência de doenças autoimunes (colagenoses), na fase aguda de viroses, cirrose hepática, leptospirose, mononucleose, na própria gestação, em outras infecções treponêmicas, em pacientes com hanseníase, na malária, entre outros. O VDRL começa a ter resultados positivos geralmente 1 ou 2 semanas após o aparecimento do cancro duro. Os títulos diminuem com tratamento adequado e podem desaparecer em 9 a 12 meses ou permanecer baixos (cicatriz imunológica). A avaliação do LCS (VDRL, FTA- ABS, celularidade, albuminas) deve ser realizada sempre que houver sinais e sintomas neurológicos ou oftálmicos, sífilis terciária, falha de tratamento, paciente anti-HIV (vírus da imunodeficiência humana [do inglês human immunodeficiency virus ]) positivo, VDRL de altos títulos e tratamento não penicilínico em sífilis tardia. Os testes treponêmicos detectam anticorpos específicos produzidos pela infecção pelo Treponema pallidum. São raros os casos falsos-positivos. A reatividade destes indica que o usuário teve contato com Treponema pallidum em alguma época de sua vida e desenvolveu anticorpos específicos. Na maioria das vezes, permanecem positivos mesmo após o tratamento. Entre as reações específicas ou treponêmicas, a mais empregada é o FTA-ABS, consti-tuída de um teste de imunofluorescência indireta que utiliza o Treponema pallidum como antígeno para avaliar a reação de anticorpos antitreponêmicos no soro do paciente, sendo reativo a partir do 15º dia da infecção. Esse teste é útil para exclusão de falso-positivo, não devendo ser utilizado para o seguimento, pois pode permanecer positivo por toda a vida, independentemente do tratamento.2 A fração de imunoglobulina (IgM) desse teste é de capital importância para o diagnóstico da sífilis congênita, afastando, assim, os falsos-positivos do recém-nascido (RN), pela passagem de anticorpos maternos ao compartimento fetal. Os TRs para sífilis fornecem resultados em 10 a 15 minutos e podem ser úteis no parto ou em locais onde não se dispõe do VDRL. O MS do Brasil recomenda seu uso em gestantes com sinais de DSTs, no parto quando o VDRL não está disponível, em parceiros de gestantes com TR positivo, no terceiro trimestre gestacional quando o primeiro VDRL foi negativo e quando não se dispõe do resultado no terceiro trimestre. TRATAMENTO O fármaco de escolha para tratamento da sífilis na gestação é a penicilina benzatina, único capaz de prevenir a transmissão vertical. Após a dose terapêutica inicial na doença recente, poderá surgir a reação febril de Jarisch-Herxheimer, com exacerbação das lesões cutâneas e involução espontânea em 12 a 48 horas. Essa reação não representa alergia, sendo que o tratamento deve ser mantido, e realiza-se o controle dos sintomas. Quando essa reação ocorre na segunda metade da gestação, há risco de TPP ou condição fetal não tranquilizadora. Nas gestantes alérgicas à penicilina, está recomendada a dessensibilização em ambiente hospitalar e uso da penicilina nas doses habituais. Na impossibilidade do uso da penicilina, as gestantes podem ser tratadas com estearato de eritromicina 500 mg VO de 6/6 horas por 15 dias; porém, o feto será considerado como não tratado. Esquemas de tratamento para sífilis na gestação Estágio da sífilis Tratamento padrão Opção de tratamento Observações Sífilis primária ou sífilis secundária e latente recente (até 1 ano de duração) Penicilina G benzatina 2,4 milhões UI, IM, dose única (1,2 milhão UI em cada glúteo) Ceftriaxona 1 g, IV ou IM, 1 ×/dia por 8-10 dias Não gestante – Doxiciclina 100 mg, VO, 2 ×/dia por 15 dias Sífilis latente tardia (mais de 1 ano de duração) ou latente com duração ignorada e sífilis terciária. Penicilina G benzatina 2,4 milhões UI, IM (1,2 milhão UI em cada glúteo), semanal por 3 semanas; dose total de 7,2 milhões UI. Ceftriaxona 1 g, IV ou IM, 1 ×/dia por 8-10 dias Não gestante – Doxiciclina 100 mg, VO, 2 ×/dia por 30 dias Neurossifilis Penicilina cristalina 18-24 milhões UI/dia, IV, administrada em doses de 3-4 milhões UI, de 4/4 h ou por infusão contínua, por 14 dias Ceftriaxona 2 g, IV ou IM, 1 ×/dia por 10-14 dias As gestantes com diagnóstico de sífilis devem ser avaliadas mensalmente, por meio do VDRL. Considera-se um novo tratamento se houver elevação de títulos dos testes não treponêmicos em duas diluições, devido à possibilidade de falha terapêutica ou reinfecção. @anab_rs | Ana Beatriz Rodrigues MARC 02 12 Ao término da gestação e em não gestantes, recomenda-se a repetição do VDRL quantitativo trimestralmente durante o primeiro ano e, se ainda houver reatividade em titulações decrescentes, deve-se manter o acompanhamento semestralmente até estabilizar. Após 1 ano, pode-se considerar a paciente curada na presença de título baixo e estável em duas oportunidades. O tratamento é considerado inadequado nas seguintes situações: − Quando realizado com qualquer medicamento que não a penicilina; − Quando incompleto, mesmo tendo sido feito com penicilina; − Se não for adequado para a fase clínica da doença; − Quando for realizado menos de 30 dias antes do parto; − Quando houver elevação dos títulos após o tratamento; − Quando os parceiros não forem tratados, forem tratados inadequadamente ou na ausência de informação sobre o tratamento destes; − Na ausência de identificação dos títulos do VDRL ou da queda dos títulos dos parceiros após tratamento. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA Martins-Costa, Sérgio. Rotinas em Obstetrícia. Disponível em: Minha Biblioteca, (7ª edição). Grupo A, 2017.
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