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Gestão da Biodiversidade Professor Doutor Julio Cesar da Silva AUTOR Prof. Dr. Julio Cesar da Silva Graduação em Ciências Biológicas pela Faculdade Integrado de Campo Mourão (2004); Especialista em Biotecnologia aplicada à Agroindústria pela Universidade Estadual de Maringá - UEM (2008); Mestre em Biologia Comparada - UEM (2011); Doutor em Biolo- gia Comparada - UEM (2016). Professor concursado de Biologia SEED/PR (desde 2012). Diretor Auxiliar (2016/2017) do Colégio Estadual Dr. Gastão Vidigal Ensino Fundamental, Médio e Profissionalizante - SEED/PR; Professor de Biologia para o ensino médio e curso pré-vestibular do Colégio Axia - Maringá (desde 2013); Professor de Biologia para o ensino médio e curso pré-vestibular do Curso e Colégio Dom Bosco - COC - Maringá (desde 2019); Professor de Genética Humana do curso de graduação em Psicologia do Centro Universitário Cidade Verde UniFCV - Maringá (2017). Atualmente desenvolve pesquisas na área de Bioprospecção e Caracterização Química de Compostos Bioativos com potencial biotecnológico e Mutagênese Ambiental. INFORMAÇÕES RELEVANTES: • Formação Acadêmica: Ciências Biológicas. • Níveis de Titulação: Especialista em Biotecnologia; Mestre em Biologia Compara- da; Doutor em Biologia Comparada. • Instituições Frequentadas: Faculdade Integrado de Campo Mourão; Universidade Estadual de Maringá - UEM; Centro Universitário Cidade Verde - UniFCV • Link do Currículo na Plataforma Lattes: http://lattes.cnpq.br/9527412369378136 APRESENTAÇÃO DO MATERIAL Olá, aluno(a). Nesta apostila vamos discutir os aspectos relacionados à gestão da biodiversidade no Brasil, contemplando sua caracterização, além das dimensões: biológica, política, legal e social que abrangem esse conceituado tema. Vamos ainda analisar o quadro institucional, internacional e nacional da Biodiversidade e os instrumentos de gestão disponíveis para organizar no âmbito dos possíveis recursos para as gerações futuras. Pensar em biodiver- sidade é propor que uma sociedade consciente não se desenvolve sem sustentabilidade. Para tal, abordaremos os seguintes temas: ● Na Unidade I, sobre o conceito e tipos de biodiversidade, seus aspectos legais, bem como os fatores que podem afetar o desenvolvimento sustentável desta. ● Já na Unidade II você irá saber mais sobre como ocorre uma gestão consciente dos recursos relacionados à biodiversidade, seu quadro político nacional e as instituições nacionais responsáveis por organizar as demandas relacionadas a tais aspectos. ● Na sequência, na Unidade III falaremos a respeito do conhecimento biológico como fundamento para gestão, conservação e monitoramento da biodiversidade Brasileira IN SITU e EX SITU. ● Em nossa Unidade IV vamos finalizar o conteúdo dessa disciplina com as abor- dagens acerca das estratégias e planejamento no gerenciamento e conservação da sustentabilidade em diferentes unidades conservação. SUMÁRIO UNIDADE I ...................................................................................................... 5 Introdução a Biodiversidade UNIDADE II ................................................................................................... 26 Gestão da Biodiversidade UNIDADE III .................................................................................................. 49 Biodiversidade Brasileira UNIDADE IV .................................................................................................. 67 Biodiversidade, Sustentabilidade e Conservação 5 Objetivos de Aprendizagem: ● Contextuar e contextualizar a Biodiversidade; ● Compreender a dinâmica de relações e tipos de Biodiversidade; ● Estabelecer os fatores que afetam a Biodiversidade; ● Acepções legais relacionadas à Biodiversidade. Plano de Estudo: ● Definição de Biodiversidade; ● Tipos de biodiversidade; ● Fatores que interferem na biodiversidade; ● Políticas nacionais para controle e manutenção da biodiversidade. UNIDADE I Introdução a Biodiversidade Professor Doutor Julio Cesar da Silva 6UNIDADE I Introdução a Biodiversidade INTRODUÇÃO Você já parou para pensar sobre Biodiversidade? O que ela representa? Como ela está inserida no nosso cotidiano? Qual o modo como ela nos afeta? O conceito de diversidade biológica esteve inicialmente associado ao número de espécies que habitavam em determinado espaço geográfico, sendo sinônimo de riqueza específica. Com o passar do tempo, a abundância dessas espécies no ambiente, a variação entre os organismos da mesma espécie, entre outros aspectos, foram somando-se ao con- ceito, alterando-o profundamente. Dessa forma, o conceito contemporâneo de diversidade biológica procura referir e integrar toda a variedade e variabilidade que encontramos em organismos vivos, nos seus diferentes níveis e os ambientes nos quais estão inseridos. Nesta unidade vamos discutir tais aspectos e compreender de forma clara como a Biodiversidade é importante para nós e como dependemos dela para a sobrevivência da atual geração e das gerações futuras. Estudar a Biodiversidade é estar preparado para compreender o seu lugar no planeta e as consequências de uma má relação humana com o meio, além dos aspectos sociais, socioeconômicos e legais envolvidos na manutenção, manejo e preservação da nossa Biodiversidade. 7UNIDADE I Introdução a Biodiversidade 1 DEFINIÇÃO DE BIODIVERSIDADE O termo biodiversidade se tornou conhecido, tendo, inclusive, se difundido para além do meio acadêmico. Atualmente, pode-se dizer que é um dos termos científicos mais conhecidos pelas pessoas em geral. Na verdade, mesmo entre os estudiosos do assunto, não existe um consenso do exato significado da palavra. Antes de discutir o significado do termo, vejamos qual foi a sua origem. Sabe-se que, em 1980, o biólogo norte-americano Thomas Lovejoy utilizava a expressão diversidade biológica, auxiliando na sua difusão no meio científico (FRANCO, 2013). Entretanto foi em 1985 que a palavra biodiversidade surgiu, criada por Walter G. Rosen, como a forma contraída da expressão utilizada por Raymond F. Dasmann e Thomas Lovejoy (CAMPOS, 2009). Para Dobson (1996 apud ROCHA, 2010; p. 36), a biodiversi- dade pode ser entendida como “a soma de todos os diferentes tipos de organismos que habitam uma região, tal como o planeta inteiro, o continente africano, a bacia amazônica ou nossos quintais”. Assim, essa definição deixa a entender que a diversidade biológica está relacionada somente ao número de espécies. Porém diversos autores incluem outros com- ponentes na definição de biodiversidade, além do número de espécies. Em suma, pode-se dizer que tais definições são mais complexas que a de Dobson (1996 apud ROCHA, 2010). Uma dessas definições foi utilizada por Kawasaki e Oliveira (2003; p. 48), sob a ótica de que biodiversidade significa: 8UNIDADE I Introdução a Biodiversidade a variedade de organismos considerada em todos os níveis, desde variações genéticas pertencentes à mesma espécie até as diversas séries de espécies, gêneros, famílias e outros níveis taxonômicos superiores. Inclui variedade de ecossistemas, que abrange tanto comunidades de organismos em um ou mais habitats quanto às condições físicas sob as quais elas vivem. No Brasil, a Convenção de Diversidade Biológica (CDB) foi promulgada pelo Decre- to Federal 2.519 de 1998. No Artigo 2 da CDB é apresentada a seguinte definição: diversidade biológica significa a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os ecossistemas terrestres, ma- rinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de ecossistemas (BRASIL, 1998). Essa é uma definição bastante complexa e apresenta a biodiversidade constituída por vários componentes, incluindo o número de espécies e a variabilidade genética, mesmo entre indivíduos da mesma espécie e de ecossistemas.A definição inclui, ainda, os complexos ecológicos, que podem ser entendidos como processos ecológicos (LEWINSOHN, 2001). 1.1 A Distribuição da Biodiversidade Lewinsohn e Prado (2005) estimaram que o número total de espécies catalogadas é de até aproximadamente 1,8 milhões. No que tange a distribuição do número de espécies por táxons, 263.800 a 279.400 são espécies de plantas e 1.279.300 a 1.359.400 são ani- mais. Dentre os animais, os insetos são a grande maioria, com cerca de 950.000 espécies descritas. Assim, apesar das pessoas se preocuparem principalmente com a conservação de grandes mamíferos e outras espécies carismáticas, os insetos constituem o principal componente da diversidade biológica global (PURVIS; HECTOR, 2000). Vale ainda res- saltar o ecletismo de funções e interações ecológicas desempenhadas por esse grupo. A biodiversidade não está distribuída homogeneamente pelo planeta. O número de espécies tende a aumentar em direção às menores latitudes. Entre os ambientes terrestres, as flo- restas tropicais apresentam a maior concentração de espécies, ao passo que, no mar, são os recifes de corais os pontos focais de diversidade biológica (PRIMACK; RODRIGUES, 2001). O fator apontado como a principal causa do aumento do número de espécies na direção dos trópicos é a incidência de radiação solar, maior nas menores latitudes. A inci- dência de radiação solar está relacionada com a produção primária, que seria maior nos trópicos (PRIMACK; RODRIGUES, 2001). Contudo existem regiões que estão localizadas em baixas latitudes, mas possuem baixa biodiversidade em comparação às florestas tro- picais. Isso decorre por influência de outros fatores, tais quais a pouca disponibilidade de água, como nos grandes desertos (BROWN; DAVIDSON, 1977). Fatores históricos também 9UNIDADE I Introdução a Biodiversidade são relevantes, pois áreas geologicamente mais antigas podem apresentar maior riqueza de espécies que áreas mais recentes (PRIMACK; RODRIGUES, 2001). Além de fatores naturais, logicamente, o histórico da colonização humana e a exploração dos recursos naturais exercem forte influência na distribuição geográfica da biodiversidade. Atualmente, a destruição e a fragmentação dos ecossistemas naturais têm sido as principais causas de extinção de espécies. Essas alterações modificam condições microclimáticas e/ou até mesmo macroclimáticas, levando à simplificação de ecossistemas, outro fator que afeta a biodiversidade. Ambientes mais heterogêneos geralmente possuem mais espécies que ambientes mais homogêneos (PIANKA, 1994). Áreas que possuem uma topografia complexa com rios, lagos e cavernas tendem a possuir mais espécies que áreas mais simplificadas, pois apresentam maior diversidade de habitats. Sobre a heterogeneidade gerada pelos seres vivos, cientistas têm observado que ambientes com a estrutura da vegetação mais complexa geralmente possuem mais espécies de formigas do que áreas com estrutura da vegetação mais simplificada (GOMES et al., 2013; MARTINS et al., 2011). Também já foi constatado que o número de cama- das da vegetação de uma floresta estratificada verticalmente influencia positivamente o número de espécies de aves (PERONI; HERNANDEZ, 2011). Cabe ainda mencionar que o tamanho do habitat e o seu nível de isolamento podem influenciar a sua biodiversidade. Ilhas oceânicas grandes e pouco isoladas geralmente possuem maior número de espécies que ilhas pequenas e muito isoladas (MACARTHUR; WILSON, 1963). Essa variação no número de espécies está relacionada com as taxas de extinção, maiores em ilhas pequenas, e a colonização ou recolonização das ilhas, que é mais provável de ocorrer nas ilhas grandes e menos isoladas. Assim como nas ilhas, o tamanho e o nível de isolamento dos fragmentos de florestas continentais podem afetar o número de espécies que neles habitam (ALMEIDA; GOMES; QUEIROZ, 2011; LAURANCE; VASCONCELOS, 2009). Como mencionado anteriormente, o conhecimento atual sobre o número de espécies existentes no nosso planeta é reduzido. Além disso, faltam informações sobre a distribuição geográfica das espécies. Muitos ecossistemas ainda são pouco estudados por estarem em áreas de difícil acesso. Faltam ainda pesquisadores para alguns grupos de organismos e os recursos financeiros para as pesquisas sobre biodiversidade são escassos na maioria dos países. A escassez de informação sobre a distribuição da diversidade biológica dificulta o trabalho dos profissionais dedicados à sua conservação, como os Gestores Ambientais, pois esse conhecimento é crucial na escolha de áreas prioritárias para a manutenção da biodiversidade. 10UNIDADE I Introdução a Biodiversidade SAIBA MAIS A genética da conservação é uma nova abordagem no estudo da biodiversidade e utiliza as análises genéticas moleculares para elucidar aspectos relevantes da biologia das espécies para fins de manejo e conservação. Dentre os vários campos da genética da conservação podemos destacar a detecção dos efeitos deletérios do endocruzamento, a perda da diversidade genética e, consequentemente, da capacidade de respostas a mudanças ambientais, a fragmentação das populações e redução do fluxo gênico, de- riva genética, os problemas enfrentados pelas populações em cativeiro e o sucesso da introdução de novos indivíduos nas populações naturais. Fonte: Frankham, Ballou e Briscoe (2002). REFLITA A atividade antrópica vem causando efeitos significativos na biodiversidade? Nossas ações cotidianas podem fazer com que tal aspecto seja reduzido? Por centenas de anos o homem vem agindo de forma inconsequente frente a seus recursos naturais. É hora de compreender e agir de forma a tornar o planeta sustentável para as futuras gerações. Fonte: O autor 11UNIDADE I Introdução a Biodiversidade 2 TIPOS DE BIODIVERSIDADE Para algumas pessoas, a diversidade biológica tem valor em si. Tais pessoas pos- suem admiração pela natureza, assim como pelas espécies que a compõem e acreditam que as espécies devem continuar livremente a sua evolução e, somente com base nessa percepção, contribuem para a preservação da biodiversidade. Por outro lado, muitas pes- soas percebem a natureza apenas como um recurso a ser explorado ou como um obstáculo. Essas só se convencem da necessidade de conservar a biodiversidade quando percebem que, com a perda das espécies, estarão, também, perdendo benefícios. A qualidade de vida das populações humanas e suas atividades econômicas dependem da biodiversidade e das relações entre seus atores, usufruindo, desta forma, dos chamados serviços ecossis- têmicos (ANDRADE; ROMEIRO, 2009). O homem cultiva um grande número de espécies de plantas e cria diversos animais para variados fins. Também retira diretamente dos ecossistemas animais e plantas que são utilizados em larga escala como alimento, medicamentos ou matéria-prima em geral. Somente no Brasil, dados indicam que, 153 espécies marinhas são pescadas e, quando consideramos todo o mundo, estima-se que pessoas capturem, aproximadamente, 200 milhões de toneladas de pescado por ano (MUSEU NACIONAL DO MAR, 2013). Além disso, muitas novas biotecnologias vêm sendo criadas para solucionar problemas da humanidade, inclusive o aumento da demanda de alimentos (RAMALHO; FURTINI, 2009). Outro exemplo de extrativismo é a retirada de madeira das florestas nati- 12UNIDADE I Introdução a Biodiversidade vas para ser utilizada como matéria-prima em diversos fins. Somente no Brasil, a produção primária florestal obtida da extração vegetal somou R$ 4,2 bilhões em 2012 (IBGE, 2013). A extração de madeira é ainda mais significativa, pois esses dados não incluem a extração ilegal de madeira. O número de pessoas que fazem uso de plantas medicinais também é bastante expressivo, pois cerca de 80% da população humana utiliza tal recurso e apro- ximadamente 2.000 espécies são utilizadas na Bacia Amazônica (SCUDELLER; VEIGA; ARAUJO-BORGES,2009). Além do mais, a biodiversidade da flora, principalmente nas florestas, favorece a regulação da oferta de água, pois colabora para amenizar os picos de vazão e para a perenidade dos cursos d’água. A vegetação cria condições para que ocorra uma maior infiltração da água no solo e, consequentemente, diminui o escoamento superficial e a rápida chegada da água das chuvas na calha dos rios. Assim, pode diminuir a ocorrência de enchentes, recarregar o lençol freático e permitir a perenidade de cursos d’água. Cabe ressaltar que alguns dos componentes da fauna do solo também podem contribuir para o aumento da infiltração da água no solo. Foi constatado, por exemplo, o aumento da infiltração da água no solo como resultado das atividades de formigas que constroem seus ninhos no solo, formando túneis e câmaras (ELDRIDGE, 1993; LOBRY DE BRUYN; CONACHER, 1994). A vegetação tam- bém pode ajudar a manter ou melhorar a qualidade da água, pois diminui a erosão do solo e o posterior transporte de partículas para os rios e lagos, o que prejudica a qualidade da água, além de causar o assoreamento dos cursos d’água. Ao diminuir a erosão, a vege- tação ainda contribui para evitar a perda de solo e de nutrientes, mantendo a capacidade produtiva do solo. A biota também participa da própria formação do solo, agindo em conjunto com o intemperismo e da regulação de gases, podendo se destacar a produção de oxigênio pelos organismos fotossintetizantes. Muitos organismos, incluindo animais, bactérias e fungos, participam da decomposição de matéria orgânica e da ciclagem de nutrientes no solo, o que é um processo ecológico essencial para os ecossistemas naturais e também é impor- tante para os agroecossistemas. Outro processo importante para a agricultura é a fixação biológica de nitrogênio (FBN), que é vital para a vida no planeta. A FBN é realizada por bac- térias que possuem a enzima nitrogenase e que transformam o nitrogênio atmosférico em uma forma que as plantas podem metabolizar. A polinização é outro processo que possui elevada importância ecológica e econômica, através da qual o pólen, advindo da antera, é levado até a parte feminina da flor, mais precisamente o estigma. Esse processo pode ser realizado por animais (mamíferos, aves e artrópodes), inclusive, existe um grande número 13UNIDADE I Introdução a Biodiversidade de espécies de plantas que somente são polinizadas por animais. Entre essas espécies estão diversas plantas cultivadas. Gallai et al. (2009) estimaram em 153 bilhões de euros/ ano o valor dos serviços dos insetos polinizadores para a agricultura. A regulação climática realizada pelas florestas também pode ser considerada como um benefício da biodiversidade. A floresta amazônica é um bom exemplo, pois, através da transpiração das plantas, propicia uma expressiva parte da precipitação da região onde ocorre. Além disso, o desmatamento da floresta amazônica pode alterar e/ou influenciar o clima de outras regiões do Brasil (FEARNSIDE, 2006). Outra importância está na decomposição dos resíduos lançados por atividades hu- manas no ambiente, dentre eles uma série de poluentes, incluindo pesticidas, fertilizantes, efluentes industriais e esgoto doméstico. Parte desses poluentes é degradada por organis- mos vivos, especialmente bactérias, protistas e fungos que decompõem estes resíduos, melhorando o ambiente. Na agricultura, bactérias, insetos e outros organismos são utiliza- dos no controle de pragas. Isso permite que grandes quantidades de inseticidas deixem de ser utilizados, contribuindo para a manutenção da qualidade dos recursos naturais. A biodiversidade também é útil na prática de exercícios físicos e para incentivar o turismo. Existem pessoas que gostam de realizar atividades em meio à natureza. O número de pessoas interessadas no ecoturismo tem, inclusive, aumentado no Brasil. Dados do ICMBio indicam que, nas unidades de conservação federais, o número de visitantes cresceu 52% em cinco anos, sendo superior a 4,8 milhões de pessoas em 2011 (ICMBIO, 2012). Além disso, diversas culturas praticam rituais religiosos em contato com a biodiversidade, assim, possuem também importância religiosa. Por fim, a diversidade biológica ainda serve de inspiração para a arte, visto que o ser humano criou inúmeras obras de arte inspiradas nos seres vivos. Desse modo, são inúmeros os benefícios proporcionados pela biodiversidade. Todavia, muitos destes não são percebidos pelas pessoas em geral. Cabe aos profissio- nais engajados na conservação da diversidade biológica auxiliar na disseminação dessas informações, que podem ser utilizadas inclusive em atividades de educação ambiental. 14UNIDADE I Introdução a Biodiversidade 3 FATORES QUE INTERFEREM NA BIODIVERSIDADE O particionamento da diversidade total de espécies em componentes aditivos entre e dentro de comunidades permite sua medição em diferentes níveis de organização e em diferentes ambientes. Também auxilia na compreensão da dimensão ou de escalas críticas para determinar a composição e a persistência de espécies (CHANDY; GIBSON; ROBERTSON, 2006). Segundo Whittaker (1972), a diversidade pode ser expressa em quatro níveis: diversidade 16 de genes, de espécies, de povoamento e de ecossistemas e pode ser considerada pelo número (riqueza) de diferentes categorias biológicas e pela abundância relativa (equitatividade) dessas categorias. Também pode ser quantificada em diversidade alfa (α), beta (β) e gama (γ), para descrever a diversidade em diferentes escalas, isto é, entre parcelas, dentro de parcelas e no nível de paisagem, respectivamente (WHITTAKER, 1972). A influência da escala sobre a detecção de padrões de diversidade biológica tem motivado uma série de estudos (LEGENDRE; BORCARD; PERES-NETO, 2005; MAGURRAN, 2004; ROSENZWEIG, 1995; WHITTAKER, 1956). A diversidade alfa resulta da contagem do número de espécies presentes numa comunidade ou em trechos na vegetação (WHITTAKER, 1960) ou de índices como o de Shannon–Wiener ou Simpson (LEGENDRE; BORCARD; PERES-NETO, 2005). É o componente da diversidade regional que pode ser atribuído ao número médio de espécies de uma amostra homogênea. Isso é medido como um número de espécies presente no local (riqueza de espécies) ou por outra 15UNIDADE I Introdução a Biodiversidade função (índice) que leve em consideração tanto a riqueza quanto a frequência relativa das espécies (LEGENDRE; BORCARD; PERES-NETO, 2005). Um aumento no tamanho da unidade amostral referente aos limites da área de estudo resultará em um aumento na diversidade alfa, particularmente quando medidas ponderadas pela riqueza de espécies são usadas para descrevê-las (WHITTAKER, 1972). Pode ser calculada como a média ponderada, tal como a somatória do número de espécies numa amostra, multiplicada pelo número de indivíduos de todas as espécies, em que a pon- deração é o tamanho de amostras relativas medidas em números de indivíduos (VEECH; CRIST, 2007). A maioria dos métodos propostos para quantificar a biodiversidade de espé- cies refere-se à diversidade dentro das comunidades, ou seja, a alfa. A diversidade beta é também conhecida como o grau de substituição ou mudança na composição de espécies ao longo de gradientes ambientais, uma medida da diferença de composição das espécies ou entre dois ou mais conjuntos locais ou entre conjuntos locais e regionais (KOLEFF; GASTON; LENNON, 2003; WHITTAKER, 1972). Magurran (2004) definiu diversidade beta como a quantificação da dissimilaridade entre hábitats, sendo também utilizada como uma medida de heterogeneidade ambiental (LEGENDRE; BORCARD; PERES-NETO, 2005). Se a variação na composição é aleatória e acompanhada de processos bióticos que geram autocorrelação espacial, um gradiente em composição de espécies pode apa- recer e a diversidade beta pode ser interpretada como taxa de mudança na composição de espécies ao longo de um gradiente.Se a diferenciação entre pontos é devido a fatores ambientais, a diversidade beta poderia ser analisada com o objetivo de hipotetizar variáveis explanatórias (LEGENDRE; BORCARD; PERES-NETO, 2005). A heterogeneidade am- biental é um fator frequentemente associado à diversidade beta (BALVANERA; AGUIRRE, 2006; LEGENDRE; BORCARD; PERES-NETO, 2005; WHITTAKER, 1972). Em ambientes heterogêneos, as espécies de nichos distintos apresentam dife- renças em seus padrões de distribuição espacial. Fatores geográficos, como a distância entre locais, estão associados à diversidade beta e ainda foram pouco estudados. Várias medidas de diversidade beta têm sido propostas para avaliar diferentes comunidades ao longo de gradientes ambientais. A diversidade beta é tão importante quanto a diversidade alfa para conservação, uma vez que a substituição de espécies exerce grande influência sobre a diversidade em maior escala. A alta diversidade alfa das florestas tropicais tem sido amplamente documentada, ao contrário da diversidade beta, que tem sido pouco estudada (MAGURRAN, 2004). 16UNIDADE I Introdução a Biodiversidade 4 POLÍTICAS NACIONAIS PARA CONTROLE E MANUTENÇÃO DA BIODIVERSIDADE O Decreto nº 4.339, de 22 de agosto de 2002, institui os princípios e as diretrizes para a implementação da Política Nacional da Biodiversidade (PNB). Os seus princípios e diretrizes derivam diretamente da CDB, da Declaração do Rio e da Constituição Nacional, considerando o desenvolvimento de estratégias, políticas, planos e programas nacionais para a biodiversidade. A PNBio tem como objetivo geral a promoção, de forma integrada, da conservação da biodiversidade e da utilização sustentável de seus componentes, com a repartição justa e equitativa dos benefícios derivados da utilização dos recursos genéticos, de componentes do patrimônio genético e dos conhecimentos tradicionais associados a esses recursos. Como um anexo do Decreto nº 4.339, encontra-se o texto integral da PNB, em que são apresentados os seus princípios e diretrizes, além de dispor sobre seus sete com- ponentes e respectivos objetivos: 1) conhecimento da biodiversidade; 2) conservação da biodiversidade; 3) utilização sustentável dos componentes da biodiversidade; 4) monitora- mento, avaliação, prevenção e mitigação de impactos sobre a biodiversidade; 5) acesso aos recursos genéticos e aos conhecimentos tradicionais associados e repartição de benefícios; 6) educação, sensibilização pública, informação e divulgação sobre biodiversidade; 7) for- talecimento jurídico e institucional para a gestão da biodiversidade. No tocante à pesquisa para a conservação da biodiversidade, cumpre comentar os dois primeiros componentes, que tratam, respectivamente, do conhecimento e da conservação da biodiversidade. O 17UNIDADE I Introdução a Biodiversidade primeiro componente congrega diretrizes voltadas à geração, sistematização e disponibili- zação de informações que permitam conhecer os componentes da biodiversidade do país e que apoiem a gestão da biodiversidade, além de diretrizes relacionadas à produção de inventários, à realização de pesquisas ecológicas e à realização de pesquisas sobre co- nhecimentos tradicionais, que podemos destacar: (i) promover pesquisas para identificar as características ecológicas, a diversidade genética e a viabilidade populacional das espécies endêmicas e ameaçadas no Brasil, a fim de subsidiar ações de recuperação, regeneração, utilização sustentável e conservação destas; (ii) fortalecer e expandir pesquisas ecoló- gicas de longa duração, preferencialmente em unidades de conservação; (iii) promover e apoiar pesquisa sobre a biologia da conservação para os diferentes ecossistemas do país e particularmente para os componentes da biodiversidade ameaçados; (iv) apoiar e estimular a pesquisa sobre o saber tradicional (conhecimentos, práticas e inovações) de povos indígenas, quilombolas e outras comunidades locais, assegurando a sua integridade sociocultural, a posse e o usufruto de suas terras. E agora a pergunta fundamental: quem executa/executará as pesquisas citadas no contexto institucional existente para a conser- vação da biodiversidade brasileira? No segundo componente encontram-se as diretrizes destinadas à conservação in situ e ex situ da variabilidade genética de ecossistemas e de espécies, particularmente da- quelas ameaçadas ou com potencial econômico, bem como diretrizes para implementação de instrumentos econômicos e tecnológicos em prol da conservação da biodiversidade. Nesse componente, destacam-se os objetivos a seguir: (i) planejar, promover, implantar e consolidar corredores ecológicos e outras formas de conectividade de paisagens, como forma de planejamento e gerenciamento regional da biodiversidade, incluindo compati- bilização e integração das reservas legais, áreas de preservação permanentes e outras áreas protegidas; (ii) promover a criação de UC de proteção integral e de uso sustentável, levando-se em consideração a representatividade, conectividade e complementaridade da unidade para o Sistema Nacional de Unidades de Conservação; (iii) criar, identificar e estabelecer iniciativas, programas e projetos de conservação e recuperação de espécies ameaçadas, endêmicas ou insuficientemente conhecidas; (iv) desenvolver, promover e apoiar estudos e estabelecer metodologias para conservação e manutenção dos bancos de germoplasma das espécies nativas e exóticas de interesse científico e comercial. Isso traz à tona novamente a pergunta: quem executa/executará as ações de inter- venção mencionadas anteriormente no contexto institucional existente para a conservação da biodiversidade brasileira? Como se vê, a Política Nacional de Biodiversidade é bem 18UNIDADE I Introdução a Biodiversidade abrangente e detalhada, chegando a ser redundante de certo modo. O importante, porém, é reconhecer que essa política estabelece as prioridades nacionais em relação ao tema; além disso, ao organizar a PNBio, o legislador deixou evidente a responsabilidade partilhada entre governo, sociedade civil e iniciativa privada em relação à conservação, uso susten- tável e repartição de benefícios. No entanto, a estrutura de interação entre as instituições (já existentes e a serem criadas, se for o caso) e a sociedade não foi abordada – trata-se das “regras do jogo”, que só serão estabelecidas com a regulamentação da PNBio. A não regulamentação da PNBio não implica na não existência de instituições atuando nesse tema; muito pelo contrário: o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA), instituído pela Lei nº 6.938 de 31/08/81 e regulamentado pelo Decreto nº 99.274 de 06/06/90, é cons- tituído por órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e pelas Fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental, que inclui a biodiversidade. Porém só com a regulamentação da PNBio é que se estabelecerá mais claramente o papel de cada instituição, em que e no que ela poderá atuar, ponto fundamental para tirar da informalidade projetos já desenvolvidos por ONGs e Governos Estaduais, por exemplo, que já atuam há décadas na conservação da biodiversidade. 19UNIDADE I Introdução a Biodiversidade 5 AS CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS DA PERDA DE BIODIVERSIDADE A biodiversidade pode ser vista como um valioso recurso global de grande impor- tância para assegurar o que os cientistas denominam de “a teia da vida”. Devido às perdas nessa área, e com a situação agravada pelo nível crescente de extinções, é evidente que uma parcela significativa da diversidade da vida na Terra pode, perfeitamente, desaparecer dentro de poucas décadas. É também claro para os cientistas que essa perda pode trazer sérios impactos negativos para a sociedade (BRADY, 1997). As implicações econômicas são óbvias. Estudiosos da área ambiental, bem como aqueles que definem políticasam- bientais, estabeleceram um sólido elo entre desenvolvimento econômico e conservação dos recursos biológicos (BRADY, 1997; WILSON, 1997). Um dos problemas centrais dos habitantes dos trópicos é o da sobrevivência – uma questão basicamente biológica. As atitudes dessas populações para conseguirem se alimentar prejudica o habitat local através de desmatamentos, deterioração do solo e outras formas de agressão. Wilson (1997) defende que esse problema pode ser solucionado par- cialmente ao se utilizar a própria diversidade biológica como fonte de riqueza econômica. Muitas são as possibilidades de uso desse recurso. Essa diversidade é fonte potencial de alimentos, novos remédios, fibras e substitutos do petróleo. Nesse caso, a lógica é simples e linear. A diversidade precisa existir para ser explorada racionalmente em benefício da humanidade, de modo geral, e dos habitantes dos trópicos em particular. 20UNIDADE I Introdução a Biodiversidade São muitas as evidências das perdas de diversidade biológica no planeta. Norman Myers (1997) – biólogo tropical, consultor em Meio Ambiente e Desenvolvimento –, citando vários autores afirma que, durante o período de maior concentração de vida na Terra (os últimos 600 milhões de anos), a taxa natural de extinção tem sido da ordem de uma espécie por ano aproximadamente. Avaliações dessa natureza são frequentemente questionadas como sendo exage- radas e alarmistas. Entretanto alertas como esses talvez devam ser levados mais a sério, mesmo quando alicerçados em informações incompletas. A incerteza científica – quando os riscos são elevados – não deve ser usada como argumento para a inação. Observa-se que muitos desses sistemas indicam sinais de stress e mais recentemente, outros já apre- sentam ameaças reais de extinção. A ênfase na importância desses sistemas biológicos, ora ameaçados, é por demais plausível devido ao fato de que esses sistemas apoiam a vida no planeta. Outro aspecto não menos importante é que nos episódios ocorridos no passado, que redundaram em grandes extinções, a vida das plantas não foi seriamente ameaçada. Mesmo na extinção de espécies mais enfatizada, acontecida há cerca de 65 milhões de anos, quando os dinossauros foram aniquilados juntamente com 20% da vida marinha, a maioria das plantas sobreviveu, embora grande parte da vida animal fosse dizimada. Essa extinção em massa foi causada pela colisão de um grande meteorito no planeta, assim acredita parcela significativa da comunidade científica. Agora, pela primeira vez, a diversidade das plantas também está diminuindo e isso se constitui em um dado novo para a problemática das perdas da biodiversidade. No passado, mesmo tendo havido extinções em massa no mundo animal, as plantas terrestres sobreviveram com perdas relativamente pequenas e o surgimento de novas espécies – tan- to vegetais como animais – pôde continuar acontecendo devido às condições ambientais proporcionadas pelo mundo vegetal, que forneceu uma base de recursos, em que esses processos evolucionários puderam ocorrer (MYERS, 1997). Estima-se que o Homo Sapiens tenha surgido há cerca de 200 mil anos. As ati- vidades agrícolas fixas, entretanto, só tiveram início há dez mil anos, enquanto que as atividades industriais se iniciaram há 250 anos. A perda da biodiversidade causada apenas pela atuação humana desde a revolução industrial situa-se em torno de 10% a 20%. Caso essa tendência não mude, por volta do próximo século as perdas terão alcançado 50%. O mundo encontra-se, então, diante de um período de “extinção em massa”. 21UNIDADE I Introdução a Biodiversidade Mesmo com os avanços da engenharia genética, o assunto assume urgência, pois a maioria as perdas de diversidade biológica, para não citar os serviços ecológicos perdidos, quase sempre estão muito além da capacidade humana de recuperá-las (CONWAY, 1997). Atualmente, a perda da biodiversidade constitui o mais grave perigo com o qual se defronta a humanidade (EHRLICH; EHRLICH, 1992). Dentre os grandes ecossistemas – celeiros de vida –, as florestas tropicais são centros de enorme diversidade. Raven (1997) salienta que, sendo o assunto biodiversidade, as florestas tropicais ocupam o principal lugar. Nesse trabalho, nossa atenção é direcionada para a biodiversidade existente nas florestas tropicais, por quatro razões. Primeiramente, é nesses habitats que, apesar de cobrirem apenas 7% da superfície terrestre, estão contidas mais de 50% das espécies da biota mundial. A segunda razão deve-se ao fato de que essas são florestas que estão sendo des- truídas implacavelmente. Estima-se que mais da metade das florestas tropicais já desapa- receu. A continuar no mesmo ritmo, elas provavelmente desaparecerão dentro do próximo século, sendo incluídas nessa perda centenas de milhares de espécies, que seriam extintas com resultados imprevisíveis (WILSON, 1997). O terceiro motivo prende-se à seguinte constatação: apesar de sua extraordinária riqueza biológica, as florestas se enquadram en- tre os mais frágeis dos habitats (WILSON, 1997). Ao contrário do que comumente se pensa, os solos das florestas tropicais são muito pobres. Quase 70% de sua área é constituída de terra tropical, vermelha e amarela, que são tipicamente ácidas e pobres em nutrientes. Um outro dado é que apenas 0,1% dos nutrientes atinge além de cinco centímetros abaixo da superfície do solo (NRC, 1982). A regeneração desses habitats é também restringida pela fragilidade de suas sementes, compostas em sua maioria de espécies lenhosas. Portanto, pode demandar séculos o processo de recuperação de uma floresta. A quarta e última razão é que no Brasil se encontra a maior floresta tropical do mundo. Sendo assim, somos, primordialmente, responsáveis pelos seus recursos, pela sua biodiversidade e pela preservação dos serviços ambientais fornecidos pela floresta. 5.1 Causas da Diminuição da Biodiversidade Analisemos agora as causas dos desmatamentos e consequentemente das perdas da biodiversidade. É essa devastação em ampla escala a principal causa da extinção das espécies (MYERS, 1997). 22UNIDADE I Introdução a Biodiversidade A premissa é de que a destruição das florestas tropicais se deve, principalmente, ao crescimento demográfico e a pobreza do meio rural. Há autores, entretanto, que criticam essa visão afirmando que as reais causas dos desflorestamentos tropicais são os grandes empreendimentos comerciais, ligados às madeireiras, que estão sendo efetuados nos países tropicais. Em estudo mais recente, a FAO (1995) faz uma diferenciação entre causas subja- centes dos desmatamentos em diferentes regiões tropicais do mundo. Na África, a pressão da população rural através das atividades de subsistência, pastagens e extração de ma- deira, tanto para ser usada como fonte de energia quanto como material de construção, é a causa primária das mudanças ocorridas nas áreas florestais. Já a América Latina parece ter mais peso nesse processo, por meio de projetos de grande escala para criação de gado e planos orientados para o desenvolvimento de regiões desabitadas. A Ásia, por sua vez, apresenta como causas principais tanto a pressão populacional – através da pobreza rural – quanto grandes projetos voltados para o aumento da produção de alimentos. Os motivos dos desmatamentos, entretanto, são complexos e não comportam respostas isoladas. Burley (1997) enfatiza que economias decadentes e pressões dos credores externos obrigam muitos países tropicais a, literalmente, dizimar suas florestas e outras riquezas biológicas, em vez de tratá-los como recursos renováveis. Em todas as regiões, a taxa de reposição é bem menor do que a taxa de exploração. A premência em satisfazer necessidades básicas de suas populações e melhorar as condições sociais, simplesmente, tornam essas economias sem alternativas a curto prazo. Ehrenfeld (1997) põe a questão nos seguintes termos: o atualmodelo de desenvol- vimento tecnológico, o consumismo, o tamanho crescente dos empreendimentos governa- mentais, industriais e agrícolas e o crescimento das populações humanas são responsáveis pela maioria das perdas da diversidade biológica. Outro fator que contribuiu para a perda da diversidade biológica foi que, ao longo deste século, a agricultura mundial se transformou drasticamente, passando de seu relativo isolamento para uma economia global de trocas. Houve uma tendência para as regiões diminuírem seu leque de espécies cultivados crescendo a especialização, evidentemente motivada pelos pressupostos econômicos das vantagens comparativas. A destruição desses habitats apresenta componentes econômicos e sociais que estão inseridos nas realidades econômicas e sociais enfrentadas pelos países menos desenvolvidos. Destacam-se, então, como principais causas dos desmatamentos: 23UNIDADE I Introdução a Biodiversidade ● crescimento populacional e expansão de suas atividades, uma vez que a pres- são de uma população crescente acarreta a necessidade de terra adicional para plantio; ● padrões de propriedade da terra – alto grau de concentração fundiária – que forçam os lavradores sem-terra para florestas e terras marginais; ● aumento dos campos para pastagem do gado de corte – produção pecuária; ● derrubada de árvores para fins comerciais – tanto para consumo interno quanto para exportação – em uma escala que supera em muito a capacidade de rege- neração das florestas. 24UNIDADE I Introdução a Biodiversidade CONSIDERAÇÕES FINAIS Nesta unidade buscamos compreender o conceito de biodiversidade e seus as- pectos sociais, socioeconômicos e legais. Vimos ainda como ela está envolvida em nosso cotidiano e quais as estratégias para sua conservação e principalmente manutenção dos seus recursos para as gerações futuras. Quando abordamos sobre o Particionamento da Biodiversidade, focamos ainda mais nas suas etapas de formação e na sua estrutura em diferentes ambientes. Tais aspectos, por sua vez, nos levam a compreensão da sua com- plexidade. Diante de tantos dados apresentados, temos a nítida sensação de que falar sobre biodiversidade é estabelecer uma relação íntima sobre o nosso papel enquanto gestor de tais recursos, sejam eles relacionados à vida animal ou vegetal. Esta unidade teve como objetivo trazer para a nossa realidade tais discussões e, ainda, evidenciar os motivos pelos quais estamos comprometendo tais recursos, além de como podemos agir de forma cons- ciente para tornarmos o meio sustentável para as futuras gerações. 25UNIDADE I Introdução a Biodiversidade MATERIAL COMPLEMENTAR VÍDEO Curta metragem: Lagoa do Peixe: Homem x Meio Ambiente Disponível no link: https://youtu.be/u86wtcmR8N Resumo: O Parque Nacional da Lagoa do Peixe foi criado em 1986. Anterior a sua criação, habitantes locais sobreviviam da pesca do camarão, em suas inúmeras lagoas, e da pesca, em sua área litorânea do Oceano Atlântico. Conciliar homem e meio ambiente é o problema do Parque, que o filme quer mostrar. Ficha técnica: Diretor: Marcelo de Paula (diretor); Carla Mendes (produtora); 23 minutos e 45 segundos de duração. LIVRO Título: Conhecendo a Biodiversidade Link: https://ppbio.inpa.gov.br/sites/default/files/conhecendo_a_ biodiversidade_livro.pdf Autores: Ariane Luna Peixoto, José Roberto Pujol luz e Marcia aparecida de Brito Sinopse: O livro procura contribuir para que o conhecimento sobre a biodiversidade brasileira atinja mais pessoas, sendo resultado de um projeto intelectual de cientistas e equipes do Programa de Pesquisa em Biodiversidade (PPBio) e da Rede Temática de Pes- quisa em Modelagem Ambiental da Amazônia (Geoma). Este é um livro sobre o Brasil, que aborda experiências pretéritas e atuais em áreas dos seis biomas – Pampa, Mata Atlântica, Cerrado, Pantanal, Caatinga e Amazônia –, sua biodiversidade e as transformações naturais ou provocadas pela ação humana na paisagem; também sobre espaços do território brasileiro que ganharam novas configu- rações através dos séculos de ocupação humana. https://youtu.be/u86wtcmR8Nw 26 Objetivos de Aprendizagem: ● Conceito de Gestão; ● Compreender como a CDB estabelece as relações entre gestão e Biodiversidade; ● Conceituar o quadro político nacional da Biodiversidade. Plano de Estudo: ● Definição de Gestão Ambiental; ● Entendendo a CDB; ● Gestão da Biodiversidade no Brasil: PRONABIO, PNB, FUNBIO, PROBIO. UNIDADE II Gestão da Biodiversidade Professor Doutor Julio Cesar da Silva 27UNIDADE II Gestão da Biodiversidade INTRODUÇÃO Os ecossistemas são a base para todas as formas de vida e seus serviços são imprescindíveis para toda a humanidade. Contudo a diversidade biológica do nosso mundo está desaparecendo a um ritmo frenético. Se continuarmos a destruir o meio ambiente, eliminaremos não apenas a base da nossa existência no futuro, mas também da nossa economia. É fundamental que todos os atores unam forças e combinam seus esforços para combater a perda global da biodiversidade. Há uma necessidade urgente de cooperação nas esferas internacional e nacional. Com os esforços concertados da política, da ciência, dos cidadãos e dos sistemas econômicos, podemos realizar progressos nesse sentido. A economia e a ecologia não são adversárias, mas, sim, interdependentes: são duas faces da mesma moeda. Portanto, é de fundamental importância a compreensão de como podemos gerir nossa biodiversidade, os veículos legais instituídos bem como os órgãos envolvidos nesse processo. Nesta unidade vamos aprender um pouco mais sobre gestão sustentável dos recur- sos ambientais e de que forma podemos praticá-la no nosso dia a dia. 28UNIDADE II Gestão da Biodiversidade 1 DEFINIÇÃO DE GESTÃO AMBIENTAL A Gestão Ambiental é um conjunto de ferramentas utilizadas na administração de atividades econômicas e sociais, de forma a utilizar de maneira racional os recursos natu- rais, renováveis ou não. Ela deve visar o uso de práticas que garantam a conservação e a preservação da biodiversidade, assim como a reciclagem das matérias-primas e a redução do impacto ambiental das atividades humanas sobre os recursos naturais. Entre as ferramentas utilizadas na Gestão Ambiental, podemos destacar: ● técnicas para a recuperação de áreas degradadas; ● o estudo de riscos e impactos ambientais para a avaliação de novos empreen- dimentos ou ampliação de atividades produtivas. A Gestão Ambiental, quando bem aplicada, permite a redução de custos diretos pela diminuição do desperdício de matérias-primas e de recursos cada vez mais escassos e mais dispendiosos, como água e energia, e de custos indiretos representados por san- ções e indenizações relacionadas a danos ao meio ambiente ou à saúde de funcionários e da população de comunidades que tenham proximidade geográfica com as unidades de produção da empresa. A gestão socioambiental é o caminho para as organizações que decidiram assumir responsabilidade social e adotar as melhores práticas para tornar mais sustentáveis seus processos produtivos. As crescentes restrições dos mercados exigentes e as aparentes ameaças da legislação ambiental podem ser fonte de maior competitividade, de inova- ção, de implantação de novas técnicas de gestão e melhoria de processos, de produtos 29UNIDADE II Gestão da Biodiversidade e serviços. Essa obra trata de como é possível conciliar sustentabilidade econômica com sustentabilidade social e ambiental. Para compreendermos melhor qual o real significado desse termo, temos que entender os conceitos de Gestão e de Ambiente. Entendemos gestão como sendo o ato ou efeito de gerir, administrar envolvendo os processos de planejar, organizar, liderar e controlar. Podemos dizer ainda que administrar ou gerir um negócio está ligado ao ato de observar, fiscalizar e agir sobre o que está sendo feito, para que se atinjam os objetivos propostos e desejados em que existe determinado objetoou que ocorre determinada ação. Porém o termo aplica-se a muitos campos de trabalho, em nosso caso, podemos dizer que se refere a todo meio ambiente, aos aspectos naturais, incluindo a luz, o ar, a água, o solo ou os seres vivos e suas inter-relações. Sendo assim, podemos entender que gestão ambiental é um conjunto de políticas, programas e práticas administrativas e operacionais que levam em conta a saúde, a segu- rança das pessoas e a proteção ao meio ambiente, através da eliminação ou minimização de impactos ambientais decorrentes do planejamento, implantação, operação, ampliação, realocação ou desativação de empreendimentos ou atividades, incluindo-se todas as fases de produção de um produto. 1.1 Fundamentos Básicos da Gestão Ambiental Os fundamentos da administração ambiental são a base, ou seja, os motivos que levam uma empresa a adotar práticas ambientais corretas. Esses motivos podem ser ideo- lógicos, administrativos, comerciais, legais, entre outros. A seguir constam alguns motivos que levam as empresas a pensarem em gestão ambiental consciente: ● matérias-primas escassas e caras; ● crescimento da população nas grandes regiões metropolitanas; ● legislação ambiental rígida; ● a fiscalização por parte da comunidade local; ● exigência dos clientes e investidores. Por sua comprovada relevância para a sociedade, a Educação Ambiental tornou-se Lei em abril de 1999, a chamada “Lei da Educação Ambiental” (Lei n° 9.795), com o objetivo de levar a conscientização para as escolas e universidades, a fim de construir um pensa- mento saudável nas novas gerações. Medida extremamente válida, mas que não pode estagnar nos bancos das escolas: é necessário que ela continue também nas empresas, sejam elas multinacionais ou empresas de porte menor. 30UNIDADE II Gestão da Biodiversidade A Educação Ambiental, quando voltada especificamente para os funcionários de uma empresa, pode trazer diversos benefícios para a organização como um todo. Esse processo pode ser feito através da implantação de um Sistema de Gestão Ambiental (SGA), da realização de minicursos, palestras e até mesmo através da contratação de consultorias que se encarregam de gerenciar esses processos educativos. Porém é preciso destacar que as pessoas dentro da organização precisam estar alinhadas a esses princípios de conservação ambiental. Elas precisam pensar e agir de forma comprometida com o meio ambiente e, principalmente, com os impactos que suas atitudes equivocadas podem gerar no ecossistema em que vivem. Os funcionários precisam conhecer os indicadores ambientais da empresa, as metas de redução de emissão de gases, as áreas que mais precisam de cuidados para evitar a poluição involuntária de rios, córregos etc. e tantas outras informações que são indispensáveis para que o colaborador crie uma consciência ambiental voltada não só para a preservação do meio-ambiente, como para o benefício da própria empresa. Assim, quando as equipes de trabalho estão conscientizadas da importância de se rever alguns processos, de realizar manutenções periódicas em equipamentos chave e de promoverem ações internas e externas de divulgação de práticas socioambientais responsáveis para outras empresas, escolas, universidades, centros comunitários etc., a empresa começa a perceber diversas mudanças positivas em suas práticas. Tais mudanças, práticas e de pensamento, trazem benefícios, de curto, médio ou longo prazo, para as empresas, como: ● funcionários comprometidos com os ideais da empresa; ● boa imagem da empresa frente aos clientes e sociedade em geral; ● apelo forte de marketing junto à marca da empresa; ● vantagem competitiva frente aos concorrentes; ● aumento da lucratividade decorrente do melhor posicionamento de sua empresa e produtos/serviços no mercado; ● chances reduzidas de provocar um acidente ambiental e, com isso, manchar a imagem da empresa; ● melhor relacionamento com as comunidades vizinhas, desenvolvendo parcerias na preservação ambiental local; ● ter uma empresa comprometida com ações que preservam o meio ambiente e garantem um futuro mais saudável para as próximas gerações; ● e tantos outros benefícios óbvios advindos da preservação ambiental. 31UNIDADE II Gestão da Biodiversidade Como se pode notar, muitos são os benefícios, tanto para a empresa quanto para a sociedade. Mas é válido dizer que a empresa não deve se preocupar com as questões ambientais apenas por motivos de marketing empresarial, mas como uma consciência verdadeira do que se pretende. O planeta, mais do que nunca, precisa de ajuda e não se pode tratar com desdém essa questão. O termo gestão ambiental é bastante abrangente. Ele é frequentemente usado para designar ações ambientais em determinados espaços geográficos, como, por exemplo: gestão ambiental de bacias hidrográficas, gestão ambiental de parques e reservas flores- tais, gestão de áreas de proteção ambiental, gestão ambiental de reservas de biosfera e outras tantas modalidades de gestão que incluam aspectos ambientais. A gestão ambiental empresarial está essencialmente voltada às organizações, ou seja, companhias, corporações, firmas, empresas ou instituições e pode ser definida como sendo um conjunto de políticas, programas e práticas administrativas e operacionais que levam em conta a saúde e a segurança das pessoas e a proteção do meio ambiente através da eliminação ou minimização de impactos e danos ambientais decorrentes do planejamen- to, implantação, operação, ampliação, realocação ou desativação de empreendimentos ou atividades, incluindo-se todas as fases do ciclo de vida de um produto. A medida em que avançamos para um novo milénio, damo-nos conta da crescente preocupação das empresas em relação às questões ambientais. Em países como o Japão, EUA ou Alemanha as empresas, percebendo-se desta tendência mundial, têm vindo a alterar os seus métodos de trabalho, bem como os seus produtos, tentando satisfazer a vontade de um novo consumidor, disposto a mudar a sua atitude perante o ambiente. Nesse campo não será alheia a pressão que o governo exerce nos diversos se- tores empresariais, de forma a coincidir com as expectativas não só do mercado, mas também com o intuito da preservação ambiental. Embora a legislação possa não ser eficaz, desenvolvem-se fórmulas que incentivam ao seu cumprimento, tais como: contratos de adaptação ambiental; EMAS; sistema comunitário de atribuição de rótulo ecológico; Ponto Verde ou “produtos verdes”. Nesse sentido, é determinante a perspectiva sobre dois pontos essenciais: ● a relação empresa-Ambiente (a nível administrativo e econômico); ● o papel do consumidor na progressiva adaptação ambiental das empresas. 32UNIDADE II Gestão da Biodiversidade SAIBA MAIS Na gestão ambiental, a sustentabilidade é vista como um dos pilares fundamentais. Essa profissão relativamente nova tem como função conduzir as demandas administrativas e de produção das organizações, de uma maneira que garanta o cuidado socioambiental e o desenvolvimento de consciência sustentável. Para auxiliar nessa importante tarefa, é fundamental buscar consultoria de engenharia ambiental. Dentre suas vantagens estão: ● avaliação dos estragos ambientais; ● análise das consequências para o meio ambiente; ● auxílio na redução de danos; ● entrega de soluções condizentes com as normas. Esse serviço, portanto, contribui para que as empresas se tornem sustentáveis e verdadeiras amigas do ecossistema. Gerando o diagnóstico necessário, a empresa ou o profissional contribui até mesmo para a fiscalização de todos os projetos e métodos, garantindo que tudo seja cumprido de acordo com o planejamento feito em parceria com o gestor ambiental. Fonte: O autor REFLITA A grande mudança de mentalidade que se tem assistido nesse início de século coloca em primeiro plano o meio ambiente enquanto visão descentrada do sujeito, do homem. Nestaunidade vamos perceber que a preocupação com o meio ambiente designa uma esfera mais ampla do gerenciamento que todos devemos lidar. Fonte: O autor http://www.fragaengenharia.com.br/engenharia-ambiental/consultoria-e-engenharia-ambiental 33UNIDADE II Gestão da Biodiversidade 2 ENTENDENDO A CDB Até os anos 70, a preocupação com a conservação da biodiversidade estava ligada ao modelo norte-americano e europeu de criação de reservas, estabelecimento de parques e construção de cercas e guaritas. De um lado ficava a natureza, do outro, as pessoas. Esse modelo chegou a funcionar bem nas sociedades mais afluentes ou, por alguma outra razão, mais propensas a contemplar a natureza; mas, nas sociedades em que as pessoas precisavam tanto de proteção quanto às plantas e os animais, o modelo de parques e reser- vas se mostrou inadequado. O novo ambientalismo, surgido no final dos anos 60 nos EUA, veio propor a superação do debate entre preservacionismo e conservacionismo, iniciado na segunda metade do século passado, em que, de um lado, estavam os que pretendiam proteger a natureza através da criação de parques e reservas e, do outro lado, os que pretendiam fazer uso dos recursos naturais, conservando a natureza com um objetivo mais pragmático. Portanto, com o novo ambientalismo, a preocupação é principalmente com a conciliação entre sociedade e natureza e com a conjugação dos objetivos de proteger o ambiente, ao mesmo tempo em que é possível servir-se dele, de forma sustentável (LES- TER, 1989). Essa mudança no paradigma da proteção ambiental acontece paralelamente a uma outra transformação nas ciências naturais, quando se passa da percepção das espécies como foco de análise para a percepção dos ecossistemas ou do mundo em que as espécies interagem. O conceito, antes estático e unidimensional, passou a ser dinâmico e multidimensional. 34UNIDADE II Gestão da Biodiversidade Sinalizam essa evolução no pensamento sobre proteção ambiental as Convenções de Rãmsar para a Proteção de Terras Inundadas de Importância Internacional Especial- mente os Habitats para Pássaros (1971); de Paris, sobre o Patrimônio Cultural e Natural (1972); de Washington, sobre o Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas de Extin- ção (CITES) (1973); de Bonn, para a Proteção de Espécies Migratórias da Vida Selvagem (1979). Essas são as quatro convenções de alcance global que marcam a mudança de paradigma e de espécies para ecossistemas. Paralelamente à escala regional e bilateral, nos cinco continentes, foram também sendo assinados acordos para proteção de espécies migratórias e ecossistemas. O primeiro passo para que a diversidade de genes, espécies e ecossistemas fosse abordada de uma maneira global foi dado com o lançamento da Estratégia Mundial de Conservação pela IUCN em colaboração com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), a Organização Educacional, Científica e Cultural das Na- ções Unidas (UNESCO), o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e o Fundo Mundial para a Natureza (WWF), em 1980. Naquela época o conceito de biodi- versidade ainda não existia, pelo menos no sentido que tem hoje, e a estratégia tinha como objetivo principal instruir, coordenar e guiar as políticas de conservação dos recursos vivos. Sua função era a de ativar o debate sobre coordenação de políticas para conservação da natureza, desde o nível local, em parques e reservas, até o desenvolvimento de programas nacionais e internacionais de conservação (IUCN; UNEP; WWF, 1980). Durante a 15ª Assembleia Geral da IUCN, realizada em Christchurch, na Nova Zelândia, em 1981, o Conselho Internacional de Direito Ambiental (ICEL) foi responsável pela aprovação da Resolução 15/10 que instava o Secretariado da IUCN a analisar “os aspectos técnicos, jurídicos, econômicos e financeiros relacionados à conservação, acesso e uso dos recursos naturais, com a intenção de prover os fundamentos para um acordo internacional, bem como para as regras que deverão guiá-lo” (IUCN, 1989). No Congresso Mundial sobre Parques Nacionais, realizado em Bali, na Indonésia, em 1982, os juristas da Comissão de Direito Ambiental da IUCN começaram a discutir de forma mais ampla a questão do manejo de recursos genéticos. Foi feita, naquela oportuni- dade, a primeira proposta para que se elaborasse, não muito adiante, um tratado mundial para a proteção de recursos genéticos. Pela Recomendação nº 10 do Congresso, a IUCN ficou com a incumbência de investigar “o possível desenvolvimento de instrumentos inter- nacionais para regular a exploração comercial de recursos genéticos selvagens” (IUCN, 1989). Três anos se passaram desde a 15ª reunião da Assembleia Geral da IUCN, em 35UNIDADE II Gestão da Biodiversidade 1981, sem que tivesse sido possível, por questões financeiras e operacionais, realizar o estudo sobre o perfil de um documento internacional amplo para proteção da natureza. Somente em Madri, em 1984, durante a 16ª reunião da Assembleia Geral da IUCN, foi adotada a Resolução 16/24, em que ficou definido que deveria ser preparada uma versão preliminar do acordo global, que trataria dos seguintes temas: (a) o papel dos recursos genéticos na manutenção da diversidade biológica; (b) o acesso aos recursos genéticos; (c) a responsabilidade dos Estados nacionais sobre a conservação dos recursos genéticos; (d) o fortalecimento das legislações nacionais para conservação in situ; (e) o uso comer- cial dos recursos genéticos; (f) os recursos financeiros para a conservação dos recursos genéticos. A elaboração do texto ficou a cargo do Centro de Direito Internacional (ELC) da IUCN, que contou com o apoio da Comissão de Direito Internacional (CEL) das Nações Unidas e das outras cinco comissões da IUCN: Manejo de Ecossistemas; Educação e Co- municação; Estratégia Ambiental e Planejamento; Parques Nacionais e Áreas Protegidas; Sobrevivência de Espécies. Entre 1981 e 1987, durante o período em que se trabalhou a versão preliminar da convenção ainda em sua fase não-oficial, sem envolvimento direto do PNUMA, aconteceram transformações importantes no panorama ambiental internacional. O processo de preparação da Convenção de Biodiversidade, como não poderia deixar de ser, acompanhou essa evolução conceitual. Tornava-se evidente que cercar áreas relevantes para os propósitos da conserva- ção não as isolaria dos efeitos de condições climáticas adversas ou da alta incidência de raios ultravioleta – repercussões previstas nas agudas mudanças ambientais globais –, de onde se concluiu que as preocupações com a proteção da biodiversidade ultrapassavam a noção de conservação de áreas selecionadas. A política internacional para proteção da biodiversidade estava também, a partir de meados dos anos 80, fortemente vinculada ao sucesso dos outros regimes ambientais globais e uma convenção sobre biodiversidade, antes pensada como uma meta final, passará a ser considerada um importante movimento para o início de uma nova relação entre acordos globais para proteção do meio ambiente. 2.1 Características Principais da CDB A Convenção inova em pelo menos quatro aspectos: em primeiro lugar, permite que as razões éticas e estéticas para conservação da biodiversidade sejam reconhecidas oficialmente como relevantes, ao lado das razões econômicas e ecológicas; em segundo lugar, aborda a conservação, o estudo e o uso sustentável de recursos biológicos de forma integrada e global; em terceiro lugar, estabelece finalmente um vínculo entre conservação 36UNIDADE II Gestão da Biodiversidade da biodiversidade e acesso aos recursos genéticos e à biotecnologia; em quarto lugar, procura contrabalançar os desníveis entre as partes, propondo parcerias Norte/Sul que não se limitem ao financiamento adicional, mas que impliquem transferência de tecnologia para a conservação, a ciência e a utilização sustentável da biodiversidade.A Convenção da Biodiversidade é uma convenção-quadro em dois sentidos: (a) porque estabelece princípios, metas e compromissos globais, criando a moldura para as políticas de proteção da biodiversidade global, portanto não apresenta listas de espécies ameaçadas ou anexos de áreas protegidas, ficando a decisão, na maior parte dos casos, para ser tomada no interior dos Estados nacionais e mesmo no nível administrativo local; (b) porque, dentro do modelo de procedimento desdobrado (double track), há a função de iniciar o processo de estabelecimento de novos atos internacionais que tratarão de temas menos amplos em protocolos com regras detalhadas e específicas, ficando essas tarefas sob a responsabilidade da Conferência das Partes. Tal Convenção reúne os seguintes temas principais: (1) o conceito de soberania nacional sobre os recursos biológicos e sua articulação com o conceito de preocupação comum da humanidade; (2) as medidas de conservação e uso sustentável da biodiversidade; (3) as questões de acesso aos recursos biológicos; (4) as questões de financiamento. O conceito de preocupação comum da huma- nidade (common concern of humankind) surgiu como alternativa ao conceito de patrimônio/ herança comum da humanidade (common heritage of humankind). A preocupação comum da humanidade se aplica à nova geração de problemas ambientais globais, porque exprime uma situação de interdependência ecológica intensa, só percebida nos últimos dez anos. Através desse conceito se pretende expressar que os Estados nacionais têm tanto o direito como a obrigação de preocupar-se com questões ambientais globais. A noção de preocupação comum também implica que o ambiente global é assunto de cada Estado nacional e de todos, a um só tempo. Finalmente, esse conceito procura indicar que o horizonte da mudança ambiental global ultrapassa o tempo de uma ou duas gerações e se estende no longo prazo. A ideia é que uma preocupação comum da huma- nidade merecerá atenção das próximas gerações por muito tempo à frente, uma vez que a escala da pressão humana sobre a biosfera, principalmente durante esse século, atingiu proporções geológicas (IUCN - CEL - ICEL 1995). A Convenção do Clima também faz uso do novo conceito, afirmando que a mudan- ça climática global é uma preocupação comum da humanidade. A decisão de se evitar o conceito de patrimônio ou herança comum da humanidade tem também, como não poderia 37UNIDADE II Gestão da Biodiversidade deixar de ser, razões político-econômicas, além das filosófico-jurídicas anteriormente ex- postas. Falar em patrimônio comum implica considerar que os recursos biológicos são responsabilidade comum, portanto pertencem à humanidade. Permitindo o livre acesso aos recursos biológicos ao conjunto dos atores da cena internacional, de uma forma ideal e genérica, sem levar em consideração as diferentes situações de cada Estado nacional, bem como as distintas capacidades científico-tecnológicas e econômicas das corporações transnacionais, o conceito de patrimônio comum mostra-se inadequado para lidar com as assimetrias do sistema global contemporâneo. Isso porque não se está tratando de recursos com valores estéticos, éticos ou ecológicos apenas, que muito dificilmente podem ser traduzidos em cifras convencionais, apesar de sua importância. Está se cuidando de recursos que também possuem valor econômico atual e potencial e movimentam um setor de ponta da ciência, da indústria e do comércio global, a biotecnologia. Por essa razão, a questão do acesso aos recursos biológicos toma vulto. Como liberar o acesso aos recursos que servirão de matéria-prima para produtos que são ne- gociados no mercado e estão protegidos por patentes principalmente, se apenas poucos atores têm capacidade de realizar aplicações biotecnológicas avançadas? Esse tipo de questionamento serviu para reforçar o argumento a favor da soberania nacional sobre os recursos biológicos, uma demanda do Sul, rico em biodiversidade e pobre em meios para conhecê-la e utilizá-la. A afirmação de que os Estados nacionais exercem soberania sobre a biodiversida- de que abrigam em seus territórios está presente no preâmbulo e em outros dois artigos da Convenção (artigo 3, que reproduz o artigo 21 da Declaração de Estocolmo, ao reconhecer que os Estados-nacionais têm o direito de explorar seus recursos de acordo com suas políticas ambientais; artigo 15, que reafirma a soberania nacional como base para a deci- são sobre o acesso aos recursos genéticos). A soberania nacional, segundo a Convenção, precisa ser exercida levando-se em consideração que os Estados-nacionais são também responsáveis pela conservação e uso sustentável dos seus recursos biológicos (artigos 6, 8 e 10). Quanto às medidas de conservação e uso sustentável da diversidade biológica, a Convenção define uma série de obrigações para as partes, entre as quais: (1) o desenvol- vimento de estratégias nacionais e programas que permitam a integração da conservação e do uso sustentável da biodiversidade em planos setoriais e intersetoriais relevantes, bem como em políticas e programas governamentais, influenciando o processo de tomada 38UNIDADE II Gestão da Biodiversidade de decisão (artigos 6 e 10); (2) a capacitação de recursos e a soma de esforços para a identificação dos componentes da biodiversidade e das prioridades para conservação ou de uso sustentável (artigo 7); (3) a conservação in situ deve receber atenção especial dos governos e deve ser tratada em políticas abrangentes que incluem o estabelecimen- to ou aperfeiçoamento de sistemas de áreas protegidas, a reabilitação de ecossistemas degradados, a recuperação de espécies ameaçadas, a proteção de hábitats naturais e a manutenção de populações viáveis de espécies (artigo 8); (4) a conservação ex situ deve complementar as medidas de conservação in situ (artigo 9); (5) o uso sustentável dos recursos biológicos é uma obrigação a que partes se comprometem em diversos momentos da Convenção (tratado especificamente no artigo 10); (6) é reconhecida a importância das comunidades locais e povos tradicionais na conservação da biodiversidade e a Convenção destaca a necessidade de se preservar e estudar o acervo de conhecimentos e práticas que esses povos e comunidades possuem, na maioria das vezes, verdadeiras lições sobre o uso sustentável da biodiversidade (artigos 8 e 10); (7) devem ser adotadas medidas de treinamento e pesquisa (artigo 12) e de educação e conscientização pública (artigo 13); (8) devem ser utilizadas técnicas como avaliação de impacto ambiental e medidas de con- tingência para situações emergenciais, como formas de assessoramento do processo de decisão governamental (artigo 14). É importante considerar alguns aspectos relacionados às obrigações para conservação e uso sustentável da biodiversidade (BURHENNE apud SANCHES; JUMA, 1994; pag. 93). Em primeiro lugar, a Convenção diferencia a conservação do uso sustentável da biodiversidade para atender um pleito dos países em desenvolvimento que, durante as negociações, sentiam a necessidade de deixar claro que conservar e utilizar sustentavel- mente os recursos biológicos eram objetivos distintos, ao mesmo tempo complementares e urgentes. Dessa maneira, evitou-se utilizar o conceito amplo de conservação que inclui a noção de uso sustentável dos recursos biológicos. Do ponto de vista substancial, contudo, a Convenção trabalha com o conceito de conservação em sua acepção moderna e ampla, que admite e estimula a coexistência de áreas prioritárias para conservação com áreas de estudo e uso sustentável, manejadas com o apoio e a participação das comunidades envolvidas. Em segundo lugar, a Convenção vai além do que o seu título indica para atingir sua principal meta, a proteção da diversidade biológica, proteger os seus componentes, indivi- dualmente (genes, espécies e ecossistemas). Portanto, em vez de fixar-seno tratamento dos sintomas, vai direto às causas da perda da biodiversidade. Ao determinar que todas as 39UNIDADE II Gestão da Biodiversidade partes devem utilizar sustentavelmente os recursos biológicos, a Convenção atinge todos os Estados nacionais e não apenas aqueles mais ricos em biodiversidade. Em terceiro lugar, a Convenção procura qualificar as obrigações, principalmente quando se refere ao financiamento para as medidas de conservação, deixando claras as diferenciações entre países desenvolvidos e em desenvolvimento (artigo 20). Em quarto lugar, a Convenção é global em seus objetivos, mas local-nacional em seus meios. Essa também foi uma demanda do Sul, que recusou todas as tentativas de estabelecimento de listas globais de áreas ou espécies prioritárias para conservação. Cada Estado nacional desenvolverá suas estratégias de implementação da CBD, a partir da moldura e dos instrumentos que a Convenção oferece. De fato, o importante é que se reconhece a impossibilidade de se ter um processo decisório centralizado e vertical quanto à proteção da biodiversidade, porque se está provavelmente diante de um dos temas em que a simbiose global e local mais se evidencia. Alguma forma de coordenação das ações locais-nacionais se fará necessária, contudo esse papel deverá ser desempenhado pela Conferência das Partes. A questão envolvendo o acesso à biodiversidade, como visto antes, foi a que mais gerou polêmicas em todo o processo negociador, e pode ser decomposta em três demandas diferentes: (a) por acesso aos recursos genéticos; (b) por acesso a tecnologias pertinentes, inclusive biotecnologia; (c) por acesso aos benefícios advindos da utilização dos recursos. O artigo 15 da Convenção da Biodiversidade estabelece que “em reconhecimento dos direi- tos soberanos dos Estados sobre seus recursos naturais”, o acesso aos recursos genéticos é decidido pela autoridade nacional, com base na legislação nacional pertinente. A Organização para Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO) foi respon- sável pela definição de que os recursos genéticos eram patrimônio comum da humanidade, através do Compromisso Internacional sobre Recursos Fitogenéticos. Como se tratava de um compromisso tomado por resolução (Resolução 08/83), mantinha-se apenas como um instrumento de soft law, 20 propondo que cada país se responsabilizasse por proteger seus recursos genéticos tanto em áreas naturais (in situ) como em bancos de germoplasma, 21 (ex situ) em nome da humanidade. Foi criada também, junto com o Compromisso Interna- cional, a Comissão sobre Recursos Genéticos Vegetais para supervisionar a sua aplicação, o que deu ao Compromisso um sentido mais sério do que se tivesse permanecido apenas como uma declaração de intenções. Em 1992, o Compromisso Internacional da FAO já havia sido aceito por 107 países. Mesmo em se cuidando de documentos com status diferentes, já que o Compromisso In- 40UNIDADE II Gestão da Biodiversidade ternacional da FAO não chega a ser um tratado, fica claro que, a partir da Convenção, está revogado o regime anterior de livre troca dos recursos genéticos, administrado pela FAO. Resta discutir como fica a situação dos recursos que se encontravam em bancos de ger- moplasma antes da Convenção da Biodiversidade entrar em vigor. A FAO pretende rever os termos do Compromisso Internacional sobre Recursos Genéticos Vegetais e espera poder tornar compatíveis as regras, atualmente conflitantes, do Compromisso com a Convenção da Biodiversidade. Outras instituições com interesses imediatos na questão do acesso aos recursos genéticos são o Grupo de Consulta sobre Pesquisa Agrícola Internacional (CGIAR) e o Conselho Internacional sobre Recursos Genéticos Vegetais (IBPGR), que, sob inspiração do trabalho desenvolvido pelo cientista russo Vavilov (1926), suportam uma rede de 18 Centros de Pesquisa Agrícola e Conservação de Recursos Genéticos espalhados pelo mundo, que vêm realizando a troca livre de recursos para a agricultura há pelo menos 30 anos. Nesse campo atua também a União Internacional para a Proteção de Novas Va- riedades de Plantas (UPOV), uma instituição estabelecida pela Convenção de Paris para a Proteção de Novas Variedades de Plantas (assinada em 1961 e revista em 1972, 1978 e 1991), que tem o propósito de proteger, por um determinado período, a propriedade intelectual do agricultor que cultive uma nova variedade vegetal. A proteção da propriedade intelectual do investidor em novos cultivos, de acordo com a UPOV, funciona como um incentivo para o desenvolvimento de novas variedades na agricultura, na silvicultura e na horticultura. Os artigos 15, 16 e 19 tratam do acesso a tecnologias pertinentes, inclusive biotec- nologia, e à distribuição de seus benefícios. O acesso a tecnologias foi e continuará sendo, certamente, um dos temas sensíveis dessa Convenção. O consenso foi formado a partir da importância que os países desenvolvidos dão à proteção da propriedade intelectual, de uma parte, e da importância que os países em desenvolvimento dão à transferência de tecnologia como condição necessária para a conservação dos recursos biológicos, de outra parte. Dessa forma, ficou estabelecida a obrigação, para os países desenvolvidos, de promoverem ou facilitarem o acesso à tecnologia (inclusive biotecnologia), recebendo, em contrapartida, o compromisso dos países em desenvolvimento de que serão respeitadas as patentes e de que serão implementadas ou aperfeiçoadas regras nacionais para o reconhe- cimento e disciplina dos direitos de propriedade intelectual. 41UNIDADE II Gestão da Biodiversidade Quanto à distribuição dos benefícios da biotecnologia, ficou decidido que as partes, em cada caso concreto, procurarão chegar a um consenso sobre o modo em que se fará sua partilha equitativa. Ainda que o texto final tenha representado um avanço, pode-se fa- cilmente prever as dificuldades que aparecerão quando chegar a hora de se colocar esses dispositivos em prática. As questões mais sérias estão relacionadas a dois fatores: (a) à ampla margem de discricionariedade deixada às partes para a negociação dos termos em que se fará a partilha dos benefícios; (b) aos problemas em se identificar exatamente de que recurso se origina o benefício tecnológico, já que pode se passar entre 10 a 12 anos até que se consiga chegar a um produto comerciável. Além disso, nada impede a utilização de vários recursos para a geração de um único produto, tornando a relação mais complexa ainda, já que, para um produto, podem concorrer recursos de origens diversas, aumentando o número de partes em negociação. Por fim, as questões sobre financiamento completam as regras substantivas da Convenção. O artigo 20 define que um mecanismo de financiamento receberá doações de recursos financeiros novos e adicionais dos países desenvolvidos, que deverão ser utilizados pelos países em desenvolvimento para cobertura dos custos adicionais com que tenham que arcar para a aplicação das medidas previstas na Convenção. Os empréstimos obedecerão a prioridades definidas pela Conferência das Partes e serão negociados entre países em desenvolvimento e mecanismo financeiro. Também é previsto no artigo 20 que o fluxo de empréstimos deve ser contínuo e organizado de forma que os países em desenvol- vimento possam realizar os objetivos da Convenção. O GEF - Fundo para o Meio Ambiente Mundial 22 foi escolhido como mecanismo financeiro interino (artigo 39 e Resolução 1, do Ato Final de Nairóbi), não sem encontrar resistência do G77, que o considerava inadequado por não ser nem democrático nem transparente (GLOWKA et al. 1994). Outra crítica ao GEF é que, por estar sujeito a um Conselho, um Secretariado e às determinações das agências financiadoras (PNUMA, PNUD e Banco Mundial), não se vincula totalmente às decisões da Conferência das Partes, como era a intenção do artigo 21 (mecanismo
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