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A cognição humana OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Explicar o desenvolvimento da psicologia cognitiva e da neuropsicologia cognitiva. > Identificar a neurociência cognitiva como abordagem da cognição humana. > Reconhecer o desenvolvimento da ciência cognitiva computacional. Introdução Na medida em que as pesquisas foram evoluindo, surgiram diferentes abordagens para explicar a cognição humana, cada uma delas com campo conceitual, interesses de pesquisa e metodologias de pesquisa próprios. Embora psicologia cognitiva seja o nome de uma das abordagens específicas, a expressão também é, às vezes, utilizada para englobar todas elas. As quatro abordagens da cognição humana: psicologia cognitiva, neuropsicologia cognitiva, neurociência cognitiva e ciência cognitiva computacional. Psicologia cognitiva e neuropsicologia cognitiva A psicologia cognitiva está relacionada à tentativa de compreender a cognição humana com evidências, mais especificamente, comportamentos, sem uso de equipamentos para visualizar o interior do cérebro. A neuropsicologia cognitiva estuda pacientes que tenham lesão no cérebro com o objetivo de entender como é a cognição humana normal Psicologia cognitiva ESTÍMULO (de baixo para cima) Atenção Percepção Processos de pensamentos Decisão RESPOSTA OU AÇÃO Diencéfalo Nesse tipo de funcionamento, é realizado apenas um processamento por vez, o que chamamos de processamento serial, mais presente em tarefas novas. O processamento bottom-up é diretamente influenciado pela estimulação externa. O processamento top--down (de cima para baixo), em que se consideram não apenas o estímulo, mas também as expectativas e os conhecimentos do indivíduo. É o processamento top-down que leva em conta os conhecimentos e as expectativas, que permite a você, por exemplo, ler uma palavra mesmo quando algumas letras são substituídas por algarismos: P5NSAM5NTO Em geral, mais de um processamento ocorre ao mesmo tempo, o que se chama de processamento paralelo. É mais comum em tarefas habituais, como quando cozinhamos enquanto conversamos com alguém. Ambientes controlados: as pesquisas são realizadas em laboratório com indivíduos saudáveis. Segundo Eysenck e Keane (2017, p. 4), as pesquisas carecem, portanto, de validade ecológica, de “aplicabilidade (ou o contrário) dos achados dos estudos laboratoriais aos contextos da vida cotidiana”. Experimentador implacável: o comportamento do pesquisador não é influenciado pelo comportamento do participante. Você não encontrará essa situação na vida real. Evidências indiretas: com evidências indiretas como resultados dos experimentos, não sabemos exatamente o que está acontecendo no cérebro enquanto uma tarefa é realizada e, por isso, não podemos ter certeza se o processamento é serial ou paralelo. Descrições verbais: alguns autores, como Eysenck e Keane (2017) consideram que descrições verbais podem ser vagas, dificultando a sua previsibilidade. Sternberg (2008, p. 30), porém, assinala o “acesso aosinsights introspectivos a partir do ponto de vista dos participantes” como um ponto forte, porque não poderia ser acessado de outra forma se não com as verbalizações. Especificidade do paradigma: “ocorre quando os achados de alguma tarefa experimental ou paradigma não são obtidos, mesmo quando, aparentemente, estão sendo usados tarefas ou paradigmas muito semelhantes Ausência de “uma arquitetura ou estrutura abrangente que esclareça as inter-relações entre os componentes do sistema cognitivo. Neuropsicologia cognitiva Está preocupada com os padrões de desempenho cognitivo (intacto e deficiente) apresentados pelos pacientes com dano cerebral” As pesquisas realizadas na década de 1960 permitiram entender que é possível que a memória de longo prazo funcione normalmente mesmo que a memória de curto prazo esteja prejudicada, ao contrário do que se pensava anteriormente. Isso só foi possível ao estudar pessoas com lesão cerebral. O foco é entender a mente, como funciona a cognição. Não existe, porém, um consenso, pois outros pesquisadores utilizam neuroimagens para identificar áreas lesionadas no cérebro de pacientes. A primeira suposição é a modularidade, que pressupõe “que o sistema cognitivo consiste em muitos módulos ou processadores relativamente independentes ou separados, cada um especializado em determinado tipo de processamento” De acordo com essa suposição, cada módulo apresenta uma especificidade de domínio, que é a “noção de que determinado módulo responde seletivamente a certos tipos de estímulo. A segunda suposição é a modularidade anatômica, que é a crença de que cada módulo está localizado em uma região do cérebro. Existem evidências disso para o sistema de processamento visual, mas não para tarefas complexas em que são verificados ativamentos de lobos frontais em diversas áreas. A terceira suposição é a da existência de uma uniformidade da arquitetura funcional para todas as pessoas. Essa crença se justifica pela impossibilidade de generalizar os achados das pesquisas se cada pessoa tivesse uma arquitetura funcional única. A quarta suposição é a subtratividade, que é a ideia de que uma lesão cerebral afeta “um ou mais módulos de processamento, mas não altera ou acrescenta nada” As dissociações ocorrem quando um paciente com lesão cerebral desempenha bem uma tarefa, mas tem prejuízo em outra, por exemplo, tarefas que exigem a memória de curto prazo intacta quando a de longo prazo está prejudicada. A explicação poderia ser módulos de processamento distintos, o que confirmaria a suposição da neuropsicologia cognitiva. A dissociação dupla, “achado de que alguns indivíduos com lesão cerebral têm desempenho intacto em algumas tarefas, mas desempenho fraco em outras, enquanto outros indivíduos exibem o padrão oposto” A dissociação dupla elimina a explicação pela complexidade da tarefa. Essas suposições são também contestadas. A neuropsicologia cognitiva trabalha com cérebros com alguma lesão e, portanto, a forma predominante de pesquisa é o estudo de caso, o que é uma limitação metodológica. Para tentar diminuir o impacto dessa limitação, realiza estudos de séries de casos. Neurociência cognitiva Note a estrutura esquemática do neurônio, com suas partes — corpo celular, dendritos e axônios —, bem como a sinapse com terminais axônicos e neurônios pós-sinápticos. Dendritos e axônios são os prolongamentos dos neurônios. Os dendritos recebem os estímulos, enquanto os axônios são os prolongamentos que transmitem as informações do neurônio para as outras células. Neurônios pós- sinápticos são os que se localizam após a sinapse, a ligação entre os neurônios. O cérebro tem dois hemisférios: o direito e o esquerdo. Cada um dos dois hemisférios tem quatro grandes áreas, chamadas de lobos — frontal, parietal, temporal e occipital Os sulcos, que são estrias no cérebro: sulco central, sulco parieto-occipital e corte pré-occipital. Enquanto as fendas são chamadas de sulcos, as saliências são chamadas de giros. As áreas cerebrais são divididas em dorsal (em direção ao topo), ventral (em direção à base), frontal (em direção à frente), posterior (parte de trás), lateral (ao lado) e medial (no meio). O cérebro funciona de acordo com dois princípios contraditórios entre si: o princípio de controle de custos, que visa a diminuir as distâncias entre as conexões, e o princípio da eficiência, para integrar as informações. Às vezes, as informações estão distantes uma da outra e, para resolver essas dificuldades, os neurônios se relacionam com neurônios próximos a si e com até 10 mil neurônios. Para resolver a questão da localização, existem módulos, que são áreas de conexão agrupadas, e centros, que são regiões com muitas conexões com outras regiões . Técnicas para o estudo do cérebro Resultou em muitos conhecimentos sobre a sua estrutura. No entanto, conforme Sternberg(2008, p. 43), “a tendência nos últimos tempos tem sido a de concentrar-se em técnicas que proporcionem informações sobre o funcionamento mental humano à medida que ele ocorre”, in vivo (vivo). Registro de unidade isolada ou registro de célula única: consiste em inserir um microeletrodo no cérebro para estudar neurônios isolados. É a mais minuciosa das técnicas, porém é invasiva e, portanto, raramente utilizada em pesquisas com humanos. Potenciais relacionados a eventos (ERPs): o eletroencefalograma (EEG) é utilizado para obter esse tipo de informação. Trata-se de um exame com baixa resolução espacial, que não identifica as áreas específicas do cérebro envolvidas nos eventos, mas tem boa precisão temporal. De acordo com Rotta, Ohlweiler e Riesgo (2016, p. 82), “um traçado de EEG corresponde a uma espécie de ‘pescaria’ da atividade cerebral no momento em que foi feita. Portanto, é um exame extremamente dinâmico e pode variar com o momento”. Tomografia por emissão de pósitrons (PET): tem baixa resolução tempo ral, mas boa resolução espacial, medindo a atividade do cérebro após a aplicação de um marcador que se concentra nos vasos sanguíneos do cérebro. Imagem por ressonância magnética (IRM): um campo magnético provoca a movimentação dos prótons no cérebro, o que os faz liberar energia. O aparelho escaneia as áreas mais brilhantes, aquelas que liberam mais energia. Com esse exame, é possível verificar as estruturas do cérebro, mas não seu funcionamento. Imagem por ressonância magnética funcional (IRMf): tem boa resolução tanto espacial quanto temporal. Portanto, na pesquisa, é melhor do que a PET. Mede o BOLD, que é o “contraste dependente do nível de oxigênio no sangue Imagem por ressonância magnética funcional relacionada a evento (IRMfe): tem sido muito utilizada, pois permite comparar padrões de atividades relacionadas a eventos isolados. Magnetoencefalografia (MEG): mede os campos magnéticos produzidos pela atividade elétrica cerebral. Tem resoluções temporal e espacial boas, mas seu custo é alto. Estimulação elétrica transcraniana (TMS): um dispositivo emite pulsos magnéticos breves, afetando uma área do cérebro. O efeito imita uma lesão, o que auxilia na determinação da importância da área para o desempenho na tarefa. Estimulação magnética transcraniana repetitiva (rTMS): os pulsos elé tricos da TMS são aplicados rápida e repetidamente. Tem sido muito utilizada. Em geral, fala-se somente TMS. IMPORTANTE A resolução espacial indica a localização, ou seja, a área em que o evento ocorre no cérebro A resolução temporal informa o momento em que o evento ocorreu, o que permite identificar se ele ocorreu em reação a uma determinada tarefa e quanto tempo depois. Não existe a melhor técnica, pois todas apresentam qualidades e limitações. A escolha da técnica depende do objetivo. Uma das grandes contribuições da neurociência cognitiva é “que existem integração e coordenação substanciais no cérebro Ciência cognitiva computacional Com a ciência cognitiva computacional, a cognição humana é estudada com o desenvolvimento de modelos computacionais, considerando o conheci mento sobre o comportamento e o cérebro. esclarece que “o pensamento computacional representa a forma como as tarefas podem ser executadas de forma mais eficiente pelos humanos”. Não se pode confundir, porém, modelagem computacional com inteligência artificial A primeira “envolve a programação de com putadores para simularem ou imitarem aspectos do funcionamento cognitivo humano”, A segunda “envolve a construção de sistemas de computador que produzem resultados inteligentes, mas os processos envolvidos podem ter pouca semelhança com os usados pelos seres humanos A maior parte dos modelos computacionais é do tipo conexionista, con sistindo “em redes interligadas de unidades simples; as redes exibem a aprendizagem por meio da experiência, e itens específicos de conhecimento são distribuídos entre as inúmeras unidades Nos modelos conexionistas, a propagação retrógrada (backprop) é um mecanismo de aprendizagem que compara as respostas reais com as respostas corretas, para que o modelo aprenda o comportamento sem ter sido programado para isso. A arquitetura cognitiva tem auxiliado na compreensão do sistema cognitivo. As pesquisas em ciência cognitiva computacional têm alargado a abrangência das pesquisas, pois ela se baseia em informações muito mais rigorosas e precisas do que as dos modelos verbais. Os modelos computacionais são precisos e podem modelar padrões de atividade cerebral e efeitos de lesões cerebrais. A grande limitação, entretanto, é que não conseguem trabalhar com os aspectos motivacionais e emocionais, não conseguindo replicar as condições do mundo real. Confira a seguir, de modo bastante resumido, a principal característica de cada abordagem. Psicologia cognitiva: observa comportamentos. Neuropsicologia cognitiva: analisa cérebros lesionados. Neurociência cognitiva: usa equipamentos de imageamento cerebral. Ciência cognitiva computacional: elabora modelos computacionais.