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Prova de Economia Política Internacional II 
 
Arthur Bernardes de Oliveira 
 
Como você (s) analisa(m) a posição e o poder dos Estados Unidos no atual Sistema de 
Governança Global frente às potências emergentes? E a posição e o poder da China? 
 
Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos têm desempenhado um 
papel importante na política mundial. A atual ordem multilateral foi cunhada e moldada de 
acordo com os termos e valores dos EUA, como democracia e liberalismo. Como resultado, sua 
hegemonia tem sido um dos aspectos mais prevalentes das relações internacionais, 
especialmente após a Guerra Fria. Na década de 1990, os EUA concentravam uma ampla gama 
de aspectos de liderança: desde tecnológicos, financeiros e militares até científicos e culturais 
(LAKE, 2003). Mas em 2001, os EUA foram atingidos pelos eventos inesperados do 11 de 
setembro e pode-se dizer que este foi um ponto de virada em relação a sua posição perante o 
resto do mundo. Em pouco tempo, durante a crise financeira e econômica de 2006-2010, ficou 
bastante evidente que os EUA estavam perdendo suas posições de liderança. 
O poder no atual sistema de governança global tornou-se mais difuso. A mudança de 
poder que acompanha a ascensão do Brasil, Rússia, Índia, China (os BRICs) e outras “potências 
em ascensão” levantam questões sobre a possível reordenação ou mudanças no estado da 
governança global. Ao mesmo tempo que defendem uma melhor representação em instituições 
como o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e o Conselho de Segurança da ONU, 
os governos da China, Índia, Brasil e outras economias emergentes começaram a desenvolver 
e manter instituições alternativas para colaboração econômica e política (HURRELL, 2018). 
Também ocorreu uma mudança de poder geoeconômico e pode-se dizer que está 
ocorrendo uma mudança de poder geopolítico. O G7 cedeu relevância ao G20. O crescimento 
econômico dinâmico dos BRICS e a nova centralidade crescente na África estão suplantando a 
hegemonia econômica das antigas metrópoles. A cooperação Sul-Sul compensa as relações 
assimétricas Norte-Sul. A maior parte da população e do comércio mundial estão agora 
centrados na Ásia, em que se observa desde a década de 1990 um número crescente de trabalhos 
prevendo um declínio relativo norte-americano e a chegada das economias asiáticas, em 
especial da China. 
Nesse sentido, no continente asiático surgiu uma China assertiva e pragmática. A China 
criou novas organizações multilaterais para discussões de segurança e outra para empréstimos 
https://www.nytimes.com/2015/12/05/business/international/china-creates-an-asian-bank-as-the-us-stands-aloof.html
de infraestrutura. Ela desenvolveu um programa global de empréstimos – a Iniciativa do 
Cinturão e Rota – e assumiu um papel global mais forte nas mudanças climáticas. E a China 
está espalhando sua influência política e econômica na África e na América Latina. Parece que 
os EUA não podem desacelerar o crescimento econômico chinês, nem conter seu poder. Dessa 
forma, pode-se dizer que a China está mudando as regras, quer os EUA gostem ou não. 
A ascensão da China colocou em questão alguns paradigmas de governança, 
especialmente no que diz respeito à hegemonia e poder dos EUA, bem como a ordem que o 
sustenta. Essa tendência de mudança mundial só cresceu, principalmente com a política externa 
de Donald Trump, baseada no protecionismo, no isolacionismo e no unilateralismo. É inegável 
que as eleições norte-americanas de 2020 e a vitória de Joe Biden indicam o início de uma nova 
fase ou uma tentativa de retorno a um estabelecimento anterior na política externa norte-
americana. No entanto, é improvável que esse rearranjo leve à extinção de todo um movimento 
global que aponta para uma mudança na dinâmica mundial. A China não tem planos de abdicar 
de sua posição emergente e também não está disposta a se submeter a um “tratamento pior” por 
não ser considerada uma democracia segundo os moldes ocidentais, principalmente em um 
contexto que é inconcebível um regime comercial sem a China. 
Xi Jinping propõe um “ Modelo da China ” que devolveria a China à posição de destaque 
que ocupava no mundo no século XIX. Melhoraria o padrão de vida do povo e permitiria que a 
China ocupasse o centro do palco nos assuntos mundiais, tudo sob o controle do sistema político 
do Partido. Xi oferece esse modelo como uma alternativa ao neoliberalismo na ordem mundial 
emergente. Pode-se dizer que o modelo de desenvolvimento bem-sucedido da China resiste ao 
consenso neoliberal de Washington (ZHAO, 2010). Por enquanto, a China defende um mundo 
diverso e multipolar como alternativa à hegemonia dos EUA/OTAN, um equilíbrio de poder 
entre grandes blocos regionais que impediria qualquer um deles de dominar a ordem mundial 
emergente. 
Apesar de continuar sendo a maior potência econômica e militar do planeta, bem como 
responsáveis pela moeda mais utilizada no mundo inteiro, tanto em reservas internacionais 
como em livre circulação, a mudança emergente no poder geopolítico exige uma posição 
adequada dos EUA. No entanto, esta posição parece estar ainda sob construção. Construir e 
liderar a ordem internacional liberal tem sido o ponto focal da grande estratégia americana 
desde o final da Segunda Guerra Mundial. Contudo, a atual ordem global enfrenta imensos 
desafios e o contexto emergente não privilegiará os interesses estratégicos americanos, sem 
abordar a erosão da legitimidade liberal e o surgimento de uma ordem global mais multipolar 
(ACHARYA, 2017). 
https://www.cfr.org/backgrounder/chinas-soft-power-initiative
https://www.cidob.org/publicaciones/serie_de_publicacion/opinion/asia/a_china_model_for_the_new_era
Tentativas fracassadas de lidar com questões de conflito externo no Oriente Médio, 
Norte da África e, mais recentemente, com a saída das tropas do Afeganistão, são sintomas da 
obsolescência da posição convencional de poder norte-americana. Assim também são as 
tendências para a regionalização econômica e o regionalismo político que surgem como uma 
resposta à incapacidade do Estado-nação individual de controlar a dinâmica de uma economia 
de mercado supranacional. A estratégia baseada na nostalgia da Guerra Fria que coloca a China 
como rival inevitável em um conflito inevitável pode se tornar uma profecia autorrealizável. 
Assim como também poderia um pragmatismo pós-Guerra Fria que vê a China mais como um 
parceiro em uma nova ordem mundial. O mesmo é verdade para os estrategistas chineses 
enquanto traçam seu curso através de uma economia de mercado capitalista globalizada. 
A governança global no século XXI está sendo costurada por uma multiplicidade de 
atores e interesses. O entrelaçamento das políticas externas dos EUA e da China é essencial 
para entender a volatilidade atual e as tendências futuras na dinâmica mundial. Enquanto 
Donald Trump conseguiu minar a ordem multilateral e promover o unilateralismo, o futuro da 
governança global acaba sendo uma questão em aberto agora que o democrata Joe Biden é o 
presidente dos EUA. Pode-se dizer que a criação de um Concerto de Democracias, que tem sido 
coordenado pela administração de Biden e que inclui inúmeros países dentre eles emergentes 
de peso expressivo como Brasil e Índia, é uma tentativa americana de moldar a ordem mundial 
emergente ao seu favor. 
No entanto, não há dúvida de que as tensões, conflitos e competição entre os EUA e a 
China provavelmente permanecerão, especialmente nas áreas de tecnologia avançada, 
inteligência artificial, propriedade intelectual, 5G e desequilíbrio comercial e financeiro 
(GOMARD, 2020). No entanto, pode haver algumas aberturas para melhorias no 
relacionamento bilateral e base para novos consensos e cooperação. Independentemente disso, 
o papel da China no sistema internacional é, sem dúvida, notável e, mesmo com o pivô dos 
EUA para o multilateralismo sob o governo Biden, é improvávelque a China perca sua 
importância em todo o mundo, inclusive em questões de governança global. 
 
REFERÊNCIAS 
ACHARYA, A. After Liberal Hegemony. Ethics & International Affairs, September 8, 2017. 
 
GAMBLE, A. Is State Sovereingty Compatible with Multilateralism? In: TELÓ, M (Ed.). Reforming Multiteralism 
in Post-Covid Times. Foundation for European Progressive Studies, Brussels, 2020. 
 
GOMARD, T. COVID-19 and the end of technological innocence. Politique Étrangère, v. 2, p. 25- 38, 2020. 
 
HURRELL, A. Beyond the BRICS: Power, Pluralism, and the Future of Global Order. Roundtable Rising Powers 
and International Order. King´s College London, 2018. 
 
LAKE, D. A. British and American Hegemony Compared. In: FRIEDEN, J. A.; LAKE, D. A. (Orgs). International 
Political Economy: Perspectives on Global Power and Wealth. London and New York: Routledge, 2003, cap. 8 
(p. 126-139). 
 
RODRICK, D. The Globalization Paradox: Democracy and the future of the World Economy, Oxford: Oxford 
University Press, 2018, Cap. 7 (Poor Countries in a Rich World). 
 
ZHAO, S. The China Model: Can it Replace the Western Model of Modernization? Journal of Contemporary 
China, v. 19, n. 65, p. 419-436, 2010.

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