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1 Prezado(a), seja bem-vindo(a) ao curso de Investigação Criminal. Veja a seguir a apresentação do tema proposto e os objetivos esperados para seu melhor aproveita- mento. Para explicar a finalidade de investigação criminal, diante do atual Estado Democrático de Direito, já não é mais suficiente sua ideia como mecanismo de produção da prova de um crime. Mais do que produzir provas de um crime, os integrantes da equipe de investigação criminal pos- suem responsabilidade social, pois são atores sociais que possuem, por força constitucional, o poder/dever de realizar a atividade investigativa, e de produzir, por meio de uma eficiente persecução criminal, a tão almejada justiça. Tenha em mente A investigação criminal é um evento único, indivisível, que tem início com a “notitia criminis”, e en- cerramento, com o trânsito em julgado da sentença penal (ou ainda, segundo alguns doutrinadores, não se encerra, pois a qualquer momento poderá ocorrer a revisão criminal), cujo sucesso depende, além de outros fatores, do nível de interação existente entre os profissionais que integram as instituições de segurança pú- blica, pois é a partir da observação inicial deles, em especial nos locais de crime, que os primeiros elementos probatórios serão detectados. A idoneidade de um local de crime, por contemplar, mesmo que implicitamente, grande parte das respostas necessárias para a reconstrução de um delito, exigirá do profissional de segurança pública conhe- cimento técnico que o habilite a: Adotar as primeiras providências de proteção e isolamento. Efetivar as medidas preservacionistas, a obtenção de dados e informações que subsidiarão a investi- gação preliminar. Isso possibilitará a construção das primeiras hipóteses para a explicação do delito e, consequente- mente, com o seguimento da investigação, o desenvolvimento de um planejamento operacional capaz de testar, com eficiência, as linhas investigativas eleitas. Para que a atividade investigativa obtenha êxito, não se pode mais ver o crime apenas como um fato pretérito, estático, mas sim como algo dinâmico, cujo “modus operandi” ultrapassou, e muito, a simplicidade dos antigos batedores de carteira e dos pequenos golpistas. Hoje, com base nos avanços tecnológicos, na globalização e na facilidade de comunicação, existe uma complexa rede de relações, a qual busca obter, pelos meios que se fizerem necessários, o maior volume possível de vantagens ilícitas. Atente-se para o fato de que o grau de complexidade das condutas perpetradas por essas novas organizações criminosas, estruturadas e voltadas à prática de crimes, muitas delas sob o manto de uma fa- laciosa legalidade e sob a proteção (ou participação direta) de profissionais públicos e políticos, exige dos integrantes das equipes de investigação o conhecimento e a utilização de técnicas especiais de investigação, e mais, requer também uma efetiva e eficaz interação entre os profissionais de segurança pública na busca APRESENTAÇÃO 3 de dados e informações qualificados, capazes de fazer aflorar elementos de prova ardilosamente ocultados. Nesse diapasão, ratificando a impossibilidade de conter a ação dessas organizações criminosas apenas com a utilização de técnicas convencionais, a Organização das Nações Unidas, por meio da Convenção das Na- ções Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (Decreto nº 5.015/04) e a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (Decreto nº 5.687/06), propõe que os Estados-partes, entre eles o Brasil, utilizem técnicas especiais de investigação como: Mormente a entrega vigiada; A infiltração; A vigilância eletrônica; A quebra de sigilo fiscal e bancário; A interceptação telefônica. Essas técnicas têm a finalidade de detectar, confirmar, prevenir ou reprimir atividades criminosas dis- persadas e dissimuladas entre atividades aparentemente lícitas. Assim, não há dúvidas de que o processo de desenvolvimento da investigação criminal (antes baseado no empirismo e na intuição) corresponde ao desencadeamento para a produção do conhecimento científico, pois tal como uma pesquisa científica, é movido por um raciocínio lógico e ordenado, sendo ele: Iniciado após a eclosão da prática delitiva (problema); Passando pela obtenção de dados e informações preliminares (elementos objetivos e subjetivos), os quais levarão à produção de hipóteses testáveis que, além de explicar os fatos que compõem o fenômeno investigado, per- mitirão a produção de conclusões; E, ao final, de uma teoria a qual irá municiar o julgador de elementos probatórios que fundamentarão sua decisão. Esse processo de produção e de valorização do conhecimento, por força de sua natureza explora- tória, dá conotação bidimensional à investigação criminal, isso ao proteger e limitar direitos, criando uma conexão dos fundamentos constitucionais de cidadania e de respeito à dignidade da pessoa humana com a produção de provas. Todavia, essa busca incessante pelo esclarecimento da autoria e da materialidade de delitos não é algo desenfreado e sem limites, pelo contrário, para que os elementos objetivos e subjetivos produzidos durante a investigação preliminar e de seguimento possuam valor probatório, necessariamente devem estar alicerçados em princípios, dentre os quais podemos destacar: A legalidade; A moralidade; A probidade; A impessoalidade; A eficiência. Essa riqueza de temas, por sua amplitude e complexidade, será abordada no curso de Investigação Criminal em duas unidades, cada uma com 60horas, sendo a primeira focada em conteúdos teóricos, e a se- gunda, práticos, todos ligados à investigação criminal, e para que haja uma sequência lógica no aprendizado, a segunda unidade terá como requisito a conclusão da primeira. Viva com emoção este curso. Reflita sobre os temas abordados. Promova novas pesquisas e aplique esses conhecimentos, com entusiasmo e respeito, aos desafios do ofício de apurar infrações penais. Excelentes estudos! 4 Objetivos do curso Este curso criará condições para que você possa: Compreender a concepção de segurança pública como tutora de direitos e garantias fundamentais, instrumento de defesa da cidadania; Definir investigação criminal e suas finalidades como processo científico; Listar sistemas de investigação criminal e as modalidades segundo o momento de sua execução; Listar os princípios constitucionais que regem a investigação criminal sob o aspecto normativo, rela- cionando-os com os princípios operacionais e os atos que controlam a investigação criminal Descrever os valores fundamentais da Constituição da República Federativa do Brasil garantidores do respeito à dignidade do investigado; Aplicar as normas legais de controle da efetividade da busca de elementos objetivos e subjetivos pela investigação criminal; Formular o problema em uma investigação criminal; Elaborar e testar hipóteses indicativas das circunstâncias e autoria de um crime; Listar os atributos e as atitudes exigidas ao profissional da investigação criminal para superar a frag- mentação da investigação criminal; Demonstrar como se processa a interdisciplinaridade na investigação criminal; Definir prova e compreender a proposta doutrinária dos cuidados a serem tomados para valorização da prova; Aplicar a ordem lógica da investigação criminal para demonstrar a credibilidade e validade das infor- mações que compõem a prova. Estrutura do Curso Buscando dar efetividade aos objetivos citados, a presente unidade será composta de oito módulos, cuja estrutura é a seguinte: Módulo 1 - A investigação criminal como instrumento de defesa da cidadania Módulo 2 - Investigação criminal: aspectos conceituais Módulo 3 - Investigação criminal: princípios fundamentais Módulo 4 - Fundamento legal da investigação criminal Módulo 5 - A lógica aplicada à investigação criminal Módulo 6 - Perfil profissional do integrante da equipe de investigação Módulo 7 - A interdisciplinaridade da investigação criminal Módulo 8 - Valorizaçãoda Prova Conclusão Referências Bibliográficas 5 Apresentação do módulo Seja bem-vindo(a) ao Módulo: A investigação criminal como instrumento de defesa da cidadania. Nele você irá estudar a relação entre a polícia cidadã e a investigação criminal. A concepção de segurança pública como aparato repressor do Estado, por força da soberania popu- lar, materializada na Carta Magna de 1988, foi superada e hoje integra uma das páginas viradas da história. Para saber mais sobre a Carta Magna de 1988, acesse o link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. A nova ordem jurídica constitucional instalada em 1988 chancelou e fez prosperar a denominada polícia cidadã, protetora e defensora de direitos e garantias fundamentais, depositando na investigação criminal uma responsabilidade que ultrapassa a produção de elementos objetivos e subjetivos capazes de fundamentar o indiciamento do autor e subsidiar a promoção da ação penal, pois é dela o dever de proteção e manutenção do Estado Democrático de Direito e, consequentemente, do exercício pleno da cidadania. Então, você irá estudar e entender essa nova realidade! Preparado? Vamos lá! Objetivos do módulo Ao final deste módulo, você será capaz de: Compreender a concepção de segurança pública como tutora de direitos e garantias fundamen- tais; Reconhecer a investigação criminal como instrumento de defesa da cidadania; Identificar os princípios fundamentais de sustentação da democracia brasileira. Polícia cidadã e a investigação criminal O pacto político firmado em 1988 pela sociedade brasileira foi no sentido de formar um Estado De- mocrático de Direito alicerçado na soberania, na cidadania, na dignidade da pessoa humana, nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, e no pluralismo político, pois o que se buscava era a construção de uma sociedade: Livre; Justa; Pluralista; Solidária; Sem preconceitos. MÓDULO 1 A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL COMO INSTRUMENTO DE DEFESA DA CIDADANIA 6 E protetora dos direitos: Civis; Políticos; Sociais; Culturais; Econômicos. Para garantir essa nova sociedade que aflorava, fruto legítimo e incontestável da soberania popular, já não era suficiente a antiga concepção de segurança pública como aparato repressor do Estado. Exigia-se, então, diante da nova ordem jurídica constitucional instalada, que as instituições policiais estivessem vocacionadas a proteger e defender direitos e garantias, surgindo, assim, a denominada polícia cidadã. Todavia, essa nova percepção de segurança pública como instrumento de defesa da cidadania exige das instituições policiais a utilização de técnicas e métodos que, embasados nos princípios e limites constitucionais, sejam capazes de obter justiça e paz social sem que qualquer abuso ou arbitrariedade seja cometido. Considerando que as atividades de segurança pública devem tutelar a integralidade da cidadania, as instituições policiais, como parte efetiva de uma rede interdisciplinar de proteção dos valores de susten- tação do Estado Democrático de Direito, devem buscar, incansavelmente, por meio da integração e da inte- ração social, atingir essa finalidade. Nesse contexto, a investigação criminal é uma das ferramentas utilizadas pela polícia judiciária para a proteção plena dos direitos humanos. A investigação criminal é um dos instrumentos utilizados para salvaguardar direitos e garantias da pessoa humana, os quais, uma vez efetivados, proporcionam dignidade, liberdade, igualdade e fraternidade necessárias à sua existência e desenvolvimento. E mais, dentro do contexto de segurança pública cidadã, resta ainda à investigação criminal proteger e defender, indistintamente, quem esteja sofrendo ou possa sofrer qualquer tipo de arbitrariedade ou abuso estatal. Para saber mais sobre os direitos humanos, acesse: http://www.direitoshumanos.usp.br As práticas infracionais atentam contra o sistema de direitos e garantias fundamentais, os quais pro- porcionam a sobrevivência de uma sociedade democrática. Assim, a razão de ser das instituições policiais é garantir o livre e pacífico exercício desses direitos e garantias. A investigação criminal, como principal mecanismo de busca da justiça penal, deverá estar em con- sonância com as demandas decorrentes do usufruto desses direitos e garantias. Importante! Para que possa dar continuidade ao estudo proposto nesta unidade, uma pergunta deve ser respondida: a sociedade precisa mesmo de uma polícia? Jaume Curbet (1983, p. 75) nos remete a refletir sobre o tema com uma citação do escritor francês Balzac: Os governos passam, as sociedades morrem, mas a Polícia é eterna. Honoré de Balzac 7 Você pode ter chegado a várias conclusões a partir dessa assertiva, todavia, a mais importante delas é a de que, seja qual for o modelo de sociedade, esta sempre necessitará da tutela policial. Para refletir Num sistema de direitos e garantias fundamentais, de que adiantaria, por exemplo, a previsão constitucional do direito à vida, à igualdade, à liberdade e à propriedade, se não tivéssemos segurança e tranquilidade para exercê-los? A primeira Constituição Francesa de 1791 já declarava, em seu artigo 12, a importância da tutela po- licial dos direitos do homem e do cidadão: A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública. Esta força se institui, portanto, para benefício de todos e não para a utilidade particular daqueles que a têm a seu cargo. Honoré de Balzac. A investigação criminal, como instrumento de proteção da cidadania, possui dupla função: preve- nir e reprimir as práticas delitivas. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, assim como a Constituição Francesa de 1791, materializa em sua carta a vontade popular de construir um Estado soberano, capaz de proteger e defender, por meio de suas instituições: O livre exercício dos atos de cidadania; A dignidade humana; Os valores sociais; As liberdades. Sendo assim, as atividades de investigação criminal devem refletir, por meio de seus métodos e téc- nicas, a certeza de que tutelam direitos e garantias fundamentais, e assim, de que protegem e defendem o Estado Democrático de Direito. Finalizando... Neste módulo você estudou que: O Estado Democrático de Direito exige, para a sua completa efetividade, que a segurança pública esteja vocacionada a tutelar direitos e garantias fundamentais (segurança cidadã) e que, assim sendo, seja capaz de garantir o exercício pleno da cidadania. A investigação criminal, como instrumento de defesa da cidadania e uma vez possuidora de dupla função (prevenir e reprimir práticas delitivas), deve estar alicerçada em técnicas e métodos específicos, os quais, uma vez consubstanciados em princípios e regras constitucionais, seja capaz, cientificamente e com base nos mais elevados valores éticos e morais, de produzir justiça e paz social. Parabéns por finalizar este módulo! 8 Para fixar este conteúdo, realize os exercícios propostos a seguir. No próximo módulo você estudará as definições, as finalidades, os sistemas e a classificação da in- vestigação criminal. Bons estudos! Exercícios Com base nos conhecimentos adquiridos no módulo 1, realize as atividades propostas a seguir. Atividade 1: Analise a afirmativa a seguir e explique como isso poderá se tornar prático. “(...) a investigação criminal é uma das ferramentas utilizadas pela polícia judiciária para a proteção plena da cidadania.” Atividade 2: Você estudou que um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito é a dignidade da pessoa huma- na. Avalie suas práticas como profissional de segurança pública, ressaltando no que elas refletem ou contrariam esse princípio. 9 Gabarito Feedback da atividade 1: O Estado Democrático de Direito, fruto legítimo e incontestável da soberania popular, materializado na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, exige das instituições policiais, sob a nova ótica de segurançapública – segurança cidadã –, que estejam vocacionadas a proteger e defender direitos e garantias fundamentais, devendo, para tanto, fazer uso de técnicas e métodos específicos, todos alicerçados nos mais elevados valores éticos e morais, pois somente assim auxiliarão verdadeiramente na obtenção de justiça e paz social. Nesse contexto, a investigação criminal, definida como o conjunto de procedimentos interdisciplinares, de natureza inquisitiva, preservadora e preparatória, que busca, de forma sistematizada e dentro de parâmetros éticos e legais, a produção da prova, deverá ser conduzida pela equipe de investigação criminal sempre foca- da na obtenção da verdade daquilo que se pretende aclarar, afastando-se, para tanto, qualquer preconceito, juízo de valor, interesse pessoal, ilegalidade, imoralidade ou improbidade. Feedback da atividade 2: A dignidade da pessoa humana, segundo leciona Ingo Wolfgang Sarlet, é a “(...) qualidade intrínseca e dis- tintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co–responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os de- mais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida.” (SARLET, 2011, p. 73). Assim, a dignidade é um valor inerente à personalidade das pessoas, que se manifesta na autodeterminação consciente e responsável da própria vida, cujos alicerces são o respeito e valorização. Ao eleger a dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil e, consequen- temente, do próprio Estado Democrático de Direito, o legislador constituinte externou seu desejo de propor- cionar um mínimo de invulnerabilidade às liberdades individuais, seja perante outras pessoas ou diante do próprio controle do Estado, fomentando, assim, a unidade dos direitos e garantias fundamentais. A investigação criminal, por força de sua natureza exploratória, mesmo baseada nos mais rigorosos meca- nismos científicos de reconstrução factual e nos limites constitucionais, sempre possuirá caráter invasivo, colidindo, assim, com as liberdades individuais, o que exigirá dos integrantes das equipes de investigação, como tutores de direitos e garantias fundamentais, o uso oportuno e necessário dos métodos e técnicas investigativas franqueados pela legislação pátria, produzindo, apenas e tão somente, a necessária invasão na intimidade e privacidade das pessoas, ou seja, aquela imprescindível ao pleno esclarecimento da prática delitiva, sem, contudo, ultrapassar o limite imposto pela dignidade humana. Apresentação do módulo Seja bem-vindo(a) ao módulo “Investigação criminal: aspectos conceituais”! Antes de iniciar o conteúdo deste módulo, relembre os dois principais conceitos que você estudou no módulo anterior: O Estado Democrático de Direito exige, para a sua completa efetividade, que a segurança pública, em especial no que tange à investigação criminal, esteja vocacionada a tutelar direitos e garantias funda- mentais, e que, assim o fazendo, proteja e mantenha o exercício pleno da cidadania. A investigação criminal é instrumento de defesa da cidadania e possui dupla função: prevenir e reprimir práticas delitivas. Agora, dando continuidade ao curso, você estudará as definições, as finalidades, os sistemas e a clas- sificação da investigação criminal. Preparado(a)? Vamos lá! Objetivos do módulo Ao final deste módulo, você será capaz de: Definir investigação criminal; Explicar as finalidades da investigação criminal; Compreender os sistemas de investigação criminal; Listar as modalidades de investigação criminal segundo o momento de sua execução. Estrutura do módulo Este módulo é composto pelas seguintes aulas: Aula 1 – Definições, finalidades e sistemas de investigação criminal Aula 2 – A investigação criminal segundo o momento da sua realização MÓDULO 2 A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL: ASPECTOS CONCEITUAIS 11 Aula 1 – Definições, finalidades e sistemas de investigação criminal Como você estudou anteriormente, a investigação criminal é uma das ferramentas utilizadas pela polícia judiciária para a proteção integral da cidadania, e que, protegendo e defendendo direitos e garantias fun- damentais, salvaguarda o Estado Democrático de Direito e, consequentemente, amplia a sensação de segu- rança. Todavia, você pode estar se perguntando: o que é a investigação criminal? Povoam nosso imaginário aqueles incríveis detetives dos filmes e da literatura policial que tudo podem em nome da lei. Imagem produzida pelo conjunto de características preconcebidas de algo ou alguém, que só existe na imaginação das pessoas. Contudo, essa concepção da atividade investigativa está equivocada! Pelo contrário, a lei é apenas um dos limites a serem respeitados pelo policial, sendo necessário também que suas condutas profissionais estejam embasadas nos mais elevados valores éticos e morais, pois seu papel, como dito preliminarmente, ultrapassa o esclarecimento da materialidade, da autoria e das circunstâncias do delito, alcançando o status de tutor da cidadania. Sob a ótica romântica, muito bem retratada pelas empresas cinematográficas, investigar é sinônimo de emoção, fruto do misterioso labirinto percorrido para o esclarecimento de um crime. Entretanto, a atividade investigativa, por seu importante papel social, requer conhecimentos, habi- lidades e atitudes capazes de produzir uma reconstrução científica e verdadeira daquilo que se pretende elucidar, ou seja, do fato, em tese, criminoso. “Ao contrário do que muitos pensam, a investigação não visa tão somente a obter indícios para a acusação, mas sim apurar a verdade, seja ela a favor da acusação ou da defesa.” (CABETTE, 2003, p. 197). Diante disso, surge a pergunta: “O que é, então, investigar?” Do ponto de vista sinonímico, ao se buscar as acepções dicionarizadas, encontra-se, entre outras, as do Aurélio: Referente à sinonímia ou sinônimo Investigar. [ Do Lat. Investigare. ] V. t. d. 1. Seguir os vestígios de. 2. Fazer diligências para achar; pesquisar, indagar, inquirir: investigar as causas de um fato. 3. Examinar com atenção; esquadrinhar. (Ferreira, 1975, p.781). Veja que todas as acepções são compatíveis com o processo de busca dos elementos objetivos e subjetivos que sustentarão a reconstrução factual, são eles: seguir os vestígios; seguir os vestígios; fazer diligências para achar; pesquisar; 12 indagar; inquirir; examinar com atenção; esquadrinhar. Então, pode-se concluir que: Investigar é um conjunto de atos interligados que visam a elucidar um fato obscuro. E, quando esse fato que se pretende aclarar é uma possível prática delitiva, a investigação passa a ser qualificada como cri- minal. O procedimento apresenta a característica de ser composto de atos ordenados de forma metódica, de maneira que um pressupõe o próximo, até o último ato da série, distinguindo-se, por isso, de outras realidades de formação sucessiva. A ideia de ordem insere-se no contexto da realidade unitária procedimental e a explica. (FERNANDES, 2005, p. 33) 1.1. Definições de investigação criminal Anteriormente, você se deparou com a definição do termo “Investigar”, dada pelo dicionário Aurélio, certo? Assim, o mesmo Aurélio valida essa compreensão sinonímica da ação investigativa quando registra: Investigação. [Do lat. Investigatione.] S. f. 1. Ato ou efeito de investigar; busca, pesquisa. 2. Indagação minuciosa; indagação, inquirição. (1975, p. 781). Diante disso, você deve ter percebido que tanto as acepções do verbo que expressa o agir e o sentir dos executores, como as do nome, que expressamo resultado daquelas ações, nos levam à percepção de que a investigação é um conjunto de atos que se complementam. Então, surge um novo questionamento: como definir investigação criminal? Diferente do nosso país, que não prevê uma definição legal para a investigação criminal, Portugal, por força da Lei de Organização da Investigação Criminal (Art. 1º da Lei nº 49, de 27 de agosto de 2008), define inves- tigação criminal como: Acesse: http://www.policiajudiciaria.pt/PortalWeb/content?id={CBD3F401-5D03-492E-9FCF-9396E- D545D27} “Conjunto de diligências que, nos termos da lei processual penal, se destinam a averiguar a existência de um crime, determinar os seus agentes e a sua responsabilidade e descobrir e recolher as provas, no âm- bito do processo”. Doutrinariamente e sob a ótica jurídica, várias são as definições de investigação criminal. Entretanto, a maioria delas atribui caráter preparatório e informativo à acepção, isso ao externar que ela se destina a preparar a ação penal. Veja, por exemplo, as definições a seguir: [A investigação criminal é uma] atividade estatal de persecução criminal destinada a preparar a ação penal, que apresenta caráter preparatório e informativo, pois o seu objetivo é levar ao órgão encarregado da ação penal os elementos necessários para a dedução da pretensão punitiva em juízo. (MARQUES, 1997, p. 139) 13 (...) podemos conceituar a investigação criminal preliminar como o conjunto de atividades realizadas concatenadamente por órgãos do Estado; a partir de uma notícia-crime ou atividade de ofício; com caráter prévio e de natureza preparatória com relação ao processo penal; que pretende averiguar a autoria e as circunstâncias de um fato aparentemente delitivo, com o fim de justificar o exercício da ação penal ou o ar- quivamento (não processo). (LOPES JUNIOR, 2006, p. 40) Outros, porém, acrescentam que a investigação criminal, além de preparar e informar, também se destina a amparar o convencimento sobre a viabilidade da ação penal, evitando, assim, que inocentes sejam submetidos ao processo penal, ou que fatos que não caracterizam crime sejam submetidos, desnecessaria- mente, à ação penal. Marta Saad (2004, p. 160) concorda com a fala de Francesco Carnelutti (2001, p. 113) quando ele afir- ma que: “a investigação não se faz para comprovar um delito, mas para excluir uma imputação aventurada”. No mesmo sentido, Calabrich afirma que: estando entre as funções do Estado a proteção de direitos fundamentais e a promoção da Justiça, a notícia da prática de um ilícito penal faz surgir para este o dever de, por meio de seus órgãos constitucional e legalmente legitimados, apurar o fato, de modo a confirmá-lo ou não, e de promover a ação penal corres- pondente, se for o caso. (CALABRICH, 2007, p. 50) Mazini, em 1951, já afirmava que a investigação criminal tinha... a finalidade característica de recolher e selecionar o material que haverá de servir para o juízo, elimi- nando todo o que resulte confuso, supérfluo ou inatendível. Com isso, evitar-se-iam os debates inúteis e se prepararia um material selecionado para os debates necessários. (MAZINI, 1951, p. 173) Assim, diante do exposto, pode-se afirmar que: Investigação criminal é o conjunto de procedimentos interdisciplinares, de natureza inquisitiva, pre- servadora e preparatória, que busca, de forma sistematizada, integrada e complementar, dentro de parâme- tros éticos e legais, a produção de elementos objetivos e subjetivos capazes de reconstituir o fato apurado. Assim sendo, a investigação criminal proporcionará a transição entre a mera possibilidade (notícia-crime) para a verossimilitude (imputação/indiciamento) e posterior probabilidade (indícios racionais), necessária para adoção de medidas cautelares e para receber a ação penal. (Lopes Junior, 2005, p. 41) Amplie seus conhecimentos! Quer saber sobre a história da investigação criminal no Brasil? Acesso o arquivo “Histórico da Inves- tigação Criminal no Brasil”, que está nos anexos do curso. 1.2. Finalidades da investigação criminal A produção da prova penal no Brasil ocorre, em grande parte, na fase que antecede ao processo, denominada de pré-processual, cujo instrumento para a sua efetividade é o inquérito policial. Daí que a fina- lidade da investigação criminal é coincidente com a finalidade daquele procedimento, e para fins didáticos, será dividida em três eixos: remota, mediata e imediata. Finalidade remota: aplicação da lei penal e tutela dos direitos e garantias fundamentais do cidadão. Finalidade mediata: produção de subsídios para a promoção da ação penal. Finalidade imediata: produção de elementos objetivos e subjetivos acerca da autoria e da materia- lidade do crime, possibilitando, assim, o indiciamento do autor. Portanto, pode-se concluir que: A investigação criminal, realizada por meio do inquérito policial, dentro dos parâmetros constitucio- nais da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da eficiência e do respeito à dignidade humana, tem por finalidade formar, com base em técnicas e métodos específicos, um conjunto probatório coeso, coerente e robusto quanto à materialidade e à autoria delitiva, visando a formar um juízo de probabilidade, o qual embasará, quando for o caso, uma ação penal, integrando, assim, a persecução criminal. 1.3. Sistemas de investigação criminal Para que você possa compreender melhor a investigação criminal, e mais, entender sua importância para a efetividade da justiça penal, é necessário que saiba distinguir os sistemas de investigação criminal existentes. A análise apresentada a seguir, está alicerçada no direito comparado e, por força dos objetivos do curso, focará os sistemas de investigação criminal com base na diversidade de seus titulares, quais sejam: Sistema do Juiz Investigador (Juizados de Instrução); Sistema do Promotor Investigador; e Sistema da Polícia Investigadora. 1.3.1. (Juizado de Instrução) O Sistema do Juiz Investigador No sistema do Juiz Investigador, adotado pela França e Espanha, segundo leciona Aury Lopes Junior (2003, p. 71), o juiz instrutor é a máxima autoridade investigativa, pois ele pode, por sua própria iniciativa e sem necessidade de provocação – salvo nos delitos privados – determinar a instauração da investigação criminal, dirigindo-a e/ou realizando-a, sendo que, para tanto, terá o auxílio da polícia judiciária, a qual lhe está diretamente subordinada no plano funcional. Portugal e Itália adotaram o Sistema do Juiz Investigador até 1987 e 1988, respectivamente, quando então passaram a utilizar o Sistema do Promotor Investigador. O juiz instrutor poderá, dentre outras medidas de cunho investigativo, determinar: A prisão cautelar do suposto autor; A quebra do sigilo bancário e fiscal; Outras medidas cautelares; A interceptação telefônica; A busca e apreensão domiciliar. Eles ainda poderão: Interrogar o suspeito Ouvir testemunhas Requisitar exames periciais Determinar diligências etc. 15 Ou seja, a iniciativa probatória está inteiramente nas mãos do juiz instrutor, e mais, a participação da defesa e da acusação, em especial no que tange à solicitação de diligências, ficará adstrita à sua análise, pois cabe a ele deferi-las ou não, não restando ao Ministério Público qualquer poder instrutório. Para evitar os riscos decorrentes de uma suposta contaminação pelo seu envolvimento direto com os elementos investigativos – o que poderia gerar parcialidade no julgamento, uma vez formado seu conven- cimento acerca da existência do crime e sobre sua autoria – o juiz instrutor, como não possui poderes para decidir a questão, enviará o procedimento investigativo a uma composição de julgamento, a qual terá a incumbência de julgá-lo. Referido sistema, conforme descrito anteriormente, confere uma grande gama de poderes a uma única pessoa, a qual, durante a investigação criminal, é capaz de restringir direitos e garantias fundamen- tais e, ao mesmo tempo, avaliar a legalidade de suas medidas, o que, segundoas regras estabelecidas pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, não é admissível, isso por força do sistema de freios e contrapesos, o qual traz equilíbrio e segurança às relações processuais. 1.3.2. O Sistema do Promotor Investigador No sistema do Promotor Investigador, adotado na Itália, Alemanha, Portugal e Estados Unidos da América, o promotor de justiça é o diretor da investigação criminal, cabendo-lhe receber a notitia criminis diretamente ou, se for o caso, por intermédio da polícia judiciária, a qual poderá estar funcionalmente su- bordinada ao primeiro, como ocorre em Portugal, ou apenas possuir o dever legal de auxiliá-lo, não havendo qualquer vínculo de subordinação, como ocorre na Alemanha, Itália e Estados Unidos. Todavia, diferentemente do sistema do juiz investigador, o parquet não possui poderes para de- terminar medidas constritivas de direitos e garantias fundamentais, as quais dependem de autorização judicial, e mais, os atos praticados pelo promotor de justiça no curso da investigação criminal possuem ca- ráter administrativo, ou seja, são de limitado valor probatório, devendo, assim, serem renovados em juízo, quando então serão submetidos ao contraditório e à ampla defesa. O Sistema do Promotor Investigador apesar de não atribuir tantos poderes a uma mesma pessoa, como ocorre no sistema do juiz investigador, pode eventualmente abalar o sistema de freios e contrapesos estabelecido pelo legislador constituinte, pois sendo o parquet uma das partes no processo penal (respon- sável, inclusive, pelo oferecimento da denúncia), a condução da investigação criminal poderia se contami- nar com o desejo único de obtenção de elementos subjetivos e objetivos suficientes para o oferecimento da denúncia, entretanto, como tratado na apresentação do curso, a finalidade precípua da investigação criminal, como tutora de direitos e garantias fundamentais, é a obtenção da verdade sobre determinado fato, o qual poderá, ou não, caracterizar um crime. Segundo André Rovegno (2005, p. 117), citado por Claudio Geoffroy Granzotto (http://jus.com.br), “em grande parte onde se adota a figura do promotor diretor do procedimento preliminar, o que ocorre na prática é o fenômeno da policização integral da investigação, num quadro em que o parquet só tomará contato com a investigação quando a polícia o considerar concluído”. 1.3.3. O Sistema da Polícia Investigadora No sistema da Polícia Investigadora, adotado pelo Brasil, cabe à polícia judiciária a direção da investigação criminal, sendo esta a titular do procedimento investigativo criminal (diga-se, do inquérito policial) o qual será presidido por uma autoridade policial, ou seja, por um delegado de polícia. IC-M02-S36 Sobre o inquérito policial, acesse o arquivo “DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941OU- TUBRO DE 1941”, que está nos anexos do curso. 16 Art. 144, § 4º da CF/88 - “às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares”. Segundo leciona Marcos Kac (2004, p. 166): “no sistema adotado no Brasil a atuação do Ministério Público é derivada da polícia judiciária, ou seja, não tem o poder de condução direta da investigação penal, sendo esta exclusiva da polícia judiciária.” Para tanto, em pleno respeito ao sistema de freios e contrapesos disciplinado pela Constituição da República Federativa do Brasil, o legislador constituinte estabeleceu que a autoridade policial não possui poderes para determinar medidas constritivas de direitos e garantias fundamentais, as quais dependem de autorização judicial, e mais, da manifestação do parquet, cabendo ao último, além de outras atribuições: Sobre as atribuições, acesse o arquivo “Constituição Federal Art. 129”, que está nos anexos do curso. Exercer o controle externo da atividade policial e o custus legis (fiscal da lei); Requisitar diligências investigatórias; e Requisitar a instauração de inquérito policial. Tudo isso, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais. Um dos traços mais marcantes do Sistema da Polícia Investigadora diz respeito à sua neutralidade em relação à futura ação penal, pois a autoridade policial não possui qualquer interesse ou participação na acusação ou no julgamento, e como tutor de direitos e garantias fundamentais, seu único desejo reside na busca pelo esclarecimento da verdade, para a qual faz uso de técnicas e métodos investigativos. Ademais, é justamente essa imparcialidade que garante a igualdade processual. Segundo preceitua Aury Lopes Junior: Atualmente, os países que adotam o sistema do promotor investigativo, os fizeram em substituição ao ultrapassado modelo do juizado de instrução, não tendo ao menos podido vislumbrar a direção da inves- tigação nas mãos da polícia, tendo em vista a inexistência da figura do delegado de polícia, agente bachare- lado em Direito, com vasto conhecimento jurídico e formação técnica voltada à apuração de crimes. Aula 2 – A investigação criminal segundo o momento da sua realização Olá! Seja bem-vindo(a) a esta nova aula! Na aula anterior você aprendeu definições, finalidades e sistemas de investigação criminal. Já, agora, você irá estudar sobre o momento da realização da investigação criminal. Antes disso, porém, vamos relembrar sua definição: A investigação criminal é um conjunto de procedimentos interdisciplinares, de natureza inquisitiva, preservadora e preparatória, que busca, de forma sistematizada, integrada e complementar, dentro de parâ- metros éticos e legais, a produção da prova de uma infração penal. Preparado(a) para dar sequência ao aprendizado? Então, vamos lá! As provas de uma infração penal surgirão da análise contextual dos elementos objetivos e subjetivos angariados pela investigação criminal, que uma vez submetidos ao contraditório e à ampla defesa (durante a fase processual), embasarão a decisão judicial, a qual será externada na sentença penal. 17 Objetivos: Vestígios encontrados na cena do crime ou em objetos relacionados com a prática deliti- va. Subjetivos: Exemplos: o depoimento de testemunhas, as declarações de vítimas ou suspeitos, o interroga- tório do suposto autor do delito, acareações etc. A antiga vertente que atribuía apenas aos investigadores (ou profissionais) de polícia, mesmo que sob a coordenação de um delegado de polícia, a responsabilidade pela efetividade da investigação criminal, diante da nova concepção surgida, a qual lhe confere caráter interdisciplinar e complementar, e devido a sua importância para a proteção e manutenção do estado democrático de direito, já não é mais aceita. A investigação criminal, por força da estrutura de polícia judiciária adotada pela legislação pátria e da complexidade de suas ações, exige que delegados de polícia, investigadores (ou profissionais) de polícia e escrivães de polícia atuem em sinergia, formando uma célula investigativa, que será denominada a partir de agora de equipe de investigação, a qual deverá ser coesa e estar focada na obtenção de elementos objetivos e subjetivos capazes de reconstituir, com cientificidade, os fatos investigados. Ação simultânea, em comum e coordenada de todos os atores e atrizes envolvidos na investigação, para construção da prova. O delegado de polícia, diante do que foi exposto anteriormente e em decorrência das regras estabe- lecidas pela legislação processual penal, além de integrar a equipe de investigação, terá a responsabilidade de coordená-la, pois mesmo que grande parte das decisões adotadas durante o curso da investigação crimi- nal sejam compartilhadas e delegadas, algumas, por força dos referidos diplomas legais (como, por exemplo, as que se referem a medidas cautelares e a determinadas técnicas investigativas), são autocráticas e, conse- quentemente, privativas da autoridade policial, como você estudará mais a frente, no curso de InvestigaçãoCriminal 2. Incluindo, aqui, leis especiais como, por exemplo, a Lei n° 11.343/06, que trata de drogas ilegais, a Lei n° 12.850/13, que versa sobre organizações criminosas, a Lei n°9.613/98, que aborda a lavagem de capitais, dentre outras. Acesse a “Lei n° 11.343/06” por meio do link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004- 2006/2006/lei/l11343.htm. Acesse a “Lei n°9.613/98” por meio do link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htm. No que tange à produção dos elementos subjetivos, mesmo que grande parte seja materializado nos cartórios da organização policial (por intermédio de entrevistas, interrogatórios, acareações, reconheci- mentos de pessoas e coisas, dentre outros), sua produção está intimamente relacionada com as diligências policiais realizadas pelos integrantes da equipe de investigação, deflagradas a partir da ciência da prática de fatos que caracterizam, em tese, uma infração penal (notitia criminis), cuja internalização nos inquéritos po- liciais se dá por intermédio de relatórios, em especial o de investigação em local de crime e os de diligência (ou de missão policial), os quais subsidiarão as providências de polícia judiciária subsequentes. Os elementos objetivos (ou materiais), em contrapartida, são produzidos por intermédio da atividade pericial, realizada por peritos, os quais não possuem, em regra, subordinação funcional direta a autoridades policiais, porém, por força do disposto no Art. 6°, Inciso VII do Código de Processo Penal (Decreto-Lei n° 3.689/41, de 3 de outubro de 1941), não poderão recusar a realização de exames periciais, exceto quando caracterizarem uma ilegalidade. 18 A grande maioria dos órgãos de criminalística estaduais já se encontra desvinculada das Polícias Judiciárias Civis, entretanto, Amazonas, Acre, Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais, Piauí, Rio de Janeiro, Rondônia, Distrito Federal e Roraima ainda mantém a criminalística vinculada funcionalmente às suas respectivas Polícias Civis. Para saber sobre o Art. 6°, Inciso VII do Código de Processo Penal (Decreto-Lei n° 3.689/41, de 3 de outubro de 1941), acesse o arquivo “Art. 6º”, que está nos anexos do curso. Veja agora um exemplo que ilustra a recursa de realização de uma exame pericial por ele caracterizar uma ilegalidade. Exemplo... Fulana, telefonista de uma empresa do ramo de calçados, a partir de 08/05/13, após romper o re- lacionamento amoroso que mantinha com Ciclano, passou a receber inúmeras ameaças de morte, todas efetivadas por meio do telefone fixo da empresa. A equipe de investigação, acreditando que o autor das ameaças seria Ciclano, optou por abordá-lo, quando então seu aparelho celular foi formalmente apreendido. Em ato contínuo, a autoridade policial, buscando verificar se as ligações recebidas pela vítima parti- ram do celular de Ciclano, requisitou exame pericial no aparelho, determinando, dentre outras ações, que o perito levantasse e descrevesse as ligações originadas do celular submetido a exame pericial, de 08/05/13 até a data da apreensão. O perito, uma vez não existindo ordem judicial para tanto, se recusou em realizar o referido exame pericial, pois este violaria a privacidade de Ciclano, direito este protegido pela carta magna e que só pode sofrer violação em casos específicos e por força de determinação judicial. A investigação criminal, mesmo sendo um conjunto de procedimentos, guarda em sua essência a indivisibilidade, pois é da interligação dos elementos objetivos e subjetivos que a prática delitiva será re- construída, aflorando, daí, sua dinâmica, autoria (motivação, meios e oportunidade) e materialidade, além de todas as circunstâncias que lhe dizem respeito. Entretanto, para fins didáticos, a investigação criminal será fracionada em dois momentos: investiga- ção criminal preliminar e investigação criminal de seguimento. O fracionamento da investigação criminal em “investigação preliminar” e “investigação de seguimento” foi apresentado pelo professor Guaracy Mingardi em 2005, quando da divulgação do relatório final da pesquisa denominada “Investigação de Homicídios: construção de um modelo”, a qual é um dos produtos do Concurso Nacional de Pesquisas Aplicadas em Justiça Criminal e Segurança Pública, promovido pela Senasp/MJ no referido ano. Dê continuidade ao curso para descobrir mais informações sobre esses dois momentos. Para saber mais... Quer saber mais sobre esse tema? Leia o texto Investigação de Homicídios: construção de um modelo, de Guaracy Mingardi, que está nos anexos do curso. 2.1. Investigação criminal preliminar A investigação criminal preliminar diz respeito às ações investigativas deflagradas pela equipe de investigação logo após a notitia criminis, e engloba, dentre outras medidas: o deslocamento ao cenário do crime; a preservação e o isolamento do local; a produção de elementos objetivos e subjetivos (por meio da utilização de métodos e técnicas investigativas); a liberação do local; as pesquisas iniciais sobre as vítimas, testemunhas e suspeitos; além de outras diligências investigativas preambulares, as quais perdurarão até a efetiva entrega do relatório de investigação em local de crime (e dos documentos que o embasam) à autoridade policial com atribuição para apurar os fatos sob análise. Acesse o “Relatório de investigação em local de crime”, que está nos anexos do curso. O exemplo a seguir demonstra uma situação de investigação criminal preliminar. Estude-o com aten- ção. Exemplo... A equipe de investigação de determinada delegacia de polícia, composta por quatro policiais (dois caracterizados: delegado de polícia e um dos investigadores de polícia; e dois descaracterizados: investiga- dores de polícia), assim que toma conhecimento da prática de um homicídio culposo na direção de veículo automotor, se desloca ao local. No cenário do crime, ao verificarem que o perímetro de isolamento não era adequado, os policiais caracterizados providenciam a sua ampliação, bem como, em seguida, levantam todos os dados e informa- ções coletados pelos policiais militares que preservavam o local, acionando, em ato contínuo, a criminalísti- ca. Os policiais descaracterizados se inserem entre as pessoas que estavam na parte externa do períme- tro de isolamento e passam a coletar, de maneira dissimulada, dados e informações acerca do acidente de trânsito, quando então descobrem que o condutor do veículo automotor e causador do acidente não era aquele que havia se apresentado (Ciclano) aos policiais militares (o qual era, na verdade, um dos passageiros do carro), mas sim um terceiro (Fulano), o qual foi retirado do local por familiares, pois estava aparentemente embriagado. Após uma análise detalhada do local, os policiais caracterizados constatam que uma das câmeras existentes em um supermercado captou as imagens do acidente, as quais confirmam as informações coleta- das até então, e mais, com o auxílio dos policiais descaracterizados, identificam três testemunhas presenciais do acidente de trânsito, as quais são qualificadas e conduzidas à delegacia de polícia, juntamente com os demais envolvidos, para serem ouvidos (depois de esgotadas as medidas investigativas e de realizados os exames periciais - os quais foram acompanhados pela autoridade policial –, ou seja, após a liberação do local de crime). Em diligências subsequentes, a equipe de investigação identifica o condutor do veículo automotor e provável causador do fatídico, o qual é devidamente qualificado. Entretanto, por estar homiziado, não é encontrado. Por fim, decorridos três dias, a equipe de investigação, depois de realizar todas as pesquisas e dili- gências necessárias, entrega à autoridade policial com atribuição para apuração dos fatos o respectivo rela- tório de investigação em local de crime, o qual contemplará todos os dados e informações coletados durante a investigação criminal preliminar. 2.2. Investigação criminal de seguimento A investigação criminal de seguimentorefere-se às ações investigativas realizadas após a entrega do relatório de investigação em local de crime (e dos documentos que o embasam) à autoridade policial com atribuição para apurar os fatos, cujo ponto de partida será os dados e informações (elementos objetivos e subjetivos) coletados durante a investigação preliminar, e o término, a reconstrução pormenorizada daquilo 20 que se pretendia esclarecer. Atenção! Assim como ocorre em uma corrida com bastão, entre a investigação criminal preliminar e a investi- gação criminal de seguimento não há interrupção. O bastão, nesse caso, representa os dados e informações coletados e registrados pela equipe de investigação preliminar, que serão repassados à equipe de investiga- ção de seguimento por meio do relatório de investigação em local de crime. A seguir, você verá um novo exemplo, o qual ilustra uma investigação criminal de seguimento em andamento. Vamos lá! Exemplo... Tomando como base o exemplo anterior (suposto homicídio culposo na direção de veículo automo- tor), a equipe de investigação de seguimento, ao dar cumprimento às respectivas ordens de missão policial, identificaram testemunhas que presenciaram Fulano ingerindo bebidas alcoólicas em um bar, as quais foram intimadas e prestaram depoimento na delegacia de polícia, quando então afirmaram que viram Fulano be- bendo cervejas no “Bar da Alegria”, e que depois de aproximadamente duas horas, este saiu do local condu- zindo o veículo automotor marca GM, modelo Corsa, cor branca, o qual tinha como passageiro Ciclano. Referidas testemunhas externaram também que Fulano estava embriagado e que saiu ziguezagueando com o carro, tudo indicando que acabaria se envolvendo em um acidente de trânsito, pois não tinha condições para conduzir um carro. Os laudos periciais lavrados pela criminalística confirmaram que o causador do acidente de trânsito foi o condutor do veículo automotor marca GM, modelo Corsa, cor branca, o qual estava em alta velocidade e não obedeceu à sinalização local. Diante do apurado, a equipe de investigação, depois de realizar novas diligencias, logrou encontrar Fulano, o qual foi intimado e, durante interrogatório, depois de ver as imagens coletadas pela câmera do supermercado, acabou confirmando a prática delitiva, isso ao externar que na data dos fatos havia ingerido grande quantidade de cerveja no “Bar da Alegria”, e que saiu do local conduzindo o seu carro, um corsa branco, o qual tinha como passageiro Ciclano, e que depois de invadir uma preferencial, por estar em alta velocidade, não conseguiu parar o carro e acabou colidindo com a motocicleta da vítima, causando a sua morte. Externou ainda que depois do acidente, como estava embriagado, foi retirado do local por seu irmão, que o manteve escondido em sua casa por dois dias. Atenção! Perceba que as diligencias realizadas pela equipe de investigação de seguimento se basearam nos dados e informações coletados pela equipe de investigação preliminar, a qual apresentou uma hipótese para o crime, que uma vez testada, possibilitou a reconstrução dos fatos. Finalizando... Que tal revisar o que você estudou neste módulo? Veja só: A investigação criminal diz respeito a um conjunto de procedimentos interdisciplinares, de nature- za inquisitiva, preservadora e preparatória, cuja finalidade é formar, com base em técnicas e métodos espe- cíficos, um acervo probatório coeso, coerente e robusto quanto à autoria e materialidade delitiva, visando a formar um juízo de probabilidade, o qual embasará, quando for o caso, uma ação penal. São três os sistemas de investigação criminal – Juiz Investigador, Promotor Investigador e Polícia Investigadora –, e que o Brasil adota o Sistema da Polícia Investigadora, cabendo à polícia judiciária a direção da investigação criminal, sendo esta a titular do procedimento investigativo criminal – inquérito policial, o qual será presidido por um delegado de polícia. A investigação criminal deve, obrigatoriamente, ser realizada por uma equipe de investigação (de- 21 legado de polícia, escrivão de polícia e investigadores de polícia) coesa e focada na obtenção de elementos objetivos e subjetivos capazes de reconstituir, com cientificidade, os fatos investigados. A investigação criminal é um procedimento indivisível, mas que, para fins didáticos, é fracionada em dois momentos: investigação criminal preliminar e investigação criminal de seguimento. A investigação criminal preliminar se inicia com a notitia criminis e perdura até a entrega do relató- rio de investigação em local de crime à autoridade policial com atribuição para apuração dos fatos, quando então se inicia a investigação criminal de seguimento, cuja conclusão se dará com a reconstrução pormeno- rizada daquilo que se pretendia esclarecer. Parabéns! Você finalizou o conteúdo desse módulo! Agora, realize os exercícios adiante para dar continuidade ao seu aprendizado. Exercícios Com base nos conhecimentos adquiridos, realize as quatro atividades propostas a seguir. Atividade 1: Você estudou que a finalidade da investigação criminal se divide em três eixos: remota, mediata e imediata. Numa avaliação crítica, descreva o efeito prático desse conhecimento para a investigação criminal. Atividade 2: Analise a situação hipotética apresentada abaixo e identifique, segundo o momento da execução, qual investigação criminal foi desenvolvida pela equipe de investigação. Durante uma ocorrência de roubo a um supermercado, os infratores, depois de recolherem dinheiro e cheques dos caixas, trancam os funcionários em um banheiro e, no instante que empreendiam fuga, são surpreendidos por um vigilante, o qual acaba sendo alvejado e morto. Após a fuga, a Polícia Militar é acionada, e, minutos depois, comparecem ao local dois policiais mili- tares, os quais imediatamente o preservam e isolam, bem como, em ato contínuo, comunicam o ocorrido à equipe de investigação plantonista, que também comparece ao local e, em seguida, aciona a criminalística. A equipe de investigação plantonista, dividida em policiais caracterizados e descaracterizados, inicia o levantamento de dados e informações acerca dos fatos, o que perdura até o término das atividades peri- ciais. Com o término das atividades periciais, o corpo do vigilante é encaminhado ao IML, onde é subme- tido a necropsia. A equipe de investigação plantonista, depois de concluir as diligências preliminares, entrega à au- toridade policial com atribuição para apuração dos fatos o respectivo relatório de investigação em local de crime, a qual, logo após, instaura inquérito policial para apurar os fatos. 22 Atividade 3: a. ( ) Quanto à finalidade mediata da investigação criminal, marque a afirmativa correta: b. ( ) Corresponde à aplicação da lei penal e a tutela dos direitos fundamentais do cidadão. c. ( ) Corresponde à utilização do processo investigatório para aplicação da lei penal. d. ( ) Corresponde à produção de subsídios para a promoção da ação penal. e. ( ) Corresponde à produção de elementos objetivos e subjetivos sobre as circunstâncias da mate- rialidade e da autoria das infrações penais, para indiciamento do autor. Atividade 4: Assinale a afirmativa correta: a. ( ) A classificação da investigação criminal quanto ao momento de execução corresponde apenas às atividades investigativas desenvolvidas no local do crime. b. ( ) A investigação criminal preliminar se inicia com a instauração do inquérito policial pelo dele- gado de polícia. c. ( ) Quanto ao momento da execução, a investigação criminal pode ser classificada em investigação criminal cartorária e investigação criminal de seguimento. d. ( ) O depoimento das testemunhas nos autos do inquérito policial é um exemplo de investigação criminal de seguimento. 23 Gabarito Feedback da atividade 1. A investigação criminal está inserida em um sistema jurídico que a contempla com finalidade tridi- mensional, composta pela produção de elementos objetivose subjetivos capazes de fundamentar o indicia- mento do autor pela autoridade policial (finalidade imediata), os quais subsidiarão o promotor de justiça ou o ofendido na promoção da ação penal (finalidade mediata) e, ao final, possibilitarão a aplicação da lei penal (finalidade remota), proporcionando, assim, justiça criminal e, consequentemente, paz e segurança social, tão necessários ao pleno exercício da cidadania e à existência do Estado Democrático de Direito. Percebendo esse alcance da investigação criminal, os profissionais de segurança pública, em especial os integrantes das equipes de investigação, saberão que sua atividade, por mais simples que possa parecer, possui enorme relevância social, pois é por meio dela que direitos e garantias fundamentais são tutelados, garantindo, assim, o exercício pleno da cidadania, motivo pelo qual jamais poderá ser negligenciada. Feedback da atividade 2. A situação hipotética apresentada descreve nitidamente uma investigação criminal preliminar, a qual inicia-se com a notitia criminis (roubo ocorrido ao supermercado) e perdura até a entrega do relatório de investigação em local de crime (e demais documentos que o embasam) à autoridade policial com atribuição para apurar os fatos. Dentre as ações que a compõe, pode-se citar, dentre outras, as que seguem: deslocamento ao cenário do crime; preservação e isolamento do local (incluindo, aqui, a correção do perímetro de isolamento, que poderá ser diminuído – por motivos de segurança –, ou ampliado – para proteger vestígios detectados pelos peritos, pela equipe de investigação criminal ou outros profissionais de segurança pública que estiverem no local); produção de elementos objetivos e subjetivos (por meio da utilização de métodos e técnicas inves- tigativas); liberação do local; e pesquisas iniciais sobre as vítimas, testemunhas e suspeitos. Resposta da atividade 3:: afirmativa c). Resposta da atividade 4: afirmativa d). 24 Apresentação do módulo Bem-vindo(a) ao Módulo “Investigação criminal: princípios fundamentais.” Lembre-se que no módulo anterior você estudou que a investigação criminal possui finalidade tridi- mensional, sendo elas: 1. Finalidade imediata: Produzir elementos objetivos e subjetivos capazes de fundamentar o indi- ciamento do autor pela autoridade policial; 2. Finalidade mediata: Subsidiar o promotor de justiça ou o ofendido na promoção da ação penal; 3. Finalidade remota: Produção da Verdade. Vale a pena relembrar ainda que ela não se detém às duas primeiras, sendo portanto a Produção da verdade, sua principal finalidade, e por ela, a obtenção de justiça penal, sendo o respeito aos direitos humanos, consubstanciados nos direitos e garantias fundamentais, e a plena efetividade dos mais elevados preceitos éticos e morais, o alicerce de sua existência. Ainda no módulo anterior, você pôde observar que no Brasil se adota o sistema da polícia investiga- dora, e que a investigação criminal, devido a sua complexidade, deverá ser conduzida por uma equipe de investigação, cuja coordenação, por força das regras processuais penais, recairá sobre o delegado de polícia. IC-M03-S05 Dando continuidade, você estudará o significado dos princípios, e mais, conhecerá a importância dos princípios constitucionais que regem a investigação criminal para a tutela dos direitos e garantias funda- mentais, a proteção do Estado Democrático de Direito e, consequentemente, o livre e seguro exercício da cidadania. O estudo deste módulo lhe auxiliará a compreender que o cumprimento dos princípios operacionais da investigação criminal está diretamente relacionado com o sucesso da atividade investigativa. Preparado(a)? Vamos lá! Objetivos do módulo Ao final deste módulo, você será capaz de: Definir o que são princípios; Listar os princípios constitucionais que regem a investigação criminal sob o aspecto normativo; Nomear os princípios operacionais que regulam a investigação criminal sob o aspecto operacional. Estrutura do módulo Este módulo é composto pelas seguintes aulas: Aula 1 – Princípios Aula 2 – Princípios constitucionais da investigação criminal Aula 3 – Princípios operacionais da investigação criminal MÓDULO 3 INVESTIGAÇÃO CRIMINAL: PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS 25 Aula 1 – Princípios O procedimento investigativo, assim como qualquer outro ato da administração pública, para ser capaz de cumprir com a sua finalidade, precisa estar alicerçado em princípios específicos, que o regem e sustentam. Pode-se definir, de uma maneira geral, os Princípios, como: Regras básicas que determinam condutas obrigatórias e impedem a adoção de procedimentos com eles incompatíveis. São os fundamentos de determinados procedimentos, a base sobre a qual eles se assentam. Para ajudá-lo a complementar este conteúdo, veja a seguir duas definições de princípios, uma apon- tada pelo jurista Miguel Reale e outra pelo Advogado Celso Antônio Bandeira de Mello. De acordo com Reale (1986, p. 60), Princípios são, pois, verdades ou juízos fundamentais, que servem de alicerce ou de garantia de cer- teza a um conjunto de juízos, ordenados em um sistema de conceitos relativos à dada porção da realidade. Às vezes também se denominam princípios certas proposições, que apesar de não serem evidentes ou resul- tantes de evidências, são assumidas como fundantes da validez de um sistema particular de conhecimentos, como seus pressupostos necessários. Segundo Mello (1994, p. 450), Princípio - já averbamos alhures - é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionali- zação do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo [...]. Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou de inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fun- damentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra. Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que os sustêm e alui-se toda a estrutura nelas esforçada. Importante! Os princípios são elementos de ação transversal. No caso, significa que os princípios constitucionais regem todos os procedimentos da investigação criminal em todos os atos da administração pública. Que está presente em todos os atos públicos. Sendo a investigação criminal um conjunto de atos da administração pública, incide sobre ela princípios que fundamentam a gestão dessa administração, bem como princípios específicos da metodolo- gia de execução técnico-cientifica. Os princípios aplicados à investigação criminal são regras de operacionalidade da função protetora de direitos e garantias fundamentais. Assim, quanto maior o grau de lesividade da ação investigativa, maior deverá ser o cuidado da equipe de investigação com as garantias protetoras do investigado. Potencial nível de lesão ou de exposição à lesão a direitos e garantias fundamentais do cidadão, decorrente das ações realizadas pelas equipes de investigação. 26 Para refletir Suas práticas diárias como profissional público têm sido norteadas com essa percepção? Aula 2 - Princípios constitucionais da investigação criminal O marco inicial dos princípios que regem a investigação criminal é o Art. 37 da Constituição da Repú- blica Federativa do Brasil, o qual disciplina os fundamentos legais que deverão servir de referência e inspirar todos os atos daadministração pública. Diz o texto: Mas, qual o significado desses princípios? Veja a seguir! 2.1. Princípio da legalidade Você viu que, no Estado Democrático de Direito todos e todas deverão se submeter à supremacia da lei. O princípio da legalidade é a pedra de toque do Estado de Direito e estabelece dois tipos de relação, uma com a administração pública, e outra, com o cidadão. 2.1.1. Relação com administração pública A atuação da administração pública só pode ser operada em conformidade com a lei. É uma relação de submissão. Nesse sentido, Mello (1994, p.48) afirma que: Assim, o princípio da legalidade é o da completa submissão da Administração às leis. Este deve tão- -somente obedecê-las, cumpri-las, pô-las em prática. Daí que a atividade de todos os seus agentes, desde o que lhe ocupa a cúspide, isto é, o Presidente da República, até o mais modesto dos servidores, só pode ser a de dóceis, reverentes obsequiosos cumpridores das disposições gerais fixadas pelo Poder Legislativo, pois esta é a posição que lhes compete no direito Brasileiro. Meirelles (1998, p. 67), em conformidade, afirma: A legalidade, como princípio de administração, significa que o administrador público está, em toda sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. Importante! É justamente essa relação de submissão que gera segurança jurídica aos cidadãos e limita o poder dos pro- fissionais da Administração Pública. 2.1.2. Relação com o cidadão É permitido ao cidadão fazer tudo aquilo que a lei não proíbe, e mais, não poderá ser obrigado a fazer aquilo que não lhe é determinado por lei. É uma relação de autonomia que resulta no princípio da liberdade do ser humano, o qual integra o rol de direitos e garantias individuais e está previsto no Art. 5º, Inciso II da Carta Magna: Importante! O princípio da legalidade é direito fundamental de cidadania, que servirá de base para todos os demais princípios. 27 Observe que a acepção dada pela norma constitucional ao vocábulo lei não é restrita, mas abrangen- te, abarcando a lei propriamente dita e todo o contexto jurídico em que ela está contida. Pense, o que isto significa? Significa que as normas que regulam a investigação criminal – mesmo as administrativas como: por- tarias, ordens de serviços, protocolos de procedimentos etc. – estão inseridas nesse contexto e, portanto, deverão respeitar o princípio da legalidade. 2.2. Princípio da impessoalidade O princípio da impessoalidade deve ser analisado sob dois prismas: Desdobramento do princípio da isonomia. Objetiva impedir que profissionais públicos concedam privilégios ou prejudiquem determinadas pessoas em detrimento do interesse público. Vedação de promoção pessoal do administrador. Tem por finalidade que os profissionais públicos se valham da coisa pública para buscar promoção pessoal. Sobre este princípio, Bandeira de Mello afirma que: Nele se traduz a ideia de que a Administração tem que tratar todos os administrados sem discrimi- nações, benéficas ou detrimentosas. Nem favoritismo nem perseguições são toleráveis. Simpatias ou ani- mosidades pessoais, políticas ou ideológicas não podem interferir na atuação administrativa e muito menos interesses sectários, de facções ou grupos de qualquer espécie. (BANDEIRA DE MELLO, 2003, p. 104) Trazendo essas definições para a investigação criminal, significa dizer que os procedimentos e atitu- des deflagrados pelos integrantes da equipe de investigação deverão refletir objetividade no atendimento do interesse público, sem qualquer possibilidade de privilégios, malefícios ou promoção pessoal. Interesse público diz respeito ao agir estatal voltado a assegurar a viabilidade da vida em sociedade, e quando se refere à investigação criminal, essa viabilidade se materializa por meio da plena efetividade de suas finalidades: tutelar direitos e garantias fundamentais; produzir elementos objetivos e subjetivos capazes de esclarecer o fato investigado e, se for o caso, fundamentar o indiciamento do autor pela autoridade poli- cial; subsidiar o promotor de justiça ou o ofendido na promoção da ação penal; e, possibilitar a aplicação da lei penal. 2.3. Princípio da moralidade A moralidade da Administração Pública está relacionada com aquilo que a sociedade, em determi- nado momento, considerou eticamente adequado e moralmente aceito. Nesse sentido, veja abaixo o que afirmam, segundo o princípio da moralidade, o advogado Juarez Freitas e a Procuradora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, para complementar seus estudos. Segundo Juarez Freitas, […] estão vedadas condutas eticamente inaceitáveis e transgressoras do senso moral médio superior da sociedade, a ponto de não comportarem condescendência. Não se confunde, por certo, a moralidade com o moralismo, este último intolerante e não-universalizável por definição. De certo modo, tal princípio determina que se trate a outrem do mesmo modo que se apreciaria ser tratado, isto é, de modo virtuoso e honesto. O “outro”, aqui é a sociedade inteira, motivo pelo qual o princípio da moralidade exige que, funda- mentada e intersubjetivamente, os atos, contratos e procedimentos administrativos venham a ser contem- plados e controlados à base de orientação decisiva e substancial que prescreve o dever de a Administração 28 Pública observar, com pronunciado rigor e a maior objetividade possível, os referenciais valorativos da Cons- tituição, cumprindo vivificar, exemplarmente, o combate contra toda e qualquer lesão moral ou imaterial provocada por ações públicas não-universalizáveis, destituídas de probidade e de honradez. […] O princípio da moralidade no campo administrativo não há de ser entendido como singelo conjunto de regras deonto- lógicas extraídas da disciplina interna da Administração. Na realidade, prescreve exatamente mais: diz com os padrões éticos de uma determinada sociedade, de acordo com os quais não se admite a universalização de máximas de conduta que possam fazer perecer liames sociais aceitáveis ( justificáveis axiologicamente). (2004, p. 53 - 56) De acordo com Maria Sylvia Zanella Di Pietro, [...] quando o conteúdo de determinado ato contrariar o senso comum de honestidade, retidão, equi- líbrio, justiça, respeito à dignidade do ser humano, à boa-fé, ao trabalho, à ética das instituições. A morali- dade exige proporcionalidade entre os meios e os fins a atingir; entre os sacrifícios impostos à coletividade e os benefícios por ela auferidos; entre as vantagens usufruídas pelas autoridades públicas e os encargos impostos à maioria dos cidadãos. Por isso mesmo, a imoralidade salta aos olhos, quando a Administração Pública é pródiga em despesas legais, porém inúteis, como propaganda ou mordomia, quando a população precisa de assistência médica, alimentação, moradia, segurança, educação, isso sem falar no mínimo indis- pensável à existência digna. Não é preciso, para invalidar despesas desse tipo, entrar na difícil análise dos fins que inspiram a autoridade; o ato em si, o seu objetivo, o seu conteúdo, contraria a ética da instituição, afronta a norma de conduta aceita como legítima pela coletividade administrada. Na aferição da imoralidade administrativa, é essencial o princípio da razoabilidade […] (2006, p. 96) Diante do conteúdo exposto, você poderá concluir que, as técnicas e métodos utilizados pela inves- tigação criminal para a produção de elementos objetivos e subjetivos, além de irem ao encontro do sistema jurídico vigente, deverão estar de acordo com o ideário moral vigente, são eles: Receber dos órgãos públicos informações de interesse particular, coletivo ou geral (Inc. XXXIII); Obter certidões em repartições públicas (Inc. XXXIV); Conhecer informações relativas à pessoa interessada, constantes de bancos de registros oubancos de dados de entidades governamentais ou de caráter publico (Inc. LXXII). Importante! As decisões tomadas pela equipe de investigação durante a investigação criminal deverão estar alicerçadas e de acordo com os valores que a sociedade adota como norte para a relação de convivência das pessoas, e destas para com o ambiente. 2.4. Princípio da publicidade A acepção fundamental do princípio da publicidade diz respeito à transparência. Bandeira de Mello (1996, p. 102), ao se reportar ao princípio da publicidade, afirma que é “(...) o dever administrativo de manter plena transparência em seus comportamentos”. Na Administração Pública, a transparência tem como objetivo o controle que poderá ser feito pela própria Administração, pelo Poder Judiciário e pelo cidadão dos atos praticados pelos profissionais públicos. De acordo com SILVA (2010, p. 14), (...) de fato, com as tecnologias, a sociedade capitalista tornou-se muito mais dinâmica, complexa e, de algum modo, as ações humanas agora estão cercadas de instrumentos reais que possibilitam transparên- cia e controle fiscal e social. Dessa maneira, a presença do Poder Público em quase todas as nossas ações diárias levou a um estreitamento da distância entre o cidadão e o Estado, em parte pela transparência, pelos mecanismos de controle e, em outra parte, pelas ações e reações dos sujeitos, ao reivindicarem como seus os direitos sociais (SILVA, 2010, p. 14) 29 O controle da gestão pública pelo cidadão, tamanha sua importância, encontra previsão em vários dispositivos do Art. 5º da Carta Magna, podendo citar, entre eles: Para saber mais... Acesse a Lei nº 9.507/97 que regula o direito de acesso a informações e disciplina o rito processual do habeas data, por meio do link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9507.htm. Mas, você acha que esse princípio é absoluto? Não! Trata-se de uma regra, e como tal, possui exceções. O legislador constituinte, objetivando dar equilíbrio às relações jurídicas afetadas pelo princípio da publicidade, estabeleceu exceções ao direito à informação, isso ao tutelar hipóteses de sigilo, o que pode ser extraído da leitura do Inc. XXXIII do Art. 5º da CF/88: […] todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado; Para saber mais... A Lei nº 12.527/11(fazer link para: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/ l12527.htm) regula o acesso a informações previsto no Inc. XXXIII do Art. 5º, no Inc. II do § 3º do Art. 37, e no § 2º do Art. 216, todos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Confira! Diante do conteúdo apresentado, pode-se concluir que a transparência é a regra, e que as exceções, necessariamente, deverão estar previstas expressamente em lei. Para saber sobre as exceções acesso o arquivo “Normas infraconstitucionais que preveem o sigilo” que está nos anexos do curso. Para refletir Considerando o disposto no Art. 20 do Código de Processo Penal (“A autoridade assegurará no in- quérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade.”), pode-se afirmar que todos os atos da investigação criminal são sigilosos? Em princípio não. No caso da investigação criminal, devem ser considerados dois aspectos: O contexto da apuração, de interesse imediato e geral, pois diz respeito às demandas imediatas de bem-estar da coletividade; O aspecto do ato operacional específico, cujo interesse é mediato. Ou seja, a apuração de provas da prática de um delito, como ato geral de gestão pública, deve ser do conhecimento da comunidade, para que tenha segurança jurídica quanto a garantia de proteção de seu bem-estar. Note que, mesmo sendo de seu interesse, os procedimentos operacionais de apuração, em regra, são executados em sigilo, exatamente para garantir a exequibilidade da investigação. De acordo com o Art. 7º, Inciso XIV da Lei nº 8.906/94, é direito do advogado “examinar em qual- quer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamen- to, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos”, todavia, a par das 30 divergências jurisprudenciais e doutrinárias, em se tratando de procedimento investigativo cujo sigilo foi determinado por decisão judicial, apenas com autorização judicial o advogado poderá acessá-lo, estando o material sigiloso formalmente documentado ou não nos autos. Nesse sentido, Tourinho Filho, ao tratar do inquérito policial, assim leciona: Além de escrito ele ainda é sigiloso. Se o inquérito policial visa a investigação, a elucidação, a descoberta das infrações penais e das respectivas autorias, pouco ou quase nada valeria a ação da polícia judiciária se não pudesse ser guardado o necessário sigilo durante a sua realização. O princípio da publicidade, que domina o processo, não se harmoniza, não se afina com o inquérito policial. Sem o necessário sigilo, diz Tornaghi, o inquérito seria uma burla, um atentado. (TOURINHO FILHO, 2006, p. 206) Para refletir Já imaginou se a polícia anunciar antecipadamente as estratégias que irá aplicar na investigação criminal de delitos praticados por quadrilhas de tráfico de drogas ou por organizações criminosas? (Inserir a imagem padronizada para os momentos de reflexão) Você deve ter chegado à conclusão de que, desta forma, é pouco provável que consiga produzir alguma prova... 2.5. Princípio da eficiência Para finalizar a aula 2 – Princípios constitucionais da investigação criminal, você irá conhecer agora o Princípio da eficiência. Por sua importância, é de observância prioritária e universal no exercício de toda atividade adminis- trativa do Estado. O termo remete à acepção de boa administração e está vinculado à: Produtividade; Profissionalismo; Adequação técnica do exercício funcional às demandas do interesse público. Veja a seguir o que diz Pazzaglini (2000, p.32): “o administrador público tem o dever jurídico de, ao cuidar de uma situação concreta, escolher e aplicar, entre as soluções previstas e autorizadas pela lei, a medida eficiente para obter o resultado desejado pela sociedade”. Isto significa que a Administração Pública e seus profissionais, no exercício das atividades funcionais, deverão aplicar os recursos disponíveis com base na melhor relação custo-benefício, otimizando-os, e em- pregar os critérios técnicos e legais necessários para maior eficácia possível em benefício da boa qualidade de vida do cidadão. Nesta aula, você aprendeu que... A aplicação prática do princípio na investigação criminal se concretiza com todos os cuidados necessários para sua eficácia, como: Planejamento, com a escolha adequada dos meios; Cuidados com a proteção aos direitos e garantias fundamentais das pessoas envolvidas no proces- so; Legalidade na coleta dos elementos objetivos e subjetivos. 31 Aula 3 - Princípios operacionais da investigação criminal A operacionalidade da investigação criminal é sustentada pelo tripé formado pelos seguintes princípios: Compartimentação Sigilosa; Imediatismo; Oportunidade. 3.1. Compartimentação sigilosa Compartimentar é o mesmo que compartir, ou seja, dividir em compartimentos. Ainda, conforme acepções encontradas nos dicionários, distribuir por vários indivíduos ou lugares. As duas acepções são compatíveis com o sentido posto ao princípio em análise. O sigilo é inerente à própria arquitetura da investigação criminal. Imagine se os dados e informações colhidos nesse processo pudessem ser devassados por qualquer pessoa. Provavelmente a polícia judiciária nunca obteria elementos objetivos e subjetivos capazes de reconstituir o fato delituoso investigado. Diz a lei processual penal: […] Artigo 20 - A Autoridade assegurará
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