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REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE PÚBLICA W B A 01 24 _v 2. 1 2 Patrícia Santos Prudêncio Danielle Leite de Lemos Oliveira Londrina Editora e Distribuidora Educacional S.A. 2020 REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE PÚBLICA 1ª edição 3 2020 Editora e Distribuidora Educacional S.A. Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza CEP: 86041-100 — Londrina — PR e-mail: editora.educacional@kroton.com.br Homepage: http://www.kroton.com.br/ Presidente Rodrigo Galindo Vice-Presidente de Pós-Graduação e Educação Continuada Paulo de Tarso Pires de Moraes Conselho Acadêmico Carlos Roberto Pagani Junior Camila Braga de Oliveira Higa Carolina Yaly Giani Vendramel de Oliveira Henrique Salustiano Silva Juliana Caramigo Gennarini Mariana Gerardi Mello Nirse Ruscheinsky Breternitz Priscila Pereira Silva Tayra Carolina Nascimento Aleixo Coordenador Camila Braga de Oliveira Higa Revisor Danielle Leite de Lemos Oliveira Patrícia Santos Prudêncio Editorial Alessandra Cristina Fahl Beatriz Meloni Montefusco Gilvânia Honório dos Santos Mariana de Campos Barroso Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) _________________________________________________________________________________________ Prudêncio, Patrícia Santos. P971r Redes de atenção à saúde pública/ Patrícia Santos Prudêncio, Danielle Leite de Lemos Oliveira – Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2020. 41 p. ISBN 978-65-5903-048-4 1. Públicas 2. Evidências 3. Conceitos I. Oliveira, Danielle Leite de Lemos. II. Título. CDD 350 ____________________________________________________________________________________________ Raquel Torres – CRB 6/2786 © 2020 por Editora e Distribuidora Educacional S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e Distribuidora Educacional S.A. 4 SUMÁRIO Redes de Atenção à Saúde e à Atenção Básica ______________________ 05 Atenção Primária nas Redes de Atenção à Saúde ___________________ 19 Processo de implantação das Redes Prioritárias ____________________ 34 Reorganização dos fluxos de atendimento __________________________ 49 REDES DE ATENÇÃO À SAÚDE PÚBLICA 5 Redes de Atenção à Saúde e à Atenção Básica Autoria: Patrícia Santos Prudêncio Leitura crítica: Danielle Leite de Lemos Oliveira Objetivos • Apresentar a conceituação, os princípios norteadores e os elementos constitutivos da Rede de Atenção à Saúde (RAS). • Identificar a relação das Redes de Atenção à Saúde (RAS) com a Atenção Básica (AB). • Apresentar os desafios e as potencialidades das Redes de Atenção à Saúde (RAS). 6 1. Movimento para implantação das Redes de Atenção à Saúde (RAS) O movimento relacionado ao desenvolvimento e implantação das Redes de Atenção à Saúde (RAS) no Sistema Único de Saúde (SUS), teve como ator protagonista o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) e, tal movimento ocorreu em quatro momentos, que foram: 1) construção da concepção teórico-conceitual; 2) difusão da proposta; 3) institucionalização das RAS e implantação das RAS; 4) momento atual (BRASIL, 2015). O primeiro momento, referente à construção da proposta das RAS, baseou-se em experiências internacionais para adequar a realidade de um sistema público universal à realidade de um país federativo, onde predomina fortes desigualdades regionais e com um sistema de cooperação entre a União, Estados e municípios. O segundo momento, contempla um campo ideológico, em que foi estabelecido uma proposta com o propósito difundir o conceito das RAS e avançar nos aspectos de fundamentos teóricos e operacionais (BRASIL, 2015). O terceiro momento, abrangeu a busca pela institucionalização da RAS como forma de organizar os serviços de saúde no SUS, que resultou na publicação da Portaria GM/ MS nº 4.279 de 30 de dezembro de 2010. O quarto momento diz respeito à implantação das RAS, obedecendo a estratégia adotada pelo Ministério da Saúde para implantar as Redes Temáticas nas regiões metropolitanas (BRASIL, 2015). 1.1 Redes de Atenção à Saúde (RAS): princípios norteadores e elementos constitutivos As Redes de Atenção à Saúde (RAS) são consideradas como arranjos organizativos de ações e serviços de saúde, que envolvem diferentes densidades tecnológicas que integram o sistema de apoio técnico, logístico e de gestão, no intuito de buscarem garantir a integralidade 7 do cuidado (BRASIL, 2015). Possuem como objetivo, a promoção da integração sistêmica, de ações e serviços de saúde a fim de proporcionar uma atenção continuada, integral, de qualidade e humanizada. Além disso, visa garantir o acesso, a equidade, eficácia clínica e sanitária e a eficiência econômica (BRASIL, 2010). De acordo com a Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017, referente à aprovação da Política Nacional de Atenção Básica, que estabelece uma revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica (AB), no âmbito do SUS, a RAS é definida como uma estratégia para um cuidado integral e direcionado às necessidades de saúde da população, destacando a AB como primeiro ponto de atenção e como a porta de entrada preferencial para o sistema de saúde. Uma das atividades a serem desempenhadas pelas RAS é a ordenação do fluxo e contra fluxos de pessoas, produtos e informações em todos os pontos de atenção à saúde (BRASIL, 2017). A conceituação apresentada pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS, 2011), aborda um detalhamento semelhante quando preconiza que redes integradas de serviços de saúde, sistemas organizados de serviços de saúde, sistemas clinicamente integrados ou organizações sanitárias integradas possam ser exemplificadas como sendo uma rede de organizações que promovem o oferecimento de serviços de saúde equitativos e integrais a uma população específica, bem como pelo fato de se disporem a prestar contas pelos seus resultados clínicos e econômicos e pelo estado de saúde da população a que ela serve. Nogueira et al. (2019) destacam que a existência de uma hegemonia conceitual associada a uma concepção generalista é representada pelos conceitos apresentados pela Organização Pan-americana de Saúde (OPAS), pelo Ministério da Saúde e pelo consultor Eugênio Vilaça Mendes. A polissemia dos conceitos como “organização, arranjo, interação, estrutura e/ou estratégia” foi enfatizada nos estudos 8 analisados pelos autores, o qual caracterizaram uma complexidade a temática, pois o conceito da RAS contempla uma pluralidade. Convém destacar que as RAS são regulamentadas pela Portaria GM/MS nº 4.279/2010 e implementadas no país na forma de redes temáticas, priorizando algumas linhas de cuidado, como: 1) Rede Cegonha; 2) Rede de Atenção às Urgências e Emergências (RUE); 3) Rede de Atenção Psicossocial (Raps); 4) Rede de Cuidado à Pessoa com Deficiência; e 5) Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas. Para que a RAS seja efetiva em realizar o seu papel é fundamental que a Atenção Primária à Saúde (APS) esteja organizada de forma que a oferta do cuidado seja coordenada (BRASIL, 2015). Nesse contexto, no intuito de promover o fortalecimento das secretarias estaduais de saúde, a fim de apoiarem os municípios, o CONASS apresentou uma proposta e desenvolveu um conjunto de oficinas direcionadas ao fortalecimento da APS, organizando-a de forma territorializada, e com uma população cadastrada. Envolveu, inclusive, a capacitação de todos os profissionais participantes da APS, com o propósito de contribuir para a sua qualificação, bem como para a resolutividadedo nível de atenção, garantindo, assim, o papel de coordenação da RAS (BRASIL, 2015). As RAS são consideradas organizações poliárquicas de conjuntos de serviços de saúde, que atuam de forma integrada entre si e focadas em objetivos comuns e com ações de cooperação e interdependente, a fim de ofertar uma atenção contínua e integral a uma população específica que seja coordenada pela APS (BRASIL, 2015). As RAS apresentam três elementos constitutivos, como demonstrado na figura a seguir. 9 Figura 1 – Elementos constitutivos das Redes de Atenção à Saúde (RAS) Fonte: Brasil (2015, [s.p.]). O primeiro elemento que constitui a RAS é a população, que é de responsabilidade sanitária e econômica, e contempla a população cadastrada e vinculada a uma unidade de APS e não a população registrada pelos censos demográficos. Abrange a população que vive em territórios sanitários singulares, e apresenta subpopulações por riscos sociais e sanitários (BRASIL, 2015). O segundo elemento constitutivo da RAS refere-se à estrutura operacional, que compõe-se de cinco componentes, conforme ilustrado na figura abaixo. 10 Figura 2 – Componentes que compõem a estrutura operacional da RAS Fonte: Brasil (2015, [s.p.]). O terceiro e último elemento constitutivo das RAS contempla os modelos de atenção à saúde, que são caracterizados por serem sistemas lógicos que organizam o funcionamento das RAS ao articularem de forma singular as relações entre os componentes da rede e as intervenções sanitárias. São divididos em dois tipos, os modelos de atenção aos eventos considerados agudos e os modelos destinados às condições crônicas de saúde (BRASIL, 2015). Uma consideração importante a ser mencionada é que a RAS é composta por serviços de igual identidade, organizada de modo a viabilizar e racionalizar o itinerário terapêutico que atenda às necessidades do cuidado em saúde. Este aspecto, segundo Santos (2017), configura um dado relevante ao cidadão quanto ao seu direito de ter assegurado uma assistência que atenda às suas necessidades de saúde na rede da região ou entre regiões. Para Mendes (2011), os benefícios da implementação das RAS são refletidos nos resultados sanitários e econômicos dos sistemas de atenção à saúde. 11 Para compreender a relação da RAS com a AB, é preciso conhecer primeiro a definição da AB. De acordo com a Portaria GM/MS nº 4.279/2010, a AB é definida por um conjunto de ações de saúde individuais, familiares e coletivas que envolvem a ações de promoção, prevenção, proteção, diagnóstico, tratamento, reabilitação, redução de danos, cuidados paliativos e vigilância em saúde. Tais práticas são desenvolvidas pela implementação de práticas de cuidado integrado e gestão qualificada, realizada pela equipe multiprofissional e dirigida à população em território previamente definido e que são de responsabilidade sanitária da equipe de saúde local (BRASIL, 2010). Ela deve ser ofertada de forma integral e gratuita a todas as pessoas, levando em consideração a necessidade de suprir as necessidades e demandas territoriais, bem como os determinantes e condicionantes de saúde. Isso implica dizer que é proibido qualquer tipo de exclusão, seja ela relacionada à idade, gênero, raça/cor, etnia, crença, nacionalidade, orientação sexual, identidade de gênero, estado de saúde, condição socioeconômica, nível de escolaridade, limitação (intelectual, física, funcional ou outra) (BRASIL, 2017). Para cumprir com tais metas é proposto a adoção de estratégias que minimizem as desigualdades/ iniquidades, evitando, assim, a exclusão social de grupos que possam sofrer estigmatização ou discriminação. Nela, também são estabelecidos os princípios e diretrizes do SUS e da RAS, que devem ser operacionalizados na AB (BRASIL, 2017) e que estão ilustrados na figura a seguir: 12 Figura 3 – Princípios e Diretrizes das Redes de Atenção à Saúde (RAS) Fonte: Brasil (2015, [s.p.]). Em relação aos princípios das RAS, pode-se apresentar algumas particularidades. Por exemplo, o princípio da universalidade refere-se em promover o acesso universal e contínuo aos serviços de saúde que sejam de qualidade e resolutivos. Deve acolher as pessoas, promovendo a vinculação e a corresponsabilização pela atenção às suas necessidades de saúde. Conforme Brasil (2017), as equipes que atuam na Atenção Básica nas Unidades Básicas de Saúde, devem praticar a escuta ativa, de forma a receber e ouvir todas as pessoas que procuram os serviços de saúde, de modo universal. O atendimento deve proporcionar o fácil 13 acesso e deve ser livre de diferenciações excludentes, a fim de atender as demandas e necessidades. O princípio da equidade, abrange a oferta do cuidado diante da identificação das diferenças nas condições de vida e saúde, bem como de acordo com as necessidades das pessoas. Esse princípio, relatado em Brasil (2017), envolve a proibição de qualquer tipo de exclusão baseada em idade, gênero, cor, crença, nacionalidade, etnia, orientação sexual, identidade de gênero, estado de saúde, condição socioeconômica, escolaridade ou limitação, nível intelectual, funcional, dentre outros. Esse princípio, contempla minimizar desigualdades, evitar a exclusão social de grupos que possam sofrer estigmatização ou discriminação, de forma que prejudique a autonomia e a situação de saúde. E o princípio da integralidade refere-se ao conjunto de serviços realizados pelas equipes de saúde que atendam às necessidades da população adscrita nas diferentes esferas do cuidado, como exemplo: promoção e manutenção da saúde, prevenção de doenças e agravos, cura e reabilitação, redução de danos e cuidados direcionados, como cuidados paliativos (BRASIL, 2017). Convém destacar que nas RAS, a concepção de hierarquia é substituída pela de poliarquia. O sistema de atenção à saúde em rede é organizado de forma horizontal, ou seja, não há uma hierarquia entre os diferentes pontos de atenção à saúde. As organizações hierárquicas ou piramidais, correspondem a redes em árvore, caracterizando uma limitação nas conexões entre os diversos ramos e onde predominam os fluxos hierárquicos, de um centro menor para o seu superior. Diferentemente, como afirma Mendes (2011), ocorre quando para as redes poliárquicas ou redes em malha, onde cada nó se conecta a vários outros, possibilitando, assim, uma interconexão entre eles. Nas RAS, a concepção hierárquica e piramidal deve ser substituída pela concepção de rede poliárquica de atenção à saúde, em que devem ser 14 respeitadas as diversidades relacionadas às densidades tecnológicas, rompendo, assim com as relações verticalizadas, tornando-se redes policêntricas horizontais (BRASIL, 2015), como ilustrado na figura a seguir. Figura 4 – Mudanças dos sistemas piramidais e hierárquicos para as redes de atenção à saúde Fonte: Mendes (2011, [s.p.]). 1.2 Desafios e potencialidades da efetividade das Redes de Atenção à Saúde A implantação de sistemas integrados ou RAS, com a adoção de um modelo de atenção que vise atender as necessidades de saúde da população, tem sido recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Convém destacar que, após a regulamentação das RAS pela Portaria GM/MS n. 4.279/2010, foram definidas cinco redes temáticas prioritárias e que foram pactuadas para serem implantadas nas regiões de saúde do país, a saber (BRASIL, 2015): 15 • Rede Cegonha: consiste em uma rede de cuidados que tem como propósito assegurar à mulher o seu direito ao planejamento reprodutivo e uma atenção pautada na humanização a gravidez, parto e puerpério, além de preconizar a criança o direito ao nascimento seguro, o crescimento e desenvolvimento saudáveis. Tem como objetivo promover a implementação de um novo modelo de atenção à saúde da mulher e da criança, além de reduzir a mortalidade materna e infantil enfatizando o componente neonatal. • Rede de Urgência e Emergência (RUE): as prioridades de atenção dessa rede temática, engloba os cuidadosaos sistemas cardiovasculares, cerebrovasculares e traumatológicos, e que devem ser implementados de forma gradativa em todo o território nacional, levando em consideração os critérios epidemiológicos e a densidade populacional. Cabe destacar a importância da realização do acolhimento com a classificação de risco, bem como enfatizar que a qualidade e a resolutividade, devem fundamentar a base de todo o processo e dos fluxos assistências. • Rede de Atenção Psicossocial para as pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas (Raps): tem como meta para o seu funcionamento, o respeito aos direitos humanos, a garantia da autonomia e da liberdade das pessoas, além de preconizar a implementação de ações pautadas na equidade, no reconhecimento dos determinantes sociais da saúde, na extinção de estigmas e preconceitos, na garantia do acesso e na qualidade dos serviços. Tem como propósito promover um cuidado integral e uma assistência multiprofissional que preconize a lógica da interdisciplinaridade, atenção humanizada e centrada nas necessidades das pessoas, na diversidade das escolhas das estratégias de cuidado, no desenvolvimento das atividades territoriais, a fim de favorecer a inclusão social e, consequentemente, promover a autonomia e o exercício da cidadania. 16 • Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiências (Viver Sem Limites): tem como propósito ampliar o acesso e promover um atendimento de qualidade às pessoas portadoras de deficiências temporárias ou permanentes, progressivas, regressivas ou estáveis, intermitentes ou contínuas, na esfera do Sistema Único de Saúde. Prevê a garantia dos direitos humanos, com autonomia, independência e liberdade as pessoas com deficiências para optarem por suas escolhas. • Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas, no âmbito do Sistema Único de Saúde: tem como meta promover a atenção integral à saúde das pessoas portadoras de doenças crônicas, por meio da implementação de ações e estratégias que tenham como foco a promoção e proteção da saúde, a prevenção de agravos, o estabelecimento de diagnósticos, o oferecimento de tratamento, reabilitação, redução de danos, bem como a manutenção da saúde. É importante compreender que em um sistema organizado em redes, todos os aspectos de atenção à saúde são considerados importantes, ou seja, deve existir um relacionamento horizontal e contínuo da atenção nos níveis primário, secundário e terciário. Assim, cada ponto de uma rede conectado a outro, possibilitará a organização dos serviços de saúde, bem como a garantia dos cuidados essenciais aos cidadãos usuários desse sistema (NOGUEIRA et al. 2019). Existem inúmeros desafios relacionados à efetividade das RAS e que podem ser atribuídos a situações, tais como: a adequação dos serviços ao processo de transição epidemiológica brasileira; a superação das disputas de poder existentes no cotidiano dos serviços; o fortalecimento da atuação da APS como ordenadora das RAS; a necessidade de fortalecimento dos sistemas de regulação; a maneira efetiva de reorientação do modelo assistencial e, consequentemente, o enfrentamento da fragmentação dos serviços com vistas à integralidade. 17 A partir de Nogueira et al. (2019), a fragmentação e a segmentação das práticas no cotidiano dos serviços de saúde ocorrem devido ao conceito de seleção ao acesso aos serviços, gerando barreiras e fortalecendo as lacunas na assistência, bem como a falta de garantia de continuidade do cuidado. Tal fato é contraditório à recomendação do cuidado em rede, ou seja, um cuidado que deve garantir o acesso universal, integral e equânime. Nesse contexto, evidências apontam que a implementação de alguns programas tem ocorrido de forma desarticulada, favorecendo, assim, a prevalência de uma modelo fragmentado e que contraria os pressupostos relacionados ao sistema organizacional estabelecidos pelas RAS (BRASIL, 2015), programas como: Requalificação das Unidades Básicas de Saúde, Brasil Carinhoso, Programa de Saúde na Escola (PSE), Academias da Saúde, Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade (PMAQ), Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf), Telessaúde – Redes, Saúde Bucal, Programa de Valorização da Atenção Básica, (Provab) e Mais Médicos. Nogueira et al. (2019) afirmam que a superação desses desafios relacionados à implementação das RAS, deve contemplar a implementação de ações e estratégias que tenham como foco o fortalecimento das redes de cuidado, a fim de refletir os princípios doutrinários do SUS, ou seja, que a atuação das RAS seja sinônimo de ações e estratégias de saúde pautadas na universalidade, integralidade, equidade e participação popular. 1.3 Considerações finais A assistência prestada pelas redes de atenção à saúde, possui princípios norteadores e elementos constitutivos que norteiam suas ações e organização. Tal fato, permite aos serviços de saúde vinculados ao Sistema Único de Saúde a atuarem em prol de uma assistência integrada, articulada, segura e de qualidade. Para a efetividade da sua atuação, a 18 Atenção Primária de Saúde deve tem um papel importante, ao atuar como articuladora, centro de comunicação e coordenadora dos serviços de saúde, levando em consideração o equilíbrio entre as demandas ofertadas e as necessidades da população. Referências Bibliográficas BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Portaria nº 2.436, de 21 de setembro de 2017. Aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes para a organização da Atenção Básica, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília: Ministério da Saúde, 2017. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/ saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html. Acesso em: 17 nov. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. A Atenção Primária e as Redes de Atenção à Saúde. Brasília: CONASS, 2015. Disponível em: https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e-as- Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf. Acesso em:17 nov. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 4.279, de 30 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília: D.O.U., 2010. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ saudelegis/gm/2010/prt4279_30_12_2010.html. Disponível em: http://bvsms.saude. gov.br/bvs/saudelegis/gm/2010/prt4279_30_12_2010.html. Acesso em: 17 nov. 2020. MENDES. As redes de atenção à saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde, 2011. NOGUEIRA, M. S. et al. Redes de atenção à saúde: mapa conceitual, referenciais teóricos, desafios e potencialidades. Essentia, Sobral, v. 20, n. 2, 2019, p. 84-93. Disponível em: https://essentia.uvanet.br/index.php/ESSENTIA/article/view/311. Acesso em: 17 nov. 2020. OPAS. Organização Pan-Americana da Saúde. A atenção à saúde coordenada pela APS: construindo as redes de atenção no SUS, contribuições para o debate. Brasília, OPAS/OMS, 2011. SANTOS, L. Região de saúde e suas redes de atenção: modelo organizativo- sistêmico do SUS. Ciênc. saúde coletiva, Rio de Janeiro, v. 22, n. 4, p. 1281- 1289, abr./2017. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413- 81232017002401281&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso em: 5 ago. 2020. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt2436_22_09_2017.html https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e-as-Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e-as-Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2010/prt4279_30_12_2010.html http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2010/prt4279_30_12_2010.html https://essentia.uvanet.br/index.php/ESSENTIA/article/view/311. https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-81232017002401281&script=sci_abstract&tlng=pthttps://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-81232017002401281&script=sci_abstract&tlng=pt 19 Atenção Primária nas Redes de Atenção à Saúde Autoria: Patrícia Santos Prudêncio Leitura crítica: Danielle Leite de Lemos Oliveira Objetivos • Apresentar a conceituação da Atenção Primária à Saúde. • Apresentar e caracterizar os atributos, os papéis e as recomendações de fortalecimento da Atenção Primária à Saúde no Sistema Único de Saúde. • Caracterizar a estrutura operacional das Redes de Atenção à Saúde. 20 1. Atenção Primária à Saúde (APS) A atenção primária à saúde (APS), pode ser considerada como a principal e mais adequada forma de acesso das pessoas ao sistema de saúde, por estar diretamente associada a uma atuação fundamentada na equidade da saúde entre populações. Para Starfield (2002). A conferência de Alma-Ata definiu a APS como “cuidados essenciais baseados em métodos de trabalho e tecnologias de natureza prática, cientificamente críveis e socialmente aceitáveis, universalmente acessíveis na comunidade aos indivíduos e às famílias, com a sua total participação e a um custo suportável para as comunidades e para os países, à medida que se desenvolvem num espírito de autonomia e autodeterminação” (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE/UNICEF, 1979, p. 14). (STARFIELD, 2002, [s.p.]) A partir da definição da APS, foram definidos os elementos essenciais da APS, a saber: educação em saúde; o saneamento básico; o programa materno-infantil, que contempla a imunização e a atenção ao planejamento familiar; a implementação de medidas preventivas quanto a endemias; a promoção de tratamento adequado das doenças, bem como dos danos mais comuns; a disponibilização de medicamentos essenciais; a implementação de ações de promoção de alimentação saudável e de micronutrientes; e a valorização das práticas complementares. Tal definição, para Mendes, 2015), aponta a saúde como forma de expressão de direitos humanos. Ao levarmos em consideração a definição apresentada quanto à Atenção Primária à Saúde (APS) é possível compreender a articulação da APS como parte e como coordenadora de uma RAS. Tal fato é refletido ao identificar a APS como uma estratégia de organização do sistema de atenção à saúde ao implementar uma forma singular de apropriar, recombinar e reordenar os recursos do sistema a fim de atender as 21 necessidades, demandas e as representações da população (BRASIL, 2015). 1.1 Os atributos e papéis da Atenção Primária a Saúde A estratégia de organização dos sistemas de atenção à saúde, relacionados à APS, implica no exercício de sete atributos e três papéis, ou seja, uma APS só será considerada de qualidade quando os sete atributos forem operacionalizados em sua totalidade (BRASIL, 2015). Tais atributos e papéis são ilustrados na Figura 1 a seguir. Figura 1 – Atributos e papéis da Atenção Primária à Saúde (APS) Fonte: adaptada de Brasil (2015, [s.p.]). Os atributos da APS podem ser essenciais e derivados. Em relação aos atributos essenciais, pode-se citar algumas particularidades de cada um deles. Por exemplo, conforme Brasil (2015), a atenção ao primeiro 22 contato é representada pela acessibilidade e utilização dos serviços de saúde para cada novo problema ou novo episódio. Além disso, Portela (2017) reporta a ideia de que um sistema de saúde organizado a partir da APS, apresenta uma porta de entrada considerada de fácil acesso a todos e em relação a qualquer necessidade de cuidado. Convém destacar que formas de mensurar a atenção ao primeiro contato, envolve a avaliação da oferta dos serviços que sejam acessíveis diante da utilização destes quando ocorre uma necessidade. A longitudinalidade diz respeito à existência de uma oferta regular de cuidados pela equipe de saúde, bem como a sua utilização no decorrer do tempo, em um ambiente de relação de mútua confiança e humanização (BRASIL, 2015). Para Starfield (2002) ela é caracterizada quando há um estabelecimento de uma relação de vínculo de longa duração, interpessoal e de cooperação mútua entre as partes, isto é, entre os profissionais de saúde e os usuários. É um atributo que desencadeia vários benefícios, como a redução na utilização de serviços e hospitalizações e custo total da assistência, atenção mais oportuna e adequada e uma atenção pautada na prevenção. De acordo com Portela (2017), a integralidade é considerada, provavelmente, um dos atributos de maior relevância acerca da resolubilidade da APS em relação aos diferentes sistemas de saúde. É representada, segundo Brasil (2015), pelo oferecimento de serviços que supram as necessidades da população adscrita e que envolvam a implementação de ações e estratégias de promoção, prevenção, cura, cuidado, reabilitação, paliação, a responsabilização da oferta de serviços, bem como o reconhecimento adequado dos problemas de saúde e que atinjam os aspectos biológicos, psicológicos e sociais. Starfield (2002) refere que a integralidade implica que as unidades de APS devem garantir ao indivíduo o recebimento de todos os tipos de serviços de atenção à sua saúde de acordo com as suas necessidades. 23 Deve responsabilizar-se diretamente pelas condições mais corriqueiras, como pelo encaminhamento para os serviços secundários, ou seja, a APS deve reconhecer as necessidades relacionadas à saúde da população, bem como deve disponibilizar todos os recursos com o propósito de suprir suas necessidades. Portela (2017) acrescenta que a heterogeneidade identificada no país reflete na necessidade de realização de mensurações adequadas e ajustadas a diferentes realidades, e que sejam capazes de verificar as necessidades regionais e locais, no intuito de organizar todos os serviços primários ofertados, ou garantir que sejam manejados em outros níveis de atenção à saúde. A coordenação, significa a capacidade da equipe de saúde de garantir a continuidade da atenção, incluindo o reconhecimento dos problemas que demandam um acompanhamento contínuo e que se articule com o objetivo de atuar como um centro de comunicação das RAS (BRASIL, 2015). Segundo afirma Portela (2017), sua essência discorre da disponibilidade de informações referentes aos serviços prestados na APS de forma integrada e coordenada, bem como aqueles prestados por diferentes membros de uma equipe de profissionais que pertencem a própria APS. Já em relação ao atributo essencial da focalização na família, pode-se considerá-la como um sujeito da atenção e que requer a interação da equipe de saúde com a unidade social e o conhecimento integral de seus problemas de saúde, além das formas singulares de abordagem familiar. O atributo orientação comunitária representa o reconhecimento das necessidades das famílias em decorrência do contexto físico, econômico e social em que vivem. A competência cultural representa uma relação de horizontalidade que deve existir entre a equipe de saúde e a população, em que sejam respeitadas as particularidades culturais e preferências das famílias (BRASIL, 2015). 24 Em relação aos atributos derivados, pode-se apresentar algumas particularidades. Para Starfield (2002), por exemplo, o atributo referente à focalização na família diz respeito ao fato de considerar a família como um sujeito da atenção, requerendo a interação da equipe de saúde com a unidade social, além do conhecimento integral associados aos problemas de saúde e das especificidades de abordagem das famílias. O segundo atributo derivado refere-se à orientação comunitária que é representada pelo reconhecimento das necessidades das famílias em decorrência do contexto físico, econômico e social em que estão inseridas. Isso exige uma avaliação situacional das necessidades de saúde das famílias envolvidas, bem como na integração em programas intersetoriais de enfrentamento dos determinantes sociais (proximais e intermediários. Como descrito em Starfield (2002), o terceiro atributo derivado, refere-se à competência cultural que implica no estabelecimentode uma relação horizontal entre as equipes de saúde e a população, de modo a zelar pelo respeito diante das singularidades culturais e as escolhas das pessoas e das famílias. Além dos cumprimentos dos atributos, tanto essenciais quanto os derivados, para que a APS seja efetiva é preciso que seus papéis também sejam atendidos. Por exemplo, o papel da resolutividade reflete que eles devem ser resolutivos e capacitados para suprir a demanda da APS. Já a coordenação, descrita por Brasil (2015), expressa o exercício desempenhado pela APS, que contempla ter condições de ordenar os fluxos e os contra fluxos das pessoas, produtos e informações provenientes dos diferentes componentes das redes. Para Mendes (2015), o papel da APS referente à função de responsabilização implica no conhecimento e relacionamento íntimo, nos microterritórios sanitários, com a população adscrita, no exercício da gestão de base populacional e na responsabilização econômica e sanitária em relação a essa população adscrita. 25 1.2 Demanda e oferta na Atenção Primária à Saúde A APS deve estar preparada para promover resolução a quase totalidade dos problemas recorrentes que se apresentam no nível dos cuidados primários. Nesse sentido, deve existir uma preocupação com a qualidade da atenção que é prestada, no intuito de gerar valor para as pessoas usuárias dos serviços de saúde. Como nos lembra Mendes (2015), é de responsabilidade da APS a saúde da população, bem como a coordenação das RAS. Ao levar em consideração a construção social da APS, é preciso mencionar que isso implica em uma coerência entre a estrutura da demanda e da oferta, ou seja, a estrutura de oferta deve se adequar as respostas sociais a cada tipo de demanda específica por meio de uma estrutura singular (BRASIL, 2015). Há a necessidade de buscar uma harmonia entre a demanda e a oferta. Entretanto, o fato é que na prática da APS no SUS, nota-se uma estrutura de oferta que não supre as respostas as complexas demandas de cuidados primários, isto é, a estrutura de oferta muitas vezes não dá conta de responder a todas as demandas da APS. Tal desequilíbrio entre a oferta e demanda na APS, como aponta Brasil (2015), são ilustradas no quadro abaixo. Quadro 1 – O desequilíbrio entre as estruturas da oferta e da demanda na APS ESTRUTURA DA DEMANDA ESTRUTURA DA OFERTA Por condições agudas. Consultas médicas. Por condições crônicas agudizadas. Consultas de enfermagem. Por condições gerais e inespecíficas. Trabalhos em grupo. Por condições crônicas não agudizadas. Vacinação. 26 Por enfermidades. Rastreamento de câncer de colo do útero. Por pessoas hiperutilizadoras. Visitas domiciliares. Demandas administrativas. Dispensação de medicamentos. Por atenção preventiva. Solicitação, coleta ou realização de exames. Por atenção domiciliar. Fornecimento de atestados médicos. Por autocuidado apoiado. Fonte: adaptado de Mendes (2015). Como visto em Brasil (2015), é possível observar um desequilíbrio entre a estrutura de demanda ampla e uma estrutura de oferta restrita, desencadeando uma crise na APS e que pode ser solucionada por meio do agrupamento de demandas que exigem perfis de ofertas semelhantes, bem como na ampliação do perfil de oferta em decorrência dos grupos de demandas. Por exemplo, as pessoas buscam atendimento na APS por vários motivos, como: um desconforto psicológico, um anseio, uma solicitação burocrática, medo de uma doença, necessidade de esclarecimento de uma informação técnica ou de discussão de situações relacionadas a aspectos não biomédicos, além da presença de sinais e sintomas de doenças estabelecidas (LANDSBERG et al., 2012). Na APS, os atendimentos se distribuem em uma relação próxima entre a demanda não programada e a demanda programada. Os diferentes tipos de demandas identificadas na APS, descritos em Mendes (2015), podem ser organizados em nove categorias, conforme ilustrado na Figura 2 a seguir. 27 Figura 2 – As demandas na APS na estruturação das respostas sociais Fonte: adaptada de Mendes (2015). É importante ressaltar que as necessidades de saúde da população vinculada a APS são transformadas em demandas efetivas quando são superadas as barreiras de acesso, tais como: baixa cobertura populacional, carteira de serviços restrita, custos de oportunidade altos, barreiras financeiras, barreiras culturais, barreiras geográficas e barreiras organizacionais (BRASIL, 2015). A lista de problemas ou diagnósticos servem de base para estruturar diversos perfis de demandas e que podem ser agrupados em: demanda por condições agudas; demanda por condições crônicas agudizadas; demanda por condições gerais e inespecíficas; demanda por condições crônicas não agudizadas; demanda por enfermidades; demanda por pessoas hiperutilizadoras; demandas administrativas; demanda por atenção preventiva; demanda por atenção domiciliar; e demanda por autocuidado apoiado. 28 Conforme Mendes (2015), destes tipos de demandas, convém destacar que as demandas por pessoas hiperutilizadoras é representada pelas pessoas que consomem grande parte da oferta de consultas da APS, fato que demostra a importância de serem aplicados modelos de atenção que incentivem o estabelecimento de um equilíbrio entre a demanda não programada e a programada. Diante deste panorama é possível identificar a amplitude e a diversidade da APS que, na prática social apresenta uma operacionalização limitada que não considera essa diversidade, pois, em geral, trabalha-se com uma estrutura restrita de demanda (BRASIL, 2015). Portanto, as necessidades de saúde da população associada à APS, superadas as barreiras de acesso, favorecem a transformação em demandas efetivas que conduzem a APS a refletir ações de acolhimento e elaboração de listas de problemas e diagnósticos. Dessa forma, é possível identificar que a estrutura da APS é ampla e diversificada. 1.3 Estrutura operacional das Redes de Atenção à Saúde A estrutura operacional das RAS é composta de cinco componentes, a saber: o centro de comunicação, representada pela APS; os pontos de atenção à saúde, divididos em secundários e terciários; os sistemas de apoio, que contemplam os sistemas de apoio diagnóstico e terapêutico, de assistência farmacêutica, de teleassistência e de informação em saúde; os sistemas logísticos, que são representados pelos registros eletrônico em saúde, pelos sistemas de acesso regulado à atenção e pelos sistemas de transporte em saúde; e pelo sistema de governança da RAS. Uma consideração importante a ser feita, é que os três primeiros componentes correspondem aos nós das redes, e o quarto, as ligações que comunicam os diferentes nós. Segundo Mendes (2015), convém destacar que as RAS são estruturadas para que possam enfrentar uma condição de saúde específica ou grupos com condições de saúde específicas, por meio de um ciclo completo de atendimento. 29 1.4 Fortalecimento da Atenção Primária à Saúde De acordo com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS, 2018) foi realizado um estudo com o objetivo de identificar as estratégias, ações e inovações direcionadas a produzirem uma APS forte e que levasse em consideração os itens referentes: às diretrizes organizacionais do modelo assistencial; à rede de atenção à saúde; à estrutura e recursos tecnológicos; aos recursos humanos e financeiros; à governança; à participação social e métodos de monitoramento e de avaliação dos resultados. O estudo contou com a participação de 23 especialistas brasileiros que elaboraram recomendações para reorganização da APS no SUS, que foram: • Proporcionar a ampliação e consolidação da estratégia saúde da família com destaque para os atributos essenciais da APS. • Favorecer a ampliação às formas de acesso à APS e que inclua os tipos: avançado, não presencial e horário estendido, além de incluir a utilização de ferramentas digitais para comunicação não presencial entre a equipe e as pessoas. • Qualificar a adscrição das pessoasàs equipes das APSs por meio da utilização de um quantitativo populacional, critérios de adscrição complementares aos previamente estabelecidos quanto ao território, perfil epidemiológico e de vulnerabilidade social e utilização de listas de pacientes. • Disponibilizar ações e serviços de saúde baseados nas necessidades da população, elaborando uma carteira de serviços que garanta a oferta de recursos, sejam eles insumos, equipamentos etc., bem como a garantia da plena realização das ações previstas na carteira. • Permitir ampliação da atuação clínico-assistencial de todas as categorias de profissionais pertencentes às equipes da APS, por meio da utilização de protocolos multiprofissionais fundamentados nas melhores evidências científicas. 30 • Possibilitar a qualificação dos profissionais de APS em relação à comunicação e tecnologia do cuidado (entrevista motivacional, plano de cuidados e autocuidados). • Promover adensamento tecnológico orientado por medidas preventivas quarternárias na APS, ao utilizar tecnologias de informação e equipamentos diagnósticos e terapêuticos, seja de forma presencial ou a distância; • Garantir a informatização das Unidades Básicas de Saúde, da rede assistencial e dos complexos reguladores, a fim de disponibilizar registro eletrônico em saúde com informações do sistema de saúde público e privado, garantindo que não haja barreiras informacionais. • Desenvolver sistema de regulação centrado na APS, com destaque para a implementação de tecnologias da informação e comunicação, bem como protocolos clínicos de regulação, e com qualificação do processo de referência e contra-referência. • Garantir o aumento do financiamento da APS até alcançar patamares adequados e suficientes. • Garantir uma estrutura física e tecnológica adequada, que possibilite a ambiência, conforto, além de fornecer de forma adequada os insumos necessários para o funcionamento das Unidades Básicas de Saúde. • Realizar um planejamento da oferta de recursos humanos para a APS, bem como estruturar um plano de formação profissional com destaque para as especificidades da APS e que incluam: médico de família e comunidade, enfermeiro de família e comunidade. • Manter estratégias permanentes e sustentáveis para o suprimento de profissionais médicos para a APS em áreas que apresente uma alta taxa de rotatividade profissional ou que apresente limitações e dificuldades para contratação destes profissionais. 31 • Realizar ações de promoção assistencial de apoio as equipes pertencentes a APS, como: cuidado compartilhado, interconsultas, telemonitoramento, NASF, matriciamento etc.). • Realizar atividades de promoção, monitoramento e avaliação da qualidade da atuação das equipes de APS, e que estejam relacionadas aos princípios, atributos, diretrizes, objetivos, metas e resultados, com estabelecimento de mecanismos de remuneração e incentivos por desempenho. • Realizar ações que estimulem a formação de líderes em APS na esfera da gestão. • Promover estratégias de defesa e fortalecimento da APS, e que envolva a produção de conhecimento científico, bem como na divulgação de experiências inovadoras e exitosas. • Destacar a importância da transparência das informações sobre saúde, de forma que facilite o acesso da população a informações sobre as ações e os serviços de saúde, por exemplo, listas de espera, horários, serviços ofertados, o uso de tecnologia da informação e outros dispositivos utilizados nos meios de divulgação. • Facilitar a participação das pessoas, bem como realizar o controle social e a avaliação dos serviços por meio da incorporação de novos canais de escuta e que envolvam as tecnologias de comunicação não- presenciais, ouvidoria, entre outros. • Estimular a função de mediadora da APS diante das ações intersetoriais e da participação das pessoas para repercutir na determinação social, na promoção da saúde e na redução das desigualdades. 32 1.5 Considerações finais Para que a Atenção Primária nas Redes de Atenção à Saúde seja efetiva e de qualidade, é preciso que seus atributos (essenciais e derivados) e papéis sejam operacionalizados em sua totalidade, bem como tenha a sua função de coordenação da atenção à saúde em pleno funcionamento. É preciso que haja um equilíbrio entre a demanda e a oferta dos serviços de saúde, a fim de garantir uma assistência de qualidade, tanto no âmbito individual quanto coletivo. Há ainda a necessidade de implementação de ações e estratégias de saúde que fortaleçam a Atenção Primária à Saúde no Sistema Único de Saúde o que, consequentemente, contribuirá para uma Rede de Atenção à Saúde funcional. Nesse contexto, destaca-se a importância da identificação dos desafios relacionados à implementação das RAS, bem como do seu fortalecimento por meio de ações e inovações. Referências Bibliográficas BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. A Atenção Primária e as Redes de Atenção à Saúde. Brasília: CONASS, 2015. Disponível em: https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e-as- Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf. Acesso em:17 nov. 2020. LANDSBERG, G. et al. Análise de demanda em Medicina de Família no Brasil utilizando a CIAP. Ciência Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, n. 17, p. 3025-3036, 2012. MENDES, E. V. A construção social da atenção primária à saúde. Brasília: Conselho Nacional de Secretários de Saúde – CONASS, 2015. Disponível em: https:// www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-CONSTR-SOC-ATEN-PRIM-SAUDE.pdf. Acesso em 18 nov. 2020. OMS. Organização Mundial da Saúde. UNICEF. Cuidados primários de saúde: Relatório da Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde. Alma- Ata, Rússia; Brasília, UNICEF, 1979. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ publicacoes/declaracao_alma_ata.pdf. Acesso em: 18 nov. 2020. OPAS. Organização Pan-Americana da Saúde. Relatório 30 anos de SUS, que SUS para 2030? Brasília: OPAS; 2018. Disponível em: https://iris.paho.org/ handle/10665.2/49663. Acesso em: 18 nov. 2020. https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e-as-Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e-as-Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-CONSTR-SOC-ATEN-PRIM-SAUDE.pdf https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-CONSTR-SOC-ATEN-PRIM-SAUDE.pdf https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-CONSTR-SOC-ATEN-PRIM-SAUDE.pdf https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-CONSTR-SOC-ATEN-PRIM-SAUDE.pdf https://iris.paho.org/handle/10665.2/49663 https://iris.paho.org/handle/10665.2/49663 33 PORTELA, G. Z. Atenção Primária à Saúde: um ensaio sobre conceitos aplicados aos estudos nacionais. Physis, Rio de Janeiro, v. 27, n. 2, p. 255-276, jun./2017. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/physis/v27n2/1809-4481- physis-27-02-00255.pdf. Acesso em: 22 ago. 2020. STARFIELD, B. Atenção Primária: equilíbrio entre necessidades de saúde, serviços e tecnologia. Brasília: UNESCO; Ministério da Saúde, 2002. Disponível em: https:// pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lis-19860. Acesso em: 17 nov. 2020. https://www.scielo.br/pdf/physis/v27n2/1809-4481-physis-27-02-00255.pdf https://www.scielo.br/pdf/physis/v27n2/1809-4481-physis-27-02-00255.pdf https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lis-19860 https://pesquisa.bvsalud.org/portal/resource/pt/lis-19860 34 Processo de implantação das Redes Prioritárias Autoria: Patrícia Santos Prudêncio Leitura crítica: Danielle Leite de Lemos Oliveira Objetivos • Exemplificar o processo de implantação das Redes Temáticas Prioritárias no Sistema Único de Saúde (SUS). • Identificar e caracterizar as redes temáticas prioritárias de atenção. • Identificar os desafios do processo de implementação das Redes de Atenção à Saúde (RAS). 35 1. Redes de Atenção à Saúde (RAS) As Redes de Atenção à Saúde (RAS) são consideradas estratégias de organização da atenção à saúde direcionadas especificamente para atuaremna promoção do cuidado integrado, por meio da combinação entre a flexibilidade de alocação de práticas e tecnologias, bem como da coordenação do cuidado para a garantia da longitudinalidade do cuidado (OUVERNEY; NORONHA, 2013). Sua regulamentação se dá pela Portaria nº 4.279, de 30 de dezembro de 2010 (BRASIL, 2010). A instituição de uma RAS, representa o funcionamento de um conjunto articulado e interdependente de unidades de saúde que possuem o propósito de promover uma atenção pautada na integralidade e no seguimento de acordo com as necessidades de cada indivíduo, levando em consideração a combinação custo/efetividade da alocação de recursos (OUVERNEY; NORONHA, 2013). As características das RAS são representadas pelos seguintes aspectos: a construção e manutenção de relações horizontais entre os pontos de atenção, tendo a Atenção Básica (AB) como centro de comunicação; o foco nas necessidades de saúde da população; a responsabilização pela continuidade e integralidade da atenção; atenção contínua e integral; a promoção de um cuidado multiprofissional; o comprometimento de compartilhamento de objetivos e o compromisso com resultados sanitários e econômicos (BRASIL, 2014). 1.1 Processo de implantação das Redes Temáticas Prioritárias A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que a implantação de sistemas integrados ou Redes de Atenção à Saúde (RAS) ocorra por meio da adoção de um modelo de atenção que tenha como foco atender as necessidades de saúde da população (BRASIL, 2015). Para que este processo de implantação das RAS ocorra é necessário a compreensão 36 de que vários aspectos precisam ser considerados, como exemplo: delimitação da população e a área de abrangência a ser atendida; estabelecimento de um diagnóstico situacional; construção de uma imagem que supere as lacunas assistenciais; articulação entre o sistema público e privado; planejamento pela efetiva necessidade; elaboração de um sistema logístico e de suporte; investimento nos indivíduos/equipes; criação de um sistema de regulação e governança para o funcionamento da rede; implementação de um financiamento sustentável e suficiente que garanta vinculação entre as metas e os resultados (BRASIL, 2014). Após a publicação da Portaria GM/MS nº 4.279/2010 que organiza no Sistema Único de Saúde (SUS) as RAS, cinco redes temáticas prioritárias foram pactuadas para serem implantadas nas regiões de saúde do país, a saber: 1) Rede Cegonha; 2) Rede de Atenção às Urgências e Emergências (RUE); 3) Rede de Atenção Psicossocial (Raps); 4) Rede de Cuidado à Pessoa com Deficiência; 5) Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas (BRASIL, 2014). A seguir são apresentadas algumas particularidades de cada uma dessas RAS. 1.2 Rede Cegonha A Rede Cegonha (RC) é uma rede temática que foi instituída em 2011. Considerada uma inovadora estratégia implementada pelo Ministério da Saúde (MS) no âmbito do SUS, ela é regulamentada pela Portaria nº 1.459 (BRASIL, 2011a). Seu funcionamento tem como base os princípios do SUS, ou seja, visa garantir a universalidade, a equidade e a integralidade da atenção à saúde. Dessa forma, a RC é organizada de modo a assegurar o acesso, o acolhimento e a resolutividade, por meio de um modelo de atenção direcionado ao cuidado pré-natal, parto e nascimento, puerpério e sistema logístico, que inclui transporte sanitário e regulação. 37 A RC é uma rede de cuidados que visa garantir à mulher o direito ao planejamento reprodutivo e atenção humanizada durante todo o ciclo gravídico-puerperal, bem como garantir à criança o direito ao nascimento seguro, ao crescimento e ao desenvolvimento saudáveis. Além disso, tem como objetivo promover a implementação de novo modelo de atenção à saúde, à mulher e à criança, contribuindo, assim, para a redução da mortalidade materna e infantil com destaque na ênfase no componente neonatal (BRASIL, 2015). A operacionalização da RC ocorre em cinco fases, como ilustrado na figura a seguir: Figura 1 – Operacionalização da Rede Cegonha Fonte: adaptada de Brasil (2015). A verificação do cumprimento das ações de cada componente da rede será realizada anualmente pelo MS, de forma compartilhada com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) e o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) (BRASIL, 2014). Ao refletirmos sobre os componentes da RC, podemos considerar quatro componentes, conforme demonstrado na Figura 2 abaixo: 38 Figura 2 – Quatro componentes da Rede Cegonha Fonte: adaptada de Brasil (2015). O componente pré-natal é essencial para a organização da rede e é responsabilidade da APS que deve atuar como centro de comunicação. Conforme Brasil (2015), o atendimento de pré-natal deve envolver: estratificação dos riscos e vulnerabilidades, vinculando a gestante aos pontos de atenção; realização de pré-natal em uma unidade básica de saúde; garantia dos exames previstos em protocolos; vínculo com uma maternidade durante o período da gestação. O componente parto e nascimento, deve ter seu sistema organizacional definido por região, de forma que tenha condições de oferecer assistência obstétrica e neonatal (Unidade de Terapia Intensiva, Unidade de Cuidados Intensivos e Canguru), bem como proporcionar ambiência das maternidades, garantia de acompanhante durante o acolhimento e o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato (BRASIL, 2015). Convém destacar aqui, que a garantia de acompanhante durante o trabalho de parto, parto e nascimento, tem relação e estão relacionadas à aplicação de tecnologias leves de cuidado em saúde, ou seja, ao oferecimento de orientações sobre o pré-natal, acolhimento, bem como a livre escolha da mulher nas diferentes etapas e que contemplam a inclusão dos 39 familiares e/ou acompanhante de sua preferência no processo de parturição (PEREIRA et al., 2018). O terceiro componente é relacionado ao puerpério e à Atenção Integral à Saúde da Criança que também é de responsabilidade das equipes de APS e que visam oferecer acompanhamento à puérpera e à criança, até mesmo com visita domiciliar na primeira semana após a realização do parto e nascimento, além de incentivar a implementação de ações que atuem na promoção do aleitamento materno e da alimentação complementar saudável. Ainda, prevê a busca ativa das crianças vulneráveis, a prevenção e o tratamento das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DSTs), a orientação sobre a saúde sexual e reprodutiva, bem como a disponibilização de métodos contraceptivos (BRASIL, 2015). O quarto componente, descrito em Brasil (2011), diz respeito ao sistema logístico e contempla o acesso ao transporte sanitário seguro para as gestantes, as puérperas e os recém-nascidos de alto risco, sendo este tipo de atendimento realizado pelo Sistema de Atendimento Móvel de Urgência (Samu-Cegonha), cuja recomendação é que sejam devidamente equipados com incubadoras e ventiladores neonatais. Em relação ao sistema logístico, sua regulação deve seguir o modelo “Vaga Sempre”, contemplando a elaboração e a implementação de um plano em que esteja previsto o vínculo da gestante ao local de ocorrência do parto e implantação da regulação de leitos obstétricos e neonatais, bem como a regulação de leitos obstétricos e neonatais, e regulação de urgências e consultas ambulatoriais (BRASIL, 2015). Uma importante consideração a ser feita é que as boas práticas de atenção ao parto e nascimento incentivam o protagonismo da mulher em várias dimensões, além de possibilitarem o repensar do modelo obstétrico, contribuindo, assim, para a organização da RAS materno infantil, cujo intuito é garantir a acessibilidade, o acolhimento e a resolutividade aos usuários. Para que isso seja possível, os profissionais de saúde devem compreender a importância de se corresponsabilizarem 40 e assumirem condutas que reflitam boas práticas como possibilidade de transformação do modelo obstétrico (PEREIRA et al., 2018). Um exemplo deconduta é resgatar o protagonismo da mulher no cenário obstétrico na atenção ao parto e nascimento, ampliando o cuidado multidimensional pela superação da fragmentação e da linearidade das ações e das intervenções obstétricas. 1.3 Rede de Atenção Psicossocial A Rede de Atenção Psicossocial, tem como objetivo a criação, ampliação e articulação de pontos de atenção à saúde das pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas (Raps), sendo regulamentada pela Portaria GM/ MS nº 3.088 de 23 de dezembro de 2011 (BRASIL, 2011b). Para o funcionamento da Rede de Atenção Psicossocial, algumas diretrizes necessitam ser obedecidas, conforme Brasil (2015): o respeito aos direitos humanos, a garantia da autonomia e a liberdade das pessoas; a implementação de ações que garanta a promoção da equidade, por meio do reconhecimento dos determinantes sociais da saúde; a luta pela combate aos estigmas e preconceitos; a garantia de acesso, bem como a qualidade dos serviços; a oferta do cuidado integral e a assistência multiprofissional com destaque para a interdisciplinaridade; a atenção pautada na humanização e focada nas necessidades das pessoas. Outras diretrizes dessa rede estão relacionadas ao desenvolvimento de estratégias de redução de danos, enfoque nos serviços de base territorial e comunitária que envolvam a participação e controle social dos usuários e de seus familiares; organização dos serviços em rede de atenção à saúde regionalizada, com estabelecimento de ações intersetoriais a fim de contribuir para a garantia da oferta do cuidado integral; promoção de estratégias de educação permanente; 41 desenvolvimento da lógica do cuidado para pessoas com transtornos mentais e com necessidades associadas a utilização do crack, consumo de álcool e outras drogas (BRASIL, 2015). A Rede de Atenção Psicossocial apresenta os seguintes componentes, conforme ilustrado na Figura 3 a seguir: Figura 3 – Componentes da Rede de Atenção Psicossocial Fonte: adaptada de Brasil (2015). Convém destacar que o Ministério da Saúde tem a responsabilidade de apoiar a implementação, o financiamento, o monitoramento, bem como o processo avaliativo da Rede de Atenção Psicossocial em funcionamento em todo o território Nacional (BRASIL, 2015). 42 1.4 Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência A Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência faz parte do Programa Viver Sem Limites (VSL), lançado no fim de 2011, que é regulamentada pela Portaria GM/MS nº 793 de 24 de abril de 2012 (BRASIL, 2012) e que tem como objetivo ampliar o acesso e qualificar o atendimento as pessoas no âmbito do SUS, que apresentem alguma deficiência temporária ou permanente, progressiva, regressiva ou estável, intermitente ou contínua. As diretrizes gerais que fundamentam essa rede, dizem respeito aos direitos humanos, com garantia de autonomia, independência e liberdade das pessoas com deficiência para realizarem as próprias escolhas (BRASIL, 2015). A operacionalização dessa rede está pautada em cinco fases, conforme ilustrado na Figura 4 a seguir: Figura 4 – Operacionalização da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência Fonte: adaptada de Brasil (2015). Uma consideração importante a ser mencionada é que na esfera do Grupo Condutor Estadual, o Ministério da Saúde tem como atribuições mobilizar os dirigentes do SUS em cada fase da operacionalização da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência (BRASIL, 2015). 43 É fundamental que os componentes estejam articulados entre si, a fim de garantir a integralidade do cuidado e o acesso regulado a cada ponto de atenção e aos serviços de apoio. Para a garantia da equidade da atenção a esses usuários, segundo Brasil, (2015), é indispensável zelar pela: acessibilidade, comunicação, manejo clínico, implementação de medidas preventivas da perda funcional, e de redução do ritmo da perda funcional e/ou da melhora ou recuperação da função; aplicação de medidas de compensação da função perdida, bem como da manutenção da função atual. Os componentes dessa rede são ilustrados na Figura 5 a seguir. Figura 5 – Componentes da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência Fonte: adaptada de Brasil (2015). 1.5 Rede de Urgência e Emergência A Rede de Urgência e Emergência (RUE), também denominada de “Rede Saúde Toda Hora”, apresenta como prioridades as linhas de cuidados relacionadas aos sistemas: cardiovasculares, cerebrovasculares e traumatológicos. Tais prioridades dessa rede devem ser recomendadas 44 gradativamente em todo território nacional, respeitando os critérios epidemiológicos e a densidade populacional (BRASIL, 2015). O acolhimento com a classificação de risco é considerado um fator indispensável, sendo a qualidade e a resolutividade na atenção a base do processo e dos fluxos assistenciais de toda a RUE. A RUE possui, como diretriz, a ampliação do acesso e o acolhimento diante de casos agudos que surgem nos serviços de saúde em vários pontos de atenção, e que contempla a classificação de risco e a intervenção adequada e necessária aos diversos tipos de agravos. Tal atenção tem como recomendação a garantia da universalidade, equidade e integralidade na oferta assistencial direcionada às urgências clínicas, cirúrgicas, psiquiátricas, ginecológicos, obstétricas, pediátricas e todas as causas externas como traumatismos, violências e acidentes (BRASIL, 2015). A atuação da RUE é territorial, sendo a definição e organização das regiões de saúde e das redes de atenção fundamentadas nas necessidades de saúde das populações, bem como dos riscos e vulnerabilidades específicas. Deve prezar, ainda, pela garantia da equidade, integralidade do cuidado e qualificação da assistência. Os componentes da RUE contemplam os seguintes aspectos (BRASIL, 2015): • Atenção domiciliar. • Unidades de Pronto Atendimento (UPA) e conjunto de serviços de urgência 24 horas. • Força nacional de saúde do SUS. • Atenção Primária à Saúde. • Ações de promoção, prevenção e vigilância à saúde. • Disponibilização de Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu 192) e centrais de regulação médica das urgências e emergências. 45 • Salas de estabilização. Dentre os componentes da RUE, convém destacar o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), que tem como finalidade implementar ações com maior grau de eficácia e efetividade no oferecimento dos serviços de atendimento as necessidades de urgência e emergência, traumas e violência (BRASIL, 2015). 1.6 Desafios quanto à implementação das Redes Temáticas de Atenção à Saúde De acordo com Brasil (2014), existem vários desafios referentes à implementação das Redes Temáticas de Atenção à Saúde que necessitam ser superados, dentre os quais pode-se citar alguns: • Elaboração de cultura e implementação de práticas de trabalho em rede. • Utilização do planejamento territorial para o processo de estruturação das RAS. • Insuficiência no aspecto do financiamento para a dimensão das necessidades do sistema e inadequado. • Capacidade de gerenciamento ainda insuficiente para realização do monitoramento de todos os processos. • Presença de uma pactuação competitiva e que não cumpre o acordado, identificado pela falta de repasse dos fundos municipais e estaduais para os prestadores dos serviços. • Necessidade de implantação de uma regulação efetiva, uma vez que o processo ainda é considerado frágil e burocrático e com pouca decisão gestão. 46 • Implementação de ações para a formação, capacitação, qualificação e educação permanente dos trabalhadores. • Aprimoramento dos sistemas de informação por meio do monitoramento e avaliação dos resultados. • Existência de grupos de condutores das redes que não realizam o exercício de funções de articulação, interlocução, negociação, avaliação e responsabilidade pela tomada de decisão. 1.7 Governança das Redes de Atenção à Saúde O processo de governança das Redes de Atenção à Saúde no âmbitodo SUS é regulamentado pela Resolução nº 23, de 17 de agosto de 2017 (BRASIL, 2017) e que determina, também, as diretrizes para os processos de regionalização, planejamento regional integrado, estruturado de forma ascendente. Essa resolução especifica o compromisso dos três entes federados envolvidos no processo de implementação dos modelos de atenção à saúde, que contemplem o atendimento às políticas pactuadas e às necessidades de saúde da população brasileira (BRASIL, 2017). Determina a forma de alocação dos recursos de capital, bem como o custeio pelas três esferas de gestão levando em consideração os princípios da regionalização e da organização das RAS. 1.8 Considerações finais O processo de implantação das redes temáticas prioritárias da atenção no SUS é um processo que demanda a compreensão da importância de várias etapas a serem cumpridas, bem como desafios a serem superados para que a sua atuação funcional e efetiva. O propósito do processo de implantação visa atuar na promoção e na coordenação do cuidado, a fim de garantir que ele seja integrado, integral, contínuo de acordo com as necessidades de cada pessoa. 47 Referências Bibliográficas BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Implantação das Redes de Atenção à Saúde e outras estratégias da SAS. Brasília: Ministério da Saúde, 2014. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/ implantacao_redes_atencao_saude_sas.pdf. Acesso em: 18 nov. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. A Atenção Primária e as Redes de Atenção à Saúde. Brasília: CONASS, 2015. Disponível em: https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e- as-Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf. Acesso em:17 nov. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Resolução nº 23, de 17 de agosto de 2017. Estabelece diretrizes para os processos de Regionalização, Planejamento Regional Integrado [...]. Brasília: D.O.U., 2017. Disponível em: http://bvsms. saude.gov.br/bvs/saudelegis/cit/2017/res0023_18_08_2017.html. Acesso em: 18 nov. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 4.279, de 30 de dezembro de 2010. Estabelece diretrizes para a organização da Rede de Atenção à Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Brasília: D.O.U., 2010. Disponível em: https:// bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2010/prt4279_30_12_2010.html. Acesso em: 18 nov. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 1.459, de 24 de junho de 2011. Institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde–SUS–a Rede Cegonha. Brasília: D.O.U., 2011(a). Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/ prt1459_24_06_2011.html. Acesso em: 30 ago. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de [...]. Brasília: D.O.U., 2011(b). Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/ gm/2011/prt3088_23_12_2011_rep.html. Acesso em: 18 nov. 2020. BRASIL. Ministério da Saúde. Portaria nº 793, de 24 de abril de 2012. Institui a Rede de Cuidados à Pessoa com deficiência no âmbito do Sistema Único de Saúde. Brasília: D.O.U., 2012. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ saudelegis/gm/2012/prt0793_24_04_2012.html. Acesso em: 18 nov. 2020. OUVERNEY, A. M.; NORONHA, J. C. Modelos de organização e gestão da atenção à saúde redes locais, regionais e nacionais. In: FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ. A saúde no Brasil em 2030–prospecção estratégica do sistema de saúde brasileiro: organização e gestão do sistema de saúde. Fiocruz/Ipea/Ministério da Saúde/ Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Rio de Janeiro, v. 3, p. 143-182, 2013. Disponível em: http://books.scielo.org/id/98kjw/ pdf/noronha-9788581100173-06.pdf. Acesso em: 24 ago. 2020. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/implantacao_redes_atencao_saude_sas.pdf https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/implantacao_redes_atencao_saude_sas.pdf https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e-as-Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf https://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/A-Atencao-Primaria-e-as-Redes-de-Atencao-a-Saude.pdf http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cit/2017/res0023_18_08_2017.html http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/cit/2017/res0023_18_08_2017.html https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2010/prt4279_30_12_2010.html. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2010/prt4279_30_12_2010.html. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt1459_24_06_2011.html http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt1459_24_06_2011.html http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt3088_23_12_2011_rep.html http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt3088_23_12_2011_rep.html http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2012/prt0793_24_04_2012.html http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2012/prt0793_24_04_2012.html http://books.scielo.org/id/98kjw/pdf/noronha-9788581100173-06.pdf http://books.scielo.org/id/98kjw/pdf/noronha-9788581100173-06.pdf 48 PEREIRA, S. B. et al. Boas práticas de atenção ao parto e ao nascimento na perspectiva de profissionais de saúde. Rev. Bras. Enferm., Brasília, v. 71, supl. 3, p. 1313-1319, 2018. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S0034-71672018000901313&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 26 ago. 2020. 49 Reorganização dos fluxos de atendimento Autoria: Patrícia Santos Prudêncio Leitura crítica: Danielle Leite de Lemos Oliveira Objetivos • Apresentar a conceituação e caracterização do sistema de referência e contrarreferência. • Apresentar o funcionamento do sistema de referência e contrarreferência. • Identificar as dificuldades e os desafios dos sistemas de referência e contrarreferência. 50 1. Rede de Atenção à Saúde e a integralidade do cuidado A Rede de Atenção à Saúde (RAS) apresenta como uma das suas metas o cumprimento da integralidade do cuidado, que está relacionado ao conjunto articulado e contínuo da implementação de ações e serviços com enfoque preventivo e curativo, bem como individual e coletivo, em todos os níveis de complexidade dos sistemas de saúde. A integralidade é considerada uma condição que deve ser garantida e aprimorada a todos os usuários. Ela está relacionada na promoção do acesso, do direito de atenção em todos os momentos que representem necessidade para o usuário. Envolve, ainda, a perspectiva do olhar profissional que considere o ser humano em sua multidimensionalidade (QUEVEDO et al., 2016). Para que a integralidade do cuidado seja atendida nas RASs faz-se necessário que os serviços de saúde das RASs atuem de forma integrada (QUEVEDO et al., 2016). Para tanto, é necessário a implementação de uma rede informatizada de suporte ao processo de regulação do acesso, bem como zelar pela manutenção da capacitação profissional para a regulação do acesso. Além disso, conforme Mendes (2011), é preciso providenciar sistemas de monitoramento e avaliação de suas atividades. Importante destacar que sistemas organizados em diferentes níveis de atenção, como no caso das RASs, é necessário a presença de um sistema de referência e contrarreferência para tornar os fluxos de atendimento viáveis entre as diferentes esferas que compõem o sistema. Nas RASs, esse sistema integra o sistema logístico, que deve estar conectado à Tecnologia da Informação, a fim de garantir uma organização racional dos fluxos e contrafluxos de informações, produtos e pessoas. Dessa forma, segue o autor, permitirá um processo dinâmico de referência e contrarreferência ao longo dos pontos de atenção. 51 1.1 Sistema de referência e contrarreferência Os sistemas de referência e contrarreferência são caracterizados pela tentativa de realizar uma organização dos serviços de saúde de maneira que favoreça o acesso às pessoas que procuram pelos serviços de saúde. Neste sistema, quando o usuário que é atendido na unidade básica, apresentaa necessidade de um atendimento específico, é referenciado, ou seja, encaminhado para uma unidade de maior complexidade, no intuito de receber a assistência que necessita. Quando o usuário finaliza o atendimento de tal necessidade, deve retornar à unidade de origem para seguir o acompanhamento iniciado, o que caracteriza ser “contrarreferenciado”. Uma consideração importante a ser mencionada é que a referência e a contrarreferência deve ser realizada em formulário próprio da instituição que deve ser preenchido por um profissional responsável e que tenha nível superior (BRASIL, 2011). Dessa forma, os serviços de saúde estarão conectados entre si, ou seja, um informará ao outro em relação aos procedimentos realizados pelo paciente, bem como as possíveis condutas a serem adotadas (ALVES et al., 2015). Para Pereira e Machado (2016), a referência é caracterizada pelo ato de encaminhar o usuário de um nível de atenção de menor complexidade para um nível de maior complexidade de acordo com a sua necessidade. E a contrarreferência ocorre quando o usuário retorna para um nível de atenção de menor complexidade, vindo de um nível de média ou maior complexidade, isto é, quando a continuidade do tratamento pode ser realizada em um nível de atenção que demande menos recursos tecnológicos e terapêuticos. Para estes autores, o sistema de referência e contrarreferência é considerado um desafio para a implementação da integralidade em saúde, pois para o alcance de um atendimento integral e integrado demanda uma mudança das práticas de saúde em vários aspectos e que estão relacionados à(s): instituição, organização e 52 articulação dos serviços de saúde, práticas dos profissionais, interação com os demais sistemas da saúde. Silva et al. (2018) destacam que a realização de contrarreferência é considerada um aspecto importante, uma vez que favorece a redução de encaminhamentos ao serviço terciário sem necessidade ou critérios, proporcionando que o paciente não permaneça como cliente ativo da instituição em questão. Cabe destacar, segundo Mendes (2011), que o sistema de referência e contrarreferência é caracterizado por ser um sistema que se desenvolve em quatro componentes que devem funcionar de maneira integrada, como demonstrado na figura a seguir: Figura 1 – Sistema de referência e contrarreferência desenvolvido em quatro componentes Fonte: adaptada de Mendes (2011). 53 1.2 Níveis de complexidade A resolução CIPLAN nº 03 de 25 de março de 1981 (BRASIL, 1981), que regulamenta a cobertura dos serviços de saúde como uma oferta sistematizada e contínua de serviços básicos de saúde com o intuito de atender as necessidades de uma população em específico, em lugares acessíveis e que tenham como propósito garantir o acesso da população quanto aos diferentes níveis de atendimento do sistema de serviços de saúde. Nessa resolução, são definidas as características dos níveis de complexidade da atenção, levando em consideração as atividades por eles prestadas, bem como a profundidade de especialização destas e a frequência em que ocorrem. Os níveis de complexidade são três, a saber: Figura 2 – Níveis de complexidade da atenção Fonte: adaptada de Mendes (2011). De acordo com a Resolução CIPLAN nº 03 de 25 de março de 1981 (BRASIL, 1981), os níveis de atenção à saúde, de acordo com a sua complexidade, podem ser exemplificados da seguinte forma: 54 • Nível primário: representado pelas atividades de promoção, proteção e recuperação da saúde e que se enquadram no nível ambulatorial, onde algumas atividades são agrupadas, como exemplo, as atividades de saúde, saneamento e apoio diagnóstico. • Nível secundário: é destinado à realização de atividades assistenciais e que envolvem quatro especialidades médicas consideradas básicas, a saber: área da clínica médica, ginecologia e obstetrícia, pediatria e a clínica cirúrgica. Contempla, ainda, as especialidades estratégicas, nas modalidades de atenção ambulatorial, internação, urgência e reabilitação. • Nível terciário: é caracterizado por apresentar a maior capacidade de resolução de casos mais complexos do sistema e que engloba as modalidades de atendimento ambulatorial, internação e urgência. Contempla, ainda, as especialidades estratégicas nas modalidades de atenção ambulatorial, internação, urgência e reabilitação. Já em relação ao nível terciário, este é caracterizado por apresentar a maior capacidade de resolução de casos mais complexos do sistema, e que engloba as modalidades de atendimento ambulatorial, internação e urgência. Uma importante consideração a ser mencionada quanto aos níveis de complexidade da atenção está relacionada à garantia da integralidade do cuidado. Isso significa dizer que o indivíduo é um ser indissociável e que possui plenos direitos ao acesso à saúde, o que envolve o atendimento relacionado à promoção da saúde até a reabilitação desta. Por isso, a integralidade é uma condição que deve ser um alvo a ser cumprido e aprimorado (QUEVEDO et al., 2016). 55 1.3 Funcionamento do sistema de referência e contrarreferência O sistema logístico da RAS é fundamentado na Tecnologia da Informação que tem como propósito garantir uma organização racional dos fluxos e contrafluxos de informações, produtos e pessoas, possibilitando, assim, o estabelecimento de um processo dinâmico de referência e contrarreferência ao longo dos pontos de atenção (PEREIRA; MACHADO, 2016). Em relação ao funcionamento do sistema de referência e contrarreferência, Xiang et al. (2013) destacam que a transição de cuidados é representada pelo encaminhamento de um usuário da APS para outro nível de complexidade, sendo o intercâmbio de informações ocorrido por meio de carta de referência, que usualmente é impressa e escrita pelo profissional. Nesse contexto do funcionamento dos serviços de referência e contrarreferência, estudos comprovam a necessidade de melhorias. Por exemplo, o estudo realizado por Alves et al. (2015) teve por objetivo analisar a estrutura da rede de referência e contrarreferência sob a visão dos atendimentos realizados em um serviço de urgência. Foram avaliados 605 pacientes que deram entrada em um serviço de pronto atendimento e permaneceram ali por mais de 24 horas. Os autores constataram que foi significativa a quantidade de pessoas que se autorreferenciam ao pronto atendimento de saúde como primeira escolha. Tal fato reflete que os pacientes envolvidos nesse estudo não procuram a APS, o que pode ser atribuído à falta de orientações sobre qual serviço deve ser procurado, ou ainda devido à baixa resolutividade desse nível de atenção. Os autores deste estudo concluem que tais resultados servem de suporte para auxiliar na organização da rede de saúde no município em questão, bem como contribuir para melhorar a articulação dos serviços 56 de saúde nos diferentes níveis de atenção, almejando, assim, que os pacientes com queixas menores de urgência busquem pela Atenção Primária. Destacam, ainda, a necessidade de implementação de um instrumento de referência e contrarreferência nas atividades práticas dos estabelecimentos de saúde, no intuito de gerar uma integração da rede e continuidade dos cuidados a serem oferecidos aos usuários em todos os níveis de atenção (ALVES et al., 2015). 1.4 Atuação da enfermeira no sistema de referência Em relação à atuação da enfermeira para o funcionamento do sistema de referência, o estudo realizado por Ribas et al. (2018) identificou a atuação da “enfermeira de ligação” ser uma importante estratégia para melhorar a integração entre os serviços e promover a continuidade do cuidado. Convêm destacar, que o termo “enfermeira de ligação” é utilizado em alguns serviços de saúde de países como o Canadá, Espanha e Portugal, uma vez que adotam a função de “enfermeira de ligação”. É essencial que a enfermeira adote o papel de coordenadora da alta hospitalar, bem como deve envolver-se nesse processo de transição. No