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82 europa, o centro do mundo Desde que as pessoas começaram a enriquecer rapidamente, com as finanças e o comércio, o Segundo Estado conquistou um novo respeito. Seus gastos e seus luxos tornaram-no alvo da inveja do Primeiro. Inevitavelmente, os dois se fundiram, e hoje não há mais diferenças na maneira como administram suas casas, dão jantares e se vestem. [...] Também não é mais possível enxergar diretamente diferenças entre os ramos do Terceiro [Estado]. O mais ordinário artesão comporta-se como igual do mais eminente artiste [artista], ou de qualquer pessoa que pratique um negócio superior ao seu. p Luis XV, retratado por carle van Loo, no século XVIII. em seu reinado, iniciou-se o processo de desagregação da monarquia absolutista francesa. 2 análise de imagens e de texto Para responder às próximas questões, examine a imagem e o texto abaixo. Observe também a imagem de Luís XIV, por Hyacinthe Rigaud, em tela de 1701 (reproduzida na página 77). O trecho a seguir, citado pelo historiador francês Darnton, foi escrito por um burguês que vivia do arrendamento de suas terras na cidade francesa de Montpellier, em 1768. Ele faz referência às divisões sociais: o Segundo Estado era formado pela nobreza e o Terceiro Estado, pelo povo. Havia ainda o Primeiro Estado, formado pelo clero. A lb u m /a k g -i m a g e s /L a ti n s to ck /M u s e u d e B e la s -A rt e s , P a ri s , F ra n ç a . HGB_v2_PNLD2015_073a083_u1c06.indd 82 3/21/13 3:28 PM o camInHo daS monarquIaS europeIaS 83 a) Descreva as imagens, tentando identificar os diversos objetos que cercam os reis Luís XIV e Luís XV, bem como suas vestimentas. Em que medida tais objetos expressam o poder real? b) Assim como as pinturas retratam a realeza francesa, o texto revela a importância da visibilidade dos sinais de distinção social. Explique por que esses sinais de distinção social eram importantes. c) Que transformações sociais são destacadas pelo membro da burguesia francesa? 3 análise de fonte histórica O texto abaixo é um trecho das memórias escritas pelo monarca francês Luís XIV, constituindo uma im- portante fonte histórica do período, sobre as bases do Estado centralizado e sobre a atuação do monarca. Leia-o e responda às questões propostas. [...] deveria existir um regulamento exigindo que todo criado, do sexo masculino ou feminino, usasse um distintivo bem visível, na roupa. Porque nada é mais impertinente do que ver um cozinheiro ou um cama- reiro que enverga um traje enfeitado com galões ou renda, põe a espada à cinta e se insinua em meio à melhor companhia, nos passeios públicos; ou ver uma camareira vestida tão elaboradamente quanto sua patroa; ou encontrar criados domésticos de qualquer tipo enfeitados como se fossem nobres. Tudo isto é revoltante. O estado dos criados é de servidão, de obediência às ordens de seus patrões. [...]. DARNTON, Robert. O grande massacre de gatos e outros episódios da história cultural francesa. Rio de Janeiro: Graal, 1986. p. 186-188. Informado de tudo, escuto os meus súditos mais humildes; conheço a todo o momento o número e a quali- dade das minhas tropas, bem como a situação das minhas praças; dou incessantemente as minhas ordens para todas as suas necessidades; trato imediatamente com os ministros estrangeiros; recebo e leio os despachos; redijo, eu mesmo, uma parte das respostas e passo aos meus secretários o cerne das demais; regulo os ingressos e os gastos do meu Estado; faço com que me prestem conta diretamente aqueles a quem coloco nos cargos importantes; conduzo os meus negócios de forma tão secreta quanto nenhum outro tinha feito antes de mim; distribuo as graças pelo meu próprio critério e conservo, se não me engano, aqueles que me servem, embora favorecidos com benefícios, destinados a eles mesmos e aos seus, dentro de uma modéstia muito longínqua da elevação e do poder dos primeiros ministros. [...]. A tranquilidade dos súditos só se encontra na obediência. [...] Sempre é menos ruim para o público suportar do que controlar incluso o mau governo dos reis, do qual Deus é único juiz. Aquilo que os reis parecem fazer contra a lei comum funda-se, geralmente, na razão de Estado, que é a primeira das leis, por consentimento de todo mundo, mas que é, no entanto, a mais desconhecida e a mais obscura para todos aqueles que não governam. LUÍS XIV, Rei da França. Memorias. (Versão espanhola de Aurelio Garzón del Camino). México: Fondo de Cultura Económica, 1989. p. 28-37. a) Partindo da leitura do primeiro parágrafo do texto, explique a expressão atribuída ao monarca Luís XIV: “o Estado sou eu”. b) Segundo as palavras de Luís XIV, qual o único juiz que poderia julgar um rei? c) Explique que papel Luís XIV atribuía aos súditos no trecho citado acima. d) De acordo com Luís XIV, de que maneira a chamada “razão de Estado” legitima e justifica as ações do rei? e) Referindo-se à razão de Estado, Luís XIV afirma que ela “é, no entanto, a mais desconhecida e a mais obscura para todos aqueles que não governam”. Como você interpreta isso? HGB_v2_PNLD2015_073a083_u1c06.indd 83 3/21/13 3:28 PM américa portuguesa: expansão e diversidade econômica7 Capítulo 84 europa, o centro do mundo p Repouso de uma caravana, litogra- fi a de Johann moritz rugendas, presente na obra Viagem pitoresca ao Brasil, de 1835. R e p ro d u ç ã o /C o le ç ã o p a rt ic u la r economia e sociedade Até que ponto nossa vida depende das condições materiais e eco- nômicas? A vida de uma pessoa pode ser completamente diferente da vida de outra pessoa que more na mesma cidade, na mesma época, dadas as suas condições econômicas, educacionais e de classe social. E pode ter muitas semelhanças com a vida das pessoas de outros tempos. Grande parte das características culturais das diferentes regiões brasileiras da atualidade resultou das condições da vida material e das atividades econômicas desenvolvidas ao longo da história colonial. Neste capítulo, você poderá refl etir sobre esses temas, no decorrer dos estudos sobre os acontecimentos políticos e econômicos do Brasil no período co- lonial. para pensar HistOricaMente HGB_v2_PNLD2015_084a098_u1c07.indd 84 3/21/13 3:29 PM amérIca portugueSa: expanSão e dIverSIdade econômIca 85 0º Adaptado de: IstoÉ. Brasil – 500 anos: atlas histórico. São Paulo: Grupo de Comunicação Três S.A., 1998. p. 18. p a extensão máxima do Brasil holandês foi atingida em 1641, quando a Holanda dominava sete das 14 capitanias brasilei- ras. recife foi a cidade colonial que mais se benefi ciou com esse domínio. o Brasil holandês A ll m a p s /A rq u iv o d a e d it o ra A presença holandesa na colônia deixou inúmeros legados culturais: os monumentos arquitetônicos como palácios, igrejas e pontes; as referências que ainda hoje permanecem na cultura popular, como letras e imagens carna- valescas; os registros de artistas, cientistas, cartógrafos, pintores, entre outros membros da comitiva de Maurício de Nassau. as invasÕes de naÇÕes eurOpeias Desde a chegada de Cabral, o domínio português sobre sua colônia na América foi ameaçado por outros países europeus. Nem mesmo a instauração dos gover- nos-gerais em 1549 e a implantação bem-sucedida do empreendimento açucareiro conseguiram afastar as incursões estrangeiras que, ao contrário, aumentaram nos séculos XVI e XVII. A União Ibérica (1580-1640), período em que Portugal e suas colônias passaram a integrar as posses da Espanha, atraiu para o Brasil os inimigos europeus dos castelhanos, descontentes com sua hegemonia, sobretudo franceses e holandeses. Os franceses, após terem realizado o contra- bando de pau-brasil no litoral brasileiro no início do século XVI, fundaram, em 1555, uma colônia no Rio de Janeiro: a França Antártica. Foram expulsos pelo governador-geral Mem de Sá, em 1567, mas intensifi - caram sua presença noNordeste brasileiro. Tentaram estabelecer no Maranhão uma nova colônia, a França Equinocial. Também essa tentativa fracassou. Em decorrência da União Ibérica, os holandeses estenderam sua inimizade pelos espanhóis às colô- nias do Império Português. Nos Países Baixos, que na época também incluíam o território da atual Bélgica, o desenvolvimento comercial e a adoção do protes- tantismo calvinista pela maioria da população leva- ram as elites mercantis fl amengas a lutar pela auto- nomia política diante do domínio espanhol e católico. Em 1581, obtiveram a independência. A luta com os Países Baixos enfraqueceu o pode- rio espanhol. Após uma trégua, os Países Baixos reto- o legaDo HolanDÊs maram a ofensiva militar, fundando, em 1621, a Com- panhia das Índias Ocidentais, destinada a contro- lar o comércio do açúcar brasileiro e apossar-se dos domínios ibéricos na costa americana e africana. Depois de uma tentativa frustrada de invadir Salva- dor, em 1630, os holandeses organizaram uma grande expedição que atacou a principal área açucareira da América portuguesa, a região de Olinda e Recife, onde permaneceram por quase 25 anos. R e p ro d u ç ã o /A c e rv o I c o n o g ra fi a /R e m in is c ê n c ia s a rua da cruz em recife, desenho do sé- culo xIx de L. Schlappriz e litografi a de F. H. carls. P HGB_v2_PNLD2015_084a098_u1c07.indd 85 3/21/13 3:29 PM 86 europa, o centro do mundo O domínio holandês na colônia portuguesa estendeu-se desde o litoral do atual Maranhão até o território que hoje corresponde ao Sergipe. Para admi- nistrá-lo foi nomeado o conde Maurício de Nassau, que permaneceu no cargo entre 1637 e 1644. Preo- cupado em normalizar a rica produção açucareira, o conde conseguiu a colaboração de muitos senhores de engenho, concedendo-lhes empréstimos que per- mitiram o aumento da produtividade. Ele também trouxe artistas e cientistas da Europa, concedeu liber- dade de credo e modernizou Recife urbanisticamente. Os últimos anos da administração de Nassau fo- ram de muitas dificuldades, com a queda de preço do açúcar no mercado europeu, perda de safras por incên- dios, pragas e inundações e falência de muitos senhores. A Companhia das Índias Ocidentais, apesar de to- das essas dificuldades, determinou a cobrança integral das dívidas dos senhores de engenho, com juros eleva- dos. Nassau, contrário às medidas e acusado de mau uso dos recursos, entregou o cargo, decidindo voltar à Europa. Com a saída de Nassau, aumentou o confron- to dos senhores de engenho com a Companhia. Antes mesmo que ele deixasse o Brasil, a luta havia se inten- sificado no Maranhão, culminando com a expulsão dos holandeses de São Luís. A insurreição alastrou-se pelo Nordeste, atingindo Pernambuco em 1645. Eclodiu en- tão o movimento que expulsou definitivamente os ho- landeses, a Insurreição Pernambucana (1645-1654). Inicialmente os colonos não contaram com a ajuda do reino de Portugal. Apenas depois das pri- meiras vitórias o movimento foi ganhando apoio e reforços metropolitanos. A luta, que tinha entre seus líderes o negro Henrique Dias e o indígena Felipe Ca- marão, fortaleceu-se com a adesão dos senhores de engenho às forças populares. Os holandeses foram obrigados a concordar com a Paz de Haia, assinada em 1661. Sob intermediação inglesa, reconheceram os domínios coloniais lusos em troca de uma indenização. Simultaneamente, au- mentavam os vínculos entre Portugal e Inglaterra. Expulsos do Nordeste brasileiro, os ho- landeses implantaram a empresa açucareira em seus domínios coloniais nas Antilhas, de onde passaram a concorrer com vantagem sobre o açúcar brasileiro, já que eles haviam aprendido as técnicas de cultivo da cana e de produção do açúcar. Isso provocou a primei- ra crise da economia colonial, levando o Nor- deste à perda de sua supremacia econômica na colônia. Henrique Dias e Felipe Camarão formaram poderosas lideranças na luta contra os holandeses. Na divisão das lide- ranças dos índios potiguares, quando alguns deles resolveram alinhar-se aos holandeses, Felipe Camarão (1601-1648) decidiu manter-se fiel aos portugueses. Participou da resistência ar- mada contra os holandeses e seus aliados potiguares, obtendo diversos sucessos em batalhas, a mais memorável delas foi a primeira batalha de Guararapes. O indígena recebeu do rei Filipe III de Portugal o hábito de cavaleiro da Ordem de Cristo, o direito de usar o título de dom e brasão de armas, bem como soldo de capitão-mor dos índios. Morreu pouco antes da vitória final portuguesa de “febre maligna”. Já Henrique Dias (nascido entre 1575 e início do século XVII e morto em 1662) comandou um exército de negros libertos lutando em várias frentes de batalha até a vitória final. No período de relativa paz entre holandeses e colonizadores portugueses, Henrique Dias deixou os combates, “atuando talvez como capitão do mato em busca de escravos fugidos”, retomando os embates contra os holandeses a partir de 1645, em seguidas ofensivas nas batalhas de Guararapes, entre 1648 e 1649. Depois da expulsão dos holandeses, recebeu comendas, como a da Ordem de Cristo, alforria para seus co- mandados, além de fazendas e dinheiro.1 Henrique Dias e Felipe Camarão à Frente De negros e ínDios entre ColonizaDores R e p ro d u ç ã o /I g re ja d e N o s s a S e n h o ra d a C o n c e iç ã o d o s M il it a re s , R e c if e , P E . ∏ detalhe de um painel de 1781 (anônimo) da Igreja de nossa Senhora da conceição dos militares, no recife, representando a expulsão dos holandeses pelos colo- nos brasileiros. observe que as forças coloniais não usavam calçados. 1 VAINFAS, Ronaldo, RAMINELLI, Ronald (Dir.) Dicionário do Brasil colonial (1500-1808). Rio de Janeiro: 2000. p. 224-225 e 279-280. HGB_v2_PNLD2015_084a098_u1c07.indd 86 3/21/13 3:29 PM