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Transferência de massa Luana Santana dos Santos OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM > Reconhecer a importância do estudo da transferência de massa por meio de situações cotidianas. > Identificar os mecanismos físicos de transferência de massa. > Comparar transferências de calor e de massa. Introdução A transferência de massa pode ocorrer por dois mecanismos: difusão molecular e convecção. Na difusão molecular, o movimento molecular aleatório é o principal responsável pelo movimento das moléculas e, consequentemente, pela troca de matéria entre duas regiões que apresentem o diferencial de concentração de um componente. Já no mecanismo de convecção, a troca de matéria ocorre quando o fluido em movimento está sob uma superfície e existe a diferença de concentração de espécies entre essas regiões. A transferência de massa pode ser entendida como o movimento da matéria no espaço. Em geral, os sistemas que apresentam esse fenômeno são compostos por várias espécies, logo, há o movimento de uma destas entre os componentes do sistema. Para ocorrer esse movimento, devem existir regiões com diferentes concentrações, pois a transferência de massa ocorre no sentido das regiões onde a concentração dessa espécie é mais alta para uma região de concentração inferior. Algumas aplicações que utilizam os princípios da transferência de massa são: processos industriais de destilação, absorção, extração, evaporação, reatores químicos, entre outras utilizações na engenharia. Neste capítulo, você estudará as situações do cotidiano que ocorrem devido à transferência de massa. Além disso, conhecerá os mecanismos físicos de trans- ferência de massa. Por fim, verá a diferença entre as transferências de massa e de calor. Importância da transferência de massa O processo de transferência de massa pode ocorrer em todos os estados físicos da matéria. Por exemplo, se um recipiente com água é deixado em contato com o ar ambiente por um longo período, ocorre a evaporação da água, ou seja, ocorre a transferência por difusão de moléculas de água do líquido para o ar, o que será identificado pela redução do volume do reci- piente. Outro exemplo é o desaparecimento de bolas de naftaleno utilizadas em residências, detectado pelo olfato quando as moléculas se difundem no local. Esse é um fenômeno parecido ao que ocorre com o gelo seco, só que, neste caso, há formação de uma nuvem de CO2 na atmosfera. Na engenharia, um processo comum é a adição de carbono ao ferro para promover o endurecimento do metal, característica obtida pela difusão do carbono nos moldes nos quais estão o ferro (ÇENGEL; GHAJAR, 2012). Outro sistema comum é a presença de um sólido, como o açúcar, que se difunde em um líquido, como o café. Por exemplo, quando há uma grande concentração de açúcar no fundo do recipiente com café, ele é difundido para as outras regiões do recipiente nas quais a sua concentração é inferior; esse pro- cesso pode ser favorecido pela agitação com uma colher, por exemplo (BIRD; STEWART; LIGHTFOOT, 2010). A Figura 1, a seguir, apresenta esses processos de transferência de massa. Transferência de massa12 Figura 1. Exemplos de transferência de massa. Fonte: Çengel e Ghajar (2012, p. 797). Entre os diversos eventos do cotidiano que envolvem a transferência de massa, pode-se citar a solubilização do sal na água ou até mesmo o preparo de um chá por infusão, em que a substância presente no vegetal em grande concentração é transferida para a água com o passar do tempo até atingir o equilíbrio, conforme a Figura 2. Além disso, outros processos que envolvem a solubilização e a difusão do oxigênio ocorrem nos aquários, possibilitando a manutenção da vida aquática, e no arejamento de reservatórios de água, aplicado para aumentar a concentração de oxigênio e outras substâncias na água. Assim, com a remoção de substâncias da água, o gás carbônico em excesso é transferido para o ar. Transferência de massa 13 Figura 2. Exemplo de transferência de massa em preparo de chá. Fonte: Portal... (c2017, documento on-line). Os processos de evaporação relacionam as transferências de calor e de massa. Na atmosfera, ocorre uma contínua evaporação e condensação da água do solo, dos oceanos, etc., e várias formas de vida são dependentes desses processos, bem como o clima do meio ambiente. Tais processos são governados pelas correntes atmosféricas convectivas e pela difusão do vapor de água (HOLMAN, 1999). Outro processo que envolve transferência de massa utilizado industrial- mente é a extração sólido–líquido para a fabricação do café. A extração de óleo de soja e de componentes do minério também pode ser feita por meio dessa operação, além do estudo de reatores químicos nos quais ocorre a transferência de reagentes para uma superfície (FOUST et al., 1982). Portanto, o entendimento da transferência de massa é essencial para o desenvolvi- mento de equipamento, processos e produtos para a aplicação no cotidiano e nas indústrias. A transferência de massa através de uma fase ou entre duas fases requer um afastamento das condições de equilíbrio. Por exemplo, no caso da dissolução do sal em água, a transferência do sólido ocorre até se atingir um valor máximo, de modo que a solubilidade do sal sofre variações de acordo com a temperatura da água. Nesse caso, quanto maior for a temperatura, maior será a quantidade de sólido dissolvido. Transferência de massa14 Mecanismos físicos da transferência de massa A transferência de massa pode ser associada à convecção, na qual a massa é transportada de um lugar para outro na corrente do fluido. Esse é um fenômeno macroscópico, de modo que é estudado na mecânica dos fluidos. Quando se tem uma mistura de gases ou de líquidos e existe um gradiente de concentração entre algum dos componentes da mistura, ocorrerá a difusão, uma transferência de massa a nível microscópico (HOLMAN, 1999). Difusão molecular O movimento de uma espécie química a partir de uma região de concentração elevada até outra de menor concentração pode ser exemplificado quando se adiciona dicromato de potássio à água. O dicromato em grande concentração no fundo do recipiente é difundido para as outras regiões do recipiente nas quais a sua concentração é baixa ou nula. A lei de Fick da difusão descreve o movimento de uma substância (dicromato de potássio) dentro de uma mistura (dicromato + água) na qual ela é um dos componentes, devido ao gradiente de concentração dessa substância (BIRD; STEWART; LIGHTFOOT, 2010). Essa difusão é claramente observada a olho nu, devido à coloração do dicromato que se espalha na água, conforme a Figura 3. Figura 3. Difusão sólido–líquido. K2Cr2O7 H2O Transferência de massa 15 A lei de Fick é dada pela Equação 1: (1) A taxa de fluxo de substância é proporcional ao gradiente de concentração e A é a área normal para a direção do fluxo. A grandeza é definida como o fluxo mássico difusivo de uma espécie. A lei de Fick também define a difusividade mássica ou o coeficiente de difusão binária, DAB, grandeza que representa a facilidade que um elemento tem de atravessar um plano normal de um gradiente de concentração para outro, uma característica de cada substância (ÇENGEL; GHAJAR, 2012). Uma das origens físicas do transporte de massa é o mecanismo de difusão. Considere uma mistura de duas espécies, identificadas como A e B, separadas por uma parede móvel. Se essa parede for retirada, ocorrerá o transporte das espécies por difusão, como representado na Figura 4. Figura 4. Transferência de massa por difusão em uma mistura binária. Fonte: Adaptada de Bergman et al. (2014). Concentração da espécie A Concentração da espécie B CA CB xox A B Transferência de massa16 A probabilidade de qualquer molécula se mover para a esquerda ou para a direita é igual, devido ao movimento molecular aleatório dessas moléculas, porém a difusão mássica ocorre no sentido de redução da concentração. Desse modo, ocorrerá o transporte da espécie Apara a direita e da espécie B para a esquerda. Após um determinado tempo, essa transferência de massa não ocorre mais, pois se atinge as concentrações uniformes das espécies (BERGMAN et al., 2014). A difusão ocorre em sistemas sólidos, líquidos e gasosos e, de acordo com o espaçamento entre as moléculas, a difusão em gases é superior aos outros estados físicos (WELTY; RORRER; FOSTER, 2017). No movimento molecular aleatório, as moléculas da mistura colidem continuamente, o que influencia o processo de difusão. Se a colisão for entre moléculas de mesmo tipo, não há diferença entre as moléculas que atravessam o plano. Em caso de moléculas diferentes, que podem ter massas distintas, a difusão será dominada pelas moléculas de maior massa (ÇENGEL; GHAJAR, 2012). Na análise de transferência de massa de misturas, é importante conhe- cer a definição de mistura, pois os sistemas envolvem, pelo menos, duas substâncias. A mistura é constituída por duas ou mais substâncias químicas, chamadas de espécies, e suas quantidades podem ser especificadas em termos de concentração (BROWN; LEMAY; BURSTEN, 2005). Segundo Bird, Stewart e Lightfoot (2010), há várias formas de se expressar a concentração das espécies em uma mistura. No estudo da transferência de massa, as formas mais comuns são: concentração em massa (ρi), concentra- ção molar (Ci), fração em massa (ωi) e fração molar (xi). Essas concentrações podem ser obtidas por meio do uso das seguintes relações: (2) A Equação 2 é dita como a relação entre a massa da espécie de interesse (i) por unidade de volume da solução, expressa em g/mL ou g/cm3. (3) Transferência de massa 17 A Equação 3 mostra a relação entre o número de mols da espécie i por uni- dade de volume da solução, expressa nas unidades de gmol/mL ou gmol/cm3. (4) A Equação 4 mostra a relação entre a concentração em massa da espécie i e a densidade total da solução. (5) A Equação 5 mostra a relação entre a concentração da espécie i e a con- centração total da solução. Em todas as relações anteriores, o índice “i” indica que a determinação é para uma espécie química dentro da solução. Essas mesmas relações podem ser utilizadas para calcular as concentrações para a mistura. Em uma mistura, as espécies químicas presentes se movem com diferentes velocidades, que podem ser expressas como velocidade média de massa e velocidade média molar. A velocidade média de massa para uma mistura de “n” componentes é dada pela Equação 6: (6) onde vi é a velocidade da espécie em relação aos eixos coordenados. Observe que ρν é a velocidade local assumida pela massa que passa por uma secção de área. De forma semelhante, foi definida a velocidade média molar, dada pela Equação 7: (7) Observe que C.ν é a velocidade local assumida pelos mols que passam na secção de área. Transferência de massa18 Convecção Segundo Welty, Rorrer e Foster (2017), a transferência de massa por convecção é influenciada pelas características de movimento do fluido. Esse modo de transferência sempre ocorrerá a partir das maiores concentrações para as menores concentrações de espécies transferidas. Quando o fluxo é provo- cado por uma bomba ou similar, a convecção é forçada, já quando ocorre devido à diferença de densidade, o processo é chamado de convecção natural. A equação da taxa para a transferência de massa convectiva pode ser escrita conforme a Equação 8: ṁconv = hmassaA(Cs – C∞) (8) onde a massa molar transferida da espécie A é identificada como ṁconv; e hmassa é o coeficiente de transferência de massa convectiva e a diferença de concentração entre a superfície e a corrente de fluido da espécie A. Quando há um fluido se movimentando sobre uma superfície, há formação de uma camada fina próximo a essa superfície. Se esse movimento do fluido é laminar, as partículas do fluido próximo ao sólido estão paradas. Assim, o mecanismo de transferência de massa entre a superfície e o fluido deve envolver a transferência de massa molecular através do filme estagnado. Em geral, a resistência da transferência de massa é resultado da camada de filme do fluido e do coeficiente de transferência de massa por convecção (Figura 5; WELTY; RORRER; FOSTER, 2017). Transferência de massa 19 Figura 5. Transferência de massa por convecção. Fonte: Portal... (c2017, documento on-line). A transferência de massa por convecção pode ocorrer entre um fluido em movimento e uma superfície ou entre fluidos imiscíveis em movimento separados por uma interface móvel. Analogia entre as transferências de calor e de massa A massa e o calor podem ser considerados duas formas de energia, as quais podem ser convertidas entre si por meio da equação de Einstein: E = mc2 (9) Transferência de massa20 Outra semelhança está nos mecanismos das transferências de calor e de massa, visto que esses processos ocorrem devido a uma força motriz. No caso da transferência de calor, essa força motriz é a diferença de temperatura; já para a transferência de massa, é a diferença de concentração. Assim, os fluxos de calor e de massa ocorrem sempre no sentido da região de maior concentração (ou temperatura) para a região de menor concentração (ou temperatura), como indicado na Figura 6 (ÇENGEL; GHAJAR, 2012). Figura 6. Representação da analogia entre as transferências de calor e de massa. Fonte: Çengel e Ghajar (2012, p. 798). Considerando-se os mecanismos físicos e as equações da taxa, os pro- cessos de transferência de calor e de massa apresentam analogias. Entre os mecanismos de transferência de calor, estão a condução, a convecção e a radiação. Quanto à transferência de massa, ela só pode ocorrer por condução e convecção (BERGMAN et al., 2014). As taxas de transferência de calor por condução envolvidas nesses fenômenos podem ser obtidas por meio da Equação 10: (10) Transferência de massa 21 onde k é a condutividade térmica do meio; e A é a área normal à direção da transferência de calor. Essa equação expressa a lei de Fourier da condução de calor, por meio da qual se obtém a taxa de condução de calor em uma direção x, que, por sua vez, é proporcional ao gradiente de temperatura . De modo análogo à lei de Fourier, tem-se a lei de Fick da difusão (Equação 1), que expressa a taxa de difusão de massa de uma espécie química no meio estacionário na direção x. Essa taxa é proporcional ao gradiente de concen- tração nessa direção, que também pode ser escrito como: (11) onde DAB é a difusividade de massa ou coeficiente de difusão da espécie A em B; e CA é a concentração da espécie na mistura no local x. Observe que as equações apresentam a mesma forma, portanto, é pos- sível obter soluções para a equação da difusão de massa nas soluções das equações da condução de calor, desde que ambas possuam os mesmos tipos de condições de contorno. Para isso, as equações devem rearranjadas, fazendo-se as mudanças dos coeficientes e das variáveis correspondentes (ÇENGEL; GHAJAR, 2012). Em caso da transferência de calor por convecção, a taxa de transferência é dada pela lei de resfriamento de Newton, expressa pela Equação 12: Q̇ conv = hconvA(Ts – T∞) (12) onde hconv é o coeficiente de transferência de calor; A é a área da superfície; e o diferencial de temperatura ocorre na camada-limite térmica. No caso da convecção de massa ou transferência de massa por convec- ção, a transferência de massa entre a superfície e o fluido em movimento envolve a difusão de massa e o movimento da massa de fluido. Assim, a sua quantificação pode ser feita de forma semelhante à lei de resfriamento de Newton, conforme a Equação 13: ṁconv = hmassaA(Cs – C∞) (13) onde hmassa é o coeficiente de transferência de massa; A é a área da superfície; e (Cs – C∞)representa o diferencial de concentração, a força motriz do processo (ÇENGEL; GHAJAR, 2012). Transferência de massa22 Referências BERGMAN, T. L. et al. Fundamentos de transferência de calor e de massa. 7. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2014. BIRD, R. B.; STEWART,W. E.; LIGHTFOOT, E. N. Fenômenos de transporte. Rio de Janeiro: LTC, 2010. BROWN, T. L.; LEMAY, H. E.; BURSTEN, B. Química: a ciência central. 9. ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005. ÇENGEL, Y. A.; GHAJAR, A. J. Transferência de calor e massa: uma abordagem prática. 4. ed. Porto Alegre: AMGH, 2012. FOUST, A. et al. Princípios das operações unitárias. 2. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1982. HOLMAN, J. P. Transferência de calor. 8. ed. Basaure: McGraw-Hill, 1999. PORTAL LABORATÓRIOS VIRTUAIS DE PROCESSOS QUÍMICOS. Transferência de massa. In: PORTAL laboratórios virtuais de processos químicos. Coimbra, c2017. Disponível em: http://labvirtual.eq.uc.pt/siteJoomla/index.php?option=com_content&task=vie w&id=249&Itemid. Acesso em: 4 set. 2020. WELTY, J. R.; RORRER, G. L.; FOSTER, D. G. Fundamentos de transferência de momento, de calor e de massa. 6. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2017. Leituras recomendadas BRAGA FILHO, W. Fenômenos de transporte para engenharia. 2. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2012. KREITH, F.; MANGLIK, R.; BOHN, M. Princípios de transferência de calor. 2. ed. São Paulo: Cengage Learning, 2010. MORAN, M. J. et al. Introdução à engenharia de sistemas térmicos: termodinâmica, mecânica dos fluidos e transferência de calor. Rio de Janeiro: LTC, 2005. Os links para sites da web fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu funcionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. Transferência de massa 23 http://labvirtual.eq.uc.pt/siteJoomla/index.php?option=com_content&task=view&id=249&Itemid http://labvirtual.eq.uc.pt/siteJoomla/index.php?option=com_content&task=view&id=249&Itemid
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