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Historias_de_investigacoes_matematicas

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HISTÓRIAS DE INVESTIGAÇÕES 
MATEMÁTICAS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
João Pedro da Ponte 
Hélia Margarida Oliveira 
Maria Helena Cunha 
Maria Irene Segurado 
 
 
 
 
 
Histórias de investigações matemáticas 
2 
Sobre o livro 
 
Uma actividade matematicamente rica por parte dos alunos surge, em especial, quando 
o professor valoriza e fomenta nas aulas a realização, discussão e avaliação de activida-
des de investigação. O presente trabalho enquadra-se no Projecto Matemática Para 
Todos — Investigações na Sala de Aula, e teve por objectivo estudar os problemas e 
dilemas profissionais bem como o conhecimento profissional necessário ao professor 
que pretende envolver os seus alunos neste tipo de actividade matemática. 
 
Tomam-se por base quatro ideias fundamentais. A primeira, refere-se à Matemática a 
ensinar, e respeita a uma perspectiva epistemológica sobre esta ciência que a encara 
muito mais como uma actividade no decurso da qual se constrói novo conhecimento do 
que como um corpo de saber a transmitir. A segunda, refere-se à importância da inte-
racção social no processo de negociação dos significados matemáticos, e 
consequentemente na aprendizagem. A terceira, tem a ver com a dinâmica da inovação 
curricular e coloca o problema da concretização prática de novas orientações 
pedagógicas, nomeadamente quando subscritas pelos programas oficiais. Finalmente, a 
quarta, é de ordem metodológica, apostando nas potencialidades de uma análise 
narrativa das situações de ensino-aprendizagem, numa base de pesquisa cooperativa. 
 
Sobre os autores 
 
João Pedro da Ponte, licenciado em Matemática pela Faculdade de Ciências da Univer-
sidade de Lisboa e doutor em Educação Matemática pela Universidade da Georgia. Tem 
coordenado diversos projectos de investigação na área da educação, com especial des-
taque para o ensino da Matemática, a formação de professores e as novas tecnologias. É 
presentemente Professor Associado da FCUL e Presidente do respectivo Departamento 
de Educação. 
 
Hélia Margarida Oliveira, licenciada em Ensino da Matemática e mestre em Educação 
pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, onde desempenha presentemen-
te as funções de Assistente. Participa no Grupo de Trabalho de História e Ensino da 
Matemática da Associação de Professores de Matemática. 
 
Maria Helena Cunha, licenciada em ensino, na Variante de Matemática e Ciências, pela 
Escola Superior de Educação de Viseu e mestre em Educação pela Faculdade de Ciên-
cias da Universidade de Lisboa. É presentemente Equiparada a Assistente do Segundo 
Triénio naquela Escola Superior de Educação. 
 
Maria Irene Segurado, licenciada em Economia pelo Instituto Superior de Economia de 
Lisboa e mestre em Educação pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, é 
professora de nomeação definitiva do 4º grupo da EB 2,3 Rui Grácio, em Montelavar. 
Integrou o Projecto MINERVA e colabora no Grupo de Trabalho da Internet e no Cen-
tro de Formação da Associação de Professores de Matemática. 
 
Histórias de investigações matemáticas 
1 
 
 
 
ÍNDICE 
 
 
1. INTRODUÇÃO 3 
 
 O estudo 3 
 Contexto e objectivo 3 
 A Matemática como actividade 4 
 A interacção social no processo de aprendizagem 5 
 A dinâmica de inovação curricular 7 
 
 Investigações na aula de Matemática 8 
 O que são actividades de investigação? 8 
 A preparação de aulas de investigação 11 
 A realização de aulas de investigação 15 
 Dificuldades a ultrapassar 18 
 
 
2. METODOLOGIA DE TRABALHO 21 
 
 Narrativas de situações de ensino-aprendizagem 21 
 Histórias, narrativas e conhecimento humano 21 
 Histórias, narrativas e conhecimento profissional 23 
 O processo de construção de uma narrativa 25 
 O trabalho da equipa 27 
 A elaboração e análise das narrativas 29 
 
 
3. HISTÓRIAS 35 
 
Conjecturando... (JP-IS5) 36 
Matemática: Calcular ou pensar? (JP5) 44 
Números quadrados e triangulares (HC5A) 50 
Contra factos não há argumentos (HC5B) 57 
Uma investigação em grande grupo (IS5) 62 
Histórias de investigações matemáticas 
2 
E se os alunos seguem caminhos imprevistos? (IS6) 68 
Matemática por conveniência?! (HO8A) 72 
Quando os expoentes se tornam negativos (HO8B) 79 
E os fósforos transformaram-se em palitos (HO8C) 84 
Um problema com muitas soluções (AV8) 92 
 
 
4. CONCLUSÕES 99 
 
O conhecimento profissional do professor em actividades de investiga-
ção 99 
 A Matemática 99 
 Os processos de aprendizagem 102 
 O currículo 105 
 A instrução 107 
 
 Reflexão geral sobre o trabalho desenvolvido 112 
 Tarefas de investigação e saber matemático 113 
 As interacções sociais no processo de aprendizagem 114 
 O professor e a inovação educativa 116 
 A metodologia 117 
 Nota final 120 
 
5. BIBLIOGRAFIA 124 
 
6. ANEXOS 128 
 
Potências e regularidades 129 
Números quadrados e triangulares 131 
Explorações com números 132 
Às voltas com os múltiplos 133 
Propriedades das potências de expoente inteiro 134 
Quadrados com fósforos 135 
 
Histórias de investigações matemáticas 
3 
 
 
 
1. INTRODUÇÃO 
 
 
 
 Este trabalho centra-se sobretudo no professor. Pretendemos dar um 
contributo para o estudo do seu conhecimento profissional em contextos de 
inovação curricular. E procuramos fazê-lo através de uma abordagem meto-
dológica de algum modo também inovadora, pelo menos na educação 
matemática: a análise narrativa das situações de ensino-aprendizagem. Nes-
te capítulo damos conta dos principais objectivos e pressupostos teóricos 
do estudo relativamente à Matemática, ao professor e à inovação curricular 
nesta disciplina. 
 
 
O estudo 
 
 
Contexto e objectivo 
 
 O presente trabalho decorre de um projecto1 cujo objectivo era estu-
dar, numa perspectiva de análise narrativa, o conhecimento profissional 
necessário ao professor que pretende envolver os seus alunos em actividade 
matemática significativa, bem como os problemas e dilemas profissionais 
com que se confronta nestas situações de ensino-aprendizagem. Uma acti-
vidade matemática rica por parte dos alunos surge, em especial, quando o 
professor valoriza a realização, discussão e avaliação de actividades de 
investigação por parte dos alunos. Pretendia-se estimular os professores 
participantes e cooperantes a explicitar, desenvolver e produzir materiais de 
divulgação das suas teorias práticas acerca do modo de organizar e condu-
zir tais actividades educativas. O projecto, que se revestiu de um carácter 
de investigação-acção, envolveu professores e alunos do 2º e 3º ciclos do 
 
1 Projecto “Prática e reflexão sobre a prática: Análise narrativa de situações de ensino aprendizagem”, 
apoiado pelo Instituto de Inovação Educacional, Sistema de Incentivos à Qualidade de Educação (Con-
curso 1995 — Medida 2) 
Histórias de investigações matemáticas 
4 
ensino básico, decorrendo as suas actividades de campo em escolas das 
zonas de Viseu e Lisboa. 
 Tomámos por base quatro ideias fundamentais. A primeira, refere-se 
à Matemática a ensinar, e respeita a uma perspectiva epistemológica sobre 
esta ciência que a encara muito mais como uma actividade no decurso da 
qual se constrói novo conhecimento do que como um corpo de saber a 
transmitir. A segunda, refere-se à importância da interacção social no pro-
cesso de negociação dos significados matemáticos, e consequentemente na 
aprendizagem. A terceira, tem a ver com a dinâmica da inovação curricular 
e coloca o problema da concretização prática de novas orientações pedagó-
gicas, nomeadamente quando subscritas pelos programas oficiais. Final-
mente, a quarta, é de ordem metodológica, apostando nas potencialidades 
de uma análise narrativa das situações de ensino-aprendizagem, numa base 
de pesquisa cooperativa. 
 Assumindo um carácter eminentemente interpretativo, este projecto 
não pretendia testar hipóteses empíricas. Mas, como projecto de investiga-
ção, assenta em diversos pressupostos sobre a natureza do saber matemáti-
co em contexto escolar, sobre oprocesso de aprendizagem, sobre a inova-
ção educativa e sobre o processo de investigação. Analisamos no fim do 
trabalho em que medida a sua validade sai reforçada ou, pelo contrário, 
enfraquecida. 
 
A Matemática como actividade 
 
 A Matemática tem sido tradicionalmente encarada como um corpo de 
conhecimento. Mas ela pode igualmente ser vista como uma actividade 
humana e isso constitui uma primeira ideia fundamental deste projecto. A 
Matemática permeia muitas áreas da sociedade actual de modos dificilmen-
te imagináveis há alguns anos atrás (Hammond, 1978). À medida que ela se 
tem tornado uma ferramenta cada vez mais poderosa para interpretar situa-
ções e para agir nos mais diversos domínios, novas competências têm pas-
sado igualmente para o primeiro plano. Mais do que executar algoritmos ou 
procedimentos repetitivos, o que se exige hoje às pessoas é flexibilidade 
intelectual, capacidade de lidar com diferentes tipos de representações, 
capacidade de formular problemas, de modelar situações diversificadas e de 
avaliar criticamente os resultados obtidos usando diferentes metodologias 
(MSEB, 1989). 
Histórias de investigações matemáticas 
5 
 A Matemática está em evolução permanente e a sociedade também. 
O mesmo se pode dizer dos alunos. De um ensino selectivo e destinado 
apenas a uma elite, passámos a um ensino de massas, generalizado e obri-
gatório para todos. Nesta situação, os objectivos e as práticas de ensino da 
Matemática têm também que mudar profundamente. 
 As perspectivas absolutistas (Ernest, 1991), que encaram o conheci-
mento matemático como um edifício solidamente alicerçado, construído 
dedutiva e cumulativamente, qual paradigma do rigor absoluto, contribuí-
ram para a cristalização de um currículo fortemente estruturado em torno 
dos conteúdos. Como consequência, considerava-se que o papel do profes-
sor era a simples exposição clara e rigorosa dos conceitos matemáticos e o 
treino dos alunos na resolução de exercícios repetitivos. Esta forma de 
apresentar a disciplina impõe aos alunos uma visão muito limitada e imper-
feita da sua natureza. 
 Diversos matemáticos têm afirmado, desde há muito, a sua discor-
dância em relação a esta visão. Por exemplo, Bento Caraça (1958) contrasta 
a ideia de ciência feita com a de ciência em processo de elaboração. Na 
mesma linha de pensamento, George Pólya (1945) refere que “a Matemáti-
ca apresentada à moda de Euclides surge como uma ciência dedutiva e sis-
temática mas a Matemática no seu processo de criação aparece como ciên-
cia experimental e indutiva” (p. vii). A aprendizagem da Matemática deve 
contemplar oportunidades de os alunos se envolverem em momentos 
genuínos de actividade matemática. Num movimento que tem igualmente o 
seu paralelo no ensino experimental das ciências, passa-se a dar atenção aos 
processos de criação do saber e não simplesmente ao seu produto final. 
 Nesta abordagem, a Matemática é vista como uma construção social, 
impregnada de valores e, em última análise falível como qualquer outro 
produto do pensamento humano. Os processos sociais que ditam a aceita-
ção de certos conceitos e a rejeição de outros têm uma expressão paralela 
na negociação do significado matemático que decorre na sala de aula 
(Bishop e Goffree, 1986). Em suma, sublinha-se a importância de aproxi-
mar a actividade do aluno da actividade do matemático, contribuindo para 
que as salas de aula se constituam como comunidades matemáticas 
(Schoenfeld, 1992). 
 
Histórias de investigações matemáticas 
6 
A interacção social no processo de aprendizagem 
 
 Surge assim uma segunda ideia fundamental deste projecto: a impor-
tância das interacções na sala de aula. Na nossa tradição de ensino, a inte-
racção professor-aluno tende a ser fortemente privilegiada no processo de 
ensino-aprendizagem. A interacção entre os alunos ou é quase inexistente 
ou é pouco valorizada pelo professor. 
 O diálogo na sala de aula é na maior parte dos casos completamente 
conduzido pelo professor, limitando-se muitas vezes a perguntas fechadas 
que suscitam respostas unívocas e imediatas (Correia, 1995). Este tipo de 
interacção é de certo modo natural quando as tarefas propostas se limitam à 
resolução de exercícios rotineiros de aplicação da matéria dada, mas não 
basta quando se oferecem aos alunos experiências matemáticas mais inte-
ressantes. Na verdade, ao pretender que os alunos desenvolvam a capacida-
de de formular problemas, de explorar, de conjecturar e de raciocinar 
matematicamente, que desenvolvam o seu espírito crítico e a flexibilidade 
intelectual, é-se levado a um outro modo de conceber o ensino e a criar um 
outro ambiente de aprendizagem. Para isso, é essencial mudar de modo 
fundamental o discurso na sala de aula (NCTM, 1994). Os alunos, ao for-
mularem as suas conjecturas, ao defenderem as suas ideias, ao questiona-
rem e compararem os processos desenvolvidos por si e pelos seus colegas, 
bem como os resultados obtidos oralmente ou por escrito, dão passos 
essenciais para clarificar o seu pensamento e para alcançar uma compreen-
são mais profunda de conceitos e princípios matemáticos. 
 Em termos educativos torna-se importante valorizar a interacção dos 
alunos uns com os outros e com o professor. São, pois, necessárias tarefas 
específicas que favoreçam este tipo de actividades. No entanto, não será a 
simples introdução de tarefas que irá alterar só por si a aprendizagem. É de 
realçar a grande importância da acção do professor nas questões que colo-
ca, nas interacções que promove, em especial encorajando os alunos a dis-
cutir e a explicar a Matemática que desenvolvem. As discussões assumem 
um papel importante, favorecendo o desenvolvimento da capacidade de 
argumentar e de comunicar matematicamente. O professor terá como papel 
fundamental iniciar e dirigir o discurso, envolver cada um dos alunos, man-
ter o interesse pelo assunto, colocar questões esclarecedoras ou provocantes 
e não aceitar apenas a contribuição dos alunos que têm habitualmente res-
Histórias de investigações matemáticas 
7 
postas correctas ou ideias válidas. Terá de respeitar a diversidade dos alu-
nos. 
 Por outro lado, o professor fica a saber mais sobre as ideias e os 
conhecimentos dos alunos quando os observa e ouve. Os momentos de dis-
cussão permitem que ele dê atenção individual aos alunos, coloque ques-
tões para sondar os seus conhecimentos, e note a partir das suas respostas 
eventuais dificuldades conceptuais (NCTM, 1994). Além disso, o professor 
deve constituir um modelo vivo das atitudes e competências que deseja 
desenvolver no aluno. Como diz John Mason, “é através do seu ser mate-
mático e do modo como esse ser se manifesta que o professor influenciará 
as atitudes e inclinações da maioria dos alunos” (1991, p. 17). Todos estes 
aspectos requerem uma competência profissional significativa. É, pois, 
importante que o professor reflicta sobre o novo papel que é chamado a 
desempenhar e o modo de contornar as respectivas dificuldades. 
 
A dinâmica de inovação curricular 
 
 Chegamos deste modo à terceira ideia fundamental do projecto: as 
inovações curriculares impõem uma análise dos saberes profissionais 
requeridos para a sua concretização. A orientação para o ensino da Mate-
mática que temos vindo a apresentar está de algum modo já presente nos 
novos programas portugueses (em vigor desde 1991), nomeadamente 
quando indicam a resolução de problemas como eixo do currículo ou se 
referem ao papel do aluno na aprendizagem. Mas estas ideias têm ainda 
reduzida expressão nas práticas pedagógicas. Na verdade, uma coisa é 
reconhecer a importância de um conjunto de princípios sobre o ensino da 
Matemática. Outra coisa, bem diferente, é levá-los à prática em condições 
muitas vezes adversas — em aulas superlotadas, sem se dispor dos mate-
riais necessários, perante alunos muitas vezes fortemente desmotivados em 
relação à disciplina e pouco receptivos a experiências inovadoras. Como 
apresentar aos alunos uma actividade de investigaçãose eles não têm um 
mínimo de pré-requisitos matemáticos? O que fazer quando eles não com-
preendem o enunciado de um problema nem se mostram dispostos a fazer o 
mínimo esforço? Como conduzir uma discussão quando todos os alunos 
querem falar ao mesmo tempo e mostram pouco interesse em ouvir os seus 
colegas? Que rotinas são necessárias para conduzir uma aula em que os 
alunos realizam trabalho de investigação? Qual a articulação entre o traba-
Histórias de investigações matemáticas 
8 
lho investigativo e outras actividades de aprendizagem como a resolução de 
exercícios? 
 Não é necessariamente por pouco empenho profissional que os pro-
fessores têm, por vezes, dificuldade em encontrar maneiras de concretizar 
um ensino de cunho mais inovador. Trata-se, de um problema mais profun-
do, que remete para competências ao nível do saber-fazer, para zonas de 
indefinição no que respeita a concepções essenciais sobre os assuntos que 
se ensina e sobre o processo de aprendizagem, para dificuldades de monito-
rização da avaliação de actividades de aprendizagem com uma dinâmica 
significativamente complexa. 
 Neste projecto pretendem-se equacionar os saberes profissionais 
relevantes para este tipo de prática pedagógica, para o que se têm em conta 
diversas tradições teóricas, nomeadamente a perspectiva psicológica (que 
recorre a conceitos como esquemas, rotinas e guião curricular), a perspecti-
va da psicologia social (que se preocupa sobretudo com a influência das 
representações sociais e das identidades profissionais) e a perspectiva 
fenomenológica (que incide essencialmente no significado das experiências 
pessoais do professor)2. 
 São estes os elementos-chave da fundamentação teórica do projecto e 
do seu enquadramento na realidade educativa portuguesa, à luz da reforma 
curricular. Uma quarta ideia fundamental do projecto, relativa ao sentido da 
análise narrativa e à sua concretização em termos metodológicos, será abor-
dada no capítulo seguinte. 
 
 
Investigações na aula de Matemática 
 
 
O que são actividades de investigação? 
 
 Uma vez que existe uma profusão de formulações sobre o que se 
entende por “investigações matemáticas”, é necessário explicitar o sentido 
que lhes atribuímos neste projecto. As investigações matemáticas são parte 
do que alguns autores designam por “actividade matemática”, o que corres-
ponde a identificar aprender Matemática com fazer Matemática. Nesta 
 
2 Ver Ponte (1994). 
Histórias de investigações matemáticas 
9 
perspectiva, esta ciência é encarada mais como uma forma de gerar conhe-
cimento do que como um corpo de conhecimentos. Love (1988) define 
implicitamente este tipo de actividade, ao afirmar que os alunos devem ter 
oportunidade de: 
 
• identificar e iniciar os seus próprios problemas; 
• expressar as suas próprias ideias e desenvolvê-las ao resol-
ver problemas; 
• testar as suas ideias e hipóteses de acordo com experiências 
relevantes; 
• defender racionalmente as suas ideias e conclusões e sub-
meter as ideias dos outros à crítica ponderada. (p. 260) 
 
 Um conceito muito próximo de investigação matemática é o de reso-
lução de problemas. Os dois termos são usados muitas vezes de modo 
indistinto. Ambas as noções se referem a processos matemáticos complexos 
e ambas envolvem actividade fortemente problemática. A resolução de pro-
blemas envolve uma grande variedade de tarefas, tanto de cunho mais 
fechado como mais aberto, tanto relativas a situações puramente matemáti-
cas como referentes a situações da vida real. “Actividades investigativas” 
ou “investigações matemáticas” designam, no contexto deste projecto, um 
tipo de actividade que dá ênfase a processos matemáticos tais como procu-
rar regularidades, formular, testar, justificar e provar conjecturas, reflectir e 
generalizar. São actividades de cunho muito aberto, referentes a contextos 
variados (embora com predominância para os exclusivamente matemáticos) 
que podem ter como ponto de partida uma questão ou uma situação propos-
ta quer pelo professor, quer pelos alunos. 
 O aspecto mais distintivo das actividades de investigação em relação 
à resolução de problemas diz respeito à natureza da questão a estudar. 
Enquanto que na resolução de problemas a questão tende a ser apresentada 
já completamente especificada ao aluno, na actividade de investigação as 
questões iniciais são de um modo geral vagas, necessitando de ser trabalha-
das, tornadas mais precisas e transformadas em questões concretas pelo 
próprio aluno. As actividades de investigação envolvem assim uma compo-
nente essencial de formulação de problemas, etapa normalmente ausente 
(porque já cumprida de antemão pelo professor) na resolução de problemas. 
 Outra distinção diz respeito às estratégias a seguir. Enquanto que na 
resolução de problemas faz sentido sugerir heurísticas gerais (como as de 
Histórias de investigações matemáticas 
10 
Pólya, 1945) ou estratégias mais específicas (como as de Schoenfeld, 
1982), nas actividades de investigação o leque de possibilidades é de tal 
maneira vasto que se torna difícil fazer semelhante sistematização. 
 Assim, enquanto que na resolução de problemas o objectivo é a 
estratégia seguida e a solução a que conduz, na actividade de investigação o 
objectivo é a compreensão de um domínio problemático. Esta distinção é 
bem ilustrada na metáfora geográfica: “o objectivo é a jornada, não o desti-
no” (Pirie, 1987, p. 2). A mesma ideia é reforçada por Ernest (1991) ao 
referir que nesta actividade “a ênfase está na exploração de uma terra des-
conhecida” (p. 285), enquanto que na resolução de problemas se procura 
encontrar um caminho que conduza à solução ou soluções. O processo 
investigativo tem, assim, um carácter mais divergente do que, em geral, a 
resolução de um problema. 
 Para que uma situação possa constituir uma investigação é essencial 
que seja motivadora e desafiadora, não sendo imediatamente acessíveis, ao 
aluno, nem o processo de resolução nem a solução ou soluções da questão. 
As actividades de investigação contrastam-se claramente com as tarefas 
que são habitualmente usadas no processo de ensino-aprendizagem, uma 
vez que são muito mais abertas, permitindo que o aluno coloque as suas 
próprias questões e estabeleça o caminho a seguir. Numa investigação par-
te-se de uma situação que é preciso compreender ou de um conjunto de 
dados que é preciso organizar e interpretar. A partir daí formulam-se ques-
tões, para as quais se procura fazer conjecturas. O teste destas conjecturas e 
a recolha de mais dados pode levar à formulação de novas conjecturas ou à 
confirmação das conjecturas iniciais. Neste processo podem surgir também 
novas questões a investigar. 
 As investigações matemáticas caracterizam-se, igualmente, pelo estí-
mulo que fornecem ao aluno para este justificar e provar as suas afirma-
ções, explicitando matematicamente as suas argumentações perante os seus 
colegas e o professor. As capacidades de argumentação e prova são dois 
aspectos destacados da capacidade de comunicar matematicamente. O 
desenvolvimento desta capacidade é, também, um dos grandes objectivos 
educacionais do ensino da Matemática (NCTM, 1991). Ao confrontarem as 
suas diferentes conjecturas e justificações, os elementos da turma consti-
tuem-se como pequena comunidade matemática, na qual o conhecimento 
matemático se desenvolve em conjunto. 
Histórias de investigações matemáticas 
11 
 O trabalho do aluno aproxima-se, assim, do trabalho do matemático. 
Ernest (1991), afirma mesmo que, “a actividade matemática de todos os 
alunos de Matemática, desde que produtiva, envolvendo a formulação e a 
resolução de problemas, não é qualitativamente diferente da actividade do 
matemático profissional” (p. 283). Para este autor, a actividade matemática 
do aluno, se bem que possuindo um reduzido grau de complexidade de 
acordo com os seus conhecimentos matemáticos, compara-se à do matemá-
tico em termos dos processosa que recorre. 
 
A preparação de aulas de investigação 
 
 Este modo de ver a aprendizagem vem, naturalmente, relativizar a 
importância dos conteúdos no currículo. Ainda que estes continuem a cons-
tituir o suporte da actividade, o desenvolvimento de capacidades de ordem 
superior torna-se um objectivo destacado, e os processos característicos da 
actividade matemática passam a constituir o foco do ensino. Como defende 
Lerman (1989), “a Matemática é identificada por modos particulares de 
pensar, conjecturar, procurar contradições formais e informais, etc., não 
pelo ‘conteúdo’ específico” (p. 77). Porém, dado que os programas vigen-
tes se centram nos conteúdos, organizados de uma forma hierárquica e 
compartimentada, o professor tem necessidade de fazer surgir as investiga-
ções matemáticas na aula em ligação com eles. Isto não significa que, em 
cada momento, as propostas tenham obrigatoriamente que introduzir ou 
explorar conceitos que estão a ser abordados. Significa apenas que se refe-
rem de modo especial a certos tópicos do programa ao mesmo tempo que 
permitem que os alunos recorram a todo o arsenal matemático de que já 
dispõem. 
 O ponto de partida de uma investigação, tal como foi pensado pelo 
professor, pode relacionar-se de modo mais ou menos directo com um ou 
outro tema do currículo. Mas a actividade que o aluno realiza, particular e 
única, pode originar outras questões, seguir por caminhos inusitados e aca-
bar por se relacionar com muitos outros temas. Há que procurar um ponto 
de equilíbrio entre a preocupação de seguir de forma ordenada o currículo e 
a valorização da natureza aberta das investigações, reconhecendo o contri-
buto importante que estas podem fornecer para o desenvolvimento matemá-
tico dos alunos. 
Histórias de investigações matemáticas 
12 
 O professor tem um papel fundamental na planificação de activida-
des de investigação na sala de aula. A selecção das propostas e o estabele-
cimento de objectivos para a sua realização relacionam-se com a especifi-
cidade da turma e com o contexto em que surgem na aula. Nem os objecti-
vos nem as tarefas podem ser completamente definidos, de antemão, pelos 
autores dos programas. O professor surge, deste modo, como alguém que 
participa no processo de elaboração do currículo — delineando objectivos, 
metodologias e estratégias, e reformulando-os em função da sua reflexão 
sobre a prática. 
 A maior ou menor ligação das actividades de investigação com os 
conteúdos pode ser um dos factores que restringe ou amplia o tempo dispo-
nível para a sua realização. O professor é confrontado com decisões difíceis 
quanto à gestão do tempo devido ao número elevado de aspectos que 
necessita de relativizar e conjugar. Para além de definir qual o peso relativo 
que estas actividades devem ocupar no cômputo das actividades de uma 
turma, tem também de ponderar sobre a frequência com que elas devem 
surgir: será mais vantajoso para os alunos aparecerem várias tarefas de 
investigação em sequência ou, pelo menos, com grande proximidade, ou 
mais espaçadas ao longo do ano? 
 A articulação com os conteúdos leva também a questionar em que 
medida podem as investigações ser propostas no início, durante ou no fim 
de um assunto. Se a tarefa de investigação for introduzida num momento 
qualquer, que pontes se podem estabelecer com o trabalho já desenvolvido? 
 Ao seleccionar ou criar uma tarefa, o professor deve definir clara-
mente os objectivos a atingir e ter em atenção o nível etário e o desenvol-
vimento matemático dos alunos. A maior ou menor familiaridade dos alu-
nos com este tipo de actividade é um factor muito importante a considerar. 
 Quer a criação quer a reformulação das propostas de investigação são 
actividades que consomem tempo e exigem do próprio professor uma atitu-
de investigativa. A natural insegurança do professor num tipo de trabalho 
que ainda não domina, aliada ao investimento que exige, especialmente 
quando faltam os recursos apropriados na escola, podem constituir obstácu-
los senão intransponíveis, pelo menos limitantes ao desenvolvimento deste 
tipo de actividade. 
 Uma investigação matemática pode-se iniciar em condições muito 
variadas. No entanto, existem questões e situações que são potencialmente 
Histórias de investigações matemáticas 
13 
mais ricas. A atenção que deve merecer a escolha de uma tarefa encontra-se 
expressa nas seguintes palavras de Ollerton (1994): 
 
Uma parte importante da minha planificação tem a ver com o 
encontrar tarefas que: 
 
• sejam um começo apropriado para todos na aula trabalha-
rem; 
• forneçam oportunidades ricas para muitos desenvolvimen-
tos; 
• possibilitem que sejam trabalhadas uma variedade de com-
petências de conteúdo; 
• criem oportunidades para os alunos explorarem ideias e 
colocarem questões; 
• apoiem diferentes tipos de intervenções do professor desde 
o colocar questões ao explicar e expor; 
• permitam aos alunos tomar a maior parte da responsabili-
dade no seu desenvolvimento; 
• tenham uma variedade de resultados, alguns dos quais 
podem ser inesperados; 
• permitam que o conteúdo seja processado; 
• extraiam contextos transcurriculares “reais”, tais como usar 
de informação de um jornal, ou contextos de resolução de 
problemas; 
• sempre que possível tenham um começo prático de forma a 
prover experiências concretas a partir das quais abstracções 
possam ser feitas. (p. 64) 
 
 Este professor indica diversos aspectos que devem ser contemplados 
na criação e selecção de tarefas de cunho exploratório e investigativo. 
Saliente-se, por exemplo, a preocupação com a possibilidade de os alunos 
desenvolverem múltiplas abordagens e colocarem questões, bem como com 
a adequação da tarefa inicial a todos os alunos. 
 Nesta mesma linha de pensamento, Lampert (1990) chama-nos a 
atenção para o que considera ser o principal critério de selecção de um pro-
blema, entendido como situação problemática. Para a autora, os problemas 
devem levar todos os alunos a fazerem e testarem conjecturas, que são, pos-
teriormente, alvo de discussão na turma. Numa das propostas que apresen-
tou aos seus alunos procurava potenciar a sua progressão em direcção a 
ideias matemáticas mais complexas e abstractas, ou ainda, segundo as suas 
Histórias de investigações matemáticas 
14 
palavras, criar “um cenário para um ziguezague entre a observação indutiva 
e a generalização dedutiva, que Lakatos e Pólya vêem como características 
da actividade matemática” (p. 39). 
 A ideia de que as situações a propor devem ser abertas, no sentido de 
estimularem o aluno a colocar as suas próprias questões, é um dos aspectos 
mais fortes das tarefas de natureza investigativa. Este grau de abertura pode 
até mesmo traduzir-se em propostas não necessariamente na forma interro-
gativa. Lerman (1989), ilustra este último caso, através da situação: 
 
Considera triângulos de lados inteiros. Existem três triângulos 
com 12 unidades de perímetro. Investiga. (p. 77) 
 
 Em seguida apresenta uma figura com três triângulos com a indica-
ção da medida do comprimento de cada um dos lados. Esta “situação”, em 
que não é colocada nenhuma pergunta, permite a formulação de problemas 
diversos de acordo com o interesse e conhecimento matemático do aluno. 
Todavia, há que ser cuidadoso ao introduzir estas situações no processo de 
ensino-aprendizagem porque podem tornar-se algo frustrantes para os alu-
nos que, no dia-a-dia da aula de Matemática, lidam apenas com questões 
muito estruturadas. Por outro lado, podem também criar uma certa insegu-
rança no professor visto que envolvem uma grande margem de imprevisibi-
lidade. 
 Após a selecção da situação a propor, segue-se uma fase não menos 
importante: o planeamento da aula. As questões ligadas à organização e 
gestão da aula são tanto mais relevantes quanto menor é a experiência do 
professor nesta área. Decisões sobre se os alunos irão trabalhar individual-
mente ou em grupo, como se irão constituir os grupos, e se haverámomen-
tos de trabalho em grande grupo, dependem não só da natureza da tarefa 
apresentada mas, principalmente, dos objectivos estabelecidos pelo profes-
sor. 
 O modo de trabalho escolhido será um dos factores a ter em conta 
para se prever o tempo de duração da actividade. Será possível realizar a 
investigação numa única aula? Por quanto tempo conseguirão os alunos 
manter-se interessados na tarefa? 
 Frequentemente, a estrutura escolhida pelo professor para uma aula 
de investigação consiste nas seguintes fases: 
 
Histórias de investigações matemáticas 
15 
• introdução da tarefa pelo professor (quer seja apenas um 
ponto de partida ou uma questão bem definida) e arranque 
da sua realização pelos alunos (interpretação da situação e 
definição do caminho a seguir); 
• realização da tarefa (durante a qual o professor interage 
com os alunos individualmente ou em pequeno grupo); e 
• apresentação de resultados pelos alunos e sua discussão 
(comparação das interpretações da tarefa, estratégias segui-
das e resultados obtidos; neste ponto é frequente surgirem 
novas questões para futura investigação). 
 
 Por vezes, as discussões intermédias do professor com um grupo de 
alunos ou mesmo com toda a turma durante a fase da realização da tarefa 
mostram-se bastante profícuas. Numa aula de investigação, mais do que em 
qualquer outra, não é possível prever com exactidão o que irá acontecer. É, 
pois, necessária uma grande flexibilidade na preparação de uma aula deste 
tipo. 
 
A realização de aulas de investigação 
 
 O modo como a tarefa de investigação é apresentada aos alunos 
constitui um elemento extremamente relevante da actuação do professor: 
 
Mesmo os adeptos mais extremistas da Matemática investiga-
tiva não acreditam, em geral, que não seja necessária interven-
ção alguma do professor para que o aluno aprenda. Isso seria 
esperar que cada indivíduo recriasse, do princípio, toda a 
Matemática. (Hatch, 1995, p. 37) 
 
 A situação, quer tenha sido criada ou recriada pelo professor, é já um 
refazer, sob a forma de questão, do processo investigativo em que o seu 
autor se envolveu. Tal como o trabalho do matemático que é publicado apa-
rece com uma forma definitiva, não dando a conhecer o percurso, os avan-
ços e os recuos, também a investigação que é proposta ao aluno surge-lhe 
burilada e acabada. Com isto quer dizer-se que não é razoável supor que as 
questões propostas ao aluno o levarão, necessariamente, a percorrer os 
mesmos caminhos que quem as gerou. Como refere Mason (1978), “o alu-
no não está no mesmo estado que o originador” (p. 45). O professor não 
pode antecipar, fidedignamente, todas as suas reacções. 
Histórias de investigações matemáticas 
16 
 Adicionalmente, a preocupação do professor com a exploração cabal 
da situação, pode levar a uma construção demasiadamente estruturada da 
investigação. Como consequência, o aluno tenderá a encarar a proposta de 
trabalho como um conjunto de tarefas específicas a serem resolvidas, e não 
como uma investigação cujos objectivos e estratégias são por ele definidos. 
O grau de abertura das situações depende não só (e talvez, não primaria-
mente) do tipo de questão a investigar mas também da abordagem que é 
escolhida pelo professor. Quem já se embrenhou numa investigação e ten-
tou transformá-la numa situação a ser apresentada (por escrito ou oralmen-
te), sabe que não é fácil conseguir, sem se ser demasiado directivo, colocar 
questões que levem os alunos a explorarem todas as potencialidades que 
lhe reconhecemos. 
 O papel do professor na fase de arranque de uma actividade de inves-
tigação é, pois, extremamente importante. De acordo com Mason (1991), 
“uma questão é apenas um grupo de palavras com um ponto de interroga-
ção” (p. 16), ou seja, uma questão, só por si, pode não gerar investigação. É 
necessário que o professor manifeste consistentemente uma atitude investi-
gativa no decorrer das suas aulas para, desse modo, influenciar positiva-
mente a curiosidade dos alunos. 
 Na fase seguinte, tendo os alunos iniciado a actividade, o professor 
dará atenção ao desenvolvimento do seu trabalho. O apoio a conceder, no 
sentido de os ajudar a ultrapassar eventuais bloqueios ou a tornar mais rica 
a sua investigação, é um dos aspectos mais complexos da intervenção do 
professor. Tem extrema importância numa investigação a reflexão do aluno 
sobre o seu trabalho. Esta pode ser estimulada directa ou indirectamente 
pelo professor. É necessária experiência e sensibilidade para lidar com 
estes problemas de uma forma bem sucedida. 
 Num curso criado pelo Shell Centre (1993) para auxiliar os professo-
res na implementação e avaliação da resolução de problemas e de activida-
des de investigação, apresentam-se indicações sobre a pertinência, ou não, 
de certas intervenções por parte do professor. Assim, com base na avalia-
ção de um trabalho realizado em mais de 30 escolas, incentiva-se o uso de 
questões que levem o aluno a reflectir sobre o modo como está a abordar a 
situação (por exemplo, “o que tentaste fazer?”); recomenda-se alguma 
moderação no fornecimento de indicações quanto às estratégias (por exem-
plo, “comprovaste se isso funciona?”); desaconselha-se a referência a 
aspectos específicos da situação (por exemplo, “por que não experimentas 
Histórias de investigações matemáticas 
17 
com três fichas?”) (p. 191). O objectivo é ir diminuindo a orientação do 
professor, à medida que o aluno vai ficando mais familiarizado com este 
tipo de actividade. 
 Barbara Jaworski (1994) relata amplamente num estudo por si reali-
zado os desafios que esta abordagem metodológica levanta ao professor, 
um dos quais designa por “tensão-didáctica”. E recorda as seguintes pala-
vras de John Mason: 
 
Quanto mais explícito sou sobre o procedimento que espero 
que os meus alunos efectuem, mais provável é que eles o efec-
tuem sem recurso à compreensão do que o procedimento é 
suposto indicar; isto é, mais eles tomarão a forma pela subs-
tância... Quanto menos explícito sou sobre os meus objectivos 
(...) menos provável é que eles encontrem o que se pretendia 
ou que percebam o seu significado. (Mason, 1988, citado em 
Jaworski, 1994, p. 180) 
 
Em relação a alguns professores que participaram no seu estudo, 
Jaworski indica como observou essa tensão: “eram relutantes em dizer aos 
alunos factos que eles queriam que soubessem; no entanto, ficavam contra-
riados quando esses factos não emergiam através da investigação” (p. 207). 
Pode observar-se que a implementação destas actividades não é de todo 
linear, colocando o professor perante inúmeros dilemas. 
Um dos grandes objectivos das actividades de investigação é a con-
dução dos alunos a graus progressivos de generalização e de abstracção. 
Consequentemente, a justificação das conjecturas apresentadas é uma com-
ponente importante do seu trabalho. Tal como foi mencionado anteriormen-
te, o grau de formalização dessa justificação depende do nível de desenvol-
vimento matemático do aluno. No entanto, é tarefa do professor fazer notar 
ao aluno a necessidade de se “convencer” a si próprio e aos outros dos seus 
argumentos de forma que, a pouco e pouco, acabe por o fazer espontanea-
mente (Mason, 1991). 
A importância da realização de uma discussão final sobre a activida-
de dos alunos tem sido referida com alguma insistência por diversos auto-
res. Já no relatório Cockcroft (1982) se encontra a indicação explícita de 
que sem essa discussão o sentido da investigação se poderia perder. Usual-
mente, é nesta fase que serão postas em confronto as estratégias, as hipóte-
ses e as justificações que os diferentes alunos ou grupos de alunos construí-
Histórias de investigações matemáticas 
18 
ram, e que o professor assume as funções de moderador. Ele procura trazer 
à atenção da turma os aspectos mais destacados do trabalho desenvolvido e 
estimula os alunos a questionarem as asserções dos seus pares. Assim, o 
desenvolvimento da capacidade dos alunos para comunicar matematica-mente e do poder de argumentação são dois dos objectivos destacados desta 
fase da actividade de investigação. 
O professor tem um papel determinante na feitura de propostas de 
investigação e na condução de aulas em que os alunos se empenham neste 
tipo de actividade. Todavia, para que os alunos sintam autenticidade nas 
suas propostas de trabalho é necessário que ele próprio demonstre um espí-
rito investigativo. Os alunos só poderão compreender plenamente o que 
significa fazer matemática se tiverem oportunidade de o observar como um 
matemático em acção. 
 
Dificuldades a ultrapassar 
 
 As investigações constituem um meio privilegiado de proporcionar 
aos alunos uma experiência matemática autêntica, porque facilitam o 
envolvimento num tipo de trabalho que se encontra muito próximo da acti-
vidade matemática, abrangendo o desenvolvimento e a utilização de algu-
mas capacidades de ordem superior que, de um modo geral, não são con-
templadas noutro tipo de actividades. 
 Antecipamos nesta reflexão grande parte das dificuldades e limita-
ções referentes à realização de actividades de investigação na aula de 
Matemática. Muitas delas apontam para a necessidade de investigação 
aprofundada com base em situações de sala de aula. Passamos, brevemente, 
em revista algumas questões que se colocam. 
 Uma das dificuldades decorre das limitações programáticas. A exten-
são do programa é vulgarmente apontada como impeditiva da diversifica-
ção de estratégias na sala de aula. Um aspecto que merece atenção diz res-
peito às dificuldades manifestadas pelo professor ao tentar articular este 
tipo de actividades com os conteúdos programáticos e com os constrangi-
mentos de tempo. Por outro lado, será que as investigações, quando apenas 
surgem como uma actividade esporádica, chegam a promover uma atitude 
investigativa nos alunos? 
 Relativamente ao papel do professor no desenvolvimento das aulas 
surgem questões sobre a organização da turma — os alunos trabalham indi-
Histórias de investigações matemáticas 
19 
vidualmente ou em grupos? como são formados os grupos? Outras questões 
referem-se ao apoio a fornecer aos alunos, à gestão do tempo concedido 
para os alunos realizarem o seu trabalho, à orientação da discussão final e 
ao modo de avaliar a actividade desenvolvida. 
 Alguns impedimentos à realização de actividades de investigação 
advêm da falta de preparação que o professor possa sentir para ultrapassar 
os diversos obstáculos com que se depara. Outros problemas podem decor-
rer do facto do professor possuir uma visão parcial ou redutora do que sig-
nifica investigar. Torna-se, assim, imprescindível que ele tenha acesso a 
material diversificado e que sejam criadas condições para que possa discu-
tir em conjunto com outros colegas sobre esta problemática. 
 A margem deixada pelos actuais programas para a integração de 
investigações matemáticas não é muito explícita. Exige-se, por isso, algum 
engenho ao professor para manobrar no espaço deixado ao seu cuidado. 
Histórias de investigações matemáticas 
20 
 
 
 
2. METODOLOGIA DE TRABALHO 
 
 
 
 Este trabalho, que se desenvolve numa lógica de investigação-acção3, 
tem por base a elaboração, análise e divulgação de narrativas referentes a 
situações de ensino-aprendizagem em que os alunos trabalham em tarefas 
de investigação matemática. Pretende-se que estas narrativas testemunhem 
aspectos dos dilemas e incertezas dos professores e evidenciem elementos 
relevantes do seu conhecimento profissional neste tipo de actividades edu-
cativas. 
 
 
Narrativas de situações de ensino-aprendizagem 
 
 
 O método narrativo, como método de investigação educacional, tem 
vindo a ganhar uma proeminência cada vez maior, configurando-se como 
uma importante abordagem no quadro da investigação qualitativa de tipo 
interpretativo. Passamos em revista, de modo sucinto, as principais ideias 
que nos levaram a considerar a sua utilização neste estudo. 
 
Histórias, narrativas e conhecimento humano 
 
 Uma história é uma forma de contar uma sequência de acontecimen-
tos, que tem três elementos básicos: (a) uma situação envolvendo algum 
conflito, ou dificuldade, (b) um ou mais personagens que se envolvem na 
situação com um dado propósito, e (c) uma sequência temporal na qual o 
conflito é de algum modo resolvido. Por outras palavras, uma história con-
tém referência a personagens, locais e acontecimentos enquadrados numa 
sequência temporal que sugere implicitamente tanto causalidade como sig-
 
3 Trata-se de um projecto com características de investigação-acção porque os participantes pretendem 
incluir nas suas práticas docentes usuais actividades de tipo investigativo e de resolução de problemas, 
valorizando a correspondente comunicação/discussão no seio da turma, procurando, através da experi-
mentação e da reflexão sistematizada, encontrar formas viáveis de o concretizar na sala de aula. 
Histórias de investigações matemáticas 
21 
nificado. Todo o ser humano é um contador de histórias: vê o presente nas-
cer do passado e dirigir-se ao futuro. Pode-se dizer que percebe a realidade 
de um modo narrativo (Carter, 1993; Clandinin e Connelly, 1991). 
 Neste domínio, como em muitos outros, a terminologia varia de autor 
para autor. Diremos, com Connelly e Clandinin (1990), que uma história é 
um fenómeno natural do nosso pensamento, que ocorre constantemente, e 
que uma narrativa é o uso da história como método de investigação. Trata-
se portanto de uma história produzida deliberadamente, com um propósito 
muito particular. Por outro lado, um continuum na experiência de uma pes-
soa é uma unidade narrativa se torna a sua experiência de vida significativa 
através da unidade que lhe proporciona (Carter, 1993; Connelly e Clandi-
nin, 1986). 
 As histórias constituem parte integrante da nossa experiência quoti-
diana. Uma ideia fundamental é a de que organizamos as nossas experiên-
cias de interacção social através de histórias. De acordo com Bruner 
(1991), o nosso conhecimento diz respeito a dois domínios distintos: o 
mundo físico e o mundo das interacções humanas. A maior parte dos estu-
dos acerca do processo de aquisição do saber incide sobre o modo como 
nós conhecemos o mundo físico e não o mundo humano ou simbólico. 
 Para aquele autor, organizamos a nossa experiência e a nossa memó-
ria de acontecimentos humanos na forma de histórias, que são assim fenó-
menos naturais do nosso pensamento. Vivemos através de histórias, ou 
seja, pensamos, percebemos, imaginamos e fazemos escolhas morais de 
acordo com estruturas narrativas. A criação de histórias permite-nos estabe-
lecer ordem e coerência no fio da nossa experiência e construir a partir daí 
um sentido para os incidentes e acontecimentos do mundo real (Carter, 
1993). Por outro lado, a pessoa que conta uma história tanto é moldada pela 
situação como molda a situação vivida (Clandinin e Connelly, 1991). 
 Uma segunda ideia importante é a de que uma história é uma forma 
de pensamento convencional, culturalmente transmitida, constrangida 
pelas capacidades de cada pessoa e pela natureza do meio em que está 
inserida. Deste modo, as construções narrativas não são verdadeiras ou fal-
sas, mas apenas mais ou menos verosímeis e mais ou menos evocativas. A 
sua aceitação é governada por convenção e por “necessidade narrativa”. Ou 
seja, a cultura fala através de histórias individuais, histórias que são cons-
truídas em torno de temas que permitem a projecção dos valores humanos 
(Carter, 1993; Riessman, 1993). 
Histórias de investigações matemáticas 
22 
 O modo de pensar narrativo é profundamente distinto do modo de 
pensar lógico ou científico e sujeita-se a diferentes critérios de qualidade. 
Riessman (1993), por exemplo, aponta os seguintes aspectos como essen-
ciais numa boa narrativa: persuasividade, correspondência, coerência e uso 
pragmático. Não é qualquer história que pode ser relevante para fins de 
investigação, mas apenas as históriasque satisfazem estas características 
fundamentais. 
 Uma terceira ideia marcante é a de que o conhecimento humano se 
baseia em ferramentas culturais, sendo por isso o grupo cultural uma uni-
dade de análise fundamental. Na perspectiva de Bruner (1991), havendo 
domínios específicos do conhecimento e competência humanos que são 
suportados e organizados por conjuntos de ferramentas culturais, a unidade 
de análise não pode ser apenas o indivíduo, mas tem de ser o grupo cultu-
ral. O pensamento, as percepções e as experiências dos professores são 
elementos integrantes da sua cultura, fazendo com que a força dos contex-
tos culturais esteja presente nos seus pensamentos: “o que os professores 
nos dizem acerca das suas práticas é, fundamentalmente, um reflexo da sua 
cultura, e não pode ser compreendido correctamente sem referência a essa 
cultura que é interpessoal” (Olson, 1988, citado em Solas, 1992, p. 213). 
 Em qualquer cultura existe necessariamente um largo consenso 
implícito no que respeita às crenças sociais — ou seja, como é que nós pen-
samos que as pessoas são e como é que lidamos uns com os outros. Trata-
se de um bom exemplo de um domínio do conhecimento organizado narra-
tivamente (Bruner, 1991). Nele se incluiu, naturalmente, as representações 
dos docentes sobre os processos de aprendizagem dos seus alunos. 
 As histórias tornaram-se assim num dos meios de captar a complexi-
dade, a especificidade e as relações existentes entre os fenómenos com que 
lidamos. Elas relembram constantemente as limitações das abordagens 
positivistas tradicionais, para as quais o ensino surgia decomposto em 
variáveis discretas e em indicadores de eficácia (Carter, 1993). 
 
Histórias, narrativas e conhecimento profissional 
 
 O conhecimento profissional do professor evidencia-se na sua práti-
ca. Ora, uma outra ideia fundamental é que as histórias e as narrativas 
constituem um modo de conhecimento particularmente ligado à acção. 
Como diz Carter (1993), as histórias são “modos de conhecimento emer-
Histórias de investigações matemáticas 
23 
gindo da acção... explicações das intenções humanas no contexto da acção” 
(p. 6). As histórias, com a sua multiplicidade de sentidos, são uma forma 
particularmente adequada para expressar o conhecimento associado à com-
plexidade da acção. Uma vez que o ensino é uma acção intencional numa 
situação, o conhecimento essencial que os professores têm do ensino vem 
da sua prática, isto é, de agirem como professores nas salas de aula. Assim, 
para compreender o pensamento de um professor, podemos começar por 
procurar as histórias que estruturam o modo de pensar sobre os aconteci-
mentos da sala de aula desse mesmo professor (as suas teorias práticas). No 
entanto, devemos ter presente que, nas suas narrativas, os professores não 
se limitam a recordar e a relatar as suas experiências, mas repetem e 
recriam as suas próprias histórias, reconstruindo significados, redefinindo o 
seu eu pessoal e profissional (Cortazzi, 1993). 
 Segundo Connelly e Clandinin (1986), os académicos têm sido irre-
dutivelmente teóricos e têm falhado na compreensão do pensamento práti-
co. Para estes autores, a prática tem de ser o ponto de partida para a inves-
tigação e não um mero lugar de aplicação da teoria. O estudo narrativo 
muda a ênfase da análise da prática em termos da teoria para o desenvolvi-
mento da teoria em termos da prática. 
 Uma última ideia-chave é a de que a produção de narrativas é uma 
forma de promover uma relação de colaboração entre investigadores e 
professores. Para estabelecer uma relação colaborativa é necessário tempo, 
relação pessoal, espaço e voz (Connelly e Clandinin, 1990). Este tipo de 
investigação permite o estabelecimento de formas de colaboração que pro-
movem uma estreita relação entre todos os participantes. Esta relação 
envolve sentimentos de “interligação”, igualdade, afecto, propósito e inten-
ção partilhados e de proximidade. Desta relação, mutuamente inspiradora, 
podem resultar insights sobre o pensamento dos professores que seria 
improvável obter através de qualquer outro tipo de investigação. 
 A relação que se estabelece entre investigador e professor fomenta a 
reflexão sobre as práticas deste último, permitindo uma compreensão mais 
profunda das eventuais mudanças operadas nessa prática, bem como do 
papel dessas mudanças. Assim, será de realçar o contributo dado pelas nar-
rativas no sentido do crescimento profissional, social e pessoal dos profes-
sores. 
 As histórias captam dum modo especial a riqueza, as nuances de sig-
nificado, as ambiguidades e as contradições dos assuntos humanos, ao con-
Histórias de investigações matemáticas 
24 
trário do pensamento paradigmático ou científico que requer precisamente 
consistência e não contradição (Bruner, 1991; Carter, 1993). Uma razão 
para valorizar a narrativa na investigação educacional é a sua grande capa-
cidade para representar a vida e promover a ligação entre esta e as expe-
riências educativas. As narrativas são uma forma de capturar a complexi-
dade, a especificidade e as ligações internas e externas do fenómeno com 
que estamos a tratar e, desse modo, ultrapassar as limitações das aborda-
gens atomistas e positivistas. As narrativas são, por isso, uma forma de 
conhecer e de pensar particularmente adequada para lidar com as questões 
com que nos debatemos na investigação educacional (Carter, 1993). 
 O resultado da investigação narrativa é a produção de uma filosofia 
pessoal, traduzindo a forma como cada professor pensa acerca de si próprio 
em situações de ensino. Obtém-se assim uma visão do seu conhecimento 
prático e pessoal. A filosofia pessoal não é uma reconstrução do investiga-
dor nem do participante. É uma reconstrução dos dois em colaboração 
(Connelly e Clandinin, 1986). 
 Uma história, uma vez contada (oralmente ou por escrito), deixa de 
pertencer apenas ao personagem que a narrou. Passa a ter uma existência 
independente da sua vontade, das suas intenções ou da sua interpretação 
(Clandinin e Connelly, 1991). Passa a pertencer a toda a comunidade edu-
cativa. 
 
O processo de construção de uma narrativa 
 
 O método geral de investigação narrativa consiste em compreender e 
reconstruir em colaboração com os professores unidades narrativas dentro 
das suas histórias. A investigação narrativa tende a começar sem um pro-
blema pré-especificado, mas com um interesse num fenómeno que possa 
ser entendido narrativamente (Connelly e Clandinin, 1986). 
 Para Labov (citado em Riessman, 1993), uma narrativa pode ser 
decomposta em 6 elementos fundamentais: 
 
• resumo (sumário da substância da narrativa); 
• orientação (tempo, lugar, situação, participantes); 
• acção complicadora (sequência de acontecimentos); 
• avaliação (o significado da acção, a atitude do narrador); 
• resolução (o que finalmente aconteceu); 
Histórias de investigações matemáticas 
25 
• coda (faz regressar à perspectiva do presente). 
 
 A escrita das narrativas é o primeiro passo da interpretação. As fon-
tes de dados podem ser as mais variadas: notas de campo de experiência 
partilhada, registos em diários de bordo, entrevistas não estruturadas, histó-
rias contadas, cartas escritas, escritos biográficos e autobiográficos, etc. Às 
várias fontes de dados o investigador acrescenta a sua própria reflexão. 
Nesta abordagem, a observação e a reflexão conjunta sobre situações vivi-
das desempenham um papel fundamental. O processo de investigação nar-
rativo tem um primeiro movimento da experiência para as notas de campo, 
transcrições, documentos e reflexões do investigador e do professor, avan-
çando depois para uma reconstrução mútua da narrativa (Connelly e Clan-
dinin, 1986, 1990). 
 A construção de uma narrativa pressupõe diversas etapas, que Riess-
man (1993) sistematiza no seguinte modelo: 
 
• viver ou participar da experiência; 
• contar a experiência (pelo sujeito que a viveu); 
• transcrever a experiência; 
• analisar a experiência, implicando a elaboração de umtestemunho 
(usualmente escrito); 
• ler, pressupondo uma recontagem da experiência. 
 
 Para esta autora, trata-se no fundo de diversos níveis de representa-
ção de uma experiência. Ao falar da experiência há que notar que se ergue 
um fosso inevitável entre a experiência como foi vivida e toda a comunica-
ção que é feita acerca dela. Contar uma experiência implica também a cria-
ção de uma identidade — um modo como se quer ser conhecido pelos 
outros. Toda a narrativa é inevitavelmente uma auto-representação. 
 A transcrição é (como os outros níveis de representação) necessaria-
mente incompleta, parcial e selectiva. Transcrever o discurso, tal como 
fotografar a realidade, é uma acção interpretativa. Decisões acerca de como 
transcrever, tal como acerca de falar e ouvir, são guiadas pela teoria e por 
normas retóricas. 
 Analisar implica seleccionar, salientar, relacionar e comparar. Como 
em todo o processo investigativo, é o passo-chave da actividade criativa de 
investigação. Pretende-se que essa análise não deturpe a voz e o sentido das 
Histórias de investigações matemáticas 
26 
práticas profissionais, mas os enriqueça e clarifique tirando partido da mul-
tiplicidade de experiências e perspectivas dos elementos da equipa. 
 Uma vez na sua forma final, a narrativa continua aberta a várias lei-
turas e a várias construções. O significado de um texto é sempre significado 
para alguém. As narrativas transportam uma carga cultural e histórica mui-
to acentuada. As verdades que construímos são significativas para comuni-
dades interpretativas específicas em circunstâncias históricas bem defini-
das. Cada nível do modelo envolve uma redução, mas também uma expan-
são: os contadores seleccionam para narrar os aspectos da sua experiência 
total mas juntam outros elementos interpretativos. 
 
 
O trabalho da equipa 
 
 
 A equipa do projecto é constituída por dois docentes universitários, 
uma docente de uma escola superior de educação e uma professora do 2º 
ciclo do ensino básico4, interessados na exploração das possibilidades das 
narrativas como instrumento de investigação educacional e de formação de 
professores. Todos os membros da equipa têm vários anos de experiência 
de leccionação no ensino básico e secundário5. Os elementos presentemente 
no ensino superior trabalham na formação inicial e contínua de professores. 
 O programa de trabalhos inicial previa que os elementos da equipa do 
projecto e outros professores cooperantes iriam promover durante o ano 
lectivo de 1995-96 um número significativo de aulas em que fossem reali-
zadas e discutidas actividades investigativas e de resolução de problemas 
por parte dos alunos. Essas aulas, bem como o subsequente processo de 
avaliação das aprendizagens, seriam objecto de observação e registo vídeo 
por parte dos membros da equipa do projecto, dando lugar à realização de 
discussões e consequente produção de narrativas. 
 As narrativas incidiriam sobre as situações de ensino-aprendizagem 
efectivamente vividas. Seriam produzidas tanto pelos professores que rege-
ram essas aulas como pelos elementos que as observaram. Uma primeira 
 
4 Uma outra professora do 3º ciclo e do ensino secundário (Ana Vieira), inicialmente prevista para inte-
grar o projecto, acabou por não participar na equipa, tendo sido uma das professoras cooperantes. Esta 
professora elaborou uma das narrativas que integram este relatório e colaborou na experimentação de 
diversas propostas de trabalho. 
5 Mais precisamente, 4, 5, 6 e 15 anos de experiência. 
Histórias de investigações matemáticas 
27 
versão seria sujeita a um processo de discussão e análise, a partir do qual 
surgiriam novas versões, sucessivamente mais aperfeiçoadas. 
 Em reuniões conjuntas, a equipa estabeleceu e reformulou por diver-
sas vezes o seu plano de trabalho, discutiu e reflectiu sobre textos de natu-
reza teórica e debruçou-se sobre diversos aspectos do processo de constru-
ção e de análise das narrativas. Versões preliminares de cada uma das his-
tórias foram amplamente discutidas, tendo sido sucessivamente objecto de 
aperfeiçoamento. O mesmo processo foi seguido com as diversas secções 
deste relatório. Em vários momentos do percurso fizeram-se balanços 
colectivos sobre o desenvolvimento do trabalho. 
 Nas suas reuniões, a equipa discutiu diversos contributos teóricos 
sobre as tarefas de investigação, sobre a dinâmica da aula, sobre o conhe-
cimento profissional do professor e sobre o uso de narrativas em investiga-
ção educacional6. 
 Dois dos membros da equipa do projecto realizaram uma visita de 
estudo ao Reino Unido, tendo por foco a experiência de realização de tare-
fas de investigação na aula de Matemática naquele país. Os resultados des-
sa visita foram discutidos numa reunião de toda a equipa do projecto. 
 
 
 
6 Uma vez que este projecto incide na realização de tarefas de investigação matemáticas pelos alunos, foi 
feita uma discussão do texto de J. Mason (1991), que se debruça sobre a já longa experiência de uso des-
tas actividades nas escolas do Reino Unido. O autor aponta diversas questões a ter em conta em cada uma 
das fases da realização de uma investigação na sala de aula. 
 Atendendo ao interesse das interacções na sala de aula no decurso da realização deste tipo de tare-
fas, foi seleccionada para discussão uma parte substancial da tese de doutoramento de E. Castro (1995), 
realizada na Universidade de Granada, que se refere precisamente a esta temática num contexto de traba-
lho inovador na sala de aula com padrões numéricos. 
 Para contextualizar o presente projecto em termos dos estudos já feitos sobre as competências pro-
fissionais do professor de Matemática, discutiu-se um texto de J. P. Ponte (1996), que faz uma análise 
crítica da investigação realizada em Portugal em torno da figura e da actividade do professor. 
 O estudo aprofundado da relação entre tarefa e actividade, nomeadamente no contexto educacio-
nal, é de grande importância para se compreender o que se passa na realização de tarefas de investigação. 
Daí a selecção para discussão aprofundada do texto Task and activity de B. Christiansen e G. Walther 
(1986). Foi dada particular atenção ao modo como os autores se referem às actividades de exploração e 
investigação e à análise que fazem da forma como os professores as podem conduzir na sala de aula. 
 Foram ainda discutidos diversos aspectos teóricos sobre o método narrativo, tendo como referên-
cia principal o texto de K. Carter (1993), The place of story in the study of teaching and teacher educa-
tion, e os livros de C. Reissman (1993) e M. Cortazzi (1993). 
Histórias de investigações matemáticas 
28 
A elaboração e análise das narrativas 
 
 
 Algumas das narrativas produzidas neste projecto resultam de situa-
ções de ensino-aprendizagem levadas a cabo pela professora do 2º ciclo 
pertencente à equipa. Outras narrativas resultam de aulas realizadas por 
professores contactados pelos elementos da equipa e que se disponibiliza-
ram a colaborar. 
 As tarefas a usar nas respectivas turmas foram escolhidas pelas profes-
soras (da equipa ou cooperantes), de entre as sugeridas pela equipa do pro-
jecto. As professoras, de um modo geral, escolhiam as tarefas por lhes 
parecerem mais adequadas à turma ou aos temas programáticos que trata-
vam naquele momento ou, simplesmente, porque consideravam uma inves-
tigação interessante. A preparação prévia das aulas com os professores 
cooperantes foi variável mas na maior parte dos casos reduziu-se a uma 
única reunião de trabalho (onde se esclareceram eventuais dúvidas). Por 
vezes, as professoras faziam pequenas sugestões de alteração (que eram 
naturalmente atendidas). Em alguns casos foram resolvidas e exploradas 
exaustivamente as tarefas propostas. Nesta reunião, os elementos da equipa 
procuravam ainda conhecer como a tarefa seria apresentada, quanto tempo 
a professora previa para a sua realização,como iria organizar os alunos 
para trabalhar e que expectativas tinha quanto ao seu desempenho. 
 A produção das versões preliminares das narrativas foi levada a cabo 
por cada um dos elementos da equipa do projecto, em colaboração com 
outros elementos da equipa e por vezes com as professoras cooperantes7. A 
elaboração de uma narrativa sobre uma situação de ensino-aprendizagem 
revelou-se um processo bastante problemático, tendo-nos obrigado a reflec-
tir e a tomar decisões em relação a diversos aspectos. 
 Em primeiro lugar, surge a questão da autoria das narrativas. Estas 
devem ser elaboradas essencialmente pelos membros da equipa de investi-
gação ou pelos professores responsáveis pela leccionação das aulas? A rea-
lização dos textos pelos professores seria sem dúvida mais interessante — 
conferindo-lhes um papel de maior protagonismo. No entanto, depois de 
algumas tentativas, acabámos por verificar que as professoras cooperantes 
 
7 Exceptua-se o caso de uma história produzida por uma professora cooperante (Ana Vieira), que foi 
integralmente elaborada por esta professora. 
Histórias de investigações matemáticas 
29 
tinham grande dificuldade e pouca motivação para realizar tal tarefa. Esse 
processo foi, por isso, pouco utilizado8. 
 Em segundo lugar, põe-se o problema da relação entre as narrativas 
escritas e as narrativas orais. Sendo o objectivo final do trabalho a produ-
ção de narrativas escritas, seria adequado passar por uma etapa intermédia 
de produção de narrativas orais? A estratégia adoptada foi a da realização 
de narrativas (escritas) com base numa conversa com a professora sobre a 
aula9. Essa conversa decorria num registo não estruturado e informal, e nela 
estavam normalmente presentes diversos elementos de narrativa oral. O 
texto assim produzido era submetido à apreciação da professora para even-
tuais correcções e validação, de modo a ter tanto quanto possível a garantia 
de representar fidedignamente a situação vivida10. 
 Em terceiro lugar, deve referir-se o problema de encontrar o tipo certo 
de narrativa adequado a este estudo, problema que surgiu em diversos 
momentos. Qual a natureza das “complicações” que temos em vista? Que 
tipo de informação deve ser dada para contextualizar cada uma das narrati-
vas? Em ensaios preliminares foram produzidos textos representando 
pequenos momentos da aula mas que não se revelaram adequados aos 
objectivos deste trabalho. Houve, também, necessidade de distinguir uma 
narrativa de um relatório sobre uma aula. Este tende a ser bastante porme-
norizado, descrevendo tudo o que de importante aconteceu, com algum 
substrato crítico. Uma narrativa, para manter a sua fluência natural, não 
pode ter a preocupação de “contar tudo”, nem sequer de “contar muita coi-
sa”. Pelo contrário, tem de se centrar no desenvolvimento das sucessivas 
complicações e resoluções da acção. E tem de procurar colocar-se no ponto 
de vista do actor principal — o professor — e não deixar-se abafar comple-
tamente pelas ideias preconcebidas do investigador. Muito embora, o nar-
rador explícito nas narrativas produzidas seja o investigador, pretendemos 
 
8 Note-se, no entanto, que houve narrativas produzidas pela professora do 2º ciclo que integra a equipa 
do projecto (Irene Segurado) e por uma outra professora cooperante (Ana Vieira), inicialmente prevista 
para integrar a equipa. 
9 Na maior parte dos casos o membro da equipa assistiu à aula em causa. Nessas circunstâncias, a com-
plicação central da narrativa pode surgir tanto da observação como da reflexão conjunta realizada com o 
professor. Nos casos em que o investigador não assistiu à aula, a complicação ou surge espontaneamente 
do professor ou resulta de um questionamento perspicaz por parte do investigador na conversa conjunta 
posterior. 
10 Os professores não fizeram quaisquer correcções, considerando que o conteúdo retratava aquilo que 
tinha de facto acontecido na aula. 
Histórias de investigações matemáticas 
30 
que o professor tenha, também, um papel importante na narração, para o 
que transcrevemos com frequência o seu discurso directo. 
 Em quarto lugar, coloca-se também a questão de onde encontrar o 
ponto de partida para a elaboração de uma narrativa. A complicação tem de 
estar identificada à partida ou evolui naturalmente a partir de uma primeira 
versão que descreve uma situação vivida na sala de aula? Cada elemento da 
equipa procurou desenvolver o seu próprio método para a elaboração de 
narrativas, trabalho que requer tanto de inspiração como de esforço e per-
sistência. De grande utilidade foram os registos áudio da professora na aula 
(e dos alunos com quem dialogava), as entrevistas feitas às professoras e os 
registos escritos durante as aulas. A sua utilização não levantou grandes 
problemas. A importância do vídeo é variável — é grande se a narrativa 
pretende descrever a aula mas é reduzida se se centra num acontecimento 
isolado. Os registos vídeo revelaram-se bastante úteis para reproduzir a fase 
de discussão na aula quando “se passa muita coisa ao mesmo tempo”. Se a 
situação tiver sido vivida há já algum tempo, o vídeo é também muito útil 
para ajudar a recordar certos pormenores. O vídeo é tanto menos importan-
te quanto mais elaborada está a narrativa antes de começar a ser posta no 
papel (ou no computador). No caso das aulas não assistidas directamente 
pelos membros da equipa de investigação, os registos vídeo foram funda-
mentais para que se formasse uma ideia (ainda que parcial) do decorrer dos 
acontecimentos e da actuação das professoras11. No entanto, o uso do vídeo 
é mais problemático do que o dos restantes métodos e instrumentos de 
registo porque impede o observador de prestar total atenção aos aconteci-
mentos que se estão desenrolando na aula. 
 Em quinto lugar surge o problema da relação entre a produção da nar-
rativa e a sua análise. A narrativa, ao ser elaborada, deve sair logo com uma 
estrutura de análise claramente identificada? Deve seguir, por exemplo, o 
esquema de Labov (indicado na p. 26)? Depois de algumas tentativas, con-
cluímos que produzir em simultâneo a narrativa e a análise não era um pro-
cesso natural. Por outro lado, para nós, o esquema de Labov assumiu 
importância sobretudo como um esquema orientador e não como estratégia 
fundamental de análise. 
 
11 Os casos de não assistência às aulas pelo membro da equipa foram em número reduzido. No entanto, 
esta situação parece ter proporcionado mais informações e comentários interessantes por parte da profes-
sora cooperante do que a situação de assistência directa. 
Histórias de investigações matemáticas 
31 
 Existem diversos métodos que se podem utilizar para fazer a análise 
das narrativas. Mas os métodos devem sempre servir os propósitos estabe-
lecidos e não devem ser encarados como valendo em si mesmos. A verdade 
é que as narrativas não têm sido muito usadas para identificação de dilemas 
e incertezas dos professores ou para evidenciar aspectos do seu conheci-
mento profissional, nomeadamente no que se refere à sua acção na sala de 
aula, pelo que não podíamos recorrer a modelos preexistentes. Assim, deci-
dimos usar uma grelha de análise baseada num conjunto de categorias refe-
rentes ao conhecimento profissional do professor de Matemática relativo à 
sua prática lectiva desenvolvido pela própria equipa do projecto (ver o qua-
dro 1). Esta grelha tem por base as questões emergentes da literatura e da 
experiência anterior dos elementos da equipa sobre a realização de activi-
dades de investigação (ver Ponte, 1995). 
 A estratégia de análise consistiu em procurar identificar em cada situa-
ção os aspectos que remetem, de um modo directo ou problemático, para 
elementos do conhecimento didáctico referidos neste quadro. Estes aspec-
tos foram colocados numa coluna na margem direita de cada uma das nar-
rativas,seguindo o modelo adoptado nas Normas Profissionais do NCTM 
(1994). Um segundo momento da análise tomou em consideração os aspec-
tos identificados nas diversas narrativas e salientados pelo processo indica-
do, propondo uma articulação e perspectiva geral. O resultado deste traba-
lho de análise surge no capítulo das conclusões. Finalmente, procedeu-se a 
um balanço dos pressupostos iniciais, tendo em conta o trabalho desenvol-
vido e a experiência adquirida. 
 
Histórias de investigações matemáticas 
32 
Quadro 1 - Categorias do conhecimento didáctico do professor 
relativo à sua prática lectiva 
 
 
 
Matemática 
 
Conceitos 
Terminologia 
Relações entre conceitos 
Processos matemáticos 
Forma de validação de resultados 
Competências básicas e processos de raciocínio 
 
 
 
Processos de 
aprendizagem 
 
Relação entre acção e reflexão 
Papel das interacções 
Papel das concepções dos alunos 
Papel dos conhecimentos prévios 
Estratégias de raciocínio 
Perspectivas em relação às capacidades dos alunos 
 
 
 
Currículo 
 
Finalidades e objectivos 
Ligação entre conteúdos 
Ligação com outros assuntos 
Representações dos conceitos 
Materiais 
 
 
 
Instrução 
 
Ambiente de trabalho e cultura da sala de aula 
Tarefas - concepção, selecção, sequenciação 
Tarefas - apresentação, apoio na execução, reflexão 
Actividade 
Comunicação e negociação de significados 
Modos de trabalho na sala de aula 
 
 
Histórias de investigações matemáticas 
33 
 
 
 
3. HISTÓRIAS 
 
 
 
Histórias de investigações matemáticas 
34 
 
Conjecturando... 
 
A Irene entrou na sala do conselho directivo à minha pro-
cura. Vinha apreensiva tanto com a turma como com o 
equipamento de gravação. A turma não tinha experiência 
de trabalho em tarefas de investigação e além disso só tinha 
tido uma aula e meia sobre potências. E a câmara de vídeo 
que ia ser usada tinha acabado de vir da reparação. Pensei 
paciência, com um bocado de sorte pode ser que tudo aca-
be por correr bem. A Irene ia dar uma aula de duas horas a 
uma turma do 5º ano, experimentando uma ficha de traba-
lho sobre Potências e Regularidades. O dia — 29 de Feve-
reiro de 1996 (um dia “bissexto”) — tinha que ser bem 
aproveitado pois só aparece de 4 em 4 anos! 
A grande questão que se colocava à Irene era a de pôr a 
trabalhar na sala de aula estes alunos em tarefas de investi-
gação. Trata-se, segundo ela, duma turma de rendimento 
médio e bastante homogénea. Apenas três ou quatro alunos 
se destacam pela positiva e uns quatro ou cinco pela nega-
tiva. Desde o princípio do ano que os alunos desta turma se 
têm revelado com pouca capacidade de pensamento inde-
pendente. Para eles, a “autoridade” está no professor, pro-
curando cumprir à risca tudo o que ele pede, sem nunca se 
atreverem a ir mais longe. 
A Irene tem vindo a tentar modificar esta maneira de ser 
dos alunos. Colocou algumas tarefas onde eles eram cha-
mados a tomar algumas decisões, por exemplo, problemas 
onde não estavam claramente expressos os dados necessá-
rios ou onde era preciso fazer alguma selecção de informa-
ção. No entanto, em todas estas tarefas, havia claramente 
uma pergunta formulada, à qual havia que dar resposta. 
Agora, estava apreensiva quanto à reacção que os alunos 
teriam quando 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A professora 
procura ter 
em conta as 
características 
específicas 
dos seus alu-
nos ao pla-
near a reali-
zação de um 
novo tipo de 
tarefa. 
 
 
A professora 
realiza tarefas 
que gradual-
mente vão 
desenvolven-
do nos alunos 
novas capaci-
dades. 
Histórias de investigações matemáticas 
35 
confrontados com uma actividade de investigação, onde se 
pretende que eles vão bastante além do que lhes é explici-
tamente indicado. Estava também preocupada com o tem-
po. A sua ideia era a de usar a aula de duas horas para que 
os alunos fizessem a ficha e a respectiva discussão — mas 
neste tipo de trabalho é sempre difícil prever se o tempo 
disponível irá ser suficiente. 
Apesar de ser uma turma pouco habituada a trabalhar em 
grupo, pareceu à Irene que esta seria a melhor maneira de 
resolverem as tarefas que lhes iriam ser propostas. A troca 
de ideias poderia tornar o trabalho mais rico e os alunos 
não sentiriam o peso da avaliação, que se torna por vezes 
bastante inibidor. Além disso, tinha a certeza de que os 
alunos iriam solicitar frequentemente o seu auxílio, sendo 
este impensável se se tivesse de repartir por 24 alunos e 
não apenas por 6 grupos de trabalho. Pensou em introduzir 
a ficha com as diversas questões, conforme já havia feito 
com outra turma no ano anterior, fazendo uma breve expli-
cação oral dos termos desconhecidos dos alunos. 
A Irene indicou aos alunos para se organizarem para traba-
lho de grupo — o que levou a grande movimentação das 
mesas e cadeiras, tomando algum tempo. Começou então 
por ler as questões propostas na ficha, explicando o signifi-
cado de uma ou outra palavra. Por vezes formulava uma 
pergunta: 
Profª: Qual o significado da palavra ‘cubo’? 
Tudo se passou conforme o planeado até ao momento em 
que começou a explicar o termo “conjectura” e, não encon-
trando os termos desejados, acabou por fazer uma deriva-
ção mais prolongada. Mas a certa altura pareceu-lhe que os 
alunos estavam a ficar com um ar cada vez mais 
A professora 
procura que 
as tarefas 
sejam ade-
quadas ao 
tempo dispo-
nível. 
 
A professora 
decide reali-
zar trabalho 
de grupo — o 
modo de tra-
balho que 
neste caso 
considera 
mais ade-
quando às 
tarefas pro-
postas. 
 
A tarefa é 
introduzida 
oralmente e 
por escrito. 
 
A professora 
procura 
encontrar o 
melhor modo 
de apresentar 
a tarefa, tendo 
em conta que 
não deve dar 
informação a 
mais nem a 
menos. 
 
A professora 
procura clari-
ficar os con-
ceitos que 
 
Histórias de investigações matemáticas 
36 
confuso e sentiu que seria mais importante esclarecer o que 
se entendia por regularidades. Procurou encontrar exem-
plos e levar os alunos a indicarem, eles mesmos, outros 
exemplos de diversos domínios da Matemática. Este início 
levou mais tempo do que o previsto, mas por fim os alunos 
começaram a trabalhar. 
Nos primeiros momentos da aula estive à volta do material 
de gravação vídeo. A câmara, na verdade, não inspirava 
muita confiança. Dirigi a objectiva para o grupo de alunos 
mais próximo — mesmo assim a mais de dois metros. O 
aspecto degradado do microfone, envolvido num papel 
meio rasgado, e a distância a que o grupo se encontrava 
davam-me a sensação que pouco iria ser registado. Além 
disso, a câmara estava irritantemente inclinada a 30º, mais 
parecendo um barco em vias de se afundar! Todas as 
minhas tentativas para a endireitar esbarraram com a tei-
mosia do tripé, provocando certamente bastantes tremuras 
na gravação. Enfim, deixei a câmara a fazer o seu melhor e 
fui instalar-me junto do grupo que estava a ser filmado, 
composto por quatro alunos. 
Terminada a explicação inicial, a Irene tinha começado a 
circular pelos grupos. A primeira questão desafiava os alu-
nos a escreverem diversos números como uma potência de 
base 2: 
 
 64 = 
 128 = 
 200 = 
 256 = 
 1000 = 
 
Pedia-lhes ainda que fizessem conjecturas acerca dos 
números que podem ser escritos como potências de base 2 
irão ser 
necessários, 
solicitando as 
contribuições 
dos alunos, e 
altera a sua 
estratégia 
tendo em 
conta a sua 
reacção. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Os alunos, na 
expectativa 
de que há 
uma resposta-
padrão para 
cada pergunta 
têm dificul-
dade em lidar 
com questões 
postas de 
modo diferen-
te do habitual.
 
Histórias de investigações matemáticas 
37 
e como potências de base 3. Havia alguma confusão uma 
vez que os alunos não entendiam muito bem qual a resposta 
que era para dar, mostrando tendência para escreverem coi-
sas como 642 = 4096. Para eles devia haver uma resposta 
esperada e que por certo a professora já tinha explicado na 
aula, mas não viam qual era. A Irene tentou levá-los a per-
ceber que

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