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42 UPE 2015 O RETIRANTE EXPLICA AO LEITOR QUEM É E A QUE VAI – O meu nome é Severino, como não tenho outro de pia. Como há muitos Severinos, que é santo de romaria, deram então de me chamar Severino de Maria; como há muitos Severinos com mães chamadas Maria, fiquei sendo o da Maria do finado Zacarias Mais isso ainda diz pouco: há muitos na freguesia, por causa de um coronel que se chamou Zacarias e que foi o mais antigo senhor desta sesmaria Como então dizer quem falo ora a Vossas Senhorias? Vejamos: é o Severino da Maria do Zacarias, lá da serra da Costela, limites da Paraíba (...) [continuação...] Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida: na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra, no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas e iguais também porque o sangue, que usamos tem pouca tinta E se somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte severina: que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença é que a morte Severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida) João Cabral de Melo Neto Analise as armativas a seguir: I. No início do trecho, Severino se apresenta e, para se diferenciar dos demais Severinos existentes na ‘freguesia’, revela informações acerca dos pais e da região onde vive. Mas o lavrador tem dificul- dades em sua apresentação, pois Severinos no norte são “iguais em tudo na vida” II. À medida que apresenta, Severino faz revelações sobre ele e os demais sujeitos que estão em condi- ções de sobrevida tão ou mais precárias que a sua. É uma vida cercada pela morte, que, se não lhes rouba os dias pela doença, rouba pela violência. III “A gente não nascida” é uma referência às crian- ças não nascidas, por causa da doença da mãe, cujas vidas são similares à de Severino, pois es- sas mulheres também são vítimas da fome, da seca, do desemprego e da violência humana. Está cORRETO o que se arma, apenas, em A I e II. b I e III. c II e III. d I. E II. 43 UFPE 2014 Texto 1 — Essa cova em que estás, Com palmos medida, É a conta menor Que tiraste em vida. — É de bom tamanho, Nem largo nem fundo, É a parte que te cabe Deste latifúndio — Não é cova grande, É cova medida, é a terra que querias ver dividida — É uma cova grande para teu pouco defunto, mas estarás mais ancho que estavas no mundo — É uma cova grande para teu defunto parco, porém mais que no mundo te sentirás largo. — É uma cova grande para tua carne pouca, mas à terra dada não se abre a boca. [...] MELO NETO, João Cabral de. Morte e vida severina. Texto 2 Somem canivetes Fica proibido o canivete em aula, no recreio, em qualquer parte pois em um país civilizado entre estudantes civilizadíssimos, a nata do Brasil, o canivete é mesmo indesculpável. Recolham-se, pois, os canivetes sob a guarda do irmão da Portaria. Fica permitido o canivete nos passeios à chácara para cortar cipó descascar laranja e outros fins de rural necessidade. LÍNGUA PORTUGUESA Capítulo 15 Século XX: novas identidades literárias118 Restituam se, pois, os canivetes a seus proprietários com obrigação de serem recolhidos na volta do passeio, e tenho dito. Só que na volta do passeio verificou-se com surpresa: no matinho ralo da chácara todos os canivetes tinham sumido. ANDRADE, Carlos Drummond de A partir da análise da temática dos dois poemas ante- riores, avalie as proposições a seguir e assinale quais são verdadeiras (V) ou falsas (F): 0-0 João Cabral inspira-se nos padrões da poesia clás- sica Drummond, ao contrário, reflete as pretensões estéticas da vanguarda modernista 1 1 No poema de João Cabral, o suposto interlocutor é evocado explicitamente: as desinências verbais são indícios disso. Em Drummond, prevalece um discurso normativo: daí o predomínio do uso do imperativo. 2-2 O poema de João Cabral é uma peça literária em- blemática da luta que tem sido travada em relação às desigualdades sociais advindas da má distribui- ção na posse da terra. 3-3 No verso: “é uma cova grande para tua carne pou- ca”, a antítese reformula um conhecido provérbio popular. 4-4 Em “Somem canivetes”, Drummond, com fina ironia, admite que o uso do canivete é “indesculpável”, pois se trata de um país “civilizado” e de estudan tes “civilizadíssimos”, “a nata do Brasil” 44 Enem 2011 Texto I O meu nome é Severino, não tenho outro de pia. Como há muitos Severinos, que é santo de romaria, deram então de me chamar Severino de Maria; como há muitos Severinos com mães chamadas Maria, fiquei sendo o da Maria do finado Zacarias, mas isso ainda diz pouco: há muitos na freguesia, por causa de um coronel que se chamou Zacarias e que foi o mais antigo senhor desta sesmaria. Como então dizer quem fala ora a Vossas Senhorias? MELO NETO, João Cabral de Obra completa Rio de Janeiro: Aguilar, 1994. Texto II João Cabral, que já emprestara sua voz ao rio, transfe- re-a, aqui, ao retirante Severino, que, como o Capibaribe, também segue no caminho do Recife. A autoapresentação da personagem, na fala inicial do texto, nos mostra um Severino que, quanto mais se define, menos se individua- liza, pois seus traços biográficos são sempre partilhados por outros homens. SECCHIN, A. C João Cabral: a poesia do menos. Rio de Janeiro: Topbooks, 1999. Com base no trecho de “Morte e vida severina” (Texto I) e na análise crítica (Texto II), observa-se que a relação entre o texto poético e o contexto social a que ele faz referência aponta para um problema social expresso literariamente pela pergunta “Como então dizer quem fala / ora a Vossas Senhorias?”. A resposta à pergunta expressa no poema é dada por meio da: A descrição minuciosa dos traços biográficos do nar rador personagem. construção da figura do retirante nordestino como um homem resignado com a sua situação. representação, na figura do narrador personagem, de outros Severinos que compartilham sua condição. d apresentação do narrador personagem como uma projeção do próprio poeta, em sua crise existencial. E descrição de Severino, que, apesar de humilde, or- gulha-se de ser descendente do coronel Zacarias. 45 UFRGS 2017 (Adapt.) Leia a seguir o diálogo entre Se- verino e Mestre Carpina, retirado de Morte e vida severina, de João Cabral de Melo Neto — Seu José, mestre carpina, que lhe pergunte permita: há muito no lamaçal apodrece a sua vida? e a vida que tem vivido foi sempre comprada à vista? — Severino, retirante, sou de Nazaré da Mata, mas tanto lá como aqui jamais me fiaram nada: a vida de cada dia cada dia hei de comprá la — Seu José, mestre carpina, e que interesse, me diga, há nessa vida a retalho que é cada dia adquirida? espera poder um dia comprá-la em grandes partidas? — Severino, retirante, não sei bem o que lhe diga: não é que espere comprar em grosso tais partidas, mas o que compro a retalho é, de qualquer forma, vida. Seu José, mestre carpina, que diferença faria se em vez de continuar tomasse a melhor saída: a de saltar, numa noite, fora da ponte e da vida? Assinale com V (verdadeiro) ou F (falso) as seguintes armações. F R E N T E 2 119 J Severino, retirante chegado ao Recife, questiona a vida miserável de Mestre Carpina J Mestre Carpina defende a necessidade de viver mesmo que em condição precária J Mestre Carpina nega-se a ouvir os infundados ques tionamentos de Severino. J Severino, em sua última interrogação, aponta uma hesitação entre viver e morrer A sequência correta de preenchimento, de cima para baixo, é A V - V - F - V V - F - F - F V - F - V - V d F - V - F - V E F - V - V - F 46 UPF 2017 Sobre a chamada Geração de 45, que al guns críticos denominam de pós modernista, apenas é incorreto afirmar que: A Apresenta um primeiro balanço de sua produção por meio da publicação, em 1951, da antologia Pa- norama da nova poesia brasileira, organizada por Fernando Ferreira de Loanda Encontra em João Cabral de Melo Neto o seu expoente maior, em que pese o fato de o poeta per nambucano situar se no grupo mais por circunstânciacronológica do que por afinidades programáticas. Regride plenamente a concepções e procedimentos poéticos parnasiano-simbolistas, desconsiderando toda a poesia existencial europeia de entreguerras, de filiação surrealista, que poderia insuflar algum so- pro de modernidade à produção do grupo. d Reúne, basicamente, poetas amadurecidos duran te a II Guerra Mundial, como Hélio Pelegrino, Ledo Ivo, Geir Campos, Fernando Ferreira de Loanda e José Paulo Paes, entre vários outros. E Rejeita o verso livre e o coloquialismo dos mo- dernistas de 22, operando um retorno ao verso metrificado e à dicção nobre em seus poemas 47 EBMSP 2016 O artista inconfessável Fazer o que seja é inútil. Não fazer nada é inútil. Mas entre fazer e não fazer mais vale o inútil do fazer. Mas não, fazer para esquecer que é inútil: nunca o esquecer Mas fazer o inútil sabendo que ele é inútil, e bem sabendo que é inútil e que seu sentido não será sequer pressentido, fazer: porque ele é mais difícil do que não fazer, e difícil mente se poderá dizer com mais desdém, ou então dizer mais direto ao leitor Ninguém que o feito o foi para ninguém MELO NETO, João Cabral de. “O artista inconfessável”. SECCHIN, Antônio Carlos (Org). João Cabral de Melo Neto (seleções). São Paulo: Global Editora. Disponível em: <http://culturanavegante blogspot com.br/ 2010/11/o-artista- inconfessavel-joao-cabral-de.html>. Acesso em: 8 fev. 2018. Os versos de João Cabral de Melo Neto revelam um eu poético A angustiado, diante da constatação de que a poesia não é necessária nem útil para qualquer leitor, até mesmo para ele, na condição de artista pessimista, refletindo sobre o seu verdadeiro desejo de comunicar algo que ele mesmo considera inútil para um leitor ávido por informações importantes paradoxal, ao abordar, metalinguisticamente, sua incapacidade de comunicar algo, considerado inú- til, embora acabe expressando suas convicções sobre o discurso poético, que é difícil para um leitor que não existe ou que não é receptivo à sua arte. d centrado no código linguístico, na medida em que analisa a sua própria produção artística e a sua incapacidade de se fazer entender diante de um interlocutor presente e sensível a novas formas de expressão. E incapaz de confessar seus sentimentos e de tradu zir em palavras concretas e significativas o desdém que sente em relação à dificuldade que o leitor en- contra para interpretar seu ofício 48 Imed 2016 Analise o texto a seguir: O texto acima, de , é um dos exemplos mais famosos da . Assinale a alternativa que preenche, correta e respec- tivamente, as lacunas do trecho acima A Ferreira Gullar poesia concreta Décio Pignatari – poesia concreta Ronaldo Azevedo – poesia surrealista d Ferreira Gullar poesia surrealista E Décio Pignatari – poesia surrealista 49 UFJF 2012 Leia o poema concreto a seguir, de Décio Pignatari, para responder à questão. PIGNATARI, Décio. “Contribuição a um alfabeto duplo”. In: Poesia, Pois é, Poesia./ Poetc. São Paulo: Brasiliense, 1986. p. 184. LÍNGUA PORTUGUESA Capítulo 15 Século XX: novas identidades literárias120