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04 11 (Aula - Quinhentismo no Brasil)

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Profª. Cristiane 
Literatura 
 
Página 1 de 4 
Aula – Quinhentismo no Brasil (1500 – 1601) 
 
Outra fruta há nesta terra (...) que se cria em huma planta 
humilde junto do chão: a qual planta tem umas pencas como de 
herva babosa. A esta fruta chamam Ananases, e nascem como 
alcachofras, os quais parecem naturalmente pinhas, e são do 
mesmo tamanho, e alguns maiores. Depois que são maduros, tem 
um cheiro mui suave e comem-se aparados feitos em talhadas. 
São tão saborosos, que a juízo de todos nam há fruta neste Reino 
que no gosto lhes faça vantagem (...) 
Pero de Magalhães Gandavo, Tratado da Terra do Brasil: História da 
Província de Santa Cruz. Belo Horizonte: Itatiaia; SP: Edusp, 1981, p. 98 
 
Quando, pela primeira vez, nos deparamos com excertos da 
literatura produzida no século XVI no Brasil, é comum 
estranharmos. Estranhamos o modo como as descrições da terra 
(frutas, plantas, animais) e da gente (índios) são feitas – para 
alguns elas chegam a ser risíveis, por não corresponderem com a 
imagem que fazemos hoje desses elementos. O modo como 
Magalhães Gandavo descreve em 1570 o abacaxi, por exemplo, 
pode causar estranhamento para o leitor brasileiro da 
contemporaneidade: parece erva babosa? Alcachofra? Pinha? 
Reparem o quanto ele parte de comparações com elementos já 
conhecidos dos europeus para criar a imagem da fruta. Nós, 
brasileiros, conhecedores do abacaxi, poderíamos afirmar que 
essa não é uma boa descrição da fruta... Porém, será possível 
descrever o novo de maneira nova? Quando nos deparamos com 
aquilo que não conhecemos, partimos do nosso próprio 
parâmetro, daquilo que temos como referência de mundo para 
tentar conceituar e, a partir disso, entender o novo. O usual acaba 
sendo descrever o novo de maneira velha... A visão que se faz do 
outro é sempre baseada no eu, portanto a visão de mundo 
daqueles que descrevem elementos da terra recém-descoberta é 
etnocêntrica e, muitas vezes, preconceituosa. É claro que o olhar 
de quem conta a história interfere nela e, nesse sentido, os 
europeus colonizadores e aventureiros que aqui chegaram 
fizeram uma imagem da terra que correspondia à sua visão de 
mundo e não necessariamente à verdade. É uma das verdades, 
mas qual seria a visão do índio que se deparava com o europeu 
pela primeira vez? Pouco conhecemos dos índios brasileiros num 
período anterior da vinda dos portugueses para cá porque, dentre 
outros aspectos, eles não tinham escrita. Assim, construímos uma 
visão sobre esse povo que é completamente moldada pelos 
padrões europeus do colonizador do século XVI. Leia outros 
trechos da obra de Pero de Magalhães Gândavo: 
 
A língua deste gentio toda pela costa é uma. Carece de três letras, a 
saber, não se acha nela F, nem L, nem R, coisa digna de espanto, porque 
assim não têm nem Fé, nem Lei, nem Rei e, desta maneira, vivem sem 
justiça e desordenadamente. 
[...] 
Vivem todos em aldeias. Pode haver em cada uma sete ou oito casas, 
as quais são compridas, feitas à maneira de cordoarias e cada uma delas 
está cheia de gente duma parte e doutra e cada um por si tem sua estância 
e sua rede armada em que dorme e, assim, estão todos juntos uns dos 
outros por ordem e pelo meio da casa fica um caminho aberto para se 
servirem. Não há, como digo, entre eles, nenhum Rei nem Justiça, 
somente em cada aldeia têm um principal que é como capitão, ao qual 
obedecem por vontade e não por força. Morrendo este principal, fica seu 
filho no mesmo lugar. Não serve de outra coisa senão de ir com eles à 
guerra e aconselha-os como se hão de haver na peleja, mas não castiga 
seus erros nem manda sobre eles coisa alguma contra sua vontade. Este 
principal tem três, quatro mulheres. A primeira tem em mais conta e faz 
dela mais caso que das outras. (...) Não adoram coisa alguma nem têm 
para si que há na outra vida glória para os bons e pana para os maus. 
Todos cuidam que se acaba nesta (vida) e que as almas fenecem com os 
corpos e, assim, vivem bestialmente, sem ter conta, nem peso, nem 
medida. 
Pero de Magalhães Gândavo in Eduardo de Almeida Navarro, 
Método Moderno de Tupi Antigo – a língua do Brasil dos 
primeiros séculos. 2 ed, Petrópolis: Editora Vozes, 1999, p. 46 
 
1 Utilizamos o termo aqui no sentido de um conjunto de obras escritas 
sobre um mesmo assunto, não como uma linguagem artística. 
Agora reflita: seria pertinente afirmar que o “gentio” (modo como 
os portugueses se referiam pejorativamente a todos aqueles que 
não eram cristãos) não tinham fé, lei e/ou rei porque não possuíam 
esses fonemas em sua língua? Viver em agrupamentos é 
realmente sinal de desordem? Não “castigar os erros” dos outros 
é sinal de que o “principal” não tem grandes serventias? Por não 
haver Estado ou monopólio da força poderíamos afirmar que não 
havia justiça? Seria verdade que os índios “não adoravam coisa 
alguma”, se sabemos que eles possuíam pensamento mítico, em 
que tudo era regido pelo sobrenatural? O que podemos deduzir, a 
partir disso, sobre a visão de justiça, sociedade e fé do cronista 
lusitano? Será possível medir a cultura alheia a partir da sua? É 
mais fácil, a partir da leitura desses relatos e da análise de seu 
discurso, termos uma visão do europeu do século XVI do que do 
índio desse mesmo período. 
O professor Alfredo Bosi, a respeito das origens da nossa literatura 
– e da nossa história, afirma: 
O problema das origens da nossa literatura não pode formular-se em 
termos de Europa, onde foi a maturação das grandes nações modernas 
que condicionou toda a história cultural, mas nos mesmo termos das outras 
literaturas americanas, isto é, a partir da afirmação de um complexo 
colonial de vida e de pensamento. 
A colônia é, de início, o objeto de uma cultura, o “outro” em relação à 
metrópole: em nosso caso, foi a terra a ser ocupada, o pau-brasil a ser 
explorado, a cana-de-açúcar a ser cultivada, o ouro a ser extraído; numa 
palavra, a matéria-prima a ser carreada para o mercado externo. A colônia 
só deixa de o ser quando passa a sujeito da sua história. Mas essa 
passagem fez-se no Brasil por um lento processo de aculturação do 
português e do negro à terra e às raças nativas; e fez-se com naturais 
crises e desequilíbrios. Acompanhar este processo na esfera da nossa 
consciência histórica é pontilhar o direito e o avesso do fenômeno nativista, 
complemento necessário de todo complexo colonial. 
Alfredo Bosi, História Concisa da Literatura Brasileira. 3 ed, 
São Paulo: Cultrix, ?, p. 13 
 
1. Literatura1 de informação 
 
O primeiro texto aqui redigido data de 1500, quando Pero Vaz de 
Caminha, escrivão da frota de Pedro Álvares Cabral, chega à nova 
terra e documenta para el-rei D. Manuel as primeiras impressões 
da natureza e do aborígene. A partir dele, inúmeros outros relatos 
documentam a instauração do processo de que fala Alfredo Bosi; 
são informações que viajantes e missionários europeus, a partir 
da ótica da sua cultura, colheram sobre a natureza e o índio. 
Porque são crônicas históricas, não pertencem ao gênero literário, 
não põem ser consideradas, portanto, obras de arte; há críticos 
que chegam a afirmar que não têm valor estático. Ainda assim, é 
importante estudarmo-nas porque são elas a pré-história das 
nossas letras, as quais interessam “como reflexo da visão do 
mundo e da linguagem que nos legaram os primeiros 
observadores do país. É graças a essas tomadas diretas da 
paisagem, do índio e dos grupos sociais nascentes, que captamos 
as condições primitivas de uma cultura que só mais tarde poderia 
contar com o fenômeno da palavra-arte”2. 
Leia alguns excertos da Carta e pense: a visão que o europeu 
construiu sobre o índio pode ser considerado um retrato fiel da 
realidade? 
E dali houvemos vista d'homens, que andavam pela praia, de 7 ou 8, 
segundo os navios pequenos disseram, por chegarem primeiro. Ali 
lançámos os batéis e esquifes fora e vieram logo todos os capitães das 
naus a esta nau do capitão-mor e alifalaram. E o capitão mandou no batel, 
em terra, Nicolau Coelho, para ver aquele rio. E, tanto que ele começou 
para lá d'ir, acudiram pela praia homens, quando dous, quando três, de 
maneira que, quando o batel chegou à boca do rio, eram ali 18 ou 20 
homens, pardos, todos nus, sem nenhuma cousa que lhes cobrisse suas 
vergonhas. Traziam arcos nas mãos e suas setas. Vinham todos rijos para 
o batel e Nicolau Coelho lhes fez sinal que pusessem os arcos; e eles os 
puseram. 
2 Alfredo Bosi, op. cit., p. 15 
 
Profª. Cristiane 
Literatura 
 
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Ali não poude deles haver fala nem entendimento que aproveitasse, 
por o mar quebrar na costa. Somente deu-lhes um barrete vermelho e uma 
carapuça de linho, que levava na cabeça, e um sombreiro preto. E um 
deles lhe deu um sombreiro de penas d'aves, compridas, com uma 
copazinha pequena de penas vermelhas e pardas, como de papagaio. E 
outro lhe deu um ramal grande de continhas brancas, miúdas, que querem 
parecer d'aljaveira, as quais peças creio que o capitão manda a Vossa 
Alteza. E com isto se volveu às naus por ser tarde e não poder deles haver 
mais fala, por azo do mar. 
[...] 
O Capitão, quando eles vieram, estava sentado em uma cadeira, bem 
vestido, com um colar de ouro mui grande ao pescoço, e aos pés uma 
alçatifa por estrado. Sancho de Tovar, Simão de Miranda, Nicolau Coelho, 
Aires Correa, e nós outros que aqui na nau com ele vamos, sentados no 
chão, pela alcatifa. Acenderam-se tochas. Entraram. Mas não fizeram sinal 
de cortesia, nem de falar ao capitão nem a ninguém. Porém um deles pôs 
olho no colar do Capitão, e começou de acenar com a mão para a terra e 
depois para o colar, como que nos dizendo que ali havia ouro. Também 
olhou para um castiçal de prata e assim mesmo acenava para a terra e 
novamente para o castiçal, como se lá também houvesse prata. 
Mostraram-lhes um papagaio pardo que o capitão traz consigo; 
tomaram-no logo na mão e acenaram para a terra, como quem diz que os 
havia ali. Mostraram-lhes um carneiro: não fizeram caso. Mostraram-lhes 
uma galinha; quase tiveram medo dela: não lhe queriam pôr a mão; e 
depois a tomaram como que espantados. 
Deram-lhes ali de comer: pão e peixe cozido, confeitos, farteis, mel e 
figos passados. Não quiseram comer quase nada daquilo; e se alguma 
coisa provavam, logo a lançavam fora. Trouxeram-lhes vinho numa taça; 
mal lhe puseram a boca; não gostaram nada, nem quiseram mais. 
Trouxeram-lhes água em uma albarrada. Não beberam. Mal a tomaram na 
boca, que lavaram e logo a lançaram fora. 
[...] 
Ali andavam entre eles três ou quatro moças, bem moças e bem 
gentis, com cabelos muito pretos, compridos, pelas espáduas; e suas 
vergonhas tão altas e tão cerradinhas e tão limpas das cabeleiras que de 
as nós muito bem olharmos não tínhamos nenhuma vergonha. 
[..] 
Chantada a Cruz, com as armas e a divisa de Vossa Alteza, que 
primeiramente lhe pregaram, armaram altar ao pé dela. Ali disse missa o 
Padre Frei Henrique, a qual foi cantada e oficiada por esses já ditos. Ali 
estiveram conosco a ela obra de cinqüenta ou sessenta deles assentados 
todos de joelhos, assim como nós. 
E quando veio ao Evangelho, que nos erguemos todos em pé, com as 
mãos levantadas, eles se levantaram conosco e alçaram as mãos, ficando 
assim, até ser acabado; e então tornaram-se a sentar como nós. E quando 
levantaram a Deus, que nos pusemos de joelhos, eles se puseram assim 
todos, como nós estávamos com as mãos levantadas, e em tal maneira 
sossegados, que, certifico a Vossa Alteza, que nos fez muita devoção. 
E, segundo o que a mim e a todos pareceu, esta gente não lhes falece 
outra coisa para ser toda cristã, senão entendermos porque assim 
tomavam aquilo que nos viam fazer, como nós mesmo, por onde nos 
pareceu a todos que nenhuma idolatria nem adoração têm. E bem creio 
que, se Vossa Alteza aqui mandar quem entre eles mais devagar ande, 
que todos serão tornados ao desejo de Vossa Alteza. E por isso, se alguém 
vier, não deixe logo de vir clérigo para os batizar, porque já então terão 
mais conhecimentos de nossa fé, pelos dois degredados, que aqui entre 
eles ficam, os quais hoje também comungaram ambos. 
Esta terra, Senhor, me parece que da ponta que mais contra o sul 
vimos até outra ponta que contra o norte vem, de que nós deste porto 
houvemos vista, será tamanha que haverá nela bem vinte ou vinte e cinco 
léguas por costa. Tem, ao longo do mar, nalgumas partes, grandes 
barreiras, delas vermelhas, delas brancas, e a terra por cima toda chã e 
muito cheia de grandes arvoredos. De ponta a ponta, é tudo praia-palma, 
muito chã e muito formosa. 
Pelo sertão nos pareceu, vista do mar, muito grande, porque, a 
estender olhos, não podíamos ver senão terra com arvoredos, que nos 
parecia muito longa. 
Nela, até agora, não pudemos saber que haja ouro, nem prata, nem 
coisa alguma de metal ou ferro; nem lho vimos. Porém a terra em si é de 
muitos bons ares, assim frios e temperados, como os de Entre-Doiro e 
Minho, porque neste tempo de agora os achávamos como os de lá. 
Águas são muitas, infindas. E em tal maneira é graciosa que, 
querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem. 
http://www.triplov.com/hist_fil_ciencia/pero_vaz_caminha/index.htm 
 
 
3 Termo derivado Éden, segundo a Bíblia, jardim onde Deus colocou o 
primeiro homem e a primeira mulher; sinônimo de “paradisíaca”. 
A carta de Caminha, certidão de nascimento do nosso país, é um 
texto corrido, composto por começo, meio e fim, que se insere no 
gênero de literatura de viagens. A partir da ingênua observação 
que faz sobre a terra e o homem, Caminha deixa transparecer sua 
ideologia mercantilista, moldada a partir de uma cristandade ainda 
medieval. Sobre ela, Massaud Moisés comenta: 
[...] Percebe-se (...) que não se limitou a um reconto frio e impessoal; 
ao contrário, certa veemência percorre-lhe as palavras, como se o 
entusiasmo provocado pelas novidades contempladas lhe transformasse 
o estilo e, por isso mesmo, a maneira de ver o mundo. Dir-se-ia que o 
literato que nele existia, latente ou não, vem à tona, mercê do 
deslumbramento perante a visão edênica oferecida pela terra 
desconhecida. Daí a descrição, fluentemente literária, do gentio e uma 
narração de igual teor, centrada na entrevista que o aborígene concede 
aos navegantes. (...) Parece que o cronista não resiste à tentação de 
inocular no registro oficial sua agitação íntima em face do espetáculo 
insólito que presencia. (...) A vivacidade resultante, a indiscriminação dos 
pormenores a fixar (...), a “paixão” pelo indígena, que prenunciava, 
involuntariamente, o “bom selvagem” de Rosseau, o elogio da terra, que 
inaugurava o mito ufanista, ainda hoje vivo – constituem outros aspectos 
dignos de nota neste documento que fundava, extasiadamente, nossa 
literatura. 
Massaud Moisés, A Literatura Brasileira através dos Textos. 21 ed, 
São Paulo: Cultrix, 1998, p. 18-19 
 
Podemos considerar, portanto, que o primeiro contato do 
colonizador com a nova terra traz sobre ela uma visão edênica3, 
repleta de deslumbramento, a qual não se manteve durante todo 
o século XVI. Num segundo momento, o lugar passou a ser visto 
como um antro de desordem repleto de seres imorais. Muitos 
cronistas enxergavam os índios como bichos, defendiam que 
eram animais e que, portanto, não tinham alma. Foram os jesuítas, 
no intuito de defender a ideia do índio como um ser humano, que 
se preocuparam com a catequização desse povo e, também, os 
responsáveis por iniciar um processo de aculturação do índio, 
tema este que discutiremos na ágora deste caderno. 
Autores modernos utilizaram-se da literatura de informação para 
(re)construir a nossa visão sobre a história do Brasil, de forma 
irônica ou crítica. Veja os poemas a seguir. 
 
Texto I 
As meninas da gare 
 
Eram três ou quatro moças bem moças e bem gentis 
Com os cabelos mui pretos pelas espáduas 
E suas vergonhas tão altase tão saradinhas 
Que de nós as muito olharmos 
Não tínhamos nenhuma vergonha. 
Oswald de Andrade 
 
Texto II 
 
Mostraram-lhes uma galinha 
Quase haviam medo dela 
E não queriam por a mão 
E depois a tomaram como espantados 
Oswald de Andrade 
 
Texto III 
Carta de Pero Vaz 
 
A Terra é mui graciosa, 
Tão fértil eu nunca vi. 
A gente vai passear, 
No chão espeta um caniço, 
No dia seguinte nasce 
Bengala de castão de oiro. 
Tem goiabas, melancias, 
Banana que nem chuchu. 
Quanto aos bichos, tem-nos muitos, 
De plumagens mui vistosas. 
 
Profª. Cristiane 
Literatura 
 
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Tem macaco até demais. 
Diamantes tem à vontade, 
Esmeralda é para os trouxas. 
Reforçai, Senhor, a arca, 
Cruzados não faltarão, 
Vossa perna encanareis, 
Salvo o devido respeito. 
Ficarei muito saudoso 
Se for embora daqui. 
Murilo Mendes 
 
2. Literatura Jesuítica 
 
Os jesuítas chegaram no Brasil com a frota de Tomé de Sousa em 
1549 e fundaram colégios No Rio de Janeiro, Bahia e Pará. 
Desenvolveram um ensino catequético de cunho medievalizante e 
propiciaram o surgimento de um clima cultural ente nós. A poesia 
e o teatro, de caráter catequético e pedagógico, são o que havia 
de mais estético em sua produção e mesclavam dogmas católicos 
a costumes indígenas, para que verdades cristãs fossem 
gradativamente sendo inseridas na cultura nativa. Os maiores 
nomes desse gênero são os padres Manuel da Nóbrega, Fernão 
Cardim e José de Anchieta, este último também responsável por 
escrever a primeira gramática do Tupi. Vejamos, no trecho a 
seguir, composto em redondilhas, o tratamento do desengano do 
mundo segundo uma visão alegre e esperançosa, cuja consolação 
única parece ser o amor divino. 
 
Do pé do sacro monte 
Meus olhos levantando 
Ao alto cume, 
Vi estar aberta a fonte 
Do verdadeiro lume, 
Que as trevas do meu peito 
Todas consume. 
Correm doces licores 
Das grandes aberturas 
Do penedo. 
Levantam-se os errores, 
Levanta-se o degredo 
E tira-se a amargura 
Do fruto azedo. 
Padre José de Anchieta in Alfredo Bosi, op. cit, p. 24 
 
É interessante notarmos o quanto a literatura jesuítica e a literatura 
de informação se interpenetram de tal modo que acabam 
adquirindo características comuns: ambas orientam para o 
conhecimento da terra e do homem que aqui vivia e para a 
educação do “gentio” e do colono analfabeto. O intuito sempre fora 
o mesmo: servir aos fins da Companhia de Jesus. Assim, explica-
se o motivo da arte desinteressada e doutrinária. 
____________________________________________________ 
 
Exercícios 
 
1. (F.M. Triângulo Mineiro-MG) “Esta Província de Santa Cruz, 
além de ser tão fértil como digo, e abastada de todos os 
mantimentos necessários para a vida do homem, é certo ser 
também muito rica, e haver nela muito ouro e pedraria, de que se 
tem grandes esperanças.” 
Como demonstra o texto esse excerto, de Pero de Magalhães 
Gândavo, a literatura dos que aqui estiveram nos séculos XVI e 
XVII: 
a) procura indicar, com a maior exatidão possível e com verdadeiro 
espírito científico, as potencialidades econômicas do novo 
território. 
b) Mostra a atitude de superioridade e menosprezo com que o 
europeu encarava a nova terra e a selvageria dos habitantes. 
c) Constitui a primeira manifestação de sentimento nacionalista, 
que iria crescendo à medida que se desenvolvia a literatura 
brasileira. 
d) Adquiriu – não sendo propriamente ficção – inestimável valor 
documental, por transmitir a primeira visão da terra virgem, 
encarada, por isso mesmo, como um lendário paraíso perdido. 
e) Contém mais ficção – como consequência do espanto do 
descobrir diante das novas terras – do que propriamente 
informação. 
 
2. (UFSM) Sobre a literatura produzida no primeiro século da vida 
colonial brasileira, é correto afirmar que: 
a) É formada principalmente de poemas narrativos e textos 
dramáticos que visavam à catequese. 
b) Inicia com Prosopopeia, de Bento Teixeira. 
c) É constituída por documentos que informam acerca da terra 
brasileira e pela literatura jesuítica. 
d) Os textos que a constituem apresentam evidente preocupação 
artística e pedagógica. 
e) Descreve com fidelidade e sem idealizações a terra e o homem, 
ao relatar as condições encontradas no Novo Mundo. 
 
3. (UFV) Leia a estrofe abaixo e faça o que se pede: 
 
Dos vícios já desligados 
nos pajés não crendo mais, 
nem suas danças rituais, 
nem seus mágicos cuidados. 
(ANCHIETA, José de. O auto de São Lourenço [trad. e adap. 
 de Walmir Ayala] Rio de Janeiro: Ediouro[s.d.]p. 110) 
 
Assinale a afirmativa verdadeira, considerando a estrofe acima, 
pronunciada pelos meninos índios em procissão: 
a) Os meninos índios representam o processo de aculturação em 
sua concretude mais visível, como produto final de todo um 
empreendimento do qual participaram com igual empenho a 
Coroa Portuguesa e a Companhia de Jesus. 
b) A presença dos meninos índios representa uma síntese perfeita 
e acabada daquilo que se convencionou chamar de literatura 
informativa. 
c) Os meninos índios estão afirmando os valores de sua própria 
cultura, ao mencionar as danças rituais e as magias praticadas 
pelos pajés. 
d) Os meninos índios são figuras alegóricas cuja construção como 
personagens atende a todos os requintes da dramaturgia 
renascentista. 
e) Os meninos índios representam a revolta dos nativos contra a 
catequese trazida pelos jesuítas, de quem querem libertar-se tão 
logo seja possível. 
 
4. (UFSM) O Quinhentismo, enquanto manifestação literária, pode 
ser definido como uma época em que: 
 
I – não se pode falar, ainda, na existência de uma literatura 
brasileira, pois a cultura portuguesa estabelecia as formas de 
pensamento e expressão para os escritores na colônia; 
II – se pode falar na existência de uma literatura brasileira porque, 
ao descreverem o Brasil, os textos mostram um forte instinto de 
nacionalidade, na medida em que todos os escritores eram nativos 
da terra; 
III – a produção escrita se prende à descrição da terra e do índio 
ou a textos escritos pelos jesuítas, ou seja, uma produção 
informativa e doutrinária. 
 
Está(ão) correta(s): 
a) Apenas I. 
b) Apenas II. 
c) Apenas I e III. 
d) Apenas II e III. 
e) Apenas III. 
 
 
Profª. Cristiane 
Literatura 
 
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5. (Cefet/RJ) “A feição deles é serem pardos, maneira de 
avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam 
nus, sem nenhuma cobertura. Nem estima nenhuma coisa cobrir 
nem mostrar suas vergonhas; e estão acerca disso com tanta 
inocência como têm em mostrar o rosto. (...) Porém a terra em si 
é de muito bons ares, (...). E em tal maneira é graciosa que, 
querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo, por bem das águas que 
tem.” 
O texto acima apresenta fragmentos: 
a) do “Diálogo sobre a conversão dos gentios”, do Pe. Manuel da 
Nóbrega. 
b) das “Cartas” dos missionários jesuítas, escritas nos dois 
primeiros séculos. 
c) da “Carta” de Pero Vaz de Caminha a El-Rey D. Manuel, 
referindo-se ao descobrimento de uma nova terra e às primeiras 
impressões do aborígene. 
d) da “Narrativa Epistolar e os Tratados da Terra e da Gente do 
Brasil”, do jesuíta Fernão Cardim. 
e) do “Diário de Navegações”, de Pero Lopes de Souza, escrivão 
do primeiro colonizador, o de Martim Afonso de Souza. 
 
6. (FUVEST) Entende-se por literatura informativa no Brasil: 
a) o conjunto de relatos de viajantes e missionários europeus, 
sobre a natureza e o homem brasileiros. 
b) a história dos jesuítas que aqui estiveram no século XVI. 
c) as obras escritas com a finalidade de catequese do indígena. 
d) os poemas do Padre José de Anchieta. 
e) os sonetos de Gregório de Matos 
 
7. (UFPA) Quanto ao sentimento nativista das primeiras 
manifestações literárias feitas no Brasil: 
a) é um sentimento de apego aos valores culturais portugueses, 
conforme se vê nos poemas de Anchieta. 
b) consiste na propagação da mentalidade colonial portuguesa, 
sobre o que giram os poemas de Gregório de Matos. 
c) aobra dos cronistas viajantes representa o apogeu deste 
sentimento. 
d) é um sentimento tênue de apego à terra brasileira que, mais 
tarde, irá desaguar no nacionalismo do Romantismo. 
e) só se observa nos poetas árcades devido ao seu envolvimento 
na inconfidência Mineira. 
 
8. (UFPE) “Se suas cartas não apresentam valor literário 
reconhecível, os demais aspectos da obra do missionário – um 
representado por criações literárias com objetivo pedagógico em 
relação à catequese, outro por criações desinteressadas – devem 
ser literariamente valorizados, sobretudo o teatro em verso”. 
O texto refere-se aos textos produzidos no século XVI por: 
a) José de Anchieta. 
b) Pero Vaz de Caminha. 
c) Antônio Vieira. 
d) Bento Teixeira. 
e) Manuel da Nóbrega. 
 
9. (IFSP) Leia, abaixo, o fragmento da História da Província de 
Santa Cruz, de Pero de Magalhães Gândavo, para responder à 
questão. 
 
Finalmente que como Deus tenha de muito longe esta terra dedicada 
à cristandade, e o interesse seja o que mais leva os homens trás si que 
nenhuma outra coisa haja na vida, parece manifesto querer entretê-los na 
terra com esta riqueza do mar até chegarem a descobrir aquelas grandes 
minas que a mesma terra promete, para que assim desta maneira tragam 
ainda toda aquela bárbara gente que habita nestas partes ao lume e ao 
conhecimento da nossa santa fé católica, que será descobrir-lhe outras 
minas maiores no céu, o qual nosso Senhor permita que assim seja, para 
glória sua, e salvação de tantas almas. 
GÂNDAVO, Pero de Magalhães. História da Província de Santa Cruz. Org. 
Ricardo Martins Valle. Introd. e notas Ricardo Martins Valle e Clara Carolina 
Souza Santos. São Paulo: Hedra, 2008. p. 115. 
 
A leitura atenta do texto permite afirmar que 
a) nos textos de informação estavam consorciados o projeto de 
exploração das novas terras descobertas e o de difusão da fé 
cristã. 
b) o autor julga desinteressante a perspectiva de exploração 
mercantil do Brasil, preferindo a ela o projeto de difusão da fé 
cristã. 
c) o autor condena os homens ambiciosos e interesseiros, que 
preferem a exploração mercantil ao projeto abnegado de difusão 
da fé cristã. 
d) o autor condena a hipocrisia dos que afirmam empreender em 
nome da fé cristã, mas que apenas se interessam pelas “grandes 
minas” a descobrir. 
e) havia discrepância e dissenso entre o projeto de exploração das 
novas terras descobertas e o de difusão da fé cristã. 
 
10. (UFSM) A Carta de Pero Vaz de Caminha é o primeiro relato 
sobre a terra que viria a ser chamada de Brasil. Ali, percebe-se 
não apenas a curiosidade do europeu pelo nativo, mas também 
seu pasmo diante da exuberância da natureza da nova terra, que, 
hoje em dia, já se encontra degradada em muitos dos locais 
avistados por Caminha. 
Tendo isso em vista, leia o fragmento a seguir. 
 
Esta terra, Senhor, parece-me que, da ponta que mais contra o sul 
vimos, até outra ponta que contra o norte vem, de que nós deste ponto 
temos vista, será tamanha que haverá nela bem vinte ou vinte e cinco 
léguas por costa. Tem, ao longo do mar, em algumas partes, grandes 
barreiras, algumas vermelhas, outras brancas; e a terra por cima é toda 
chã e muito cheia de grandes arvoredos. De ponta a ponta é tudo praia 
redonda, muito chã e muito formosa. 
Pelo sertão nos pareceu, vista do mar, muito grande, porque a 
estender d’olhos não podíamos ver senão terra com arvoredos, que nos 
parecia muito longa. 
Nela até agora não pudemos saber que haja ouro, nem prata, nem 
coisa alguma de metal ou ferro; nem o vimos. Porém a terra em si é de 
muito bons ares, assim frios e temperados como os de Entre-Douro e 
Minho, porque neste tempo de agora os achávamos como os de lá. 
As águas são muitas e infindas. E em tal maneira é graciosa que, 
querendo aproveitá-la, tudo dará nela, por causa das águas que tem. 
CASTRO, Sílvio (org.). A Carta de Pero Vaz de Caminha. 
Porto Alegre: L&PM, 2003, p. 115-6. 
 
Esse fragmento apresenta-se como um texto 
a) descritivo, uma vez que Caminha ocupa-se em dar um retrato 
objetivo da terra descoberta, abordando suas características 
físicas e potencialidades de exploração. 
b) narrativo, pois a “Carta” é, basicamente, uma narração da 
viagem de Pedro Álvares Cabral e sua frota até o Brasil, relatando, 
numa sucessão de eventos, tudo o que ocorreu desde a chegada 
dos portugueses até sua partida. 
c) argumentativo, pois Caminha está preocupado em apresentar 
elementos que justifiquem a exploração da terra descoberta, os 
quais se pautam pela confiabilidade e abrangência de suas 
observações. 
d) lírico, uma vez que a apresentação hiperbólica da terra por 
Caminha mostra a subjetividade de seu relato, carregado de 
emotividade, o que confere à “Carta” seu caráter especificamente 
literário. 
e) narrativo-argumentativo, pois a apresentação sequencial dos 
elementos físicos da terra descoberta serve para dar suporte à 
ideia defendida por Caminha de exploração do novo território. 
 
 
____________________________________________________ 
 
Gabarito 
 
1. d) 2. c) 3. a) 
 
4. c) 5. c) 6. a) 
 
7. d) 8. a) 9. a) 
 
10. a)

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