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SOCIOLOGIA COM VIVIANE CATOLÉ 1 2 SOCIOLOGIA COM VIVIANE CATOLÉ SOCIALIZAÇÃO E CONTROLE SOCIAL O homem, mais do que formador da sociedade, é um produto dela. O conceito de controle social nasce junto com a Sociologia como ciência. Trata-se de mecanismos de intervenção de uma sociedade ou grupo social utilizados para que os indivíduos se comportem de maneira desejável, de acordo com as regras sociais. Por meio de recursos materiais e simbólicos, aqueles que governam sobre o grupo controlado influenciam o modo de pensar, de ser, valores e crenças dos indivíduos, com o objetivo de manter determinado ordenamento social. Socialização O conceito de socialização surgiu para explicar de que maneira as pessoas se tornam seres sociais, ou seja, um “alguém” dentro de um grupo. Toda sociedade precisa ensinar sua língua, seus valores, seus costumes, seus pensamentos para quem nasce dentro dela. Nessa perspectiva, um indivíduo socializado é aquele que é reconhecido como um membro legítimo dessa sociedade. Uma vez que todas as pessoas passam por isso, raramente percebemos quando estamos sendo socializados. E, na verdade, a todo momento a socialização está acontecendo. Veremos a seguir como esse processo ocorre. A Sociologia se tornou uma disciplina científica oficialmente com Durkheim, no século XIX. Foi esse mesmo autor que desenvolveu o conceito de “socialização”, que, por sua vez, pode ser considerada fundamental em sua teoria sobre a sociedade. Durkheim pensava a sociedade como uma coisa, ou seja, como algo exterior e maior em relação às pessoas individualmente. Pensar o fenômeno social não se trata, para Durkheim, de falar de um indivíduo ou outro, mas de um todo coerente que é a sociedade. Isso permitiu que a Sociologia se tornasse uma ciência porque definiu o seu objeto de estudo: a sociedade. Falar desse pensamento de Durkheim é importante porque, para ele, é a sociedade que realiza essa socialização. E nenhum indivíduo pode escolher ser ou não socializado. Todos são socializados porque, independentemente das vontades próprias, as pessoas são ensinadas a comer, a gesticular, a falar, a andar. Ninguém escapa dessa coisa – a sociedade – e, portanto, ninguém escapa da socialização. Esse é o caráter coercitivo do fenômeno social. E ser coercitivo não necessariamente significa que é forçado ou agressivo, mas que simplesmente não há outro caminho a não ser esse. A socialização, portanto, é um processo educativo. É o meio pelo qual uma sociedade torna cada indivíduo um ser social, à sua imagem. Essa abordagem da socialização mostra o caráter total da sociedade, explicando tanto os padrões quanto as exceções. Como Durkheim foi o primeiro sociólogo a desenvolver isso de maneira consistente, obviamente, depois dele muitas pesquisas foram realizadas. Muitas delas, hoje, refutam a ideia durkheimiana de sociedade. Entretanto, a importância desse conceito é inegável. A concepção de Durkheim de socialização se reflete em outras obras. Por exemplo, Anthrony Giddens define a socialização como: “[o processo de ensino em que seres indefesos se tornam] seres auto-conscientes, com saberes e capacidades, treinadas nas formas de culturas em que nasceram” Desde que nascemos, portanto, somos submetidos à socialização. As crianças humanas possuem um SOCIOLOGIA COM VIVIANE CATOLÉ 3 tempo de infância caracteristicamente grande em relação às outras espécies, o que permite, justamente, que elas sejam socializadas por maior tempo. Níveis de socialização A socialização é um processo que se estende ao longo de toda a vida. Entretanto, pelo menos nas sociedades ocidentais, ela não acontece da mesma maneira conforme um indivíduo envelhece. Há uma diferença entre socialização primária e secundária, portanto. Veremos essa diferença a seguir. Socialização primária A socialização primária são os primeiros processos educativos aos quais uma criança é submetida assim que nasce em uma sociedade. A primeira instituição social com que um bebê tem contato frequentemente é a família. Ela promove a socialização infantil. Com o pai, a mãe ou outros agentes, a criança é ensinada a viver em sociedade: aprende um idioma, aprende a andar, a comer… Todos esses comportamentos são específicos e necessários para o bebê crescer e ser reconhecido como uma pessoa entre outras. Além disso, é possível elencar a escola como uma insti- tuição socializadora. A socialização na escola desempenha um papel fundamental porque, nas sociedades ocidentais, as crianças passam uma boa parte de suas vidas juntas, separadas por idade e separadas da vida dos adultos. Portanto, a nossa sociedade define também o que é uma criança e como elas devem se comportar. Socialização secundária A socialização secundária diz mais respeito à fase adulta. É quando as pessoas seguem “nichos” diversos de grupos com os quais elas passam a ter mais contato. Por exemplo, na socialização organizacional, as pessoas têm empregos diferentes. Em cada tipo de trabalho, existe um grupo com dinâmicas próprias e formas de convivência diferentes de outros. Nesses espaços, todas as pessoas são socializadas para se comportarem adequadamente. Assim, o processo de socialização nunca se interrompe. Ele se estende na vida das pessoas porque todas elas vivem em sociedade e precisam ser reconhecidas enquanto seres sociais pelos seus pares. Socialização e sociabilização A socialização é um conceito próprio da Sociologia, sendo um objeto de pesquisa e reflexão dessa disciplina científica. Entretanto, quando se adentra em outros campos, alguns sentidos diferentes podem ser dados às palavras. Por exemplo, em estudos institucionais, políticos ou econômicos, socializar pode acabar tomando um sentido mais específico, de compartilhar, distribuir ou ampliar bens, vantagens e privilégios com um determinado grupo. Nesse contexto, sociabilizar acaba tendo um sentido mais amplo, de simplesmente ter contato social com outros indivíduos. De qualquer modo, socialização no sentido sociológico tem uma importância teórica de explicar a forma como as pessoas crescem e são reconhecidas dentro de uma sociedade. Conhecer essas acepções pode ser importante para dar relevância a essa distinção do conhecimento da Sociologia. Socialização e controle social Nossas sociedades dispõem de mecanismos para controlar nosso c o m p o r t a m e n t o de acordo com as normas e valores estabelecidos no meio social. Entende-se por controle social o conjunto de mecanismos de intervenção que cada sociedade ou grupo social possui e que são usados como forma de garantir a conformidade do comportamento dos indivíduos. Além disso, esses mesmos mecanismos servem como forma de intervenção diante das possíveis mudanças que porventura venham a se desenrolar no meio social. Nesse caso, as ferramentas de controle social induzem a conformidade do sujeito com a sua nova realidade, seja de forma positiva, seja 4 SOCIOLOGIA COM VIVIANE CATOLÉ de forma negativa. O filósofo político Noberto Bobbio, em sua definição de controle social, faz a distinção de dois tipos de forma de controle: as formas de controle externas e as formas de controle internas. A primeira forma de controle (externa) refere-se às ferramentas de intervenção direta que são acionadas quando o indivíduo não se dispõe à uniformidade do comportamento geral. Nesse ponto, são utilizadas sanções, punições ou outras formas de intervenção para garantir que o sujeito se submeta ao contexto. Como exemplo, podemos citar a polícia e as leis que ela deve garantir que sejam seguidas. Nesse sentido, a polícia tem o dever e o poder, legitimados pelo Estado, de garantir que as ações dos indivíduos não fujam às delimitações da lei. Tendo isso em mente, podemos afirmar que a polícia é apenas uma ferramenta de aplicação dos mecanismos de controle externo. As sanções e as punições, por exemplo, podem ser aplicadas pelo próprio grupo social ou sociedadeem que estamos inseridos. A exclusão social é o mais claro exemplo de sanção que uma sociedade pode infligir a alguém. Ao não nos vestirmos de acordo com o que se estabelece como aceitável, por exemplo, estamos todos sujeitos a julgamentos e podemos ser considerados agentes de subversão social. Ademais, a privação de direitos, interdições físicas ou mesmo a reclusão (aprisionamento) são todas formas de controle externas. Em contrapartida, a área de controle interna está associada àquilo que o meio social consegue interiorizar, isto é, tornar uma ideia, pensamentos ou qualquer outra característica parte da consciência de um indivíduo. Normas e valores específicos desse meio social, considerados indispensáveis para a própria ordem social, são introduzidos ao processo de construção da identidade do sujeito, que passa a delimitar suas ações de acordo com esse conjunto normativo. Como Bobbio esclarece, os controles internos são aqueles que não ameaçam uma pessoa externamente, mas agem por meio de sua própria consciência. Esse tipo de controle, no entanto, é dependente de um processo de socialização bem construído. Sendo essa socialização realizada de forma suficiente, o indivíduo passa a tornar-se vigia de seus próprios comportamentos. O filósofo e teórico social Michel Foucault (1926-1984) dedicou sua obra “Vigiar e Punir”(1999) ao entendimento das formas de controle social externas e internas. Segundo o autor, a construção do sujeito dócil, útil e submisso à ordem estabelecida é possível apenas por meio de processos “disciplinadores”, nos quais o corpo e a mente do sujeito são moldados de acordo com o que se pede no meio social. Para entender esse fenômeno, Foucault voltou-se para a observação de instituições disciplinadoras, como a escola e os quartéis, onde os indivíduos que ali permanecem vivem sob o controle da instituição. O produto desse processo, quando bem-sucedido, seria um sujeito dócil e “útil” ao seu contexto social. O controle social é, portanto, um conjunto entre formas externas de intervenção no comportamento do sujeito desviante (como o criminoso que é detido pela polícia) e um processo de construção de uma consciência guiada pelas regras e normas de uma sociedade. Essas formas de controle exercem força sobre a nossa individualidade, de forma que quase sempre delimitamos nossas ações de acordo com o que aprendemos ser certo ou errado. As regras do método sociológico – Émile Durkheim Sexo e temperamento em três sociedades primitivas – Margaret Mead O conceito de “socialização” caiu em desuso? Uma análise dos processos de socialização na infância com base em Georg Simmel e George H. Mead – Tamara Grigorowitschs Socialização e satisfação nos diferentes tipos de estágios – David José Nunes Relvas A influência da socialização primária na construção da identidade de gênero: percepções dos pais – Fernanda Ortiz Costa; Adriane Scomazzon Antoniazzi Para uma teoria da socialização – Pedro Abrantes A sociedade dos indivíduos – Norbert Elias