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FILOSOFIA COM VIVIANE CATOLÉ 1 2 FILOSOFIA COM VIVIANE CATOLÉ PÓS-MODERNIDADE (PARTE 2) Jacques Derrida: desconstrucionismo Um dos mais importantes filósofos do século XX, Jacques Derrida (1930-2004) nasceu em El-Biar, Argélia, antiga colônia francesa. A infância e a adolescência do intelectual, nascido no berço de uma família judia, foram vividos em meio à guerra e aos conflitos decorrentes da colonização. Fortemente influenciado por Sigmund Freud e Martin Heidegger, Jacques Derrida foi um dos mais importantes filósofos do pós-estruturalismo e pós- modernismo. Foi um dos pensadores franceses mais conhecidos internacionalmente, em particular nos Estados Unidos. Ali, a partir de 1956, lecionou nas universidades de Harvard, Yale e John Hopkins. Na França, ensinou na Sorbonne e na Escola Normal Superior. Jacques Derrida faleceu em 2004. Escreveu em torno de oitenta livros. Sua vasta obra abre um leque de inúmeros temas e esses são refletidos, hoje, em várias ciências. A psicanálise tinha uma importância central em sua obra. Para Derrida, a ideia freudiana do inconsciente revolucionara a filosofia e ele costumava citar o conceito freudiano de "posterioridade" ("Nachträglichkeit" ou "aprés-coup"). Segundo Freud, há a possibilidade de transformação do passado ao se dar um novo significado às recordações. Ao questionar os conceitos de verdade e de memória, Jacques entendia que Freud propunha um problema filosófico de magnitude inédita. Pensar é desconstruir. Derrida elaborou a teoria da desconstrução, que desafia a ideia de uma estrutura concreta e realça a noção de que não há estrutura. Pensar em Derrida é desconstruir. Foi o criador do método chamado de desconstrução. Segundo esse sistema, não se trata de destruir, e sim de decompor os elementos da escrita para descobrir partes do texto que estão dissimuladas. Essa metodologia de análise centra-se apenas nos textos. Em seguida, Derrida criou outros dois conceitos: a indecidibilidade, que mostra a impossibilidade de determinar aquilo que é forma no texto ou fundo ideológico; e o conceito de "diferença", que parte da análise semântica dos dois sentidos do infinito latino differre (diferir): o primeiro remete para o futuro (tempo); o segundo, para a distinção de algo criado pelo confronto. Deleuze “Vemos ao menos o que a filosofia não é: ela não é contemplação, nem reflexão, nem comunicação” – Deleuze & Guattari, O que é a Filosofia?, p. 12 Gilles Deleuze foi um renomado escritor e filósofo francês antirracionalista, nascido em 18 de Janeiro de 1925, em sua residência de vida Paris. O grande tema da filosofia de Gilles Deleuze é o pensamento. O exercício do pensamento e a possibilidade de novas formas de expressão do pensar percorrem toda a sua obra. Deleuze propõe lidar com a criação de conceitos e com a produção de acontecimentos que os atualizem no perpétuo jogo entre virtuais e atuais. O filósofo torce a concepção de desejo entrelaçado com as ideias de Nietzsche de vontade, de potência, inventando outros jeitos de ser, pensar e viver, intensamente atravessa- dos por acontecimentos, intensidades nesses FILOSOFIA COM VIVIANE CATOLÉ 3 acontecimentos como experimentações. Trabalha esse acontecimento como uma processualidade da formação. A filosofia a que se propõe, que defende e buscou praticar é então constituída por três instân- cias correlacionais: o plano de imanência que ela pre- cisa traçar, os personagens filosóficos que ela precisa inventar e os conceitos que deve criar. Portanto, uma filosofia é examinada, em sua concepção, o que nos invoca dimensões de praticidade, de experimentação, um alento pelo que ela produz e pelos efeitos que cau- sa. Os conceitos filosóficos são válidos à medida em que sejam verdadeiros, mas uma verdade regulada por interesses e importância. Mais, pelo que eles pro- vocam na prática e pela prática. Como nos deixamos atravessar, afetar e atravessamos a produção desses conceitos, dessas ideias-experimentação. Nesse pon- to, Deleuze nos instiga ao dizer, “não acredito naque- les que dizem ‘faça isso’; acredito naqueles que dizem ‘faça comigo’, enfim”. Também não se assumir como professor-profeta, que diz ao outro o que fazer e como fazer. Muito mais um professor militante, que, junto e a partir do de dentro, constrói coletivamente. É a esse Deleuze que nos referimos. Sociedade de Controle “As sociedades disciplinares são aquilo que estamos deixando pra trás, o que já não somos. Estamos entrando nas sociedades de controles, que funcionam não mais por confinamento, mas por controle contínuo e comunicação instantânea” – Deleuze, Conversações, 220 Num artigo intitulado "Post-Scriptum sobre as Sociedades de Controle", o filósofo Gilles Deleuze (1990) indicava alguns aspectos que poderiam distinguir uma sociedade disciplinar de uma sociedade de controle. As sociedades disciplinares podem ser situadas num período que vai do século XVIII até a Segunda Grande Guerra, sendo que os anos da segunda metade do século XX estariam marcados por seu declínio e pela respectiva ascensão da sociedade de controle. Seguindo as análises de Michel Foucault, Deleuze percebe no enclausuramento a operação fundamental da sociedade disciplinar, com sua repartição do espaço em meios fechados (escolas, hospitais, indústrias, prisão...) e sua ordenação do tempo de trabalho. Ele chamou esses processos de moldagem, pois um mesmo molde fixo e definido poderia ser aplicado às mais diversas formas sociais. Já a sociedade de controle seria marcada pela interpenetração dos espaços, por sua suposta ausência de limites definidos (a rede) e pela instauração de um tempo contínuo no qual os indivíduos nunca conseguiriam terminar coisa nenhuma, pois estariam sempre enredados numa espécie de formação permanente, de dívida impagável, prisioneiros em campo aberto. O que haveria aqui, segundo Deleuze, seria uma espécie de modulação constante e universal que atravessaria e regularia as malhas do tecido social. A sociedade de controle redimensiona e amplifica os pilares constituintes da sociedade disciplinar. Para Deleuze, a passagem de uma sociedade disciplinar a uma sociedade de controle tem como estratégia fundamental esvaziar a imagem da sua virtualidade, para a tornar pura informação, parte dos dispositivos de vigilância e monitorização. “A passagem da sociedade disciplinar à sociedade de controle se caracteriza, inicialmente, pelo desmorona- mento dos muros que definiam as instituições. Haverá, portanto, cada vez menos distinções entre o dentro e o fora. ” - Hardt, A Sociedade Mundial de Controle REFERÊNCIAS DELEUZE, Gilles. Conversações. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992. DELEUZE, G. Pourparlers Paris: Les Éditions de Minuit, 1990. FOUCAULT, M. Vigiar e Punir Petrópolis, RJ: Vozes, 1998. DERRIDA, Gramatologia, 1967. DERRIDA, Margens da Filosofia, 1972 4 FILOSOFIA COM VIVIANE CATOLÉ EXERCÍCIOS 1. (CEPERJ – 2013) Filosofia é questão de ideias. Entretanto, para alguns filósofos, ela é também questão de estilo. Gilles Deleuze pensava assim, e por isso dizia que “os grandes filósofos são também grandes estilistas", como fez na entrevista do livro Conversações, dedicada exclusivamente ao tema da filosofia. Nessa entrevista, o pensador francês define, ainda, que tal estilo em filosofia é: a) a comunicação elegante b) a beleza da contemplação. c) o processo da reflexão. d) a quietude da linguagem e) o movimento do conceito 2.(UNIMONTES - 2013) Deleuze e Guattari entendem a filosofia como possibilidade de instauração do caos. Nesse sentido, a filosofia é capaz de criticar a si mesma e também às outras formas de pensar e agir. Com relação à filosofia, podemos afirmar: a) A filosofia não é um conhecimento absoluto e não permite uma atitude crítica sobre todos os saberes. A filosofia impõe verdades e não permite que se re- criem os espaços de discussões. b) filosofia não é um conhecimento exato, uma atitude desprovidade crítica sobre todos os saberes. A filosofia não impõe verdades, mas cria e recria constantemente espaços de discussões. c) A filosofia não é um conhecimento acabado, mas uma atitude crítica sobre todos os saberes. A filosofia não impõe verdades, mas cria e recria constantemente espaços de discussões. d) A filosofia não é um conhecimento, mas uma atitude dogmática sobre todos os saberes. A filosofia impõe verdades e exclui as pessoas dos espaços de discussões. 3. (UNICENTRO-2019) ‘’A questão da Filosofia é o ponto singular em que o conceito e a criação se remetem um ao outro.” (Gilles Deleuze) Analisando o a afirmação de Gilles Deleuze e com base nos conhecimentos sobre Filosofia, pode-se afirmar que a essa ciência a) é um ato puramente racional em que a existência e a mente humana estão completamente dissociados. b) conclui pela impossibilidade do conhecimento, quer na forma moderada de suspensão do juízo, quer na radical recusa em formular qualquer conclusão. c) se apega à certeza de uma doutrina e, por conseguinte, sua contribuição específica se coloca ao serviço da verdade, do rigor e objetividade. d) sempre se confronta com o poder e sua investigação não fica alheia à ética e à política. e) busca resultados imediatos do conhecimento, superando a situação apresentada. 4. Vunesp 2011 TEXTO I No ano de 1990, o filósofo Gilles Deleuze criou o conceito de “sociedade do controle” para explicar a configuração totalitária das sociedades atuais. Na sociedade de controle, as pessoas têm a ilusão de desfrutarem de maior autonomia, pois podem, por exemplo, acessar contas correntes pela Internet. Mas, por outro lado, seus comportamentos e hábitos de consumo podem ser conhecidos pelo governo, pelos bancos e grandes empresas. Sem suspeitarem disso, os indivíduos podem ser controlados à distância, como se cada um fosse dotado de uma “coleira eletrônica”. TEXTO II Um quarto dos alemães aceitam implantar chip no corpo Pesquisa feita pela Associação Alemã das Empresas de Informação, Telecomunicação e Novas Mídias (Bitkom) revela que 23% dos moradores do país topam ter um microhip inserido no próprio corpo, contanto que isso traga benefícios concretos a eles. O levantamento, realizado com cerca de mil pessoas de várias cidades, foi divulgado na feita de tecnologia de Cebit, que vai até o próximo sábado (7) em Hannover. (Folha online, 03.03.2010) Com base no conceito de sociedade de controle e na notícia reproduzida, assinale a alternativa correta a) Os resultados da pesquisa atestam a inadequação do conceito proposto pelo filósofo francês e pelas reflexões sobre as sociedades atuais, pois o conceito está defasado vinte anos em relação a notícia da pesquisa. b) Os resultados da pesquisa atestam o grau em FILOSOFIA COM VIVIANE CATOLÉ 5 que os parâmetros da sociedade de controle foram internalizados pelos indivíduos. c) De acordo com o filósofo francês, os acessos informatizados garantem o aumento da autonomia dos indivíduos. d) O conceito de sociedade de controle tem sua aplicação restrita a sociedades governadas por ditaduras, não podendo ser aplicado s reflexões sobre a sociedade democráticas. e) O neoliberalismo, tal como o liberalismo, defende a li- berdade do indivíduo como prioridade, o que se expres- sa por facilidades de trânsitos entre países, diminuição de burocracia alfandegária e incentivo a migração. 5. (Pucpr 2010) Na sua obra Vigiar e punir, o filósofo francês Michel Foucault analisa as novas faces de exercício do poder disciplinar e afirma: “Muitos processos disciplinares existiam há muito tempo: nos conventos, nos exércitos, nas oficinas também. Mas as disciplinas se tornaram no decorrer dos séculos XVII e XVIII fórmulas gerais de dominação. (...) O momento histórico das disciplinas e o momento em que nasce uma arte do corpo humano, que visa não unicamente ao aumento de suas habilidades, nem tampouco aprofundar sua sujeição, mas a formação de uma relação que no mesmo mecanismo o torna tanto mais obediente quanto é mais útil, e inversamente. Forma-se então uma política das coerções que são um trabalho sobre o corpo, uma manipulação calculada de seus elementos, de seus gestos, de seus comportamentos. O corpo humano entra numa maquinaria de poder que o esquadrinha, o desarticula e o recompõe. Uma “anatomia política”, que é também igualmente uma “mecânica do poder”, está nascendo; ela define como se pode ter domínio sobre o corpo dos outros, não simplesmente para que façam o que se quer, mas para que operem como se quer, com as técnicas, segundo a rapidez e a eficácia que se determina. A disciplina fabrica assim corpos submissos e exercitados, corpos “dóceis”. (Vigiar e Punir, p. 118). Segundo essa passagem, seria correto afirmar que: I. O texto mostra como, a partir dos séculos XVII e XVIII o corpo foi descoberto como objeto e alvo de um novo poder e de novas formas de controle, pelas quais são superadas antigas formas de domínio e instaurado um novo modelo com o fim de tornar os corpos mais dóceis. II. O fim dessas práticas é tornar o corpo obediente e disciplinado através de um rigoroso exercício de controle sobre gestos e comportamentos. É assim que o corpo vira um novo objeto de poder. III. Segundo o autor, essa é a primeira vez na história que o corpo se tornara objeto de poder, já que essas práticas eram comuns tanto nos regimes escravocratas quanto nos monásticos. IV. Esses novos mecanismos de controle têm, segundo o autor, uma única motivação: o domínio do corpo para exploração econômica. a) Apenas as assertivas I e III são verdadeiras. b) Apenas as assertivas I e II são verdadeiras. c) Apenas a assertiva IV é verdadeira. d) Todas as assertivas são verdadeiras. e) Apenas a assertiva I é verdadeira. 6.(Escola Stª Dorotéia-RS -Adaptado) Só se pode entender o que é a filosofia, a que ponto ela não é uma coisa abstrata – da mesma forma que um quadro ou uma obra musical não são absolutamente abstratos –, só através da história da filosofia, com a condição de concebê-la corretamente. (...) Há uma coisa que me parece certa: um filósofo não é uma pessoa que apenas contempla e também não é alguém que apenas reflete. Um filósofo é alguém que também cria. Só que ele cria um tipo de coisa muito especial, ele cria conceitos. Os conceitos não nascem prontos, não andam pelo céu, não são estrelas, não são contemplados. É preciso criá-los, fabricá-los em função dos problemas que são constituídos, problemas que o pensamento enfrenta e que têm um sentido. [Em suma,] fazer filosofia é constituir problemas que têm um sentido e criar os conceitos que nos fazem avançar na compreensão e na solução dos problemas”. Gilles Deleuze. Abaixo temos algumas afirmações sobre o texto de Gilles Deleuze sobre a história e o papel da filosofia. Uma destas afirmações está INCORRETA. Qual é? a) Para Deleuze a tarefa do filósofo também é criativa. b) Conforme a concepção de Deleuze cabe à filosofia constituir problemas que têm um sentido e criar os conceitos que nos fazem avançar na compreensão e na solução dos problemas c) Deleuze retira por completo do filósofo o direito à reflexão sobre o mundo ou sobre o que os outros 6 FILOSOFIA COM VIVIANE CATOLÉ filósofos da história pensaram. d) A filosofia é uma atividade criativa, assim como a arte, no entanto o que ela cria são conceitos 7. CEPERJ-2013 Filosofia é questão de ideias. Entre- tanto, para alguns filósofos, ela é também questão de estilo. Gilles Deleuze pensava assim, e por isso dizia que “os grandes filósofos são também grandes esti- listas”, como fez na entrevista do livro Conversações, dedicada exclusivamente ao tema da filosofia. Nessa entrevista, o pensador francês define, ainda, que tal estilo em filosofia é: a) a comunicação elegante b) a beleza da contemplação. c) o processo da reflexão. d) a quietude da linguagem e) o movimento do conceito 8. (Enem 2021) É certo que entramos na era das sociedades de“controle”. Elas já não são exatamente sociedades disciplinares, cuja técnica principal é o confinamento (não somente o hospital e a prisão, mas também a escola, a fábrica, o quartel). A sociedade de controle não funciona por confinamento, mas por controle contínuo e comunicação instantânea. É evidente que não deixamos de falar de prisão, de escola, de hospital: mas essas instituições estão em crise. DELEUZE, G. Entrevista a Toni Negri. In: O devir revolucionário e as criações políticas. Novos Estudos Cebrap, n. 28, out. 1990 (adaptado). No trecho, ao problematizar as sociedades contempo- râneas, Gilles Deleuze está enfatizando a ausência de a) legitimidade nas redes de informação. b) autonomia nas ações individuais. c) sanções no ordenamento jurídico. d) padrões na sociedade de consumo. e) inovações nos sistemas educacionais. Gabarito: 1:[E]; 2:[D]; 3:[B]; 4:[C]; 5:[B]; 6:[C]; 7:[E]; 8:[B] Anotações: