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Manual de Farmacologia - Rafael Escada pdf · versão 1

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Manual de
Farmacologia
 
 
 
 
D�. R����� E�����
 
 
 
 
Nota da Editora: A área da saúde é um campo em
constante mudança. As normas de segurança
padronizadas precisam de ser obdecidas; contudo, à
medida que as novas pesquisas ampliam nossos
conhecimentos, tornam-se necessárias e modificações 
adequadas. O autor desta obra verificou cuidadosamente
os nomes genéricos das peças mencionadas, bem como
conferiu os dados, de modo que as informações fossem
precisas e de acordo com os padrões aceitos por ocasião
da publicação. Todavia, os leitores devem prestar atenção
às novas informações , a fim de se certificarem de que o
padrão não sofreu alterações. Isso é importante, sobretudo
em relação a informações novas ou que aparecem com
pouca frequência. O autor e a editora não podem ser
responsabilizados pelo uso impróprio ou pela aplicação
incorreta do produto apresentado nesta obra. O autor e a
editora empenharam-se para citar adequadamente e dar o
devido crédito a todos os detentores dos direitos autorais
de qualquer material utilizado neste livro, dispondo-se a
possíveis acertos cado, inadvertidamente a identificação de
algum deles tenha sido omitida.
 
Nome do livro: Manual de Farmacologia
Autor: Rafael Escada
Ano: 2020
Direitos exclusivos para a língua portuguesa
Copyright© 2020 por Carpe Noctem
Reservado todos os direitos.
Esta publicação não pode ser reproduzida, nem
transmitida, no todo ou em parte, por qualquer processo
eletrónico, mecânico, fotocópia, digitalização, gravação,
sistema de armazenamento e disponibilização de
informação, sítio web, blogue ou outros, sem prévia
autorização escrita da Editora.
 
 
 
Índice
 
 
 
Princípios gerais de farmacologia
 
 
Farmacodinamia
 
 
Farmacocinética
 
 
 
 
Fármacos com acção no sistema nervoso autónomo
e central
 
 
Introdução ao estudo dos fármacos colinérgicos
 
 
Fármacos de acção colinérgica:
parassimpaticomiméticos
 
 
Fármacos de acção colinérgica: antagonistas dos
receptores muscarínicos
 
 
Fármacos de acção colinérgica: antagonistas dos
receptores nicotínicos
 
 
Introdução ao estudo do sistema adrenérgico
 
 
Fármacos de acção adrenérgica: simpaticomiméticos
 
 
Fármacos de acção adrenérgica: bloqueadores
adrenérgicos
 
 
Fármacos que interferem com a transmissão 5-
hidroxitriptaminérgica
 
 
Sistema opiáceo endógeno
 
 
Fármacos com acção nos receptores opiáceos
 
 
Cannabis e canabinóides
 
 
Etanol
 
 
Fármacos com acção no sistema endócrino
 
 
Estrogénios, progestagénios e androgénios
 
 
Hormonas tiroideias
 
 
Retinóides
 
 
Vitamina D
 
 
Anti-diabéticos
 
 
Anti-bacterianos
 
 
Introdução ao estudo dos antibióticos β -lactâmicos
 
 
Penicilinas
 
 
Cefalosporinas
 
 
Outros β -lactâmicos
 
 
Inibidores das β -lactamases
 
 
Tetraciclinas
 
 
Aminoglicosídeos
 
 
Quinolonas
 
 
Macrólidos
 
 
Inibidores da síntese de folatos
 
 
Cloranfenicol
 
 
Estreptograminas
 
 
Oxazolidinonas
 
 
Lincosamidas
 
 
Nitroimidazoles
 
 
Antibióticos peptídicos
 
 
Outros anti-bacterianos
 
 
Anti-tuberculosos
 
 
Tabelas-síntese de anti-bacterianos por
microorganismo
 
Fármacos com acção no sistema nervoso central
 
 
Anti-depressores e ansiolíticos
 
 
Tranquilizantes
 
 
Farmacoterapia da epilepsia
 
 
Anti-parkinsonianos
 
 
Anti-psicóticos
 
 
Terapia da doença bipolar
 
 
Histamina e anti-histamínicos
 
 
Sistema purinérgico
 
 
Fármacos com acção no sistema cardiovascular e
renal
 
 
Anti-arrítmicos
 
 
Farmacoterapia da doença cardíaca isquémica
 
 
Terapia da insuficiência cardíaca congestiva
 
 
Terapia da hipertensão
 
 
Sistema da endotelina
 
 
Sistema das cininas
 
 
Sistema renina-angiotensina-aldosterona
 
 
Diuréticos
 
 
Fármacos que interferem com a hemóstase
 
 
Anti-inflamatórios e imunomoduladores
 
 
Corticosteróides
 
 
Anti-inflamatórios não-esteróides
 
 
Análogos das prostaglandinas e antagonistas dos
leucotrienos
 
 
Farmacoterapia da gota
 
 
Imunomoduladores
 
 
Anticorpos anti-neoplásicos
 
 
Anti-víricos
 
 
Agentes anti-víricos
 
 
Agentes anti-retrovíricos
 
 
 
 
 
Farmacodinamia
 
Em termos muito genéricos, a farmacodinamia pode ser entendida
como a ciência que estuda o modo como um determinado fármaco
actua num organismo vivo. Ora, na maior parte dos casos, os fármacos
dever-se-ão ligar a um receptor, de modo a exercerem os seus efeitos.
Após ocuparem um receptor, os fármacos podem activar, inactivar, ou
não induzir qualquer alteração no receptor em questão – mediante
essas três possibilidades (ocupação e activação do receptor, ocupação
e inactivação do receptor, e apenas ocupação do receptor), os fármacos
podem ser classificados em três grandes grupos - agonistas,
antagonistas e agonistas inversos.
 
Classes de fármacos de acordo com as suas
propriedades farmacodinâmicas
 
Agonistas
 
 
Os agonistas são fármacos que ocupam e activam
receptores aos quais se ligam. De facto, ao ligarem-se
aos seus receptores, os agonistas alteram a
conformação destes, o que induz o receptor a
desempenhar um efeito (tal como activar uma cascata de
sinalização celular, ou abrir um canal iónico). A título de
exemplo, é comum administrar adrenalina a indivíduos
com asma, uma vez que esta catecolamina ocupa e
activa os adrenorreceptores brônquicos, promovendo a
broncodilatação.
 
Antagonistas
 
Por seu turno, os antagonistas são fármacos que ocupam os
receptores, mas não induzem nestes qualquer alteração de
conformação. Assim, os antagonistas não estimulam os receptores,
apenas impedem que outras substâncias se liguem a estes. A título de
exemplo, a atropina ocupa os receptores da acetilcolina, impedindo, por
isso, que a acetilcolina se ligue aos seus receptores.
 
Os antagonistas podem
ser do tipo competitivo
ou não-competitivo. Um
antagonista
competitivo, como o
próprio nome indica,
actua no mesmo
receptor (e no mesmo
local de ligação) do
agonista, competindo
com este pelo mesmo
local de ligação do
receptor. Ou seja, a
atropina (referida no
exemplo do parágrafo
anterior) é considerada
um antagonista
competitivo da
acetilcolina, uma vez
que ocupa os mesmos
receptores (e locais de
ligação) da
 
 
acetilcolina. Todavia, a acção da atropina cessa, caso seja administrada
uma elevada dose suplementar de acetilcolina. Estes antagonistas, cuja
acção cessa aquando da administração de concentrações muito
elevadas do agonista, designam-se por antagonistas competitivos em
equilíbrio e estabelecem ligações fracas com os seus receptores (o
que explica a reversibilidade da acção destes fármacos – os agonistas
podem remover os antagonistas dos receptores por competição, desde
que a sua dose seja suficiente).
 
Por outro lado, existem antagonistas que se ligam aos respectivos
receptores de forma irreversível ou pseudo-irreversível. Deste modo, a
acção destes fármacos, que se designam por antagonistas
competitivos em não-equilíbrio, não cessa
 
 
aquando da
administração de
uma dose
aumentada do
agonista.
 
Por oposição, os antagonistas não-competitivos não actuam nos
mesmos locais de ligação dos receptores dos agonistas. Os antagonistas
não-competitivos químicos actuam nos agonistas, sequestrando-os e
impedindo-os de interagir com os seus receptores. A título de exemplo, a
protamina é um antagonista químico da heparina, uma vez que se liga à
heparina, impedindo esta última molécula de exercer os seus efeitos.
 
 
Já o antagonismo não-competitivo
fisiológico caracteriza-se pela presença
de dois agonistas para receptores
diferentes, e de cuja activação resultam
efeitos opostos. A título de exemplo, a
adrenalina e o captopril são antagonistas
fisiológicos, uma vez que a adrenalina
actua em receptores adrenérgicos,
promovendo um aumento da pressão
arterial, enquanto o captopril é um IECA,
que promove uma redução da pressão
arterial.
 
De referir que, existem fármacos que
actuam no centro alostérico dos
receptores dos agonistas (ou seja nos
mesmos receptores que os agonistas,
mas em locais diferentes daqueles aos
quaisos agonistas se ligam). Ao
actuarem alostericamente, estes
moduladores alostéricos induzem
alterações conformacionais no centro
activo dos receptores, aumentando ou
diminuindo a capacidade de ligação dos
agonistas aos receptores.
 
 
 
 
 
 
 
Antagonistas inversos
 
Os agonistas inversos são
fármacos que se ligam a
receptores que se encontram
constitucionalmente activos,
diminuindo a sua actividade.
Assim, enquanto os agonistas
ocupam e activam receptores
que se encontram inactivos, os
agonistas inversos promovem o
término da resposta dos
receptores que se encontram
activos. Actualmente, pensa-se
que muitos fármacos que
tinham vindo a ser classificados
como antagonistas serão, na
verdade, agonistas inversos.
 
Propriedades farmacodinâmicas
 
Afinidade
 
 
Nem todos os fármacos,
sejam eles agonistas ou
antagonistas, apresentam a
mesma capacidade de
ocupação dos seus
receptores. Para avaliar
essa capacidade,
determina-se a afinidade do
fármaco. Para tal, calcula-se
a constante de
dissociação em equilíbrio
(K) do fármaco em questão,
que representa a
concentração de fármaco
(expressa em moles por
litro) necessária para que
este seja capaz de ocupar
50% dos seus receptores.
Em suma, o valor de K
exprime a afinidade do
fármaco, permitindo
conhecer qual a capacidade
apresentada pelos fármacos
de ocupação dos seus
receptores.
 
Utilizando um exemplo prático:
Imaginemos que os fármacos A e
B têm respectivamente um K de
1nM e 10nM. Ora, isto significa
que A tem maior afinidade do que
B, uma vez que apenas 1nM de
A é suficiente para ocupar
metade dos seus receptores
(algo que apenas é conseguido
com 10 nM de B).
 
 
Por vezes, para exprimir a
afinidade de um fármaco, é
calculado o logaritmo negativo de
K (pK). Assim, utilizando o
exemplo anterior:
 
KA= 1nM = 1 x 10-9 M pKA =
-log (10-9) = 9 KA= 10nM = 10 x
10-9 M pKB = -log (10-8) = 8
 
 
Deste modo, o pK de A é 9, enquanto o pK de B é 8. Ou seja, como o
pK de A é superior ao pK de B, A tem maior afinidade que B (esta
relação é inversa à verificada para o K, uma vez que, quanto maior o K,
menor a afinidade de um fármaco).
 
Através do estudo das funções “concentração de fármaco-ocupação de
receptores” é ainda possível estudar outras constantes para além de K.
Todavia, estas constantes, das quais é exemplo a constante de
equilíbrio de associação, não são tão utilizadas no meio científico,
uma vez que a afinidade deve ser expressa através dos valores de K ou
pK.
 
Eficácia
 
A eficácia diz respeito à capacidade de um fármaco induzir uma
alteração no seu receptor (e, como tal, uma resposta). Ilustrando com
um exemplo, sabe-se que, ao ocupar 5% dos receptores, o fármaco A
induz resposta máxima, enquanto o fármaco B despoleta apenas 50%
da resposta máxima. Ora, neste caso, o fármaco A é mais eficaz que o
fármaco B, uma vez que, para a mesma percentagem de receptores
ocupados, A induz uma maior resposta que B.
 
Existem vários agonistas
que, quando
administrados em
concentrações suficientes
para saturar o seu pool de
receptores, conseguem
activar os seus receptores
de tal modo que passa a
ser obtida uma resposta
máxima (ou seja, a
resposta mais “forte”
capaz de ser gerada pelo
sistema receptor-efector).
Estes agonistas designam-
se por agonistas totais.
Por oposição, os
agonistas parciais
conseguem activar os
seus receptores, mas não
conseguem gerar nunca
uma resposta
 
 
máxima, por muito elevada que seja a sua concentração. Assim, os
agonistas parciais apresentam menor eficácia que os agonistas totais,
enquanto os antagonistas apresentam uma eficácia nula, uma vez que
estes fármacos se limitam a ocupar os receptores, não despoletando
alterações nestes.
 
 
De referir que, de acordo com
a teoria dos receptores
poupados, a obtenção de
resposta máxima não requer,
normalmente, a ocupação de
todos os receptores por parte
de um agonista total. A
evidência experimental para
esta teoria surgiu a partir de
estudos em que eram dadas
doses progressivamente
maiores de um antagonista
irreversível, na presença de
um agonista. Ora, mesmo
perante doses consideráveis
(mas não muito grandes) de
antagonista, os agonistas
conseguiam induzir uma
resposta máxima, uma vez
que ainda restava uma
quantidade suficiente de
receptores livres aos quais
estes fármacos se pudessem
ligar.
 
A eficácia e a afinidade são
propriedades distintas e
independentes, de tal modo
que um fármaco com elevada
eficácia não apresenta
necessariamente elevada
afinidade, e vice-versa. A
título de exemplo, a morfina e
a buprenorfina são dois
analgésicos com eficácia e
afinidade distintas: enquanto
a morfina é um agonista total
que apresenta baixa
afinidade e elevada eficácia,
a buprenorfina é um agonista
parcial que apresenta maior
afinidade mas menor eficácia.
Assim, em situações mais
graves é
 
 
preferível administrar uma grande dose de morfina, uma vez que a
buprenorfina, apesar de se ligar facilmente a uma grande quantidade de
receptores, apresenta baixa eficácia. Por outro lado, quando se
pretende administrar morfina, esta não deve ser administrada em
conjunto com a buprenorfina, uma vez que a buprenorfina ocupa os
receptores dos opiáceos com mais facilidade, impedindo a acção, mais
eficaz, da morfina. Assim, os agonistas parciais actuam como
antagonistas parciais, quando se encontram na presença concomitante
de agonistas totais.
 
Potência
 
A potência consiste na
concentração (EC50) ou
dose (ED50) de um
fármaco necessária
para a obtenção de
50% da resposta
máxima desse fármaco.
O conceito de potência
é diferente do conceito
de afinidade, embora a
potência dependa
parcialmente da
afinidade do fármaco.
De referir que, no caso
particular dos agonistas
totais que para
despoletarem resposta
máxima necessitam de
ocupar todos os
receptores, o valor da
afinidade é igual ao
valor da potência.
 
 
O conceito de potência
é igualmente distinto do
conceito de
 
eficácia, de tal modo que nem sempre um agonista mais eficaz é mais
potente que um agonista menos eficaz (tal como nem sempre um
agonista total é mais potente que um agonista parcial). De facto,
existem casos em que é necessária menor concentração de um
agonista parcial para atingir 50% da resposta máxima.
 
Em termos clínicos, a efectividade de um fármaco não depende da sua
potência, mas sim da sua eficácia máxima e das suas propriedades
farmacocinéticas. Assim, quando os terapeutas são forçados a escolher
que fármaco deverão prescrever, normalmente têm preferencialmente
em consideração a eficácia do fármaco, e não a sua potência. Todavia,
a potência é importante para determinar a dose que deverá ser
administrada do fármaco em questão. Para além disso, ao analisar uma
curva concentração-efeito de um fármaco, o terapeuta deve ter em
conta a inclinação das curvas – quanto mais vertical for a curva de um
fármaco, mais rápido é o aumento do seu efeito. A título de exemplo, a
curva para os barbitúricos é muito vertical, o que significa que
rapidamente a sua acção passa de sedativa a indutora de coma.
 
pA2
 
Para estudar a actividade dos antagonistas competitivos, é frequente
determinar a concentração de antagonista na presença da qual é
necessário duplicar a concentração do agonista, de modo a que se
obtenha a mesma resposta a esse agonista na ausência do antagonista
(ou seja, qual a concentração de antagonista, para a qual, caso
dupliquemos a concentração do agonista, seja obtida uma resposta
similar à verificada na ausência do antagonista). Essa concentração é
expressa em notação logarítmica e designa-se por “pA2”, o qual em
termos matemáticos se determina a partir da equação de Schild. Ora,
de acordo com a definição, quanto maior o valor de pA2, mais potente o
antagonista em questão.
 
Regulação da actividade dos receptores
 
A exposição continuada a um determinado fármaco leva a que o
“organismo responda”, através da regulação da actividade dos
receptores nos quais o fármaco em questão actua. A exposição
continuada a um determinado agonista, em termos agudos (num
período de horas ou dias), leva a queeste induza progressivamente
uma resposta de menor intensidade. Este fenómeno é reversível e
designa-se por dessensibilização. A título de exemplo, a β-arrestina é
responsável pela dessensibilização nos receptores β-adrenérgicos, uma
vez que, ao impedir que ocorra uma grande activação na maquinaria a
jusante destes receptores, induz uma diminuição da intensidade da
resposta associada à activação destes receptores.
 
Por outro lado, a exposição crónica a um determinado agonista induz
um fenómeno de down-regulation, que está associado à diminuição
progressiva do número de receptores presentes na célula (sendo, por
isso, de reversibilidade mais lenta). Este fenómeno explica porque é que
os toxicodependentes têm de aumentar a sua dose de estupefacientes
para obter os mesmos efeitos.
 
Já a exposição crónica a um determinado antagonista induz um
fenómeno de up-regulation, que consiste no aumento do número de
receptores presentes na célula – este fenómeno verifica-se, por
exemplo, em indivíduos aos quais sejam cronicamente administrados β-
bloqueadores e, como tal, a supressão brusca destes fármacos é
deveras perigosa.
 
Outros alvos moleculares dos fármacos
 
Canais iónicos
 
Alguns fármacos podem actuar como bloqueadores ou abridores dos
canais iónicos. A título de exemplo, os fármacos empregues em
anestesias locais actuam como bloqueadores dos canais de sódio
dependentes da voltagem dos neurónios que serão anestesiados. Por
outro lado, em situações de epilepsia (perturbação caracterizada por um
excesso de actividade dos neurónios do sistema nervoso central), é
possível administrar fármacos abridores dos canais de potássio (de
forma a contrariar os efeitos de despolarização em massa registados
nesta patologia) ou bloqueadores dos canais de sódio. Em suma,
perante um fármaco que actue num canal iónico, é essencial saber em
que canal este exerce o seu efeito e se actua num sentido de abrir ou
de bloquear o canal iónico em questão.
 
Enzimas
 
Existem fármacos que interferem com a actividade enzimática, podendo
inibi-la ou estimulá-la. Ilustrando com um exemplo: A acetilcolina
libertada pelos neurónios exerce os seus efeitos e é imediatamente
degradada pela enzima colinesterase, de modo a impedir a acumulação
deste neurotransmissor. Ora, os indivíduos com miastenia gravis
(perturbação caracterizada por falta de força muscular) apresentam um
defeito na placa motora, de tal modo que a administração de um
fármaco que iniba a colinesterase se revela benéfica, no sentido em que
permite que se acumule maior quantidade de acetilcolina e, como tal,
que se desenvolva maior força muscular.
 
No que concerne aos estimuladores enzimáticos, destaque para os
fármacos que estimulam a guanil cíclase, permitindo a génese de uma
maior quantidade de cGMP e, por conseguinte, maior dilatação do
tecido peniano.
 
Transportadores
 
Alguns fármacos podem actuar nas moléculas transportadoras,
estimulando-as ou inibindo-as. A título de exemplo, a insulina é um
estimulador do transportador da glicose GLUT4, sendo, como tal,
administrada a indivíduos em coma diabético. Por oposição, a fluoxetina
é um inibidor do transportador de serotonina, sendo utilizada em
situações de depressão. De facto, a falta de serotonina na fenda
sináptica está associada ao desenvolvimento de depressão. Ora, ao
bloquear o transportador que opera a recaptação da serotonina lançada
na fenda sináptica para o neurónio pré-sináptico, a fluoxetina permite
que uma maior quantidade de serotonina se mantenha na fenda
sináptica.
 
 
 
 
 
 
Farmacocinética
 
Enquanto a farmacodinamia estuda, de grosso modo, as acções que os
fármacos exercem no organismo; a farmacocinética estuda o modo
como o organismo interage e modifica os fármacos. De facto, para que
um fármaco possa actuar, este deverá chegar aos tecidos onde actua
(biofase) em concentrações apreciáveis. Existem situações em que é
possível colocar o fármaco em contacto directo com os tecidos-alvo,
nomeadamente quando estes correspondem às mucosas ou à pele.
Todavia, na maior parte dos casos, a biofase não pode ser colocada em
contacto directo com o fármaco, e este terá de sofrer uma série de
processos bioquímicos até chegar aos tecidos-alvo e exercer os seus
efeitos.
 
Os fármacos cuja aplicação envolve o contacto directo com a biofase
designam-se por fármacos de administração tópica. Por oposição, diz-
se que os restantes fármacos apresentam administração sistémica,
pois deverão atingir a corrente sanguínea para atingirem os tecidos-
alvo. De modo a exercerem os seus efeitos, os fármacos de
 
 
administração sistémica
cumprem, em regra, quatro
etapas sobreponíveis (ou seja,
que não ocorrem
sequencialmente, mas sim
com alguma simultaneidade)
que constituem o ciclo dos
medicamentos: absorção,
distribuição,
biotransformação e
excreção. Estes processos
podem interferir com as
características e/ou
concentração dos fármacos,
de tal modo que o seu estudo
(que é assegurado pela
farmacocinética) é
fundamental para assegurar
uma correcta administração
farmacológica.
 
Os processos farmacocinéticos estão sujeitos a uma grande
variabilidade inter-individual, visto serem influenciados por factores
como a idade, o peso, as patologias, e outros fármacos que estejam a
ser tomados pelos pacientes. O processo de biotransformação é aquele
que mais variabilidade apresenta, seguido ordenadamente pelos
processos de excreção (que está dependente, sobretudo, da função
renal do indivíduo), distribuição e absorção. Assim, tendo em conta que
um mesmo regime posológico não origina os mesmos efeitos em
indivíduos distintos, torna-se essencial optar por uma via de
personalização posológica. De referir que essa personalização deverá
ter sempre em conta o factor “idade”, uma vez que o envelhecimento
está associado à diminuição das funções fisiológicas.
 
Conhecer o modo como os
fármacos são
“processados” no
organismo, bem como os
factores fisiopatológicos
individuais que afectam as
etapas do ciclo dos
medicamentos revela-se
particularmente importante
para a determinação da
janela terapêutica de cada
fármaco. A janela
terapêutica de um
fármaco compreende o
intervalo de concentrações
em que esse fármaco
apresenta acção
terapêutica efectiva, sem
que esta gere uma
toxicidade inaceitável.
 
 
 
 
Processos de travessia das membranas biológicas
 
Em qualquer processo integrante do ciclo dos medicamentos, verifica-se
a necessidade de travessia das membranas biológicas por parte do
fármaco em questão. Essa travessia poderá ser feita por difusão
passiva, transporte mediado, ou pinocitose, dependendo das
características do fármaco em questão.
 
Difusão passiva
 
A difusão passiva é um processo de transporte não-mediado e que
ocorre a favor do gradiente de concentração, sem concomitantes gastos
energéticos. Excluindo os casos de passagem por poros aquosos, a
difusão passiva requer a dissolução de moléculas pela bicamada
fosfolipídica membranar. Ora, a velocidade de difusão depende, não
tanto das dimensões da molécula em questão, mas sobretudo de outras
propriedades, tais como a sua lipofilia e o seu grau de ionização. Essas
relações encontram-se expressas na Lei de Fick, que permite
determinar a velocidade de difusão para uma dada partícula:
 
O grau de ionização de uma
determinada molécula é
igualmente importante para
determinar como se processará
a difusão passiva. De facto, a
difusão ocorre mais facilmente
caso as moléculas se
encontrem na forma não-
ionizada (mais lipossolúvel).
Assim, de acordo com a
equação de Henderson-
Hasselbach, na presença de
diferenças de pH entre os dois
lados da membrana, passa a
ocorrer difusão num sentido, até
que as concentrações da forma
não ionizada existentes nos dos
lados da membrana atinjam o
equilíbrio. De referir que a
equação de Henderson-
Hasselbach assume formas
diferentes na presença de um
ácido fraco ou de uma base
fraca.
 
 
Assim, de acordo com estas equações, é possível deduzir que um ácido
fraco se tende a acumular no lado alcalino da membrana, enquanto
umabase fraca se tende a acumular no lado ácido da membrana.
 
Transporte mediado
 
O transporte mediado é utilizado para fazer deslocar moléculas que,
por serem excessivamente polares ou demasiado grandes, são
incapazes de atravessar as membranas lipídicas por difusão simples.
Este transporte é operado por proteínas transportadoras, podendo
ocorrer a favor do gradiente de concentração e sem concomitantes
gastos energéticos (difusão facilitada), ou contra o gradiente de
concentração e com simultâneos gastos energéticos (transporte
activo). Em qualquer um dos casos, o transporte mediado caracteriza-
se por duas propriedades – selectividade (um dado transportador
apenas transporta determinados fármacos específicos) e
saturabilidade (visto que o número de transportadores é finito).
 
Em termos matemáticos, a velocidade de transporte mediado é passível
de ser calculada através da equação de Michaelis-Menten:
 
 
 
 
 
Pinocitose
 
A pinocitose é um processo de transporte de fluidos e macromoléculas,
que ocorre, sobretudo, ao nível dos capilares e na parede intestinal.
Este processo de transporte activo, apesar de quantitativamente menos
importante, revela-se particularmente importante para o transporte de
várias moléculas de grande importância farmacológica.
 
Vias de administração sistémica de fármacos
 
Via oral
 
A via oral (administração per os) é a via de administração sistémica
clinicamente mais utilizada para a administração de fármacos. Esta via
apresenta uma considerável vantagem, que diz respeito ao facto de a
maior parte dos fármacos administrados oralmente ser absorvida no
intestino delgado que, como mencionado anteriormente, apresenta
várias características favoráveis à absorção de substâncias.
 
A absorção por via oral per se não apresenta grande variabilidade inter-
individual. Todavia, o processo de absorção é influenciado por algumas
propriedades gastrointestinais, as quais já poderão apresentar forte
variabilidade. Uma dessas propriedades é o tempo de trânsito
intestinal que, como já foi referido, interfere com o tempo de contacto
de um fármaco.
 
Por outro lado, o tempo de esvaziamento gástrico também poderá
influenciar a absorção por via oral, na medida em que esse factor
determina o tempo durante o qual o fármaco será exposto ao pH ácido
do estômago (sendo que existem moléculas que poderão ser alteradas
ou destruídas por um baixo pH). Ora, o tempo de esvaziamento gástrico
caracteriza-se por ampla variabilidade inter-individual, dependendo das
características fisiológicas dos pacientes, das suas patologias e de
outros fármacos que estes possam estar a tomar.
 
O pH do tubo digestivo, não apresentando grande variabilidade inter-
individual, também actua como um condicionante da absorção por via
oral. Ao nível do lúmen gástrico, regista-se um pH ácido, motivo pelo
qual os ácidos fracos se encontram maioritariamente na forma não-
ionizada, enquanto as bases fracas se encontram maioritariamente na
forma ionizada. Assim, ao nível do estômago, a absorção dos ácidos
encontra-se favorecida, enquanto a absorção das bases se encontra
pouco favorecida. Por oposição, o pH do intestino delgado é alcalino, de
tal modo que as bases fracas se encontram maioritariamente na forma
não-ionizada, enquanto os ácidos fracos se encontram maioritariamente
na forma ionizada. Assim, ao nível do intestino delgado, tendo em
consideração apenas o pH, a absorção das bases encontra-se
favorecida, enquanto a absorção dos ácidos se encontra pouco
favorecida. Apesar disso, a maior parte dos fármacos ácidos continua a
ser absorvida ao nível do intestino delgado, uma vez que este
apresenta maior área de absorção, irrigação mais rica, e menor
espessura, comparativamente ao estômago.
 
A administração de um fármaco por via oral deverá ainda ter em conta a
presença ou ausência de alimentos – a presença de alimentos pode
modificar a velocidade e extensão da absorção de um fármaco (ou seja,
a sua biodisponibilidade). De facto, a presença de alimentos está
associada à diminuição da velocidade de esvaziamento gástrico, e ao
aumento da motilidade intestinal (o que leva a uma diminuição do tempo
de contacto entre o fármaco e a superfície intestinal). Por outro lado, as
substâncias secretadas aquando da digestão podem se ligar aos
fármacos, formando complexos que impeçam a absorção destes
últimos. Por fim, caso os fármacos sejam absorvidos por processos de
transporte mediado, é possível existir competição entre o fármaco e os
nutrientes pelos mesmos transportadores. Todavia, apesar destas
desvantagens, a administração de fármacos na presença de alimentos
pode ser benéfica em algumas situações – a título de exemplo, os
fármacos irritantes ou lesivos para a mucosa gástrica devem ser
administrados na presença de alimentos, uma vez que estes últimos
actuam como protectores da mucosa.
 
Após
serem
absorvidos
no
intestino,
os
fármacos
administra
dos por via
oral
chegam
ao sistema
porta,
sendo
encaminha
dos para 
o fígado.
 
Assim, os
fármacos
contactam
com o
fígado
antes de
serem
distribuído
s para os
restantes
tecidos
(incluindo
para os
seus
tecidos-
alvo). Ora,
ao nível do
fígado,
estes
fármacos
poderão
sofrer
alterações
que
poderão
condiciona
r a sua
biodisponi
bilidade –
efeito de
primeira
passagem
. Este
fenómeno
não ocorre
de forma
homogéne
a para
todos os
fármacos:
existem
fármacos
que não
sofrem
qualquer
tipo de
biotransfor
mação
hepática e,
por isso, a
sua
passagem
pelo fígado
não afecta
a sua
biodisponi
bilidade.
Por
oposição,
existem
fármacos
que são
amplament
e
metaboliza
dos e
inactivados
pelos
hepatócito
s, de tal
modo que
a sua
primeira
passagem
induz uma
diminuição
da sua
biodisponi
bilidade.
De referir
que, os
fármacos
que
apresente
m um
efeito de
primeira
passagem
muito
intenso
não
deverão
ser
administra
dos por via
oral, pois
caso
contrário a
sua
eficácia
será a
priori muito
mais
reduzida.
 
Apesar disso, existem, actualmente, medicamentos que tiram partido do
efeito de primeira passagem. Os pró-fármacos são substâncias
químicas desprovidas de actividade terapêutica per se. Todavia, aquando
da sua passagem pelo fígado, estas substâncias são metabolizadas pelos
hepatócitos e convertidas em fármacos com actividade terapêutica. A
título de exemplo, o ácido acetilsalicílico (que não tem actividade
terapêutica) é desacetilado no fígado, sendo convertido em ácido salicílico
(que apresenta actividade terapêutica). Assim, o ácido acetilsalicílico é o
pró-fármaco do ácido salicílico.
 
Via sublingual
 
A aplicação de fármacos por via sublingual possibilita que estes sejam
rapidamente absorvidos, uma vez que o epitélio da mucosa bucal
apresenta reduzida espessura e elevada vascularização. Para além
disso, os fármacos absorvidos por via sublingual são transportados
directamente para o sistema cava, escapando ao efeito de primeira
passagem e, como tal, à metabolização hepática.
 
Todavia, a aplicação de fármacos por via sublingual é desvantajosa,
caso os fármacos em questão sejam demasiado irritantes ou
apresentem um sabor desagradável.
 
Via rectal
 
Em comparação com o intestino delgado, o recto apresenta menor
vascularização e menor superfície de absorção. Para além disso, o
contacto do fármaco com a superfície absorvente é quase sempre
prejudicado pela presença de fezes, o que leva a que a absorção por
via rectal apresente eficácia inconstante. Acresce ainda o facto da
acção irritante de muitos fármacos (que é tolerável por via oral) ser
intolerável por via rectal.
 
Todavia, apesar destas desvantagens, a aplicação de fármacos por via
rectal pode ser utilizada em situações em que a administração oral
esteja impossibilitada (por exemplo, num indivíduo com vómitos). Para
além disso, cerca de metade da dose administrada por via rectal escapa
ao efeito de primeira passagem, não sofrendo alterações da
biodisponibilidade.
 
Via intra-venosa
 
A via intra-venosa comporta vários riscos e limitações, motivo pelo
qual a aplicação de fármacos por esta via apenas deverá ocorrer
quandonão é possível optar por outras vias de administração. Entre os
riscos que podem decorrer da administração intra-venosa de
medicamentos destaque para:
 
1. Desenvolvimento de infecções (sobretudo em doentes
imunodeprimidos)
 
2. Desenvolvimento de reacções do tipo anafilático grave
 
3. Desenvolvimento de embolismo
 
4. Aparecimento de efeitos cardiovasculares e respiratórios graves
 
5. Contaminação por uso de material não-esterilizado
 
Para além disso, apenas se podem aplicar soluções aquosas por via
endovenosa, as quais deverão ser aplicadas lentamente, uma vez que
uma aplicação vagarosa permite observar se estão a ser desenvolvidos
efeitos inesperados no decurso da injecção (caso esses efeitos sejam
observados, a administração do fármaco deve parar).
 
Todavia, apesar das desvantagens referidas, a aplicação de fármacos
por via intra-venosa também apresenta várias vantagens,
nomeadamente:
 
1. Inexistência da etapa de absorção – A concentração do fármaco
atinge valores máximos na corrente sanguínea, logo após a sua
aplicação. Isto revela-se particularmente importante em situações
de emergência.
 
2. Possibilita a administração de medicamentos que, quando
aplicados por outras vias, apresentam fraca absorção, ou sofrem
inactivação.
 
3. Permite a administração de grandes quantidades de líquidos por
perfusão contínua. O processo de perfusão contínua permite
ainda que as quantidades administradas sejam rigorosamente
controladas, o que se revela particularmente importante quando
os fármacos apresentam uma estreita janela terapêutica (isto é,
quando as concentrações terapêuticas são muito próximas das
concentrações tóxicas).
 
4. Possibilita a administração de fármacos que, por terem acção
irritante local, não podem ser administrados por via intra-muscular
ou subcutânea.
 
Via intra-muscular
 
A via intra-muscular é uma alternativa consistente à via oral, uma vez
que todos os fármacos capazes de atravessar a parede capilar, e sem
efeito irritante considerável, poderão, a priori, ser administrados por via
intra-muscular. Todavia, os medicamentos que se encontram sob a
forma de solução aquosa são mais facilmente absorvidos que aqueles
que se encontram sob a forma de solução oleosa ou suspensão.
 
A aplicação de fármacos por via intra-muscular está ainda associada a
outras vantagens, nomeadamente, à rápida velocidade de absorção e à
existência de regiões de elevada área de contacto (a aplicação de um
medicamento deve ocorrer em músculos de grandes dimensões, como
o glúteo máximo ou o deltóide) e rica irrigação (para aumentar a
irrigação local, deverá ser feita uma massagem na região de aplicação
da injecção).
 
Contudo, a injecção de medicamentos por via intra-muscular também
apresenta algumas desvantagens, nomeadamente, o risco de lesão de
feixes nervosos, a dificuldade de auto-administração, a impossibilidade
de administração de grandes volumes de líquidos, e o desenvolvimento
de irritação e dor local.
 
Via subcutânea
 
Embora seja muito semelhante à via intra-muscular, a via subcutânea é
mais dolorosa, mais susceptível de despoletar fenómenos de irritação
local, e está associada a maior lentidão de absorção. Todavia,
contrariamente ao que ocorre com a via intra-muscular, é possível auto-
administrar medicamentos por via subcutânea.
 
Em alguns casos é possível implantar cirurgicamente um comprimido no
tecido celular subcutâneo. A presença desse comprimido permite que o
fármaco presente seja absorvido de forma lenta e controlada, o que leva
a que o seu efeito terapêutico se prolongue no tempo. De referir que
este processo é utilizado, por exemplo, em programas de terapêutica
hormonal de substituição.
 
Via dérmica
 
A via dérmica (percutânea) não é amplamente utilizada para
administração sistémica. De facto, apesar de os fármacos administrados
por via dérmica poderem atingir a corrente sanguínea (caso sejam
suficientemente lipofílicos e pequenos), a passagem destes para o
sangue ocorre a uma taxa irregular e difícil de quantificar. Assim, os
fármacos aplicados por via dérmica apenas podem ser absorvidos de
forma algo regular caso sejam “especificamente desenhados” para
aplicação sistémica, e caso as áreas de absorção sejam
cuidadosamente escolhidas – de facto, estes medicamentos deverão
ser aplicados em zonas de pele fina e glabra, tais como as áreas
esternal, subclavicular ou abdominal.
 
Via inalatória
 
A absorção de fármacos por via inalatória é deveras rápida, devido à
pequena espessura dos alvéolos pulmonares e à elevada irrigação e
extensa área do tecido pulmonar. Todavia, na maior parte dos casos, a
via inalatória não é utilizada com fins sistémicos. Ora, dadas as
características (já referidas) do tecido pulmonar, vários fármacos
inalatórios para administração tópica podem ser involuntariamente
absorvidos, gerando efeitos sistémicos potencialmente indesejáveis.
Deste modo, os aerossóis indicados para administração tópica deverão
conter apenas partículas cujas dimensões apenas lhes permitam chegar
até aos bronquíolos (deste modo a passagem para os alvéolos
pulmonares fica impedida). Caso isto se verifique, a administração
tópica de um fármaco torna-se possível e o risco de absorção diminui.
 
Via intra-óssea
 
Esta via é, normalmente, praticada por punção do esterno e utilizada em
situações de administração de grandes quantidades de líquido (sendo
utilizada como alternativa à via intra-venosa).
 
Via intra-tecal
 
Esta via consiste na deposição directa de substâncias no sistema
nervoso central, sendo utilizada aquando da presença de moléculas
que, devido à sua dificuldade em atravessar a barreira hemato-
encefálica, nunca poderiam atingir concentrações terapêuticas caso
fossem aplicadas de outra forma.
 
Ciclo dos medicamentos
 
Absorção
 
O processo de absorção de um fármaco define-se como a passagem
de um fármaco desde o seu local de deposição até à circulação
sanguínea. Qualquer fármaco que seja aplicado por via sistémica terá
que sofrer absorção, com excepção dos fármacos que são
administrados por via intra-venosa (que são directamente introduzidos
na corrente sanguínea). Por seu turno, os fármacos que são
administrados por via tópica poderão sofrer absorção, embora esta seja,
na maior parte dos casos, considerada indesejável, uma vez que,
quando se aplica um fármaco por via tópica, deseja-se normalmente
que este apenas apresente efeitos locais na zona de aplicação.
 
A absorção ocorre maioritariamente por difusão passiva, de tal modo
que é passível de ser influenciada por diversos factores:
 
1. Área de absorção – Quanto mais extensa for a área de
absorção, maior a velocidade com que decorre o processo de
absorção. Assim, o intestino delgado revela-se um órgão
particularmente dotado para a absorção de substâncias, uma vez
que as suas pregas e vilosidades lhe conferem uma grande área
de superfície. A área das membranas dos alvéolos pulmonares
também é bastante extensa, o que facilita a absorção de certos
fármacos inalados.
 
2. Tempo de contacto – O tempo de contacto entre um fármaco e a
região absorvente revela-se particularmente importante no tubo
digestivo: Existem porções do tubo digestivo (tais como o
esófago) em que o fármaco se desloca tão rapidamente que não
poderá ser absorvido. Por outro lado, as alterações do trânsito
intestinal poderão condicionar o processo de absorção
farmacológica – a diarreia (maior velocidade do trânsito intestinal)
está associada a menor absorção por diminuição do tempo de
contacto, enquanto a obstipação (menor velocidade do trânsito
intestinal) está associada maior absorção. Neste sentido, o tempo
de contacto entre o fármaco e a área absorvente está sujeito a
alguma variabilidade inter-individual, uma vez que o trânsito
intestinal é diferente consoante os indivíduos.
 
3. Intimidade do contacto – Quanto mais íntimo o contacto entre o
fármaco e as membranas biológicas, mais eficaz será o processo
de absorção. Assim, no caso do tubo digestivo, os medicamentos
em solução ou suspensão são mais facilmenteabsorvidos que os
medicamentos sólidos, devido ao facto de os primeiros
estabelecerem um contacto mais íntimo com as mucosas.
 
4. Intensidade da irrigação – Quanto mais intensa for a irrigação
de uma dada região, maior será a diferença de concentrações
entre o local de deposição do fármaco e o sangue para o qual o
fármaco se dirige. Por esse motivo, o intestino delgado, cuja
irrigação é muito rica, é um órgão privilegiado para a absorção de
substâncias. Por oposição, quando se procede à aplicação tópica
de um fármaco, poderá ser administrado um vasoconstritor, de
modo a reduzir a irrigação local e, consequentemente, a
quantidade do medicamento que é absorvida.
 
5. Espessura da estrutura absorvente – Quanto menor for a
espessura do tecido absorvente, maior será a velocidade de
absorção. Isto ajuda a explicar porque é que a absorção dos
fármacos ocorre predominantemente no intestino delgado, e não
no estômago. Seguindo o mesmo raciocínio, dado serem muito
finas, as mucosas nasal e bucal apresentam uma elevada
velocidade de absorção, motivo pelo qual a aplicação tópica de
fármacos nessas regiões poderá ser potencialmente perigosa.
 
Distribuição
 
A distribuição de um fármaco consiste na transferência reversível das
moléculas farmacológicas desde o espaço intra-vascular até ao espaço
extra-vascular (nomeadamente para os diferentes órgãos, tecidos, e
fluidos corporais).
 
O perfil de distribuição de um fármaco é particularmente influenciado
pelos factores fisiológicos (idade, sexo, e peso corporal) e patológicos
do indivíduo, bem como pela capacidade apresentada pelo fármaco em
atravessar as membranas biológicas. A título de exemplo, a idade e o
sexo do paciente condicionam a percentagem de água corporal, que,
por sua vez, determina o volume de distribuição de um fármaco. O
volume de distribuição (Vd) reflecte a quantidade de água presente
nos compartimentos que o fármaco é capaz de atravessar – a título de
exemplo, o plasma sanguíneo é constituído por três litros de água,
motivo pelo qual, um fármaco que seja incapaz de atravessar a parede
capilar (e que, portanto, apenas se possa deslocar no meio intra-
vascular) apresenta um volume de distribuição de três litros. Por seu
turno, um fármaco capaz de se deslocar por mais compartimentos terá
um maior volume de distribuição.
 
 
O estudo da distribuição de um fármaco deverá igualmente ter em conta
as diferentes intensidades de irrigação registadas pelos vários órgãos.
Assim, no início do processo de distribuição, a maior parte do fármaco é
encaminhada pelos tecidos mais ricamente irrigados, nomeadamente o
cérebro e algumas vísceras como os rins. Passado algum tempo, o
fármaco passa a ser encaminhado para tecidos de irrigação intermédia,
tais como o músculo esquelético e algumas vísceras menos irrigadas.
Por fim, o fármaco é distribuído para os tecidos menos irrigados, nos
quais se destaca o tecido adiposo (que, apesar da sua grande massa, é
muito pobremente irrigado).
 
Interacções entre os fármacos e as proteínas
plasmáticas e tecidulares
 
Ao estudar a distribuição dos fármacos, devemos ainda ter em
consideração que estes interagem com as estruturas plasmáticas e
tecidulares. De facto, verifica-se que tanto no meio intra-vascular como
extra-vascular, existe sempre uma fracção de fármacos que circula
ligada a proteínas. Todavia, apenas a fracção de fármacos que circula
livremente (sem estar ligada a proteínas) é capaz de atravessar as
membranas biológicas. Assim, deverá existir um equilíbrio dinâmico e
reversível entre as formas livre e ligada dos fármacos, o que não implica
que a percentagem de fármaco livre tenha que ser igual à percentagem
de fármaco ligado.
 
Como já foi referido, apenas a fracção livre é capaz de atravessar a
membrana capilar (e as restantes membranas biológicas), sendo por
isso a única fracção capaz de ter acção terapêutica e de sofrer
eliminação. Por oposição, a fracção ligada é considerada
farmacologicamente inactiva, actuando como um “depósito de fármaco”.
 
 
Ou seja, como
existe sempre um
equilíbrio entre a
fracção livre e a
fracção ligada, à
medida que a
fracção livre vai
sendo consumida,
a fracção ligada
vai se
 
“desligando” das
proteínas,
assegurando a
permanência de
fármaco livre em
circulação.
 
Alguns fármacos apresentam mais afinidade para as proteínas
plasmáticas, motivo pelo qual tendem a permanecer no compartimento
intra-vascular. Por oposição, os fármacos que apresentam mais
afinidade para as proteínas tecidulares tendem a deslocar-se para o
espaço extra-vascular e, por conseguinte, a apresentar baixas
concentrações plasmáticas.
 
Quando os fármacos se ligam fortemente às estruturas extra-vasculares
(tecidulares), o seu volume de distribuição atinge valores de milhares de
litros. Ora, isto revela-se fisiologicamente impossível, uma vez que o
volume de água corporal total ronda os 41 litros. Assim, devido aos
valores anormalmente elevados que pode apresentar, passa a ser mais
correcto designar o volume de distribuição por volume aparente de
distribuição. Este parâmetro não tem qualquer significado fisiológico,
servindo apenas para relacionar as doses administradas de um fármaco
com as concentrações plasmáticas obtidas. Em suma, Vd apresenta
valores muito elevados para os fármacos que se distribuem
preferencialmente para o meio extra-vascular, e valores muito reduzidos
para os fármacos que se mantêm tendencialmente no meio intra-
vascular (no caso extremo de um fármaco que seja incapaz de passar
para o espaço extra-vascular, Vd=3 litros, dado o plasma sanguíneo ser
constituído por três litros de água).
 
Interacção entre fármacos no processo de distribuição
 
O perfil de interacção entre os fármacos e as proteínas plasmáticas
adquire particular relevância aquando da administração concomitante
de vários fármacos. De facto, caso sejam simultaneamente
administrados dois fármacos com elevada afinidade para as proteínas
plasmáticas, pode acontecer que um dos fármacos “desligue” o outro,
que se encontrava previamente ligado (isto é perfeitamente plausível,
uma vez que a ligação entre os fármacos e as proteínas plasmáticas é
inespecífica). Ora, este fenómeno leva a um aumento da concentração
plasmática da fracção livre (e, como tal, activa) desse último fármaco, o
que acarreta consequências indesejáveis.
 
Assim, este fenómeno de interacção farmacológica revela-se
extremamente importante na prática clínica, sobretudo para fármacos
que apresentam estreita janela terapêutica (ou seja, em que pequenas
alterações da fracção livre podem comprometer a segurança do
tratamento). A título de exemplo, caso seja administrado um anti-
inflamatório não-esteróide a um doente medicado com varfarina (um
anti-coagulante), o anti-inflamatório vai “desligar” a varfarina das
proteínas plasmáticas, algo que faz aumentar a sua fracção-livre e,
como tal, o risco de desenvolvimento de acidentes hemorrágicos.
 
 
Convém ainda não esquecer que existem situações patológicas que
cursam com uma diminuição da quantidade de proteínas plasmáticas.
Nestas condições, um fármaco com uma elevada taxa de ligação às
proteínas plasmáticas apresentará uma fracção livre muito superior,
comparativamente ao que seria expectável numa situação normal.
 
De referir apenas, que todos os tipos de proteínas plasmáticas podem
se ligar aos fármacos, embora existam duas que assumam particular
relevância, nomeadamente, a albumina (que apresenta grande
afinidade para os fármacos ácidos) e a glicoproteína-α1 (que, devido à
sua natureza ácida, liga-se facilmente a fármacos alcalinos).
 
Redistribuição
 
Como foi referido, a distribuição de uma substância depende do
estabelecimento de um equilíbrio entre as fracções livres existentes nos
diferentes compartimentos corporais, de tal modo que, passado algum
tempo após administração de um fármaco, os processos de eliminação
passam a favorecer a passagem do espaço extra-vascular para o
espaço intra-vascular. Ou seja, no início da fase de distribuição, o
fármaco tende a abandonar o espaço intra-vasculare a passar para o
espaço extra-vascular. Todavia, com o passar do tempo, a quantidade
de fármaco livre no meio intra-vascular vai caindo consideravelmente,
motivo pelo qual passa a ser favorecido o transporte de fármaco no
sentido inverso (desde o espaço extra-vascular para o espaço intra-
vascular).
 
Isto explica porque é que os fármacos não chegam simultaneamente a
todos os órgãos. Assim, inicialmente, os fármacos deslocam-se
preferencialmente para o cérebro e vísceras altamente irrigadas.
Todavia, passado algum tempo, o gradiente de concentrações inverte-
se, passando a ser favorecida a passagem dos fármacos (desde o
cérebro e vísceras) novamente para o sangue. Posto isto, os fármacos
passam a ser redistribuídos para tecidos de irrigação menos intensa,
tais como o músculo esquelético. Posteriormente, os fármacos acabam
também por abandonar esses tecidos (pelos mesmos motivos),
acumulando-se progressivamente, no tecido adiposo.
 
Este fenómeno de redistribuição tem importantes implicações clínicas,
nomeadamente:
 
1. Os órgãos mais irrigados são aqueles que apresentam
concentrações mais elevadas do fármaco em questão, numa fase
mais precoce. Todavia, nessas regiões, os fármacos deixam de
exercer a sua acção farmacológica, sobretudo, devido ao
fenómeno de redistribuição (e não tanto por excreção ou
eliminação).
 
2. A acumulação do fármaco em locais onde a sua actividade não se
faz sentir leva a que os tecidos em questão passem a actuar
como “reservatórios”, que vão libertando o fármaco a velocidade
variável. Isto permite prolongar o tempo de permanência do
fármaco no organismo. De entre os tecidos que actuam como
reservatório, destaque para o tecido adiposo, que é
particularmente importante para o armazenamento de fármacos
lipossolúveis.
 
3. Na sequência de uma técnica de eliminação forçada (como sendo
a hemodiálise), é removida uma grande quantidade de fármaco
do sangue. Todavia, após a realização destas técnicas, a
concentração plasmática dos fármacos tende a aumentar, devido
à ocorrência de fenómenos de redistribuição, os quais respondem
à necessidade de se passar a estabelecer um novo equilíbrio
entre os diferentes compartimentos.
 
Distribuição para o sistema nervoso central
 
Apesar de o sistema nervoso central ser ricamente irrigado, a maior
parte dos fármacos atinge os órgãos centrais de forma lenta e
quantitativamente pouco extensa, devido à presença da barreira
hemato-encefálica. De facto, existem inclusive fármacos incapazes de
atingir o sistema nervoso central.
 
Todavia, apesar da presença da barreira hemato-encefálica, a
distribuição dos fármacos para o sistema nervoso central continua a
ocorrer preferencialmente por difusão passiva.
 
De referir que, existem situações patológicas (tais como a meningite)
que se caracterizam pela disrupção da barreira hemato-encefálica, o
que facilita a distribuição de fármacos para o sistema nervoso central.
 
Distribuição através da placenta
 
Actualmente, considera-se que a barreira placentária é muito pouco
selectiva, de tal modo que os fármacos presentes na circulação materna
passam facilmente para a circulação fetal. A maior parte dos fármacos
sitos no sangue materno passam para o feto por difusão passiva,
embora uma fracção menor passe por transporte activo e,
provavelmente, por pinocitose. Assim, a administração de um fármaco a
uma grávida deverá ser bastante ponderada, de modo a evitar que o
feto seja desnecessariamente exposto a substâncias potencialmente
nocivas.
 
Biotransformação (metabolismo)
 
O processo de biotransformação diz respeito a qualquer alteração que
a estrutura química dos fármacos poderá sofrer no organismo. De facto,
o organismo considera os fármacos como substâncias estranhas,
procurando eliminá-los o mais rapidamente possível. Para tal, o
organismo opera uma série de reacções com o objectivo de converter
os fármacos em moléculas mais facilmente excretáveis (daí considerar-
se que a biotransformação é um processo de eliminação), as quais se
designam por metabolitos.
 
 
Na maior parte das vezes,
quando comparados com os
fármacos que lhes deram
origem, os metabolitos são mais
hidrossolúveis, mais polares
(logo, com mais grupos
hidrofílicos), e de maiores
dimensões. Desta forma, os
metabolitos têm maior
dificuldade em atravessar as
membranas biológicas (ou seja,
a sua distribuição encontra-se
dificultada), mas são mais
facilmente excretados.
 
A biotransformação dos fármacos pode ocorrer em vários órgãos,
embora o fígado assuma particular importância, devido às suas
dimensões e à diversidade enzimática presente nos hepatócitos. De
qualquer forma, as reacções de biotransformação podem ser divididas
em duas fases:
 
1. Reacções de fase I (reacções pré-sintéticas): Estas reações
têm como objectivo tornar o fármaco mais polar, envolvendo, por
isso, processos de oxidação, redução, ou hidrólise (estes dois
últimos apresentam pouca importância quantitativa). As reacções
de oxidação são as mais importantes e, tal como as reacções de
redução, são maioritariamente mediadas pelo sistema
microssómico hepático – este sistema conta com a presença de
enzimas da família do citocromo P450 (CYP) e da família do
NADPH-citocromo P450 redútase.
 
2. Reacções de fase II: Estas reacções induzem um aumento das
dimensões moleculares, uma vez que consistem maioritariamente
em reacções de conjugação do fármaco com outros substratos
(de entre os quais se destaca o ácido glicurónico). As reacções
desta fase são mediadas por uma enorme variedade de
transferases, de tal modo que a fase II é a menos afectada em
situações de patologia hepática.
 
Devido ao facto de dependerem da acção enzimática, os processos de
biotransformação são saturáveis. Em condições normais, a saturação
não chega a ser atingida. Todavia, é perfeitamente possível que se
passe a verificar saturação enzimática, aquando da administração
simultânea de diferentes fármacos cuja eliminação seja assegurada
pelo mesmo sistema enzimático. Ora, nestas situações, em que ocorre
saturação das enzimas envolvidas nos processos de biotransformação,
os fármacos podem atingir concentrações plasmáticas muito superiores
às expectáveis.
 
Como referido anteriormente, a biotransformação é o processo do ciclo
dos medicamentos que mais variabilidade inter-individual comporta. Isto
deve-se, sobretudo, à existência de um polimorfismo genético que
interfere com a biotransformação e que, por esse motivo, é um dos
principais responsáveis pelas respostas atípicas à administração de
fármacos. Também a idade influencia o processo de biotransformação,
de modo determinante – os recém-nascidos apresentam sistemas
enzimáticos biotransformadores imaturos e que, muitas vezes, originam
metabolitos distintos daqueles originados pelos adultos. Por outro lado,
a biotransformação encontra-se comprometida nos idosos, sobretudo
devido à diminuição da massa e fluxo hepáticos, associada à
degeneração dos sistemas hepáticos. Por fim, a patologia hepática pode
condicionar o processo de biotransformação dos fármacos, sendo as
patologias crónicas mais deletérias que as transitórias. Como seria
expectável, a presença de patologia hepática afecta de forma mais
marcada a metabolização dos fármacos que estão sujeitos a extensa
biotransformação ou a um importante efeito de primeira passagem.
 
Interacção entre fármacos no processo de
biotransformação
 
Tal como se verifica com
o processo de
distribuição, a
biotransformação
 
 
é passível de ser
afectada pela ocorrência
de interacções entre
fármacos. De facto,
alguns fármacos
apresentam capacidade
de indução enzimática
(capacidade de aumentar
a actividade metabólica
enzimática), enquanto
outros apresentam
capacidade de inibição
enzimática (capacidade
de diminuir a actividade
metabólica enzimática).
Para compreender quais
as possíveis
consequências deste
facto, imaginemos uma
situação hipotética:
 
Os fármacos com capacidade
de inibição enzimática podem
actuar por mecanismos
competitivos ou não-
competitivos. A inibição diz-se
competitiva,quando o agente
inibidor ocupa o centro activo da
enzima (podendo, ou não, servir
de substrato enzimático) – este
tipo de inibição pode ser
superado através do aumento
da concentração de substrato.
Por oposição, a inibição diz-se
não-competitiva quando o
agente inibidor forma um
complexo (reversível ou
irreversível) com a enzima,
impossibilitando a interacção
entre esta e o
 
 
seu substrato – este tipo de inibição não pode ser superado através do
aumento da concentração de substrato. Existem ainda processos de
inibição indirecta, os quais resultam de alterações fisiopatológicas ou
da diminuição da síntese de proteínas enzimáticas.
 
 
 
Na maior parte das vezes, os fenómenos de inibição são do tipo
competitivo, interferindo maioritariamente com as enzimas da família do
citocromo P450. Como é óbvio, quanto menor a especificidade de
substrato de um sistema enzimático, mais vastas serão a priori as
implicações resultantes da sua inibição. De qualquer forma, em termos
clínicos, os fenómenos de inibição estão frequentemente associados
com o desenvolvimento de efeitos tóxicos, resultantes do aumento da
concentração plasmática dos fármacos cuja metabolização está
diminuída.
 
Existem situações em que as reacções de biotransformação originam
metabolitos com igual ou maior actividade que os fármacos que lhes
deram origem (ou seja em pró-fármacos, tais como as
benzodiazepinas). Nesse caso, a existência de inibição enzimática está
associada a uma perda de eficácia dos fármacos cuja metabolização
está diminuída.
 
Já no que concerne ao fenómeno de indução, convém referir que
existem fármacos capazes de induzir o seu próprio metabolismo (auto-
indução). De entres fármacos, destaque para a carbamazepina (anti-
epiléptico).
 
 
Excreção
 
A excreção de um fármaco define-se como o conjunto de processos
através dos quais se dá a saída do fármaco (ou dos metabolitos
resultantes da sua biotransformação) para o exterior do organismo.
Conhecer a via de excreção preferencial de um determinado fármaco é
importante, na medida em que esta poderá estar associada ao
desenvolvimento de efeitos terapêuticos ou indesejados.
 
Excreção por via urinária
 
Em termos quantitativos e fisiológicos, a via urinária constitui a mais
importante via de excreção. Isto deve-se ao elevado fluxo sanguíneo
renal, bem como ao facto de as reacções de biotransformação
convertem os fármacos em metabolitos polares, os quais são mais
facilmente excretados por via renal. De qualquer forma, apenas a
fracção livre dos fármacos (ou dos seus metabolitos) é passível de
sofrer filtração glomerular, o que mais uma vez reforça o papel de
“reservatório de fármaco” assumido pelos complexos fármaco-proteínas.
 
Parte dos fármacos filtrados sofre reabsorção tubular, que ocorre
preferencialmente, por difusão passiva. Ora, a difusão passiva de uma
substância é influenciada pelo seu grau de ionização, de tal modo que
alterações do pH do filtrado glomerular interferem com a reabsorção
tubular dos fármacos e seus metabolitos. Assim, a alcalinização do
filtrado promove a ionização dos ácidos fracos, inibindo a sua
reabsorção e favorecendo a sua excreção. Por oposição, acidificação
do filtrado favorece a reabsorção dos ácidos fracos e inibe a sua
excreção (verifica-se o contrário para as bases fracas). Assim, aquando
de uma intoxicação, é possível recorrer ao controlo do pH do filtrado
(tornando-o mais ácido ou mais alcalino), de modo a promover a
excreção renal de substâncias indesejadas. A título de exemplo,
aquando de uma intoxicação por um barbitúrico (ácido fraco), é costume
induzir alcalinização do filtrado para favorecer a excreção daquela
substância.
 
Existem ainda fármacos que são secretados para o lúmen tubular,
nomeadamente, através de processos de transporte activo. Ora, por
vezes, vários fármacos competem pelo mesmo transportador, o que
poderá levar a uma diminuição da velocidade de excreção destes
fármacos activamente secretados. A título de exemplo, o probenecid e a
penicilina G competem pelo mesmo transportador para serem
secretados – isto permite aumentar o tempo de semi-vida plasmática da
penicilina G, uma vez que a sua taxa de secreção (e,
consequentemente, de excreção) diminui, devido ao facto de os seus
transportadores estarem em parte ocupados com probenecid.
 
A excreção é ainda afectada por vários factores fisiológicos, de entre os
quais se destaca a idade – a capacidade excretora é menor nos recém-
nascidos (que não dispõem ainda de uma função renal completamente
desenvolvida) e nos mais idosos. Por outro lado, qualquer patologia
renal, ou que interfira com o fluxo plasmático renal, interfere
negativamente com o processo de excreção.
 
Outras vias de excreção
 
Para além da via urinária, existem muitas outras vias de excreção,
nomeadamente a via biliar, pulmonar, e intestinal. Os fármacos
excretados pela via biliar, onde predominam os processos de
transporte activo, podem ser parcialmente ou totalmente reabsorvidos,
através do ciclo entero-hepático. Como é óbvio, isto permite prolongar
significativamente o tempo de presença do fármaco e/ou metabolitos no
organismo.
 
Já a via de excreção pulmonar inclui a excreção de gases e
substâncias voláteis por via alveolar. Por fim, a excreção a partir de
glândulas exócrinas pode adquirir relevância em situações muito
particulares – a título de exemplo, a excreção de fármacos/metabolitos
por via das secreções mamárias poderá acarretar consequências
indesejáveis para o lactente.
 
 
Volume de distribuição
 
 
 
 
 
A fórmula supracitada (que deriva da fórmula clássica de cálculo de
uma concentração) permite calcular o volume aparente de
distribuição, o qual pode exceder amplamente qualquer volume do
organismo, dado corresponder ao volume aparentemente necessário
para acomodar todo o fármaco presente num dado compartimento (tal
como o plasma) caso o organismo fosse homogéneo. Um fármaco com
elevado volume de distribuição tende preferencialmente a apresentar
concentrações extra-vasculares superiores às intra-vasculares.
 
Clearance
 
Em termos matemáticos, a taxa de eliminação (clearance) pode ser
determinada através das seguintes fórmulas:
 
 
 
 
; sendo que:
 
 
 
Para a maior parte dos fármacos, a clearance não atinge a saturação
nos valores clínicos. Ora, quando assim é, diz-se que a taxa de
eliminação é de primeira ordem, podendo ser calculada através da
seguinte fórmula:
 
 
 
 
Contudo, quando as concentrações de fármaco presentes no organismo
são muito elevadas, a clearance pode passar a ser limitada por
saturação. Ora nestas situações, em que a eliminação é limitada pela
capacidade de excreção, o conceito de clearance não faz sentido, tal
como o uso da área sob a curva. Nesses casos, aplica-se a seguinte
fórmula para se proceder ao cálculo da taxa de eliminação de um
fármaco:
 
 
 
 
Tempo de semi-vida
 
A semi-vida de um fármaco (t1/2) corresponde ao tempo necessário
para que uma determinada quantidade de fármaco reduza o seu valor
para metade, quer no decurso de um processo de eliminação, quer
após infusão contínua.
 
O tempo de semi-vida pode ser matematicamente determinado pela
seguinte fórmula:
 
; sendo que:
 
 
 
 
; daqui se deduz que:
 
 
 
 
 
Assim, esta fórmula permite-nos obter o tempo necessário para atingir
50% das concentrações do fármaco em estado estacionário. Todavia,
algumas considerações devem ser tidas em conta, nomeadamente:
 
• Uma alteração no tempo de semi-vida não implica,
necessariamente, a ocorrência de mudanças na eliminação do
fármaco.
 
• No caso de fármaco que se distribuam por vários compartimentos,
o verdadeiro tempo de semi-vida é superior ao estimado pelas
fórmulas supracitadas.
 
Acumulação
 
Ocorre acumulação de um fármaco sempre que o intervalo das doses
administradas é inferior a quatro semi-vidas. Como expectável, a
acumulação é inversamente proporcional à fracção de dose de fármaco
perdida em cada intervalo.
 
As concentrações máximas de um fármaco atingidas no estado
estacionário(após administração de doses intermitentes deste fármaco)
calculam-se através do produto entre a concentração máxima atingida
após a administração da primeira dose e o factor de acumulação. Ou
seja:
 
 
;
 
sendo que:
 
 
 
 
Biodisponibilidade e fenómeno de primeira passagem
 
Apenas a administração de um fármaco por via intra-venosa assegura
uma biodisponibilidade de 100% - em todas as restantes vias a
biodisponibilidade é inferior. No caso de algumas vias (nomeadamente a
via oral e, em parte, a via rectal), o fenómeno de primeira passagem
contribui para a diminuição da biodisponibilidade farmacológica. Ora,
em termos matemáticos, este fenómeno pode ser estimado pela
seguinte fórmula:
 
 
 
 
Deste modo, a biodisponibilidade é passível de ser calculada pela
seguinte fórmula:
 
 
 
Como expectável, os fármacos com taxas de extracção hepática mais
elevadas comportam maior variabilidade inter-individual, as quais
resultam de diferenças inter-individuais na função hepática e fluxo
sanguíneo. Nesses fármacos, existem grandes diferenças entre as
concentrações obtidas por via oral e por uma via que não sofra efeito de
primeira passagem (tal como a via sublingual).
 
 
 
 
Note-se que não o efeito de primeira passagem não é o único
responsável pelo facto de a biodisponibilidade dos fármacos
administrados por via oral não ser total. A título de exemplo, a p-
glicoproteína (p-gp) é um transportador que impede a absorção de
alguns fármacos, expulsando-os activamente do interior das células
intestinais, de novo para o lúmen intestinal. Note-se que esta proteína é
inibida pelo sumo de toranja.
 
Administração de um fármaco
 
Com base nos parâmetros estudados, é possível proceder ao cálculo da
dose que deverá ser administrada de um determinado fármaco:
 
 
 
 
No estado estacionário sabe-se que a taxa de administração equivale à
taxa de eliminação, de tal modo que:
 
 
 
Ora, isto possibilita o cálculo da dose de manutenção (quantidade de
fármaco necessária para que ocorra manutenção da sua concentração
no estado estacionário):
 
 
 
A concentração no estado estacionário atingida por infusão contínua
apenas depende da clearance, tal como se verifica com a concentração
média atingida após administração intermitente. Assim, não é
necessário conhecer a semi-vida ou o volume de distribuição de um
fármaco para determinar a concentração plasmática média expectável
para uma determinada taxa de absorção.
 
Aquando da administração de uma nova quantidade de fármaco por via
intra-venosa, deve-se ter em conta a relação taxa de absorção/taxa de
distribuição – se a absorção for muito rápida em comparação com a
distribuição, as concentrações plasmáticas do fármaco serão
inicialmente mais elevadas, o que poderá despoletar toxicidade
transitória.
 
Efeitos de um fármaco
 
Os efeitos de um fármaco podem ser classificados como imediatos,
tardios ou cumulativos:
 
• Efeitos imediatos: Estes efeitos relacionam-se directamente com
as concentrações plasmáticas do fármaco em questão, embora
nem sempre reflictam a variação de concentrações que se faz
sentir ao longo do dia. De facto, alguns fármacos com um curto
período de semi-vida podem
 
ser administrados apenas uma vez por dia (mantendo os seus
efeitos ao longo do dia), pois atingem uma concentração inicial
muito superior às EC50. Note-se que, quando as concentrações
de um fármaco encontram-se no intervalo entre [0,25xEC50;
4xEC50], a sua relação tempo-efeito expressa-se por uma função
linear.
 
• Efeitos tardios: Estes efeitos ocorrem apenas ao fim de algumas
horas ou dias, devido ao lento turn-over dos produtos resultantes
do metabolismo dos fármacos.
 
• Cumulativos: Estes efeitos resultam da progressiva acumulação
de um fármaco no organismo (ou seja, na maioria das vezes,
apenas se verificam após administração deste fármaco em doses
sucessivas). A título de exemplo, ao acumularem-se no córtex
renal, os aminoglicosídeos induzem necrose tubular aguda. Por
outro lado, os efeitos terapêuticos de vários anti-neoplásicos
também são de cariz cumulativo.
 
 
 
Introdução ao estudo dos fármacos
colinérgicos
 
A acetilcolina é um neurotransmissor extremamente importante, tanto
ao nível do sistema nervoso central como ao nível do sistema nervoso
periférico. Em termos centrais, existem vários neurónios colinérgicos
(por exemplo, ao nível da formação reticular), havendo relação entre a
diminuição da quantidade central de acetilcolina e a doença de
Alzheimer. Já em termos periféricos, a acetilcolina é o neurotransmissor
utilizado nos nervos motores, encarregues da inervação muscular –
assim, ao nível da placa motora, é libertada acetilcolina, que actua em
receptores nicotínicos, induzindo contracção muscular.
 
 
O papel da
acetilcolina no
sistema nervoso
autónomo é mais
complexo. De facto,
tanto os neurónios
pré-ganglionares
simpáticos, como
os neurónios pré-
ganglionares
parassimpáticos,
libertam acetilcolina
para os respectivos
neurónios pós-
ganglionares.
Todavia, enquanto
os neurónios pós-
ganglionares
simpáticos libertam
noradrenalina, os
neurónios pós-
ganglionares
parassimpáticos
libertam também
acetilcolina. Assim,
a acetilcolina
promove a
contracção do
músculo liso
visceral,
desempenhando
efeitos
característicos de
uma resposta
parassimpática
(tais como a
estimulação da
broncoconstrição e
do peristaltismo).
Para além disso, os
neurónios
simpáticos
responsáveis pela
inervação das
glândulas exócrinas
libertam
acetilcolina, que
estimula a
secreção glandular.
 
No que concerne aos efeitos da acetilcolina, destaque ainda para o
facto de esta substância ser vasodilatadora. A acção vasodilatadora da
acetilcolina parece um contra-senso, tendo em conta que este mediador
promove contracção do músculo liso visceral. Todavia, os efeitos
vasodilatadores da acetilcolina são indirectos – a acetilcolina actua em
receptores endoteliais, estimulando a síntese endotelial de NO. Por seu
turno, o NO actua nas células musculares lisas vasculares, onde
apresenta um efeito vasodilatador.
 
A acetilcolina exerce os seus efeitos, através da ligação a duas classes
distintas de receptores – os receptores muscarínicos (receptores M)
devem o seu nome ao facto de também poderem ser activados pela
muscarina, enquanto os receptores nicotínicos (receptores N) são
assim designados por também poderem ser activados pela nicotina. O
nome destes receptores baseia-se meramente em estudos históricos
(até porque não existe muscarina ou nicotina endógena), pois a
acetilcolina constitui o principal ligando endógeno de ambos os tipos de
receptores.
 
Os receptores muscarínicos são exclusivamente expressos ao nível das
estruturas viscerais, nomeadamente, ao nível das glândulas exócrinas,
músculo liso, e endotélio (as respostas ditas “parassimpáticas” são
despoletadas na sequência da activação de receptores muscarínicos).
Em termos moleculares, estes receptores apresentam sete domínios
transmembranares e são do tipo metabotrópico, estando acoplados a
proteína G (a activação destes receptores activa cascatas de
sinalização intracelulares, ou interfere com canais iónicos
membranares). Existem cinco classes de receptores muscarínicos – M1,
M2, M3, M4 e M5. Os receptores M1, M3, e M5 estão acoplados à
proteína Gq, induzindo um aumento dos níveis intracelulares de cálcio.
Por seu turno, os receptores M2 e M4 estão acoplados à proteína Gi,
inibindo a actividade da adenil cíclase. Para além disso, o receptor M2
está acoplado a uma proteína Gi que, quando activada, se liga
directamente a um canal iónico de K+.
 
Já os receptores nicotínicos são exclusivamente expressos ao nível do
músculo esquelético (na placa motora) e nas células cromafins da
medula supra-renal. Estes receptores são do tipo ionotrópico (ou seja,
são constituídos por canais iónicos), apresentando uma estrutura
pentamérica (ou seja, são constituídos por cinco subunidades). Existem
várias subunidades, de cuja interacção resultam múltiplas combinações
– estas combinações de subunidades determinama estrutura e as
propriedades funcionais dos receptores nicotínicos (como, por exemplo,
a permeabilidade ao cálcio). De referir que, em termos moleculares, a
abertura dos canais iónicos associados aos receptores nicotínicos está
dependente da ligação de duas moléculas de acetilcolina às
subunidades α de cada receptor.
 
 
 
A exposição prolongada dos receptores nicotínicos aos seus agonistas
abole a resposta efectora. Isto é, caso um receptor nicotínico neuronal
seja excessivamente activado, o neurónio pós sináptico deixa de
responder; enquanto, a estimulação excessiva de um receptor muscular
leva ao relaxamento do músculo esquelético. Isto acontece porque a
presença continuada de um agonista nicotínico evita a recuperação
eléctrica da membrana pós-juncional. Assim, este efeito de “bloqueio
despolarizante” pode ser utilizado para produzir paralisia muscular.
 
 
Ao nível do sistema nervoso central e dos gânglios autonómicos, ocorre
expressão conjunta de receptores muscarínicos e nicotínicos. Assim,
tendo em conta a enorme diversidade de locais onde são expressos
receptores colinérgicos, a administração de fármacos colinérgicos não-
selectivos poderá causar alterações difusas e muito marcadas na
função de vários sistemas orgânicos. Deste modo, devem ser
escolhidos fármacos com alguma selectividade funcional, a qual pode
ser de vários tipos:
 
1. Existem fármacos que activam selectivamente receptores
nicotínicos ou muscarínicos.
 
2. Existem fármacos que activam preferencialmente um subtipo de
receptores nicotínicos (a título de exemplo, existem fármacos que
activam preferencialmente os receptores nicotínicos musculares,
em detrimento dos ganglionares).
 
3. Devido às suas diferentes propriedades farmacocinéticas, através
da correcta escolha da via de absorção dos fármacos, e possível
obter selectividade farmacocinética. A título de exemplo,
quando se procura obter efeitos centrais, procede-se à
administração de um fármaco com capacidade de atravessar a
barreira hemato-encefálica.
 
Síntese e degradação da acetilcolina
 
A acetilcolina é sintetizada a partir de acetil-CoA e colina, sendo esta
reacção catalisada pela acetiltransférase da colina (ChAT). Esta
enzima encontra-se presente, sobretudo, no citoplasma dos neurónios
colinérgicos, embora a placenta também expresse uma grande
quantidade de ChAT. De referir que, a síntese de acetilcolina é um
processo rápido, mas que pode ser acelerado durante a actividade
nervosa.
 
 
Existem alguns
inibidores da
ChAT (tais como
o bromoacetil-
CoA), embora
estes sejam
deveras pouco
eficazes, uma vez
que o passo
limitante da
síntese de
acetilcolina se
prende com o
transporte de
colina a partir do
meio extracelular.
De facto, devido
ao facto de ser
uma base
quaternária, a
colina difunde-se
muito lentamente
através das
membranas
celulares. Assim,
a maior parte da
colina é captada
para o meio
intracelular,
através de um
transportador
membranar com
elevada afinidade
para esta
substância. Ora,
esse
transportador
pode ser inibido
por compostos
estruturalmente
similares à colina,
tais como o
hemicolíneo-3.
De referir que a
capacidade de
concentrar colina
no interior do
terminal nervoso
revela-se
particularmente
importante em
situações de
maior actividade
nervosa, nas
quais se torna
necessária uma
aceleração da
síntese de
acetilcolina.
 
Para além de poder ser captada a partir do meio extracelular, a colina
pode ser obtida por hidrólise dos fosfolipídeos das membranas
celulares. Já o acetil-CoA, é sintetizado nas mitocôndrias, podendo ser
sintetizado a partir do piruvato ou do acetato.
 
Após ter sido sintetizada, a acetilcolina é armazenada em vesículas
sinápticas. A entrada de acetilcolina para essas vesículas é mediada
por um trocador, o qual é inibido pelo vesamicol. Existem vários tipos
de vesículas de acetilcolina, sendo que algumas constituem vesículas
de reserva – a existência deste tipo de vesículas previne a ocorrência
de depleção de acetilcolina.
 
A libertação de acetilcolina requer a fusão entre a membrana das
vesículas sinápticas e a membrana celular do terminal pré-sináptico. A
ocorrência deste processo está dependente da interacção entre
proteínas vesiculares (tais como a sinaptobrevina) e proteínas da
membrana do terminal (tais como a SNAP-25) – ora, esta interacção é
inibida pela toxina botulínica, que actua através da remoção
enzimática de um ou dois aminoácidos das proteínas do aparelho
exocítico.
 
Após ter sido libertada (e após se ter ligado aos seus receptores pós-
sinápticos), a acetilcolina deverá ser rapidamente removida da fenda
sináptica. Assim, existem três mecanismos envolvidos na remoção
deste neurotransmissor:
 
1. Inactivação enzimática: Ao nível das fendas sinápticas, existe
uma grande quantidade de acetilcolinesterase (ACh-E), que é a
enzima responsável pela hidrólise de acetilcolina em acetato e
colina (a qual pode ser depois captada pelo neurónio pré-
sináptico). A Ach-E é maioritariamente sintetizada ao nível dos
neurónios e dos miócitos, embora também seja expressa por
outras células, tais como os eritrócitos. Para além disso, ao nível
do plasma, fígado, glia, e músculo liso gastro-intestinal, existe
uma colinesterase com menor especificidade para a acetilcolina –
a butirilcolinesterase (BCh-E). O nome da BCh-E advém do
facto de esta enzima conseguir hidrolisar mais rapidamente a
butirilcolina que a acetilcolina. De qualquer modo, o papel
fisiológico da BCh-E permanece ainda amplamente
desconhecido, pensando-se que esta enzima seja importante na
biotransformação plasmática de fármacos.
 
A Ach-E apresenta uma grande eficácia, motivo pelo qual o
processo de inactivação enzimática é o mais importante para
remoção da acetilcolina da fenda sináptica. Assim, os restantes
mecanismos de remoção apenas adquirem maior relevância
aquando da administração de inibidores da ACh-E.
 
2. Recaptação de acetilcolina pelos terminais nervosos: Nas
terminações colinérgicas em repouso, a reciclagem da acetilcolina
libertada ocorre a baixa velocidade. Todavia, na presença de
actividade sináptica, passa se a verificar um aumento da
velocidade de recaptação deste neurotransmissor.
 
3. Difusão de acetilcolina da fenda sináptica.
 
 
 
 
Fármacos de acção colinérgica:
parassimpaticomiméticos
 
Designam-se por parassimpaticomiméticos (ou
acetilcolinomiméticos), todos os agentes capazes de activar os
receptores da acetilcolina ou de inibir as colinesterases. Os fármacos
que se ligam directamente (e activam) aos receptores da acetilcolina
designam-se por parassimpaticomiméticos de acção directa, enquanto
os fármacos que inibem as colinesterases designam-se por
 
parassimpaticomiméticos de acção indirecta.
 
Parassimpaticomiméticos de acção directa
 
Como foi referido anteriormente, os fármacos parassimpaticomiméticos
de acção directa ligam-se e activam receptores nicotínicos e
muscarínicos. Existem duas classes de parassimpaticomiméticos de
acção directa, de acordo com a sua estrutura química:
 
1. Ésteres de colina: Acetilcolina, metacolina, betanecol, carbacol
 
2. Alcalóides: Muscarina, pilocarpina, nicotina, lobelina (os dois
primeiros fármacos apresentam acção predominantemente
muscarínica, enquanto os dois últimos apresentam acção
predominantemente nicotínica).
 
A maior parte dos parassimpaticomiméticos de acção directa é capaz de
se ligar a ambos os tipos de receptores colinérgicos (muscarínicos e
nicotínicos), tal como acontece com a acetilcolina. Todavia, designam-
se por agonistas muscarínicos todos os parassimpaticomiméticos de
acção directa que actuam em receptores muscarínicos, enquanto a
classe dos agonistas nicotínicos inclui todos os
parassimpaticomiméticos de acção directa que actuam em receptores
nicotínicos.
 
De entre os
agonistas
muscarínicos, a
maior
 
 
parte possui fraca
selectividade para
os
 
vários subtipos de
receptores
muscarínicos.
Todavia, os
compostos de
amónio
quaternário têm
alguma afinidade
para o receptor
M1, a arecaidina
possui afinidade
para o receptor
M2, e o betanecol

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