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Direito Empresarial II – Títulos de Crédito Bruno Costa bfabricio_costa@yahoo.com.br TÍTULOS DE CRÉDITO Introdução – Evolução histórica O crédito consiste em um direito a uma prestação futura que se baseia na confiança, tendo como elementos a boa-fé e a concessão de prazo. Ou seja, é o ato de dispor a um terceiro determinado valor, mediante a promessa de recebimento deste valor no futuro. O desenvolvimento dos títulos de crédito decorreu da necessidade de viabilizar a circulação mais rápida de riqueza em relação a obtida com a moeda manual. A utilização obrigatória da moeda como meio de pagamento inviabilizaria a dinâmica da atividade econômica, retardando as operações negociais. O crédito, portanto, impulsionou a economia moderna. O crédito é produtivo e útil na medida em que proporciona a circulação do capital. Os títulos de crédito passam a ser importantes na história, na qualidade de documentos que instrumentalizam o crédito e permitem a sua mobilização com rapidez e segurança. Pode-se considerar os títulos de crédito como instrumentos de circulação de riqueza. Os títulos de crédito surgiram na Idade Média, juntamente com o surgimento do Direito Comercial. O direito cambiário foi dividido pela doutrina em 4 períodos históricos: *Período Italiano: até o ano de 1650. Nesse período as cidades marítimas italianas se destacam, bem como as feiras medievais que atraíam os grandes mercadores da época. Destaca-se o desenvolvimento das operações de câmbio, em razão da diversidade de moedas entre as várias cidades medievais. Surge o câmbio trajetício, através do qual o transporte da moeda num determinado trajeto ficava por conta e risco de um banqueiro. Esse câmbio trajetício se instrumentalizava através de dois documentos: a cautio, apontada como origem da nota promissória, por envolver uma promessa de pagamento (o banqueiro reconhecia a dívida e prometia pagá-la no prazo, lugar e moeda convencionados), e a littera cambii, apontada como origem da letra de câmbio, por se referir a uma ordem de pagamento (o banqueiro ordenava ao seu correspondente que pagasse a quantia nela fixada). *Período Francês: que vai de 1650 a 1848. Nessa fase do direto cambial, surge na França a cláusula à ordem, o que acarretou a criação do instituto do endosso. *Período Alemão, que vai de 1848 a 1930: com a edição da Ordenação Geral do Direito Cambiário, em 1848, que codificou as normas disciplinadoras da cambial, separando-as das normas de direito comum, que regiam as relações jurídicas que permitiram o saque da letra de câmbio. Consolidou-se, portanto, a letra de câmbio especificamente – e os demais títulos de crédito, de forma geral – como instrumento de crédito viabilizador da circulação de direitos. Ademais, nesse período, a legislação cambiária caracteriza-se principalmente pela permanente e crescente preocupação com a proteção do terceiro adquirente da boa-fé para facilitar a circulação do título, que constitui a sua função precípua. *Período Uniforme, que se iniciou em 1930, com a realização da Convenção de Genebra sobre Títulos de Crédito e a consequente aprovação, no mesmo ano, da Lei Uniforme das Cambiais, aplicável às letras de câmbio e às notas promissórias. LUG – LEI UNIFORME DE GENEBRA No ano seguinte, foi aprovada a Lei Uniforme do Cheque. Ambas as leis uniformes genebrinas receberam forte influência da Ordenação Geral Alemã de 1848. O Brasil participou das convenções e aderiu às suas resoluções em 1942. Os decretos nº 57.663/1966 e 57.595/1966 promulgaram as leis uniformes das cambiais e do cheque no Brasil. Ocorre que, desde 1908, o Brasil já tem legislação sobre títulos de crédito. *Decreto 2.044/1908. Esse decreto continua em vigor, exceto quanto ao que estiver em conflito com a LUG e não houver reservas para a aplicação da convenção. O Código Civil de 2002 também disciplinou os títulos de crédito nos artigos 887 a 926. Aplicação da lei específica (LUG) – sem ocorrência de conflito por aplicação do Art. 903 do Código Civil. Art. 903. Salvo disposição diversa em lei especial, regem-se os títulos de crédito pelo disposto neste Código. Conceito de título de crédito: Cesare Vivante definiu Título de Crédito como o “documento necessário para o exercício do direito literal e autônomo, nelemencionado”. Definição do Código Civil: Art. 887 “O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei.” As expressões “necessário”, “literal” e “autônomo” remetem a três princípios do regime jurídico cambial: *Cartularidade *Literalidade *Autonomia Características dos títulos de crédito: Os títulos de crédito são documentos formais – Precisam observar requisitos essenciais previstos em lei. São considerados bens móveis - art. 82 a 84 do Código Civil títulos de apresentação – “Necessários ao exercício dos direitos neles contidos” São títulos executivos por forma do art. 784 do CPC (2015) – Obrigação líquida e certa. Obrigações quesíveis: Cabe ao credor dirigir-se ao devedor para receber a importância. Títulos de resgate – Sua emissão pressupõe futuro pagamento. Título de circulação – Função primordial do título de crédito. Natureza pro solvendo PRINCÍPIOS DO DIREITO CAMBIÁRIO Cartularidade ou Incorporação A cartularidade é a incorporação é a materialização do direito no documento (papel ou cártula). Assim, o direito de crédito somente pode ser exercido com a apresentação do título. *O devedor pode se recusar a pagar se o título não lhe for apresentado. *Quem não está na posse do documento não se presume credor. *O exercício dos direitos representados por um título de crédito pressupõe sua posse. *A execução dos títulos depende da juntada dos documentos originais. Cópia autenticada não é suficiente. (Atenção ao PJE...) *A posse do título pelo devedor presume o pagamento. Obs.: Exceção ao princípio da cartularidade? Duplicatas virtuais - Art. 889, §3º - Código Civil Princípio da Literalidade O título de crédito vale pelo que nele está escrito. A literalidade assegura às partes da relação cambial a exata correspondência entre o teor do título e o direito que ele representa. Em regra, obrigações inseridas em documentos apartados não terão validade na relação cambial. A quitação, ainda que parcial, deve ser representada no próprio título. *Literalidade indireta – Obrigações não contidas expressamente nos títulos. Princípio da Autonomia O direito do legítimo possuidor do título é autônomo ou independente em relação aos possíveis direitos dos anteriores possuidores do título. Cada obrigação contida no título é autônoma, existe por si só, de modo que o adquirente ou portador do título pode exercitar seu direito sem qualquer dependência das outras relações obrigacionais que o antecederam. REsp 190753 / SP: STJ: O aval é obrigação autônoma e independente, descabendo assim a discussão sobre a origem da dívida. Para Waldo Fazzio: “Obriga-se porque assina e pelo que assina”. Para Vivante: “O possuidor de boa-fé exercita um direito próprio que não pode ser restringido ou destruído pelas relações ocorridas entre os possuidores precedentes e o devedor”. As implicações do princípio da autonomia representam a garantia efetiva de circulabilidade do título de crédito. O terceiro descontador não precisa investigar as condições em que o crédito foi transacionado, trazendo segurança às relações cambiais. Vale lembrar que a autonomia não está necessariamente ligada a circulação do título de crédito. ABSTRAÇÃO – A abstração significa a completa desvinculação do título em relação à causa que originou sua emissão, fazendo com que questões relacionadas ao negócio jurídico subjacente não afetem o cumprimento da obrigação do título de crédito. Ex: Tício compra uma máquina de Mévio por 1.000,00 e emite nota promissória para pagamento. Mévio devia Caio +- 1.000,00 e repassou a ele a NP emitida por Tício. Caio poderá cobrar de Tício ainda quehaja nulidade no negócio. A relação de Tício e Mévio não macula a relação de Mévio com Caio e de Caio com Tício. Quando Mévio endossou a NP para Caio, o título se desvinculou da compra e venda da máquina. Para João Eunápio Borges: “Há títulos que, além de autônomos, são abstratos, no sentido de que circulam isolados e desprendidos da causa de que se originaram.” A abstração somente ocorrerá quando houver circulação do título. Distinção entre relação causal e cartular (cambial): As relações causal e cartular não se confundem, embora coexistam harmonicamente porque a criação do título de crédito não implica novação no que se refere à relação causal, vez que esta não se extingue. A relação causal enseja uma ação extracambiária, ao passo que a relação cartular enseja uma ação cambiária. Relação Cambial Relação Cambial Relação Cambial Emissão Endosso B>C Endosso C>D A < > B AB < > C ABC < > D Relação Causal (1) Relação Causal (2) Relação Causal (3) Exceção: a Duplicata, por ser um título causal, mantém vínculo com a causa que a gerou. INOPONIBILIDADE DE EXCEÇÕES A TERCEIROS DE BOA-FÉ A expressão exceção significa defesa em sentido processual. Trata-se da manifestação processual do princípio da autonomia. O executado em virtude de um título de crédito não pode alegar matéria de defesa estranha à sua relação direta com o exequente, salvo, provando a má-fé dele. Ou seja, não pode lhe opor exceções pessoais. Ex. Em embargos do devedor contra a execução promovida por Caio, Tício alega vício na venda feita por Mévio. Essas exceções seriam oponíveis apenas a Mévio. Atenção aos artigos 17 da LUG e 916 do Código Civil! A boa-fé do portador é presumida. No processo caberá ao devedor provar a má-fé e o conluio do portador com o antigo titular. É assegurado ao devedor o direito de questionar eventuais vícios formais do título. Independência Para Tomazette, o princípio da independência significa que o título vale por si só, não precisando ser completado por outros documentos. * Esse princípio não é aplicável a alguns títulos de crédito. Waldo Fazzio chegou a chamar a independência de atributo eventual. Para João Eunápio Borges podemos traduzir a independência por plenitude, em virtude da qual alguns títulos são completos no sentido de se bastarem a si mesmos, sem necessidade e sem possibilidade de qualquer apelo ou remissão a elementos estranhos a eles. CLASSIFICAÇÃO DOS TÍTULOS DE CRÉDITO a) Quanto ao Modelo: Livres: o formato não segue um rigor absoluto. O título pode ser confeccionado da maneira que melhor atenda aos interesses das partes. Ex. Nota promissória. Vinculados: o formato obedece a padrão normativamente estabelecido. Ex.: cheque, duplicata. b) Quanto à Estrutura: Ordem de Pagamento: ordem dada por uma pessoa (sacador) para que outro (sacado) pague ao beneficiário (tomador). Ex.: letra de câmbio. Promessa de Pagamento: relação direta entre o emitente e o beneficiário. Ex.: nota promissória. c) Quanto à hipótese de emissão: Causal (impróprio): somente pode ser emitido para documentar determinadas operações, estando vinculado à sua causa. Duplicata (prestação de serviço e compra e venda). Abstrato (não-causal): pode ser emitido por qualquer causa e não mantém qualquer vinculação com ela. Ex.: cheque, nota promissória. d) Quanto à Circulação: Ao Portador: São os títulos nos quais não consta o nome do beneficiário do direito nele incorporado. É transmitido por mera tradição. Nominal: Conta com o nome do beneficiário. Pode apresentar-se sob a modalidade à ordem (passíveis de serem transferidos por endosso) ou não à ordem (transmitidos por cessão de crédito – nesse caso o cedente se obriga apenas com o cessionário, não em relação aos posteriores possuidores do título). Em outros termos, enquanto o título à ordem se transfere por endosso, o titulo não à ordem transfere-se por cessão civil de crédito. Nominativo: Título cuja transferência se opera mediante termo lavrado em livro próprio, já que é emitido em favor de pessoa cujo nome conste no registro do emitente. – ART. 921 C/C e) Quanto à Pessoa do Emitente: Públicos: Emitidos por pessoa Jurídica de Direito Público Privados: Emitidos por particulares, pessoas físicas ou jurídicas. ENDOSSO: É instituto tipicamente cambial, por meio do qual ocorre a transferência do título de crédito (direito nele mencionado) do endossante (credor) ao endossatário (terceiro). Trata-se de ato cambiário formal, decorrente da declaração unilateral de vontade do credor manifestada no próprio título. Efeitos do Endosso: A) transfere todos os direitos emergentes do título, do endossante para o endossatário (titularidade do crédito). B) o endossante assume a responsabilidade solidária pelo pagamento do título na qualidade de co-devedor. A transferência não é só do crédito, mas também da garantia. Atenção ao art. 914 – CC “Ressalvada cláusula expressa em contrário, constante do endosso, não responde o endossante pelo cumprimento da prestação constante do título.” Tal estitpulação não tem o condão de revogar a lei especial sobre o assunto. O endossante é devedor indireto, solidário e de regresso. O endosso deve ser feito no verso do título, bastando, para tanto, a assinatura do endossante. Caso o endosso seja feito no anverso da cártula, deve conter, além da assinatura do endossante, menção expressa de que se trata de endosso. Cláusula “sem garantia” – Transmissão do título sem garantir o cumprimento da obrigação – Art. 15 da LUG. Proibição de novo endosso – O endossante continua garantindo o título até então. Caso ocorram novos endossos, ele não garantirá o pagamento aos outros endossatários – Art. 15 da LUG. O endosso parcial é nulo – Art. 12 da LUG. Modalidades: • Endosso em Branco: é aquele dado sem a identificação do beneficiário (endossatário). Nesse caso, mesmo vedado por lei o pagamento sem identificação, pode o título circular livremente em branco, desde que, no instante de seu pagamento, seja preenchido. • Endosso em Preto: identifica expressamente a quem está sendo transferida a titularidade do crédito. Espécies de Endosso: *Próprio: tenha como função a efetiva transferência dos direitos emergentes do título de crédito. Poderá ser em branco ou em preto. *Impróprio: o endossante transfere tão somente o exercício dos direitos inerentes ao título, sem que se opere a transferência dos direitos inerentes ao título. Essa espécie de endosso apenas legitima a posse do detentor do título. Tipos de endosso impróprio: 1- Endosso-Mandato: O endossante constitui o endossatário como seu procurador, que passa a ter poderes para a prática de todos os atos necessários para o efetivo recebimento da quantia descrita no título. Poderá cobrar, protestar e executar. Expressão que poderá ser escrita no título: “para cobrança”, “valor a cobrar” ou “por procuração”. 2- Endosso Caução/Pignoratício/Garantia: Espécie por meio do qual o endossante transfere ao endossatário o título apenas como forma de garantir outra obrigação contraída perante o endossatário. Com o pagamento da dívida o título deverá ser resgatado. *ENDOSSO TARDIO OU PÓSTUMO O endosso pode ser dado após o vencimento do título, caso em que produzirá seus efeitos de transferência do crédito e de responsabilização do endossante normalmente. Contudo, caso o endosso seja posterior ao protesto por falta de pagamento, ou após o prazo expirado para o protesto, produz-se apenas os efeitos de uma cessão ordinária de crédito. O endosso feito sem data presume-se feito antes de expirado o prazo de protesto. Nesses termos o art. 20 da LUG, dispõe: Art. 20. O endosso posterior ao vencimento tem os mesmos efeitos que o endosso anterior. Todavia, o endosso posterior ao protesto por falta de pagamento, ou feito depois de expirado o prazo fixado para se fazer o protesto, produz apenas os efeitos de uma cessão ordinária de créditos. Salvo prova em contrário, presume-se que um endosso sem data foi feito antes de expiradoo prazo fixado para se fazer o protesto. ENDOSSO CESSÃO CIVIL *Regime Jurídico Civil *Negócio bilateral. *Cessão ocorre por contrato O cedente somente responde pela existência do crédito. Art. 294 CC – O devedor pode argüir matérias atinentes à sua relação com o cessionário. * Regime Jurídico Cambial *Ato unilateral *Endosso se faz no verso do título. O endossante responde pela existência de crédito e solvência do devedor Aplicação do princípio da autonomia e da inoponibilidade dos terceiros de boa fé
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