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FAZER PRECARIZAR

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Fábio Luís Franco
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FAZER PRECARIZAR: 
neoliberalismo autoritário e necrogovernamentalidade
Fábio Luís Franco*
* Universidade de São Paulo. 
Av. Prof. Mello Moraes, 1721. Cep: 05508-030. Cidade 
Universitária. São Paulo – São Paulo – Brasil. 
fabio.sofia@gmail.com
https://orcid.org/0000-0001-7295-5015
D
O
SS
IÊ
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https://dx.doi.org/10.9771/ccrh.v34i0.44503
Neste artigo, trata-se de explorar as articulações entre necropolítica e gestão neoliberal do trabalho no Brasil. 
Pretende-se sustentar que o neoliberalismo autoritário opera tanto coercitivamente, valendo-se dos aparatos 
de segurança e de justiça, quanto a partir da gestão do sofrimento psíquico e dos processos de subjetivação. 
Para tanto, parte-se da compreensão de que a necropolítica neoliberal envolve, também, intervenções visando 
a fazer precarizar, isto é, a produzir sofrimento nos corpos por meio da administração de condições mortífe-
ras, tal como fica explicito com a plataformização neoliberal do trabalho no Brasil. Por fim, o artigo introduz 
algumas considerações sobre os impactos dessa gestão necropolítica neoliberal da precariedade nas formas 
de subjetivação dos trabalhadores, lançando luz sobre a necrogovernamentalidade neoliberal enquanto ges-
tão das condições de emergência da angústia. 
Palavras-chave: Necropolítica. Neoliberalismo. Plataformização. Trabalho. Angústia.
NECROPOLÍTICA, NEOLIBERA-
LISMO, AUTORITARISMO
Em relação à biopolítica, a necropolítica 
é um conceito êxtimo, ao mesmo tempo inte-
rior e exterior, familiar e estranho, próximo e 
distante. Tal estatuto aparentemente paradoxal 
da necropolítica é derivado, em primeiro lugar, 
do fato de que esse conceito tornou inteligível 
um conjunto de dispositivos de poder-saber 
situados nas margens do sistema produtivo 
global, nas regiões submetidas ao colonialismo 
e ao imperialismo europeu e norte-america-
no, nas áreas de conflito no Oriente Médio, ao 
mesmo tempo que lançou luz sobre a multi-
plicação de enclaves mortíferos no interior dos 
países capitalistas avançados (Mbembe, 2003). 
Em segundo lugar, a extimidade da necropo-
lítica expõe as cesuras, as contradições e os 
limites da alegada hegemonia das tecnologias 
biopolíticas desde o final do século XVIII, da 
qual partia Foucault ao afirmar que “O poder 
já não conhece a morte. No sentido estrito, o 
poder deixa a morte de lado” (Foucault, 1997, 
p. 221, grifos nossos) para se ocupar preferen-
cialmente da gestão da vida e da maximização 
da produtividade vital, tanto do indivíduo vi-
vente quanto das populações.
Não que a biopolítica fizesse tabula rasa 
das presentificações da morte no governo dos 
vivos. “Como exercer o poder da morte, como 
exercer a função da morte, num sistema polí-
tico centrado no biopoder?” (Ibidem, p. 227), 
perguntava Foucault sintetizando o que ele 
considerava ser uma “antinomia central da 
nossa razão política” (Foucault, 2001a, p.1634). 
A despeito das diferenças, pode-se dizer que a 
solução que lhe propuseram alguns dos prin-
cipais representantes da tradição biopolítica 
(Cf. Foucault, 1997; Agamben, 2002; Esposito, 
2004) consistiu em adotar o que os juristas de-
signam como “critério hierárquico”: dissolvia-
-se a antinomia atribuindo ao biopoder um es-
tatuto hierarquicamente superior ao poder da 
morte, cuja existência e funcionamento passa-
vam a ser considerados subordinados às exi-
gências da razão biopolítica. Ao fim e ao cabo, 
restaurava-se a unidade do poder da vida ao 
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mesmo tempo em que se conferia um lugar às 
práticas tanatopolíticas.
Mas, a tanatopolítica não é a necropo-
lítica. Enquanto o primeiro termo, recorrente 
nos teóricos da biopolítica, refere-se à função 
política da morte que tem lugar no governo da 
vida e dos vivos, a necropolítica é o que não 
se subordina ao biopoder – ainda que possa se 
interseccionar com esse –, pois faz da morte do 
inimigo, da destruição do seu corpo, da produ-
ção do cadáver um “objetivo primário e abso-
luto” (Mbembe, 2003, p.12). Nesse caso, não é 
mera nota de rodapé filológica explicitar que 
Thanaton, em grego, é a morte em sua acepção 
mais abstrata, ao passo que Nekron é a morte 
que se faz carne, cadáver.
A necropolítica, portanto, é o poder da 
morte que se exerce sobre e por meio do corpo. 
Dos antigos rituais públicos de suplício no An-
cien Régime aos genocídios da população pre-
ta, indígena, trans no Brasil contemporâneo, a 
necropolítica se conjuga como poder de fazer 
morrer, consequência da cada vez mais pulve-
rizada e repartida decisão soberana sobre o es-
tado de exceção e o abandono da vida nua (Cf. 
Mbembe 2003; Agamben, 2012). Mas, a ne-
cropolítica não se esgota nas formas passadas 
e presentes de exercício da soberania. Além 
dessas, há outras conjugações da necropolíti-
ca: fazer desaparecer, torturar, expor à morte, 
e, também, gerir o sofrimento dos corpos por 
meio da administração de condições mortífe-
ras, como ocorre nas chamadas guerras infra-
-estruturais em que os alvos são os sistemas de 
abastecimento, de circulação e de saúde das 
populações inimigas. No cerco israelense à fai-
xa de Gaza, nas intervenções norte-americanas 
no Iraque, na ocupação armada de territórios 
favelizados, a necropolítica se exerce em nome 
da nova palavra de ordem das guerras contem-
porâneas de contra-insurgência: bomb now, die 
later, de forma que 
não é preciso matar as pessoas, basta provocar o co-
lapso de suas condições de vida. E assim foi feito 
(e estou citando): a destruição sistemática da infra-
-estrutura (eletricidade, abastecimento, água, sane-
amento etc) não caracterizaria bem um bombardeio 
cirúrgico, mas o que um médico norte-americano 
chamou de ‘neurocirúrgico’: com a precisão alardea-
da, as bombas inteligentes arrancaram o cérebro que 
permite a uma população sobreviver. As sanções, 
como o nome indica, fariam o resto do serviço, sem 
falar no rastro radioativo de bombas de urânio em-
pobrecidos, na devastação ecológica etc. Já na guer-
ra cosmopolita seguinte, inverteu-se o raciocínio 
estratégico, embora à procura do mesmo resultado: 
os bombardeios com grafite, por exemplo, visavam 
apagar o sistema elétrico da Sérvia, mas sem destruir 
sua infra-estrutura de base. Tanto num caso como 
no outro, comenta Paul Virilio, ‘a eliminação que se 
busca é sempre a da vida, da vitalidade energética 
do adversário’. Em sua opinião, o modelo de conta-
minação viral e de irradiação atômica ou cibernética 
é patente, ‘já não se trata tanto de fazer explodir uma 
estrutura, mas de neutralizar a infra-estrutura do ini-
migo, criando em seu meio e à sua volta a pane e o 
pânico pela interrupção vital de toda atividade coe-
rente e coordenada’ (Arantes, 2007, p. 61-62). 
Sem possibilidade de circulação, sem 
meios de comunicação, abandonados à fome, 
à sede, às doenças, isolados uns dos outros, 
os indivíduos são reduzidos ao seu corpo e às 
necessidades impostas pelas exigências de so-
brevivência. “Nem a vida nem a morte, mas a 
produção de uma sobrevivência modulável e 
virtualmente infinita constitui a tarefa decisi-
va do biopoder em nosso tempo”, constatava 
Agamben (2008, p. 156) após ser conduzido 
pelos relatos dos sobreviventes de Auschwitz 
ao longo daquela zona cinzenta em que se pro-
duzia “em um corpo humano a separação ab-
soluta entre o ser vivo e o ser que fala, entre a 
zoé e o bios, o não-homem e o homem: a so-
brevivência” (Ibidem, p. 156). As guerras con-
temporâneas continuam a deslocar o limitar 
móvel da sobrevivência até encontrar o ponto 
de indiferenciação entre o ser vivo e o cadá-
ver, a vida orgânica e os sinais que indicam a 
presença da morte, de forma lançar permanen-
temente a sombra ameaçadora da aniquilação 
sobre as existências que lutam por sobreviver, 
o que, como veremosa seguir, é a condição 
fundamental para a emergência da angústia.
Intervenções necropolíticas “neuroci-
rúrgicas” desta natureza não são exclusividade 
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das guerras e campanhas militares conduzidas 
por Estados visando à neutralização de popu-
lações inimigas. Transformada em uma com-
modity, a morte mobiliza uma rede de micro-
-governos, que mantém entre si e com o Estado 
relações múltiplas e polimorfas, cujos lucros 
são obtidos por meio de atividades direta ou 
indiretamente ligadas a uma economia necro-
política (Cf. Mbembe, 2012, p. 137). A explora-
ção do poder da morte enriquece grupos arma-
dos locais, milícias, formações paramilitares, 
companhias privadas de segurança, forças es-
tatais de repressão, indústrias bélicas, agências 
funerárias particulares…e, também, empresas 
neoliberais. Por mais contra-intuitivo que pos-
sa parecer em um primeiro momento, encon-
tram-se nos manuais de gestão empresarial do 
trabalho algumas daquelas mesmas estratégi-
cas necropolíticas de criação da pane e do pâ-
nico pela destruição sistemática das condições 
de vida dos trabalhadores. A incorporação 
dessas intervenções “neurocirúrgicas” faz com 
que o neoliberalismo utilize uma nova forma 
de dominação pela ameaça da precarização 
(Cf. Dejours, 2007, p. 52), “precarização que 
não concerne apenas ao emprego, mas também 
a toda a condição social e existencial” (Ibidem, 
p. 124). Fazer precarizar se torna, portanto, a 
máxima que orienta a ação da necropolítica e a 
partir da qual se pode alcançar dimensões me-
nos evidentes do neoliberalismo autoritário. 
BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE 
O CONCEITO DE PRECARIADO
É verdade que a experiência da precari-
zação é vivida diferentemente de acordo com 
o gênero, a raça,1 a idade, a trajetória profissio-
nal do indivíduo, bem como depende do aces-
so ou não às políticas sociais, das condições 
1 As dimensões de gênero e racial são elementos centrais 
para análise dos processos de precarização e suas incidên-
cias diferenciais sobre a população brasileira. No entanto, 
lamentavelmente, não conseguiremos aprofundar neste ar-
tigo a discussão sobre tais dimensões, que serão tratadas em 
textos futuros. Aproveito para agradecer profundamente ao 
parecer que destacou a importância epistêmica da questão 
racial para a economia argumentativa deste trabalho.
familiares e comunitárias que o rodeiam, den-
tre outros fatores. Contudo, esse tipo de res-
salva, ainda que legítima, pode contribuir para 
fortalecer ainda mais a ideologia neoliberal que 
esvazia a precarização do seu caráter estrutural 
para transformá-la em um modo de ser referido 
exclusivamente ao indivíduo, o qual assume a 
inteira responsabilidade de superá-la por meio 
de esforços e estratégias igualmente individu-
ais. Para não reproduzir essa ideologia, é essen-
cial insistir em uma abordagem da precarização 
que leve em conta seus aspectos estruturais, 
sem, com isso, negligenciar as refrações sin-
gulares, histórica, geográfica e subjetivamente 
situadas, que incidem sobre o fenômeno. 
No âmbito deste artigo, o processo de 
precarização é compreendido como parte 
constitutiva do modo de produção capitalista 
e da mercantilização da força de trabalho (Cf. 
Braga, 2012). Não era outra coisa que Marx 
([1867] 2013) anunciava ao expor a relação 
do crescimento da ocupação industrial com a 
aparentemente paradoxal emergência de uma 
população de trabalhadores excedentes em re-
lação à necessidades atuais do mercado, mas 
dos quais se poderia dispor virtualmente. 
No caso do Brasil, a formação do preca-
riado recua até os tempos iniciais da industria-
lização fordista do país (Cf. Braga, 2012) nos 
anos 1950, cujo crescimento se alimentou da 
imigração da força de trabalho precarizada 
oriunda do campo, das pequenas cidades e do 
Nordeste, principalmente. Esses trabalhadores 
participaram da primeira formação do preca-
riado brasileiro, que, na esteira das considera-
ções de Marx sobre a “superpolução relativa” 
(Marx, 2013, p. 718), Braga (2012, p. 16) define 
como uma parcela do proletariado na qual se 
reúnem: 1) os trabalhadores flutuantes, inse-
ridos em relações de trabalho intermitentes e 
submetidos à altíssima rotatividade de ocupa-
ções em razão de serem semi – ou não qualifi-
cados; 2) a população latente, que se localiza 
nas fronteiras entre as ocupações formais e in-
formais, como, por exemplo, os trabalhadores 
rurais que chegam à indústria; 3) a população 
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estagnada, que “se reproduz de forma anormal” 
devido às sub-remunerações e às condições 
degradantes de trabalho e de existência. Em 
suma, precarizados são, portanto, os setores 
proletários mais explorados, “em permanente 
trânsito entre a possibilidade de exclusão so-
cioeconômica e o aprofundamento da explo-
ração econômica” (Ibidem, p. 17), espoliados 
dos direitos trabalhistas e sociais, e carentes 
de acesso à representação sindical ou que, na 
melhor das hipóteses, estão vinculados a sin-
dicatos extremamente frágeis. Desse recorte, 
ressalva Braga (2012, p. 26), estão excluídos 
os setores mais qualificados do proletariado e, 
portanto, mais estáveis e melhor remunerados, 
e o lumpemproletariado, que não ocupa fun-
ções essenciais para a reprodução capitalista.
Enfatizar a pré-existência histórica do 
precariado e da precarização não significa dis-
solver a particularidade dessa camada social, 
enfraquecendo ou até implodindo sua efetivi-
dade heurística para expôr as novas contradi-
ções da estrutura capitalista neoliberal.2 Se o 
precariado não é nem novo, nem uma classe 
em si mesmo, suas configurações e dinâmicas 
se alteraram radicalmente sob efeito das mu-
tações nos modos capitalistas de produção e 
suas consequências sobre o proletariado. Sem 
entrarmos nos detalhes desse diagnóstico, in-
teressa-nos apenas destacar que, no Brasil, o 
aprofundamento da precarização pela adoção 
de medidas neoliberais a partir dos anos 1990 
empurrou gradativamente o precariado da in-
dústria e do trabalho formal para a esfera dos 
serviços, onde aderiu à informalidade, à sub-
contratação ou às formas de terceirização, com 
remunerações ainda mais baixas, maior des-
proteção social e trabalhista, e intensa inse-
gurança existencial, potencializada, como ví-
nhamos dizendo, por medidas necropolíticas 
neoliberais de mercantilização territorial – que 
implica a gentrificação e processos de deslo-
2 Essa é a principal crítica que Giovanni Alves endereça à 
definição de precariado construída por Ruy Braga: https://
blogdaboitempo.com.br/2013/07/22/o-que-e-o-precariado/. 
Para uma discussão mais aprofundada, recomendamos “Di-
mensões da Precarização do Trabalho”, do mesmo Alves. 
camento forçado –, de destruição do sistema 
de assistência e saúde públicas, de redução ou 
desmantelamento dos benefícios sociais, pre-
videnciários e laborais.
De lá pra cá, a precarização do trabalho 
apenas se agudizou, principalmente após a 
reforma trabalhista, ocorrida no governo Mi-
chel Temer, e a macabra associação do bolso-
narismo com os efeitos da pandemia do CO-
VID-19. Segundo dados da Pesquisa Nacional 
por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, 
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatís-
tica (IBGE), referente ao trimestre encerrado 
em janeiro de 2021, a população ocupada no 
Brasil aumentou 2% em relação ao trimestre 
anterior, dos quais 81% corresponde às ocu-
pações informais (Cf. Carneiro, 2021). Com 
isso, o número de trabalhadores informais no 
país alcançou 34.148 milhões de brasileiros, 
39,7% do total da população ocupada (Car-
neiro, 2021). Já o trabalho intermitente, criado 
pelas reformas da CLT, corresponde atualmen-
te à modalidade de contratação preferida das 
empresas brasileiras, submetendo milhares de 
pessoas a jornadas de trabalho indefinidas e, 
consequentemente,a ganhos variáveis, o que 
aprofunda o sentimento de insegurança exis-
tencial (Cf. Braga, 2021). 
Face a tal conjuntura, não obstante as 
ressalvas de Braga, é possível supor uma am-
pliação dos precarizados no sentido de abarcar 
alguns setores pauperizados, particularmente 
aqueles que Marx (2013, p 719) alocava nas 
categorias dos que podem ser absorvidos pelo 
exército ativo. De fato, as modalidades intermi-
tentes do trabalho, nas quais estão incluídas, 
como veremos, os trabalhadores de entregas por 
aplicativo, suspendem a distinção entre preca-
riado e pauperizado como efeito da suspensão 
entre tempo de trabalho e tempo sem trabalho, 
como se estivéssemos diante da substanciali-
zação antinômica de um empregado-desem-
pregado, cuja transição para um polo ou outro 
depende das decisões das empresas-aplicativo 
escondidas sob a máscara dos algoritmos. 
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FOME! 
“Fome!” é o grito de ordem do Movimen-
to dos Entregadores Antifascistas,3 um movi-
mento de abrangência nacional que reúne tra-
balhadores de entregas por aplicativo. Mais 
explicitamente do que nas reivindicações por 
melhorias salariais ou pelo reconhecimento de 
direitos que marcaram os movimentos operá-
rios nas últimas décadas, o gatilho para a atual 
mobilização dos trabalhadores de aplicativo 
vem das entranhas dos corpos famintos que 
se tornaram os principais responsáveis pela 
distribuição de alimentos durante a pandemia 
do novo Coronavírus. “O que me revoltava era 
trabalhar carregando comida nas costas de bar-
riga vazia” (Lima apud Soprana, 2020, sp), sin-
tetiza Paulo Roberto da Silva Lima, o “Galo”, 
um dos principais mobilizadores do movimen-
to de entregadores por aplicativo. 
“Fome!”. A esse primeiro grito, outros se 
fazem escutar: “sede!”, “dor!”, “frio”. Enquanto 
os lucros das empresa por aplicativo têm au-
mentado desde o início do isolamento social 
no Brasil,4 os trabalhadores de plataforma vi-
ram seus salários caírem progressivamente, 
dificultando ainda mais a conquista do míni-
mo necessário para sobreviver. De acordo com 
uma pesquisa (Cf. Abílio et al., 2020) coorde-
nada pela Rede de Estudos e Monitoramento 
da Reforma Trabalhista (Remir Trabalho) e 
publicada em agosto de 2020, na qual foram 
entrevistados 252 trabalhadores de quatro dis-
tritos brasileiros, 60,3 por cento relataram que-
da na receita em comparação com o período 
pré-pandêmico, enquanto apenas 10,3% decla-
raram que estão ganhando mais dinheiro agora 
do que antes. Entre os entrevistados, 35,7% re-
lataram ganhar menos de R$ 260 por semana, 
o que representa duas vezes mais trabalhado-
3 https://brasil.elpais.com/brasil/2020-06-28/galo-lanca-a-
-revolucao-dos-entregadores-de-aplicativo-essenciais-na-
-pandemia-invisiveis-na-vida-real.html
4 A Rappi, uma das empresas-aplicativo de entrega, diz ter 
crescido cerca de 300% justamente no período inicial do 
isolamento imposto pela pandemia do novo Coronavírus 
(https://www.youtube.com/watch?v=fWnnD2V1IFE - últi-
mo acesso em 10.07.2020). 
res nessa faixa de remuneração do que antes 
da crise disparada pelo COVID-19. Nesse cená-
rio, mais trabalho não significa mais dinheiro, 
pois 56,4% dos entrevistados que trabalham 
mais de 9 horas por dia vêm sofrendo uma 
redução de 66,65% em seus ganhos quando 
comparados com o período anterior à pande-
mia. Além dessa queda na receita, 62,3% dos 
trabalhadores entrevistados afirmaram nunca 
ter recebido das empresas onde trabalham ne-
nhum tipo de equipamento para se proteger da 
contaminação do vírus. Por isso, alguns deles 
decidiram pagar por suas próprias medidas de 
cuidado sanitário, como usar máscaras e luvas, 
levar desinfetante para as mãos e manter dis-
tância de segurança na entrega dos produtos.
“Fome!” porque o trabalhador perdeu seus 
laços de pertencimento a uma classe para ser re-
duzido ao seu corpo, sobre o qual pesa perma-
nentemente a ameaça da aniquilação. “Fome!”
A ECONOMIA NECROPOLÍTICA DA 
PLATAFORMIZAÇÃO DO TRABALHO
Os trabalhadores por aplicativo estão 
na vanguarda da precarização neoliberal do 
trabalho. Desde que deixou a idealidade dos 
manuais de teoria econômica para ser testado 
em contextos nacionais tomados como labo-
ratórios políticos a partir dos anos 1970, nos 
quais precisou assumir configurações híbridas 
e flexíveis (Cf. Ong, 2007; Andrade, 2019), o 
neoliberalismo se apresentou como uma ra-
cionalidade governamental com pretensão de 
integrar todas as esferas da existência humana 
segundo os princípios gerais da concorrência 
e do empreendedorismo (Cf. Dardot e Laval, 
2009; Foucault, 2004).
Para tanto, não era suficiente estruturar 
a ação dos governos de modo a garantir a au-
tonomia do mercado, ainda que às expensas 
do próprio Estado e, principalmente, dos seus 
aparelhos de segurança, de legislação e de jus-
tiça; fazia-se igualmente necessário governar 
as condutas dos indivíduos, no sentido que
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O termo “conduta”, apesar da sua natureza equí-
voca, talvez seja um daqueles que melhor permite 
atingir aquilo que há de específico nas relações de 
poder. A “conduta” é, ao mesmo tempo, o ato de 
“conduzir” os outros (segundo mecanismos de coer-
ção mais ou menos estritos) e a maneira de se com-
portar num campo mais ou menos aberto de possibi-
lidades. O exercício do poder consiste em “conduzir 
condutas” e em ordenar a probabilidade. O poder, 
no fundo, é menos da ordem do afrontamento entre 
dois adversários, ou do vínculo de um com relação 
ao outro, do que da ordem do “governo” (Foucault, 
1995, p. 288).
Para governar é preciso administrar a li-
berdade, gerir a incondicionalidade do desejo 
por meio de um princípio de cálculo econômi-
co que precisa ser internalizado pelos indiví-
duos. A governamentalidade neoliberal depen-
de, portanto, de um 
profundo trabalho de design psicológico, ou seja, de 
internalização de predisposições psicológicas visan-
do a produção de um tipo de relação a si, aos ou-
tros e ao mundo guiada através da generalização de 
princípios empresariais de performance, de inves-
timento, de rentabilidade, de posicionamento, para 
todos os meandros da vida. Desta forma, a empresa 
poderia nascer no coração e mente dos indivíduos 
(Safatle, 2021, p. 23). 
Ou, mais explicitamente, os indivíduos 
mesmos deveriam se identificar com essa em-
presa. Nesse sentido, é preciso insistir que as 
dimensões autoritárias do neoliberalismo não 
se revelam apenas nas intervenções coercitivas 
do Estado e dos seus mecanismos, mas, tam-
bém, nos dispositivos governamentais visando 
à produção do consenso e o engajamento dos 
indivíduos. Em uma palavra, ao se tratar do 
neoliberalismo autoritário não se pode perder 
de vista seus efeitos sobre a economia libidi-
nal dos sujeitos, sobre a forma como esses in-
vestem determinadas relações e internalizam 
padrões ideais de conduta que pretendem nor-
malizar as escolhas e decisões a partir do pa-
radigma da empresa capitalista. Nesse sentido, 
Safatle insiste que 
(…) a empresa não é apenas a figura de uma forma 
de racionalidade econômica. Ela é a expressão de 
uma forma de violência. A competição empresarial 
não é um jogo de críquete, mas um processo de re-
lação fundado na ausência de solidariedade (…), no 
cinismo da competição que não é competição algu-
ma (…), na exploração colonial dos desfavorecidos, 
na destruição ambiental e no objetivo monopolista 
final (2021, p. 25). 
A violência impingida por meio dos 
processos de subjetivação neoliberais não se 
dissocia daquela efetivada pelo uso das forças 
de segurança e dos aparatos de justiça. Antes, 
entre uma e outra se estabelece uma série de 
alianças, sobreposições, compromissos. Por 
exemplo, quando a internalização de padrões 
de conduta e avaliação não é suficiente para 
colocaros sujeitos nos trilhos do mercado, a 
polícia é sempre o recurso suplementar à mão 
que intervém para salvar “os cidadãos de bem” 
das ameaças dos “vagabundos”. Portanto, in-
sistamos uma vez mais que o neoliberalismo 
autoritário precisa ser tomado como uma for-
ma de racionalidade que se impõe – e busca 
conquistar adesão – pelo uso da violência de 
Estado associado ao recurso às violências de 
mercado, que incidem tanto sobre os corpos 
quanto sobre as subjetividades. 
Voltando a esse último aspecto, o do de-
sign psicológico, é preciso levar em conta que, 
contemporaneamente, também participam da 
formação dos ideais empresariais com os quais 
os trabalhadores se identificam as chamadas 
empresas-aplicativo, representadas por Uber, 
Rappi, Ifood, James, Loggi, Amazon Mechani-
cal Turk, PiniOn, Freelancer, 99Designs et ca-
terva.
Apesar de relativamente recentes no 
mercado global, essas empresas fazem avançar 
para novos setores do mercado um conjunto 
de mudanças no mundo do trabalho que ante-
cede a sua versão atual sob empuxo e impacto 
dos aplicativos: a terceirização, os serviços de 
venda direta e as formas estruturantes da ex-
ploração do trabalho nas áreas periféricas do 
capitalismo (Cf. Abílio, 2019a). 
As pesquisas em sociologia do trabalho 
vêm cunhando diferentes conceitos para en-
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quadrar tais mudanças.5 A perspectiva assu-
mida por este trabalho situa-se entre as teorias 
sobre a plataformização do trabalho (Cf. Ca-
silli; Posada, 2019), entendida como um com-
plexo processo global de renovação da forma 
de gestão, controle e expropriação do trabalho 
por meio de dispositivos digitais de gestão al-
gorítmica de dados. Se optamos por utilizar 
a expressão dispositivos digitais, ao invés de 
simplesmente falarmos em aplicativos ou pla-
taformas, é para enfatizar que a plataformiza-
ção não se reduz a uma transformação de or-
dem tecnológica com vistas a renovar os meios 
de gestão do trabalho. Para além de um mero 
efeito de desenvolvimento técnico, a platafor-
mização é mais propriamente um dispositivo, 
no sentido que Foucault constrói para este ter-
mo. Primeiramente, o dispositivo é uma rede 
mutável e heterogênea, “(...) comportando dis-
cursos, instituições, projetos arquiteturais, de-
cisões regulamentares, leis, medidas adminis-
trativas, enunciados científicos, proposições 
filosóficas, morais, filantrópicas, em suma: 
tanto o dito quanto o não dito, eis os elemen-
tos do dispositivo” (Foucault, 2001b, p. 299). 
Nessa rede, eis o segundo aspecto destacado 
pelo filósofo francês, os fios que a tecem po-
dem estabelecer entre si nós variáveis, crian-
do, assim, novas conexões ou desfazendo as já 
existentes. Assim, a uma lei pode se conectar 
uma instituição e um discurso científico, por 
exemplo, ou a esse último podem se vincular 
projetos arquitetônicos e tecnologias variadas, 
“Em suma, entre esses elementos, discursivos 
ou não, existe como que um jogo, mudanças de 
posição, modificações de funções, que podem, 
eles também, ser muito diferentes “(Ibidem, 
p.299). Finalmente, o dispositivo é, a cada mo-
mento histórico, a resposta a um imperativo de 
urgência. Assim, “o dispositivo tem uma fun-
ção estratégica dominante” (Ibidem, p.299). 
Não é possível compreendê-lo adequadamen-
te, portanto, se o abstraímos das relações de 
5 Tais como uberização, capitalismo de plataforma, traba-
lho sob demanda, entre outras. Não discutiremos neste 
texto as continuidades, as rupturas e os debates travados 
entre essas distintas abordagens teóricas. 
poder nos quais ele está inscrito. Contudo, a 
realização dessa função estratégica não é es-
tática e unívoca, pois não só as urgências se 
transformam, mas o próprio dispositivo não é 
capaz de dominar todos os seus efeitos. Aqui, 
Foucault leva a meta-estabilidade inerente ao 
dispositivo para o campo das suas produções: 
“já que cada efeito, positivo e negativo, deseja-
do ou não desejado, vem entrar em ressonân-
cia ou em contradição com os outros, e pede 
a uma retomada, a um reajustamento dos ele-
mentos heterogêneos que surgem aqui e ali” 
(Foucault, 2001b, p. 299). Assim, se por um 
lado há sempre um processo de “sobredeter-
minação funcional” do dispositivo, por outro 
lado isso exige um perpétuo “processo de re-
alização estratégica”, isto é, de recomposição 
do dispositivo de modo a capturar estrategica-
mente os efeitos residuais da sua própria ação.
Tomada como um dispositivo, a plata-
formização do trabalho envolve uma rede he-
terogênea e meta-estável de poderes e saberes 
– tecnologias, enunciados psicológico-morais, 
ações estatais, legislações, dados, algoritmos, 
inteligência artificial etc – associada estrategi-
camente à racionalidade neoliberal, ao autori-
tarismo e à financeirização do capitalismo.
Esse processo não se dá de maneira ho-
mogênea em todas as ramificações das ativida-
des laborais. Nos próximos parágrafos, nossa 
análise se concentrará no que se designa como 
“plataformas que requerem o trabalhador em 
uma localização específica” (Ghroman, 2020, 
p. 113) ou “plataformas de trabalho territorial” 
(Braga, 2021), as quais incluem os chamados 
aplicativos de entrega e transporte.6 Apesar 
dessa circunscrição de escopo, algumas das 
características desse tipo de plataforma podem 
ser encontradas, com variações, em outros. 
6 Além destas, Grohman identifica “ii) plataformas de mi-
crotrabalho ou crowdwork (como Amazon Mechanical 
Turk, PiniOn, MicroWorkers), marcadas principalmente 
pelo trabalho de treinar dados4 para a chamada “inteligên-
cia artificial”5; iii) plataformas freelance, de clou- dwork 
ou macrotrabalho (como GetNinjas, WeDoLogos, Freelan-
cer, iPres- tador, Fiver, 99Designs), que reúnem tarefas des-
de pintura e passeio com animais até design e programa-
ção” (2020, p. 113). 
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No discurso da plataformização,7 não 
existe mais a figura do trabalhador coberto por 
direitos e garantias que limitavam minima-
mente sua relação com o capital; em seu lugar, 
surge o “parceiro” das empresas- aplicativo, 
ao mesmo tempo consumidor das tecnologias 
necessárias para a realização da sua ativida-
de e prestador de serviços sob demanda para 
clientes anônimos. Entre parceiros e empresas 
a única relação que existe é a do livre contrato 
de adesão às cláusulas de cadastramento nos 
aplicativos. Após baixar o app, enviar os docu-
mentos solicitados e assinar o contrato – ainda 
estamos na gramática da plataformização –, 
o “parceiro” conquista a esperada autonomia 
laboral: sem chefe e hierarquias, sem jornada 
de trabalho pré-estabelecida, ele se supõe um 
empresário-de-si à espera de pedidos encami-
nhados por uma multidão de consumidores-a-
valiadores. Para receber estrelas, elogios e gor-
jetas – as quais vêm se tornando elemento es-
sencial para a composição da renda mensal –, 
o trabalhador precisa desenvolver estratégias 
pessoais que garantam níveis ótimos de perfor-
mance na concorrência com seus colegas pla-
taformizados. Tais estratégias envolvem ofe-
recer facilidades para os consumidores, como 
água, balas, carregadores de celular; estar 
atento aos avisos dos aplicativos sobre preço 
dinâmico, eventos e outras situações que po-
dem fazer a demanda crescer em determinados 
momentos e em regiões específicas; interpretar 
os sinais dos consumidores para saber orientar 
seu próprio comportamento, por exemplo, evi-
tando falar ou, ao contrário, sendo conversati-
vo, adotando uma postura mais ou menos for-
mal, aproximando-se ou mantendo distância 
no momento da entrega; cometer infrações no 
trânsito, dirigindo pela contramão, avançando 
o sinal vermelho do semáforo ou conduzindo o 
veículo ou a bicicleta em alta velocidade, para 
realizar mais pedidos em menos tempo ou para 
entregar um alimento ainda fresco ao cliente;7 No que segue, baseamo-nos em um conjunto de traba-
lhos, particularmente em Abílio (2020,2019a), Van Doorn 
(2017) e Grohman (2020). 
expor-se permanentemente a perigos decor-
rentes do comportamento de risco no trânsito 
ou daqueles derivados da própria execução da 
atividade por longos períodos de tempo.8 Os 
muitos obstáculos e problemas que surgem no 
cotidiano do trabalho são assumidos integral-
mente pelo trabalhador-parceiro, que se encar-
rega dos ônus e custos decorrentes de aciden-
tes de trânsito, doenças ocupacionais, assaltos 
e furtos, pane nos veículos, obsolescência ou 
quebra do aparelho celular, problemas de co-
nectividade com a internet etc. 
Após a adesão ao contrato, a comunica-
ção entre o plataformizado e a empresa -apli-
cativo se limita a notificações e a algumas 
mensagens automáticas. Afora essas situações 
pontuais, o contato com a empresa é experi-
mentado pelo trabalhador como uma tarefa de 
Sísifo, sempre diferida por ligações que não 
se completam, emails que são respondidos 
automaticamente ou pela série incontável de 
mediadores terceirizados que trabalham para 
as empresas fornecendo explicações padroni-
zadas para as interrogações que recebem dos 
trabalhadores. 
As enormes limitações interpostas pelos 
aplicativos na comunicação com os seus “par-
ceiros” constituem apenas uma das muitas es-
tratégias de imunização (Cf. Van Doorn, 2017, 
p. 902) adotadas pelas empresas para se pro-
teger de obrigações trabalhistas asseguradas 
pelas legislações, deslocando para cada traba-
lhador os ônus e custos derivados do exercí-
cio do seu trabalho. Outra dessas estratégias 
imunizatórias é a governança algorítmica dos 
trabalhadores por meio da qual as empresas 
conseguem um máximo de controle e gestão 
do trabalho, dos fluxos entre oferta e deman-
da, das informações e dados, com um mínimo 
de visibilidade, uma vez que as bonificações, a 
oscilação no valor dos pagamentos, as frequen-
tes incoerências no sistema de distribuição de 
8 A respeito dos impactos da plataformização sobre a saú-
de física dos entregadores, recomendo aos leitores acom-
panharem os desdobramentos da pesquisa doutoral de 
Eduardo Rumenig, a quem agradeço pela sempre generosa 
partilha de reflexões. 
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pedidos e, inclusive, as arbitrariedades na de-
finição de suspensões e cancelamentos de con-
tas podem ser atribuídas à calculabilidade de-
sinteressada dos softwares (Cf. Pasquale, 2015; 
Bucher, 2017). 
No dia-a-dia das entregas e serviços pla-
taformizados, o mal-estar dos trabalhadores re-
vela a distância entre o ideal do empresário de 
si e as condições efetivas de trabalho. A queda 
progressiva dos valores pagos por quilômetro 
rodado enquanto se aumenta o tempo de espe-
ra por pedidos, as punições inexplicáveis, os 
riscos potencializados pelo contexto epidêmi-
co, a necessidade de se cadastrar em mais de 
um aplicativo para garantir algum rendimento 
mensal – abaixo do suficiente –, as jornadas de 
trabalho que facilmente excedem dez horas di-
árias, os custos de manutenção dos equipamen-
tos e instrumentos de trabalho, a sensação de 
que não se é ouvido nem reconhecido pela em-
presa, o sentimento de “estar batendo a cabeça” 
sozinho, os desgastes físicos sentidos no próprio 
corpo e no dos colegas, sem conseguir acesso fá-
cil a banheiro, passando sede e fome, por esses e 
outros fatores, os plataformizados são mais pro-
priamente autogerentes subordinados, 
no sentido de que, submetido a um gerenciamento 
obscuro e cambiante que define/determina quanto 
ele pode ganhar e quanto tempo terá de trabalhar 
para tanto, o trabalhador estabelece estratégias de 
sobrevivência e adaptação, visando ao mesmo tem-
po decifrar, adequar-se à e beneficiar-se da forma 
como o trabalho é organizado, distribuído e remu-
nerado. Essas estratégias também são previsíveis e 
integráveis à gestão. É preciso considerar ainda que 
o trabalhador não tem poder algum de interferên-
cia – nem mesmo de negociação – sobre as regras 
de distribuição e remuneração do trabalho (Abílio, 
2020, p. 19-20).
Essas “estratégias de sobrevivência e 
adaptação”, no entanto, são vendidas pela 
“ideologia do Vale do Silício” (Schradie, 2017) 
como uma “ferramenta de liberdade” (Srnicek, 
2016, p. 85), que contribui para engajamento 
de um número crescente de trabalhadores em 
atividades laborais plataformizadas. No Brasil, 
segundo dados da PNAD, até o início de 2019, 
3,8 milhões de brasileiros utilizavam platafor-
mas digitais como fonte de renda, transforman-
do-as “no maior empregador do Brasil” (Esta-
dão Conteúdo, 2019). Se levarmos em conta as 
pessoas que utilizam essas plataformas como 
fonte complementar, os índices sobem para 17 
milhões de trabalhadores em 2019, a partir de 
pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva 
(Estadão Conteúdo, 2019). É provável que a 
histórica crise social resultante da epidemia do 
novo Coronavírus esteja impulsionando ainda 
mais o uso dos aplicativos como fonte prioritá-
ria ou complementar de renda familiar.
Nesta “multidão de trabalhadores dispo-
níveis” (Abílio 2020, p. 112) reside outro ele-
mento responsável pela gestão plataformizada 
da precarização: trata-se de suscitar no traba-
lhador a permanente sensação de superfluida-
de e obsolescência na medida em que sua força 
de trabalho é facilmente substituível por qual-
quer outra que, na superpolução relativa sem-
pre crescente de plataformizados, aguarda seu 
lugar ao sol, ou melhor, seu lugar em algum 
ponto entre as milhares de conexões algorítmi-
cas que levarão seu celular a tocar, finalmente! 
(Cf. Van Doorn, 2017). 
A precarização do trabalho esteve na 
agenda do neoliberalismo desde seus primór-
dios. Ela é, a um só tempo, condição e efeito 
necessário da sobreposição de medidas legal-
mente asseguradas visando, por um lado, à 
promoção da competitividade internacional, 
da concorrência nacional de forma a estimu-
lar o fluxo de capital financeiro, da propaga-
ção da forma-empresa para todas as esferas de 
atividades humanas, incluindo o próprio Esta-
do, e, por outro lado, à eliminação de direitos 
trabalhistas e sociais, principais responsáveis, 
segundo o credo neoliberal, pela crise global. 
Para a massa de precarizados, existem, 
de um lado, as ofertas de trabalho precário, 
temporário e informal, associadas ao restritís-
simo acesso ao que restou das políticas sociais 
emergenciais, e, do outro lado, a coerção esta-
tal, na forma da polícia ou das instituições do 
sistema de justiça, responsável pela repressão 
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aos movimentos que se interpõem à lógica neo-
liberal do mercado e pelo controle punitivista e 
carcerário da pobreza. Como temos enfatizado, 
o neoliberalismo autoritário se efetiva, então, 
como gestão da precariedade do corpo do tra-
balhador, ameaçando-o com espectro da obso-
lescência e da impossibilidade de sobreviver, e 
como poder repressor associado ao Estado.
Para encerrar esta sucinta introdução à 
necropolítica da plataformização, é essencial 
desvelar o viés racial e de gênero (Cf. Srnicek, 
2017, p. 83; Van Doorn, 2017) que sustenta e 
simultaneamente é reforçado por esses novos 
dispositivos de gestão e subsunção do traba-
lho. Com efeito, em primeiro lugar, a platafor-
mização dá visibilidade a um conjunto de ele-
mentos intrínsecos às formas de organização 
do trabalho periférico, sobretudo do trabalho 
feminino das mulheres negras periféricas (Cf. 
Abílio, 2019b); e, em segundo lugar, a mas-
sa dos trabalhadores de aplicativo no Brasil 
é composta por jovens negros periféricos, no 
caso dos apps de entrega, e por mulheres ne-
gras periféricas, quando se trata dos aplicati-
vos que oferecem “serviços domésticos”. Se, 
historicamente, a necropolítica incidiu de 
forma privilegiada no corpo negro capturadopelo sistema produtivo colonial na medida em 
que o excluía do campo do direito, da lingua-
gem e do desejo, são esses mesmos corpos que 
continuam sendo precarizados como parte das 
estratégias necropolíticas de gestão dos traba-
lhadores a partir dos dispositivos digitais. 
PARA INTRODUZIR A GESTÃO 
NEOLIBERAL AUTORITÁRIA DA 
ANGÚSTIA
Ao fazer avançar a destruição das con-
dições de trabalho e de existência dos traba-
lhadores até se fazer ouvir o grito “fome!”, a 
plataformização expõe as articulações visce-
rais entre neoliberalismo autoritário e necro-
política cujos efeitos sobre o corpo não são 
sem consequências subjetivas. Nesse ponto, a 
necropolítica se converte em uma necrogover-
namentalidade (Cf. Franco, 2021), pois, para o 
poder, a morte não é apenas uma tecnologia 
de marcação, um instrumento de conservação 
da vida pela destruição das ameaças biológicas 
ou um fenômeno estatístico passível de regu-
lação; ela é, também e principalmente, um dos 
elementos que delimitam as condições em que 
a vida é possível, na medida em que gerir as 
maneiras pelas quais se morre, como se morre, 
quem morre, do que se morre, o que aconte-
ce com o corpo após a morte, quais as formas 
de se prantear um morto, é gerir os riscos que 
pesam sobre a vida e, portanto, é administrar 
o quanto cada sujeito pode usufruir das pos-
sibilidades de ser livre, de escolher e desejar .
Sendo assim, poderíamos nos pergun-
tar: qual tipo de subjetividade corresponde ao 
governo necropolítico da precarização do tra-
balho sob o neoliberalismo autoritário? Que 
disposições psicológicas o trabalhador precisa 
internalizar para que sua precariedade social e 
existencial possa ser mais eficazmente subsu-
mida pelo capital? Abre-se, desta forma, outra 
dimensão pela qual se exerce o neoliberalismo 
autoritário: se, como vimos, a necropolítica, 
para fazer precarizar, incide sobre o corpo por 
meio da destruição sistemática das condições 
de vida e da repressão brutal da pobreza, a ne-
crogovernamentalidade põe em marcha um 
processo de precarização subjetiva, fomentan-
do formas de sofrimento psíquico que, a um só 
tempo, capturam e engajam os sujeitos na sua 
própria exploração pelo mercado.
À primeira vista, parece despropositado 
investigar a necrogovernamentalidade do neo-
liberalismo, uma vez que o discurso neolibe-
ral, ao veicular demandas de performativida-
de, gozo, investimento, rentabilidade, estaria 
mais próximo a um dispositivo gestor da vida 
do que da morte e da precariedade.
Sem desconsiderar a face biopolítica do 
neoliberalismo, é preciso insistir que a platafor-
mização deixa entrever que estas mesmas exi-
gências psíquicas não são estranhas à domina-
ção do trabalhador pela ameaça da precarização.
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A precarização, que resulta da progressi-
va destruição das condições laborais e de exis-
tência dos trabalhadores, tem como um dos 
seus efeitos subjetivos a angústia. Deste modo, 
nesta seção, pretendo introduzir algumas arti-
culações entre a ameaça da precarização (Cf. 
Dejours, 2007) e a gestão neoliberal autoritária 
do trabalhador por meio da angústia. 
É verdade que a angústia vem sendo pre-
terida pelo discurso psiquiátrico, que, no Ma-
nual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos 
Mentais (DSM), da Associação Norte-America-
na de Psiquiatria, desde a sua terceira edição, 
tem preferido reunir sob a categoria “trans-
tornos de ansiedade” um conjunto variado de 
sintomas, tais como o medo, o distúrbio de 
atenção, a falta de ar, a agorafobia, o mutismo 
seletivo, o transtorno de pânico, as fobias espe-
cíficas e, inclusive, a categoria pouco evidente 
de transtornos de ansiedade não especificados. 
Ao tratar a angústia a partir de uma descrição 
sindrômica pretensamente neutra do ponto de 
vista axiológico, a racionalidade psiquiátrica 
do DSM recalca que os sofrimentos psíquicos 
têm estrutura relacional porquanto são expres-
são de conflitos entre exigências pulsionais e 
injunções normativas próprias das nossas insti-
tuições e organizações sociais (Cf. Safatle; Silva 
Júnior; Dunker, 2018, 2021). Em uma frase, o 
que se recalca são as condições sociais de emer-
gência do sofrimento psíquico, os quais passam 
a ser atribuídos exclusivamente aos indivíduos.
Por isso, “hoje em dia são os psicanalistas 
que têm a responsabilidade da angústia” (Fin-
germann, 2016, p. 90), tanto porque a clínica 
psicanalítica não é sem angústia, quanto pelo 
fato de que cabe à psicanálise restituir a angús-
tia as suas causas estruturais e estruturantes. 
Desse ponto de vista, a emergência da 
angústia depende de conjunturas em que fra-
cassam as formas subjetivas singulares sobre 
as quais cada um se apoia para interpretar e 
responder às exigências sociais que o convo-
cam. Se, antes, esse sujeito podia gozar da su-
posta segurança a respeito de quem concebia 
ser, de quais eram as expectativas dos outros 
para com ele, de como deveria proceder diante 
de certos apelos, após o encontro com o trau-
mático da experiência, isto é, com o advento 
de algo que rasga as telas interpretativas que 
enquadravam a maneira como encarava a vida, 
o sujeito “se vê questionado em sua existên-
cia, sem poder se reconhecer no passado nem 
imaginar o que será no futuro” (Berta, 2015, 
p. 97). Em suma, a angústia é o afeto do de-
samparo fundamental do sujeito, desamparo 
que Freud ([1926] 2014) compreendia como o 
resultado do sentimento de desintegração da 
possibilidade de significar de maneira total a 
experiência, inserindo-a na trama de conexões 
psíquicas que ligariam as excitações a fim de 
encontrar caminhos possíveis de satisfação. 
Tal impossibilidade de significar certos adven-
tos da experiência coloca o sujeito diante de 
algo estranho, absolutamente Outro, uma alte-
ridade opaca cujos limites, balizas, sentidos e 
significações são falhos e fazem falhar as que o 
sujeito mobiliza em sua defesa. 
No entanto, como contra-intuitivamente 
afirmava Lacan, a impossibilidade de responder 
ao enigma de si e do Outro implica uma certeza: 
a “certeza de que isso quer dizer alguma coisa, 
sem que se saiba o que isso quer dizer” (Soller, 
2012, p. 39), a certeza de que há uma significa-
ção que responde ao que não se sabe dizer o que 
é. Essa significação da significação vazia evoca 
a iminência de aparição do objeto com o qual o 
sujeito se identifica e que, enquanto ser-objeto, 
está à mercê do gozo do Outro. Em outras pala-
vras, as situações de angústia colocam o sujeito 
face a face com o terror de responder na posição 
de objeto que o Outro é suposto demandar ou 
ser demandado para fazê-lo gozar. Para apresen-
tar a angústia, Lacan ([1961-1962] 2003) se vale 
de uma alegoria: 
Imaginem-se dentro de um recinto fechado, sozinho 
com uma louva-a-deus de três metros de altura. É a 
proporção correta para que eu tenha o tamanho do 
dito macho. Além do mais, estou vestido uma pele 
do tamanho do dito macho, que tem 1,75m, mais 
ou menos minha altura. Eu me miro, miro minha 
imagem assim fantasiada dentro do olho facetado 
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da louva-a-deus fêmea. Será que a angústia é isso? 
É muito perto disso (Lacan, ([1961-1962] 2003, p. 
243-244). 
A alegoria só faz sentido se lembrarmos 
que a louva-a-deus fêmea, que é muito maior 
do que o macho da sua espécie, devora o par-
ceiro após o acasalamento. Tal como essa pes-
soa que se descobre fantasiada de louva-a-deus 
macho ao ver seu reflexo no olho da fêmea, na 
angústia o sujeito se crê um objeto pronto para 
ser devorado pelo Outro. Para aqueles que che-
gam aos consultórios, a angústia é experimen-
tada como uma sensação precisa de morte, um 
“morrer no gerúndio” (Fingermann, 2016, p. 
94). A angústia, portanto, tem efeitos ontológi-
cos, justamente porque ela diz respeito ao ser 
(Cf. Soller, 2012,p. 50), colocando em questão 
as construções imaginárias que constituíam as 
camadas sucessivas do Eu e a garantia que o 
sujeito encontrava sobre o assento da fantasia. 
Não por acaso, Soller se refere à angústia como 
uma “destituição subjetiva selvagem”, isto é, 
“um momento em que o sujeito cessa de ser 
sujeito, em que ele se apreende como objeto 
e em que o desejo (como incógnita, como x, 
com todas essas ilusões que as incógnitas pro-
duzem sempre) fica suspenso” (Ibidem, p. 47).
Se a angústia é um sentimento univer-
sal, ela não deixa de ser sensível às modalida-
des dominantes de laço social, que se modifi-
cam segundo as épocas (Cf. Fingermann, 2016, 
p. 12). No caso que nos ocupa, o que mais aci-
ma denominamos a gestão da ameaça de pre-
carização consiste na administração neoliberal 
das condições de emergência da angústia, do 
sentimento de redução iminente do sujeito ao 
seu corpo (Cf. Lacan, [1974] 2001) e dos efeitos 
ontológicos de destituição das subjetividades 
para as converter em objetos, fazendo-as se 
sentirem morrendo aos poucos – donde o cará-
ter inapelavelmente necrogovernamental que 
a angústia convoca, quando captura e gerida 
pelo neoliberalismo autoritário. 
De acordo com Fernandes et al. (2018, 
p.2345), de 2004 a 2013, o número de licenças 
concedidas devido a transtornos de ansieda-
de “aumentaram de 615 para 12.818. No to-
tal, houve um aumento na ordem de 1.964% 
para este tipo de concessão”. Em 2017, os da-
dos analisados pela Organização Mundial da 
Saúde (OMS) revelaram que o Brasil é o país 
com o maior número de casos de transtorno de 
ansiedade no mundo, que incide em 9,3% da 
população, três vezes mais que a média mun-
dial (Estadão Conteúdo, 2019). Esses números 
corroboram a associação entre a agudização 
das transformações neoliberais no mundo do 
trabalho e o aumento da incidência de sofri-
mentos derivados da emergência da angústia. 
Tal associação parece ser impensável 
sem que se leve em conta os impactos da ne-
oliberalização sobre os laços laborais. A partir 
da análise que realizamos das plataformas di-
gitais de entrega na seção 4, torna-se possível 
identificar o que nelas pode funcionar como 
ocasiões para a emergência da angústia. 1) o 
enfraquecimento e combate às formas de or-
ganização coletiva dos trabalhadores, levando 
à progressiva individualização do sofrimento 
e da responsabilidade do trabalhador. Asso-
ciada à generalização do princípio da concor-
rência, não apenas os trabalhadores se vêem 
desvinculados de outros trabalhadores como 
esses são identificados a potenciais adversá-
rios na busca por melhores posições e mais 
reconhecimento (Cf. Dardot e Laval, 2009); 2) 
a intensificação da sensação de superfluidade, 
obsolescência e descartabilidade (Cf. Harvey, 
2008, Van Doorn, 2017). 3) a impossibilidade 
de atribuir sentido ao cotidiano de trabalho, 
desde o fluxo de pedidos até a ocorrência de 
sanções arbitrárias, na medida em que as re-
gras e formas de operacionalidade das empre-
sas-aplicativo são frequentemente opacas. 4) a 
ausência de um Outro ao qual se pode endere-
çar a fala para perguntar, confrontar, solicitar, 
uma vez que ele foi substituído por algoritmos 
supostamente neutros que operam à despeito 
dos trabalhadores. 
No entanto, à medida em que a gestão ne-
oliberal autoritária das condições para a emer-
gência da angústia produz a subordinação dos 
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sujeitos, ela também estimula o engajamento 
do precariado como reação ao horror da ame-
aça sempre presente de destituição subjetiva. 
No caso dos precarizados-plataformizados, as 
estratégias de defesa passam pela multiplica-
ção de atividades e comportamentos que vão 
da esquiva e fuga às situações que prenunciam 
a irrupção de angústia até as respostas estereo-
tipadas por meio das quais se procura respon-
der ao que o sujeito presume ser as exigências 
sociais requeridas para obtenção de amparo e 
segurança. Se a angústia é o afeto do desampa-
ro decorrente da ruptura dos anteparos subjeti-
vos que localizavam o sujeito em suas relações 
com o Outro, ao pressentir a irrupção do hor-
ror da angústia alguém pode buscar proteção 
por meio de reiteradas tentativas de reproduzir 
os ideais que supostamente lhe garantiriam o 
amor do Outro. Assim a exploração neoliberal 
do trabalho obtém a adesão dos trabalhadores 
às pressões por autovalorização permanente 
de si mesmos, principalmente por meio do 
cumprimento de metas, da superação de desa-
fios e obstáculos mobilizados como parte das 
estratégias de gestão gamificada do trabalho 
(Cf. Scholtz, 2013; Rosemblat and Stark, 2016; 
Woodcock, 2019), do empenho pela maximi-
zação das suas performances na concorrência 
com seus companheiros, do consumo de mer-
cadorias cuja propriedade contém a promessa 
de reconhecimento social (Cf. Pacheco Filho, 
2015), da internalização de ideais de virilida-
de, tal como do caçador ou do guerreiro que 
enfrenta todos os perigos ainda que se colocan-
do em risco de morte.
Estabelece-se, com isso, um circuito 
sem fim que transita entre a emergência da 
angústia e as respostas defensivas do sujeito, 
as quais, uma vez mobilizadas, confrontam-se 
novamente com a ameaça da precariedade. Por 
meio das intervenções necropolíticas de des-
truição sistemática dos recursos necessários à 
manutenção da vida e da montagem de dispo-
sitivos necrogovernamentais de gestão distri-
butiva diferencial das condições de emergên-
cia da angustia, o neoliberalismo autoritário 
alcança, assim, a subordinação do precariado, 
coagido também policial e juridicamente, e o 
seu engajamento em formas de subjetividade 
que aprofundam a espoliação da sua força de 
trabalho. 
Recebido para publicação em 30 d eabril de 2021
Aceito em 08 de novembro de 2021
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Fábio Luís Franco – Doutor em Filosofia pela Universidade de São Paulo e psicanalista membro do 
Fórum do Campo Lacaniano de São Paulo. Pesquisador de pós-doutorado vinculado ao International 
Research Group on Authoritarianism and Counter-Strategies (IRGAC), do Rosa Luxemburg-Stiftung, e 
ao Instituto de Psicologia da USP. Visiting Scholar na cátedra de “Sociology of the Future of Work” na 
Einstein Center Digital Future e na Humboldt-University em Berlim. Pesquisador-membro do Laboratório 
de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise (LATESFIP-USP). Publicações recentes: Brasil: um laboratório do 
desaparecimento. In: VANNUCHI, C.; VILALTA, L. P. (org). Vala de Perus: um crime não encerrado da 
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FAIRE PRECARISER : néolibéralisme autoritaire 
et nécrogouvernementalité
Fábio Luís Franco
Cet article analyse les articulations entre la 
nécropolitique et la gestion néolibérale du travail 
au Brésil. Il vise à soutenir que le néolibéralisme 
autoritaire opère à la fois de manière coercitive, 
en utilisant l’appareil de sécurité et de justice, 
et par la gestion de la souffrance psychologique 
et les processus de subjectivation. Pour cela, il 
part de la compréhension que la nécropolitique 
néolibérale implique également des interventions 
visant à précariser, c’est-à-dire à produire de la 
souffrance dans les corps à travers l’administration 
de conditions mortelles, comme cela devient 
explicite avec la plateformisation néolibérale du 
travail au Brésil. Enfin, l’article introduit quelques 
considérations sur les impacts de cette gestion 
nécropolitique néolibérale de la précarité sur les 
formes de subjectivation des travailleurs, mettant 
en lumière la nécrogouvernamentalité néolibérale 
commegestion des conditions d’émergence de 
l’angoisse. 
Mots clés: Nécropolitique. Néolibéralisme. 
Plateforme. Travail. Angoisse.
MAKING IT PRECARIOUS: authoritarian 
neoliberalism and necrogovernmentality
Fábio Luís Franco
This article analyses the articulations between 
necropolitics and neoliberal labor management in 
Brazil. It is intended to argue that authoritarian 
neoliberalism operates both coercively, using the 
apparatus of security and justice, and through the 
management of psychological suffering and the 
processes of subjectivation. For this, it starts from 
the understanding that neoliberal necropolitics 
involves, also, interventions aiming to make 
precarization, that is, to produce suffering in 
the bodies through the administration of deadly 
conditions, as becomes explicit with the neoliberal 
platformization of work in Brazil. Finally, the 
article introduces some considerations about 
the impacts of this neoliberal necropolitical 
management of precariousness on the forms 
of subjectivation of workers, shedding light on 
neoliberal necrogovernmentality as management of 
the conditions of emergence of anguish. 
Keyword: Necropolitics. Neoliberalism. Platform. 
Work. Anguish.

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