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UNIDRUMMOND CURSO DE NIVELAMENTO EM LÍNGUA PORTUGUESA Prof. Dr. Emerson Salino TEORIA AULA 1 – LEITURA. PARÁFRASE. SÍNTESE NOÇÃO DE TEXTO O que seria um texto? Texto não é qualquer aglomerado de palavras, frases, orações ou períodos soltos e para isso é preciso verificar a viabilidade de um enunciado para que se saiba se é ou não um texto. De modo geral, chamamos de texto toda unidade de produção de linguagem situada, acabada e autossuficiente. O texto se dá não apenas pela gramática, mas por vários componentes que, unidos constituem ideias estilísticas, esquemáticas e retóricas, pois se trata de uma unidade de sentido, de um conteúdo comunicativo contextual que se caracteriza por um conjunto de relações responsáveis pela sua construção. O texto é um tecido verbal estruturado de tal modo que as ideias formam um todo coeso, uno, coerente. São sequências de signos e conceitos ordenados sistematicamente, de modo a manifestar um único direcionamento. A manifestação de um único direcionamento, ou a noção de unidade no texto, também é destacada por Padre Antônio Vieira — Sermão da Sexagésima:1 “O sermão há de ser duma só cor, há de ter um só objeto, um só assunto, uma só matéria. Há de tomar o pregador uma só matéria, há de defini-la para que se conheça, há de dividi-la para que se distinga, há de prová-la com a Escritura, há de declará--la com a razão, há de confirmá-la com o exemplo, há de ampliá-la com as causas, com os efeitos, com as circunstâncias, com as conveniências que se hão de seguir, com os inconvenientes que se devem evitar, há de responder às dúvidas, há de satisfazer as dificuldades, há de impugnar e refutar com toda a força da eloquência os argumentos contrários, e depois disso há de colher, há de apertar, há de concluir, há de persuadir, há de acabar. Isto é sermão, isto é pregar, e o que não é isto, é falar de mais alto. Não nego nem quero dizer que o sermão não haja de ter variedade de discursos, mas esses devem nascer todos da mesma matéria, e continuar e acabar nela.” Para que um texto seja constituído, ou para que se chegue a uma compreensão, é necessário trabalhar, principalmente, as relações tanto de coerência quanto de coesão. • o saber partilhado, que é a informação antiga — pode aparecer na introdução, ou estar subentendida no contexto; 11 VIEIRA, Padre Antônio. Sermão da Sexagésima. In: Os sermões. São Paulo: Difel, 1968, v. VI. • a informação nova, que se caracteriza como uma necessidade para a existência do texto, veiculando uma informação que não é do conhecimento do leitor, ou que não o é da forma como será exposta e consequentemente, uma nova maneira de ver os fatos; • as provas, que são fundamentos das afirmações expostas. Se o leitor duvidar de suas asserções, poderá recorrer a outras obras indicadas pelo escritor para chegar às mesmas conclusões que ele. O texto pode ser uma palavra ou uma obra completa, que se produz no interior de um processo interlocutivo. Cada tipo de texto, seja ele oral ou escrito, apresenta características especificas, ainda que seja desenvolvido pelo mesmo sujeito, pois é preciso submeter-se às regras específicas para cada texto representado. Uma conversa em um bar com amigos é muito diferente de uma reunião de negócios em uma empresa. Em se tratando de textos escritos, o convívio com eles faz com que o leitor adquira a capacidade de apreender tanto suas formas quanto seus conteúdos. Isso ocorre porque suas formas e seus conteúdos não podem ser vistos como fatores separados. Supõese, dessa prática, uma atitude produtiva em que o leitor sai modificado por aderir aos pontos de vista com que compreende o mundo ou por modificar seus pontos de vista em face do diálogo mantido por meio do texto com seu autor. O texto escrito proporciona ao indivíduo a faculdade de materializar significados e intenções de um dos interagentes a distância, em que a base textual sobre a qual ele se apoia é inerente a um processo de elaboração. É nisso que reside a complexidade do ato de leitura, pois a compreensão de um texto escrito envolve a compreensão de frases e sentenças, de argumentos, de provas formais e informais, de objetivos, de intenções, muitas vezes de ações e de motivações, isto é, abrange muitas das possíveis dimensões do ato de compreender, se pensarmos que a compreensão verbal inclui desde a compreensão de uma charada até a compreensão de uma obra de arte. A clareza de um texto escrito é condicionada pelas possibilidades de interpretação que ele apresenta, uma vez que o produtor do texto deve conhecer o idioma e suas regras gramaticais para deixar claros seus objetivos, ou ideias, que deseja transmitir. Um texto é mais ou menos eficaz dependendo da competência de quem o produz, ou da interação de autor--leitor, ou emissor-receptor. O texto exige determinadas habilidades do produtor, como conhecimento do código, das normas gramaticais que regem a combinação dos signos. A noção de texto, que pode ser aplicada tanto para as manifestações orais como para as escritas, ressalta que nesses processos tal ocorrência se dá como uma forma de elaboração de uma rede de significados com vistas a informar, explicar, discordar, convencer, aconselhar, ordenar. Então, ao escrever, cada pessoa demonstra o que deseja se comunicar. Para atingir essa finalidade o autor deixa marcas em seus textos para que possam ser seguidas pelo leitor, cria seu próprio estilo e diferentes formas de se expressar. Assim, formular não significa simplesmente deixar ao interlocutor a “tarefa” de compreensão. As palavras ou frases articuladas produzem significações que são dotadas de intencionalidade, ganhando sentido pela interferência dos destinatários, criando as unidades textuais. Para tornar concreto um ato de compreensão, é necessário que o leitor reúna determinadas condições: possua a competência correspondente às mensagens do texto e do discurso; domine traços de referência de conteúdos; busque no texto a mensagem pretendida pelo autor; utilize estratégias e habilidades adequadas ao exercício de compreensão/interpretação. TEXTO LITERÁRIO E TEXTO NÃO LITERÁRIO O texto literário tem uma dimensão estética, multissignificativa e dinâmica, que possibilita a criação de muitas e novas relações de sentido. Com o predomínio da função poética da linguagem, é um meio importante de reflexão sobre a realidade, envolvendo um processo de recriação dessa realidade. A produção de um texto literário envolve: a) a valorização da forma: o uso literário da língua caracteriza-se por um cuidado especial com a forma, visando à exploração de recursos que o sistema linguístico oferece, nos planos fônico, prosódico, léxico, morfossintático e semântico, ou seja, em todo sistema textual. Para qualquer tipo de tema, o que importa é como o texto será montado. b) a reflexão sobre o real: em lugar de apenas informar sobre o real, ou de produzi-lo, a expressão literária é utilizada principalmente como um meio de refletir e recriar a realidade, reordenando-a. Isso dá ao texto literário um caráter ficcional, ou seja, o texto literário interpreta aspectos da realidade efetiva, de maneira indireta, recriando o real num plano imaginário. c) a reconstrução da linguagem: no texto literário, o uso estético da linguagem pressupõe criar novas relações entre as palavras, combinando-as de maneira única, revelando assim novas formas de ver o mundo. d) a multissignificação: no texto literário, faz-se igualmente um amplo uso de metáforas e metonímias, com o objetivo de despertar no leitor o prazer estético. Isto é o que define seu caráter plurissignificativo. Observea canção de Raul Seixas – Mosca na sopa Eu sou a mosca que pousou em sua sopa Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar Eu sou a mosca que pousou em sua sopa Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar Eu sou a mosca que pousou em sua sopa Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar Eu sou a mosca que perturba o seu sono Eu sou a mosca no seu quarto a zumbizar Eu sou a mosca que perturba o seu sono Eu sou a mosca no seu quarto a zumbizar E não adianta vir me dedetizar Pois nem o DDT pode assim me exterminar Porque 'cê mata uma e vem outra em meu lugar Eu sou a mosca que pousou em sua sopa Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar Eu sou a mosca que pousou em sua sopa Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar Atenção, eu sou a mosca A grande mosca A mosca que perturba o seu sono Eu sou a mosca no seu quarto A zum zum zumbizar Observando e abusando Olha do outro lado agora Eu tô sempre junto de você Água mole em pedra dura Tanto bate até que fura Quem, quem é? A mosca, meu irmão Eu sou a mosca que pousou em sua sopa Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar Eu sou a mosca que pousou em sua sopa Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar E não adianta vir me dedetizar Pois nem o DDT pode assim me exterminar Porque 'cê mata uma e vem outra em meu lugar Eu sou a mosca que pousou em sua sopa Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar Eu sou a mosca que pousou em sua sopa Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar Eu sou a mosca que perturba o seu sono Eu sou a mosca no seu quarto a zumbizar Eu sou a mosca que perturba o seu sono Eu sou a mosca no seu quarto a zumbizar Mas eu sou a mosca que pousou em sua sopa Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar https://www.letras.mus.br/raul-seixas/48320/ - acesso em 12/07/2019 No texto não literário, as relações são mais restritas, tendo em vista a necessidade de uma informação mais objetiva e direta no processo de documentação da realidade, com predomínio da função referencial da linguagem, e na interação entre os indivíduos, com predomínio de outras funções. As moscas são insetos alados perigosos para a saúde Quem gosta de conviver com insetos voadores incômodos como as moscas? Elas passeiam não apenas em áreas residenciais e comerciais, mas também em locais sujos como lixeiras, bueiros, matéria orgânica em decomposição e em qualquer detrito. Com isso, carregam em seus corpos agentes patógenos que provocam doenças gastrointestinais. As moscas possuem hábitos diurnos. Os locais em que os insetos pousam podem apresentar manchas escuras e claras, pois eles depositam excrementos e saliva sobre o alimento. As moscas são atraídas por locais quentes e alimentos expostos. Elas têm uma cabeça móvel, com um par de grandes olhos compostos e bucais projetados para perfuração e sucção de alimentos. Usam apenas um único par de asas para voar.2 O texto literário “Mosca da sopa”, de Raul Seixas, parte de uma palavra do domínio comum — mosca — e vai ampliando seu potencial significativo, explorando recursos formais para estabelecer um paralelo entre o que a mosca faz — pousa, pinta, perturba. No texto não literário “As moscas são insetos alados perigosos para a saúde”, do site temitek apenas informa o leitor sobre os cuidados que precisamos ter em relação ao inseto, os lugares onde aparecem, como é sua morfologia etc. COMPREENSÃO E INTERPRETAÇÃO Compreensão e interpretação de texto são coisas distintas, enquanto aquela é apenas a apreensão das informações contidas no texto, esta é a análise que cada leitor — com sua experiência — faz a respeito das informações contidas no texto. Vejamos um exemplo de “interpretação” que fizemos no ensino fundamental: 2 https://termitek.com.br/pragas-urbanas/moscas/ - acesso em 12/07/2019 A velha contrabandista3 Stanislaw Ponte Preta Diz que era uma velhinha que sabia andar de lambreta. Todo dia ela passava pela fronteira montada na lambreta, com um bruto saco atrás da lambreta. O pessoal da Alfândega — tudo malandro velho — começou a desconfiar da velhinha. Um dia, quando ela vinha na lambreta com o saco atrás, o fiscal da Alfândega mandou ela parar. A velhinha parou e então o fiscal perguntou assim pra ela: — Escuta aqui, vovozinha, a senhora passa por aqui todo dia, com esse saco aí atrás. Que diabo a senhora leva nesse saco? A velhinha sorriu com os poucos dentes que lhe restavam e mais os outros, que ela adquirira no odontólogo e respondeu: — É areia! Aí quem sorriu foi o fiscal. Achou que não era areia nenhuma e mandou a velhinha saltar da lambreta para examinar o saco. A velhinha saltou, o fiscal esvaziou o saco e dentro só tinha areia. Muito encabulado, ordenou à velhinha que fosse em frente. Ela montou na lambreta e foi embora, com o saco de areia atrás. Mas o fiscal ficou desconfiado ainda. Talvez a velhinha passasse um dia com areia e no outro com muamba, dentro daquele maldito saco. No dia seguinte, quando ela passou na lambreta com o saco atrás, o fiscal mandou parar outra vez. Perguntou o que é que ela levava no saco e ela respondeu que era areia, uai! O fiscal examinou e era mesmo. Durante um mês seguido o fiscal interceptou a velhinha e, todas às vezes, o que ela levava no saco era areia. Diz que foi aí que o fiscal se chateou: — Olha, vovozinha, eu sou fiscal de alfândega com 40 anos de serviço. Manjo essa coisa de contrabando pra burro. Ninguém me tira da cabeça que a senhora é contrabandista. — Mas no saco só tem areia! — insistiu a velhinha. E já ia tocar a lambreta, quando o fiscal propôs: — Eu prometo à senhora que deixo a senhora passar. Não dou parte, não apreendo, não conto nada a ninguém, mas a senhora vai me dizer: qual é o contrabando que a senhora está passando por aqui todos os dias? — O senhor promete que não “espaia”? — quis saber a velhinha. — Juro — respondeu o fiscal. — É lambreta. Questionário 1. O que a velhinha carregava dentro do saco, para despistar o fiscal? 2. O que o autor quis dizer com a expressão “tudo malandro velho”? 3. Leia novamente o 4º parágrafo do texto e responda: quando o narrador citou os dentes que “ela adquirira no odontólogo”, a que tipo de dentes ele se referia? 4. Explique com suas palavras qual foi o truque da velhinha para enganar o fiscal. 5. Quando a velhinha decidiu contar a verdade? 3 PONTE PRETA, Stanislaw. A velha contrabandista. In: Gol de padre. 7. ed. São Paulo: Ática, 2003 (Col. Para Gostar de Ler — v. 23). 6. Qual é a grande surpresa para o fiscal? 7. Numere corretamente as frases abaixo, observando a ordem dos acontecimentos. ( ) O fiscal verificou que só havia areia dentro do saco. ( ) O pessoal da alfândega começou a desconfiar da velhinha. ( ) Diante da promessa do fiscal, ela lhe contou a verdade: era contrabando de lambretas. ( ) Todo dia, a velhinha passava pela fronteira montada numa lambreta, com um saco no bagageiro. ( ) Mas, desconfiado, o fiscal passou a revistar a velhinha todos os dias. ( ) Durante um mês, o fiscal interceptou a velhinha e, todas às vezes, o que ela levava no saco era areia. ( ) Então, ele prometeu que não contaria nada a ninguém, mas pediu à velhinha que lhe dissesse qual era o contrabando que fazia. 8. Agora com suas palavras diga o que você pensa a respeito da atitude da velhinha no texto. Para responder às questões de números 1 a 7, basta retornar ao texto e retirar de lá a informação necessária à resposta. Já a questão de número 8 pede que o leitor dê a sua opinião a respeito daquilo que leu. As questões de 1 a 7 trabalham a compreensão do texto. A questão8 trabalha a interpretação. Interpretar é, então, utilizar a experiência de leitor para entender as mensagens deixadas no texto pelo autor. Partindo desse ponto de vista, podemos pensar que um texto aceita qualquer interpretação, mas na verdade o texto está aberto a várias leituras, porém não está aberto a qualquer leitura. A diferença está em que o texto aceita apenas as leituras que nele já aparecem inscritas como possibilidades de leitura, pois o autor, ao produzir seu texto, deixa nele algumas marcas. Assim, as várias leituras não se fazem a partir da vontade do leitor, mas dessas marcas significativas presentes no texto. A interpretação do texto está diretamente relacionada à maneira como se percebem as marcas linguísticas, dando a ele muitas possibilidades de leitura — e não todas. Assim podemos distinguir dois tipos de interpretação: a subjetiva e a objetiva. Interpretação subjetiva Nesse tipo de interpretação interessa apenas o conhecimento prévio que o leitor possui, sua experiência, a sua visão de mundo. As informações contidas no texto são apenas um ponto de partida para suas divagações.4 Interpretação objetiva É a interpretação que leva em conta as marcas significativas contidas no texto. Essas marcas são muitas e variadas, dependendo do tipo de texto e da “intenção” do autor. Porém, podemos sistematizar a observação de algumas que estão presentes em todas as produções: vocabulário, gramática e raciocínio lógico verbal. Vocabulário Ao produzir um texto o autor utiliza palavras que podem ter significados múltiplos, então cabe ao leitor encontrar o significado que melhor se encaixa naquele contexto. Para isso devemos pensar em conotação e denotação: a) conotação: a palavra utilizada em sentido figurado; b) denotação: a palavra utilizada em sentido real. Para se chegar à interpretação objetiva devemos buscar sempre a denotação. Vejamos um exemplo: “Navegar é preciso, viver não é preciso.” No século I a.C., os romanos viviam ativamente o seu processo de expansão econômica e territorial. Roma se tornava um império de grandes dimensões e a necessidade de desbravar os mares se colocava como imperativo para o seu fortalecimento. Por volta de 70 a.C., o General Pompeu foi incumbido da missão de transportar o trigo das províncias para a cidade de Roma, que passava por uma grave crise de abastecimento causada por uma rebelião de escravos. Os riscos de navegação eram grandes, em virtude das limitações tecnológicas e dos ataques de piratas, que aconteciam com frequência. Os marinheiros, então, viviam um grave dilema: salvar a cidade de Roma da crise de abastecimento, ou fugir dos riscos da viagem, mantendo--se seguros na cidade de Sicília. Foi então que, de acordo com o historiador Plutarco, o general Pompeu proferiu essa lendária frase, motivando os seus marinheiros. Tempos depois, essa frase foi utilizada como lema da Liga Hanseática e também da Escola de Sagres. Alguns poetas a utilizaram em seus escritos: Camões, Fernando Pessoa, Caetano Veloso. Até Ulisses Guimarães a utilizou, no seu célebre discurso pelas eleições diretas. A interpretação objetiva ou subjetiva passa pelo vocabulário, pois o adjetivo “preciso” presente nesse texto pode ser interpretado de duas maneiras: a) preciso = necessário: nesse caso, temos uma interpretação subjetiva, pois cada leitor 4 Numa prova de concurso público, não podemos utilizar esse modelo de interpretação, pois, se assim o fizéssemos, teríamos infinitas possibilidades de resposta para cada questão da prova. entenderá as ideias de “navegar” e “viver” como melhor lhe convier; b) preciso = exato: nesse caso, temos uma interpretação objetiva, pois a única possibilidade de leitura é a de que navegar é algo exato, navegar tem precisão; viver não é exato, não tem precisão. É preciso saber reconhecer no texto os pontos principais, que nos ajudam a decodificar a mensagem. Para isso podemos nos fixar nas palavras--chave ou ideias--chave. Palavras-chave Ao ler um texto presente em uma prova de concurso, ou em qualquer outra situação, é preciso preocupar-se em procurar sempre a palavra que marca a ideia principal de cada parágrafo. Mesmo que ache uma expressão significativa, poderá perceber que há uma palavra que se destaca como referência do argumento principal ali abordado. Essa palavra é que chamamos de palavra-chave. Duas perguntas poderão ser fundamentais para se entender a importância da palavra- chave em um determinado parágrafo: 1. Sobre o que se fala nessa passagem? 2. O que se fala sobre a palavra-chave? Assim, a leitura se torna mais dirigida, mais concentrada, além de dinamizar a identificação de qualquer ponto abordado com maior rapidez. Tal ferramenta permitirá desenvolver melhor os argumentos e ter uma interpretação de textos com mais eficácia. Observe a seguir o exemplo tirado do site brasilescola.uol.com.br/saude, acessado em 14/07/2019. “A asma pode ocorrer por hereditariedade, alergias, alterações climáticas, gripes ou resfriados e outros. Dessa forma, as causas da doença variam de acordo com cada organismo, sendo que, independente da origem, a doença deve ser tratada, pois o não tratamento compromete o bom funcionamento do organismo e a qualidade de vida.” Palavras-chave = Asma, Doenças respiratórias Ideias-chave A partir das palavras-chave, pode-se chegar à ideia-chave de cada parágrafo, ou seja, o assunto principal de cada parágrafo, de forma sintetizada. E, a partir da síntese de cada parágrafo, chega-se à ideia central do texto. Observe o mesmo parágrafo apresentado anteriormente: “A asma pode ocorrer por hereditariedade, alergias, alterações climáticas, gripes ou resfriados e outros. Dessa forma, as causas da doença variam de acordo com cada organismo, sendo que, independente da origem, a doença deve ser tratada, pois o não tratamento compromete o bom funcionamento do organismo e a qualidade de vida.” Ideias-chave = como se pode adquirir asma e doenças respiratórias. Raciocínio lógico verbal Pela observação das relações lógicas estabelecidas entre as palavras do texto, podemos chegar a conclusões objetivas. No texto: “Radegondes foi ao Teatro Municipal de São Paulo assistir à apresentação da Orquestra Sinfônica do Estado, regida pelo maestro Asdrúbal de Sousa. Ficou encantada com a apresentação e afirmou ‘Este maestro é bárbaro!’” — note que a palavra “bárbaro” assume o sentido de “muito bom” ou “excelente”, pois é o que se pode interpretar a partir das relações que esta palavra mantém com as outras. O sentido original de “bárbaro”, porém, é outro: “cruel”, “rude”, “selvagem” ou “desumano”, como se percebe na frase: “Asdrúbal estava muito nervoso, agiu com impaciência, gritando como um bárbaro”. PARÁFRASE, RESUMO E SÍNTESE PARÁFRASE É o procedimento em que se restabelece a ideia de um texto em outro. A paráfrase é uma atividade de reformulação pela qual se restaura bem ou mal, na totalidade ou em partes, fielmente ou não, o conteúdo de um texto--fonte num texto--derivado. A paráfrase é, portanto, um enunciado que reformula um anterior e com o qual mantém uma relação de equivalência semântica. A paráfrase sempre se remete a um texto anterior, para reafirmá--lo ou esclarecê--lo, criando, portanto, uma relação de intertextualidade. Na paráfrase sempre se conservam as ideias do texto original. O que se incluem são comentários, ideias e impressões de quem faz a paráfrase. Parafrasear, então, é contar, com outras palavras, as ideias de um texto. Para isso, deve--se fazer uma leitura atenta e, em seguida, reafirmar o tema central do texto apresentado.Exemplo de paráfrase Texto-matriz Texto original: Gonçalves Dias Minha Terra tem palmeiras Onde canta o sabiá. As aves que aqui gorjeiam Não gorjeiam como lá. Texto-derivado Paráfrase: Carlos Drummond De Andrade Meus olhos brasileiros se fecham saudosos Minha boca procura a “Canção do Exílio”. Como era mesmo a “Canção do Exílio”? Eu tão esquecido de minha Terra… Ai terra que tem palmeiras onde canta o sabiá! Ana Lúcia Tinoco Cabral e Nílvia Pantaleoni RESUMO Resumo é uma condensação fiel das ideias ou dos fatos contidos no texto. Resumir um texto significa reduzi-lo ao seu esqueleto essencial sem perder de vista três elementos: a) cada uma das partes essenciais do texto; b) a progressão em que elas se sucedem; c) a correlação que o texto estabelece entre cada uma dessas partes. O resumo é, então, uma redução do texto original, procurando captar suas ideias essenciais, na progressão e no encadeamento em que aparecem no texto. Para elaborar um bom resumo, é necessário compreender antes o conteúdo global do texto. Não é possível ir resumindo à medida que se vai fazendo a primeira leitura. Resumir é apresentar, com as próprias palavras, os pontos relevantes de um texto. Quem resume deve exprimir, em estilo objetivo, os elementos essenciais do texto. Por isso não cabem, num resumo, comentários ou julgamentos ao que está sendo condensado. Muitas pessoas julgam que resumir é reproduzir frases ou partes de frases do texto original, construindo uma espécie de “colagem”. Essa “colagem” de fragmentos do texto original não é um resumo. É evidente que o grau de dificuldade para resumir um texto depende basicamente de dois fatores: a) da complexidade do próprio texto (seu vocabulário, sua estruturação sintático-semântica, suas relações lógicas, o tipo de assunto tratado etc.); b) da competência do leitor (seu grau de amadurecimento intelectual, o repertório de informações que possui, a familiaridade com os temas explorados). Procedimentos para a elaboração de um resumo: Leitura silenciosa: ler uma vez o texto do começo ao fim. Já vimos que um texto não é um aglomerado de frases: sem ter noção do conjunto, é mais difícil entender o significado preciso de cada uma das partes. Essa primeira leitura deve ser feita com a preocupação de responder genericamente à seguinte pergunta: do que trata o texto? Segunda leitura (sempre necessária) com interrupções, para compreender melhor o significado de palavras difíceis (se preciso, recorra ao dicionário) e para captar o sentido de frases mais complexas (longas, com inversões, com elementos ocultos). Nessa leitura, deve-se ter a preocupação sobretudo de compreender bem o sentido das palavras relacionais, responsáveis pelo estabelecimento das conexões (assim, isto, isso, aquilo, aqui, lá, daí, seu, sua, ele, ela etc.). Terceiro momento: fazer uma segmentação do texto em blocos de ideias que tenham alguma unidade de significação. Ao resumir um texto pequeno, pode-se adotar como primeiro critério de segmentação a divisão em parágrafos. Pode ser que se encontre uma segmentação mais ajustada que a dos parágrafos, mas, como início de trabalho, o parágrafo pode ser um bom indicador. Quando se trata de um texto maior (o capítulo de um livro, por exemplo) é conveniente adotar um critério de segmentação mais funcional, o que vai depender de cada texto (as oposições entre os personagens, as oposições de espaço, de tempo). Em seguida, com palavras abstratas e mais abrangentes, tenta--se resumir a ideia ou as ideias centrais de cada fragmento. Redação final: com suas palavras, criar o resumo — procurando não só condensar os segmentos, mas encadeá-los na progressão em que se sucedem no texto e estabelecer as relações entre eles. Observe o resumo do texto de Bertrand Russell5 (abaixo), feito por Fiorin e Savioli. “Na verdade, por que desejamos, quase todos nós, aumentar nossa renda? À primeira vista, pode parecer que desejamos bens materiais. Mas, na verdade, os desejamos principalmente para impressionar o próximo. Quando um homem muda-se para uma casa 5 RUSSELL, Bertrand. Ensaios céticos. 2. ed. São Paulo: Nacional, 1957, p. 67-68. In: FIORIN, José Luiz; SAVIOLI, Francisco Platão. Para entender o texto: leitura e redação. 11. ed. São Paulo: Ática, 1995. maior num bairro melhor, reflete que gente de ‘mais classe’ visi-tará sua esposa, e que alguns pobretões deixarão de frequentar seu lar. Quando manda o filho a um bom colégio ou a uma universidade cara, consola-se das pesadas mensalidades e taxas pensando nas dis-tinções sociais que tais escolas conferem a pais e filhos. Em toda cidade grande, seja na América ou na Europa, casas iguaizinhas a outras são mais caras num bairro que noutro, simplesmente por-que o bairro é mais chique. Uma das nossas paixões mais potentes é o desejo de ser admirado e respeitado. No pé em que estão as coisas, a admiração e o respeito são conferidos aos que parecem ricos. Esta é a razão principal de as pessoas quererem ser ricas. Efetiva-mente, os bens adquiridos pelo dinheiro desempenham papel secun-dário. Vejamos, por exemplo, um milionário, que não consegue distinguir um quadro de outro, mas adquiriu uma galeria de antigos mestres com auxílio de peritos. O único prazer que lhe dão os quadros é pensar que se sabe quanto pagou por eles; pessoalmente, ele gozaria mais, pelo sentimento, se comprasse cromos de Natal, dos mais piegas, que, porém, não lhe satisfazem tanto a vaidade. Tudo isso pode ser diferente, e o tem sido em muitas sociedades. Em épocas aristocráticas, os homens eram admirados pelo nascimento. Em alguns círculos de Paris, os homens são admirados pelo seu talento artístico ou literário, por estranho que pareça. Numa universidade teuta é possível que um homem seja admirado pelo seu saber. Na índia, os santos são admirados; na China, os sábios. O estudo dessas sociedades divergentes demonstra a correção de nossa análise, pois em todas encontramos grande percentagem de homens indiferentes ao dinheiro, contanto que tenham o suficiente para se sustentar, mas que desejam ardentemente a posse dos méritos pelos quais, no seu meio, se conquista o mérito.” Resumo do texto I. Ideia geral do texto: Busca da admiração e do respeito, uma das fortes paixões do homem. II. Segmentação do texto: Critério: tipo de objeto a ser adquirido. 1º parágrafo: aquisição dos bens materiais; 2º parágrafo: aquisição daquilo que é valorizado em cada época ou em cada sociedade. III. Resumo das ideias de cada parte a) busca da riqueza em nossa sociedade é busca do respeito e da admiração dos outros, porque isso é conferido a quem parece rico; b) busca do que cada sociedade valoriza é busca da admiração e do respeito dos outros. IV. Redação final O homem cobiça a riqueza não para usufruir dos bens materiais que ela possibilita, mas para alcançar admiração e prestígio, uma das mais fortes paixões do homem. Assim como nossa sociedade persegue a riqueza porque ela confere prestígio, outras perseguem outros indicadores de prestígio: o nascimento, o talento artístico, o saber, a santidade.6 6 FIORIN, José Luiz; SAVIOLI, Francisco Platão. Para entender o texto: leitura e redação. 11. ed. São Paulo: Ática, 1995. SÍNTESE A síntese de texto é um tipo de arranjo especial: consiste em reproduzir, em poucas palavras, o que o autor expressou amplamente. Assim, devem ser aproveitadas apenas as ideias principais, deixando-se de lado tudo o que desempenha papel secundário. A síntese trabalha basicamente com as palavras-chave ou ideias-chave7 do texto. Vejamos um texto: O abolicionismo,que logrou pôr fim à escravidão nas Antilhas Britânicas, teve peso ponderável na política antinegreira dos governos britânicos durante a primeira metade do século passado. Mas tiveram peso também os interesses capitalistas, comerciais e industriais, que desejavam expandir o mercado ultramarino de produtos industriais e viam na inevitável miséria do trabalhador escravo um obstáculo para este desiderato.8 E suas (possíveis) sínteses: Síntese esquemática — representada por um esquema linguístico, ou mapa mental: Abolicionismo + interesses capitalistas = fim da escravidão. Síntese frásica — representada por um período completo: Abolicionismo e interesses capitalistas juntam--se para colocar fim à escravidão. BIBLIOGRAFIA BÁSICA MARTINO, Agnaldo. Português Esquematizado – Gramática, Interpretação de texto, Redação Oficial e Redação Discursiva. São Paulo: Saraiva, 7ª ed., 2018. BIBLIOGRAFIA DE APOIO BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 37ª ed., 2009. CEREJA, Willian e COCHAR, Thereza. Gramática reflexiva: texto, semântica e interpretação. São Paulo: Atual, 3 ed., 2010. ________________________________e CILEY, Cleto. Interpretação de Textos: construindo competências e habilidades em leituras. São Paulo: Atual. 2009. FÁVERO, Leonor Lopes. Coesão e coerência textuais. São Paulo: Ática, 10ª ed., 2005. 7 Esses conceitos já foram dados anteriormente. 8 SINGER, Paul. A formação da classe operária. São Paulo: Atual, 1988, p. 44. KOCH, Ingedore Vilaça & ELIAS, Vanda Maria. Ler e escrever: Estratégias de produção textual. São Paulo: Contexto, 2009.
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