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MÓDULO 1 Histórico dos Conselhos da Comunidade CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: Formação de Conselheiros GOVERNO FEDERAL Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva Vice-Presidente da República Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho Ministro da Justiça e Segurança Pública Enrique Ricardo Lewandowski Secretário da Secretaria Nacional de Políticas Penais– SENAPPEN André de Albuquerque Garcia Diretora da Escola Nacional de Serviços Penais – ESPEN Stephane Silva de Araújo Equipe ESPEN Haynara Jocely Lima de Almeida UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA Coordenação Geral Luciano Patrício Souza de Castro Financeiro Fernando Machado Wolf Consultoria Técnica EaD Giovana Schuelter Coordenação de Produção Caroline Daufemback Henrique Francielli Schuelter Coordenação de AVEA Andreia Mara Fiala Revisão Textual Supervisão: Evillyn Kjellin Victor Rocha Freire Silva Vivianne Oliveira Rodrigues Design Instrucional Supervisão: Milene Silva de Castro Flora Bazzo Schmidt Gabriel de Melo Cardoso Joyce Regina Borges Design Gráfico Supervisão: Mary Vonni Meürer de Lima Airton Jordani Jardim Filho Cleber da Luz Monteiro Giovana Aparecida dos Santos Guilherme Comerão Stecca Almeida Julia Morato Leite Lucas Renata Cristina Gonçalves Sonia Trois Tiago Augusto Paiva Programação Supervisão: Alexandre Dal Fabbro João Pedro Mendonça de Araujo Luan Rodrigo Silva Costa Luiz Eduardo Pizzinatto Audiovisual Supervisão: Rafael Poletto Dutra Angie Luiza Moreira de Oliveira Dilney Carvalho da Silva Eduardo Corrêa Machado Jacob de Souza Faria Neto Kimberly Araujo Lazzarin Marcelo Vinícius Netto Spillere Marília Gabriela Salomao Dauer Maycon Douglas da Silva Apresentação Áureo Mafra de Moraes Conteúdo Tatiana Whately de Moura BY NC ND Todo o conteúdo do curso Conselho da Comunidade e Controle Social: Formação de Conselheiros, da Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública do governo federal – 2022, está licenciado sob a Licença Pública Creative Commons Atribuição - Não Comercial - Sem Derivações 4.0 Internacional. Para visualizar uma cópia desta licença, acesse: https://creativecommons.org/licenses/by- nc-nd/4.0/deed.pt_BR. EXPEDIENTE https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt_BR https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt_BR A partir de 1º de janeiro de 2023, o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) passou a ser denominado Secretaria Nacional de Políticas Penais (SENAPPEN), instituída pelo Art. 59 da Medida Provisória nº 1.154; porém, devido ao fato de o material deste curso ter sido produzido antes da vigência da referida medida provisória, há conteúdos em que a atual SENAPPEN é mencionada como DEPEN. É possível, ainda, que outros órgãos gover- namentais federais citados nos materiais, como ministérios, secretarias e departamentos, disponham de uma nova estrutura regimental e uma nova nomenclatura e sejam mencionados de maneira diferente da atual. ESCLARECIMENTO SUMÁRIO Apresentação 5 Objetivos do módulo 5 Unidade 1: A entrada da sociedade nas prisões através das igrejas 7 1.1 Histórico 7 Unidade 2: Lei de Execução Penal 11 2.1 Os órgãos da execução penal 11 2.2 Os Conselhos da Comunidade 16 Síntese do Módulo 23 Referências 24 CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 5 APRESENTAÇÃO Olá, cursista! Sejam bem-vindos(as) ao nosso primeiro módulo de estudos. Neste módulo será apresentado um breve histórico da entrada da so- ciedade nas prisões através das igrejas e de comissões de cidadãos que exerciam funções de fiscalização nas prisões. Esse histórico contribui para o entendimento do que foi previsto legalmente como função dos Conselhos da Comunidade. Na segunda unidade deste módulo, serão apresentados os órgãos de execução penal, instituídos pela Lei de Execução Penal, delineando funções específicas de execução, fiscalização e/ou de orientação. Este módulo apresentará as bases históricas e legais para a atuação dos Conselhos da Comunidade, que passaram por transforma- ções em suas práticas, as quais serão abordadas nos módulos seguintes. Objetivos do módulo • Identificar a história da entrada da sociedade nas prisões. • Identificar os órgãos da execução penal e suas funções. • Caracterizar as funções e características dos Conselhos da Comunidade. UNIDADE 1 A entrada da sociedade nas prisões através das igrejas CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 7 1. A ENTRADA DA SOCIEDADE NAS PRISÕES ATRAVÉS DAS IGREJAS A atuação dos Conselhos da Comunidade foi se transformando ao longo dos anos, mas é importante fazer um resgate histórico para entender seu surgimento e as bases nas quais se anteparam as funções previstas em lei para esses conselhos. Avance para os tópicos a seguir e conheça mais sobre a história dos Conselhos da Comunidade. 1.1 Histórico QR CODE Aponte a câmera do seu dispositivo móvel (smartphone ou tablet) no QR Code ao lado para assistir ao vídeo de animação sobre os antecedentes históricos dos Conselhos da Comunidade, ou acesse o link: https://youtu.be/zMsA_HNAey4. Os antecedentes históricos que costumam ser relacionados aos Conselhos da Comunidade remetem a origens religiosas, com a prática de visitar os reclusos para fornecer alimentos, vestimentas e dar apoio espiritual. Foto: © [Thoom] / Shutterstock. https://youtu.be/zMsA_HNAey4 CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 8 Eugenio Cuello Calón aponta que a prática foi criada no Congresso de Niceia no ano de 235, em que foram criados os procuratores pauperum (1958 apud FERREIRA, 2014). As fraternidades religiosas surgiram no século XIII na Itália e no século XIV na França, com os mesmos objetivos. Outro marco importante remonta ao ano de 1480, em que os reis católicos atribuíram a juízes e promotores a função de inspecionar prisões (LEAL, 2012). “A igreja católica tem longa tradição na atividade de visitação dos cárceres, embora várias igrejas evangélicas nos dias atuais realizem esta atividade, e com intensidade, deflagrando uma relação muito estreita entre a visitação no cárcere e a religião cristã. Foi a partir dos jesuítas que uma história no cárcere passou a ser escrita, e, atualmente, tem continuidade a partir das experiências da Pastoral Carcerária, mundo afora e especialmente no Brasil, por seus serviços religiosos prestados aos encarcerados e para a melhoria das condições car- cerárias.” (LEAL, 2012, p. 62-63). No Brasil, a Lei de 1º de outubro de 1828, que estabelece as atribuições das Câmaras Municipais, instituiu a base para o que depois vieram a se tornar os Conselhos da Comunidade, estipulando a criação de comissão de cidadãos para realização de inspeções a unidades prisionais. Art. 56. Em cada reunião, nomearão uma commissão de cidadãos probos, de cinco pelo menos, a quem encarregarão a visita das prisões civis, militares, e ecclesiasticas, dos carceres dos conventos dos regulares, e de todos os estabelecimentos publicos de ca- ridade para informarem do seu estado, e dos melhoramentos, que precisam. Art. 57. Tomarão por um dos primeiros trabalhos, fazer construir ou concertar as prisões publicas, de maneira, que haja nellas a segurança, e commodidade, que promette a Constituição. (BRASIL, 1828). Os Conselhos da Comunidade surgem como versões laicizadas da tra- dição de entrada da sociedade nos cárceres, mas mantendo uma lógica assistencialista em sua atuação, especialmente em relação à assistência Procuratores Pauperum Sacerdotes e leigos que costumavam visitar as pessoas privadas de liberdade para prover alimentos, vestimentas e apoio religioso. CONSELHODA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 9 material, buscando a disponibilização de materiais básicos de higiene, colchões, vestimentas, etc. A característica laica nem sempre é verificada na prática, uma vez que a influência de entidades religiosas, em geral católica ou evangélica, ainda é forte em muitos desses conselhos. A própria constituição de alguns Conselhos da Comunidade é apontada como resultado de uma Campanha da Fraternidade de 1997 da Igreja Católica, que tratou do tema das prisões e despertou o interesse da comunidade católica para a temática (DAUFEMBACK, 2010). SAIBA MAIS Veja informações sobre a Campanha da Fraternidade de 1997, disponível em: https://campanhas.cnbb.org.br/campanha/ fraternidade1997. https://campanhas.cnbb.org.br/campanha/fraternidade1997 https://campanhas.cnbb.org.br/campanha/fraternidade1997 UNIDADE 2 Lei de Execução Penal CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 11 2. LEI DE EXECUÇÃO PENAL Nesta unidade, serão apresentados os órgãos da execução penal, institu- ídos pela Lei de Execução Penal em 1984. Também veremos as funções dos Conselhos da Comunidade e como estes se relacionam com os demais órgãos e suas funções orientadoras, fiscalizadoras e executivas. 2.1 Os órgãos da execução penal Conheça a seguir os órgãos da execução penal instituídos pela Lei de Execução Penal – LEP (Lei n° 7.210, de 1984): O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) é um órgão subordinado ao Ministério da Justiça, com 13 membros designados pelo Ministro da Justiça, entre professores e profissionais da área do Direito Penal, Processual Penal, Penitenciário e ciências correlatas, bem como representantes da comunidade e dos Ministérios da área social. Os membros do CNPCP são renovados um terço em cada ano e seu man- dato tem duração de dois anos. Cabe a este órgão os itens listados a seguir. CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 12 Responsabilidades do CNPCP 8 7 6 5 4 3 2 1 9 Representar ao juiz da execução ou à autoridade administrativa para instauração de sindicância ou procedimento administrativo, em caso de violação das normas referentes à execução penal. Propor diretrizes da política criminal. Estimular e promover a pesquisa criminológica. Promover a avaliação periódica do sistema criminal. Contribuir na elaboração de planos nacionais. Inspecionar e fiscalizar os estabelecimentos penais, propondo às autoridades dela incumbida as medidas necessárias ao seu aprimoramento. Estabelecer critérios para a elaboração de estatística criminal. Estabelecer regras sobre a arquitetura e construção de estabelecimentos penais. Elaborar programa nacional penitenciário de formação do servidor. CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 13 Além disso, também é sua responsabilidade representar à autoridade competente para a interdição de estabelecimento penal (Capítulo II). Vejamos as responsabilidades dos demais órgãos, a seguir. • Juízo da Execução O Juízo da Execução Penal compete ao juiz indicado na lei local de orga- nização judiciária e, na sua ausência, ao juiz responsável pela sentença. O juiz responsável pela execução penal tem, entre outras, as seguintes competências: a) decidir administrativamente sobre a execução da pena concedida; b) zelar pelo correto cumprimento da pena e da medida de segurança; c) inspecionar, mensalmente, os estabelecimentos penais, tomando providências para o adequado funcionamento e d) compor e instalar o Conselho da Comunidade (Capítulo III). • Ministério Público O Ministério Público é responsável pela fiscalização da execução da pena e da medida de segurança, oficiando no processo executivo e nos incidentes da execução. Cabe também ao Ministério Público realizar visitas mensais aos estabelecimentos penais (Capítulo IV). • Conselho Penitenciário O Conselho Penitenciário é instituído como órgão consultivo e fis- calizador da execução da pena. Seus membros são nomeados pelo governador do estado, do Distrito Federal e dos territórios. É integrado, assim como no CNPCP, por professores e profissionais da área do Direito Penal, Processual Penal, Penitenciário e ciências correlatas. Incumbe ao Conselho Penitenciário: a) emitir parecer sobre indulto e comutação da pena; b) inspecionar os estabelecimentos e serviços penais; c) apresentar ao CNPCP relatórios anuais dos trabalhos realizados e d) supervisionar os patronatos e a assistência aos egressos (Capítulo V). • Departamentos Penitenciários Entre os Departamentos Penitenciários, são instituídos, no capítulo VI, o Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) e os Departamentos Penitenciários locais (estaduais). O DEPEN, subordinado ao Ministério da Justiça, é órgão executivo da Política Penitenciária Nacional e de apoio administrativo e financeiro do CNPCP e tem entre suas atri- buições: a) acompanhar a aplicação das normas da execução penal no país; b) inspecionar e fiscalizar periodicamente os estabelecimentos e serviços penais; c) assistir tecnicamente as unidades federativas na CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 14 implantação dos princípios e regras estabelecidos na LEP; d) colaborar com as unidades federativas mediante convênios, na implantação de estabelecimentos e serviços penais; e) colaborar com a unidades federa- tivas para a realização de cursos de formação de pessoal penitenciário e de ensino profissionalizante do condenado e do internado e f) coordenar e supervisionar os estabelecimentos penais federais; etc. • Patronato O Patronato, público ou particular, destina-se a prestar assistência aos albergados e aos egressos (entendidos como os liberados definitivos, pelo prazo de um ano a contar da saída do estabelecimento, e os liberados condicionais, durante o período de prova). Tem por atribuição: a) orientar os condenados à pena restritiva de direitos; b) fiscalizar o cumprimento das penas de prestação de serviços à comunidade e de limitação de fim de semana e c) colaborar na fiscalização do cumprimento das condições da suspensão e do livramento condicional (Capítulo VII). • Conselhos da Comunidade Os Conselhos da Comunidade, instituídos pelos juízes da execução, são constituídos no âmbito das comarcas no Brasil. Atualmente, há 2.702 comarcas que congregam os 5.570 municípios brasileiros (CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2019). De acordo com o texto legal, o conselho deve ser composto, no mínimo, por um representante da associação comercial ou industrial, um advogado indicado pela Seção da Ordem dos Advogados do Brasil, um defensor público indicado pelo Defensor Público Geral (incluído pela Lei n. 12.313/2010) e um assistente social escolhido pela Delegacia Seccional do Conselho Nacional de Assistentes Sociais (art. 80). Na falta da representação prevista, fica a critério do juiz da execução a escolha dos integrantes. A instalação do conselho é uma atribuição do juiz de execução penal (artigo 66, inciso IX). Tais conselhos são responsáveis por: a) visitar estabelecimentos penais; b) entrevistar presos; c) apresentar relatórios mensais ao juiz e ao Conselho Penitenciário e d) diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos para melhor assistência ao preso (capítulo VIII). • Defensoria Pública Por fim, a Defensoria Pública, introduzida na LEP como órgão da exe- cução penal pela Lei n° 12.313, de 2010. Cabe à Defensoria Pública velar pela regular execução da pena e da medida de segurança, oficiando no processo executivo e nos incidentes da execução. Entre suas atribuições, consta: a) visitar os estabelecimentos penais, tomando providências para CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLESOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 15 o adequado funcionamento e b) requerer, quando for o caso, a apuração de responsabilidade (capítulo IX). Veja a seguir os órgãos da execução penal por tipo de função. Há uma complexidade interinstitucional a ser considerada nas funções dos órgãos de execução penal que envolve a diferença entre os Poderes Executivo e Judiciário e entre os níveis federativos. A rigor, os estados e o Distrito Federal são os responsáveis pela formulação e implementação da política penal e são submetidos a medidas orien- tadoras e consultivas de outros órgãos, como o Conselho Penitenciário – no mesmo nível federativo –, o CNPCP e o DEPEN, em suas orientações e recomendações realizadas no âmbito federal. E são, ainda, passíveis de fiscalização por todos os órgãos da execução penal. Orgãos da execução penal, por tipo de função Consultiva/ orientadora Fiscalizadora Executiva Conselho Penitenciário Ministério Público Departamentos penitenciários locais Defensoria Pública CNPCP DEPEN Patronato Juiz Conselho da Comunidade CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 16 Entretanto, é possível identificar a natureza executiva em outros órgãos da execução penal. O Departamento Penitenciário Nacional também possui uma função executiva na política penal, ao gerenciar as cinco peniten- ciárias federais existentes no Brasil; os patronatos, além de sua função de fiscalização da pena, possuem função de assistência direta aos albergados e egressos do sistema prisional; e os juízes da execução são responsáveis por decidir administrativamente sobre o cumprimento da pena. E, por fim, os Conselhos da Comunidade têm a possibilidade de executar diretamente medidas de assistência às pessoas privadas de liberdade, além de fiscalizar as condições dos estabelecimentos penais. 2.2 Os Conselhos da Comunidade Os Conselhos da Comunidade incorporam cidadãos e representantes de entidades de classe na lógica de inspeção e fiscalização do sistema prisional, mas há uma lacuna normativa em relação a potenciais pon- tos de interlocução e encaminhamento de demandas diretamente ao Poder Executivo. Foto: © [rafapress] / Shutterstock. CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 17 Ou seja, interpretando a letra da lei, uma vez identificadas demandas nas inspeções, os conselheiros podem realizar diligências para obtenção de recursos materiais e humanos (art. 81, inciso IV, da Lei de Execução Penal) ou incluir eventuais outras questões no relatório mensal que deve ser apresentado ao juiz (art. 81, inciso III, da Lei de Execução Penal), que, supõe-se, daria o devido encaminhamento judicial. Não há, assim, um mecanismo instituído em lei de participação dos Conselhos da Comunidade no processo de tomada de decisão da política penal, em geral, ou da política prisional, especificamente. Conheça as funções dos Conselhos da Comunidade segundo a LEP. Funções dos Conselhos da Comunidade Apresentar relatórios mensais ao juiz da execução e ao Conselho Penitenciário. Diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos. • Visitar estabelecimentos penais. • Entrevistar pessoas presas. CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 18 Veja, a seguir, como a Lei de Execução Penal (LEP) influencia na criação e atuação dos Conselhos da Comunidade. PODCAST Após a edição da Lei de Execução Penal (LEP), os Conselhos da Comunidade passaram a ser criados em diversas localidades no Brasil, de acordo com o “senso de solidariedade de cada um, na percepção, tato ou aceitação de cada juiz, mas em número insuficiente comparado com a quantidade de prisões e comarcas desse país continental” (VALOIS, 2011, p. 8). Apesar da LEP prever as atribuições do Conselho da Comunidade, não há definição de seus objetivos ou da forma de efetivação das diligências. Além disso, não há previsão de recursos e não é definida a natureza jurídica desses conselhos. Assim, os Con- selhos da Comunidade têm sido instituídos de formas variadas. Há uma dependência dos Conselhos da Comunidade em relação ao Judiciário – seja para a própria instituição dos conselhos, que dependem do juiz de execução penal, seja para obtenção de recursos para desenvolvimento de suas atividades, através de repasse da pena pecuniária. CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 19 Veja a seguir o que foi identificado em uma pesquisa realizada junto a conselheiros do Paraná por Rocha (2017). Para Rocha, o protagonismo dos juízes em relação à integração dos con- selheiros reforça seu protagonismo em relação ao conselho. As entrevistas realizadas por Rocha também identificaram que os conselheiros(as) tinham aproximação prévia com o universo dos Conselhos da Comunidade por conta de sua atuação profissional ou por relações profissionais. Formas de ingresso nos conselhos Formas de ingresso nos conselhos 37% dos respondentes iniciaram o trabalho como conselheiro por indicação/convite do juiz 0,2% foi indicado por promotor de justiça 23,5% foram indicados como consequência da sua atividade profissional (por exemplo, representantes da OAB, de associação comercial, etc.) 23,5% foram indicados por outro conselheiro 3,9% se voluntariaram 21,6% foram indicados pela liderança da entidade à qual pertence CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 20 No que se refere à natureza jurídica: “Vê-se que há Conselhos que possuem a feição de ‘pessoas jurídicas de direito público’, sem estatutos ou mecanismos internos de regramento e que atuam, simplesmente, após a constituição pela autoridade judiciária, como se fossem auxiliares do juízo, prestando-lhe contas. Outros há que, mesmo como ‘pessoas jurídicas de direito público’ adquirem e buscam maior autonomia em relação à figura do juiz, seja para que o trabalho a ser desenvolvido não seja pessoalizado, centrado na figura do juiz ‘x’ ou ‘y’ [...]. Há, ainda, outros membros de Conselhos que, após serem convocados pelo magistrado a assumirem seus cargos, tratam de organizar e constituir uma pessoa jurídica de direito privado, com personalidade jurídica e estatutos próprios, com diretoria periodicamente eleita, não só para ter independência em relação ao juízo, como, também, para mais facilmente conseguir obter recursos públicos e privados, apresentando projetos a entidades públicas e privadas dispostas a financiar iniciativas na seara penal.” (LOSEKANN, 2010, p. 46). Diante da pluralidade de formas e da ausência de estruturas institucionais prefixadas, inclusive quanto ao modo de implantação e financiamento das atividades, os conselhos da comunidade têm buscado diferentes estratégias de formalização institucional para possibilitar a operação de recursos. A maioria dos conselhos possuem recursos próprios, pro- venientes da Pena Pecuniária repassada pelo Poder Judiciário ou de convênios com secretarias municipais e estaduais (DAUFEMBACK, 2010). O Código Penal estabelece, em seu art. 43, inciso I, a prestação pecu- niária como uma das penas restritivas de direitos, ou seja, trata-se de uma pena que pode ser aplicada pelo juiz, atribuindo ao réu a obrigação de pagamento em espécie. CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 21 A Resolução CNJ nº 154, de 2012, alterada pelas Resoluções nº 206/2015 e 225/2016, define a política institucional do Poder Judiciário na utilização dos recursos oriundos da aplicação da pena de prestação pecuniária e es- tabelece, em seu art. 2º, que os valores, quando não destinados à vítima ou aosseus dependentes, serão, preferencialmente, destinados à entidade pública ou privada com finalidade social, previamente conveniada, ou para atividades de caráter essencial à segurança pública, educação e saúde. Essa resolução apresenta os Conselhos da Comunidade como um dos possíveis projetos a serem financiados com o recurso proveniente da prestação pecuniária. Em 2007 foi realizado um levantamento, durante o II Encontro de Conselhos da Comunidade da Região Sul, junto a 65 conselheiros. Veja a seguir os dados levantados no encontro. Levantamento realizado em 2007 durante o II Encontro de Conselhos da Comunidade da Região Sul 57 Conselhos de Comunidade • 38% se constituíram como Associação. • 35% outros tipos. • 10% não possuíam personalidade jurídica. • 17% não responderam. 73% dispõem de recursos próprios • Desses, 69% dos recursos eram provenientes de penas pecuniárias. CONSELHO DA COMUNIDADE E CONTROLE SOCIAL: FORMAÇÃO DE CONSELHEIROS MÓDULO 1 | Histórico dos Conselhos da Comunidade 22 Estudo posterior realizado no Paraná (ROCHA, 2017) identificou que, em 2016, todas as 161 comarcas do estado possuíam Conselhos da Comunidade criados e 116 estavam regularizados e aptos a receber recursos. Um levantamento realizado pelo Ministério da Justiça em 2008 identificou a existência de 639 Conselhos da Comunidade no Brasil e levantamento posterior, realizado pelo Conselho Nacional de Justiça, identificou que, em 2012, já havia 1.046 Conselhos da Comunidade. Há uma concentração das atividades dos Conselhos da Comu- nidade nas unidades prisionais, cerca de um terço das comarcas possuem unidades prisionais. Mas Daufemback (2010) aponta que a instalação dos Conselhos da Comunidade em locais que não têm unidade prisional favorece o envolvimento destes em programas de alternativas penais, que demandam um envolvi- mento maior da sociedade. Veja a seguir uma retomada dos principais pontos deste módulo. 23 SÍNTESE DO MÓDULO Neste módulo foram apresentados os antecedentes históricos de entrada da sociedade nas prisões, que acabou sendo reproduzido em moldes similares pela Lei de Execução Penal. A LEP previu aos Conselhos da Comunidade apenas atividades de fiscalização e de diligências voltadas a recursos materiais e humanos para melhorar assistência ao(à) preso(a) e internado(a) – atividades relacionadas ao que já era exercido pela comissão de cidadãos probos, criada pela Lei das Câmaras Municipais em 1828. A LEP estabeleceu os órgãos da execução criminal, indicando suas res- ponsabilidades e respectivas funções consultiva/orientadora; fiscalizadora e executiva. Apesar da lei prever poucos membros para integrarem os Conselhos da Comunidade, uma atuação restrita e não prever recur- sos financeiros para a realização de suas atividades, os Conselhos da Comunidade passaram a buscar diferentes estratégias de formalização institucional e de atuação. Você finalizou o Módulo 1! No próximo módulo você verá um panorama da atuação dos Conselhos da Comunidade. REFERÊNCIAS BRASIL. Lei de 1º de outubro de 1828. Dá nova fórma ás Camaras Municipaes, marca suas atribuições, e o processo para a sua eleição, e dos Juizes de Paz. Rio de Janeiro, 1828. Disponível em: https://www.planalto. gov.br/ccivil_03/leis/lim/lim-1-10-1828.htm. Acesso em: 25 fev. 2022. BRASIL. Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Institui e lei de Execução Penal. Brasília, DF: Presidência da República, 1984. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm. Acesso em: 25 fev. 2022. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Justiça em Números 2019. Brasília: CNJ, 2019. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/ conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf. Acesso em: 25 fev. 2022. DAUFEMBACK, V. Questões sobre o contexto e a atuação dos Conselhos da Comunidade: a experiência da Região Sul. In: BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Ouvidoria do Sistema Penitenciário. Fundamentos e análises sobre os Conselhos da Comunidade. Brasília: Ministério da Justiça, 2010. p. 67-86. FERREIRA, J. C. Os Conselhos da Comunidade e a reintegração social. Dissertação (Mestrado em Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia) – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2014. LEAL, C. B. Execução Penal na América Latina à luz dos direitos humanos: uma viagem pelo caminho da dor. Curitiba: Juruá, 2012. LOSEKANN, L. O juiz, o poder judiciário e os conselhos da comunidade: algumas reflexões sobre a participação social na execução penal. In: BRASIL. Ministério da Justiça. Departamento Penitenciário Nacional. Ouvidoria do Sistema Penitenciário. Fundamentos e análises sobre os Conselhos da Comunidade. Brasília: Ministério da Justiça, 2010. p. 41-63. MOURA, T. W. Conselhos da Comunidade – do assistencialismo à política? Projeto de Qualificação de Doutorado apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade de Brasília, 2020. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/lim-1-10-1828.htm https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/lim-1-10-1828.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/conteudo/arquivo/2019/08/justica_em_numeros20190919.pdf REFERÊNCIAS ROCHA, M. A. A atuação dos Conselhos da Comunidade do estado do Paraná no processo de execução penal: possibilidades, limites e desafios. Universidade de Londrina, 2017. VALOIS, L. C. Prisão, participação social e a Região Norte. In: Fundamentos e Análises sobre os Conselhos da Comunidade. Brasília: Ministério da Justiça, 2011. Apresentação Objetivos do módulo 1.1 Histórico 2.1 Os órgãos da execução penal 2.2 Os Conselhos da Comunidade Síntese do Módulo Referências
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