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AVA Unidade 4 - Monitoramento do paciente anestesiado

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Unidade 4 - Monitoramento do paciente anestesiado
Monitoração anestésica
Durante um procedimento anestésico, dentre os diversos fatores e momentos que merecem extrema atenção do profissional, a monitoração de paciente anestesiado é considerada um dos pontos cruciais para o sucesso do procedimento anestésico. 
Todo o cuidado e atenção são necessários, pois diversos fármacos utilizados para promover anestesia e analgesia também podem levar a um estado de depressão cardiopulmonar. Portanto, é possível afirmar que a monitoração anestésica é a chave para a segurança anestésica.
Sendo assim, no procedimento anestésico, a monitoração do paciente é fundamental para que não ocorram problemas com as funções vitais do animal e para que o procedimento seja realizado com segurança. O sucesso do procedimento depende da escolha de um protocolo anestésico adequado ao tipo de paciente e ao procedimento, além da manutenção da perfusão e oxigenação tecidual, em conjunto com o monitoramento constante do paciente.
O monitoramento do paciente é contínuo e todos os parâmetros devem ser registrados em uma planilha para controle do médico veterinário e anestesista responsável. Dessa maneira, tudo que acontece em um procedimento anestésico, desde a medicação pré-anestésica até a completa recuperação do paciente, deve ser monitorado, observado e registrado. O controle e organização é essencial para o sucesso do procedimento.
Durante o monitoramento do paciente, se observam circulação sanguínea, oxigenação, ventilação e temperatura do animal. Essa monitoração contínua do paciente possibilita que o anestesista perceba, de forma rápida e eficaz, qualquer alteração no animal, permitindo a identificação do problema e a ação rápida para solucionar o mais rápido possível, visando a manutenção da segurança do paciente e evitar danos posteriores.
DICA Para a monitoração do paciente, o monitor multiparamétrico é um equipamento que auxilia o trabalho do médico veterinário e anestesista, tendo em vista que é uma ferramenta que fornece amplos parâmetros para visualização e acompanhamento em tempo real.
Sobre os equipamentos que podem e devem ser utilizados na monitoração anestésica, algumas considerações são importantes. O médico veterinário deve adequar os equipamentos de monitoração anestésica aos procedimentos clínicos e cirúrgicos realizados no paciente. É fundamental que o equipamento possibilite a monitoração cardiopulmonar adequada, visto que o equipamento pode ser limitado pela espécie e características individuais do paciente
Diversos parâmetros da função cardiovascular e pulmonar são monitorados. Contudo, tais parâmetros não são mensurados e analisados de forma isolada, pois definem apenas a si, não sendo utilizados para definir o status geral do sistema. Com isso, há a necessidade da monitoração de um conjunto de parâmetros, sempre com o propósito de garantir a manutenção da entrega de oxigênio aos tecidos, bem como manter o organismo em pleno funcionamento e o paciente em segurança durante o procedimento. Junto a todos os cuidados citados para a monitoração do paciente, é preciso lembrar que o risco inerente do procedimento para cada paciente deve ser avaliado com antecedência em qualquer procedimento, sendo determinante do nível de monitoração necessária.
PROFUNDIDADE ANESTÉSICA
A profundidade anestésica é um dos parâmetros considerados durante a monitoração anestésica do paciente, sendo passível de determinação durante um procedimento de anestesia geral.
Como já se conhece de forma detalhada, a classificação dos planos anestésicos, exposta por Guedel, no livro Inhalation anesthesia, de 1951, é importante relembrar pequenos detalhes a respeito deles. A anestesia é classificada em quatro diferentes estágios (1 a 4), e quatro diferentes planos anestésicos no estágio 3. Esses planos anestésicos servem como referência ao anestesista para determinação da profundidade anestésica e indicam se o paciente está em um plano ou estágio anestésico adequado para determinado tipo de procedimento clínico ou cirúrgico.
Com isso, a monitoração do plano anestésico serve como referência na monitoração do paciente, já que o planejamento prevê que o paciente deve ficar em determinado plano anestésico no procedimento clínico, e a não permanência do paciente nesse plano é indicativo direto de problemas com a anestesia. Assim, os estágios e planos anestésicos na monitoração da profundidade anestésica são caracterizados como o conjunto de sinais e parâmetros fisiológicos do paciente que auxiliam na determinação da profundidade anestésica.
Os estágios e planos anestésicos são um conjunto de sinais e parâmetros fisiológicos que auxiliam na caracterização da profundidade anestésica, determinada pela quantidade de fármacos anestésicos, pela magnitude de estímulo que o procedimento cirúrgico ou clínico realizado causa e também por meio das condições de hipotermia e hipotensão causada pelos efeitos dos depressores sinérgicos no Sistema Nervoso Central. Na monitoração da profundidade anestésica são considerados como principais sinais e parâmetros a serem avaliados:
· Parâmetros oculopalpebrais (palpebral, corneal e pupilar);
· Reflexo interdigital e digital;
· Reflexo laringotraqueal;
· Reflexo anal;
· Alterações cardiopulmonares.
Na monitoração da profundidade anestésica, é utilizado o Índice Bispectral – BIS, que é uma análise derivada do EEG (eletroencefalografia), que avalia a depressão cortical. É uma técnica bem padronizada e definida na medicina humana, contudo, ainda apresenta resultados inconsistentes na medicina veterinária. Esses resultados inconsistentes podem estar relacionados à necessidade de padronização do teste para cada espécie. Para pequenos animais, como cães, a técnica está estabelecida, enquanto para grandes animais, como os equinos, ela ainda é um teste inconsistente. Na atualidade, a profundidade anestésica é monitorada e classificada como plano superficial, adequado e profundo, sendo que cada um desses planos para avaliação da profundidade anestésica é caracterizado por alguns sinais específicos, como se observa no Diagrama 1.
Os fatores determinantes nessa monitoração da profundidade anestésica são:
· Tipo de intervenção cirúrgica ou clínica a qual o paciente se submete;
· Espécie e raça do paciente;
· Estado fisiológico e histórico clínico do paciente;
· Fármacos utilizados e protocolo anestésico determinado.
TEMPERATURA
A temperatura é um dos parâmetros considerados na monitoração anestésica.
Esse monitoramento é fundamental, pois quadros de hipotermia podem levar à depressão cardiovascular, redução do metabolismo cerebral e atraso/problemas na recuperação anestésica. Já o extremo oposto, a hipertermia, promove aumento do metabolismo e elevação no consumo de oxigênio. Assim, é importante o monitoramento e a manutenção do paciente em temperatura normal e equilibrada.
A hipotermia faz com que ocorra decréscimo na função respiratória do paciente. Quando a temperatura corporal diminui, fisiologicamente compensando, há um decréscimo na função respiratória em igual nível e, com isso, o anestesista deve evitar a hipotermia acentuada do paciente durante o procedimento anestésico, de modo a evitar problemas respiratórios, algo que é lembrado por Natalini e Bizani em artigo para a revista A Hora Veterinária, publicado em 1990.
CURIOSIDADE Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Cardenal Herrera (REDONDO et al., 2012) com 275 gatos constata que 96% deles sofrem de hipotermia durante intervenções veterinárias que requerem anestesia. A prevalência da hipotermia é leve em 26,5% dos casos, moderada em 60,4% e severa em 10,5% dos gatos estudados.
FREQUÊNCIA CARDÍACA E PRESSÃO ARTERIAL
Com relação à monitoração da frequência cardíaca, um procedimento de monitoração básica é composto por frequência cardíaca, pressão arterial e traçado eletrocardiográfico.
A frequência cardíaca é mensurada por diversas técnicas, sendo a preferida o eletrocardiograma, que fornece dados de frequência cardíaca e ritmo ao mesmo tempo. Ainda assim,é essencial que a pressão arterial seja monitorada para obter os valores da atividade elétrica e da ejeção de sangue pelo coração. Há também a possibilidade de monitorar o débito cardíaco (DC), a pressão venosa central (PVC) e a variação na pressão de pulso, também conhecido como Delta PP.
// Frequência cardíaca: A frequência cardíaca analisa a atividade cardíaca que não está relacionada com o volume de ejeção sanguínea. Pode ser avaliada pelos métodos de palpação arterial, estetoscopia e estetoscopia esofágica. A eletrocardiografia (ECG) faz o registro gráfico da atividade elétrica cardíaca; realiza a mensuração da frequência e ritmo cardíaco; faz a leitura dinâmica do ECG, possibilitando assim a verificação de arritmias; é um método muito útil na avaliação cardíaca, porém não é tão preciso quanto as informações hemodinâmicas. Na Figura 1 podemos observar um paciente felino, sedado e sendo monitorado por meio de exame de eletrocardiograma.
// Perfusão tecidual: Técnica em que se realiza a palpação do pulso arterial (das artérias periféricas). É definido pelo tempo de preenchimento capilar (1-2”) e avalia a coloração das mucosas;
// Pressão arterial: avaliação da perfusão tecidual, em que ocorre a mensuração das pressões sistólicas, média e diastólica (a depender do método de avaliação);
// Pressão arterial invasiva: Método considerado “padrão-ouro” de monitoração da pressão arterial, em que é necessária a realização da arteriopunção, pois essa técnica fornece valores precisos de hipotensão e contínuos da pressão arterial. Contudo, é uma técnica que exige experiência do profissional diante dos riscos de hematomas, menos graves, além de embolia e infecção, mais graves;
// Pressão arterial não-invasiva: Além dessa técnica, a pressão arterial pode ser aferida pelo método não invasivo, mediante sistema oscilométrico ou doppler arterial. Dessa forma, o método é mais fácil, rápido e não ocasiona lesão tecidual. Porém, não há aferimento dos valores de forma contínua e há maior risco da ocorrência de erros de leitura, sendo uma técnica imprecisa quanto à monitoração da hipotensão e ineficiente em pequenos animais;
// Pressão Venosa Central (PVC): Técnica que mensura a pressão sanguínea da veia cava cranial ou átrio direito, realizando a avaliação do retorno venoso. Essa técnica é indicada quando há quadros hemorrágicos intensos, em necessidade de transfusão sanguínea e fluidoterapias intensiva.
FREQUÊNCIA RESPIRATÓRIA
A monitoração respiratória e pulmonar é composta do acompanhamento da frequência respiratória, do SpO2 (mensuração da concentração de oxigênio na corrente sanguínea, ou seja, a oximetria) e do ETCO2, exame de capnografia que pode indicar, quando há redução dos valores, uma possível hipotermia, diminuição da atividade muscular, choque hipovolêmico, hipotireoidismo e hiperventilação alveolar.
Quando há aumento dos valores, é um indicativo de ventilação alveolar prejudicada como resposta à depressão respiratória causada pela anestesia, aumento do metabolismo celular e consumo de CO2 em excesso, em virtude de reinalação causada por problemas com o equipamento.
A oximetria é prática e de fácil monitoração, pois é uma técnica que fornece o percentual de hemácias (eritrócitos) com O2. O exame de capnografia é mensurado de forma contínua e prática, indicando possíveis alterações no padrão respiratório. Além desses, são utilizados os exames de ventilometria e hemogasometria. A visualização da coloração das mucosas é interessante para a avaliação da monitoração respiratória, visto que uma mucosa de coloração rósea indica boa oxigenação e uma mucosa de coloração pálida indica anemia do paciente ou vasoconstrição.
// Frequência respiratória: Uma forma de mensurar apenas a ausência de apneia, não estando correlacionada de forma direta à oxigenação tecidual. Pode ser realizada pelos métodos de observação do gradil costal, por meio de um estetoscópio e pelo balão reservatório;
// Oximetria de pulso: Essa técnica realiza a estimação da pressão arterial de oxigênio e a detecção de hipoxemia antes de ocorrer cianose. Ou seja, é um método simples e prático para avaliar a liberação de oxigênio aos tecidos. Todavia, é um método pouco eficiente quanto à monitoração da hipotensão, vasoconstrição e pigmentação de mucosas. Os valores da análise de oximetria de pulso podem ser afetados por diversos fatores, como vasoconstrição, ambiente com alta luminosidade, hipotensão, coloração da pele do paciente, interferência elétrica, entre outros. Na Figura 2, há um exemplo de mensuração da oximetria de pulso através da língua, mas também há a possibilidade de medição na orelha e em outros locais;
// Ventilometria: A ventilometria avalia a ventilação do paciente de forma não invasiva, através de um aparelho chamado ventilômetro ou respirômetro. Por meio desse aparelho, se verifica a capacidade vital do paciente. Essa técnica permite a avaliação do volume corrente e volume minuto expirados;
// Capnometria: Essa técnica demonstra a pressão parcial de CO2 nos alvéolos, clinicamente semelhante à PaCO2. Na Figura 3, é observada a mensuração de um capnograma na tela;
// Hemogasometria: Essa técnica mensura a PaO2, PaCO2, pH, HCO3-, excesso de bases e eletrólitos por coleta de amostra de sangue arterial. Através dessa técnica, são mensurados os gases sanguíneos, verificando a pressão parcial de oxigênio (pO2) e a pressão parcial de dióxido de carbono (pCO2), assim como do bicarbonato e do pH. Para avaliação das desordens respiratórias primárias ou da função pulmonar, o sangue arterial é indicado por possibilitar a obtenção de valores em qualquer situação fisiológica e a monitoração em intervalos regulares e demarcados. 
// Lactato sérico: Esse método avalia a oxigenação tecidual, sendo uma técnica de avaliação indireta do metabolismo celular e tendo relação direta com o índice de óbito de pacientes.
Emergências e complicações anestésicas
Durante um procedimento anestésico, as emergências e/ou complicações anestésicas são situações que exigem intervenção imediata do anestesista ou médico veterinário responsável, seja por causa do paciente ou do procedimento anestésico.
Tais complicações ocorrem como efeitos indesejáveis do plano anestésico ou efeitos colaterais de fármacos anestésicos, como uma possível intoxicação. Dentre as diversas emergências anestésicas num procedimento veterinário, se destacam apneia, assistolia ventricular, bradipneia, bradicardia, cianose, choque linfático, problemas circulatórios, dispneia, hipotensão, hipertensão, parada cardíaca, taquicardia, taquipneia, problemas respiratórios, entre outros.
As emergências anestésicas observadas em procedimentos de pequenos animais estão relacionadas com o fator risco e, sobretudo, com a profundidade anestésica, a administração em excesso ou deficiente de oxigenação, além de sensibilidade ao fármaco anestésico, manutenção da anestesia de forma inadequada, parada respiratória e/ou cardíaca ligada a causas variadas. Além dessas, as complicações anestésicas ocorrem devido à intoxicação ao fármaco anestésico, a problemas durante a intubação no esôfago, a planos anestésicos profundos e difíceis de monitorar, a dificuldades respiratórias e ocorrência de vômitos, dentre outros fatores relevantes no contexto
RELACIONADA AO SISTEMA RESPIRATÓRIO
As principais emergências anestésicas relacionadas ao sistema respiratório são, de forma resumida, a possibilidade de obstrução respiratória por algum objeto, coagulação ou excesso de saliva ou, de forma mais particular, como raça-específica, a exemplo dos animais braquicefálicos com maior ocorrência desse tipo de problema, além do surgimento de apneia e/ou hipoventilação, espasmo da laringe ou dos brônquios, ocorrência de taquipneia, bradipneia ou dispneia, cianose etc. Muitos dos problemas relacionados ao sistema respiratório se dão porque, segundo Natalini e Bizani (1990), diversos fármacos anestésicos atuam, em razão da ação direta no sistema nervoso central do animal, deprimindo as funções respiratórias.
// Apneia e hipoventilação:A apneia é caracterizada pela ausência de qualquer movimento respiratório e a hipoventilação, por sua vez, por uma respiração subnormal ou de pouco volume. Ambas as situações são respostas à utilização de bloqueadores neuromusculares, hipercapnia e dose excessiva de anestésicos, em especial barbitúricos, por um plano anestésico profundo e hiperventilação. Em situações em que o paciente apresenta apneia causada por efeito do anestésico, é indicada a promoção de um estímulo doloroso, seguido de estímulo frênico, tracionando a língua do animal. Se o problema persistir, é imprescindível o uso de ventilador mecânico no animal. Quando há hipoventilação ou hipercapnia que leve ao estado de apneia do paciente, o tratamento recomendado é a administração de oxigênio puro em respiração assistida. Nos casos de hiperventilação primária, a PaCO2 está menor em virtude da maior eliminação de CO2, aumentando o pH do sangue e podendo ou não aumentar o bicarbonato. Com isso, se reduz a ventilação gradativamente até que a movimentação dos músculos abdominais auxiliares da respiração seja perceptível;
// Bradipneia: É um estado que ocorre como consequência de um plano anestésico profundo. Pode ser corrigida ou mitigada por meio de medidas que alterem o plano anestésico para plano mais superficial do que profundo, e também com o uso de hiperventilação com oxigênio puro;
// Taquipneia ou polipneia: Essa situação geralmente ocorre em planos anestésicos superficiais sem analgesia suficiente, como resposta a ação de fármacos anestésicos simpatomiméticos como a cetamina, com analépticos ou estimulantes do sistema nervoso central. Também é comum ocorrer como resposta à acidose respiratória, em que a PaCO está aumentada e o pH diminuído. O tratamento, nesse caso, consiste em aprofundar o plano anestésico e utilizar outros fármacos para esse paciente, como analgésicos opioides, por exemplo, além de verificar as condições da cal sodada;
// Dispneia: A dispneia durante o ato anestésico pode acontecer como resultado de uma posição errada da sonda endotraqueal, pela obliteração da sonda endotraqueal no posicionamento desconfortável da cabeça do animal, pelo excesso de secreções pulmonares que obstrui a passagem de gases, além de ser resultado de defeito do equipamento anestésico ou de quando ocorre a extubação endotraqueal de maneira precoce (principalmente em animais braquicefálicos, como algumas raças de gatos ou cães, e em equinos, devido à flacidez da epiglote), com regurgitações de bolo alimentar ou secreções, em especial nos ruminantes. Todas essas situações devem ser identificadas e mediadas por meio do esvaziamento manual do conteúdo retido na cavidade oral e faringe e também da revisão detalhada do equipamento anestésico;
// Acidose respiratória: A acidose respiratória ocorre em função da depressão respiratória que acontece em planos anestésicos profundos, levando ao acúmulo de dióxido de carbono no pulmão. Essa condição leva o organismo a tentar expulsar o dióxido de carbono alveolar e, como consequência, resulta em elevação da frequência respiratória, contudo, o volume corrente não é elevado no animal anestesiado, permanecendo retido o dióxido de carbono. Como tratamento e mitigação desse problema em casos de anestesia inalatória, o indicado é diminuir de maneira gradativa a profundidade anestésica. Já em casos em que a anestesia é intravenosa, o indicado é realizar a ventilação do paciente e acelerar e excreção dos fármacos, conforme preconizado por Massone em Anestesiologia veterinária: farmacologia e técnicas, de 2019.
RELACIONADA AO SISTEMA CARDIOVASCULAR
As emergências relacionadas ao sistema cardiovascular mais comuns são taquicardia, arritmia e bradicardia, que ocorre em planos anestésicos profundos e em procedimentos com manipulação das vísceras abdominais.
// Taquicardia: A taquicardia é caracterizada pela frequência cardíaca acima do normal, e ocorre com mais frequência em animais jovens. Em geral, a taquicardia vem acompanhada de taquipneia e ocorre nas seguintes circunstâncias: administração de doses excessivas do fármaco anestésico, prenúncio do choque, administração exagerada de N20 ou de fármacos simpatomiméticos, administração do O2 na ventilação artificial, hipóxia, hipercapnia, planos anestésicos superficiais, animais febris e na síndrome da hipertermia maligna, como apontado por Natalini e Bizani (1990) e também por Massone (2019). O tratamento no caso de taquicardia depende do que ocasiona essa situação. Em casos de planos anestésicos superficiais, é indicado o aumento da dosagem do fármaco anestésico. Já em casos de planos anestésicos profundos, o indicado é a redução da profundidade anestésica por meio de redução da dosagem de anestesia de manutenção, enquanto nos casos em que a taquicardia não tem a origem conhecida, é recomendado o uso de fluidoterapia e betabloqueadores;
// Arritmia: As arritmias cardíacas são anormalidades de formação, condução, frequência e regularidade do impulso cardíaco. Durante a anestesia, casos de arritmia cardíaca são comuns em diversas espécies, sendo que a maior atenção e preocupação está nos casos em que se observam irregularidades no pulso periférico. As arritmias cardíacas são caracterizadas por bradicardia e taquicardia, cianose, mucosas de coloração mais pálidas, hipotermia e alterações na pressão sanguínea e tônus cardíaco. O diagnóstico é realizado de forma definitiva por meio do monitor cardíaco durante a monitoração do paciente anestesiado. As arritmias cardíacas podem ser tratadas por meio da determinação do tipo de arritmia e identificação do fator causador, corrigindo os possíveis distúrbios por meio de avaliação da profundidade anestésica e ajustes apropriados no vaporizador, realização de oxigenioterapia intensa, correção dos desequilíbrios acidobásicos e eletrolíticos sanguíneos, utilização de fármacos antiarrítmicos em momentos em que a correção dos possíveis fatores precipitantes não resultarem em melhora do quadro ou há piora dos sinais clínicos e das arritmias, e quando há riscos à vida do paciente;
// Bradicardia: A bradicardia é caracterizada pelo funcionamento anormal do coração, com ou sem ritmo ventricular, sendo tolerável quando moderada e rítmica, pois, durante a anestesia profunda, ocorre queda do metabolismo basal (NATALINI; BIZANI, 1990). Esse estado pode acontecer como resposta à ação de fármacos parassimpatomiméticos, como a xilazina, mas também como resposta de casos de hipotermia e, nestes casos, agentes anticolinérgicos não ativam o sistema cardiovascular, sendo necessário que a temperatura corporal do paciente seja corrigida antes de ativar a função cardíaca, o que é descrito por McKelvey e Hollingshead no livro Small animal anesthesia and analgesia, de 2000. Para o tratamento, quando a bradicardia é causada por planos anestésicos profundos com fármacos intravenosos, o indicado é atenuar a profundidade anestésica e utilizar a ventilação logo em seguida;
EXEMPLIFICANDO Para o tratamento, é necessário analisar a causa (duradoura ou passageira), pois em algumas espécies, como os equinos, em anestesias profundas pode ocorrer até 30 batimentos cardíacos por minuto. Em situações com cães e gatos, com a aplicação de fármacos parassimpatomiméticos, a ação antagônica dever ser obtida de forma antecipada. Nessa situação, a utilização de fármacos como a adrenalina (simpáticos) deve ser evitada em animais submetidos à anestesia volátil por halogenados, pois elas desencadeiam síncope branca, que é fatal e irreversível (MASSONE, 2019).
// Parada cardíaca: As possíveis causas de parada cardíaca são diversas, visto que um somatório e combinação de fatores leva a essa condição. Ainda assim, a hipóxia e hipercapnia, na maioria dos casos, são fatores que contribuem para a ocorrência de parada cardíaca. A parada cardíaca por fibrilação ventricular pode ser causada por diversos fatores, como se observa no Quadro 1.
A parada cardíaca, ou assistolia, ” o tipo de parada associada à superdosagem de fármacos anestésicos em animais saudáveis ou aouso de dosagens adequadas para um animal saudável em animais sob condição especial, como idosos, debilitados e neonatos. É de extrema importância salientar que paradas cardíacas com mais de 3 a 4 minutos de duração resultam em lesão cerebral irreversível, segundo apontado por Massone (2019). Para realizar o diagnóstico da parada cardíaca, é feita a monitoração da cianose, da queda da pressão arterial, de irregularidades do ritmo cardíaco e perda da consciência (NATALINI; BIZANI, 1990).
Além disso, sinais clínicos como ausência de pulso periférico, de sons cardíacos, coloração de mucosas acinzentadas, ausência de sangramento na ferida operatória, dilatação pupilar grande e respiração agônica ou apneia são sinais observados durante uma parada cardíaca. A forma de tratamento de uma parada cardíaca consiste no aumento imediato da ventilação seguida de massagem cardíaca. Quando a circulação efetiva é recuperada, o tratamento sequente depende se a parada do coração é em assistole ou em fibrilação.
// Hipotensão: A hipotensão é caracterizada por pressão de pulso anormal e também por coloração das mucosas pálidas e redução da quantidade de urina do paciente. A hipotensão não é uma manifestação ou característica primária, visto que acontece quando a atividade simpático-adrenal aumentada deixa de compensar as perdas do volume sanguíneo circulante efetivo e da força contrátil miocárdica reduzida. É um estado clínico causado pela administração excessiva de fenotiazinas levando à vasodilatação periférica, planos anestésicos profundos, em especial com barbitúricos, choque toxêmicos, hemorragias graves, entre outros (MASSONE, 2019). Em situações de hipotensão, é fundamental o uso de terapia de suporte para equilibrar o paciente. Na hipotensão causada por plano anestésico profundo, ele deve ser reduzido e a oxigenação deve ser aumentada;
// Cianose: a cianose é caracterizada pelo escurecimento das mucosas e do sangue no campo operatório. O tratamento da cianose consiste em tratar a causa determinante e administrar a oxigenação no paciente e, sempre que possível ou necessário, utilizar a respiração controlada, sendo necessário certificar se os pulmões do animal se expandem de maneira adequada;
// Choque: Os choques mais frequentes que ocorrem em pequenos animais são:
1. Hipovolêmico: Resultante de traumas.
2. Neurogenico: Causado por processos dolorosos.
3. Toxêmico: Observado em peritonites, partos distócicos com trabalho de parto que excedam 12 horas.
Já em grandes animais, em especial nos equinos, a principal causa é a síndrome eólica. Também nos equinos, o choque mais comum é o choque endotoxêmico, em que o mecanismo também resulta em choque misto (neurogênico e hipovolêmico), devido à presença de dor e hipovolemia.
RELACIONADA AO EQUIPAMENTO E FALHAS TÉCNICAS
As emergências anestésicas relacionadas ao equipamento podem ocorrer por diversos tipos de problemas e falhas como:
· Problemas na abertura ou não de válvulas (que podem resultar em falhas tanto na inspiração quanto expiração do paciente);
· Problemas com os gases e conexões do circuito anestésico;
· Na quantidade de gás fornecido pelo equipamento e que pode ser insuficiente para todo o procedimento;
· Problemas relacionados a vazamento ou desconexão que alteram a dosagem de gases e fármacos levadas até o paciente;
· Escape e excesso de líquido nos tubos que podem prejudicar o funcionamento normal da transmissão de gases.
· Quando a emergência anestésica ocorre por falhas técnicas, ela se relaciona à possível negligência do anestesista, à falta de experiência na técnica ou à falta de habilidade, falta de atenção e cuidados e, em diversas situações, esses problemas colocam a vida do animal em risco e por isso devem ser evitadas.
// Desconhecimento do histórico do paciente: O desconhecimento do histórico do paciente, bem como a ausência de um exame físico detalhado pré procedimento, pode levar a riscos que podem ser evitados por meio de avaliação cuidadosa do animal, anamnese, exames laboratoriais e, em casos específicos de necessidade, a utilização de outros exames diagnósticos, como ultrassons. O levantamento do histórico clínico do paciente e exames pertinentes são fundamentais para a determinação do planejamento e protocolo anestésico adotado para aquele paciente em questão, tendo em vista os riscos que ele apresenta para cada tipo de procedimento;
// Falta de conhecimento sobre o equipamento anestésico: A falta de experiência do profissional com a utilização do equipamento anestésico para uso de agentes inalatórios pode levar a sérios problemas ao paciente durante a anestesia ou após o período anestésico. Esse risco é ainda mais importante quando se faz uso de vaporizador descalibrado, o que leva à administração de dosagens anestésicas deficientes ou em excesso. Com isso, é fundamental que os equipamentos e circuito anestésico sejam revisados e tenham manutenção periódica antes da realização de qualquer procedimento. Ainda assim, a falha mais comum de equipamentos ocorre por falta de atenção do profissional que opera o aparelho. Segundo reportado por Natalini e Bizani (1990), os principais fatores apontados como problemas observados no equipamento são:
· Exaustão da cal sodada;
· Esvaziamento do cilindro de oxigênio, a não verificação da quantidade de oxigênio no cilindro antes do procedimento ou a insuficiência para a realização do procedimento;
· Falta de conhecimentos técnicos básicos sobre o equipamento que está operando;
· Ocorrência de problemas com a sonda endotraqueal, tendo em vista que ela pode impedir a passagem do anestésico caso, durante a anestesia, ela venha a ser obstruída por problemas de dobradura nos tubos, secreções, mucosas ou sangue coagulado em seu interior, como resultado da intubação introduzida no esôfago. Além disso, a sonda pode ser desconectada do aparelho de forma inesperada;
· A ausência de manutenção no vaporizador, que pode levar a problemas com a administração do fármaco anestésico de forma ineficiente ou em excesso, levando a planos anestésicos superficiais ou altamente profundos.
// Cansaço e fadiga do profissional: Em diversas situações, o cansaço mental e físico do profissional é o responsável pelo erro humano, sendo um fator muito comum em hospitais ou clínicas com alta demanda e rotatividade, em que o anestesista atende a diversos pacientes ao longo de uma jornada de trabalho, causando a exaustão do profissional, que fica mais passível a erros;
// Falta de atenção: Dentre as emergências anestésicas causadas por falha técnica ou erro humano, uma das mais sérias é a falta de atenção do anestesista, ou seja, a ausência de acompanhamento e monitoração constante do paciente, que pode levar a falta de percepção de sinais clínicos indicativos de riscos ao paciente, como uma queda abrupta de frequência respiratória ou cardíaca. Assim, a atenção total e foco do profissional é fundamental para a manutenção da integridade do paciente e redução dos riscos, tendo em vista que pequenos detalhes despercebidos pelo profissional podem acarretar em riscos ao animal e no insucesso de todo o procedimento.
COMPLICAÇÕES ANESTÉSICAS
As complicações anestésicas são todos os eventos indesejáveis ocorridos por nível anestésico não adequado ao paciente, efeitos colaterais de fármacos anestésicos, patologias pré-existentes do paciente e procedimentos inadequados.
// Cães e gatos: Para os caninos e felinos, as complicações anestésicas mais frequentes relatadas por Massone (2019) são:
· Em planos anestésicos profundos, associados à depressão respiratória, em especial quando utilizados anestésicos voláteis halogenados, dentre eles, os de indução rápida. O tratamento indicado é retirar temporariamente o anestésico e, em seguida, realizar à respiração assistida com oxigênio puro até a volta da respiração espontânea. Caso a depressão persista, aplicar 0,5 a 1,0 mg/kg de doxapram por via intravenosa e, após a ação do fármaco, readequar o plano anestésico do paciente;
· Quando se realiza a introdução de sonda endotraqueal no esôfago. A falhaé constatada pela ausência de movimentos do balão respiratório, com recuperação durante o ato cirúrgico. Em situações em que isso ocorre, a indução deve ser realizada novamente;
· Quando há dificuldades respiratórias por retirada precoce da sonda endotraqueal, em especial nos animais braquicefálicos. Se essa situação acontece e caso não seja possível entubar novamente o animal, basta manter tracionada a língua, permitindo a passagem livre do ar, mantendo o paciente em decúbito lateral;
· Quando ocorre vômitos pós-cirúrgicos, em geral quando as alças intestinais são manipuladas de maneira enérgica ou, como na cesariana, quando há manipulação excessiva do útero. Nessas situações, a manutenção da sonda endotraqueal até o aparecimento dos reflexos protetores é vantajosa;
· Em situação de intoxicação com fármacos barbitúricos. Desde que se tenha estabelecido o quadro de depressão respiratória com o uso de um barbitúrico de duração moderada, o fundamental é manter a ventilação alveolar em boas condições. O volume-minuto pode ser mantido com o emprego da respiração controlada;
· Em situações de intoxicação por anestésicos locais, é conveniente aplicar um agente depressor do sistema nervoso central de duração ultracurta, pois a intoxicação por anestésicos locais estimula o sistema nervoso central exacerbadamente, podendo levar o paciente a óbito pela sua ação aguda. Outra medida é a aplicação de um bloqueador neuromuscular despolarizante, submetendo o paciente a respiração controlada até a normalização dos parâmetros fisiológicos. Em ambos os casos, é impreterível o uso de oxigenação para uma boa ventilação;
· Em situações de intoxicação por sobredoses de Xilazina, pode ocorrer vômitos, bradicardia, arritmia e depressão respiratória. Quando esses sintomas ocorrem de forma isolada no início da anestesia, a orientação é aplicar fármacos simpatomiméticos, como a adrenalina, até a reversão do efeito colateral da xilazina.
// Suínos: Em suínos, a complicação anestésica mais comum é a hipertermia maligna, de maior incidência nos animais das raças Landrace e Pietrain, não sendo observadas nas demais raças até o presente momento (MASSONE, 2019). O Landrace, como o da Figura 5, é uma raça suína que vem sendo melhorada através da seleção, visando ideal conformação para a produção de carne magra e excelente qualidade de criação.
Essa espécie, ao ser submetida à anestesia por fármacos voláteis halogenados, manifesta enrijecimento muscular durante a indução e, em casos de não suspensão da administração do anestésico acompanhado de ventilação com oxigênio puro, o animal vai a óbito.
// Ruminantes: As complicações anestésicas mais comuns nos ruminantes, como ovinos, caprinos e bovinos, estão descritas no Quadro 2.
// Equinos: As complicações anestésicas mais comuns para os equinos estão descritas no Quadro 3.
SINTETIZANDO
Nesta unidade, foram discutidos pormenores relativos à monitoração anestésica, que envolve o detalhamento das características dos fatores levados em consideração durante a monitoração anestésica, como a profundidade anestésica, uma vez que a avaliação dos estágios e planos auxiliam o anestesista no julgamento do estado do paciente e de uma possível necessidade de intervenção quanto a não eficácia do anestésico, sem falar nos fatores e sinais fisiológicos essenciais durante a monitoração anestésica, como a temperatura do paciente, a frequência cardíaca e a frequência respiratória, parâmetros que indicam qualquer tipo de desordem metabólica e fisiológica do paciente, possibilitando ao anestesista a tomada de decisão e realização de medidas de contenção de qualquer problema, a fim de reduzir os riscos ao paciente.
Ao final da unidade, foram descritas as emergências e complicações anestésicas, detalhando as principais fontes das emergências e como identificá-las e preveni-las no tratamento. Também foram abordadas as emergências relacionadas a problemas com os equipamentos, ao sistema respiratório, ao sistema cardiovascular e a falhas técnicas ou erros humanos. Tendo em vista que o diagnóstico do problema e execução de medidas mitigadores com eficácia e velocidade é fundamental, entender as fontes das complicações anestésicas e como proceder durante alguma emergência é fundamental para segurança do paciente.
Com isso, as informações disponibilizadas têm o propósito de auxiliar na qualificação profissional da anestesiologia veterinária, que é uma área emergente e de muita importância para a medicina veterinária, além de ser uma área em que o risco ao paciente está sempre presente e, por isso, o profissional responsável deve estar atento e se qualificar para enfrentar os desafios inerentes da rotina anestesista.

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