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08 NIM (Azadirachta indica): aspectos fitoquímicos e anatômicos Taís Arthur Corrêa UEMG Elisângela Aparecida da Silva UEMG Ana Luíza Franco UEMG Laiane Pereira Rocha UEMG Maria Clara dos Santos Tavares UFLA '10.37885/220308292 https://dx.doi.org/10.37885/220308292 Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 100 Palavras- chave: Neem, Metaból i tos Secundár ios, Anatomia Fol iar, Cerrado, Prospecção Química. RESUMO O nim é uma planta medicinal com múltiplas ações farmacológicas e considerada uma fonte de compostos bioativos para utilização na medicina, na cosmética e na agropecuá- ria. Possui condições específicas de cultivo, podendo sofrer alterações na anatomia e composição química de seus metabólitos secundários devido a efeitos do ecossistema. Neste sentido, objetivou-se caracterizar a anatomia foliar correspondente aos tecidos e suas respectivas espessuras e sistema vascular, bem como verificar a presença de grupos de metabólitos secundários das folhas e casca do tronco de uma árvore introduzida em área de Cerrado no Triângulo Mineiro. O material vegetal foi colhido em abril de 2021, no município de Frutal-MG. Após higienização e secagem, as folhas e cascas do tronco foram moídas e submetidas a extração por maceração com metanol. A triagem fitoquímica foi realizada pela metodologia de Prospecção Preliminar, considerando as classes de me- tabólitos secundários: saponinas, alcaloides, taninos, antraquinonas e flavonoides. Para caracterização da anatomia foliar foram coletados folíolos completamente expandidos e sadios, sendo preparadas lâminas com secções paradérmicas e transversais. O ex- trato das cascas do caule apresentou resultado positivo para saponinas, antraquinonas e taninos, enquanto o extrato das folhas apresentou resultado positivo apenas para flavonoides, demonstrando assim a presença de grupos de metabólitos relevantes para o desenvolvimento de terapêuticas modernas. Em relação aos caracteres anatômicos dos folíolos, os estômatos estão presentes na face abaxial, sendo possível observar a presença de drusas. A alta densidade estomática, associada à maior espessura do parênquima paliçádico são caracteres xeromorfos que podem indicar a possibilidade de adaptação da espécie em ambientes xéricos. Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 100 101 INTRODUÇÃO O uso de plantas medicinais é conhecido desde a antiguidade e está relacionado ao conhecimento popular (BADKE et al., 2011). A fitoterapia segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), é uma prática da medicina tradicional, que consiste no tratamento medicinal de origem vegetal de baixo custo e fácil acesso (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE, 2022). Porém, o uso deve ser precedido de criteriosa classificação botânica e identificação dos compostos bioativos presentes nessas plantas afim de evitar problemas na utilização (SILVEIRA; BANDEIRA; ARRAIS, 2008). Além disso, essa investigação apresenta-se como um campo promissor para descoberta de novas moléculas bioativas, seletivas, com baixa toxicidade para organismos não-alvo, tornando-se uma importante alternativa para o desen- volvimento de fitoterápicos humanamente e ambientalmente seguros. Nesse contexto a Azadirachta indica A. Juss conhecida popularmente como nim india- no ou neem, tem sido investigada devido às suas diversas aplicações como, por exemplo, planta medicinal, repelente, praguicida, dentre outras (BIWAS et al., 2002; BOECH et al., 2004; MOSSINI & KEMMELMEIER, 2005; MICHELLINE, et al., 2010; SUBAPRIYA & NAGINI, 2005; DELEITO & BORJA, 2008; GUPTA et al., 2017) e, assim, considerada uma valiosa fonte de compostos bioativos para utilização na medicina, na indústria e na agropecuária (OGBUEWU et al., 2011). Estudos recentes revelam que o nim indiano também apresenta potencial atividade antiviral (DWIVEDI et al., 2020), além de ser estudado como alternativa de tratamento de sintomas clínicos associados à Covid-19, podendo agregar valor ao desenvolvimento de novas terapêuticas contra a SARS-CoV-2 (ROY & BHATTACHARYYA, 2020; DA SILVA NETO et al., 2021). De forma geral, seus efeitos benéficos podem ser atribuídos a metabólitos secun- dários, presentes em partes da planta (semente, folhas, casca, flores e frutos) como, por exemplo, flavonoides, saponinas, taninos, alcaloides e antraquinonas, o que colabora com a necessidade de serem constantemente investigados, a fim de conhecer suas propriedades medicinais e/ou toxicológicas (DASH; DIXIT; SAHOO, 2017). O cultivo da planta se adaptou ao clima e solo do Cerrado brasileiro e pode ser útil na utilização por produtores rurais da agricultura familiar que procuram alternativas para com- bater pragas em rebanhos e plantações de forma natural e de baixo custo. Quando se trata da agricultura familiar o objetivo não é obter uma produção em larga escala e, dessa forma, o plantio de poucas plantas poderia auxiliar os produtores na preparação de fitoterápicos que atendessem às suas demandas. Por isso, é necessária a investigação das plantas in- troduzidas devido à variação da composição química desses metabólitos devido aos efeitos Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 102 do ecossistema, que envolvem inúmeros aspectos importantes, como a modificações das condições de cultivo, tratamento e diferenças genéticas. Estudos de caracteres morfoanatômicos são importantes para fornecer critérios da correta diferenciação taxonômica, visto que diversas espécies vegetais apresentam varie- dades botânicas que podem ser distintas em relação à composição fitoquímica. Além disso, as folhas podem apresentar diferenças quando cultivadas em ambientes diferentes daquele do seu centro de origem, visando adaptações para driblar variações ambientais, tais como hábitats mais secos. De acordo com Kundu e Tigerstedt (1999) diferenças de crescimento e interações genótipo × ambiente sugerem que as progênies do nim podem variar em suas respostas em diferentes ambientes. Diante do exposto, o presente trabalho tem como objetivo contribuir um pouco mais para o conhecimento anatômico e fitoquímico da espécie Azadirachta indica através da caracterização anatômica foliar e investigação da presença de grupos de metabólitos secun- dários das folhas, considerando a espécie introduzida no município de Frutal-MG, inserido no Cerrado, empregando a prospecção fitoquímica de seus extratos, visto que, há poucos estudos que evidenciem a composição dessa espécie na região. MATERIAL E MÉTODOS Coleta e identificação do material vegetal A árvore de Azadirachta indica considerada nesta pesquisa (Figura 1A) está localizada em terreno particular, nas seguintes coordenadas geográficas: Latitude:-19°50’51’’.7092’’; Longitude:-48°54’42.6348’, situada no município de Frutal, Minas Gerais. A coleta de ma- terial vegetal foi realizada no mês de abril de 2021. A etapa de prospecção fitoquímica foi desenvolvida no período de maio a junho de 2021, nas dependências da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), Unidade Acadêmica de Frutal. O preparo das lâminas com as secções dos tecidos foliares para estudos anatômicos foram realizadas no Laboratório de Anatomia e Fisiologia do Cafeeiro, na Universidade Federal de Lavras (UFLA). A determinação de espécime foi feita no mês de março de 2022, por comparação em material tombado no Herbário/BHCB no Instituto de Ciências Biológicas, Departamento de Botânica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A identificação do material ve- getal (Figura 1B) como Azadirachta indica A. Juss, nome científico validado pelo International Plant Names Index (IPNI), foi confirmada pela Mᵃ. Nayara Couto Moreira.Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 102 103 Figura 1. Árvore de Nim (A) selecionada para o estudo e exsicata (B) utilizada para determinação da espécime. Fonte: as autoras (Frutal-MG, 2022). Extração e triagem fitoquímica preliminar As cascas do tronco e as folhas de Azadirachta indica foram coletadas no período da manhã, sendo em seguida higienizadas, pesadas, secas em estufa a 60°C por 48h, tritu- radas em moinhos de facas e armazenadas em dessecador. As porções de A. indica (10g folhas e 20g cascas do tronco) foram submetidas à extração a frio por maceração com 200 mL de metanol P.A por 48h. Após essa etapa, os extratos foram filtrados em papel de filtro, secos com sulfato de sódio, envoltos em papel alumínio e armazenados em geladeira até a realização da triagem fitoquímica preliminar. A caracterização dos grupos de metabólitos secundários: saponinas, alcaloides, taninos, antraquinonas e flavonoides foram realizados por meio de testes qualitativos, em triplicata, observando a formação de espuma, precipitação/turvação, mudança de cor e aparecimento de fluorescência, conforme métodos adaptados de Simões et al. (2017), Da Silva Neto et al. (2020) e Galeane (2013). Para avaliação da presença de saponinas, 1g das amostras moídas foram solubilizadas em 10 mL de água destilada, fervida por 5 minutos, filtradas em papel de filtro, transferidas para tubos de ensaio e agitadas vigorosamente por 10 segundos. A formação de espuma e sua permanência por 15 min foi considerada como resultado positivo. A presença de alcaloides foi investigada através do tratamento de 1g das amostras moídas com 10 ml de ácido clorídrico diluído, seguida de aquecimento até fervura. Após essa etapa, as soluções foram filtradas, transferidas para tubos de ensaio e adicionadas 6 gotas do Reagente de Mayer. A observação de turvação e/ou formação de precipitado foi considerada como indicativo da presença de alcaloides. Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 104 A existência de taninos gerais e taninos hidrolisáveis foram avaliadas por meio dos testes com Cloreto Férrico e Acetato de Chumbo respectivamente. Para o primeiro, 2 mL dos extratos foram solubilizados em 2 mL de água destilada e, em seguida, adicionadas 4 gotas de Cloreto Férrico (1%). Como resultado positivo, levou-se em consideração a formação de precipitado na tonalidade azul-preto para taninos hidrolisáveis e verde-marrom para taninos condensados. Para a avaliação da presença de taninos hidrolisáveis, a 3 mL dos extratos foram adicionados 5 ml da solução de Ácido Acético a 10% e 2 ml da solução de Acetato de Chumbo a 10%. A formação de precipitado esbranquiçado ou a turvação da solução foi apontada como indicativo da presença de taninos hidrolisáveis. A detecção de antraquinonas foi realizada por meio do teste de Bornträger direta, em que 2 mL dos extratos alcoólicos foram adicionados 5 ml de solução de Hidróxido de Amônio diluído. O desenvolvimento de coloração rósea ou avermelhada foi considerada como indi- cativo da presença dessa classe de compostos. Para avaliação da presença de flavonoides foram empregadas as Reações de Shinoda e Taubouk. Inicialmente, as amostras foram submetidas a reação de Shinoda (cianidina), adicionando aos tubos de ensaio fragmentos de Magnésio metálico a 2 ml do extrato meta- nólico. Dando sequência, na capela, foram acrescentadas 5 gotas de Ácido Clorídrico con- centrado, lentamente pela parede do tubo, avaliando o desprendimento de gás hidrogênio e desenvolvimento de coloração rósea a vermelha, em caso de resultado positivo. A Reação de Taubouk consistiu na transferência de 2 mL dos extratos para cápsulas de porcelana, seguido de aquecimento até completa evaporação do solvente, por meio de chapa aquecedora. Em seguida, foram adicionadas 2 mL de acetona e pequenas porções (ponta de espátula) de cristais de Ácido Bórico e Ácido Oxálico. Essas misturas foram novamente aquecidas em chapa aquecedora até secura que, após resfriamento, foram solubilizadas em 3 mL de Éter Etílico e transferidas para tubos de ensaio. A presença de flavonoides foi avaliada por meio do desenvolvimento de fluorescência de coloração amarelo esverdeada, quando colocado sob a luz ultravioleta. Anatomia foliar Para caracterização da anatomia foliar da planta, foram coletados folíolos completa- mente expandidos e sadios, do quarto par de peciólulos, no sentido do ápice para a base da folha. Para a amostragem, foram considerados 4 lados da planta e 3 porções da copa (terço inferior, mediano e superior). A fixação do material vegetal foi realizada em FAA50 (formaldeído, ácido aético e 50% álcool etílico; 1:1:18 v:v:v) por 72 horas, sendo posterior- mente transferidas para álcool 70% (JOHANSEN, 1940) visando à conservação do material, em temperatura ambiente até a data das análises. Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 104 105 Foram realizadas secções foliares paradérmicas e transversais. As secções paradér- micas foram obtidas à mão livre a partir da epiderme da face abaxial e adaxial, na região mediana foliar, utilizando-se lâmina de aço. Posteriormente, as secções foram clarificadas em solução de hipoclorito de sódio (NaClO) a 50%, lavadas em água destilada e coradas com sa- franina 1% (KRAUS; ARDUIN, 1997), utilizando gelatina glicerinada como meio de montagem. Para obtenção das secções transversais dos folíolos, foi retirado um fragmento central do mesmo, sendo este desidratado em série etílica e, após a desidratação, foi incluído em metacrilato, conforme a metodologia do fabricante (Leica Microsystems, Wetzlar, Alemanha). Posteriormente foi seccionado com cerca de 6 μm de espessura, obtendo-se secções trans- versais das folhas, com o auxílio de um micrótomo rotativo semiautomatizado modelo MRP 2015 da marca Lupetec Tecnologia Aplicada (Lupe Indústria Tecnológica de Equipamentos para Laboratório, Brasil). As secções foram coradas com azul de toluidina a 1% (O’BRIEN; FEDER; MCCULLY, 1964) e as lâminas foram montadas, utilizando verniz vitral (Acrilex Tintas Especiais S. A.) como meio de montagem. Posteriormente, as lâminas foram observadas em microscópio óptico Kasvi modelo RED- 200 e as imagens capturadas por câmera digital acoplada Motic 5.0MP, sendo avaliados três campos por lâmina. As imagens obtidas foram analisadas no programa UTHSCSA-Imagetool. Foram mensurados os seguintes caracteres anatômicos: densidade estomática (número de estômatos por mm–2), dimensões de estômatos (diâmetro equatorial e polar, em µm), es- pessura do parênquima paliçádico e lucunoso (µm), espessura da epiderme nas faces abaxial e adaxial (µm), área do floema (µm2), área do xilema (µm2) e número de vasos do xilema. RESULTADOS E DISCUSSÃO Prospecção fitoquímica preliminar Os ensaios fitoquímicos evidenciaram a diferenciação da constituição química dos materiais analisados de forma qualitativa, rápida e com baixo custo. A Tabela 1 dispõe os ensaios realizados para cada grupos de compostos, os resultados esperados em caso de testes positivos e os dados obtidos referente a prospecção química preliminar relacionada aos grupos de metabólitos secundários: saponinas, antraquinonas, alcaloides, e flavonoides e taninos (gerais e hidrolisáveis). Cada parte da planta avaliada possui características químicas próprias, as quais são responsáveis pelas diferentes aplicações e suas peculiaridades. Foram encontrados re- sultados positivos para saponinas, antraquinonas e taninos hidrolisáveis para as casas do tronco, e apenas flavonoides para as folhas. A ausência de alcaloides foi demonstrada para ambas as amostras. Fitoquímica: potencialidadesbiológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 106 Tabela 1. Ensaios realizados, resultados positivos esperados e encontrados para as classes de metabólitos secundários avaliadas. Metabólitos Ensaios Resultado positivo esperado Resultados encontrados Cascas do tronco Folhas Saponinas Fervura e agitação vigorosa Índice de espuma persistente + - Antraquinonas Reagente de Bornträger direta Desenvolvimento de coloração rósea-avermelhada + - Alcaloides Reação de Mayer Turvação ou formação de precipi-tado branco - - Flavonoides Reação de Taubouk Desenvolvimento de fluorescência de coloração amarelo esverdeada na luz UV - + Reação de Shinoda Desenvolvimento de coloração rósea-avermelhada e desprendi- mento de gás hidrogênio - + Taninos gerais Reação com Cloreto Férrico Desenvolvimento de coloração: 1) verde-marrom -taninos con- densados; 2) azul-preto - taninos hidrolisá- veis + - Taninos hidrolisáveis Reação com Acetato de Chumbo Turvação e/ou formação de preci- pitado esbranquicado + - Fonte: dados da pesquisa (2022). O resultado fitoquímico encontrado para as cascas do tronco de nim, vai de encontro com o relatado por Farias (2008) apud Subramanian e Lakshmana (1996), que demonstra- ram a presença de fenóis e saponinas no extrato da casca de A. indica. As saponinas possuem ação detergente e emulsificante, devido a capacidade em formar espumas estáveis quando agitadas com água (Figura 2), propriedade atribuída a seu caráter anfifílico, relacionado a sua estrutura molecular, contendo uma parte lipofílica (triterpeno ou esteróide) e outra hidrofílica (açúcares), sendo alvo de interesse da indústria de cosméticos como matéria prima, adjuvante ou princípio ativo de formulações (DA SILVA NETO et al., 2020). De acordo com a literatura, drogas contento saponinas são tradicionalmente utilizadas como expectorantes e diuréticas (SCHENKEL; GOSMANN; ATHAYDE, 2010), entretanto também possuem atividade moluscicida, hemolítica, anti-inflamatória, antiparasitária, anti- tumoral e antiviral (SPARK; LIGHT; STADEN, 2004). Nas plantas, são consideradas como fitoprotetoras, sendo encontradas nos tecidos mais vulneráveis ao ataque por micro-orga- nismos (fungos e bactérias) ou predatório dos insetos (WINA; MUETZEL; BECKER, 2005). Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 106 107 Figura 2. Avaliação da presença de saponinas para o extrato metanólico das cascas do tronco: (A) extrato alcoólico (padrão) e (B) após fervura e agitação. Fonte: as autoras (Frutal-MG, 2022). A presença de antraquinonas foi confirmada a partir do desenvolvimento de coloração avermelhada, característica da Reação de Bornträger direta. Baseada na estrutura molecular, as antraquinonas são classificadas como dicetonas, caracterizadas por esqueletos carbô- nicos contendo dois anéis aromáticos, formando sistemas quinonoídicos. São conhecidas por suas propriedades como corantes e farmacológicas, dentre elas: laxantes, diuréticas, imunoestimulante, antifúngicas, antivirais e agentes antitumorais (MACEDO; ALAN E SILVA; SILVA, 2016). Ressalta-se que a atividade laxativa é a principal responsável pela utilização terapêutica da maioria dos vegetais contendo antraquinonas, entretanto sua utilização deve ser limitada pelos efeitos indesejados provocados como diarreia e cólicas intensas. A partir da reação com sais de ferro foi possível inferir a presença de taninos nas cascas do tronco, observando a formação de precipitado azul-preto. A confirmação da exis- tência de tanino hidrolisável na amostra avaliada foi evidenciada pela turvação da solução e, em seguida, formação de precipitado branco após a adição de solução de Acetato de Chumbo. Os taninos são compostos fenólicos de grande interesse econômico e ecológico. Segundo a estrutura química são classificados em dois grupos: hidrolisáveis (poliois da glucose, com as hidroxilas esterificadas pelo ácido gálico ou pelo ácido hexadiidroxifênico) e condensados (oligômeros e polímeros formados pela ligação de dois ou mais monômeros de flavan-3-ol ou flavan-3-4diol) (COSTA; BEVILAQUA; MORAIS; VIEIRA, 2008). Como metabólitos secundários são sintetizados em plantas para fins de autodefesa, conferindo ao paladar dos animais o sabor amargo ou adstringente, característica inerente ao caráter Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 108 ácido da hidroxila fenólica presente em sua estrutura química e a capacidade de formar complexos com proteínas (NOGUEIRA; SEREJO; DIAS; COUTINHO, 2021). Algumas propriedades biológicas atribuídas aos taninos são: antioxidante, enzimática, antimicrobiana e cicatrizante (SIMÕES et al., 2017). De acordo com Aracri (2019) a quanti- dade e do tipo de tanino podem variar nas diferentes partes do mesmo vegetal, como: nas raízes, no lenho, na casca, nas folhas, nos frutos, nas sementes e na seiva. Através dos testes com Cloreto Férrico e Acetato de Chumbo foi possível identificar a presença de taninos apenas para as cascas do tronco. Os flavonoides representam um dos grupos de metabólitos secundários mais diversifica- dos entre os produtos de origem natural e podem ser subdivididos em seis classes: flavonas, flavanonas, isoflavonas, flavonóis, flavanóis e antocianinas (SANTOS; RODRIGUES, 2018). São responsáveis por diversas funções nas plantas como proteção contra raios ultravioleta, insetos, fungos, vírus e bactérias, além de importantes propriedades farmacológicas, dentre elas: antitumoral, anti-inflamatória, antiviral e antioxidante (BEIL; BIRKHOLZ; SEWING, 1995; KUMAR; PANDEY, 2013; SIMÕES et al., 2001). Tais atividades farmacológicas também são atribuídas as folhas do nim, sendo muitas das vezes associadas a presença de flavonoides. Avaliando o extrato das folhas, obser- vou-se o desenvolvimento de fluorescência de coloração amarelo esverdeada quando co- locado sob luz UV, evidenciando sua presença na amostra em questão. Os resultados são corroborados por Galeane (2013), que complementa que os flavonoides são largamente distribuídos nos vegetais superiores (angiospermas), podendo apresentar diversas funções na planta como: proteção contra insetos, fungos, vírus e bactérias; agentes alelopáticos e inibidores de enzimas. Da Silva Neto e colaboradores (2020) encontraram resultado positivo para alcaloides, antraquinonas e taninos para os extratos alcoólicos de folhas de nim, entretanto o material vegetal foi colhido em outubro e em região inserida no bioma caatinga, corroborando com pesquisas que afirmam que a síntese de metabólitos secundários é influenciada por diversos fatores como, por exemplo: temperatura, disponibilidade hídrica, altitude, poluição atmosféri- ca, ataque de patógenos e sazonalidade (GOBBO NETO; LOPES, 2007), sendo este último um dos fatores mais expressivos com relação às variações na quantidade e natureza dos constituintes ativos das plantas. Caracteres anatômicos foliares Variações na anatomia foliar podem ser resultado de adaptações das plantas aos diferentes tipos de ambiente, visto que ocorrem condições diversas de temperatura, Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 108 109 disponibilidade hídrica e intensidade de radiação, sendo as principais modificações relacio- nadas às condições hídricas. Estômatos são estruturas presentes nos órgãos aéreos na maioria das plantas, sendo capazes de permitir uma comunicação do meio externo com o meio interno da planta (TAIZ, 2017). Através dos estômatos, pelas fendas estomáticas, ocorrem as trocas gasosas nas plantas, sendo o principal ponto de controle da entrada de CO2 e, simultaneamente,o prin- cipal ponto de controle de perda de água pelas plantas via transpiração. Nas secções paradérmicas obtidas dos folíolos do nim, foram observados estômatos na parte abaxial, caracterizando o folíolo como hipoestomático, sendo a distribuição alea- tória entre as nervuras secundárias, na densidade de 388,73 mm–2 (Figura 3A), enquanto que na face adaxial das folhas não foram observados nenhum estômato (Figura 3B). Tais características quanto à distribuição de estômatos nas faces adaxial e abaxial, sendo pre- sentes apenas nesta última, também foram constatadas por outros autores, inclusive em trabalhos realizados em outros países (JAFARI et al., 2013; EL-HAWARY et al., 2013; ABDEL-HAMEED, 2014). Kundu e Tigerstedt (1999) avaliaram plantas de nim em relação à caracteres ecofi- siológicos e observaram variações em relação à densidade estomática entre as plantas de países diferentes. As plantas oriundas de uma das províncias de Bangladesh apresentaram densidade estomática em torno 203,80 mm–2, enquanto que os menores valores foram ob- servados em plantas de uma das províncias de Myanmar, em torno de 142,50 mm–2. Os estômatos são do tipo anomocítico, que são aqueles envolvidos por um número variável de células que não diferem em formato e tamanho das demais células epidérmicas (Figura 3A) (APPEZZATO-DA-GLÓRIA; CARMELLO-GUERREIRO, 2006), conforme tam- bém encontrado por Jafari e colaboradores (2013) e Amede e colaboradores (2015). Neste trabalho foram observadas de 5 a 6 células epidérmicas circundando os estômatos, sendo que estes apresentaram 23 µm de diâmetro polar e 16,55 µm de diâmetro equatorial. As células epidérmicas apresentaram formas poligonais, sendo a maioria com 5 lados, algumas com 6 e raramente algumas com 4, com paredes anticlinais retas (Figura 3A e 3B). Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 110 Figura 3. Secções paradérmicas da face abaxial (A) e adaxial (B) de folíolos de Azadirachta indica, evidenciando a presença e distribuição dos estômatos (A) e ausência de estômatos (B). Fonte: as autoras (Frutal-MG, 2022). Mensah (2012) visando estudar variações anatômicas de folhas de diferentes espécies cultivadas em bioma de Savana, em Accra (Gana) para detectar caracteres que indicassem a tolerância à seca, observou que em Azadirachta indica foi a espécie que apresentou a maior frequência estomática, dentre as espécies avaliadas, sendo os estômatos presentes na face inferior (abaxial) dos folíolos. O autor concluiu, que somado a outras características anatômicas, tais como dupla camada de parênquima paliçádico e cutícula espessa, a alta frequência estomática pode ser característica da espécie para adaptação em locais mais secos, indicando possível tolerância. Nas secções paradérmicas da face abaxial do folíolo foram observadas drusas, possi- velmente de cristais de oxalato de cálcio, apesar de não terem sido executados testes es- pecíficos para confirmação. Porém conforme apontado por Amede e colaboradores (2015), a espécie apresenta cristais de oxalato de cálcio na epiderme adaxial entre as nervuras de menor porte, no parênquima cortical e medular da nervura principal. Em trabalho realizado por Jafari e colaboradores (2013) também foram observados idioblastos contendo cristais de oxalato de cálcio dispersos entre o parênquima paliçádico. Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 110 111 Figura 3. Secção paradérmica da face abaxial de folíolos de Azadirachta indica, evidenciando a presença de drusas. Fonte: as autoras (Frutal-MG, 2022). Considerando a constituição do mesofilo, os folíolos são do tipo dorsiventral, visto que o parênquima paliçádico está localizado na face adaxial e o parênquima esponjoso está vol- tado para a face abaxial, sendo este um caractere xeromorfo, juntamente com a presença de estômatos na face abaxial. Foi observado que o parênquima paliçádico está constituído por apenas uma camada de células e o parênquima lacunoso apresenta espaços intercelulares, e células com formatos diferenciados (Figura 4A). Figura 4. Secções transversais do limbo de folíolos de Azadirachta indica, evidenciando os parênquimas paliçádico (pp) e lacunoso (pl) (imagem A); xilema (X) e floema (F) na nervura central (imagem B). Fonte: as autoras (Frutal-MG, 2022). Folíolos do tipo dorsiventral podem apresentar o parênquima paliçádico em maior quan- tidade que o parênquima esponjoso, sendo este um ponto favorável para fotossíntese, visto que a grande maioria dos cloroplastos são encontradas nas células do parênquima paliçádico. Amede et al. (2015) ao caracterizarem anatomicamente folíolos de Azadirachta indica verificaram que o parênquima paliçádico se apresentou compacto, com uma a duas camadas Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 112 de células, considerando plantas cultivadas da Nigéria. Em trabalho realizado por El-Hawary e colaboradores (2013) em plantas de nim cultivadas no Egito, os autores verificam que o mesofilo foliar possuía um arranjo isobilateral, com duas camadas de parênquima paliçádico na parte superior (adaxial). Em relação à espessura dos tecidos do limbo foliar, o parênquima paliçádico apre- sentou em média 69,81 µm, enquanto que o parênquima lacunoso 65,14 µm. Além da es- pessura dos tecidos parenquimáticos, foi mensurada a espessura das epidermes da face adaxial e abaxial, tendo sido obtidas as médias de 11,43 µm e 10,85 µm, respectivamente; ambas unisseriadas. Quanto à nervura central do folíolo, foram mensuradas as seguintes dimensões: 21335,08 µm2 de área do floema; 25805,30 µm2 de área do xilema e, para os tecidos vas- culares foram observados, em média, 44,72 vasos do xilema, incluindo protoxilema e me- taxilema (Figura 4B). Assim como observado por El-Hawary e colaboradores (2013), a nervura central do fo- líolo apresenta um formato biconvexo, sendo o contorno mais proeminente observado na face inferior (abaxial). Em relação à disposição dos feixes vasculares, o floema se apresenta de um lado e, no outro, apenas xilema, caracterizando feixes vasculares colaterais (Figura 4B). CONCLUSÃO De acordo com os resultados obtidos, o extrato das cascas do caule apresentou re- sultado positivo para saponinas, antraquinonas e taninos, enquanto o extrato das folhas apresentou resultado positivo apenas para flavonoides, demonstrando assim a presença de compostos com importância para o desenvolvimento de terapêuticas modernas nas téc- nicas farmacológicas, fomentando conhecimento acerca dessa espécie vegetal de grande importância biotecnológica. Com base na anatomia foliar é possível inferir que a espécie Azadirachta indica apresentou características anatômicas dos folíolos que contribuem para o sucesso do seu cultivo em condições de Cerrado, visto que apresenta caracteres xero- morfos, que podem favorecer a adaptação da planta em locais que apresenta condições de período mais seco em determinada época do ano. Agradecimentos Aos Programa Institucionais da Universidade do Estado de Minas Gerais de Apoio à Pesquisa (PAPq/UEMG) e Produtividade (PQ/UEMG); Ao Laboratório de Anatomia e Fisiologia do Cafeeiro da Universidade Federal de Lavras, Inovacafé/UFLA; Fitoquímica: potencialidades biológicas dos biomas brasileiros - ISBN 978-65-5360-098-0 - Editora Científica Digital - www.editoracientifica.org - Vol. 1 - Ano 2022 112 113 Ao Prof. Dr. João Renato Stehmann, curador do herbário BHCB da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). REFERÊNCIAS 1. ABDEL-HAMEED, U. K. Delimitation of Azadirachta indica A. 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