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VOCÊ SABE O QUE É DATAFICAÇÃO

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VOCÊ SABE O QUE É DATAFICAÇÃO? ALGUMAS EMPRESAS GANHAM RIOS DE DINHEIRO COM ISSO
 
A transformação de enormes quantidades de dados não processados ​​em informações úteis é a base dos negócios de companhias como Amazon, Google, Facebook e Netflix
 
Amazon, Google, Facebook, Netflix, Uber, Nike. O que essas empresas têm em comum? Além de suas marcas estarem entre as mais conhecidas e valiosas do mundo, elas são essencialmente empresas de dados. São exemplos de negócios que prosperaram apoiados na utilização massiva de dados gerados pelas pessoas — um fenômeno chamado pelos especialistas de “dataficação”.
Esse termo apareceu pela primeira vez em um ensaio publicado em 2013 pela revista americana Foreign Affairs. No texto, intitulado The Rise of Big Data, o jornalista Kenneth Neil Cukier, editor de dados da revista inglesa The Economist, e Viktor Mayer-Schoenberger, professor na Universidade de Oxford, utilizaram essa expressão para descrever a prática de transformar diversos aspectos das nossas vidas em dados que geram informações para a criação de valor.
Não faltam exemplos no nosso cotidiano. “Hoje, grande parte dos equipamentos que usamos, como um telefone celular com o GPS ligado, está coletando nossos dados a todo momento”, diz Luciano Silva, professor de Ciência da Computação no Insper.  “De repente, estamos passando perto de uma loja e começamos a receber no celular alguns anúncios bem dirigidos, com base nos lugares que costumamos percorrer, nos sites que visitamos ou nos hábitos ou preferências pessoais.”
Segundo o professor Fabio de Miranda, coordenador do curso de Ciência da Computação do Insper, os dados de movimentação de pessoas fornecidos pelos telefones celulares podem ajudar a aprimorar os aplicativos que informam sobre as condições do trânsito em tempo real, como o Waze, e o planejamento urbano para tornar as cidades mais inteligentes. Por meio da análise de dados de geolocalização, é possível, por exemplo, implantar melhorias na infraestrutura de mobilidade, como explicou o professor Irad Ben-Gal,chefe do Departamento de Inteligência Artificial da Universidade de Tel Aviv, nesta palestra realizada no Insper em 2019. “O uso de dados nesse tipo de aplicação exige muito cuidado para não invadir a privacidade das pessoas. Essa é uma preocupação global e, no Brasil, motivou a aprovação da LGPD, a Lei Geral de Proteção de Dados”, diz Miranda.
 
Big Techs, Big Data
Possivelmente, as empresas que reúnem o maior volume de dados pessoais dos consumidores no mundo são as chamadas Big Techs, as gigantes de tecnologia que coletam diariamente informações de bilhões de pessoas por meio de seus aplicativos e ferramentas. A Alphabet, dona do Google, o principal sistema de buscas na internet, controla também a plataforma de compartilhamento de vídeos Youtube e aplicativos como Gmail, Google Maps, Google Meet e Google Play. Em 2020, o Google registrou em média 6,9 bilhões de buscas por dia. No total, as empresas do conglomerado faturaram 182 bilhões de dólares no ano passado.
O Facebook possui a principal plataforma de mídia social, com quase 1,9 bilhão de usuários ativos por dia. Em 2020, teve uma receita de quase 86 bilhões de dólares. A companhia detém também a rede de compartilhamento de fotos e vídeos Instagram e o aplicativo de mensagens WhatsApp. Diariamente, os 2 bilhões de usuários do WhatsApp trocam 100 bilhões de mensagens.
A Amazon, maior empresa de comércio eletrônico fora da China, faturou 386 bilhões de dólares em 2020. Ela utiliza um método conhecido como “recomendação adaptável”, que identifica interesses pessoais com base naquilo que um cliente compra ou coloca na lista de desejos no site. O sistema utiliza esses dados para sugerir itens que um consumidor cadastrado pode querer comprar. No primeiro semestre deste ano, quase 2,6 bilhões de pessoas visitaram o site da empresa a cada mês.
 
Diversão sob medida
O uso inteligente de dados tem sido a alavanca de várias outras empresas que revolucionaram alguns negócios. Para André Filipe de Moraes Batista, professor de pós-graduação em Data Science e Decisão no Insper, um dos casos mais emblemáticos é o da Netflix, empresa americana de serviço de streaming que oferece uma ampla variedade de séries, filmes e documentários em aparelhos conectados à internet.
“No início de sua história, a Netflix foi desacreditada por grandes empresas, como a Blockbuster”, diz Batista. A americana Blockbuster era a maior rede de locadoras de vídeos do mundo. Em 2000, a Blockbuster chegou a avaliar uma possível compra da Netflix, fundada três anos antes como um serviço de entrega de DVD pelo correio. O negócio não avançou porque as duas empresas não chegaram a um acordo sobre o valor da operação. Cada uma seguiu seu caminho e, em 2010, a Netflix começou a oferecer o serviço de transmissão de filmes pela internet. A Blockbuster, que manteve sua aposta no mesmo modelo de negócios, acabou falindo e fechou as últimas lojas da antiga rede em 2014. Já a Netflix tem hoje mais de 200 milhões de assinantes no mundo. Faturou cerca de 25 bilhões de dólares no ano passado.
“A Netflix é um exemplo vivo de uma empresa que conseguiu prever uma demanda e que sabe utilizar os dados dos assinantes para indicar o próximo filme ou a próxima série que pode agradar a esses consumidores”, diz Batista. A Netflix não somente utiliza dados de preferências individuais para fazer suas recomendações, como também para definir a produção de seu conteúdo original. Já há quem preveja que, no futuro, a empresa será capaz de combinar digitalmente seu acervo para criar séries customizadas para cada assinante.
“A personalização que vemos hoje na Netflix e em outros serviços é uma consequência do uso massivo de dados e tende a crescer ainda mais”, diz Batista. Em algum momento no futuro, ele espera ver a chegada do que chama de medicina de precisão: a produção de medicamento específico para cada paciente. Tudo alimentado por uma base de dados com seu DNA e outras características biológicas individuais.
 
Adeus ao velho táxi
Outra empresa que surgiu para causar disrupção no mercado foi a Uber, que começou em 2009 nos Estados Unidos oferecendo um serviço semelhante a táxi de luxo. No ano seguinte, lançou um aplicativo que permitia aos clientes solicitar um transporte privado pelo celular, substituindo o método tradicional que obrigava as pessoas a caçar táxis nas ruas. E isso só foi possível porque o aplicativo da Uber tinha dados de GPS em tempo real indicando a localização precisa dos passageiros e dos carros de seus motoristas.
Atualmente, há muita discussão em vários países envolvendo questões trabalhistas entre a Uber e seus motoristas. Alguns governos exigem que a Uber dê aos motoristas os mesmos direitos de empregados comuns. Qualquer que seja o desfecho desse debate, uma coisa é certa: nada será como antes. “A Uber revolucionou o mercado de transporte pois entendeu que as pessoas queriam um serviço mais personalizado, podendo pedir um carro quando e onde quisessem”, diz Batista. A Uber é uma empresa avaliada hoje em cerca de 90 bilhões de dólares. Em 2020, sua receita foi pouco mais de 11 bilhões de dólares.
 
Muito mais do que um tênis
Alguns negócios parecem não ter muito a ver com dados, mas estão cada vez mais ancorados em informações geradas por seus consumidores. É o caso da americana Nike, fabricante de calçados, roupas e acessórios esportivos, com um faturamento de 37 bilhões de dólares no ano passado. Com seus aplicativos, como o Nike Training Club e o Nike Run Club, voltados para pessoas preocupadas em manter a boa forma, a empresa coleta grande volume de dados de potenciais clientes. Quando um usuário do aplicativo Nike entra na principal loja da marca em Nova York, a empresa sabe quem é ele, quais esportes pratica, qual tamanho usa e quais cores prefere. E usa esses dados para oferecer um atendimento personalizado.
Os dados coletados pela Nike permitem à empresa prever decisões de compra. Se um consumidor, por exemplo, tem o hábito de trocar de tênis de corrida uma vez por anoe já se passaram mais de 12 meses, a empresa pode fazer uma oferta personalizada e lembrar o cliente que está na hora de comprar um tênis novo.
A Nike, além disso, desenvolveu uma tecnologia de escaneamento que usa uma combinação de visão computacional, ciência de dados, aprendizado de máquina e algoritmos de recomendação para achar o “ajuste perfeito” nos pés dos clientes para cada estilo de tênis fabricado pela empresa. Chamado de Nike Fit, o aplicativo solicita que o consumidor use a câmera de um smartphone para fazer uma varredura de seus pés. Com base na imagem, o programa fornece um intervalo de tamanho ideal para essa pessoa. Os dados ficam armazenados no perfil do cliente e são usados sempre que ele for comprar calçados numa loja física ou pelo site.
 
“Dados não são petróleo”
Pela importância que os dados adquiriram em nossas vidas, há quem os compare com petróleo, a fonte de energia que mudou a economia mundial após a Revolução Industrial. Ao que consta, quem primeiro usou essa metáfora foi o matemático britânico Clive Humby, um empreendedor na área de ciência de dados. Em 2006, ele escreveu: “Os dados são o novo petróleo, que é valioso, mas, enquanto não for refinado, não pode ser realmente usado. Ele precisa ser transformado em gás, plástico, produtos químicos etc., para criar uma entidade valiosa que impulsione atividades lucrativas. Portanto, os dados devem ser dissecados e analisados para que tenham valor”.
No livro The Bottomless Cloud (“A nuvem sem fundo”, em tradução literal), publicado em 2019, os autores Tom Koulopoulos, presidente da empresa de pesquisa e consultoria Delphi Group, e David Friend, um empreendedor serial, afirmam que comparar dados com petróleo não faz muito sentido. Para eles, a diferença fundamental é que dados não são commodities. “Embora cada motor use o mesmo tipo básico de combustível, cada empresa é alimentada por seu próprio conjunto exclusivo de dados”, dizem. “Os dados são cada vez mais o diferencial mais importante na forma como as empresas inovam, atendem os clientes e têm insights sobre seus mercados. É o campo de batalha da competição no futuro”.
Para Koulopoulos e Friend, a dataficação é uma etapa natural posterior à digitalização dos dados. Eles preveem que o custo de armazenamento de dados tende a cair quase a zero no futuro, inaugurando uma era de abundância ilimitada de dados.  Segundo os autores, em 2035, haverá mais de 1 yottabyte (grandeza que se escreve com 1 seguido de 24 zeros) de dados no mundo, mais do que o número de estrelas visíveis no universo. Nesse mesmo ano, somente os veículos produzirão mais de 10 zetabytes (zetabyte = 1 e 21 zeros) de dados, 15 vezes o volume de dados que existem hoje. “Da mesma forma que a energia elétrica ilimitada inaugurou cem anos de novas indústrias e inovação, a nuvem sem fundo e os custos quase zero de armazenamento irão estimular novos modelos de negócios e uma nova era de inovação que apenas estamos começando a imaginar”, afirmam.
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