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eISSN2179-426X 10.26843/rencima.v12n1a19 Recebido em 12/11/2020 | Aceito em 19/12/2020 | Publicado em 11/03/2021 O ensino de Paleontologia: interpretações de uma abordagem contextualizada à realidade local Rômulo Hohemberger1 Jéssica de Góes Billar2 Cibele Schwanke3 Renato Xavier Coutinho4 Resumo: O estado do Rio Grande do Sul é reconhecido por pesquisadores que se dedicam à paleontologia pelo significativo registro de fósseis. Nesse cenário, destaca-se a cidade de Mata, conhecida como a cidade de pedra que foi madeira, devido à vasta ocorrência de fósseis vegetais do Período Triássico. O presente artigo propõe-se a investigar de que maneira ocorre a abordagem da Paleontologia nas unidades escolares em Mata, a partir de uma pesquisa-ação, que analisou as concepções prévias dos educandos e buscou retomar possíveis conceitos paleontológicos abordados pelos professores, enfocando a riqueza paleontológica do município, a partir de uma proposta de ensino contextualizada à realidade local. Valendo-se de uma abordagem qualitativa/indutiva, foram aplicados questionários pré e pós intervenção a estudantes de 5 escolas públicas (municipais e estaduais), em turmas de 6° ano do ensino fundamental ao 3° ano do ensino médio, totalizando 101 alunos. A intervenção pedagógica seguiu a metodologia do Arco de Maguerez. Os resultados indicam que as ideias prévias dos alunos mostravam um conhecimento superficial sobre a temática paleontológica e que a intervenção pedagógica possibilitou um aprofundamento dos conhecimentos de forma contextualizada, baseado na realidade local dos educandos e proporcionando, assim, uma aproximação do conhecimento científico com o cotidiano. Palavras-chave: Ensino de Paleontologia. Educandos. Realidade Local. Contexto. The teaching of Paleontology: interpretations of a contextualized approach to local reality Abstract: The state of Rio Grande do Sul is recognized by paleontologists by the wide fossil record. In this context, Mata is known as the city of “stone that was wood”, due to the vast occurrence of vegetable fossils from the Triassic Period. This article investigates how Paleontology is approached in the public schools of Mata. Based on an action-research which analyzed the students' prior knowledge and sought reformulations on paleontological concepts used by teachers. The study is focused on the fossil record of the city from a 1 Doutorando em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Rio Grande do Sul, Brasil. romuloiff@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-1376-5219. 2 Mestranda em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Rio Grande do Sul, Brasil. jessicaiffsvs@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-7164-8571. 3 Doutora em Geociências. Professora do Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (IFRS), campus Porto Alegre. Professora do Programa de pós-graduação Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde da Universidade Federal de Santa Maria (UFMS). Rio Grande do Sul, Brasil. cibele.schwanke@poa.ifrs.edu.br https://orcid.org/0000-0003-4518-3229. 4 Doutor em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde. Professor do Mestrado Profissional em Educação Profissional e Tecnológica do Instituto Federal Farroupilha, campus São Vicente do Sul. Professora do Programa de pós- graduação Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde da Universidade Federal de Santa Maria (UFMS). Rio Grande do Sul, Brasil. renato.coutinho@iffarroupilha.edu.br https://orcid.org/0000-0001-6602-2120. https://doi.org/10.26843/rencima.v12n1a19 https://creativecommons.org/licenses/by-nc-sa/4.0/deed.pt_BR mailto:romuloiff@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-1376-5219 mailto:jessicaiffsvs@gmail.com https://orcid.org/0000-0002-7164-8571 mailto:cibele.schwanke@poa.ifrs.edu.br https://orcid.org/0000-0003-4518-3229 mailto:renato.coutinho@iffarroupilha.edu.br https://orcid.org/0000-0001-6602-2120 2 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 teaching proposal contextualized with the local reality. Using a qualitative/inductive approach, pre- and post-intervention questionnaires were applied to 101 students from 5 public schools. The pedagogical intervention followed the methodology of Arco de Maguerez. The results indicate that the preliminary concepts of the students showed a superficial knowledge about the paleontological themes, and that the pedagogical intervention made it possible to deepen the knowledge in a contextualized way, providing an approximation of scientific knowledge with daily life. Keywords: Teaching of Palentology. Educandos. Local Reality. Context. La enseñanza de la Paleontología: interpretaciones de un enfoque contextualizado de la realidad local Resumen: El estado de Rio Grande do Sul es reconocido, por investigadores dedicados a la paleontología, por el importante registro de fósiles. En este escenario, destaca la ciudad de Mata, conocida como la ciudad de la piedra que era madera, debido a la gran ocurrencia de fósiles vegetales del Triásico. Este artículo tiene como objetivo indagar cómo se da el abordaje de la Paleontología en las unidades escolares de Mata, a partir de una investigación acción, que analizó las concepciones previas de los estudiantes y buscó resumir posibles conceptos paleontológicos abordados por los docentes, con foco en la riqueza. Paleontología del municipio, a partir de una propuesta didáctica contextualizada a la realidad local. Con un enfoque cualitativo / inductivo, se aplicaron cuestionarios pre y post intervención a estudiantes de 5 escuelas públicas (municipales y estatales), en las clases desde 6 ° de primaria hasta 3 ° de secundaria, totalizando 101 estudiantes. La intervención pedagógica siguió la metodología Arco de Maguerez. Los resultados indican que las ideas previas de los estudiantes mostraron un conocimiento superficial sobre el tema paleontológico y que la intervención pedagógica permitió profundizar en el conocimiento de manera contextualizada, a partir de la realidad local de los estudiantes y así brindar una aproximación del conocimiento científico con la vida cotidiana. Palabras clave: Docente de Paleontología. Aprendices. Realidad Local. Contexto. Introdução O ensino de ciências pressupõe interpretar e compreender o meio ao qual o indivíduo está inserido, de maneira que sua realidade seja entendida como uma fração da ciência, dando um significado aos fenômenos científicos e cotidianos. Como destacado por Adams et al. (2016), a contextualização do conhecimento permite articular o ensino à vida do aluno, formando um cidadão a partir da consideração das suas dimensões sociais e individuais, oportunizadas pelas vivências na escola e fora do ambiente escolar. Segundo a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017), a contextualização deve ocorrer através de sua associação com os currículos das disciplinas, a fim de aproximar os conteúdos dos componentes curriculares às situações de vida dos estudantes. Ao professor impõe-se o desafio de identificar estratégias para apresentar, representar e/ou exemplificar os conteúdos conectando-os às realidades dos espaços e dos tempos nos quais as aprendizagens estão situadas, aproximando-os dos alunos e 3 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 atribuindo-lhes significados. Observando a realidade das cidades sul-rio-grandenses de Mata e São Pedro do Sul, Manzig e Weinszchütz (2012) destacaram que nesses municípios ocorrem abundantes e importantes registros fósseis de madeiras petrificadas. Nessas localidades, os fósseis integram a paisagem local, onde a quantidade de troncos fossilizados é tanta que dificulta, inclusive, o estabelecimento de fundações das casas e plantações. Mata representa apenasum exemplo da riqueza paleontológica nacional e, por isso, diversos estudos vêm sendo realizados para incentivar a compreensão e efetivar a abordagem dessa área científica na educação básica (DUARTE et al. 2016; SCHWANKE, 2002; NOVAIS et al. 2015; SOUZA et al. 2016; MENDES, NUNES e PIRES, 2015; IZAGUIRRY et al. 2013), de modo a proporcionar momentos para que os alunos compreendam a evolução da vida e entendam a sua existência no planeta, desmistificando alguns conceitos religiosos e falsos dogmas propagados no dia a dia (DUARTE et al. 2016, p. 125). No entanto, a paleontologia ainda está distante das salas de aulas. Como destacado por Novais et al. (2015), o ensino de Ciências na educação básica apresenta uma visão limitada a respeito da paleontologia. Possuindo um forte componente articulador e integrador das ciências biológicas e geológicas, os estudos dos fósseis não apenas contribuem para a compreensão da origem e da evolução da vida na Terra, mas também possibilitam referências à composição da atmosfera, à geografia, à geologia e às modificações climáticas ao longo do tempo geológico, destacando seu caráter interdisciplinar e multidisciplinar (MATOS, CASTRO e COUTINHO, 2012). Dessa maneira, considera-se que a abordagem destes conceitos de forma contextualizada deva ocorrer sempre que possível, de forma a proporcionar aos sujeitos o reconhecimento da procedência dos conceitos científicos, além de conseguir interpretá-los e valorizá-los enquanto patrimônios científicos e culturais. Nesse aspecto, considerando-se a riqueza fossilífera da cidade de Mata, é possível reconhecer a possibilidade de aproximação da Paleontologia aos alunos da educação básica da região de forma contextualizada. O presente artigo tem o objetivo de identificar como os alunos transitam no universo paleontológico e, a partir de suas concepções iniciais, desenvolver uma prática educativa que oportunize momentos para ressignificação do conhecimento sobre os fósseis e sua relevância para o município. 4 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 Metodologia Como estratégia metodológica e para analisar os dados, optou-se por utilizar uma abordagem qualitativa/indutiva. A pesquisa qualitativa, segundo Lüdke e André (1986), é aquela que se desenvolve em uma situação natural, possui dados descritivos, tem um plano aberto e flexível e busca descrever a realidade de maneira complexa e contextualizada. Já o objetivo dos argumentos indutivos é levar a conclusões cujo conteúdo é muito mais amplo do que o das premissas nas quais se basearam (MARCONI; LAKATOS, 2009, p. 86). Para tanto, o percurso investigativo contou com diferentes instrumentos de pesquisa, aplicados em três momentos distintos: inicialmente, na pré-intervenção, sob a forma de um questionário, teve-se o intuito de analisar as concepções prévias dos estudantes (Apêndice 1); após ocorreu uma intervenção pedagógica com os alunos; e para finalizar, a aplicação de um questionário pós-intervenção (Apêndice 2). Os questionários foram compostos por questões discursivas, objetivas e foram aplicados a 101 alunos, de 5 escolas municipais e estaduais do município de Mata. Dessas escolas, 3 estavam presentes na cidade e 2 no interior do município. Sendo assim, selecionou-se uma turma de cada escola, do sexto ano do ensino fundamental (EF) ao terceiro ano do ensino Médio (EM), exceto em uma das escolas, que, por ser a única escola de ensino médio da cidade, teve a abordagem desenvolvida em 3 turmas, correspondendo ao primeiro, segundo e terceiros anos. A intervenção ocorreu nos meses de junho e julho de 2018, totalizando 6 horas/aula, em horários que correspondiam às atividades dos professores de Ciências/Biologia na semana, para possibilitar a abordagem com todas as turmas citadas anteriormente. A pesquisa foi baseada na metodologia do Arco de Maguerez, descrita por Berbel (2012) a qual se constitui de 5 etapas: Observação da realidade e elaboração do problema; Pontos- chave; Teorização; Hipóteses de solução; Aplicação à realidade. Além disso, embora a estrutura permaneça constante, com as etapas do Arco, a sua aplicação é flexível, por adaptar-se às circunstâncias que cada grupo possui para estudar/investigar (BERBEL, 2011). As atividades estão apresentadas a seguir, e as relações com as etapas do arco de Marguerez podem ser visualizadas na Figura 1. 1º — Observação da Realidade: Aplicação do questionário (pré-intervenção), visando investigar as concepções dos educandos sobre o tema. Após, os educandos foram questionados e instigados a pensarem sobre o contexto geral da paleontologia, para isso foi colocado o termo PALEONTOLOGIA no quadro e solicitado aos alunos que citassem 5 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 possíveis palavras que remetessem ao seu significado. Figura 1: Representação da abordagem segundo o Arco de Maguerez Fonte: Organizado pelos Autores 2º — Pontos-chave: Na sequência, as turmas foram divididas em grupos (o número de grupos dependeu do número de alunos) e cada um formulou questões referentes ao tema. Depois de formuladas as questões, essas foram socializadas com a turma para que se construísse um questionário único. Este instrumento foi utilizado como estrutura para uma entrevista, a qual foi realizada com familiares, amigos e/ou vizinhos, a fim de investigar o conhecimento que possuíam sobre os processos de fossilização que ocorreram em Mata. Na aula seguinte, os alunos trouxeram as respostas para discussão em sala, e assim desenvolveu-se a próxima etapa, buscando aprofundar os conhecimentos sobre a realidade local, partindo dos seguintes questões: O que temos em Mata? Qual o processo de fossilização típico do material que ali se encontra? Qual o período geológico representado na cidade? Qual a história para os fósseis estarem ali? O que os museus mostram sobre isso? Qual a importância dos fósseis de Mata? Qual a importância de preservação desses fósseis? 3º — Teorização: Foram debatidas as questões elencadas anteriormente, conectando o tema paleontologia ao conteúdo que o professor de ciências estava trabalhando, bem como a retomada da discussão das palavras mencionadas pelos alunos, fazendo a relação dessas com o assunto principal. Logo após, ocorreu a entrega de um material informativo (Apêndice 3). Nesse momento, foram discutidas as dúvidas e curiosidades da turma sobre o tema. 6 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 4º — Hipóteses de solução: Fora proposto aos alunos que representassem o evento de fossilização que ocorreu com os fósseis presentes no município, através da construção de materiais como uma maquete, cartaz etc. 5º — Aplicação à realidade: Ocorreu a apresentação dos trabalhos dentro da própria turma. Após essa atividade, um questionário (pós-intervenção) foi aplicado com todas as turmas, elaborado a partir do primeiro questionário, que teve como finalidade avaliar a intervenção pedagógica e de que forma os estudantes passaram a compreender a importância dos fósseis para a cidade de Mata (Apêndice 2). Para analisar as respostas das questões discursivas, utilizou-se o método de análise de conteúdo proposto por Bardin (2016), composto por três etapas: a pré-análise; a exploração do material; e o tratamento dos resultados, envolvendo a inferência e a interpretação. Já as questões objetivas foram analisadas de maneira descritiva. Durante a etapa de pré-análise, os instrumentos da pesquisa foram lidos duas vezes e, logo, iniciou- se o processo de codificação. Durante a exploração do material, as respostas (unidades de registro), foram agrupadas em categorias definidas a priori. Após a organização dos dados e categorias, ocorreu o processo de inferência e interpretação das respostas dos educandos. Resultados e discussões As atividades contemplaram um total de101 alunos na etapa inicial e 89 alunos na etapa final, já que, segundo consta nos termos de compromisso, esses não seriam obrigados a participar das atividades e que poderiam deixar de participar da atividade em qualquer momento. Além disso, a descrição dos dados foi dividida em dois momentos: percepções inicias dos educandos sobre paleontologia e percepções dos educandos acerca da intervenção pedagógica. As percepções inicias dos educandos sobre paleontologia Analisando as respostas do questionário pré-intervenção a partir das categorias definidas (Quadro 1), a questão 1: “Descreva com suas palavras o que você entende por Paleontologia”, identifica-se, para a categoria — O que é Paleontologia, a identificação de uma ciência que estudo os fósseis e formas de vida em períodos geológicos anteriores. 7 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 Quadro 1: Apresentação das categorias e unidades Categorias Definição Unidades de contexto Unidades de registro/frequência de respostas Questão Pré-intervenção O que é Paleontologia Entendimento do conceito de Paleontologia Ciência que estuda os fósseis Estudo dos fósseis (65). Descreva com suas palavras o que você entende por Paleontologia Ciência que estuda formas de vida antigas Ciência que estuda as formas de vida em períodos geológicos anteriores (30) O que é fóssil Compreensão sobre o que representa um fóssil Representação de riqueza cultural e/ou científica Preservação do patrimônio local (31) Você acha importante saber como ocorre a formação de um fóssil? Se sim, por quê? Representação de formas de vidas do passado Obter conhecimento sobre o passado (34) Resultado de processos diferenciados que preservam restos ou vestígios de vida pretérita Saber como ocorre a formação de um fóssil. (13) Por que aprender Paleontologia Importância da Paleontologia Saber científico Aprender mais sobre esta ciência (83) O que você gostaria de conhecer sobre paleontologia? Justifique. Saber popular/local Sobre os fósseis de mata (7) Proteção do patrimônio fossilífero Compreensão que fósseis representam patrimônios da humanidade Importância da preservação Importância da preservação patrimonial (90) Você acha importante preservar os fósseis? Por quê? Pós-intervenção Aproximação da temática à realidade do aluno Atribuição de significado da temática à realidade local e científica Relação com realidade Explicar o que ocorreu no município (74) Diante do que foi abordado, você considera importante saber como ocorre a formação de um fóssil? Se sim, por quê? Saber científico Importância da compreensão sobre os fósseis (12) Contextualiza- Ção Significado da Paleontologia à realidade local Valor cultural Riqueza histórica local (63) O que os fósseis de Mata significam para você? Valor científico e econômico Preservação, valor e turismo (26) Saberes construídos Análise da abordagem da intervenção Fóssil Processo de fossilização (60) Descreva o que você aprendeu com as atividades realizadas sobre a paleontologia. Importância fóssil (25) Fonte: Organizado pelos Autores Verifica-se, portanto, que a maioria dos estudantes (65) demonstra conhecimentos prévios relacionando à paleontologia, à ciência que estuda os fósseis. Tal fato pode ser exemplificado nas respostas a seguir: 8 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 Educando 1 (9° ano/EF): “É a ciência que estuda os fósseis”. Educando 2 (2° ano/EM): “É o estudo dos fósseis que foram fossilizados ou petrificados”. Educando 3 (3° ano/EM): “Paleontologia é o estudo de fósseis, mas não só de fósseis, dentro disso também tem as plantas”. Pode-se notar que os educandos associam diretamente a Paleontologia aos fósseis, muito em razão da sua realidade e disponibilidade dos fósseis, bem como sua importância para o estudo paleontológico. Os dados encontrados ainda corroboram estudos anteriores, como Matos, Castro e Coutinho (2012) que evidenciaram que 30% dos educandos investigados atribuem a Paleontologia ao estudo de fósseis. Autores como Mendes, Nunes e Pires (2015), também, encontraram dados similares em suas análises, em que 40% dos estudantes relacionaram a Paleontologia ao estudo dos fósseis. As respostas na unidade de registro: “Ciência que estuda as formas de vida em períodos geológicos anteriores”, obteve 30 respostas. Pode-se inferir que os educandos conseguiram explorar outros conceitos importantes à paleontologia, pois, além de remeterem às formas de vidas existentes no passado, apresentam noções de períodos geológicos, demonstrando uma compreensão mais ampla do tempo geológico e da manifestação e diversidade de vida na Terra. Tais observações ficam evidentemente expostas nos relatos a seguir: Educando 4 (2° ano/EM): “é o que estuda as formas de vida em períodos geológicos”. Educando 5 (8° ano/EF): “é o estudo especial da vida dos animais no passado”. Considerando os dados referentes à questão: “Cite alguns exemplos de fósseis”, o Quadro 2 demonstra que alguns educandos citaram mais de um exemplo. Nota-se uma clara dissociação da relação entre os termos vegetal, madeira e pedra, mesmo que todas façam referência à realidade local do município de Mata e suas madeiras silicificadas, como representado no relato anteriormente apresentado do “educando 3”. Quadro 2: Quantitativos citados pelos educandos, onde N representa o número de referências ao termo Exemplos N Exemplos N Vegetal 30 Ossos 29 Animal 30 Madeira 26 Peixes 9 Pedra 24 Ossos de dinossauros 34 Carapaça 2 Fonte: Organizado pelos Autores 9 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 A categoria que procurou analisar as concepções relacionadas ao significado dos fósseis pelos estudantes foi obtida a partir da questão: “Você considera importante saber como ocorre a formação de um fóssil? Se sim, por quê?” demonstrou unidades de registro relacionadas à preservação do patrimônio local, obter conhecimentos sobre o passado e compreender o processo de fossilização. Com relação à “Preservação do patrimônio local”, obtiveram-se 31 respostas, os alunos reconhecem a importância da preservação do patrimônio fóssil, relacionando-a ao contexto do local e mundial. Tal percepção pode ser identificada nos relatos do educandos 6: Educando 6 (3° ano/EM) “Sim, porque sou da cidade de Mata [sic] e ela é conhecida por ser a cidade da madeira petrificada, então seria meio irônico achar que isso não é importante”. Nesse sentido, Santos e Carvalho (2011), em seus estudos, ainda encontraram dados que corroboram a esta ideia, 79% dos entrevistados creem que é relevante para a preservação do Parque Paleontológico de São José de Itaboraí, visto que possuem consciência da importância da participação da população para a preservação do patrimônio geológico. Sommer e Scherer (2002) ainda ressaltam que as comunidades com rara e sábia sensibilidade em relação à importância da preservação dessas florestas petrificadas, as protegem, ao nível institucional, por meio da criação de centros comunitários, pequenos museus e a regulamentação de leis municipais. Logo, atividades de reflexão sobre a realidade local e compreensão sobre o potencial existente nessas comunidades, colabora para o entendimento da paleontologia e uma valorização do patrimônio geológico. Alguns alunos (34) destacaram a importância dos fósseis para “obter conhecimento sobre o passado” o que mostrou a intenção de compreender mais profundamente a vida que existiu na cidade de Mata e em locais que possuem fósseis, bem como suas relações com o presente e como um meio de transformação e/ou modificação de sua realidade, como pode ser verificado a partir da resposta: Educando 7 (7° ano/EF): “Eu acho importante,porque devemos conhecer a história da nossa cidade”. A partir do relato acima, podemos ainda afirmar que a realidade local deve ser preservada e que esta preservação deve ocorrer pela conscientização. Para Nunes e Piokar-Hara (2018), uma forma de se promover a divulgação científica é através de iniciativas com o público escolar, por meio de ferramentas lúdicas que despertem nos 10 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 estudantes o interesse pelo acervo fóssil. Morais, Ferreira e Simões Neto (2019) destacam que a aprendizagem, desenvolvida nesses espaços não-formais de ensino, apresenta um caráter mais abrangente que o conceitual, oportunizando o desenvolvimento de competências atitudinais e habilidades como criatividade e afetividade. Nesse contexto, a cidade de Mata possui dois espaços institucionalizados relacionados à Paleontologia: O Museu Padre Daniel Cargnin e o Jardim Paleobotânico, esse último considerado um museu a céu aberto. Acredita-se que tais espaços promovem uma integração escola-museu, sendo fundamentais para ampliar a divulgação do acervo paleontológico da região. O interesse em conhecer o processo de fossilização que ocorreu na região foi também um destacado pelos estudantes (13), como a seguir representado: Educando 8 (2° ano/EM): “Sim, porque geralmente não estudamos isso na escola”. Educando 9 (8° ano/EF): “Acho importante saber, pois seria legal saber como se formou os fósseis da região onde moramos”. A realidade, colocada pelo educando 9, vai ao encontro com o que relata Schwanke (2002) que, em acompanhamentos realizados com alunos de graduação e professores de Ciências e Biologia do Estado do Rio de Janeiro, evidenciou uma série de lacunas envolvendo o saber paleontológico, uma ciência que envolve conhecimentos oriundos da área geológica e biológica. Uma grande dificuldade encontrada reveste-se na compreensão do Tempo Geológico. Nesse sentido, a questão: “Qual a idade da Terra?”, considerando que a idade deveria contemplar os 4,6 bilhões de anos (Ga), os dados obtidos foram interpretados em dois grupos: próximo (de 3 Ga a 6 Ga) e distante (os demais dados), como por exemplo: “76 bilhões de anos” ou “500 anos”. O primeiro grupo obteve 43 e o segundo 49 das respostas apresentadas. Considerando que alguns alunos não responderam a questão, verifica-se a falta de compreensão acerca da vastidão do tempo geológico. Corroborando com esta ideia, Leal, Meirelles e Rôças (2019) ressaltam que o não uso da relação dos conteúdos com o dia a dia dos estudantes e a dependência dos livros didáticos pelos docentes afastam o conhecimento aprendido em sala de aula, do conhecimento de mundo. Matos, Castro e Coutinho (2012) encontram, em seu estudo, dados diferentes ao averiguar o tempo geológico, verificando que 82% dos alunos compreendiam que o planeta existe há pelo menos cinco bilhões de anos. Cervato e Fordeman (2013) ainda ressaltam que, apesar de ocupar um papel importante na cultura contemporânea, ocorre certa confusão na sua ordem de magnitude. Considerando que boa parte dos alunos não possui 11 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 uma noção precisa sobre a idade da Terra, o entendimento sobre fósseis, paleontologia e evolução pode apresentar equívocos conceituais. A questão: “Você considera que os dinossauros e os seres humanos viveram juntos?” procurou colaborar no entendimento das percepções dos alunos. Dos dados obtidos, 92 educandos relatam que esses não viveram no mesmo momento, no entanto 9 repostas consideram que humanos e dinossauros foram contemporâneos. Duarte et al. (2016) também encontraram dados semelhantes. No entanto, Matos, Castro e Coutinho (2012) encontraram dados divergentes, destacando que não houve correlação dos alunos sobre a coexistência de humanos e dinossauros em suas pesquisas. Considerando que, para os alunos da educação básica e até mesmos para aqueles que ingressam nos cursos de graduação na área das ciências biológicas, as únicas imagens ensinadas sobre Paleontologia são de restos de ossos de dinossauros que são apresentados pela mídia (LIMA et al. 2015). Quanto à questão: “Você já estudou sobre paleontologia em sala de aula? Se sim, em que série/ano e de que forma o professor abordou esse conteúdo?” procurou analisar a aproximação da temática em sala de aula. Apenas 86 dos alunos responderam a questão, em que 48 responderam que não estudaram paleontologia em sala de aula e 38 responderam que estudaram em sala de aula. Com relação aos anos de escolaridade, 5 relatarem que tiveram contato com a temática no 5° ano, 8 em seu 6° ano, 6 em seu 7° ano, 1 em seu 9° ano, 2 em seu 1° ano (EM) e 12 em seu 2° ano (EM). O número de alunos que afirmam não terem visto conteúdos sobre paleontologia em sala de aula remete a Mendes, Nunes e Pires (2015), Duarte et al. (2016), Antunes, Costa e Ruivo (2013), que obtiveram dados semelhantes, demonstrando o distanciamento dessa temática da sala de aula. No caso de Mata, em especial, a Paleontologia poderia ser abordada de forma contextualizada, podendo contribuir com a conservação do patrimônio local (ANTUNES; COSTA; RUIVO, 2013). Na categoria que procurou entender a opinião dos alunos sobre "Por que aprender Paleontologia", os alunos destacaram a possibilidade de aprender mais sobre esta ciência e sobre os fósseis de Mata. Na unidade de registro relacionada a “Aprender mais sobre esta ciência”, foram obtidas 83 respostas que destacaram o interesse pelo processo de formação dos fósseis, como pode-se observar nos relatos: Educandos 10 (1° ano/EM): “Os fósseis, pela história que contém neles”. 12 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 Educandos 11 (9° ano/EF): “Como os fósseis duram tanto tempo, porque já faz muito tempo que os dinossauros existiram”. Em especial pelos fósseis de Mata, menções dos educandos buscam compreender melhor os fósseis existentes em Mata, como ocorreu sua fossilização/preservação e sua importância para o município: Educando 12 (6° ano/EF): “Como a madeira virou pedra”. Educando 13 (9° ano/EF): “Tudo, é bom porque nós moramos numa cidade que tem isso, mas poucos sabem o que é isso mesmo morando aqui e nem ligam porque não sabem como é importante isso”. Como aponta o educando 13, percebe-se a importância de desenvolver iniciativas que efetivem a divulgação científica na comunidade de Mata, visto sua importância para valorizar o patrimônio fossilífero de toda a região. Além disso, houve algumas respostas de alunos que disseram que não se interessam em ter conhecimento sobre paleontologia. Com vistas a perceber de que forma os museus da cidade se aproximam dos alunos, foi realizada a pergunta: “Você já realizou alguma atividade educativa no Museu Paleontológico Daniel Cargnin ou no Museu Paleobotânico de Mata? Esta visita foi proposta pelo professor de ciências/biologia?”. Quanto à realização das visitas, 83 dos educandos disseram que sim, porém 18 relataram que não. Acerca da disciplina que proporcionou a visita, 31 respostas dos educandos citaram que foi a disciplina de Ciências/Biologia, porém outros 8 disseram que foi proposta pelo professor de matemática, além de 4 educandos que também citaram os professores de história, e ainda 2 citaram o professor de geografia. Além disso, 2 educandos relataram que foram visitar o museu com suas famílias, 30 foram em visitas propostas pela escola e 2 participaram de palestras. De maneira a conhecer de que forma os alunos reconhecem os fósseis como patrimônios da humanidade, a questão: “Você acha importante preservar os fósseis? Por quê?” mostrou que os alunos conseguem identificar os fósseis como registros da história do município e de seu patrimônio: Educando 14 (3° ano/EM) “Sim, porque são registros históricos, que mostram muito sobre o passado do planeta terra”. Educando 15 (8°ano) “Sim, porque é algo que simboliza a cidade de Mata”. Educando 16 (7° ano) “Sim, porque é um patrimônio nosso, antigamente, pegavam e levavam caminhões cheios de fósseis daqui”. Observando as respostas, muitos relatos remetem às especificidades da realidade 13 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 local, demonstrando a relevância dos fósseis na paisagem que permeia a cidade. Duarte et al. (2016) ressaltam que o ensino da Paleontologia contribui para que os alunos comecem a despertar a conscientização com relação à preservação dos sítios e bens paleontológicos do país. Além disso, Santos e Carvalho (2011), em seu estudo, também verificaram que 15% de seus entrevistados acreditam que os conceitos paleontológicos e de preservação do patrimônio devem ser estudados junto às crianças, através da educação básica, buscando criar uma identidade e preservação do patrimônio de São José de Itaboraí. Nesse sentido e com relação ao destaque do “educando 16”, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN (2018) zela pelo cumprimento dos marcos legais, efetivando a gestão do Patrimônio Cultural Brasileiro e dos bens reconhecidos pela Unesco, como Patrimônio da Humanidade. Pioneiro na preservação do patrimônio na América Latina, o Instituto possui um vasto conhecimento acumulado ao longo de décadas e tornou-se referência para instituições assemelhadas de países de passado colonial, mantendo ativa cooperação internacional. Percepções dos educandos acerca da intervenção pedagógica Ao início da intervenção pedagógica, mais especificamente na observação da realidade, ao questionar os educandos sobre possíveis palavras que poderiam estar ligadas ao termo “Paleontologia”, obtiveram-se diversos resultados, os quais se encontram expressos em uma nuvem de palavras (Figura 2) produzida online, no site “Wordart” (https://wordart.com/nwl5dq0aletg/nuvem-de-palavras). Tal forma de expressão foi utilizada por considerar-se que a nuvem de palavras também fornece uma representatividade do conteúdo temático e que a frequência em que os dados emergem também oferecem significância para análises qualitativas. A partir dos termos presentes na nuvem, percebe-se que os alunos demonstram claramente noções básicas sobre o tema. Logo, as palavras fósseis, osso e dinossauro foram as mais frequentes, representando termos relevantes para o estudo e a compreensão desta ciência. Além disso, as citações feitas à palavra pedra remetem à realidade na qual este grupo social encontra-se envolvido, mesmo que de forma distorcida e informal, como pode ser visto até em uma espécie de “slogan” da cidade: “Mata, a cidade da pedra que foi madeira”. Porém, é compreensível, na medida em que este termo seja utilizado no sentido de falar sobre as “madeiras ou árvores petrificadas” que existem no município. Entretanto, nota-se que outros educandos também denominam os fósseis através da palavra rocha, o 14 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 que remete a uma dualidade, sendo que a maioria adota um conceito equivocado ou desconhece o conceito científico. Novais et al. (2015) ressaltam que é comum os estudantes apresentarem dificuldades em conceituar de forma científica a Paleontologia, embora consigam apresentar concepções pouco satisfatórias e baseadas no senso comum. Figura 2: Palavras que para os alunos remetem à Paleontologia Fonte: Organizado pelos Autores Outro ponto que merece destaque é a ocorrência das palavras árvores e dinossauro, sendo dinossauros mais citados que árvores, mesmo com grande registro de troncos de árvores fossilizados que ocorrem no município. Logo, alguns fatores podem ter causado essa dissociação: a ação da mídia enquanto um difusor de conhecimentos e o museu da cidade que possui alguns exemplares de fósseis de animais. Corroborando com essa ideia, Tavares et al. (2007), em seus estudos, verificaram que os alunos envolvidos na pesquisa escolhem mais os fósseis de dinossauros, pois esses chamam muita atenção dos estudantes (83%). Em outro estudo investigando a realidade local, Santos e Carvalho (2013) entrevistaram 100 moradores, 22% acreditavam que um fóssil se tratava de ossos de dinossauros. Isso mostra a grande influência da palavra “dinossauro” no imaginário popular que, muitas vezes, é considerada como sinônimo de fósseis e, também, de Paleontologia. Apesar de não ter sido muito citada, o termo “tráfico” chama a atenção e ainda representa uma realidade, apesar de todas as leis federais e estaduais existentes. Sobre esta problemática, Sommer e Scherer (2002) ressaltam que a conscientização das comunidades é fundamental para a preservação dos fósseis. Com relação aos dados obtidos por meio do questionário pós-intervenção, as categorias elencadas procuraram analisar a aproximação da temática à realidade do aluno, 15 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 a contextualização e verificar se a abordagem possibilitou a construção de saberes. A aproximação da temática à realidade local foi destacada pelos alunos ao responderem a questão: “Diante do que foi abordado, você considera importante saber como ocorre a formação de um fóssil? Se sim, por quê?”. Conteúdos de 74 respostas identificaram pertinência, demonstrando que os educandos consideram importante conhecer os processos de fossilização que ocorreram no município, de maneira que lhes auxilie a compreender a sua realidade: Educando 16 (3° ano/EM) “Sim, porque nos ajuda a entender como ocorreu a formação dos fósseis de nossa cidade”. Educando 17 (2° ano/EM) “Sim, para explicar para um turista ou até mesmo um morador de mata”. Nesse contexto, Sessa e Trivelato (2017) ressaltam que a ciência deve facilitar a compreensão do mundo, contribuindo para a apropriação de uma alfabetização mais vasta, que considere outras extensões além de conhecer/saber teorias científicas, ou seja, os contextos sociais, históricos e culturais e que possibilite a criticidade. Algumas respostas mostram esta aproximação oportunizada pela apropriação de saberes de forma contextualizada: Educando 18 (3° ano/EM) “Sim, é importante porque, na maioria das vezes, achamos que é só ir lá e ver o fóssil, com sua placa de descoberta e deu. Só que aí que se enganamos, eu não imaginava que seria tão legal descobrir as tais etapas do processo de fossilização”. Educando 19 (8° ano/EF) “Sim, eu considero importante, pois estamos rodeados de fósseis em nossa cidade e é bom sabermos sobre isso”. Educando 20 (8° ano/EF) “Sim, acho importante, pois assim se toda população souber ela irá compreender o valor científico das peças”. No tocante à contextualização, a questão: “O que os fósseis de Mata significam para você?” demonstrou o reconhecimento do patrimônio fossilífero do município enquanto valor cultural, científico e econômico. Como "Riqueza histórica local”, a maioria dos alunos (63) remetem à grande quantidade de material disponível no local e sua importância para elucidar a história da vida que habitou o passado, ao qual o município se encontra, além de proporcionar o estudo da constituição desses materiais, como é possível notar nos relatos: Educando 21 (6° ano/EF) “que eles são muito importantes para mim, principalmente para mostrar como era o passado, e como eles viraram fósseis”. Educando 22 (8° ano/EF) “Eles significam simplesmente uma história que faz de mata uma cidade rica em conhecimentos”. 16 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 Educando 23 (8° ano/EF) “Para mim, significam uma marca para a cidade, pois a cidade é conhecida como a ‘cidade da pedra, que foi madeira”. Além disso, pode-se perceber que com a atividade os estudantes conseguiram atribuir mais significado aos fósseis da cidade e que, a partir da contextualização, podem- se abordar outros conceitos e fenômenos que são importantespara compreender mais profundamente esta ciência. É interessante destacar o entendimento dos alunos acerca da importância dos fósseis para setores da cidade: Educando 22 (3° ano/EM) “Um símbolo da cidade, fonte para estudar, turismo, contribui para a economia do município, bem como para aquisição de conhecimento”. Educando 23 (7° ano/EF) “Significam estudo, sabedoria, riqueza natural, os fósseis são muito importante para o turismo da cidade”. Educando 24 (3° ano/EM) “São uma riqueza natural do município que devem ser explorados para aumentar a renda com o turismo que os fósseis proporcionam”. Como se percebe, os educandos evidenciaram a importância do estudo dos fósseis, além da sua utilização para alavancar o turismo no município. Nesse sentido, o ensino de paleontologia neste local deve ser desenvolvido e incentivado nas escolas, de maneira a proporcionar maior entendimento sobre a realidade local e despertar a curiosidade destes educandos para que contribuam para o estudo e preservação do patrimônio. Apesar disso, alguns educandos ainda não demonstraram um entendimento sobre a complexidade da paleontologia e para os fósseis de Mata, tal qual se encontra exemplificado abaixo: Educando 25 (3° ano/EM) “Apenas fósseis, nada mais”. Nesse sentido, observa-se que para alguns, ainda, não foi percebida a relevância dos fósseis de sua cidade. Novais et al. (2015) mostram que, no município vizinho de Santa Maria, apesar da riqueza fossilífera, poucas são as atividades realizadas nesse aspecto com alunos do ensino fundamental, propiciando a carência de conhecimento nessa área. Tal fato pode estar também ocorrendo no município de Mata. Com o intuito de verificar os saberes construídos, a questão: “Caso algum visitante chegasse a Mata e perguntasse a você algo sobre os troncos fossilizados espalhados pela cidade. Você saberia responder? ( ) Sim ( ) Não. Caso sim, o que você diria a ele?” foi analisada conforme a complexidade das respostas. Assim, foram divididos dois grupos: um, com definições mais complexas, que agrega diferentes conceitos e relações; já outro, com respostas menos elaboradas que não possibilitam estabelecer conexões entre os conceitos 17 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 explicitados. Com relação à definição mais complexa, foram obtidas 20 respostas que demonstram uma argumentação mais detalhada do processo de fossilização que ocorreu no município, como se segue: Educando 26 (6° ano) “Eu diria que eles eram árvores [sic] e com o tempo caíram e foram sendo cobertas por várias [sic] camadas, e elas foram fossilizadas, e depois de muito tempo começaram a aparecer e foram encontradas”. Educando 27 (7° ano) “Que no período Triássico as árvores [sic] foram derrubadas e soterradas por várias camadas, e foi fossilizadas [sic] com o passar dos anos, assim ela ficou petrificada”. Educando 28 (7° ano) “Sim, que eles foram causados por causa de um derrubamento de árvores [sic] e foram soterradas e um material chamado sílica entrou dentro das árvores assim as transformando em fósseis”. Já na categoria definição de pouca complexidade, obtiveram-se 42 respostas e abrange citações menos detalhadas, como se pode ver abaixo: Educando 29 (2° ano/EM) “Eu diria a ele que aqueles troncos foram fossilizados a [sic] milhares de anos e para isso acontecer houve [sic] uma série de fatores”. Educando 30 (1° ano/EM) “Explicaria o processo de fossilização que ocorreu”. Além disso, 36 educandos disseram que não saberiam explicar. Diante desta situação, afirma-se que, mesmo com a intervenção, essa ainda não foi suficiente para todos os educandos se apropriarem do conhecimento, visto sua complexidade. Procurando estabelecer relações com temas abordados em sala de aula pelos professores, a questão: “Cite exemplos de assuntos que você estuda em sala de aula e que consegue relacionar com a paleontologia” mostrou uma diversidade de respostas, compiladas no Quadro 3. Quadro 3: Exemplos citados, onde N representa o número de referências ao termo Exemplo N Exemplo N Células 22 Evolução 11 Animais 31 Formação Geológica 6 Plantas 27 Continentes 1 Fósseis 3 Bactérias 10 Nenhum 3 Fungos 12 Algas 4 Minerais 5 Fonte: Organizado pelos Autores Observando o Quadro 3, pode-se afirmar que os educandos conseguiram relacionar a Paleontologia a diversos termos. Algumas dessas citações podem-se atribuir ao local em 18 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 que se encontram como, por exemplo: as “plantas” e “minerais”, devido à grande quantidade de “madeiras fossilizadas” que há no município e a constante relação com o processo de silicificação. Acredita-se que as referências às células ocorreram devido ao fato de que, durante o desenvolvimento desta abordagem, utilizou-se um vídeo que demonstra o funcionamento e a estrutura das células vegetais e sua relação com a fossilização, bem como a relação do município como lenhos vegetais que estão presente nele. Quanto à menção aos “animais”, pode-se relacionar com a quantidade significativa destes fósseis presentes no museu da cidade, além da divulgação midiática sobre o tema. Esses assuntos, citados acima, podem ser usados em sala de aula para contextualizar o ensino de Paleontologia, tal como foram na abordagem até aqui descrita. Para que isso ocorra, deve-se buscar inicialmente compreender a origem dos diferentes assuntos, ou seja, o professor deve fazer-se as seguintes perguntas: qual a relação da Paleontologia com o assunto que desejo abordar? Temos estudos sobre isso? Qual sua relação com a evolução do planeta? Esse pode ser o primeiro passo para instigar o aluno e introduzir o tema, e dessa maneira, proporcionar a compreensão das diversas relações existentes entre seus cotidiano, o meio em que vivem e a constante transformação da vida. A partir da questão: “Descreva o que você aprendeu com as atividades realizadas sobre a paleontologia”, destaca-se referência aos processos de fossilização (60), tema enfatizado para explicar a ocorrência de fósseis no município e presente na atividade final elaborada pelos alunos em seus cartazes e maquetes: Educando 32 (1° ano/EM) “Processo de fossilização, após a morte vem o soterramento com isso vem a mineralização. Esse processo demora milhões de anos, depois vem o surgimento”. Educando 33 (6° ano) “Que fósseis viverão[sic] a milhões de anos e que demorou muito até chegarem ao estado de fossilização, como as árvores petrificadas também passaram por um processo”. Corroborando com essa ideia, Tavares et al. (2007) também encontrou dados parecidos após sua intervenção, mais da metade dos alunos compreenderam como ocorre o processo de fossilização, o que corresponde a um aumento de 20% no nível de conhecimento sobre o assunto abordado. Logo, verifica-se que a realidade local pode ser um suporte para o ensino e a aprendizagem em sala de aula. Na categoria N “Importância fóssil”, obtiveram-se 25 resultados e remetem à importância dos fósseis de maneira geral para o estudo desta ciência. 19 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 Educando 34 (8° ano) “O quanto é importante as madeiras petrificadas de Mata”. Nesse mesmo contexto, Santos e Carvalho (2011) encontraram dados parecidos, na medida em que a pesquisa e difusão do conhecimento científico foram compartilhadas por 16% dos conhecedores de São José de Itaboraí, que acreditam que a maior importância do parque está voltada para os estudos científicos e sua difusão em diferentes escalas. Logo, a preservação é importante, tanto para o estudo, como para a compreensão dos eventos ocorridos nesses locais. Considerando as etapas finais do Arco de Maguerez, caracterizadas pelas etapas de “hipóteses de solução” e “Aplicação à realidade”, foram construídos os materiais por parte dos educandos, reunidos na Figura 3. Estes materiais deveriamretomar o evento de fossilização que ocorreu no município, da maneira que achassem melhor. Os resultados obtidos foram cartazes e maquetes. Na imagem abaixo, verifica-se que existem diversos tipos de manifestação por parte dos educandos, as quais demonstram o que compreenderam das atividades. A partir da observação, tornam-se evidentes alguns quesitos presentes como: o desenvolvimento das árvores, sua queda/soterramento, o passar do tempo e as camadas de deposição que as cobriram e sua exposição novamente. Através desses desenhos, infere-se que os estudantes conseguiram visualizar que o processo de fossilização demora a ocorrer e que o solo está sempre em deslocamento o que, indiretamente, retoma a história do ambiente em que eles vivem. Figura 3: Materiais construídos pelos educandos Fonte: Organizado pelos Autores 20 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 Conclusões A ciência apresenta-se de diferentes formas no cotidiano dos sujeitos. Na cidade da Mata, os fósseis da região fazem parte da paisagem dos moradores da região, mas nem sempre são vistos, reconhecidos e abordados em sala de aula de forma que os alunos percebam a real importância do patrimônio científico e cultural que a região possui. A partir dos resultados obtidos com a pesquisa, tal fato ficou evidenciado nas etapas iniciais da investigação, podendo-se afirmar que os educandos possuem algum conhecimento sobre a paleontologia, porém não conseguem estabelecer relações com a riqueza paleontológica do município. No entanto, a partir de uma abordagem científica contextualizada, verificou- se que os educandos, em sua maioria, melhoraram sua argumentação sobre o tema. A proposta desenvolvida, portanto, mostrou-se eficiente para o desenvolvimento da compreensão do tema, auxiliando os educandos a compreenderem melhor os eventos que ocorreram no município e suas características. Porém, ressalta-se que o ensino de Paleontologia no município deveria ser revisto e que a abordagem paleontológica, valorizando o patrimônio local, está distante da realidade dos alunos. Tal processo deve ocorrer de maneira contínua e gradual conforme avançam os níveis de ensino, tornando a sua experiência mais complexa e significativa. Nesse contexto, seria interessante propor uma aproximação pelos professores, através de um processo de formação continuada sobre o tema, como meio de propiciar maior entendimento e valorização da Paleontologia pela comunidade. Agradecimentos À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pelo apoio financeiro. À Secretaria de Educação, escolas municipais e estaduais de Mata, pelo espaço, apoio e receptividade. Referências ADAMS, F. W. et al. Contribuições de metodologias diversificadas para a formação crítico/reflexiva de alunos da educação básica. Revista de Ensino de Ciências e Matemática, v. 7, n. 3, p. 01-17, 2016. ANTUNES, B. C.; COSTA, S. A. R. F.; RUIVO, M.L.P. dificuldades de inserir a temática paleontologia na sala de aula em Belém- PA. In: XIII Simpósio de Geologia da Amazônia, 2013, Belém. Anais do XIII Simpósio de Geologia da Amazônia, 2013. v. 1. p. 22-25. BARDIN, L. Análise de conteúdo. 4ª ed. 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Se sim, por quê? 4- Qual a idade daTerra? 5- Você acha que os dinossauros e os seres humanos viveram juntos? 6- Você já estudou sobre paleontologia em sala de aula? Se sim, em que série/ano e de que forma o professor abordou este conteúdo. 7- O que você gostaria de conhecer sobre paleontologia? Justifique. 8- Você já realizou alguma atividade educativa no Museu Paleontológico Daniel Cargnin ou no Museu Paleobotânico de Mata? Esta visita foi proposta pelo professor de ciências/biologia? 9- Você acha importante preservar os fósseis? Por quê? Apêndice 2: Questionário dos educandos - Pós-intervenção 1- Diante do que foi abordado. Você considera importante saber como ocorre a formação 23 REnCiMa, São Paulo, v. 12, n. 1, p. 1-23, jan./mar. 2020 de um fóssil? Se sim, por quê? 2- O que os fósseis de Mata significam para você? 3- Caso algum visitante chegasse a Mata e perguntasse a você algo sobre os troncos fossilizados espalhados pela cidade. Você saberia responder? ( ) Sim ( ) Não. Caso sim, o que você diria a ele? 4- Cite exemplos de assuntos que você estuda em sala de aula e que consegue relacionar com a paleontologia. 5- Descreva o que você aprendeu com as atividades realizadas sobre a paleontologia. Apêndice 3: Acesso às reportagens utilizadas. — Árvores fossilizadas formam jardim de pedra em município gaúcho. Disponível em: <http://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/nossa-terra/2012/noticia/201 2/12 /arvores-fossilizadas-formam-jardim-de-pedra-em-municipio-gaucho.html>. Acesso em 10 Abr. 2018. — Jardim paleobotânico de 200 milhões de anos é tombado na cidade de Mata. Disponível em: <https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/jardim-paleobotanicode- 200-milhoes-de-anos-e-tombado-na-cidade-de-mata.ghtml>. Acesso em 10 Abr. 2018. — É pau, é pedra - Fósseis de árvores ajudam a entender como eram as florestas do passado Disponível em: <http://chc.cienciahoje.uol.com.br/e-pau-e-pedra/>. Acesso em 10 Abr. 2018. — Floresta de fósseis Disponível em: <http://chc.org.br/acervo/floresta-de-fosseis/>. Acesso em 10 Abr. 2018. http://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/nossa-terra/2012/noticia/201%202/12%20/arvores-fossilizadas-formam-jardim-de-pedra-em-municipio-gaucho.html http://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/nossa-terra/2012/noticia/201%202/12%20/arvores-fossilizadas-formam-jardim-de-pedra-em-municipio-gaucho.html https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/jardim-paleobotanicode-200-milhoes-de-anos-e-tombado-na-cidade-de-mata.ghtml https://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/jardim-paleobotanicode-200-milhoes-de-anos-e-tombado-na-cidade-de-mata.ghtml http://chc.cienciahoje.uol.com.br/e-pau-e-pedra/ http://chc.org.br/acervo/floresta-de-fosseis/
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