Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

Organizadores 
Alexandre Torres Petry 
 Andréa Fontoura André 
 Estéfani Luise Fernandes Teixeira 
 Evânia Romanovsky 
 Jarbas Paula de Souza Junior 
 Lucas Lazzaretti 
 Mariana Polydoro de Albuquerque Diefenthaller 
 Kelly Paties Pereira de Andrade 
 
 
 
 
 Bioética e Direito 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Porto Alegre, 2023 
 
 
Copyright © 2023 by Ordem dos Advogados do Brasil 
Todos os direitos reservados 
 
Organizadores 
Alexandre Torres Petry 
 Andréa Fontoura André 
 Estéfani Luise Fernandes Teixeira 
 Evânia Romanovsky 
 Jarbas Paula de Souza Junior 
 Lucas Lazzaretti 
 Mariana Polydoro de Albuquerque Diefenthäller 
 Kelly Paties Pereira de Andrade 
 
Projeto Gráfico e Capa 
Victor Baldez Silva 
 
Revisora 
Dieniffer de Souza Silva Lemes 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A revisão de Língua Portuguesa e a digitação, bem como os conceitos emitidos em trabalhos 
assinados, são de responsabilidade dos seus autores. 
 
Escola Superior de Advocacia da OAB/RS 
Rua Manoelito de Ornellas, 55 – Praia de Belas 
 CEP 91110-230 – Porto Alegre/RS 
 
 
B512 
 Bioética e Direito [recurso eletrônico]. / Alexandre Torres Petry, Andréa 
Fontoura André, Mariana Polydoro de Albuquerque Diefenthäller 
(Orgs). Porto Alegre: OABRS, 2023. 521p. 
ISBN: 978-65-88371-31-2 
1. Bioética. 2. Direito. I. Petry, Alexandre Torres. II. André, Andréa 
Fontoura. III. Título 
 
CDU 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
PREFÁCIO - Mariana Diefenthäler ............................................................................................ 7 
APRESENTAÇÃO - Eduardo Neubarth Trindade e Estéfani Luise Fernandes 
Teixeira ............................................................................................................................................. 8 
O “NOVO” MAL DO SÉCULO XXI: SÍNDROME DE BURNOUT E SUA 
CONFIGURAÇÃO COMO DOENÇA DO TRABALHO – Aline Barth Paixão ................. 9 
DILEMAS ÉTICOS E JURÍDICOS NO ATENDIMENTO DE URGÊNCIA: 
PRIORIDADES E CONFLITOS NA PRÁTICA MÉDICA – Anderson Fernandes de 
Borba e José Antônio Carrazzoni dos Reis Júnior ............................................................... 30 
REPRODUÇÃO ASSISTIDA POST MORTEM E SUA REPERCUSSÃO NO 
ORDENAMENTO JURÍDICO – Bianca Krombauer Antunes, Mariana Silva Goulart e 
Jair Pereira Coitinho ................................................................................................................... 50 
FEMINICÍDIO PRATICADO CONTRA MULHER TRANS: A BIOÉTICA DE 
INTERVENÇÃO E A REINTERPRETAÇÃO DA QUALIFICADORA CONTIDA NO 
INCISO VI DO § 2º DO ARTIGO 121 DO CÓDIGO PENAL – Bruno de Andrade 
Martins, Eder Neves Leal e Jair Pereira Coitinho ............................................................... 67 
EUTANÁSIA, DISTANÁSIA E ORTOTANÁSIA: A ÉTICA DO RESPEITO À 
DIGNIDADE E O TESTAMENTO VITAL – Camila Maria Maciel, Estéfani Luise 
Fernandes Teixeira e Mariana Assis ........................................................................................ 87 
A PROBLEMÁTICA DO USO DO CRITÉRIO DE AUTORIDADE CIENTÍFICA PARA 
IMPOR MEDIDAS RESTRITIVAS E LIMITAR LIBERDADES INDIVIDUAIS 
DURANTE A PANDEMIA DO CORONAVÍRUS: UMA REFLEXÃO – Cesar Augusto 
Cavazzola Junior e Cidney Antônio Surdi Junior ................................................................ 97 
BIOÉTICA E DIREITOS HUMANOS: INTERFACES NA CONTEMPORANEIDADE – 
Cristiane Avancini Alves ........................................................................................................... 108 
A MORTE COMO DIREITO: UMA ANÁLISE DO DIREITO À MORTE SOB O PONTO 
DE VISTA MÉDICO-LEGAL – Daniel Oliver Franco, Viviane Teixeira Dotto Coitinho 
e Thais Campos Olea ................................................................................................................. 129 
DIREITO E BIOÉTICA POR INTERMÉDIO DA CIÊNCIA: CONSIDERAÇÕES 
JURÍDICAS. – Edgar de Medeiros Pinto ............................................................................... 149 
PROPOSTA DE REGISTRO ELETRÔNICO EM SAÚDE NACIONAL UNIFICADO 
(RESNU) COMO INSTRUMENTO DE QUALIDADE ASSISTENCIAL E OTIMIZAÇÃO 
DE CUSTOS – Edmilson de Almeida Barros Júnior .......................................................... 172 
TEORIA DAS CAPACIDADES DE MARTHA NUSSBAUM E SUA RELEVÂNCIA NA 
PROMOÇÃO DA JUSTIÇA SOCIAL PARA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA – Erika 
Neder dos Santos e Gabriel Maçalai ...................................................................................... 191 
 
 
A NATUREZA JURÍDICA DO EMBRIÃO, FRUTO DA TÉCNICA DE FERTILIZAÇÃO 
IN VITRO: A PARTIR DA ANÁLISE DA LEI 11.105, DE 2005 E DAS RESOLUÇÕES DO 
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA – Estela Franco e Letícia Alvarez Ucha ...... 203 
SAÚDE E ENCARCERAMENTO NO BRASIL: UMA REFLEXÃO ÉTICA SOB A 
ÓTICA DA LEI E DA PRÁTICA – Fábio Luis Brack e Vanessa Louise dos Santos .. 222 
O DIREITO GUIANDO OS PASSOS DA CIÊNCIA – Gabriel Silva e Luciane Bittencourt 
Fagundes ....................................................................................................................................... 240 
COVID-19 E O DIREITO: UMA VISÃO SOBRE OS IMPACTOS DA PANDEMIA SOB 
O OLHAR DA BIOÉTICA E DO DIREITO – João Tailor da Luz Saraiva, Alan Pereira 
Ferreira e Viviane Teixeira Dotto Coitinho ......................................................................... 264 
EXPORTAÇÃO DE ANIMAIS IN NATURA: DESAFIOS E IMPLICAÇÕES NO CAMPO 
DA BIOÉTICA, DO SISTEMA JURÍDICO INTERNACIONAL DE COOPERAÇÃO E DA 
PROTEÇÃO DE ANIMAIS NÃO HUMANOS – José Alberto Antunes de Miranda, 
Liziane Menezes de Souza e Nicolle Bittencourt Rocha .................................................... 276 
O INTERSEXO À LUZ DA BIOÉTICA: MULTILAR OU CONSCIENTIZAR? – Karina 
Salort Larruscaim e Sheila Salort Larruscaim ................................................................... 297 
A EXPERIÊNCIA DE IMPLANTAÇÃO DE UM COMITÊ DE BIOÉTICA EM UM 
COMPLEXO HOSPITALAR –Kelly Paties Pereira de Andrade...................................... 313 
IMPACTOS DA REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA POST MORTEM NO DIREITO 
SUCESSÓRIO – Larissa Schifelbein da Rosa, Nathálie Debus Borges e Jair Pereira 
Coitinho......................................................................................................................................... 323 
A AUTONOMIA DO ATLETA DE ALTA PERFORMANCE: UMA ANÁLISE 
BIOÉTICA- Laura Affonso da Costa Levy ........................................................................... 338 
BIOÉTICA E O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NO CENÁRIO 
DO ACESSO AO TRANSPLANTE: A DIFICULDADE EM TORNO DO TRATAMENTO 
FORA DO DOMICÍLIO – Lise Schomaker Maurell, José Walter Benetti Júnior e Laíni 
Neves Xavier. ............................................................................................................................... 348 
ROL DE PROCEDIMENTOS E EVENTOS EM SAÚDE DA ANS: A 
(DES)OBRIGATORIEDADE DE FORNECIMENTO DE FÁRMACOS À BASE DE 
CANABIDIOL AO CONSUMIDOR DA SAÚDE SUPLEMENTAR E ASPECTOS 
ATUAIS NA LEGISLAÇÃO, JURISPRUDÊNCIA E DOUTRINA – Lucas de Oliveira 
Tavares .......................................................................................................................................... 362 
O DIREITO NA ERA DA ENGENHARIA GENÉTICA: APROXIMAÇÕES 
(NECESSÁRIAS) À ÉTICA APLICADA – Marcio Renan Hamel ................................... 382 
DEPENDÊNCIA QUÍMICA E SAÚDE MENTAL: UMA ABORDAGEM 
PSICOSSOCIAL- Marcos Paulo Garcia de Andrade ......................................................... 396 
A EXIGÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL PARA O MÉDICO RELIZAR O ABORTO 
LEGAL COMO OBSTÁCULO PARA O DIREITO DAS MULHERES – Maria Dulce 
Rosso Góes e Lívia Haygert Pithan ........................................................................................ 406 
SAÚDE MENTAL E POLÍTICAS PÚBLICAS: REFLEXÕES SOBRE DIREITOS 
FUNDAMENTAIS, TECNOLOGIA E BIOÉTICA – Mariana Diefenthäler, Estéfani 
Teixeirae Evânia Romanovski ................................................................................................ 427 
 
 
OS IMPACTOS DA TECNOLOGIA NA RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE – Melissa 
Daandels ........................................................................................................................................ 437 
ENGENHARIA GENÉTICA NA REPRODUÇÃO HUMANA MEDICAMENTE 
ASSISTIDA NO BRASIL: ASPECTOS BIOÉTICOS E JURÍDICOS – Natan da Silva 
Lemes ............................................................................................................................................. 445 
BIOÉTICA E A MEDICINA INTEGRATIVA – Pâmela Ely Bonette e Michele 
Bertoncello Spader ..................................................................................................................... 465 
ESG NO SETOR DA SAÚDE – Roberto Vinícius Silva Saraiva, Elisandra Rosa Cunha 
e Hélio Gustavo Alves ................................................................................................................ 476 
A EVOLUÇÃO DAS DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE: UM ESTUDO DAS 
ABORDAGENS EUROPEIA E BRASILEIRA – Suelem da Costa Silva ........................ 494 
TESTES DE ANCESTRALIDADE GENÉTICA E A (RE)DEFINIÇÃO DA IDENTIDADE 
ÉTNICO-RACIAL NO BRASIL: MEMÓRIAS E DESAFIOS JURÍDICOS E BIOÉTICOS 
– Ulisses Soares Passos .............................................................................................................. 508 
 
 
 
7 
 
PREFÁCIO 
 
Nos 38 anos da Escola Superior de Advocacia da OAB/RS (ESA/RS), nos orgulhamos 
em termos a oportunidade de prefaciar o livro em formato E-book, composto de inovadores 
artigos científicos, intitulado como “Bioética e Direito”, sendo a terceira obra eletrônica 
organizada pela Comissão Especial do Direito à Saúde da OAB/RS com o Grupo de Estudo de 
Direito e Saúde da ESA/RS com o propósito evolutivo individual e coletivo de tratar a Bioética 
de forma transversal e multidisciplinar contextualizada no Direito. 
 Por isso, agradecemos o apoio e confiança incondicionais do Presidente da OAB/RS, 
Dr. Leonardo Lamachia, e também da Escola Superior de Advocacia da OAB/RS, na pessoa do 
seu Diretor-Geral, Rolf Madaleno, aos quais parabenizamos pelo estímulo e inspiração para o 
aprimoramento do conhecimento científico do Direito da Saúde com iniciativas como esta, que 
contribui sobremaneira para o aperfeiçoamento profissional da Advocacia nacional quiçá, 
internacional. 
Em 2023, ressaltamos a presença feminina na Advocacia e homenageamos a Vice-
Presidente da OAB/RS, Dra. Neusa Bastos, pelos préstimos inquestionáveis e liderança sensível 
da representatividade feminina na política institucional de mulher de ordem com todos os 
atributos indispensáveis à paridade e equidade de gênero saudáveis nas organizações. 
 Por fim, parabenizamos todos os autores e coorganizadores desta valorosa obra e 
convidamos os leitores a adentrarem na interlocução entre Bioética e Direito através da leitura 
dos artigos a seguir apresentados. 
 
 Desejamos ótima leitura! 
 
 
Mariana Diefenthäler, 
Presidente da CEDS. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
8 
 
APRESENTAÇÃO 
 
As transformações pelas quais a sociedade passa, o uso de novas tecnologias, as 
revoluções científicas, as mais recentes técnicas médicas, os novos medicamentos e 
procedimentos, as mudanças de comportamentos e suas implicações jurídicas são movimentos 
sociais que levam a reflexões e questionamentos éticos e morais tanto nas áreas da Medicina 
quanto do Direito. 
A Bioética é um tema complexo, inter, multi e transdisciplinar. A Bioética está 
intimamente ligada à Medicina, seguindo uma visão de proteção à vida. Assim como a Bioética 
deve estar ao lado do Direito, buscando a elaboração de leis que visem à proteção da vida. 
Dessa forma, apresentar esta obra é um privilégio. Trata-se de oportuna coletânea de 
estudos, idealizada por organizadores e articulistas da Comissão Especial da Saúde da Ordem 
dos Advogados do Brasil - Rio Grande do Sul (OAB/RS). Os autores são estudiosos que se 
dedicam à reflexão sobre o direito à saúde, debruçando-se sobre temas relevantes e inquietantes, 
no que concerne à Bioética e ao Direito, a requerer muitas pesquisas e estudos dos autores. 
O presente e-book foi idealizado com a finalidade de celebrar os 38 anos da Escola 
Superior de Advocacia (ESA/RS) e, ainda, homenagear a Dra. Neusa Maria Rolim Bastos, 
Vice-presidente da OAB/RS. 
A trajetória da homenageada compreende grande experiência, sendo renomada 
profissional. A ESA/RS foi fundada em 1985, por inciativa da OAB/RS, sendo a primeira no 
Brasil, por força da Resolução 24/1985. O Presidente da OAB/RS à época, em reunião do 
Egrégio Conselho Seccional, em 3 de setembro de 1985, aprovou a criação da Escola Superior 
de Advocacia, destinada a centralizar e a coordenar atividades culturais, por meio de cursos, 
estudos, seminários, congressos, publicações e demais programações. 
Esta obra contempla estudos que atendem a profissionais de diversas áreas, fomenta 
dúvidas, provoca inquietações e reflexões e, sobretudo, aponta caminhos. 
A Bioética é um campo multidisciplinar de estudo, fundamentado na influência de 
princípios morais e éticos que regem a vida norteando a prática médica e a pesquisa científica. 
Com isso, é imperioso analisar a Bioética a partir de uma perspectiva jurídica, a fim de 
buscar critérios éticos para a solução de questões jurídicas relacionadas à vida. 
Nesse sentido, trata-se de preciosa contribuição para a comunidade, auxiliando na 
compreensão de temáticas atuais e por vir. 
Portanto, os organizadores, os articulistas e a Comissão Especial da Saúde 
homenageiam a Escola Superior de Advocacia pelos seus 38 anos e a Dra. Neusa Maria Rolim 
Bastos por sua dedicação, sua trajetória, sua contribuição e seus ensinamentos à Ciência 
Jurídica brasileira, com votos de sucesso e agradecimento. 
 
Eduardo Neubarth Trindade 
Médico, presidente do Conselho Regional de Medicina do estado do Rio Grande do Sul 
(Cremers) 
Estéfani Luise Fernandes Teixeira 
Membro e coordenadora do GT pesquisa da Comissão Especial de Direito a Saúde da 
OAB/RS 
9 
 
O “NOVO” MAL DO SÉCULO XXI: SÍNDROME DE BURNOUT E SUA 
CONFIGURAÇÃO COMO DOENÇA DO TRABALHO 
 
THE “NEW” DISEASE OF THE 21ST CENTURY: BURNOUT 
SYNDROME AND ITS CONFIGURATION AS AN OCCUPATIONAL 
DISEASE 
 
Aline Barth Paixão1 
RESUMO 
 
A humanidade se encontra em plena transformação tecnologia. A quarta Revolução Industrial, 
também conhecida como “era digital”, está sendo marcada pelos inúmeros avanços 
tecnológicos e digitais, de maneira a auxiliar e proliferar os sistemas de produção em massa. O 
estado pandêmico mundial potencializou a realização destas mudanças no Brasil e no restante 
do mundo, com sua ocorrência de forma unida e linear, representando uma verdadeira 
metamorfose nas relações sociais, em especial, nas relações de trabalho e na saúde mental dos 
trabalhadores. As formas de trabalho se encontram em plena transformação, o que reflete 
diretamente na adaptação de todos aqueles que, de alguma forma, prestam serviços. Dessa 
forma, indaga-se os efeitos destas mudanças na saúde psíquica dos trabalhadores; a maneira 
que estes lidam com as questões relacionadas ao “novo” ambiente de trabalho lhe imposto e; 
ainda, como se enquadrar em uma sociedade que se modifica a todo instante. Para tanto, temos 
como objetivo analisar uma das principais patologias psíquicas em evidência atualmente e cujo 
crescimento espanta nos últimos anos, qual seja: a “Síndrome de Burnout”. Recentemente 
classificada como doença do trabalho pela OMS, a Síndrome de Burnout leva o trabalhador ao 
esgotamento e ao cansaço demasiado mental, contudo, resta nós observamos que estamos 
ultrapassando período social em que o esgotamento e o cansaço estão sendo levados para uma 
sociedade por completo, atingindo e transformando todauma geração. 
 
Palavras-chave: Síndrome de Burnout; Saúde mental; Doença do trabalho; Revoluções 
industriais; Era digital. 
 
ABSTRACT 
 
Humanity is in the midst of technological transformation. The fourth Industrial Revolution, also 
known as the “digital era”, is being marked by numerous technological and digital advances, in 
order to assist and proliferate mass production systems. The global pandemic state enhanced 
the realization of these changes in Brazil and the rest of the world, with their occurrence in a 
united and linear way, representing a true metamorphosis in social relations, in particular, in 
work relations and workers' mental health. The ways of working are undergoing complete 
transformation, which directly reflects on the adaptation of all those who, in some way, provide 
 
1 Discente no curso de LLM em Direito e Processo do Trabalho: O Mundo do Trabalho e suas Novas Relações, 
pela FMP. Especialista em Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho, pela PUC/RS. Graduada em 
Direito pela Faculdade CNEC Gravataí. Membro da Comissão Especial dos Advogados Trabalhistas e da 
Comissão Especial de Diversidade Sexual e Gênero pela gestão 2022/2024, ambas da OAB/RS – Subseção de 
Gravataí. Advogada Trabalhista – OAB/RS 103.534, Controller Jurídico. E-mail: aline_bpaixao@hotmail.com. 
10 
 
services. In this way, the effects of these changes on the mental health of workers are 
questioned; the way they deal with issues related to the “new” work environment imposed on 
them and; Furthermore, how to fit into a society that changes all the time. To this end, we aim 
to analyze one of the main psychic pathologies currently in evidence and whose growth has 
been astonishing in recent years, namely: “Burnout Syndrome”. Recently classified as an 
occupational disease by the WHO, Burnout Syndrome leads workers to exhaustion and 
excessive mental fatigue, however, we can see that we are overcoming a social period in which 
exhaustion and tiredness are being brought to society as a whole, reaching and transforming an 
entire generation. 
 
Keywords: Burnout syndrome; Mental health; Illness at work; Industrial revolutions; Digital 
age. 
 
INTRODUÇÃO 
 
Atualmente, a humanidade enfrenta uma gama de desafios, dentre estes, um dos mais 
importantes e intensos é a nova moldagem trazida pela revolução tecnológica, que modificará 
a estrutura de todas as formas de relações sociais que conhecemos, inclusive, as de cunho 
laborais. Estamos ultrapassando pela chamada “Quarta Revolução Industrial” ou “Indústria 
4.0”, marcada pelas conexões à distância e acesso integral e imediato a todos os tipos de 
informações, onde o ser humano é interligado através da rede online e off-line, em um espaço 
sem marcas para o físico ou relações interpessoais. 
Sem sombra de dúvidas, o Brasil e o mundo sofreram inúmeros reflexos em decorrência 
da pandemia da Covid-19, ocorrida entre os anos de 2019 e 2021, aderindo inúmeras medidas 
obrigatórias de proteção e prevenção em prol da contenção das fatalidades, em especial nas 
áreas da saúde e economia, as quais foram as principais afetadas. 
No mesmo sentido e tempo que as transformações sociais percorrem seu caminho, as 
relações laborais e as formas de prestações de serviços se ajuntam para adaptação e ingresso de 
novas técnicas, essas que, de sorte, foram alavancadas em tempos pandêmicos por razões de 
necessidade da mantença dos empregos e giro econômico do país. 
Todas estas transformações se acumulam a um sistema prejudicial e profundo no sentido 
psicopatológico das relações laborais, ao passo que se exige o rápido ajustamento dos 
trabalhadores a conceitos, técnicas e procedimentos que se modificam e inovam a todo instante. 
Tudo se resulta no descontrole psicológico, na sobrecarga mental e no excesso de trabalho, 
reflexo de uma sociedade que impulsiona o dever e a crença do poder. 
11 
 
O objetivo do presente estudo, é refletir sobre a “Síndrome de Burnout”, também 
conhecida como síndrome do “esgotamento” ou do “cansaço”, classificada como uma doença 
ocupacional – a CID 11 –, em 1º de janeiro de 2022, pela Organização Mundial de Saúde (OMS) 
mediante seu enquadramento na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas 
Relacionados com a Saúde. Voltada para as relações de trabalho, os casos envolvendo esta 
doença psíquica em nossa sociedade tiveram um aumento exponencial nos últimos anos, o que 
provoca inúmeros questionamentos e dúvidas envolvendo a saúde mental de nossos 
trabalhadores. As razões deste aumento e a preocupação da sociedade em tratar esta 
psicopatologia como uma doença do trabalho, tudo colacionando a rápida metamorfose de 
nossos sistemas tecnológicos, é o que será aqui analisado, pensado e comparado. 
 
1 CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA EVOLUÇÃO INDUSTRIAL ATÉ A ERA 
DIGITAL 
 
A construção da força de trabalho como fonte de renda e vitaliciedade de uma sociedade 
sobreveio a um verdadeiro encadeamento de valores adquiridos ao longo da história mundial, 
mediante acontecimentos de suma importância para o desenvolvimento e reconhecimento do 
trabalho humano como uma garantia constitucional fundamental em torno de todos os países 
desenvolvidos ou em pleno desenvolvimento. 
A questão do reconhecimento quanto a vitaliciedade do trabalho para a construção de 
uma sociedade íntegra, tanto em valores e princípios quanto em infraestruturas e 
desenvolvimento, deve ser superada positivamente, ao passo que, atualmente, o trabalho e sua 
presença enraizada deixaram de possuir o estigma de dor, sofrimento e outros adjetivos 
negativos. Pelo contrário, o trabalho, corretamente, remete a ideia de dignificação do homem e 
de impulsionamento de uma sociedade. 
Para tanto, necessária a realização de uma modesta digressão de maneira a 
compreendermos o caminho percorrido até a chegada neste momento atual. Para isso, 
analisemos as conhecidas “revoluções industriais” – isto é, a evolução das indústrias –, até 
então, segmentadas em quatro grandes momentos históricos. Alguns doutrinadores 
compreendem que, atualmente, já ingressamos na quinta dimensão industrial, ou seja, naquela 
chamada de “indústria 5.0”, contudo, a doutrina clássica ainda majora na conservação da 
“indústria 4.0” para o momento contemporâneo conhecido como a “era digital” – a qual será 
mais falada a frente –, posicionamento este que será seguido pelo presente artigo. 
12 
 
A primeira Revolução Industrial – ou Indústria 1.0 – teve início na Inglaterra a partir da 
segunda metade do século XVIII, aproximadamente em 1704. Posteriormente, se espalhou pelo 
mundo, sendo conhecida como um período de grande desenvolvimento e de grandes 
transformações. Foi nessa época que houve o surgimento da indústria e que o processo de 
formação do capitalismo foi consolidado. 
Dentre as características da Indústria 1.0, sucedeu-se uma emigração dos trabalhadores 
da área rural na Europa para o labor em fábricas e indústrias. A mercê de uma produção, à 
época, totalmente artesanal e manufatureira, tal motivação adveio do aspecto mecanizado de 
produção trazido pela primeira Revolução Industrial, com o consequente aumento da indústria 
têxtil com o tear, máquina de produção de fios, e uma grande força a vapor. Isto é, os grandes 
avanços e movimentos da época acarretaram, em síntese, na passagem do trabalho rural e de 
agricultura à indústria e fábricas com a utilização de tecnologia a vapor, mecanismos na época 
inéditos, que faziam com que aumentasse a produtividade e não se desperdiçasse tanta matéria-
prima. 
Em seguimento, indo para o século XIX, em torno do ano de 1870, nós tivemos a 
segunda Revolução Industrial – ou Indústria 2.0. A segunda Revolução Industrial é marcada 
fortemente pelo invento da eletricidade e da combustão, bem como por sua aplicação nos meios 
de produção, em especial, pela introduçãodestas novas técnicas e fontes de energia na indústria 
química. Esses aprimoramentos tecnológicos possibilitaram o aumento da capacidade industrial 
e da produção em escala, além de ter proporcionado o desenvolvimento acelerado da economia, 
com o consequente aumento significativo das indústrias e das fábricas. Além disso, foi na época 
da Indústria 2.0 que foram inventados o telefone, a lâmpada, o fonógrafo e o motor de 
combustão interna, que passaram a ser utilizados nos veículos. 
A terceira Revolução Industrial – ou Indústria 3.0 – iniciou-se no século XX, na década 
de 1950, no contexto da Segunda Guerra Mundial, marcando o início da “era da informação”. 
Esta época foi marcada pelo alcance de um novo patamar, tanto econômico quanto social, em 
razão do grande aumento da automação e a utilização inédita da informática, robótica, genética, 
telecomunicações, eletrônica, dentre outros. As indústrias que desenvolveram alta tecnologia 
começaram a se sobressair em relação às indústrias que se destacavam nas fases anteriores da 
Revolução Industrial, como a metalurgia, siderurgia e a indústria de automóveis. 
A alta tecnologia trazida pela Indústria 3.0 foi um propulsor no acesso a novas 
informações e na facilidade de comunicações e relações sociais, diminuindo a distância e o 
tempo entre as pessoas e as informações. Com o aprimoramento de satélites, telefones, 
13 
 
computadores, o advento da internet e outras tecnologias, sem dúvidas, esta época assinala a 
propulsão econômica capitalista, com o aumento de multinacionais e a utilização de diversos 
meios eletrônicos, inclusive, com a utilização dessas tecnologias nos meios de produção. 
Trilhando os caminhos dos três primeiros momentos da Revolução Industrial, 
adentrando em tais sinopses, podemos destacar grandes estágios de precarização. À exemplo, 
na Indústria 1.0, onde o labor de crianças nas indústrias têxtis era livremente permitido, com 
manuseio das máquinas de tecnologia a vapor e em carga horária exorbitante, podendo chegar 
até 16 horas diárias, sem qualquer espécie de proteção. Pelo contrário, naquela época, nem 
sequer, se pensava em saúde e/ou direitos dos trabalhadores, muito menos se cogitava acerca 
de saúde mental destes. 
Mas, e nos dias hoje? Em que ponto de aperfeiçoamento a nossa indústria se encontra? 
Chegando em nossa sociedade atual, temos a quarta Revolução Industrial – ou Indústria 
4.0, a qual engloba um amplo sistema de tecnologias avançadas, dentre estas: a inteligência 
artificial, o sistema cibernético, a robótica, a internet das coisas, o metaverso, a computação em 
nuvem, além das principais inovações tecnológicas desses campos. Trata-se de uma rede de 
tecnologias que está em desenvolvimento crescente e transformando as formas, os meios de 
produção e os modelos de negócios no Brasil e no mundo. 
Podemos afirmar que, atualmente, nós vivemos em uma sociedade totalmente digital e 
interconectada. O que vemos hoje em dia é uma realidade virtual que, por vezes, pode acarretar 
benefícios e, por outras, malefícios aos nossos propósitos. Ademais, sabemos que o estado 
pandêmico vivenciado pelo mundo entre os anos de 2019 e 2021 devido a Covid-19, assim 
como a campanha do “fique em casa” em prol da saúde das pessoas, acelerou imperiosamente 
os modelos de trabalho no mundo todo e, consequentemente, impulsionou e adiantou inúmeras 
tecnologias antes adormecidas ou estruturadas para inauguração posterior. 
Devido à crise do coronavírus, as estruturas mundiais obrigaram-se a adaptação em prol 
da mantença da economia de seu país, inclusive, o Brasil. Dentre tais medidas adotadas, se 
encontram o teletrabalho e o trabalho remoto, de maneira a permanecer em funcionamento com 
a maioria de seus postos de trabalho e com a continuidade da movimentação de seu sistema 
econômico. Dessa forma, a empresa e seus empregados ganharam uma opção para manter-se 
operantes, com o auxílio e a grande evolução de melhoramento nos sistemas virtuais de 
computação. 
14 
 
Destarte, mesmo depois de superado o período pandêmico, muitas empresas nacionais 
e internacionais – inclusive, os órgãos públicos de todos os poderes brasileiros – estão optando 
por manter a dinâmica do trabalho virtual, tendo em vista os benefícios e comodismos que tal 
sistema trouxe. 
A Indústria 4.0 é a indústria da “era digital”, é aquela que o ser humano e o profissional 
estão tendo de aprender a se reinventar, se especializar no mais complexo, se readequar ao 
mercado de trabalho ante as novas tecnologias e sistemas, que estão abarcando as tarefas mais 
obsoletas e repetitivas. Este é o período do metaverso, dos sistemas de algoritmos, da 
plataformização do trabalho (ou uberização, a quem preferir), das audiências e reuniões por 
videoconferências, dos softwares de gestão e das profissões híbridas, que, muitas vezes, não 
exigem experiência tradicional, mas sim, a experiência da “mente aberta”, do querer 
conhecimento e do estar disposto a se especializar nas técnicas atuais exigidas pelo mercado de 
trabalho. 
É diante desta Indústria 4.0, a conhecida era digital, que se propõe a explorar a saúde 
mental dos trabalhadores, questionando acerca do impacto que esta nova forma industrial está 
refletindo na sociedade, em especial naqueles que impulsionam a economia de nosso país. 
Como subsistir em um mercado de trabalho altamente mutável e adaptável do ponto de vista 
tecnológico e econômico, sem, contudo, debilitar a sua própria saúde e mente nesse cenário? 
 
1.1 A sociedade de vigilância de “Foucault” e a sociedade do cansaço de “Han” 
 
No ano de 1975, o filósofo francês Michel Foucault, escreveu sua enaltecida obra 
“Vigiar e Punir”, a qual tratou de um exame dos mecanismos teóricos e sociais que 
influenciaram as mudanças nos sistemas penais ocidentais. Com posicionamentos fortes e 
marcantes, o filósofo apresenta sua análise sobre a “sociedade da vigilância”, defendendo que 
as relações de poder postas, seja por qualquer instituição, escola ou prisão, são marcadas pela 
disciplina, a qual se instrumentaliza através do poder hierárquico, bem como que o poder é 
fonte das práticas discursivas, da linguagem e do conhecimento compartilhado. 
A disciplina é exercida, pressupõe-se, por um dispositivo que obrigue, pelo jogo de 
olhar, “um aparelho onde as técnicas que permitem ver induzam a efeitos de poder, e onde, em 
troca, os meios de coerção tornem claramente visíveis aqueles sobre quem se aplicam” 
(FOUCAULT, 1987, p. 196). A sanção normalizadora é a que comina, ou sanciona, toda pena. 
Segundo Foucault (FOUCAULT, 1987, p. 202). 
15 
 
Dentre as características da sociedade da vigilância suscitada por Foucault, os sujeitos 
eram submetidos por um contrato de obediência em uma sociedade dominada pelo negativismo. 
Temos então, as relações humanas e laborais condicionadas a subordinação rígida, aos 
comandos, a estrada dirigida e regrada por aqueles hierarquicamente superiores. O poder de 
vigilância é uma estratégia para alcançar um objetivo, não um objeto que pode pertencer a 
alguém, muito menos um lugar a ser ocupado e cobiçado. 
Acreditando em uma perspectiva mais intimista, no ano de 2010, o filósofo sul-coreano 
Byung-Chul Han apresentou ao mundo sua análise acerca das relações sociais através de sua 
obra chamada “Sociedade do Cansaço”, a qual, ousamos apontar, trata-se de uma das obras de 
maior relevância acadêmica da atualidade. 
Para Han, a sociedade contemporânea está alicerçada no cansaço de nossos 
trabalhadores e trabalhadoras, sendo sucumbidos pela era digital e pelas doenças psíquicas 
acarretadas ou concausadas por estas. Ao contrário da perspectiva trazida por Foucault, “a 
sociedade do século XXI não é mais a sociedade disciplinar, mas uma sociedade de 
desempenho. Também seus habitantes não se chamam mais ‘sujeitos da obediência’, mas 
sujeitos de desempenho e produção. São empresários de si mesmos” (HAN, 2017, p. 23). 
Aocontrário da sociedade disciplinar que adotava a abordagem do negativismo, a 
sociedade do desempenho é caracterizada pelo excesso de positivismo. É o elevar do homem 
até o último grau, retirando todas as espécies de comando e transpondo-o toda a liberdade e 
confiança para a execução de seu próprio labor, a seu livro arbítrio. É a confiança, o excesso de 
poder entregue ao trabalhador, a sua autonomia para demonstrar o seu potencial dentro do 
mercado, de maneira a se firmar pessoalmente. 
Esta é a nossa sociedade atual, aquela em que são criados os depressivos, os estressados, 
os ansiosos, os fracassados e os sem destinos. Aqueles que são libertos na imensidão do mundo, 
que são testados e motivados ao extremo quanto a sua capacidade, mas que não encontram seus 
caminhos e se perdem dentro de si mesmos. “O depressivo não está cheio, no limite, mas está 
esgotado pelo esforço de ter de ser ele mesmo” (HAN, 2017, p. 26). 
É dentro dessa perspectiva, que Han reflete sabidamente acerca do sistema de poder 
envolvido por trás de toda a máquina produtiva de nossa sociedade. O sujeito de obediência é 
aquele que, antigamente, sempre esteve limitado pelo negativismo, obedecendo ordens em uma 
cadeia de produção, limitado a um sistema que não tinha mais onde lucrar. Dessa forma, adota-
se o livramento da instância externa de domínio que obriga este sujeito a trabalhar ou ser 
16 
 
explorado. É trazido à tona o excesso de positividade, fazendo que ele não seja mais submisso 
a ninguém, apenas a si mesmo. Esta é a distinção entre os sujeitos de obediência e o de 
desempenho. Entretanto, a queda da disciplina não leva a liberdade, ao contrário, faz com que 
esta e a coação coincidam. O sujeito de desempenho tem a falsa sensação de liberdade, contudo, 
em verdade, ele está vivendo em auto exploração em razão do excesso de trabalho e 
desempenho, em uma verdadeira sociedade caracterizada pelo cansaço (HAN, 2017, p. 29-30). 
Nesse sentido, o explorador é, ao mesmo tempo, o explorado, o agressor e a vítima. Com 
esse paradoxo é que Han analisa a transformação de nossas relações sociais e da cadeia de 
produção, ao passo que uma sociedade de desempenho produz mais e, consequentemente, dá 
maiores lucros. A sociedade do cansaço está provocando infartos psíquicos, “o que causa a 
depressão do esgotamento não é o imperativo de obedecer apenas a si mesmo, mas a pressão 
do desempenho. Vista a partir daqui, a Síndrome de Burnout não expressa o si-mesmo esgotado, 
mas antes a alma consumida” (HAN, 2017, p. 27). 
 
1.2 Breve histórico do conhecimento da psicopatologia atribuída ao trabalho no Brasil 
 
A análise pormenorizada das relações humanas e de suas inter-relações laborais 
resultam no próprio conceito de autodeterminação governamental e de seus reflexos 
socioeconômicos e culturais. Sem sombra de dúvidas, ao mesmo passo que as doenças físicas 
e psíquicas foram sendo vistas e levadas em consideração, dado seu crescimento e afetação nas 
atividades de produção industrial, foram sendo constituídos legalmente os direitos dos 
trabalhadores a um ambiente salubre, digno e não excessivo, tudo em um processo moroso e de 
grandes golpes políticos. Por óbvio que as psicopatologias tiveram seu alcance legal tardio 
comparadas as patologias ergonômicas, tendo seus primeiros estudos atribuídos ao trabalho 
somente no ano de 1920, como será tratado a posterior. 
O término da Primeira Guerra Mundial, no ano de 1918, provocou uma grande reflexão 
em inúmeros países mundiais, ensejando a conquista de práticas mundiais humanitárias e 
preventivas, dentre elas, a criação da Liga das Nações ainda no ano de 1918, bem como a 
criação da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no ano seguinte, em 1919, esta 
originada pelo Tratado de Versalhes, documento de suma importância assinado pelas potências 
europeias, em forma de um tratado de paz que encerrou oficialmente a Primeira Guerra 
Mundial. 
17 
 
Em suma, a Liga das Nações apontava a necessidade de relativizar a soberania dos 
Estados, (...) “tinha como finalidade promover a cooperação, paz e segurança internacional, 
condenando agressões externas contra a integridade territorial e a independência política dos 
seus membros” (PIOVESAN, 2013, p. 189), enquanto a OIT tencionou na promoção da justiça 
e paz social por meio da melhoria qualitativa do trabalho no mundo, mediante a premissa de 
concretização de um trabalho digno para todos, sendo este o único meio para atingir tal objetivo. 
Rompeu-se, então, aquela ideia de soberania estatal absoluta, direcionando-se o olhar social 
para um viés de soberania centrada no cidadão, na dignidade da pessoa humana como centro 
universal das regulamentações. O viés do legislador passou para proteger a pessoa humana e 
não mais aquela prioridade do Estado. Atualmente, a OIT é uma agência multilateral 
especializada nas questões do trabalho, especialmente no que se refere ao cumprimento das 
normas internacionais, sendo integrada a Organização das Nações Unidas (ONU), sucessora da 
Liga das Nações, que foi extinta no ano de 1946. 
Ainda no ano de 1919, mais precisamente no dia 11 de agosto, a Alemanha, também 
traumatizada com a primeira grande guerra, promulgou a conhecida Constituição de Weimar, a 
qual foi uma construção muito importante para Europa e um verdadeiro marco histórico nos 
direitos sociais, ao passo que foi uma das primeiras que incluiu dentre suas normas a proteção 
ao trabalhador e o direito à educação. Posteriormente, a Constituição de Weimar serviu como 
base e grande influência positiva a inúmeros outros países na construção de suas próprias Cartas 
Magnas, inclusive, as do Brasil, especialmente a Constituição de 1934 e a atual Constituição 
Federal da República de 1988 (CF/88), ambas com seus direitos sociais e modelo de controle 
de constitucionalidade. Dentre os direitos sociais trabalhistas abordados, a Constituição de 
Weimar tratou da limitação da jornada; do desemprego; da proteção a maternidade; da previsão 
de idade mínima para admissão de trabalhadores na indústria, e; ainda, da regulamentação de 
questões do trabalho noturno para menores de idade. 
Como mencionado brevemente acima, os primeiros estudos das psicopatologias 
relacionadas ao trabalho podem ser vislumbrados somente no ano de 1920. Em que pese, 
precedentemente, já serem detectadas e tratadas as doenças psíquicas singularmente – sem 
qualquer vinculação ao trabalho –, bem como as patologias de origem ergonômicas já serem 
consideradas como doenças ocupacionais, mediante incidência do nexo de causalidade, 
somente a partir do mencionado ano as doenças de origem psíquicas passaram a ser apontadas 
e relacionadas com as atividades laborais, abrindo as possibilidades de averiguação entre a 
18 
 
patologia mental identificada no trabalhador e a atividade laboral por este desempenhada 
adjunto de seu ambiente, para configuração do nexo causal entre ambas. 
Dessa forma, deu-se início aos debates abarcando as psicopatologias como doença do 
trabalho, originadas tanto de maneira direta – causa de origem – quanto de maneira indireta – 
concausa / agravamento. 
No Brasil, constitucionalmente, houve alguns avanços tímidos no decorrer do século 
XX. Inicialmente, com a Constituição de 1934, a qual sedimentou várias garantias trabalhistas, 
dentre estas, e principalmente: a garantia de liberdade sindical; a previsão de jornada limitada 
a 8 horas diárias; a isonomia salarial; a proteção do trabalho do menor e da mulher; o repouso 
semanal remunerado; as férias anuais remuneradas, e; o salário-mínimo. 
Em segundo momento, na época da “Era Vargas”, com a outorga da Constituição de 
1937 pelo então presidente do Brasil Getúlio Vargas. Através de seu discurso protetivo em prol 
dos trabalhadores, Vargas conquistou inúmeras categorias, difundindo e prometendo direitos, 
vantagens e liberdades. Em que pese a importância do impulsionamento e normas trabalhistas,Vargas instituiu a aplicabilidade do princípio da “unicidade sindical” no Brasil – duradouro até 
os dias de hoje –, determinando a possibilidade de criação de um único sindicato por categoria 
limitado por região, assim como instituiu o imposto sindical e atribuiu a competência normativa 
dos Tribunais Regionais do Trabalho para análise e julgamento das decisões em dissídio 
coletivo, sem a participação do Poder Legislativo. Dessa forma, toda e qualquer possibilidade 
de criação de sindicatos representativos das categorias deveriam ser autorizadas pelo atual 
governo, o qual, por sua vez, apresentava parecer positivo a classes limitadas de trabalhadores, 
privilegiando somente aquelas elencadas no mais alto escalão do governo, ou seja, categorias 
“a seu dispor” e “a seu gosto”. Ressalva-se que, na era Vargas, o exercício de greve era 
totalmente proibido, sendo que sua prática era considerada como ato atentatório ao país e ao 
governo. 
Avançando, tivemos a Constituição de 1946 que, além de englobar em seu texto direitos 
já consagrados pelas constituições anteriores, trouxe – finalmente – a legalização do direito de 
greve; a participação nos lucros e resultados da empresa, e; conceitos de estabilidade do 
trabalhador. 
Como pode ser vislumbrado, os pequenos avanços conquistados nas Cartas Magnas ora 
mencionadas não tratavam diretamente acerca de prevenções do ambiente de trabalho psíquico 
em si, com olhar focado nesse intuito. Tais normas foram um start regional em nosso país para 
19 
 
o reconhecimento dos direitos sociais de seus trabalhadores em prol de um trabalho digno, 
visando a redução de acidente físico de trabalho. 
A promulgação da atual CF/88 trouxe em seu escopo uma divisão histórica em nosso 
país. Estávamos vivendo em regime ditatorial, em tempos de violações de direitos humanos e 
crueldade. O país inteiro padecia e reivindicava por direitos, liberdade e fraternidade, mediante 
um sistema democrático, de justiça social e igualitário. 
Envolvido pela influência e acolhimento da Declaração Universal dos Direitos 
Humanos, criada em 1948 pela ONU – a qual listou em seu bojo inúmeros direitos sociais, 
conjugou liberdade com igualdade, priorizou os direitos humanos e o Estado Democrático de 
Direito, e fez da dignidade da pessoa humana a proteção maior de uma nação –, o Estado 
brasileiro formou a Assembleia Constituinte que, em 5 de outubro de 1988 promulgou a 
Constituição Cidadã, movida pelo sentimento de democracia e proteção aos direitos humanos, 
em prol da liberdade, da igualdade, da fraternidade e da dignidade da pessoa humana. 
A atual Carta Magna trouxe consigo em seu título segundo uma gama de direitos e 
garantias fundamentais individuais e coletivos, tipificando-os como cláusulas pétreas, nos 
termos de seu artigo 60, § 4º, inciso IV, e de aplicação imediata, conforme art. 5º, § 1º. 
A proteção à saúde física e mental dos trabalhadores está inserida expressa e 
implicitamente dentre as normas constitucional, em especial no art. 7º. Inciso XXII, que prevê 
a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” 
como um direito específico dos trabalhadores urbanos e rurais. 
A partir deste marco temporal, a preocupação a saúde psíquica dos trabalhadores passou 
a ser tratada normativa e constitucionalmente, abrindo um leque de possibilidades 
infraconstitucionais de regulamentação ao nosso Poder Legislativo, o qual passou a exercê-lo 
desde então. De fato, pode ser afirmado que, atualmente, a saúde e proteção dos trabalhadores 
e o ambiente das relações de trabalho os quais se encontram inseridos, inclusive psiquicamente, 
são matérias de suma importância e delicadeza tratadas pelos três poderes – Executivo, 
Legislativo e Judiciário –, assim como aplicadas a todas as espécies de regimes de trabalhos e 
trabalhadores – por exemplo: empregados celetistas, autônomos, eventuais, prestadores de 
serviços, servidores estatutários, etc. – sendo devidamente apurada a responsabilidade por 
patologias no caso de configuração do nexo de causalidade ou concausalidade. 
 
 
20 
 
2 A SÍNDROME DE BURNOUT COMO O “NOVO” MAL DO SÉCULO XXI 
 
No ano de 1974, o psicólogo estadunidense Herbert J. Freudenberger, nascido em 
Frankfurt, na Alemanha, foi um dos primeiros estudiosos a dedicar sua pesquisa a observância 
das bruscas e significativas alterações de humor, atitude, motivação e personalidade associadas 
à exaustão profissional. Seu trabalho resultou, inicialmente, na publicação de um artigo 
denominado Staff Burn-out, para justamente descrever o que era essa síndrome causada pela 
exaustão do trabalhador e, posteriormente, no ano de 1980, na publicação da obra Burn Out: 
The High Cost of High Achievement, What it is and how to survive it. 
Foi o psicanalista Herbert J. Freudenberger que trouxe à tona, através de seus estudos, 
os primeiros conceitos e definições sobre a Síndrome de Burnout, e que impulsionou a 
preocupação para esta psicopatologia, associando-a diretamente com o ambiente do trabalho. 
Mediante informações extraídas diretamente do site do Governo Federal Brasileiro na 
página do Ministério da Saúde, traduzindo do inglês, burn significa queima e out exterior, ou 
seja, em análise podemos associar a um indivíduo que põe para fora, desencadeia as suas 
emoções até então adormecidas e acumuladas dentro de si por meio de ato(s) explosivo(s), em 
razão de seu esgotamento e cansaço mental relacionado ao trabalho Dessa forma, a Síndrome 
de Burnout ou “Síndrome do Esgotamento Profissional” trata-se de um distúrbio emocional 
com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico resultante de situações de 
trabalho desgastante, que demandam muita competitividade ou responsabilidade, tendo como 
principal causa da doença justamente o excesso de trabalho. Esta síndrome é comum em 
profissionais que atuam diariamente sob pressão e com responsabilidades constantes, como 
médicos, enfermeiros, professores, policiais, jornalistas, dentre outros. 
Em conexão aos princípios e análise perpetrados pelo filósofo sul-coreano Byung-Chul 
Han, em sua obra “Sociedade do Cansaço”, conforme debatido em tópico anterior, a Síndrome 
de Burnout está intimamente ligada a atual conjuntura de nossas relações sociais, direcionando-
se as tarefas no meio laboral. Isto pois, os sintomas do Burnout podem acontecer, também, 
quando o profissional, tomado pelo positivismo, excesso de otimismo e confiança lhe entregues, 
planeja ou é pautado para objetivos de trabalho muito difíceis e acaba por não conseguir atingi-
los ou finalizar as tarefas lhe imputadas, acreditando em sua falta de capacidade e 
incompetência. Tais situações somadas aos demais cenários pequenos e detalhistas, mas 
recorrentes, acrescidos a um ambiente de trabalho hostil e insalubre, acumulam-se dentro do 
próprio âmago do profissional na forma de inúmeros e confusos sentimentos, alojados e 
21 
 
escondidos, que ficam queimando-o e aguardando o momento para eclodir e libertar o interior 
daquele trabalhador de todo o esgotamento psíquico aglomerado dentro de si que estava lhe 
corroendo. 
No ano de 2013, antes de cogitarmos a possibilidade de um período pandêmico a nível 
mundial, o Ministério da Saúde realizou uma Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) visando apurar 
os índices de cometimento da população brasileira no que tange as doenças psíquicas. Os 
resultados mostraram que, naquele ano, 14,1 milhões de brasileiros se encontravam cometidos 
por algum transtorno ou sofrimento mental, dentre estes: depressão, ansiedade, estresse, 
Síndrome de Burnout, solidão conectada e dependência digital. 
À época, tais números já alarmavam e se mostravam significativos, contudo, em 
decorrência da pandemia mundial ocorrida em virtude do coronavírus, entre os anos de 2019 e 
2021, estes números cresceram de forma absurda e fumegante, tanto no Brasil quanto no 
mundo. Consoante dados apresentadospelo próprio Governo Federal, os problemas de saúde 
mental têm se tornado cada vez mais comuns em todo o mundo, como, por exemplo, a 
ansiedade, que atinge mais de 260 milhões de pessoas, sendo que o Brasil é o país com maior 
índice de pessoas ansiosas, ao passo que cerca de 9,3% da população sofre com esta 
psicopatologia, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Novos dados mostram que 
86% dos brasileiros sofrem com algum transtorno mental, como a ansiedade e a depressão. 
Por óbvio que a adaptação e a tomada de atitudes eram obrigatórias para que as nações 
pudessem transpassar a crise trazida pela Covid-19, em especial nas áreas da saúde e da 
economia, todavia, as consequências de tais condutas estão e irão ser suportadas por cada um 
de nós hoje e em longínquos anos futuros. 
As pessoas precisaram adotar um “novo estilo” de vida, precisaram se adaptar a 
permanecer em suas casas o dia inteiro, todos os dias, e nela realizar todas as suas atividades 
cotidianas e costumeiramente exercidas fora de suas residências. Passaram a trabalhar e estudar 
em suas casas, perdendo o contato diário com as demais pessoas, vendo-as somente 
virtualmente. Tiveram de despender do convívio integral com suas famílias, acomodando a 
rotina de cada um para encontrar hipóteses de não conglomeração de tarefas, sejam estas 
relacionadas ao trabalho, atividades domésticas, de cunho pessoal ou relacionadas aos estudos. 
De um lado, muitas práticas adotadas durante o estado pandêmico foram de bom agrado 
para o impulsionamento da tecnologia e do futuro das profissões em si, e irão permanecer de 
maneira positiva como gatilho para as relações sociais e laborais. Entretanto, impossível 
22 
 
mensurar o reflexo psíquico que este “novo estilo” de vida acarretou a cada ser humano que a 
ele teve que sucumbir. A pandemia, de certa forma, fez com que as doenças mentais e psíquicas 
ganhassem um protagonismo e fossem mais discutidas abertamente. A Síndrome de Burnout 
ganhou um impulso avassalador nos últimos anos, em especial, pelo fato das relações de 
trabalho serem inegavelmente um dos pilares atingidos durante a pandemia da Covid-19 e terem 
sofrido, neste estágio, um número enorme de mudanças e transformações. 
Sendo já denominada como o “novo” mal do século, como vimos, o Burnout não é uma 
psicopatologia recente, nem mesmo um gênero que pode ser aplicado livre e abertamente. Por 
certo, a Síndrome de Burnout é uma espécie de doença psíquica que está estritamente ligada as 
relações de trabalho, ao esgotamento e cansaço mental que o trabalhador tem de suportar 
diariamente, independentemente de sua classificação hierárquica. A intensidade é levada ao 
mais alto grau de desespero, interferindo em suas relações pessoais e em sua vida íntima e 
privada, ou seja, o que advém de seu trabalho prejudica sua vida privada e não ao contrário. 
Estamos vivendo em uma sociedade cansada, esgotada, tomada pelo excesso de 
informações e opiniões supérfluas, cobrada intensamente, paralisada pelo medo de não 
conseguir e que, ao mesmo tempo, é habitualmente compelida a acreditar nas exceções e na 
crença de que tudo é possível, basta apenas querer e ir atrás. A ausência de bom senso e 
percepção da realidade das coisas está nos transformando em uma sociedade de depressivos, 
fracassados, ansiosos e estressados, com indivíduos que terão de carregar sua pesada carga de 
derrotismo na alma pelo resto de suas vidas. 
 
3 SAÚDE MENTAL DOS TRABALHADORES NA ERA DIGITAL: IMERSÃO DO 
MUNDO VIRTUAL 
 
O Tribunal Superior do Trabalho (TST), já em período pós-pandémico, apresentou 
estatística muito importante através de matéria publicada em seu sítio eletrônico, demonstrando 
a mensuração de parte do impacto da turbulência mental gerada pela Covid-19, validando o 
aumento exponencial de benefícios previdenciários por doenças psíquicas e mentais concedidas 
no ano 2020. 
Dados fornecidos pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho apontam que, em 
2020, a concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez decorrente de transtornos 
mentais e comportamentais bateu recordes: foram mais de 576 mil afastamentos, uma alta de 
26% em relação ao ano de 2019. No caso do benefício de auxílio-doença, os afastamentos por 
motivos de psicopatologias como a depressão e a ansiedade registraram a maior alta entre as 
23 
 
principais doenças indicadas como razão para o pedido deste benefício, sendo que, o número 
de concessões passou de 213,2 mil, no ano de 2019, para 285,2 mil, no ano de 2020, com 
aumento de 33,7%. A duração média de afastamento do beneficiário, nos casos de 
psicopatologias, é de 196 dias. 
Importante dizer que o benefício auxílio-doença mencionado acima é aquele não 
relacionado a acidente ou doença de cunho ocupacional. 
Dentre os principais fatores determinantes para este crescimento, se encontram a 
inadaptação dos trabalhadores ao home office, o acúmulo de tarefas profissionais e domésticas, 
o endividamento, as incertezas sobre o futuro, a ansiedade, a depressão, a síndrome do pânico, 
dentre outros. 
O Comitê Gestor do Programa Trabalho Seguro da Justiça do Trabalho elenca entre as 
principais causas do surgimento ou da intensificação de problemas relacionados à saúde mental 
no ambiente de trabalho a exposição ao assédio moral e sexual, jornadas exaustivas, atividades 
estressantes, eventos traumáticos, discriminação, perseguição da chefia e metas abusivas. 
Entretanto, no período da pandemia, eles são acrescidos das mudanças decorrentes do 
teletrabalho, da sobrecarga de trabalho no setor de saúde e nos riscos diários a que se expõem 
homens e mulheres que precisam trabalhar presencialmente. 
A rápida adaptação imposta a todos os trabalhadores durante o período pandêmico 
alavancou uma nova realidade tecnológica nas relações de trabalho, a nível nacional e mundial. 
As comunicações, informações, interações e a própria presença física das pessoas se 
transformaram em modelo virtual, vindo a internet assumir um papel fundamental ao auxiliar 
na continuidade do convívio entre os indivíduos e nas prestações de serviços, bem como 
permitir a abertura de um conhecimento evolutivo, até então, total ou parcialmente 
desconhecido pelas pessoas. 
O que estamos presenciando atualmente na área tecnológica pode ter sido, de fato, algo 
novo ou, então, um impulsionar do que ainda estava por vir, mas que acabou sendo antecipado 
em razão das condições ora impostas pela pandemia da Covid-19. Independente desta resposta, 
resta claro que a estrutura das relações de trabalho nunca mais serão as mesmas. 
Estamos vivendo na conhecida Quarta Revolução Industrial – ou Indústria 4.0 –, um 
conceito extremamente amplo, que engloba a automação industrial e a integração de diferentes 
tecnologias, que visam, dentre seus objetivos, facilitar as tarefas cotidianas com a utilização das 
tecnologias, melhorar a eficiência e produtividade dos processos, e promover a digitalização 
24 
 
das atividades industriais. Nas palavras do engenheiro e economista alemão Klaus Martin 
Schwab, Fundador e Presidente Executivo do Fórum Econômico Mundial, ao envolver o tema 
em sua aclamada obra “A Quarta Evolução Industrial”: 
Imagine as possibilidades ilimitadas de bilhões de pessoas conectadas por dispositivos 
moveis, dando origem a um poder de processamento, recursos de armazenamento e acesso ao 
conhecimento sem precedentes. Ou imagine a assombrosa profusão de novidades tecnológicas 
que abrangem numerosas áreas: inteligência artificial, robótica, internet das coisas, veículos 
autônomos, impressão 3D, nanotecnologia, biotecnologia, ciência dos materiais, 
armazenamento de energia e computação quântica, para citar apenas algumas (SCHWAB, 
2016, p. 15). 
Essencial compreender que, assim como o mundo das atividades laborais, a própria 
sociedade está ingressando em um período vital de evolução de suas técnicas. As máquinas 
acabaram por se tornarimportantes em nossas vidas, de forma alguma para nos substituir ou 
tomar nosso lugar em determinada atividade, mas sim, para realização de tarefas repetitivas e 
fáceis, que se tornaram obsoletas. Nesta perspectiva, é alcançada ao indivíduo a oportunidade 
de dedicação a tarefa de maior complexidade técnica. O profissional do futuro será aquele que 
se adaptar à nova era digital a qual estamos vivenciando. 
Ora, mas ainda nem mesmo conseguimos nos adaptar ao mundo pós-pandemia, como 
iremos nos enquadrar ao mercado de trabalho em um futuro tomado pela incerteza de uma era 
ainda em construção? 
Esta indagação deve ser refletiva e analisada em conjunto com os dados mencionados 
no início deste tópico, que apontam o aumento torrencial na identificação de indivíduos, no 
Brasil, enfermos com alguma doença psíquica, entre os períodos anterior e posterior a pandemia 
do coronavírus, apurados através da base de concessões dos benefícios previdenciários de 
auxílio-doença e aposentadoria por invalidez. 
A saúde mental da sociedade como um todo foi extremamente afetada em razão da 
pandemia da Covid-19, ocorrida entre os anos de 2019 e 2021, contudo, a categoria que maior 
se destaca, sem qualquer dúvida que possa pairar, é a classe dos trabalhadores. 
Os regimes de teletrabalho e trabalho remoto impostos, bem como a obrigatoriedade de 
moldagem a esta nova estrutura, com todas as particularidades que lhe são advindas, por certo 
representam o cansaço excessivo demonstrados por aqueles que necessitaram permanecer no 
labor remotamente em suas residências. O acúmulo das tarefas laborais com as atividades de 
25 
 
cunho pessoal – muitas vezes, de caráter educacional aos filhos, vindo os pais a assumirem 
verdadeiros papéis de professores dentro de casa – certamente culminou ou, no mínimo, 
auxiliou a constituir o trabalhador depressivo e reflexivo sobre a sua própria vida e existência, 
com questionamentos aquém de seu saber e com sentimento de incapacidade, sensações 
características da Síndrome de Burnout. 
O retorno ao mercado de trabalho, seja presencialmente em período pós-pandêmico ou 
em forma de readaptação funcional, exigirá do trabalhador uma preparação a frente de suas 
capacidades atuais, impondo sua adequação ao novo mundo cibernético e tecnológico, com 
atualização momentânea de informações e postura limpa, inócua e de raciocínio rápido perante 
todas as situações. Infelizmente, não é esse o quadro geral vislumbrado atualmente no que tange 
aos trabalhadores brasileiros. 
À vista das ponderações ora aduzidas, está mais do que na hora do Estado atribuir a 
importância devida a causa em debate. É o momento de tornarmos real – finalmente – as 
doenças mentais, aquelas desacreditadas e esquecidas, que se proliferam dentro de cada um de 
nós, a nosso jeito singular e único de sentir e sofrer; e de reconhecermos o cansaço e o 
esgotamento mental dos trabalhadores. A classificação da Síndrome de Burnout como uma 
doença relacionada ao trabalho – objeto abordado no próximo tópico – é mais do que uma 
conquista, é uma demonstração de empatia pelo próximo, é conseguir enxergar além de si 
mesmo e compreender, mesmo que timidamente, o sentimento e a dor do outro. 
 
4 A SÍNDROME DE BURNOUT E SUA CONFIGURAÇÃO COMO DOENÇA DO 
TRABALHO 
 
Sui generis, a Síndrome de Burnout é uma espécie de distúrbio psicológico relacionado 
ao trabalho que afeta milhares de pessoas em todo o mundo. Encontra-se em grande crescimento 
e evidência, tornando-se cada vez mais conceituada ao lado de outras grandes e conhecidas 
doenças psíquicas recorrentes, como, por exemplo, a depressão, a ansiedade, o estresse 
generalizado e a síndrome do pânico. É caracterizada por uma sensação de esgotamento e 
exaustão emocional, despersonalização e redução do desempenho no trabalho, 
independentemente da profissão exercida e enquadramento na cadeia hierárquica, podendo 
fazer que o trabalhador sofra impactos significativos em sua saúde física e mental, 
transpassando os reflexos do cotidiano laboral para o caráter de sua vida pessoal e privada. 
26 
 
Diante desse cenário, a OMS classificou, em 1º de janeiro de 2022, a Síndrome de 
Burnout como uma doença ocupacional – a CID 11 – mediante seu enquadramento na 
Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde. 
Dentre as repercussões que esta decisão encadeia, primeiramente, de sorte, os 
trabalhadores diagnosticados passam a ter as mesmas garantias trabalhistas e previdenciárias 
previstas para as demais doenças do trabalho, ao passo que o reconhecimento do benefício por 
incapacidade laborativa em face de doença e/ou acidente do trabalho (B91) implica no advento 
de inúmeros direitos ao trabalhador, dentre estes: estabilidade de 12 meses quando do retorno 
ao trabalho – nos termos do artigo 118 da Lei nº. 8.213/91 –, depósitos fundiários durante o 
período que permaneceu em gozo do benefício previdenciário, mantença no plano de saúde da 
empresa para realização de seu tratamento e indenizações por parte da empresa. 
Em continuidade, há inferências, também, na seara cível, ao passo que a configuração e 
apuração do elemento culpa em lato sensu será subjetiva, devendo ser analisado e provado o 
tripé: dano, conduta ilícita e nexo causal. A responsabilidade do empregador e seu eventual 
dever de indenizar deverá ser enquadrado ao caso concreto, sendo de suma importância apontar 
que os ramos do direito trabalho e do direito previdenciário são independentes e autônomos e, 
ainda que possam vir a servir de auxílio um ao outro, suas decisões não são vinculadas, não 
possuem efeitos contraditórios ou formam coisa julgada ou litispendência em relação a seara 
diversa. 
Em que pese a decisão relativamente recente por parte da OMS em classificar a 
Síndrome de Burnout como uma doença ocupacional, os nossos tribunais trabalhistas já lidam 
com a temática há tempos, julgando em suas decisões casos concretos envolvendo esta 
psicopatologia. 
Em referência, no ano de 2017, nosso Egrégio TST publicou reportagem em seu sítio 
eletrônico abarcando o assunto, enfatizando acerca da importância de conscientização do tema 
e aplicando penalidade pecuniária exorbitante a empresa reclamada a título de danos morais, 
mediante o entendimento de caracterização de forte dano ao seu trabalhador, vítima da de 
Síndrome de Burnout. Vejamos trecho da reportagem: 
O HSBC Bank Brasil S.A. Banco Múltiplo foi condenado a pagar R$ 475 mil em 
indenização por danos morais a um ex-bancário que se aposentou aos 31 anos, vítima de 
síndrome de burnout. A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho desconsiderou o 
27 
 
argumento do banco de que o valor é “absolutamente exagerado” diante do caso, e negou 
provimento a seu recurso contra a condenação. 
A síndrome de burnout é um distúrbio psíquico resultante de tensão emocional e estresse 
crônicos provocados por condições de trabalho físicas, emocionais e psicológicas desgastantes. 
Segundo o processo, a partir de 1994, o ex-bancário passou a ser perseguido pelo seu 
superior hierárquico com práticas vexatórias e humilhantes, com uso de apelidos pejorativos, 
ameaças explícitas de demissão, cobranças excessivas, piadas de mau gosto e questionamentos 
quanto à sua sexualidade, entre outras. Afastado do trabalho por doença ocupacional em 2003, 
o empregado foi aposentado por invalidez dois anos depois. 
(...) O número do processo foi omitido para preservar a privacidade do trabalhador. 
(grifo nosso) 
Sem sombra de dúvidas, a Justiça do Trabalho, uma das pioneiras nos princípios 
protetivos aos trabalhadores hipossuficientes, se coloca desde os seus primórdios à disposição 
daqueles que a procuram, mediante decisões de cunho racional e voltados aos seus fundamentos 
basilares. Com a temática ora proposta não seria diferente, à medida que a aborda em seus 
julgamentos de maneira plena e congruente, primando pelo bem-estar,segurança e defesa 
daqueles que assumem os papeis dianteiros no avanço da economia do país através de sua mão 
de obra. 
Dentre os princípios destacados atualmente pela Justiça do Trabalho e vinculado 
diretamente como agente intensificador da Síndrome de Burnout, quando não observado, 
encontra-se o direito a desconexão. Os direitos fundamentais da pessoa humana estão 
intimamente ligados ao direito a desconexão, em especial, o direito à vida privada e a 
intimidade, elencados nos artigos 5°, inciso X, e 6° da CF/88. Tais premissas objetivam 
preservar o equilíbrio entre a vida profissional e a vida particular do indivíduo, sem qualquer 
pretensão danosa ao mercado de trabalho, porém sim, visando o resguardo do bem-estar 
humano e social (ALMEIDA, SILVA, 2023, p. 78-79). 
Em que pese os grandes avanços e as informações já disseminadas, ainda muitos 
trabalhadores temem a busca pela desconexão digital por temerem represálias e prejuízos em 
seu emprego, como a dispensa da empresa ou perca de possível promoção. Entretanto, o 
condicionamento desta espécie de pensamento somente retarda a necessidade de reabilitação do ser 
humano acometido pela síndrome, incluso seu desligamento pela empresa em tempo definido como 
28 
 
forma de contenção de danos, com a possibilidade de nova aparição de sintomas em trabalhador diverso 
substituto (ALMEIDA, SILVA, 2023, p. 80). 
Ante o exposto, destaca-se a importância efetiva das empresas e organizações 
trabalharem e adotarem práticas para o fornecimento de um ambiente de trabalho seguro, 
saudável e digno aos seus trabalhadores, garantindo que a carga de trabalho seja gerenciável e 
que haja tempo suficiente para descansar e se recuperar, garantindo, ainda, um equilíbrio entre 
o trabalho e a vida pessoal, de sorte, que o labor não se torne uma fonte de estresse constante. 
 
CONCLUSÃO 
 
A necessidade de nos desconectarmos deste encadeamento tecnológico perpetrado pela 
Indústria 4.0 e moldado por uma verdadeira rede integrada a todo momento e em todos os 
lugares, contendo informações em tempo real e sobre todos os assuntos, torna-se fundamental 
para a essência de nossa própria origem e para nosso descanso mental. 
Notadamente, houve assertiva por parte da OMS do reconhecimento da Síndrome de 
Burnout como uma doença ocupacional. Não obstante a mensuração teórica possível para o 
momento, as implicações efetivas serão vislumbradas prática e concretamente a posterior. O 
que resta de concreto é a conscientização da interdisciplinaridade da matéria, de sua importância 
fundamental e da certeza das consequências negativas para a saúde física e mental dos 
trabalhadores acaso não consideradas. Os reflexos podem ser singulares em primeira 
oportunidade, contudo, a máxima se expandirá a todas as relações econômicas e sistemas a ela 
agregados em segundo momento, desentoando na sociedade como um todo. 
 
REFERÊNCIAS 
 
ALMEIDA, Saulo Carvalho; SILVA, Ticianne Lourenço. Tecnologia e o novo mundo do 
trabalho: a síndrome de burnout e o necessário reconhecimento de um direito a desconexão 
laboral. Revista Eletrônica do TRT-PR. Curitiba: TRT-9ª Região, V. 12 n. 119, p. 67-87, Abr. 
2023. 
 
FOUCAULT, M. (1975). Vigiar e punir: história da violência nas prisões. Tradução brasileira 
de Raquel Ramalhete. 18ª edição – Petrópolis, RJ: Vozes, 1987. 
 
Governo Federal, Ministério da Educação. Disponível em: <https://www.gov.br/ebserh/pt-
br/comunicacao/noticias/acoes-realizadas-pela-rede-ebserh-mec-buscam-conscientizar-sobre-
a-importancia-da-saude-mental>. Acesso em: 24 set. 2023. 
 
https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/acoes-realizadas-pela-rede-ebserh-mec-buscam-conscientizar-sobre-a-importancia-da-saude-mental
https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/acoes-realizadas-pela-rede-ebserh-mec-buscam-conscientizar-sobre-a-importancia-da-saude-mental
https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/acoes-realizadas-pela-rede-ebserh-mec-buscam-conscientizar-sobre-a-importancia-da-saude-mental
29 
 
Governo Federal, Ministério da Saúde. Disponível em: <https://www.gov.br/saude/pt-
br/assuntos/saude-de-a-a-z/s/sindrome-de-burnout#:~:text=S%C3%ADndrome%20de%20Bur 
nout%20ou%20S%C3%ADndrome,demandam%20muita%20competitividade%20ou%20resp
onsabilidade>. Acesso em: 24.set.2023. 
 
Grupo Globo, Gente. Disponível em: <https://gente.globo.com/sociedade-do-cansaco/>. 
Acesso em: 24 set. 2023. 
 
HAN, Byung-Chul. Sociedade do cansaço. Tradução brasileira de Enio Paulo Gianechini. 2ª 
edição ampliada – Petrópolis, RJ: Vozes, 2017. 
 
Tribunal Superior do Trabalho (TST). Disponível em: <https://www.tst.jus.br/noticias/-
/asset_publisher/89Dk/content/id/27270562/pop_up>. Acesso em: 26 set. 2023. 
 
Tribunal Superior do Trabalho (TST), Notícias. Disponível em: <https://www.tst.jus.br/-
/mantida-indenizacao-a-bancario-aposentado-aos-31-anos-por-sindrome-de-burnout>. Acesso 
em: 28 set. 2023. 
 
Tribunal Superior do Trabalho (TST), Programa Trabalho Seguro: Programa Nacional de 
Prevenção de Acidentes de Trabalho. Disponível em: 
<https://www.tst.jus.br/web/trabalhoseguro>. Acesso em: 26 set. 2023. 
 
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 14ª edição, 
revisada e atualizada – São Paulo: Saraiva, 2013. 
 
SCHWAB, Klaus. A quarta revolução industrial. Tradução brasileira de Daniel Moreira 
Miranda. 1ª edição – São Paulo: Edipro, 2016. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/s/sindrome-de-burnout#:~:text=S%C3%ADndrome%20de%20Bur nout%20ou%20S%C3%ADndrome,demandam%20muita%20competitividade%20ou%20responsabilidade
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/s/sindrome-de-burnout#:~:text=S%C3%ADndrome%20de%20Bur nout%20ou%20S%C3%ADndrome,demandam%20muita%20competitividade%20ou%20responsabilidade
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/s/sindrome-de-burnout#:~:text=S%C3%ADndrome%20de%20Bur nout%20ou%20S%C3%ADndrome,demandam%20muita%20competitividade%20ou%20responsabilidade
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/s/sindrome-de-burnout#:~:text=S%C3%ADndrome%20de%20Bur nout%20ou%20S%C3%ADndrome,demandam%20muita%20competitividade%20ou%20responsabilidade
https://gente.globo.com/sociedade-do-cansaco/
https://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/id/27270562/pop_up
https://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/id/27270562/pop_up
https://www.tst.jus.br/-/mantida-indenizacao-a-bancario-aposentado-aos-31-anos-por-sindrom%20e-de-burnout#:~:text=Not%C3%ADcias%20do%20TST&text=A%20s%C3%ADndrome%20 de%20burnout%20%C3%A9,f%C3%ADsicas%2C%20emocionais%20e%20psicol%C3%B3gicas%20desgastantes
https://www.tst.jus.br/-/mantida-indenizacao-a-bancario-aposentado-aos-31-anos-por-sindrom%20e-de-burnout#:~:text=Not%C3%ADcias%20do%20TST&text=A%20s%C3%ADndrome%20 de%20burnout%20%C3%A9,f%C3%ADsicas%2C%20emocionais%20e%20psicol%C3%B3gicas%20desgastantes
https://www.tst.jus.br/web/trabalhoseguro
30 
 
DILEMAS ÉTICOS E JURÍDICOS NO ATENDIMENTO DE 
URGÊNCIA: PRIORIDADES E CONFLITOS NA PRÁTICA MÉDICA 
 
Anderson Fernandes de Borba1 
José Antônio Carrazzoni dos Reis Júnior2 
 
RESUMO 
O texto discute os desafios complexos enfrentados pelos profissionais de saúde em 
situações de urgências. Os dilemas éticos e jurídicos abordados, como a priorização de 
pacientes, riscos ocupacionais, carga de trabalho excessiva e escassez de recursos, ilustram a 
complexidade desse tipo de atendimento. É evidente que a tomada de decisões éticas e 
legalmente sólidas é fundamental nesse contexto. A capacitação ética e a orientação jurídica 
são ferramentas essenciais para profissionais de saúde, permitindo-lhes lidar com situações 
complexas enquanto protegem os direitos e o bem-estar dos pacientes. Além disso, destacamos 
a importância das políticas institucionais que promovam a ética no atendimento de urgência. 
Uma cultura organizacional que priorizea ética e o apoio psicológico adequado para os 
profissionais de saúde que enfrentam situações emocionalmente desafiadoras são cruciais para 
enfrentar esses dilemas de maneira responsável e compassiva. Em última análise, enfrentar 
esses dilemas é essencial para garantir que os pacientes recebam o atendimento adequado em 
situações delicadas de saúde, ao mesmo tempo em que protegemos os direitos e o bem-estar 
dos profissionais de saúde. Este estudo destaca a necessidade contínua de equilibrar a ética e a 
legalidade no atendimento de urgência, com a esperança de que uma abordagem consciente e 
responsável possa levar a resultados mais satisfatórios em momentos críticos. 
 
Palavras-chave: Saúde; Urgência; Ética; Riscos; Legislação. 
 
INTRODUÇÃO 
A área da saúde é inegavelmente um campo de complexidades e desafios constantes, 
onde os profissionais dedicam suas vidas à preservação da saúde e ao bem-estar dos indivíduos. 
No bojo dessa responsabilidade encontra-se o atendimento de urgência. Essa é uma função 
determinante que opera na fronteira entre a vida e a morte, entre a decisão e a ação imediata. 
Quando nos deparamos com a necessidade urgente de assistência médica, a extrema relevância 
desse serviço torna-se evidente, pois é um momento em que cada segundo conta e cada escolha 
pode ter implicações duradouras. 
 
1 Advogado. OAB/RS 75.077. Graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do 
Rio Grande do Sul. Pós-graduado em Direito Penal Empresarial. E-mail:anderson.borba@outlook.com. 
2 Advogado. OAB/RS 61.862. Pós-graduado em Direito Médico e da Saúde. Membro da Comissão Especial da 
Saúde da OAB/RS. E-mail: josecarrazzonijr@gmail.com. 
31 
 
Nesse contexto, os profissionais de saúde são frequentemente confrontados com dilemas 
éticos e jurídicos que transcenderam as fronteiras do simples diagnóstico e tratamento. A 
agilidade requerida para salvar vidas muitas vezes exige decisões rápidas e cruciais, envolvendo 
escolhas que podem ser moldadas por diferentes fatores, como recursos limitados, gravidade 
do quadro clínico, valores pessoais do paciente e familiares, além das normas regulatórias que 
norteiam a prática médica. O tensionamento entre agir com celeridade e agir com precisão ética 
se estabelece como uma constante preocupação para aqueles que se dedicam a esse campo. 
Este estudo se concentra em explorar e analisar os dilemas éticos e jurídicos que surgem 
no cenário de atendimento de urgência, abordando questões críticas como a priorização de 
pacientes, riscos ocupacionais, carga de trabalho extenuante e escassez de recursos. Cada um 
desses desafios representa um dilema delicado que requer uma abordagem cuidadosa e ética. 
A priorização de pacientes, por exemplo, impõe aos médicos a tarefa angustiante de 
decidir quem recebe atendimento imediato. Esta é uma decisão que não apenas impacta a vida 
dos pacientes, mas também coloca os profissionais de saúde em uma posição de extrema 
responsabilidade, tanto do ponto de vista ético quanto jurídico. 
Além disso, a carga de trabalho esmagadora e a exaustão associada a ela podem 
comprometer a qualidade do atendimento, criando um conflito entre o dever de cuidar dos 
pacientes e o autocuidado dos profissionais de saúde. Esses desafios podem ser agravados pela 
escassez de recursos, que pode levar a decisões difíceis sobre como agir de forma justa e ética. 
No âmbito dessas questões, os conflitos de valores e crenças entre profissionais de saúde 
e pacientes podem surgir, destacando a importância da comunicação eficaz e do respeito às 
escolhas individuais. A responsabilidade legal e o registro adequado também são cruciais para 
proteger os direitos e interesses de todas as partes envolvidas. 
Este estudo busca não apenas identificar esses dilemas, mas também enfatizar a 
necessidade de capacitação ética e orientação jurídica para profissionais de saúde, bem como 
políticas institucionais que promovam a ética no atendimento de urgência. Além disso, 
reconhecemos a importância do apoio psicológico adequado para profissionais de saúde que 
enfrentam situações emocionalmente desafiadoras. Em última análise, a abordagem 
responsável e compassiva desses dilemas é fundamental para garantir o melhor atendimento 
possível em momentos críticos de saúde. 
 
 
32 
 
1 PRIORIZAÇÃO DE PACIENTES: O CONFLITO DA ESCOLHA 
 
A priorização de pacientes em situações de emergência é um dilema ético que confronta 
constantemente médicos e demais profissionais de saúde. A decisão sobre quem receberá 
atendimento prioritário, em um ambiente, que, muitas vezes, apresenta quantidade limitada ou 
insuficiente de recursos disponíveis para atender às necessidades, é uma questão complexa que 
levanta preocupações fundamentais sobre equidade e justiça na distribuição de cuidados 
médicos. A partir desse ponto vamos explorar minuciosamente os intricados desafios éticos que 
permeiam o processo da tomada de decisões cruciais associadas à priorização de pacientes, a 
partir da ótica do médico, e, ao mesmo tempo, instigar uma profunda reflexão acerca do 
delicado equilíbrio necessário entre as demandas individuais e as restrições sistêmicas que 
caracterizam esse contexto. 
Para os médicos, a priorização de pacientes em situações de emergência é uma 
responsabilidade frequentemente angustiante. A necessidade de tomar decisões rápidas e 
precisas, muitas vezes com informações limitadas, pode ser avassaladora. Além disso, essas 
decisões podem afetar profundamente a vida e o bem-estar dos pacientes, bem como gerar um 
peso emocional significativo para os profissionais. 
É importante não perder de concepção, conforme estabelecido no Código de Ética 
Médica, no Capítulo I, dos Princípios Fundamentais que: 
II - O alvo de toda a atenção do médico é a saúde do ser humano, em benefício da 
qual deverá agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade profissional. 
III - Para exercer a medicina com honra e dignidade, o médico necessita ter boas 
condições de trabalho e ser remunerado de forma justa. 
 
Para que isso ocorra os médicos são treinados para fornecer cuidados de saúde com base 
em princípios éticos, incluindo a equidade e a justiça. No entanto, em situações de meios 
restritos, esses princípios podem ser testados ao máximo. Os médicos devem equilibrar a 
necessidade de tratar todos os pacientes com a realidade dos meios disponíveis. 
Essa perspectiva pode ser muito bem ilustrada pela Resolução CFM nº 2.156/2016, 
emitida pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que fornece diretrizes específicas para a 
priorização de admissão na unidade de tratamento intensivo (UTI). Essa resolução estabelece 
critérios claros com base na condição clínica dos pacientes, probabilidade de recuperação e 
limitações terapêuticas. Esses parâmetros fornecem um guia importante para a tomada de 
decisões éticas sobre a alocação de meios limitados. 
33 
 
Além disso, a Resolução CFM nº 2.110/2014, que dispõe sobre a normatização do 
funcionamento dos Serviços Pré-Hospitalares Móveis de Urgência e Emergência em todo o 
território nacional, enfatiza a importância de priorizar os atendimentos primários em domicílio, 
ambiente público ou via pública, por ordem de complexidade. O Artigo 5º dessa resolução 
declara: 
Art. 5º. O serviço pré-hospitalar móvel de urgência e emergência deve, 
obrigatoriamente, priorizar os atendimentos primários em domicílio, ambiente 
público ou via pública, por ordem de complexidade, e não a transferência de pacientes 
na rede. 
 
Quando questionado sobre “Qual a melhor conduta a ser tomada referente a sobrecarga 
de atendimento de médicos plantonistas em um pronto-atendimento e pronto-socorro”, o 
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo expediu a Consulta nº 124.524/06, 
garantindo que: 
Há que se ter claro que cabe à direção prever todosos meios necessários para que não 
ocorram situações de risco aos pacientes que buscam o pronto-socorro. Pode ser 
indicado um médico, o mais experiente da equipe, o mais preparado, proceder à 
triagem, selecionando os casos com prioridade e encaminhando os demais que possam 
ser atendidos em outros serviços. 
 
É importante considerar também que comunicar as decisões de priorização aos pacientes 
e seus familiares é uma etapa crítica e sensível no processo de cuidados médicos em situações 
de emergência. Quando a necessidade de tomar decisões difíceis se torna imperativa, médicos 
enfrentam o desafio de equilibrar a necessidade de transparência com a delicadeza necessária 
para não aumentar o sofrimento emocional dos envolvidos. 
A falta de uma estrutura adequada, ou ainda equipamentos médicos essenciais e até 
mesmo profissionais de saúde disponíveis, pode levar a decisões que afetarão diretamente a 
vida dos pacientes e seus acompanhantes. Nesses momentos críticos, é fundamental que os 
médicos comuniquem essas decisões de maneira empática e compassiva. Isso significa não 
apenas fornecer informações sobre as decisões tomadas, mas também criar um espaço para 
ouvir as preocupações e dúvidas dos pacientes e de seus familiares. 
Destaca-se que o Código de Ética Médica, no capítulo que trata da relação com pacientes 
e familiares, proíbe ao médico: 
Art. 34. Deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os 
objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, 
devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal. 
 
34 
 
A priorização de pacientes em situações de emergência, sob a ótica do médico, é um 
dilema ético que demanda uma combinação de julgamento clínico, princípios éticos e a 
orientação de diretrizes advindas do Código de Ética Médica e demais resoluções. Médicos 
diariamente enfrentam a difícil tarefa de tomar decisões críticas em momentos de capacidades 
limitadas, com o objetivo de fornecer cuidados de saúde de qualidade. Estabelecer critérios 
claros, transparentes e objetivos, bem como garantir a comunicação eficaz com os pacientes e 
suas famílias, são passos fundamentais para enfrentar esse desafio ético de maneira mais justa 
e equitativa. 
2 RISCOS OCUPACIONAIS E PROTEÇÃO DOS PROFISSIONAIS DE SAÚDE 
 
No âmbito das urgências médicas, a dedicação inabalável dos profissionais de saúde em 
fornecer assistência imediata muitas vezes os coloca diante de uma série de riscos ocupacionais 
complexos e desafiadores. O ambiente do atendimento de urgência é caracterizado pelo ritmo 
acelerado, imprevisibilidade das demandas e a necessidade da adoção de decisões rápidas e 
precisas. Nesse cenário, os profissionais enfrentam uma gama diversificada de perigos, que 
variam desde exposição a doenças altamente contagiosas até riscos físicos decorrentes de 
procedimentos médicos invasivos. 
O atendimento de urgência coloca os profissionais de saúde em contato direto com 
pacientes que frequentemente chegam com condições médicas graves e muitas vezes 
desconhecidas. A exposição a patógenos infecciosos, vírus emergentes, bactérias resistentes e 
outras doenças transmissíveis, é um risco inerente a esse serviço. Mesmo em se tratando de 
procedimentos de reanimação, administração de medicamentos e realização de cirurgias de 
emergência, tais intervenções médicas envolvem desafios físicos que colocam em risco a saúde 
dos profissionais. 
A legislação brasileira concernente à saúde e segurança no ambiente de trabalho 
apresenta uma estrutura escalonada, abrangendo diversos níveis de regulamentação para 
assegurar um ambiente laboral seguro e saudável. Essa base legal é inaugurada em linhas gerais 
pela Constituição Federal, já a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) adiciona detalhes 
específicos, delineando responsabilidades e direitos tanto para empregados quanto para 
empregadores. Complementando essa estrutura, as Normas Regulamentadoras (NRs), como a 
NR-32, definem padrões mais específicos e adaptados a setores particulares, como os serviços 
de saúde, onde os riscos podem ser distintos. Paralelamente, a Lei nº 8.080/1990 amplia a 
perspectiva ao enfatizar a colaboração entre os sistemas de saúde e trabalho para a promoção, 
35 
 
proteção e recuperação da saúde em geral. Essa abordagem estruturada reflete o compromisso 
do ordenamento em garantir um ambiente de trabalho seguro e saudável, levando em 
consideração os princípios constitucionais e adaptando-os às necessidades específicas de 
diversos setores e trabalhadores. 
Estabelecendo um ponto de partida legal, a Constituição Federal (CF) institui princípios 
e diretrizes relacionados à saúde e segurança dos trabalhadores, incluindo, obviamente, os 
profissionais de saúde que atuam em situações de urgência. A disposição constitucional mais 
relevante encontra-se insculpida no Artigo 7º, inciso XXII, CF, referindo que são direitos dos 
trabalhadores urbanos, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, a “redução 
dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança”. 
O Artigo 196 da Constituição Federal é um dos principais balizadores, dispondo que a 
“saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas 
que visem à redução do risco de doença e de outros agravos, bem como ao acesso universal e 
igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.” 
Torna-se evidente que a proteção da saúde e da segurança dos profissionais que atuam 
em situações de urgência na área da saúde não é apenas uma questão regulatória, mas também 
um imperativo constitucional. A preservação da saúde desses profissionais não só reflete o 
respeito pelos princípios fundamentais da Carta Magna, mas também é essencial para garantir 
a qualidade e a eficácia dos serviços de atendimento de urgência, reforçando a relevância 
contínua de medidas que assegurem um ambiente de trabalho seguro e saudável para esses 
dedicados profissionais. 
Ressaltando com clareza a abrangência das responsabilidades do Sistema Único de 
Saúde (SUS), o Artigo 200, Inciso VIII, CF, estabelece a sua competência em colaborar na 
proteção do meio ambiente, incluindo o ambiente de trabalho. Através desse dispositivo, 
reconhece-se a conexão intrínseca entre a saúde dos trabalhadores e a preservação do ambiente 
em que eles desempenham suas atividades. A disposição constitucional reflete a importância 
da criação de um ambiente laboral seguro e saudável, onde os profissionais possam realizar 
suas funções sem estarem expostos a riscos ocupacionais prejudiciais. Ao considerar o meio 
ambiente do trabalho como parte integrante de sua missão, o SUS reafirma seu compromisso 
em assegurar não apenas o bem-estar dos indivíduos, mas também a promoção da saúde em um 
sentido mais amplo, abordando as condições nas quais o trabalho é executado. 
36 
 
A Norma Regulamentadora 32 (NR-32) é especialmente relevante para os profissionais 
de saúde, porque ela estabelece diretrizes para a segurança e saúde no trabalho em serviços de 
saúde, incluindo ambientes hospitalares e de atendimento médico. A NR-32 aborda diversos 
aspectos relacionados à proteção dos profissionais de saúde, como: (a) a obrigatoriedade do 
fornecimento, uso e treinamento relacionado aos equipamentos de proteção individual (EPIs) 
adequados para os riscos presentes nos ambientes de saúde; (b) medidas para prevenir a 
exposição a agentes biológicos, como vírus, bactérias e outros patógenos presentes em 
ambientes de saúde; (c) adoção de medidas para evitar acidentes com objetos perfurocortantes, 
como agulhas e bisturis; (d) implementação do Programa de Prevenção de Riscos Ambientais 
(PPRA), que é voltado para a identificação, avaliação e controle de riscos ambientais presentes 
nos locais de trabalho; e, (e) adoção do Programa de Controle Médico deSaúde Ocupacional 
(PCMSO) é outro programa obrigatório que visa a promoção e preservação da saúde dos 
trabalhadores, incluindo exames médicos específicos para os riscos ocupacionais enfrentados 
pelos profissionais de saúde. 
Por seu turno, a Lei nº 8.080/1990, que dispõe sobre as condições para a promoção, 
proteção e recuperação da saúde no Brasil, não trata especificamente da segurança do trabalho 
de forma detalhada como faz a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) ou as Normas 
Regulamentadoras (NRs). No entanto, mesmo que não aborde diretamente sobre segurança do 
trabalho, é importante notar que ela contribui para um ambiente de trabalho mais seguro de 
maneira indireta. Isso porque a lei enfatiza a importância da promoção da saúde, proteção contra 
riscos à saúde e recuperação das condições de bem-estar. Portanto, ela pode ser interpretada 
como um suporte para políticas e ações que visam à melhoria das condições de trabalho em 
geral, inclusive a segurança do trabalho. 
Para assegurar a segurança e proteção dos profissionais de saúde no atendimento de 
urgência, uma abordagem multifacetada é essencial. A implementação de protocolos rigorosos 
de higiene e prevenção de infecções é um passo crucial para minimizar a exposição a patógenos. 
Isso inclui o uso adequado de EPIs, como luvas, máscaras, aventais e óculos de proteção. Além 
disso, a formação contínua acerca das medidas de segurança, manejo em situações de alto risco 
e técnicas de comunicação eficazes em momentos críticos são componentes essenciais para a 
preparação de profissionais de saúde para lidar com situações críticas. 
Outra abordagem importante envolve a criação de ambientes de trabalho seguros e 
saudáveis. Isso inclui a disponibilização de instalações adequadas, equipamentos de alta 
qualidade e sistemas de suporte, inclusive psicológico, para lidar com o estresse e o trauma 
37 
 
associados ao atendimento de urgência. Além disso, a legislação e as políticas públicas devem 
ser revistas e atualizadas regularmente para garantir que os direitos e a segurança dos 
profissionais de saúde sejam devidamente reconhecidos e protegidos. 
Não se pode ignorar que os profissionais de saúde que atuam em situações de urgência 
enfrentam riscos ocupacionais significativos que podem afetar a saúde física e mental. A análise 
cuidadosa desses riscos e a implementação de medidas de proteção adequadas são fundamentais 
para assegurar que esses profissionais possam exercer seu papel crucial na prestação de 
cuidados de emergência, mantendo sua segurança e bem-estar como prioridade. 
 
3 CARGA DE TRABALHO E EXAUSTÃO: O IMPACTO NA QUALIDADE DO 
ATENDIMENTO 
Segundo os dados do relatório “Diretrizes sobre Saúde Mental no Trabalho”, publicado 
pela Organização Mundial da Saúde (OMS), em setembro de 2022, estima-se que 12 bilhões de 
dias de trabalho são perdidos anualmente por causa da depressão e da ansiedade, custando à 
economia mundial quase 1 trilhão de dólares. No Brasil, de acordo com o Instituto Nacional de 
Seguro Social (INSS), 209.124 mil pessoas foram afastadas do trabalho por transtornos mentais, 
entre depressão, distúrbios emocionais e Alzheimer em 2022. 
As diretrizes da OMS e da OIT apresentam dez fatores de risco para saúde mental, tais 
como: conteúdo do trabalho/desenho da tarefa, carga e ritmo de trabalho, horário de trabalho, 
baixa participação nas decisões relativas ao trabalho, adequação de ambiente e equipamentos, 
cultura e função organizacional, relações interpessoais no trabalho, papel na organização, 
preocupações com o desenvolvimento da carreira e questões relativas à interface casa-trabalho. 
O “Informe Mundial de Saúde Mental: transformar a saúde mental para todos”, 
publicado em junho de 2022 pela OMS, demonstra que transtornos mentais são a principal 
causa de incapacidade e causam um em cada seis anos vividos com incapacidade. Pessoas com 
condições graves de saúde mental morrem em média 10 a 20 anos mais cedo que a população 
em geral, especialmente devido a doenças físicas evitáveis. Ainda segundo o relatório, 15% dos 
adultos vivem com algum transtorno mental, como depressão e ansiedade. 
O aprofundamento no estudo das consequências ao psíquico dos trabalhadores, geradas 
pelos estressores, resulta no surgimento do termo burnout, designando aquilo que deixou de 
funcionar por exaustão energética, expresso por meio de um sentimento de fracasso causado 
por um excessivo desgaste de energia e recursos. A síndrome de Burnout instala-se quando 
38 
 
situações de enfrentamento do estresse profissional prolongado e crônico não foram utilizadas, 
falharam ou não foram suficientes (MENZANI, 2006; MUROFUSE; ABRANCHES; 
NAPOLEÃO, 2005). 
O Ministério da Saúde descreve a síndrome de burnout, também conhecida como 
síndrome do esgotamento profissional, como um distúrbio emocional com sintomas de exaustão 
estrema, estresse e esgotamento físico resultante de situações de trabalho desgastante, que 
demandam muita competitividade ou responsabilidade. 
Ao definir esta síndrome (SCHMIDT; DANTAS,2006) relatam que ela se caracteriza 
por três diferentes componentes: exaustão emocional, despersonalização e ausência de 
realização profissional e que acomete, geralmente, os profissionais que trabalham em contato 
direto com pessoas como os trabalhadores da saúde. Atualmente, o conceito de burnout é 
considerado um dos desdobramentos mais importantes do estresse ocupacional. 
Segundo o relatório “Demografia Médica no Brasil – 2023”, especialmente no período 
de pandemia, houve considerável aumento da demanda no atendimento de casos agudos, 
cuidados intensivos e de emergência, somado à necessidade de realizar triagem, testagem e 
vigilância, além de garantir atendimentos essenciais não associados à covid-19 (SCHEFFER, 
2023). Deste modo, profissionais de saúde, médicos dentre eles, foram submetidos a condições 
inadequadas de trabalho, falta de equipamento de proteção e longas jornadas de trabalho, 
aumentando os riscos à saúde e à vida (DAL POZ; SCHEFFER, 2022). 
No mesmo sentido, foram relatadas práticas de jornadas excessivas dos residentes, 
problema que precisa ser contornado, pois investigações já demonstraram relação direta entre 
alta carga horária e má qualidade de vida, podendo contribuir para maior incidência de burnout, 
estresse, depressão e fadiga (SCHEFFER, 2023). 
Como se vê, o trabalho desenvolvido pelos profissionais da saúde, por sua própria 
natureza e características, se revela especialmente suscetível ao fenômeno do estresse 
ocupacional. O ambiente hospitalar destaca-se como importante fonte geradora de estresse, 
merecendo especial destaque as unidades de urgência e emergência, permeadas de situações 
que envolvem conflitos e tensões passíveis de gerarem estresse, intimamente ligadas ao número 
de atendimentos excedente à capacidade da unidade de saúde. 
Além do mais, são exigidos dos profissionais de saúde conhecimentos técnicos, 
científicos, habilidades e competências que devem se expressar em respostas rápidas. Uma 
equipe que atua em emergência se depara com inúmeras situações, podendo estas ser 
39 
 
desencadeadoras tanto de satisfação, quanto de frustração, sofrimento, impotência, dentre 
outros. 
Ao cuidar de pessoas que em muitas situações estão em risco iminente de morte, onde 
a assistência requer respostas rápidas e imediatas da equipe e qualquer erro pode implicar na 
morte do paciente, acaba por desencadear comportamentos inadequados à saúde dos 
profissionais, como, por exemplo, posturas ergonomicamente inadequadas e tensão emocional. 
A sobrecarga de trabalho não acontece exclusivamente pelo excesso de horas de 
trabalho, mas sim às condições inerentes ao exercício do trabalho, como carga horária 
excessiva, falta de funcionários e recursos materiais, além da falta de suporte profissional e 
emocional, sendo também necessário considerar que as atividades desenvolvidas poresses 
profissionais exigem intensamente habilidades emocionais e cognitivas que contribuem para 
seu desgaste. 
Ainda que previsto em lei, é perceptível que nem sempre tem sido assegurada a proteção 
e promoção da saúde para o profissional em seu ambiente de trabalho. 
A relação do profissional com o trabalho constitui fator importante na apresentação de 
morbidades que podem estar associadas a este trabalho. Nessa perspectiva destaca-se o estresse 
ocupacional como fator marcante de desgaste mental e físico podendo interferir diretamente na 
qualidade de vida do trabalhador a na qualidade dos serviços prestados (SILVEIRA; STUMM; 
KIRCHNER, 2009; MENDES; BORGES; FERREIRA, 2002). 
Portanto, a fim de garantir a segurança dos pacientes, é imprescindível pensar na saúde 
dos profissionais, visando melhores condições de trabalho e, especialmente, redução da sua 
sobrecarga, pois, esgotados, apáticos e dominados pelo estresse, os profissionais da saúde 
repercutem na má qualidade de assistência à população. 
4 ESCASSEZ DE RECURSOS E ALOCAÇÃO ADEQUADA 
No contexto dos atendimentos de urgência a temática da escassez de recursos e alocação 
adequada apresenta um cenário complexo e desafiador no âmbito da medicina de emergência. 
Em situações críticas, como acidentes em larga escala, surtos de doenças ou desastres naturais, 
os profissionais de saúde muitas vezes se deparam com a dura tarefa de tomar decisões difíceis 
e éticas sobre a distribuição de meios restritos, como equipamentos médicos, leitos hospitalares 
e até mesmo a disponibilidade de profissionais capacitados. 
40 
 
Nessa conjuntura, as questões éticas emergem de forma proeminente. A distribuição 
justa e equitativa dos recursos se confronta com o princípio de igualdade no tratamento dos 
pacientes. Profissionais de saúde podem se encontrar em uma encruzilhada, onde a necessidade 
de salvar vidas e priorizar os casos mais graves se choca com a realidade de que nem todos os 
pacientes podem ser atendidos da mesma forma. O debate sobre quem deve receber tratamento 
imediato e quem pode esperar pode gerar tensões e dilemas éticos profundos. 
Além disso, os aspectos jurídicos também vêm à tona nesse contexto. A legislação em 
saúde muitas vezes garante a igualdade de acesso aos cuidados médicos, mas em situações de 
dificuldades, a aplicação prática da lei é um desafio. Decisões sob pressão podem 
potencialmente gerar litígios legais, levantando questões sobre a possível violação dos direitos 
dos pacientes ou a discriminação no tratamento. 
Importa ressaltar que a Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre as 
condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento 
dos serviços correspondentes e dá outras providências, assegura que 
Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou 
conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de 
acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo 
ainda aos seguintes princípios: 
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência; 
II - integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das 
ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada 
caso em todos os níveis de complexidade do sistema; 
III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral; 
IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer 
espécie; 
 
Convém mencionar a existência da prerrogativa da chamada "vaga zero", que é um 
recurso essencial estabelecido pela Resolução CFM nº 2.077/14 para garantir acesso imediato 
a pacientes em risco de morte ou que estejam enfrentando sofrimento intenso nos Serviços 
Hospitalares de Urgência e Emergência. No entanto, é importante ressaltar que essa aplicação 
deve ser considerada uma exceção e não uma prática cotidiana na assistência de urgência. A 
prerrogativa de encaminhar pacientes como "vaga zero" é exclusiva dos médicos reguladores 
de urgências, que têm a responsabilidade de tentar estabelecer contato telefônico com o médico 
no hospital de referência, detalhando o quadro clínico do paciente e justificando a necessidade 
do encaminhamento. 
Em situações de remoção de pacientes para hospitais em regime de "vaga zero", as 
informações detalhadas sobre o estado clínico do paciente devem ser enviadas pelo médico 
41 
 
solicitante do serviço de origem. Quando a "vaga zero" é utilizada em um Serviço Hospitalar 
de Urgência e Emergência superlotado ou que não possui capacidade técnica para continuar o 
tratamento, cabe à equipe médica receptora estabilizar o paciente, e após a obtenção das 
condições clínicas adequadas para a transferência, a equipe médica deve comunicar o fato à 
regulação, solicitando o encaminhamento. Nesse cenário, a responsabilidade do gestor público 
persiste na obtenção de vagas para a continuidade do tratamento, podendo envolver até a 
compra de leitos, conforme estipulado pela legislação vigente. 
Para abordar esses desafios, os profissionais de saúde e os legisladores devem colaborar 
para estabelecer diretrizes claras e transparentes para a alocação de recursos em situações de 
emergência. O desenvolvimento de protocolos baseados em princípios éticos sólidos e em 
consonância com a legislação é fundamental para garantir que as decisões sejam tomadas de 
maneira justa e imparcial. Além disso, a educação contínua dos profissionais de saúde sobre 
questões éticas e legais relacionadas à escassez de recursos é essencial para prepará-los para 
lidar com essas situações complexas. 
Em última análise, a escassez de recursos e a alocação adequada são enfrentamentos 
inerentes ao atendimento de urgência e exigem uma abordagem sensível e equilibrada. A 
reflexão ética profunda e o entendimento das implicações jurídicas são cruciais para enfrentar 
esses dilemas complexos, garantindo ao mesmo tempo a prestação de cuidados médicos de 
qualidade e a proteção dos direitos dos pacientes. 
5 CONFLITOS DE VALORES E CRENÇAS 
Conflitos de valores e crenças no contexto médico são situações complexas que 
frequentemente desafiam os profissionais de saúde. Tais conflitos surgem quando os valores e 
crenças dos pacientes divergem dos padrões éticos e médicos estabelecidos, o que pode criar 
dilemas éticos significativos. Neste cenário, é essencial considerar a importância do respeito à 
autonomia do paciente e a busca por soluções conciliatórias que atendam tanto às necessidades 
do paciente quanto aos princípios éticos da medicina. 
A autonomia do paciente é um princípio essencial na ética médica que desempenha um 
papel crucial na resolução de conflitos de valores e crenças. Respeitar a capacidade de decisão 
do paciente, desde que esteja bem informado, é fundamental para garantir que as escolhas 
médicas sejam congruentes com os valores e crenças do paciente, sempre que possível. Isso 
exige uma abordagem ética e sensível, bem como uma comunicação aberta e empática entre 
médicos e pacientes. 
42 
 
Sobre isso, o Código de Ética Médica, assegura como princípio fundamental que: 
XXI - No processo de tomada de decisões profissionais, de acordo com seus ditames 
de consciência e as previsões legais, o médico aceitará as escolhas de seus pacientes 
relativas aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos por eles expressos, desde que 
adequadas ao caso e cientificamente reconhecidas. 
 
Para enfrentar adequadamente, ou mitigar os conflitos de valores e crenças, é essencial 
que médicos e profissionais de saúde compreendam as razões por trás das divergências. Isso 
requer uma comunicação aberta e empática com o paciente, permitindo que eles expressem suas 
preocupações e convicções pessoais. A compreensão das divergências de valores e crenças no 
contexto da saúde é um processo multifacetadoque exige comunicação aberta, empatia e 
consideração cuidadosa. Essa compreensão é um passo crucial para o encaminhamento de 
soluções éticas que equilibrem a autonomia do paciente com as responsabilidades éticas e legais 
dos médicos. À medida que os profissionais de saúde se esforçam para compreender as 
perspectivas dos pacientes, eles podem promover uma relação de confiança que beneficia tanto 
o paciente quanto a qualidade dos cuidados de saúde fornecidos. 
Na Resolução CFM nº 2.144/2016 observa-se um exemplo prático, na realização de 
cesarianas a pedido das gestantes: 
Art.1º– É direito da gestante, nas situações eletivas, optar pela realização de cesariana, 
garantida por sua autonomia, desde que tenha recebido todas as informações deforma 
pormenorizada sobre o parto vaginal e cesariana, seus respectivos benefícios e riscos. 
Uma parte essencial da gestão de conflitos de valores e crenças é a busca por alternativas 
que visem soluções conciliatórias. Os médicos podem trabalhar em conjunto com os pacientes 
para encontrar um equilíbrio que permita atender às necessidades clínicas enquanto também 
respeitam as crenças do paciente. 
Em última análise, a capacidade de abordar conflitos de valores e crenças no contexto 
assistencial reflete o compromisso com a entrega de cuidados de saúde de alta qualidade, que 
respeita a individualidade e os direitos dos pacientes. Reconhecer a complexidade desses 
desafios e adotar uma abordagem sensível e cuidadosa é fundamental para encontrar um 
equilíbrio ético entre a autonomia do paciente e os princípios da prática médica. Isso assegura 
que os cuidados de saúde prestados sejam não apenas eficazes clinicamente, mas também éticos 
e respeitosos com as convicções e valores dos pacientes. 
 
 
 
43 
 
6 RESPONSABILIDADE LEGAL E REGISTRO ADEQUADO 
 
O registro das informações é uma das diversas atividades diárias dos profissionais da 
saúde, quando envolvidos na assistência ao paciente. Assim sendo, o estabelecimento de uma 
boa relação com o paciente pode prevenir que o profissional da saúde seja acionado 
judicialmente por algum problema ocorrido durante o atendimento ou tratamento. 
Todavia, não somente o prontuário devidamente preenchido é imprescindível no vínculo 
profissional-paciente, uma vez que conterá informações de interesse para ambas as partes, mas 
especialmente o termo de consentimento informado que expressará a autorização do paciente 
para a realização do respectivo procedimento de saúde. 
Enquanto o prontuário é a coleção de informação relativa ao estado de saúde de um 
paciente, armazenada e transmitida em completa segurança e acessível ao paciente e a qualquer 
usuário autorizado (GALVÃO; RICARTE, 2012), o Consentimento Informado é a autorização 
do paciente obtida pelo profissional para a realização de procedimento médico de indiscutível 
necessidade. É condição indispensável da relação médico-paciente contemporânea. Trata-se de 
uma decisão voluntária, verbal ou escrita, protagonizada por uma pessoa autônoma e capaz, 
tomada após processo informativo, para aceitação de um tratamento específico consciente dos 
seus riscos, benefícios e possíveis consequências (BRANDÃO, 1999). 
O processo informativo seguido do consentimento do paciente vem de encontro à 
hierarquia que historicamente marcou a área da saúde, especialmente a medicina. Dessa forma, 
o poder técnico que se refletia na decisão do profissional sobre a saúde do paciente passa a ser 
substituído por um crescente respeito à autonomia individual. 
No entanto, a percepção dos profissionais da saúde sobre a responsabilidade civil e 
profissional tem aumentado a partir da incidência de inúmeros processos judiciais e 
administrativos. Reformas na Constituição Federal de 1988, no Código Civil Brasileiro, mas, 
especialmente, com o advento do Código de Proteção de Defesa do Consumidor, os pacientes 
passaram a reivindicar na justiça seus direitos, fazendo com que os profissionais da saúde se 
resguardassem melhor quanto a eventuais litígios. 
Ao paciente, respaldado pelo princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, 
é facultado decidir como viver sua vida, o que inclui quaisquer tratamentos médicos. O próprio 
Código de Ética Médica, em consonância com a Carta Magna, estabelece: “é vedado ao médico: 
44 
 
deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo 
sobre o procedimento a ser realizado, salvo sem risco iminente de morte”. 
Contudo, existem algumas dificuldades na utilização adequada do Termo de 
Consentimento Esclarecido, dentre eles está a fragilidade do vínculo entre paciente e 
profissional da saúde, principalmente no que se refere à comunicação, cuja deficiência prejudica 
o entendimento do doente sobre seu quadro clínico, diminuindo sua capacidade de opinar sobre 
o tratamento. Situação que pode ser agravada pela carga emocional da internação, que amplia 
incertezas e temores e intensifica a vulnerabilidade, comprometendo a assistência. (CASTRO; 
QUINTANA; OLESIAK; MÜNCHEN, 2020). Sobre o ponto, orienta o Conselho Federal de 
Medicina na Recomendação n.º 1/2016: 
A redação do documento deve ser feita em linguagem clara, que permita ao paciente 
entender o procedimento e suas consequências, na medida de sua compreensão. Os 
termos científicos, quando necessários, precisam ser acompanhados de seu 
significado, em linguagem acessível. 
Ademais, ainda que o consentimento informado seja absolutamente desejável e 
recomendável na relação do profissional de saúde com seu paciente, quando o paciente está em 
condição extrema, que necessite urgente de intervenção médica, o profissional de saúde fica 
dispensado de obter seu consentimento. Em tais situações, além de estar amparado nas 
determinações do Conselho Federal de Medicina, o profissional estará amparado pelo Código 
Penal, que no artigo 146, § 3º, inciso I, diz que não configura crime de constrangimento ilegal 
a intervenção médica ou cirúrgica, sem o consentimento do paciente ou de seu representante 
legal, se justificada por iminente perigo de vida. A falta de disponibilidade de tempo necessário 
para a obtenção do consentimento exonera, excepcionalmente, o médico do cumprimento desse 
dever. 
Do mesmo modo, o privilégio terapêutico também poderá ser utilizado nos casos em 
que a revelação da verdade sobre a saúde do paciente possa causar-lhe prejuízo psicológico 
grave, de forma a constituir um novo proibidor para a obtenção de seu consentimento. Esta 
exceção é garantida ao médico pelo Código de Ética Médica, cujo artigo 34 permite a não 
informação quando a comunicação direta ao paciente possa lhe provocar danos, devendo, nesse 
caso, fazer a comunicação a seu responsável legal. 
Ainda, podem ocorrer situações de risco em que pacientes portadores de enfermidades 
transmissíveis, potencialmente causadores de riscos graves para terceiros, sobretudo menores, 
negligenciam o tratamento ou negam seu consentimento para adoção de cuidados necessários. 
Nessa situação também se justifica o tratamento compulsório, não sendo exigível o 
45 
 
consentimento informado do paciente, fins de prestigiar a coletividade em detrimento da 
vontade individual ou autodeterminação, com fulcro no Código Civil Brasileiro. 
No mesmo sentido, pessoas com transtornos mentais graves poderão ser internados 
compulsoriamente para tratamento, por determinação judicial ou involuntariamente, a pedido 
da família ou indicação médica, devendo esta decisão ser comunicada ao Ministério Público 
Estadual, no prazo de 72 horas, segundo prevê o artigo 8º, § 1º, da Lei n.º 10.216/2001. 
Por derradeiro, hipótese também prevista na Recomendação n.º 1/2016 do Conselho 
Federal de Medicina, poderá ser dispensado o consentimento informado, quando o paciente se 
recusar a receber a informação, situação em que o paciente nega a verdade a seu respeito ou se 
nega a decidir, impossibilitando a comunicaçãodo procedimento para obtenção do 
consentimento livre e esclarecido. Nesses casos, quando a recusa em receber informação não 
significa, necessariamente, negativa de consentimento do paciente, a atuação do médico deverá 
guiar-se pelo princípio da beneficência. Pondera-se, todavia, que o termo de consentimento 
livre e esclarecido em “branco”, ou seja, àquele que outorga poderes ilimitados ao médicos 
apenas com base na confiança, não atinge a finalidade de comprovar que o paciente foi 
devidamente informado, pelo médico, acerca de suas condições e que efetivamente concorda 
com o tratamento a ser realizado, apenas de haver riscos (OLIVEIRA; PIMENTEL; VIERIA, 
2010). 
Como se vê, excetuadas as hipóteses legalmente previstas para a dispensa do 
consentimento livre e informado do paciente, a relação profissional de saúde-paciente deve ser 
equilibrada, levando-se em consideração o binômio: desejos do doente e segurança do 
profissional, evitando-se, desta maneira, ações judiciais desnecessárias. 
7 CONCLUSÃO: ENFRENTANDO OS DILEMAS ÉTICOS E JURÍDICOS NO 
ATENDIMENTO DE URGÊNCIA 
 
Neste trabalho, exploramos os complexos dilemas éticos e jurídicos que os médicos 
enfrentam no ambiente dos atendimentos de urgências. Abordamos questões cruciais, como a 
priorização de pacientes, riscos ocupacionais, carga de trabalho, escassez de recursos, conflitos 
de valores e crenças e responsabilidade legal. Cada um desses tópicos demonstrou a natureza 
complexa e desafiadora desse tipo de atendimento e a necessidade de estratégias e políticas 
adequadas para enfrentá-los. 
46 
 
Recapitulando os principais pontos discutidos, fica claro que os profissionais de saúde 
estão constantemente equilibrando suas responsabilidades éticas e legais, muitas vezes em 
situações de alta pressão e recursos limitados. A priorização de pacientes é uma área 
particularmente delicada, onde a decisão sobre quem receberá atendimento imediato pode ter 
implicações éticas e legais significativas. Além disso, a carga de trabalho excessiva e a exaustão 
dos profissionais de saúde podem comprometer a qualidade do atendimento, tornando ainda 
mais crítica a necessidade de encontrar soluções eficazes. 
A escassez de recursos e a alocação adequada são desafios intrínsecos ao sistema de 
saúde, exigindo uma abordagem ética transparente e baseada em critérios claros. Conflitos de 
valores e crenças podem surgir entre os profissionais de saúde e os pacientes, destacando a 
importância da comunicação eficaz e do respeito pelas escolhas individuais. 
Além disso, a responsabilidade legal e o registro adequado dos procedimentos são 
essenciais para proteger tanto os pacientes quanto os profissionais de saúde. Pressões 
institucionais e conflitos de interesses podem comprometer a tomada de decisões éticas, 
enfatizando a necessidade de uma cultura organizacional que priorize a ética e o bem-estar do 
paciente. 
Em face desses dilemas, é imperativo reconhecer a importância da capacitação ética e 
orientação jurídica para todos os profissionais de saúde. A formação contínua e o acesso a 
recursos que ajudem a lidar com essas situações complexas são fundamentais para garantir que 
as decisões tomadas sejam com base em critérios éticos e legalmente sólidos. 
Além disso, as instituições de saúde devem implementar políticas que estimulem a 
prática ética nos atendimentos de urgências, além de fornecer apoio psicológico adequado para 
os profissionais de saúde que enfrentam situações emocionalmente desafiadoras. 
Em última análise, enfrentar os dilemas éticos e jurídicos no atendimento de urgência é 
uma tarefa árdua e complexa, mas crucial. Garantir que os pacientes recebam o atendimento 
adequado, ao mesmo tempo assegurando suficiência e qualidade na assistência, inclusive 
protegendo os direitos e bem-estar dos profissionais de saúde, requer um equilíbrio delicado. 
No entanto, com o compromisso contínuo com a ética, a formação adequada e o apoio 
institucional, é possível enfrentar esses desafios de maneira responsável e compassiva, 
garantindo o melhor atendimento possível em situações críticas de saúde. 
 
 
 
47 
 
REFERÊNCIAS 
 
BRASIL. Constituição Federal. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 
Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: 
<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 14 ago. 
2023. 
 
BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do 
Trabalho. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 2 maio 1943. Disponível em: 
<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 15 ago. 2023. 
 
BRASIL. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, 
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços 
correspondentes e dá outras providências. Brasília, DF: Senado Federal, 1990. Disponível em: 
<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm>. Acesso em: 14 ago. 2023. 
 
BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. Norma Regulamentadora 32: Segurança e Saúde 
no Trabalho em Serviços de Saúde. Brasília, DF, 2005. Disponível em: 
<https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-
social/conselhos-e-orgaos-colegiados/comissao-tripartite-partitaria-
permanente/arquivos/normas-regulamentadoras/nr-32-atualizada-2022-2.pdf>. Acesso em: 14 
ago. 2023. 
 
BRANDÃO, José Freitas. Consentimento informado na prática médica. Conselho Federal de 
Medicina. Disponível em <https://portal.cfm.org.br/artigos/consentimento-informado-na-
pratica-medica/>. Acesso em 1º out. 2023. 
 
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM – Brasil). Código de Ética Médica. Disponível 
em < https://portal.cfm.org.br/images/PDF/cem2019.pdf>. Acesso em 1º out. 2023. 
 
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM – Brasil). Recomendação nº 1, de 21 de 
janeiro de 2016. Dispõe sobre o processo de obtenção de consentimento livre e esclarecido na 
assistência médica. Disponível em 
<https://www.ghc.com.br/files/Sobre%20Consentimento%20Informado.pdf>. Acesso em 1º 
out. 2023. 
 
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM – Brasil). Resolução CFM nº 2.110, de 19 de 
Novembro de 2014. Disponível em: 
<https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2014/2110>. Acesso em: 30 
ago. 2023. 
 
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM – Brasil). Resolução CFM nº 2.156, de 17 de 
Novembro de 2016. Disponível em: 
https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2016/2156. Acesso em: 01 set. 
2023. 
 
CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DE SÃO PAULO (CREMESP – 
Brasil). Consulta nº 124.524/06, de 22 de dezembro de 2008. Disponível em: 
<https://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Pareceres&dif=s&ficha=1&id=8949&tipo=PAREC
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
https://portal.cfm.org.br/artigos/consentimento-informado-na-pratica-medica/
https://portal.cfm.org.br/artigos/consentimento-informado-na-pratica-medica/
https://portal.cfm.org.br/images/PDF/cem2019.pdf
https://www.ghc.com.br/files/Sobre%20Consentimento%20Informado.pdf
https://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Pareceres&dif=s&ficha=1&id=8949&tipo=PARECER&orgao=%20Conselho%20Regional%20de%20Medicina%20do%20Estado%20de%20S%E3o%20Paulo&numero=124524&situacao=&data=22-12-2008#anc_integra
48 
 
ER&orgao=%20Conselho%20Regional%20de%20Medicina%20do%20Estado%20de%20S%
E3o%20Paulo&numero=124524&situacao=&data=22-12-2008#anc_integra>. 
 
DAL POZ, Mario Roberto, SCHEFFER Mário. Recursos Humanos para a Saúde em Tempos 
de Pandemia. A Saúde No Brasil. Orgs: Rudi Rocha, Miguel lago, Fabio Giambiagi. São Paulo: 
Ed.Lux; 2022. 
 
DE CASTRO, Carolina Fernandes de; QUINTANA, Alberto Manuel; OLESIAK, Luísa da 
Rosa; MÜNCHEN, Mikaela Aline Babe. Termo de Consentimento Livre e Esclarecido na 
Assistência à Saúde. Disponível em 
<https://www.scielo.br/j/bioet/a/nSNCdJq7zx8FynjmV7m9fqh/?lang=pt#>. Acesso em 1º out.2023. 
 
GALVÃO, Maria Cristiane Barbosa; RICARTE, Ivan Luiz Marques. Prontuário do paciente. 
Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2012. 
 
MENDES, Ana Magnólia; BORGES Lívia de Oliveira; FERREIRA, Mário Cesar (Orgs.). 
Trabalho em transição, saúde em risco. Brasília: Universidade de Brasília, 2002. 
 
MENZANI, Graziele. Stress entre enfermeiros brasileiros que atuam em Pronto Socorro. 
Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da USP, São Paulo, 2006. 
 
MUROFUSE, Neide Tiemi; ABRANCHES, Sueli Soldati; NAPOLEAO, Anamaria Alves. 
Reflexões sobre estresse e Burnout e a relação com a enfermagem. Rev. Latino-Am. 
Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 13, n. 2, 2005. 
 
OLIVEIRA, Vitor Lisboa; PIMENTEL, Déborah; VIEIRA, Maria Jésia. O uso do termo de 
consentimento livre e esclarecido na prática médica. Disponível em 
<http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/595/601>. Acesso 
em 1º out. 2023. 
 
SCHEFFER, Mário. et al. Demografia Médica no Brasil 2023. São Paulo, SP: FMUSP, AMB, 
2023. 344 p. ISBN: 978-65-00-60986-8. 
 
SCHMIDT, Denise Rodrigues Costa; DANTAS, Rosana Aparecida Spadoti. Qualidade de vida 
no trabalho de profissionais de enfermagem, atuantes em unidades do bloco cirúrgico, sob a 
ótica da satisfação. Rev. Latino-Am. Enfermagem, Ribeirão Preto, v. 14, n. 1, 2006. 
 
SEM AUTOR. Diretrizes Sobre Saúde Mental no Trabalho. Nações Unidas Brasil. Disponível 
em: <https://brasil.un.org/pt-br/201450-oms-e-oit-publicam-novas-diretrizes-sobre-
sa%C3%BAde-mental-no-trabalho>. Acesso em: 30 set. 2023. 
 
SEM AUTOR. Informe Mundial De Saúde Mental: Transformar A Saúde Mental Para Todos. 
Biblioteca Virtual em Saúde. Ministério da Saúde. 2023. Disponível em 
<https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-
saude-mental-para-todos/>. Acesso em 30 set. 2023. 
 
SEM AUTOR. Síndrome de Burnout. Ministério da Saúde. Disponível em 
<https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/s/sindrome-de-burnout>. Acesso 
em: 30 set. 2023. 
https://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Pareceres&dif=s&ficha=1&id=8949&tipo=PARECER&orgao=%20Conselho%20Regional%20de%20Medicina%20do%20Estado%20de%20S%E3o%20Paulo&numero=124524&situacao=&data=22-12-2008#anc_integra
https://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Pareceres&dif=s&ficha=1&id=8949&tipo=PARECER&orgao=%20Conselho%20Regional%20de%20Medicina%20do%20Estado%20de%20S%E3o%20Paulo&numero=124524&situacao=&data=22-12-2008#anc_integra
https://www.scielo.br/j/bioet/a/nSNCdJq7zx8FynjmV7m9fqh/?lang=pt
http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/595/601
https://brasil.un.org/pt-br/201450-oms-e-oit-publicam-novas-diretrizes-sobre-sa%C3%BAde-mental-no-trabalho
https://brasil.un.org/pt-br/201450-oms-e-oit-publicam-novas-diretrizes-sobre-sa%C3%BAde-mental-no-trabalho
https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/
https://bvsms.saude.gov.br/oms-divulga-informe-mundial-de-saude-mental-transformar-a-saude-mental-para-todos/
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/s/sindrome-de-burnout
49 
 
 
SILVEIRA, Miriane Melo; STUMM, Eniva Miladi Fernandes; KIRCHNER Rosane Maria. 
Estressores e coping: enfermeiros de uma unidade de emergência hospitalar. Rev. Eletr. Enf., 
v. 11, n. 4, 2009. 
 
 
 
50 
 
REPRODUÇÃO ASSISTIDA POST MORTEM E SUA REPERCUSSÃO 
NO ORDENAMENTO JURÍDICO 
 
Bianca Krombauer Antunes1 
Mariana Silva Goulart2 
Jair Pereira Coitinho3 
 
RESUMO 
O presente artigo descreve a evolução da reprodução assistida post mortem, bem como a sua 
regulamentação jurídica, englobando o direito das sucessões. A pesquisa apresenta a linha do 
tempo da inseminação post mortem diante a evolução da sociedade; a importância da 
Reprodução Assistida Post Mortem na sociedade, expondo um panorama da evolução 
legislativa acerca do tema; uma abordagem da legislação específica, clara e objetiva acerca do 
assunto, trazendo o Código Civil de 2002, para, ao final, demonstrar a necessidade de maior 
regulamentação do assunto pelo ordenamento jurídico; os efeitos do assunto na área de direito 
e sucessões. Além disso, se faz presente um projeto de lei acerca do referido assunto. O método 
utilizado foi o hipotético-dedutivo, com base em um estudo de livros, artigos e jurisprudência 
acerca do assunto tratado. 
Palavras-chave: Reprodução assistida Post Mortem; Direito; Filiação; Sucessão. 
 
1 INTRODUÇÃO 
Na contemporaneidade, observa-se diversas mudanças no cenário familiar e no Direito 
de Família, tendo este deixado a ideia de que o estabelecimento da filiação se baseava na relação 
sexual entre os parceiros, para a ideia de que os sentimentos de afeto e amor bastavam como 
base para a maternidade e paternidade. Isso se deu por meio de acontecimentos históricos, como 
o processo de industrialização, as Grandes Guerras Mundiais e os movimentos feministas e 
mudanças no ordenamento jurídico, como o advento da Constituição Federal Brasileira de 1988, 
todos que tiveram papel fundamental na transformação do conceito de família na sociedade. 
Essa sucessão de mudanças é exemplificada pelos autores Rodrigo da Cunha Pereira e Maria 
Berenice Dias da seguinte maneira: 
 
1 Graduanda do curso de Bacharelado em Direito pela Universidade Federal do Pampa de São Borja. E-mail: 
biancaantunes.aluno@unipampa.edu.br. 
2 Graduanda do curso de Bacharelado em Direito pela Universidade Federal do Pampa de São Borja. E-mail: 
marianagoulart.aluno@unipampa.edu.br. 
3 Professor Adjunto A da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA). Possui Doutorado em Direito 
Constitucional pela UNIFOR - Universidade de Fortaleza (CE). Membro Honorário da Academia Brasileira de 
Direito Processual Civil (ABDPC). Oab 39. 468. E-mail: jaircoitinho@unipampa.edu.br. 
51 
 
A travessia para o novo milênio transporta valores totalmente diferentes, mas traz 
como valor maior uma conquista: a família não é mais um núcleo econômico e de 
reprodução, onde sempre esteve instalada a suposta superioridade masculina. Passou 
a ser muito mais um espaço para o desenvolvimento do companheirismo, do amor, e, 
acima de tudo, o núcleo formador da pessoa e elemento fundante do próprio sujeito” 
(PEREIRA; DIAS, 2003). 
Nesse contexto, a inversão de valores em âmbito familiar, como mencionado 
anteriormente, com a ideia de que o afeto e a vontade de constituir família bastavam, passou a 
direcionar o olhar da ciência e medicina para os indivíduos que, de alguma forma, não podiam 
ou não desejavam conceber filhos de forma natural, possibilitando, assim, com que a vida 
humana, que há pouco tempo provinha-se somente de forma natural, também se validasse 
artificialmente. Dessa forma, a reprodução humana assistida surge, inicialmente, para auxiliar 
os indivíduos com complicações de fertilidade na concepção de filhos, tendo evoluído, 
posteriormente, para o acolhimento de pessoas que desejam esperar o momento certo para 
serem pais, para a concepção entre casais homoafetivos, gestação independente e até para o 
planejamento familiar visando a diminuição do risco de doenças genéticas. 
Genival Veloso França traz que a reprodução humana assistida é: 
o conjunto de procedimentos no sentido de contribuir na resolução de problemas da 
infertilidade humana, facilitando assim o processo de procriação quando outras 
terapêuticas ou condutas tenham sido ineficazes para a solução e obtenção da gravidez 
desejada” (FRANÇA, 2001, p. 225). 
Mais tarde, com a evolução da tecnologia, biomedicina e pesquisas genéticas, tornou-se 
possível, ainda, a reprodução assistida após a morte de um dos cônjuges ou companheiros, a 
chamada reprodução assistida post mortem, que trouxe controvérsias significativas nos meios 
social e jurídico. 
Neste contexto, o presente artigo visa apresentar a evolução da abordagem jurídica 
relacionada às técnicas de reproduçãoassistida homóloga post mortem, bem como seus reflexos 
no direito de família e sucessões, como forma de apontar as ainda recentes discussões e 
controvérsias acerca do tema, evidenciando a importância de uma melhor regulamentação 
jurídica acerca deste. 
A relevância do tema é evidente, uma vez que a técnica de reprodução póstuma 
possibilita aos indivíduos a concretização do desejo de ter filhos do cônjuge ou companheiro 
falecido, visando a proteção do instituto da família e o resguardo da paternidade, mesmo após 
a morte. Além disso, a observância dos reflexos e implicações da técnica e de seus 
procedimentos no ordenamento jurídico é de extrema importância para a compreensão de como 
https://www.dasagenomica.com/blog/doencas-geneticas-e-hereditarias/
52 
 
se sucede a questão dos direitos das crianças póstumas, especialmente em relação ao direito à 
herança. 
 
2 REPRODUÇÃO HUMANA ASSISTIDA HOMÓLOGA POST MORTEM 
 
A reprodução assistida pós-morte trata do uso de espermatozoides, óvulos ou embriões, 
os quais tenham sido anteriormente congelados, para a obtenção da gestação após o falecimento 
de um dos cônjuges. O processo se dá, no caso de uso de espermatozoide congelado, por meio 
do procedimento de inseminação intrauterina ou fertilização in vitro e no caso da utilização de 
óvulo congelado, por meio, somente, da fertilização in vitro. 
Contudo, a realização do procedimento não se dá de maneira simples, uma vez que é 
necessário prévia autorização, com a assinatura de um consentimento, para o uso do material 
biológico em caso de falecimento de um dos indivíduos. 
De acordo com o Conselho Federal de Medicina (CFM), na Resolução nº 2.168/2017, 
“é permitida a reprodução assistida post-mortem desde que haja autorização prévia específica 
do(a) falecido(a) para o uso do material biológico criopreservado, de acordo com a legislação 
vigente”. 
Outrossim, o Enunciado 106 do Conselho Nacional de Justiça traz que: “para que seja 
presumida a paternidade do marido falecido, será obrigatório que a mulher, ao se submeter a 
uma das técnicas de reprodução assistida com o material genético do falecido, esteja na 
condição de viúva, sendo obrigatória, ainda, a autorização escrita do marido para que se utilize 
seu material genético após sua morte”. 
Veja-se, dessa forma, que a autorização expressa de um dos cônjuges para a utilização 
do material genético é de extrema necessidade, uma vez que não é possível prever o desejo dos 
indivíduos falecidos em perpetuar seus genes. No entanto, na falta deste documento escrito, a 
realização do procedimento só poderá ser feita por meio de expressa autorização do Poder 
Judiciário. 
Ademais, tem-se que uma das dúvidas mais frequentes em relação ao assunto é acerca 
da possibilidade de os homens poderem utilizar o material genético por meio de um útero de 
substituição ou a cessão temporária de útero, uma vez que as discussões acerca do assunto 
focaram, inicialmente, na mulher viúva. 
53 
 
Sobre a questão, o Enunciado nº 633 do Conselho da Justiça Federal, advindo da VIII 
Jornada de Direito Civil, demonstrou que: “é possível ao viúvo ou ao companheiro sobrevivente 
o acesso à técnica de reprodução assistida póstuma por meio da maternidade de substituição, 
desde que haja expresso consentimento manifestado em vida pela sua esposa ou companheira”. 
Além disso, a norma do Conselho Federal de Medicina que expõe sobre a possibilidade 
da utilização do útero de substituição, prevê que “a cedente temporária do útero deva pertencer 
à família de um dos parceiros em parentesco consanguíneo até o quarto grau (primeiro grau – 
mãe/ filha; segundo grau – avó/ irmã; terceiro grau – tia/ sobrinha; quarto grau – prima). Demais 
casos estão sujeitos à autorização do Conselho Regional de Medicina”. 
 
2.1 Breve contexto histórico 
 
É de suma importância discorrer sobre o surgimento da técnica de reprodução humana 
assistida post mortem e recordar a gênese da discussão acerca desta. 
Antes do desenvolvimento das técnicas de congelamento dos embriões e gametas, a 
chamada crioconservação, os procedimentos de reprodução assistida não eram completos, 
devido a necessidade de efetivação imediata destes. Com o advento da crioconservação, se 
tornou possível o armazenamento desse material genético para uso futuro, o que fez surgir 
discussões acerca da utilização do material congelado na mulher, mesmo após o falecimento de 
seu cônjuge. 
Assim, surge o primeiro caso de reprodução assistida post mortem, mundialmente 
conhecido como “caso Affair Parpalaix”. Este se sucedeu na França, no ano de 1984, quando 
Alain Parpalaix, companheiro de Corine Richard, descobriu que estava com um câncer nos 
testículos, sendo a doença incurável. O desejo do casal era ter filhos, porém, o tratamento da 
doença fez com que Alain se tornasse infértil, o que levou o casal a procurar um banco de 
sêmen, onde Alain depositou seus espermatozoides. 
Após a morte do marido, Corine procurou o banco de sêmen para se submeter à 
inseminação artificial, tendo o banco se recusado a realizar a técnica e devolver o sêmen 
armazenado, alegando a falta de previsão legal acerca do assunto. 
Em disputa judicial, o tribunal francês de Créteil condenou o banco de sêmen, 
determinando que o material genético de Alain fosse devolvido à viúva. No entanto, devido à 
demora para o encerramento do caso, a técnica não prosperou, eis que os espermatozoides não 
tinham mais potencial fecundativo. 
54 
 
Contudo, mesmo com o resultado negativo da utilização da técnica, o caso foi 
considerado um marco histórico, abrindo portas para o início da discussão acerca do tema e do 
destino do material genético armazenado após a morte do doador. 
Em relação ao Brasil, por sua vez, o primeiro caso de nascimento de uma criança 
póstuma, se deu em razão de ordem judicial, na data de 21 de junho de 2011, quando nasceu 
Luísa Roberta (Moraes, 2019). 
Ademais, seguem outros casos tramitados na justiça brasileira acerca do assunto: 
Na cidade de São Paulo/RS, na data de 30 de abril de 2008, a juíza de Direito da 22ª 
Vara Cível do Foro Central, Dra. Carla Themis Lagrotta Germano, deferiu alvará para 
utilização, pela autora, do sêmen congelado do falecido marido, pelo prazo de um ano. O caso 
em questão tratava-se de pedido, pela autora, de alvará para a utilização do material genético 
do marido que havia falecido durante os procedimentos de tentativa de reprodução assistida 
realizados pelo casal. 
Da mesma forma, no município de Curitiba/PR, na data de 17 de maio de 2010, o Juiz 
de Direito da 13ª Vara Cível deferiu pedido da autora para realizar a técnica de inseminação 
utilizando o material genético congelado de seu marido, que havia falecido de câncer. Neste 
caso, a decisão foi proferida mesmo sem a autorização do marido, uma vez que os fatos 
apontavam o inequívoco desejo do mesmo de ser genitor. 
 
2.2 Regulamentação jurídica 
 
Ainda que seja um assunto delicado e polêmico, o tema da reprodução assistida post 
mortem não se afixa em alguma regulamentação específica que legisle a implantação de 
embriões após a morte de um dos cônjuges. Há casos em que uma legislação específica faz 
falta, pois pode-se encontrar casos de difícil resolução e delicados ao extremo, o que apenas 
dificulta ainda mais a decisão do juízo, necessitando apelar aos princípios, costumes e atos 
administrativos pairados sobre a jurisdição, não esquecendo também dos desafios que essa 
natureza traz, assim como discorre Maria Helena Diniz, em sua obra do Estado Atual do 
Biodireito: 
Possibilidade de uma criança nascer de genitor morto, por ter sido utilizado, na 
ectogênese, esperma congelado de pessoa já falecida, ainda que seja o marido de sua 
mãe, ou por ter havido fecundação in vitro de óvulo de mulher morta, ou por ter 
ocorrido o óbito de mãe ou pai genéticos antes que mulher morta, ou por ter ocorrido 
o óbito de mãe ou pai genéticosantes que o embrião seja colocado no útero da mãe 
de substituição. É preciso evitar tais práticas, pois, como já dissemos alhures, as 
55 
 
consequências ético-jurídicas que delas advirão são muito graves. Por isso, necessário 
será que se proíba legalmente a reprodução humana assistida post mortem, e, se 
porventura houver prévia permissão do falecido para uso do material biológico 
criopreservado, de acordo com a legislação vigente (Res. CFM n. 2.013/2013, Seção 
VIII), dever-se-á prescrever quais são os direitos do filho, inclusive sucessórios, 
diante, p. Ex., do disposto no art. 1798 do Código Civil. (DINIZ, 2014, p. 704) 
Embora no Código Civil de 1916 não houvesse a possibilidade de ser realizada uma 
concepção humana após a morte do genitor, os direitos do nascituro eram garantidos, sendo 
considerados desde o momento da concepção para fins de início da personalidade (MOREIRA 
FILHO, 2002). É importante lembrar que há projetos de lei acerca do tema proposto neste 
artigo, mas que ainda se encontram em andamento e que a reprodução assistida, de certa forma, 
é resguardada pelo Código Civil de 2002, como será mostrado em seguida. 
Com uma visão direta e bem elucidada, a reprodução assistida deve ocorrer de uma 
forma segura e benéfica tanto ao paciente quanto ao descendente, como frisa a autora Maria 
Helena Diniz: 
O direito de alguém à concepção e a descendência por meio de fertilização assistida 
só deverá ser permitido, lembramos mais uma vez, se não colocar em risco a vida ou 
a saúde da paciente e do possível descendente (Res. CFM n.2.013/2013; Lei espanhola 
n. 14/2006, art. 3º). Não se poderia admitir o ocorrido na Itália, onde, por ocasião de 
uma reprodução assistida, a gestante e o bebê foram contaminados com o vírus da 
AIDS, apesar de o teste feito por ela e seu marido ter acusado não estarem 
contaminados. O vírus estava no espermatozoide; o engano se deu ante o fato de 
apenas terem os médicos encontrado esse vírus no líquido seminal, na secreção 
vaginal, no sangue e raras vezes na saliva e na lágrima. Daí o enorme risco existente 
na reprodução assistida, requerendo maiores cautelas no banco de sêmen e nos exames 
efetuados nos doadores de material fertilizante e nas mulheres que cederam seu útero 
para procriação alheia. (DINIZ, 2014, p. 746) 
Seguindo com as regulamentações da reprodução assistida post mortem, cita-se o 
Conselho Federal de Medicina, que através da Resolução CFM nº 2.320/22, mais atualizada, 
revogou a Resolução CFM nº 2.294/21. Ficou decidido pela atual Resolução, no âmbito da 
reprodução assistida, que a técnica é permitida, porém, deve haver autorização específica do 
membro para poder fazer o uso do material biológico criopreservado em vida, de acordo com a 
legislação vigente (BRASIL, 2022). O primeiro procedimento a ser realizado para que a 
reprodução assistida post mortem se concretize é a formalidade da vontade dos pacientes 
autorizando a técnica diante do falecimento de uma das partes, através de um TCLE (Termo de 
Consentimento Livre e Esclarecido), cujo documento vale-se de autorização do casal para que 
a clínica possa tomar devidas condutas. Cabe também às partes informar, por meio escrito, se 
ocorrer o divórcio do casal ou a dissolução de união estável, qual será a finalidade adotada para 
os criopreservados. 
https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10607181/artigo-1798-da-lei-n-10406-de-10-de-janeiro-de-2002
https://www.jusbrasil.com.br/legislacao/111983995/c%C3%B3digo-civil-lei-10406-02
56 
 
Ainda, se destaca, o Art. 1.597, inciso III, do Código Civil, o qual dispõe que os filhos 
advindos da fecundação artificial homóloga são presumidos da mesma forma que os concebidos 
na constância do casamento. Sobre este artigo em específico falaremos mais adiante, em um 
tópico próprio, discutindo uma questão importante e relevante para a sociedade em detrimento 
de sua repercussão. 
Pesa, ainda, citar o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que editou o Provimento nº 63 
de 14 de novembro de 2017, e este dispõe o art. 17, §2º, “Nas hipóteses de reprodução 
assistida post mortem, além dos documentos elencados nos incisos do caput deste artigo, 
conforme o caso, deverá ser apresentado termo de autorização prévia específica do falecido ou 
falecida para uso do material biológico preservado, lavrado por instrumento público ou 
particular com firma reconhecida” (Brasil, 2017). Esta resolução engloba o pressuposto legal 
do consentimento, sendo nada menos que o consentimento prévio do falecido referente a 
reprodução assistida post mortem. 
Observando ser um tema complicado e que necessita de regulamentação específica, a 
Professora Ana Claudia Silva Scalquette, defende, em sua tese, a iniciativa de um Estatuto da 
Reprodução Assistida, o qual argumenta e garante em um capítulo exclusivo à Reprodução 
Assistida Post Mortem, os direitos das partes, bem como o núcleo familiar, podendo 
representar, ou não, um interesse de modo coletivo da sociedade, a permissão do uso do material 
genético, conforme dita o Estatuto e os demais trâmites para o procedimento. 
Ainda, a necessidade de o Poder Legislativo criar um regulamento acerca da reprodução 
assistida post mortem decorre de uma série de fatores, incluindo: a falta de uma conceituação 
legal e clara sobre o tema, podendo gerar incertezas e conflitos jurídicos; a necessidade de 
proteger os direitos da pessoa falecida, de quem será a mãe e do filho concebido e; a necessidade 
de garantir que esta técnica ocorre de forma saudável, ética e responsável. 
 
2.3 Posicionamento do STJ acerca da reprodução assistida post mortem 
 
É sabido que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) carrega consigo a atribuição de 
uniformizar a interpretação da legislação federal e, portanto, é seu dever fiscalizar o poder 
Judiciário e Legislativo, incentivando-os a atuarem de forma constitucional. Assim, o Superior 
Tribunal de Justiça ganha o título de instância máxima para a solução de questões 
57 
 
infraconstitucionais entre os cidadãos, não à toa que tal é conhecido também por “Tribunal da 
Cidadania”, referindo-se a Constituição Cidadã. 
Então, é nesse viés, que o STJ se pronunciou sobre a Reprodução Assistida Post 
Mortem, através do julgamento do Recurso Especial nº 1.918.421, da Quarta Turma, o qual 
contou com o voto prevalecente do Ministro Luís Felipe Salomão, que dissertou que a 
reprodução assistida post-mortem traria algumas inferências, tanto patrimoniais quanto cíveis. 
Sendo assim, para que o pré-falecido manifeste a sua vontade, de gerar outra vida com o seu 
material genético após o seu falecimento, deverá ser feita de modo escrito e antes da morte do 
indivíduo, por testamento ou outro instrumento de igual teor. De um modo geral, o STJ 
entendeu, em junho de 2021, que há possibilidade de realizar a reprodução assistida post 
mortem, desde que haja autorização expressa do falecido. 
Retrocedendo 4 anos do momento atual, era decidido pelo STJ a constitucionalidade da 
reprodução assistida post mortem, valendo-se do argumento de que esta técnica não transgredia 
o direito à vida, já que o Art. 2º do Código Civil ressalta, entre linhas, que o embrião não é 
considerado uma pessoa, pois antes do nascimento, o embrião não possui direitos e deveres 
civis. Todavia, vale ressaltar que há exceções que podem ser destacadas, como direitos 
patrimoniais, o direito à herança, por exemplo, como já mencionada no texto acima. 
O Conselho Federal de Medicina (CFM) e o Provimento nº 63/2017, do Conselho 
Nacional de Justiça (CNJ), são documentos que regulamentam a reprodução assistida post 
mortem no Brasil. O CFM, por meio da Resolução CFM nº2.320/22, dispõe que a reprodução 
assistida post mortem é permitida desde que haja autorização específica do falecido. O 
Provimento nº 63/2017, do CNJ, regulamenta acerca do registro de nascimento e também a 
emissão das certidões dos filhos concebidos por reprodução assistidapost mortem. 
Neste contexto, observa-se que a temática da reprodução assistida post mortem é 
bastante enigmática e complicada, levando em consideração que esta abrange outros temas 
polêmicos, como por exemplo ética e religião. 
2.4 Filhos concebidos pela técnica da reprodução assistida “post mortem” e seus direitos 
sucessórios 
 
De início, para descobrir o que se pretende neste tópico, é inquestionável que 
primeiramente faz-se necessário compreender o conceito da expressão filiação e seus preceitos 
básicos, afim de formar uma visão ampla para melhor entender os direitos sucessórios dos filhos 
concebidos por essa técnica. 
58 
 
A autora Maria Berenice Dias (2013, p. 360), apontou que, durante o século XX, “a 
família constituída pelo casamento era a única a merecer reconhecimento e proteção estatal, 
tanto que sempre recebeu o nome de família legítima”. Com isso, pode ser afirmado que o 
conceito de filiação nos tempos passados, mas não muito distantes, eram construídos de maneira 
discriminatória e patriarcal, visto que os filhos eram divididos em legítimos (frutos do 
casamento) e ilegítimos (concebidos fora do casamento). Após esse momento da história, 
passaram a ser reconhecidos os filhos nascidos de pais unidos através do matrimónio. 
Por meio da Constituição Federal de 1988, o direito à igualdade entre os filhos e à 
família foi assegurado, fazendo as necessárias adequações perante o momento histórico que era 
vivenciado à época. Entre essas adequações, ocorreu a de uma nova conceituação para a palavra 
filiação, trazendo o afeto como uma das bases nas relações paterno-filiais. Assim, nasce a 
oportunidade do reconhecimento da filiação dos filhos adotivos e também dos filhos concebidos 
pelas técnicas da ciência. 
Segundo Maria Helena Diniz: 
Filiação é o vínculo existente entre pais e filhos; vem a ser a relação de parentesco 
consanguíneo em linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e aqueles que lhe deram 
vida, podendo ainda (CC, arts. 1.593 a 1.597 e 1.618) ser uma relação socioafetiva 
entre pai adotivo e institucional e filho adotado ou advindo de inseminação artificial 
(DINIZ, 2015, p. 503-504). 
Se faz importante a percepção no que tange a sucessão, a qual tem o nome de sucessão 
causa mortis, justamente pelo fato de abordar a herança patrimonial de um de cujus (falecido, 
constando os bens em inventário). Trata-se de um ato de suceder. Este ato de suceder poderá 
ser designado de duas formas, uma delas é por testamento – a qual ocorre a transferência do 
bem de uma pessoa falecida para outra em vida - e a outra é legitimamente – ocorre quando a 
lei ordena a destinação do patrimônio do autor da herança a quem tem direito, através da mesma. 
Adentrando um pouco mais na regulamentação dos direitos sucessórios dos filhos 
concebidos por reprodução humana assistida post mortem, é de suma importância apontar aqui 
a presunção legal da paternidade, definindo que, consoante o artigo 1.597 do Código Civil 
(BRASIL, 2002): “Art. 1.597. Presumem concebidos na constância do casamento os filhos: [..] 
III – havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido”. Este instituto 
jurídico determina, de maneira bem sintetizada, que o marido da mãe é considerado o pai do 
filho, salvo prova em contrário, como por exemplo, o exame de DNA, assegurando ao filho 
póstumo o direito ao reconhecimento da presunção da filiação. 
59 
 
 Entretanto, para que este artigo seja validado, no processo da reprodução post mortem, 
é necessário que haja a autorização prévia do marido. Em relação a esse artigo, existem 
diferenças teóricas quanto à sua utilização prática. Alguns autores acreditam que a utilização 
deste artigo só é adequada para casais ainda casados e não aceita a sua inclusão em casamentos 
estáveis. Lôbo (2003), por outro lado, discorda desse entendimento, argumentando que mesmo 
que o artigo se refira à “estabilidade do casamento”, as presunções das relações pai-filho e mãe-
filho aplicar-se-ão às uniões estáveis, independentemente do casamento. 
Outro princípio significativo é o princípio da igualdade entre os filhos, sendo um 
princípio constitucional que garante que todos os filhos, independentemente de sua origem, 
tenham os mesmos direitos e garantias. Esse princípio está previsto no artigo 227, §6º, da 
Constituição Federal, que estabelece que “os filhos, havidos ou não da relação do casamento, 
ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações 
discriminatórias relativas à filiação”. 
Assim, Maria Helena Diniz (2007, p. 476) leciona que, “Todos os filhos de qualquer 
natureza serão igualados, ou seja, filhos havidos na constância do casamento e demais filhos 
reconhecidos recebem, de forma igual, quinhão hereditário”. Portanto, os direitos garantidos a 
cada um dos filhos deverão ser respeitados de forma igualitária entre tais, discriminando 
qualquer obstáculo ou diferenciação entre os componentes da entidade familiar. 
Entre os princípios que ensejam o direito sucessório, destaca-se também o Princípio de 
Saisine ou Droit de Saisine, originado no direito medieval francês e localizado no Código Civil 
(BRASIL, 2002), em seu artigo 1.784, que estabelece: “Aberta a sucessão, a herança transmite-
se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários”. Ou seja, a partir do exato momento 
em que a pessoa se torna de cujus, o indivíduo que, por testamento ou legitimamente, dispuser 
do direito da herança, mesmo sem ter a ciência do falecimento da pessoa, se torna, no mesmo 
momento, detentor da herança deixada, isto é, se torna dono da coisa, ocorrendo de forma 
automática, sem necessidade de algum tipo de formalidade naquele momento. A abertura da 
sucessão se dá então, através da morte. 
Seguindo a linha de legitimados à sucessão, aponta-se o artigo 1.798 do Código Civil, 
estabelecendo que: “legitimam-se a suceder as pessoas nascidas ou já concebidas no momento 
da abertura da sucessão” (BRASIL, 2002). O que este artigo quer dizer é que existem requisitos 
a serem preenchidos, para então entrar na categoria de legitimário, sendo os requisitos 
necessários: que a pessoa esteja viva ou já concebida no momento da abertura da sucessão. Em 
seguida, lista-se alguns exemplos de legitimados à sucessão, de acordo com o mencionado 
60 
 
artigo: filhos vivos ou já concebidos; pais; cônjuge sobrevivente; outros parentes colaterais. 
Também é importante destacar que, para que o indivíduo tenha capacidade sucessória, é 
necessário que ele não seja classificado como sucessor indigno, ou seja, não ter dado causa à 
perda do direito sucessório em razão de ato violento ou fraudulento praticado diante do autor 
da herança. 
Quando se fala em “já concebida”, a expressão engloba os nascituros também. Entende-
se por nascituro as pessoas que ainda não nasceram, porém já foram concebidas. Ou seja, pessoa 
concebida já adquire o direito a receber herança, mesmo que ainda não tenha nascido. 
O artigo 1.829 do Código Civil de 2002 estabelece a ordem de vocação hereditária, ou 
seja, a ordem em que os herdeiros serão chamados a receber a herança de um falecido. São 
classificadas em quatro a ordem de vocação hereditária: 
I – Descendentes; 
II – Ascendentes; 
III – Cônjuge sobrevivente e; 
IV – Colaterais. 
Na classe dos descendentes são considerados os filhos, netos, bisnetos e assim 
sucessivamente, sendo os herdeiros mais próximos do falecido e, por consequência, têm 
preferência em relação aos outros. Entretanto, estes são chamados à sucessão em concorrência 
com o cônjuge sobrevivente, a menos que o de cujus estiver casado no regime da comunhão 
universal de bens ou no regime da separação obrigatória de bens. 
Já os ascendentes são considerados pais, avós, bisavós e assim por diante, sendo 
chamados à sucessão apenas no caso de não haver algum descendente. Estes também são 
chamados à sucessão em concorrência como cônjuge sobrevivente. 
No que tange a classe de cônjuge sobrevivente, será chamado à sucessão mesmo que 
não tenha filhos com o de cujus ou também descendentes. O cônjuge sobrevivente é chamado 
à sucessão com os descendentes, ascendentes e colaterais. 
A quarta classe são os irmãos, sobrinhos, tios e assim por diante, sendo chamados à 
sucessão somente se não houver descendentes, ascendentes ou cônjuge sobrevivente. Os 
colaterais são concorrentes entre si quando chamados à sucessão. 
61 
 
O artigo 1.829 é de suma importância, pois é ele um dos artigos que garante a segurança 
jurídica das relações sucessórias. 
Além dos dispositivos já mencionados, há também o Projeto de Lei nº 1.218, de 2020, 
que se encontra sujeito à apreciação pelo Plenário, tendo como intuito a alteração da redação 
do art. 1.798 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, a fim de estabelecer direito à sucessão 
de filho gerado por meio de inseminação artificial após a morte do autor da herança. 
 
3 CONCLUSÃO 
 
Ao observar-se as mudanças no Direito de Família na sociedade, percebe-se que o 
conceito de filiação mudou com o passar do tempo, uma vez que deixou a ideia de que esta só 
poderia acontecer de forma natural, por meio da relação sexual entre casal composto por homem 
e mulher, para a ideia de que a intenção de construir família e o amor, independentemente de 
sua forma, bastam para a concepção de um filho. Dessa forma, teve-se a abertura de portas para 
os estudos e pesquisas de métodos para possibilitar a filiação de forma artificial, inclusive após 
a morte de um dos cônjuges ou companheiros. 
Ao expor o conceito e modo de funcionamento das técnicas de reprodução assistida pós-
morte, nota-se que temas muito discutidos, como a questão da necessidade de autorização 
prévia de um dos cônjuges para o uso do material genético e a possibilidade de o homem utilizar 
os gametas da viúva, foram elucidados, através da exposição de normas e Enunciados. 
No levantamento da evolução legislativa em relação ao tema de reprodução assistida 
homóloga post mortem, percebe-se que no Brasil não há norma legal acerca do tema, mas 
somente regras de deontologia médica, as quais não possuem eficácia erga omnes. Contudo, 
como demonstrado na pesquisa, existem diversos projetos de lei tramitando, alguns há um 
tempo considerável, no Congresso Nacional sobre o assunto. 
Nesse contexto, verifica-se que a falta de legislação específica acerca do tema gera 
grandes dúvidas nos indivíduos, como, por exemplo, de que forma deve ser feita a autorização 
para a utilização do material genético após a morte, se por meio de instrumento público ou 
particular. Além disso, a necessidade de uma conceituação legal e clara sobre o tema é vista por 
meio de questões relacionadas a proteção do direito de todos os indivíduos que participam da 
reprodução assistida, tais quais os receptores e os doadores do material genético e da demanda 
de garantir que os procedimentos sejam realizados de forma segura e responsável. 
62 
 
Ante o exposto, averiguou-se que a normatização das técnicas de reprodução assistida 
no ordenamento jurídico brasileiro é parca, uma vez que, embora o Código Civil de 2002 
preveja a possibilidade de filiação póstuma, não abrange os pressupostos para a realização da 
técnica, gerando hesitação quanto às suas consequências jurídicas. 
Quanto à análise acerca de como os Tribunais têm enfrentado os temas de reprodução 
assistida póstuma, verificou-se que o assunto não é recorrente, sendo pouca a quantidade de 
decisões referenciais no âmbito das cortes superiores. 
É inegável que a inseminação homóloga post mortem trouxe inúmeros avanços para o 
Direito, considerando as questões referentes à sucessão e no direito de família dos filhos 
concebidos por esta técnica. Pela ausência legislativa no que tange os reflexos sucessórios do 
filho póstumo como sucessor, há grande divergência doutrinária e jurisprudencial, pelo fato de 
que se parte do princípio da igualdade entre os filhos para iniciar a sucessão e, também, do 
reconhecimento da paternidade do filho póstumo pela lei infraconstitucional. É de estimada 
importância que seja realizada a inclusão de lei específica regulamentando as técnicas de 
reprodução assistida e também os reflexos jurídicos na esfera das sucessões dos filhos 
concebidos após a abertura da sucessão. 
Ademais, o filho póstumo, a partir do dia em que completar seus 16 anos de idade, tem 
o prazo de 10 anos para manifestar seu direito a herança. A interpretação jurídica é que a criança 
concebida por inseminação post mortem tem o direito de ser nomeada sucessora no testamento 
do falecido. Isso ocorre porque é imperativo honrar os desejos finais e inequívocos do falecido. 
Para garantir o reconhecimento do seu legítimo direito como sucessor, torna-se necessária a 
regulamentação através de legislação infraconstitucional. O objetivo é fazer face às perdas 
sofridas devido à ausência de uma lei específica e salvaguardar os direitos das crianças 
póstumas e dos seus pais. 
Dito isso, nota-se que a reprodução assistida post-mortem não é vedada em nosso país, 
devendo ela ser acompanhada por autorização expressa de vontade do genitor falecido(a). 
Nestes termos, a pesquisa contribuiu para o compreendimento da reprodução humana 
assistida homóloga post mortem, a maneira como essa se dá e os requisitos para a sua realização, 
bem como a evolução legislativa acerca do assunto e seu enfrentamento pelos tribunais 
superiores. Dessa forma, o problema que guiou a pesquisa foi respondido de forma afirmativa, 
evidenciando-se a necessidade da criação de uma legislação específica acerca do assunto a fim 
63 
 
de melhor regulamentar tal questão para haver mais qualidade na condução do procedimento 
de reprodução assistida post mortem. 
 
REFERÊNCIAS 
 
AGÊNCIA SENADO. “Projeto legaliza implantação de embriões após a morte de um dos 
membros do casal.” Senado Federal, 4 julho 2022. Disponível em: 
<https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/07/04/projeto-legaliza-implantacao-de-
embrioes-apos-a-morte-de-um-dos-membros-do-casal>. Acesso: em 24 de set. de 2023. 
 
BERGAMO, Bruno. Reprodução Assistida Post Mortem e sua Eficácia no Sistema Jurídico 
Brasileiro | Jus Brasil. Jus Brasil. Disponível em: 
<https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reproducao-assistida-post-mortem-e-sua-eficacia-no-
sistema-juridico-brasileiro/305585189>. Acesso em: 23 ago. 2023. 
 
BRASIL. Câmara dos Deputados. Projeto de Lei nº 1.218, de 2020. Altera a redação do art. 
1.798 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, para estabelecer direito à sucessão de filho 
gerado por meio de inseminação artificial após a morte do autor da herança. Brasília: Câmara 
dos Deputados, 2020. Disponível em: 
<https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=node0hnj3rn3n
800gsn9o7rx0vd3l1444088.node0?codteor=1937682&filename=Avulso+-PL+1218/2020>. 
Acesso em: 20 set. 2023. 
 
BRASIL. Código civil. 22. ED. São Paulo: Saraiva, 2016 
 
BRASIL. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM n° 2.320, de 20 de setembro de 2022. 
Adota as normas éticas para a utilização das técnicas de reprodução assistida. Diário Oficial 
[da] República Federativa do Brasil/D.O.U., Brasília, 15 de jun. 2021. 
 
BRASIL. Constituição (1998). Constituição: República Federativa do Brasil. Brasília: Senado 
Federal, 1988. 
 
BRASIL. Vade Mecum. 35. Ed. São Paulo: Saraiva, 2023. 
 
ANDRÉ LOPES CAVALCANTE, Márcio. Somente será permitida a implantação post mortem 
de embriões fertilizados in vitro se houver autorização expressa por testamento ou instrumento 
que o valha em formalidade e garantia. Buscador dizer o Direito, Manaus. Disponível em: 
<https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/ae4503ec3da32f5e90336
04744ec45ae>. Acesso em: 22 ago. 2023. 
 
CÂMARA GUIMARÃES, Pedro. “Direitos sucessórios dos filhos concebidos por 
inseminaçãoartificial homóloga post mortem.” 2022. Conteúdo Jurídico. Disponível em: 
<https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60225/direitos-sucessrios-dos-filhos-
concebidos-por-inseminao-artificial-homloga-post-mortem>. Acesso em 24 set. 2023. 
 
______. Conselho Nacional de Justiça. Provimento CNJ n° 63, de 14 de novembro de 2017. 
Institui modelos únicos de certidão de nascimento, de casamento e de óbito, a serem adotadas 
pelos ofícios de registro civil das pessoas naturais, e dispõe sobre o reconhecimento voluntário 
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/07/04/projeto-legaliza-implantacao-de-embrioes-apos-a-morte-de-um-dos-membros-do-casal.
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/07/04/projeto-legaliza-implantacao-de-embrioes-apos-a-morte-de-um-dos-membros-do-casal.
https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reproducao-assistida-post-mortem-e-sua-eficacia-no-sistema-juridico-brasileiro/305585189
https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reproducao-assistida-post-mortem-e-sua-eficacia-no-sistema-juridico-brasileiro/305585189
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=node0hnj3rn3n800gsn9o7rx0vd3l1444088.node0?codteor=1937682&filename=Avulso+-PL+1218/2020
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=node0hnj3rn3n800gsn9o7rx0vd3l1444088.node0?codteor=1937682&filename=Avulso+-PL+1218/2020
https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/ae4503ec3da32f5e9033604744ec45ae
https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/ae4503ec3da32f5e9033604744ec45ae
https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60225/direitos-sucessrios-dos-filhos-concebidos-por-inseminao-artificial-homloga-post-mortem.
https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60225/direitos-sucessrios-dos-filhos-concebidos-por-inseminao-artificial-homloga-post-mortem.
64 
 
e a averbação da paternidade e maternidade socio afetiva no Livro “A” e sobre o registro de 
nascimento e emissão da respectiva certidão dos filhos havidos por reprodução assistida. 2017. 
 
COUTINHO MIRANDA SANTOS, Henrique. “Reprodução assistida "post mortem." Jus 
Brasil, 2008. Jus Brasil. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reproducao-
assistida-post-mortem/236655745>. Acesso em: 24 set. 2023. 
 
DÁRIO FAUSTINO DE MOURA, Larissa; DA SILVA SCHOEPS, Patrícia; “Breves 
anotações sobre reprodução assistida post mortem, seus reflexos sucessórios e contratuais 
para com clínicas de reprodução humana assistida e médicos.” IBDFAM, 2021. IBDFAM. 
Disponível em: 
<https://ibdfam.org.br/artigos/1768/Breves+anota%C3%A7%C3%B5es+sobre+reprodu%C3
%A7%C3%A3o+assistida+post+mortem%2C+seus+reflexos+sucess%C3%B3rios+e+contrat
uais+para+com+cl%C3%ADnicas+de+reprodu%C3%A7%C3%A3o+humana+assistida+eou
+m%C3%A9dicos.> Acesso em: 24 set. 2023. 
 
Delfim, Márcio Rodrigo. “As implicações jurídicas decorrentes da inseminação artificial 
homóloga "post mortem." Jus.com.br, 2009. Jus.com.br. Disponível em: 
<https://jus.com.br/artigos/12965/as-implicacoes-juridicas-decorrentes-da-inseminacao-
artificial-homologa-post-mortem>. Acesso em: 24 set. 2023. 
 
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 9. ed. São Paulo, SP: Revista 
Tribunais, 2013. 
 
DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013, 
p. 340 
 
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol. 5. 30ª ed. 2015, p. 503-504. 
 
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol. 5: direito de família. 22ª ed. São 
Paulo: Saraiva, 2007, p. 476. 
 
FERREIRA DE CAMARGO FISCHER, Karla. “Inseminação artificial post mortem e seus 
reflexos no direito de família e no direito sucessório.” IBDFAM, p. 21. IBDFAM. Disponível 
em: <https://ibdfam.org.br/assets/upload/anais/224.pdf>. Acesso em: 24 set. 2023. 
 
FRANÇA, Genival Veloso de. Medicina Legal. 6. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2001. 
p. 225. 
KAPLAN, Bruna Favero. Reprodução assistida post mortem: uma análise sobre os aspectos 
éticos e jurídicos. Ibdfam.org.br. Disponível em: 
<https://ibdfam.org.br/artigos/1863/Reprodu%C3%A7%C3%A3o+assistida+post+mortem%3
A+uma+an%C3%A1lise+sobre+os+aspectos+%C3%A9ticos+e+jur%C3%ADdicos>. Acesso 
em: 23 ago. 2023. 
 
MATOS, Fernanda. “Entenda a reprodução assistida post mortem e conheça seus aspectos 
legais.” Associação Brasileira de Reprodução Assistida | SBRA, 30 novembro 2020, 
Disponível em: <https://sbra.com.br/noticias/entenda-a-reproducao-assistida-post-mortem-e-
conheca-seus-aspectos-legais/>. Acesso em: 24 set. 2023. 
 
 
https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reproducao-assistida-post-mortem/236655745
https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reproducao-assistida-post-mortem/236655745
https://ibdfam.org.br/artigos/1768/Breves+anota%C3%A7%C3%B5es+sobre+reprodu%C3%A7%C3%A3o+assistida+post+mortem%2C+seus+reflexos+sucess%C3%B3rios+e+contratuais+para+com+cl%C3%ADnicas+de+reprodu%C3%A7%C3%A3o+humana+assistida+eou+m%C3%A9dicos.
https://ibdfam.org.br/artigos/1768/Breves+anota%C3%A7%C3%B5es+sobre+reprodu%C3%A7%C3%A3o+assistida+post+mortem%2C+seus+reflexos+sucess%C3%B3rios+e+contratuais+para+com+cl%C3%ADnicas+de+reprodu%C3%A7%C3%A3o+humana+assistida+eou+m%C3%A9dicos.
https://ibdfam.org.br/artigos/1768/Breves+anota%C3%A7%C3%B5es+sobre+reprodu%C3%A7%C3%A3o+assistida+post+mortem%2C+seus+reflexos+sucess%C3%B3rios+e+contratuais+para+com+cl%C3%ADnicas+de+reprodu%C3%A7%C3%A3o+humana+assistida+eou+m%C3%A9dicos.
https://ibdfam.org.br/artigos/1768/Breves+anota%C3%A7%C3%B5es+sobre+reprodu%C3%A7%C3%A3o+assistida+post+mortem%2C+seus+reflexos+sucess%C3%B3rios+e+contratuais+para+com+cl%C3%ADnicas+de+reprodu%C3%A7%C3%A3o+humana+assistida+eou+m%C3%A9dicos.
https://jus.com.br/artigos/12965/as-implicacoes-juridicas-decorrentes-da-inseminacao-artificial-homologa-post-mortem.
https://jus.com.br/artigos/12965/as-implicacoes-juridicas-decorrentes-da-inseminacao-artificial-homologa-post-mortem.
https://ibdfam.org.br/assets/upload/anais/224.pdf.
https://ibdfam.org.br/artigos/1863/Reprodu%C3%A7%C3%A3o+assistida+post+mortem%3A+uma+an%C3%A1lise+sobre+os+aspectos+%C3%A9ticos+e+jur%C3%ADdicos
https://ibdfam.org.br/artigos/1863/Reprodu%C3%A7%C3%A3o+assistida+post+mortem%3A+uma+an%C3%A1lise+sobre+os+aspectos+%C3%A9ticos+e+jur%C3%ADdicos
https://sbra.com.br/noticias/entenda-a-reproducao-assistida-post-mortem-e-conheca-seus-aspectos-legais/
https://sbra.com.br/noticias/entenda-a-reproducao-assistida-post-mortem-e-conheca-seus-aspectos-legais/
65 
 
MONTALBANO, Ana Caroline Oliveira. Inseminação post mortem e seus reflexos no direito 
de família e sucessões. Revista da Esmesc, Florianópolis, v. 19, n. 25, p. 9-34. 2012. 
 
MORAES, Carlos Alexandre. Responsabilidade Civil dos Pais na Reprodução Humana 
Assistida – coordenação Giselda Maria Fernandes Nova Hirokona, Flávio Tartuce. 1 ed. Rio de 
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2019. 
 
MOREIRA FILHO, José Roberto. As novas formas de filiação advindas das técnicas de 
inseminação artificial homóloga post mortem e as suas consequências no direito de família e 
das sucessões. Revista IBDFAM: família e sucessões. Belo Horizonte, n.12, p. 41-63, nov./dez., 
2015. 
 
NASSYRIOS, Gabriela. Reprodução assistida homóloga post mortem e sua eficácia no sistema 
jurídico brasileiro. Jus Brasil, 2016. Jus Brasil. Disponível em: 
<https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reproducao-assistida-homologa-post-mortem-e-sua-
eficacia-no-sistema-juridico-brasileiro/336211317>. Acesso em: 24 set. 2023. 
 
OLIVEIRA MONTALBANO, Ana Caroline. Inseminação post mortem e seus reflexos no 
direito de família e sucessões. ESMESC, vol. 19, no. 25, 2012, p. 26. Revista ESMESC. 
Disponível em: <https://revista.esmesc.org.br/re/article/view/48>. Acesso em 24 set. 2023. 
 
PEREIRA DA CUNHA, Rodrigo; DIAS, Maria Berenice; Direito de Família e o Novo Código 
Civil, 3ª.ed. ver. Atual. e ampl., Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p.xiv (Prefácio à Segunda 
Edição). 
 
Projeto legaliza implantaçãode embriões após a morte de um dos membros do casal. Senado 
Federal. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/07/04/projeto-
legaliza-implantacao-de-embrioes-apos-a-morte-de-um-dos-membros-do-
casal#:~:text=Na%20Resolu%C3%A7%C3%A3o%202.294%2C%20de%2027,acordo%20co
m%20a%20legisla%C3%A7%C3%A3o%20vigente.%22>. Acesso em: 23 ago. 2023. 
 
REDE DE ENSINO LUIZ FLÁVIO GOMES. Liminar autoriza reprodução post mortem. Jus 
Brasil, 2010. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/noticias/liminar-autoriza-
reproducao-post-mortem/2209896>. Acesso em: 24 set. 2023. 
 
RESOLUÇÃO CFM Nº 2168 DE 21/09/2017 - Federal.” LegisWeb, 10 novembro 2017. 
Disponível em: <https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=352362>. Acesso em: 24 set. 
2023. 
 
SOARES MARQUES DIAS, Helena. A reprodução humana assistida homóloga post mortem: 
uma análise à luz do Direito Sucessório brasileiro. 2014. Jus.com.br. Disponível em: 
<https://jus.com.br/artigos/29287/a-reproducao-humana-assistida-homologa-post-mortem-
uma-analise-a-luz-do-direito-sucessorio-brasileiro>. Acesso em: 24 set. 2023. 
 
SCALQUETTE, Ana Claudia Silva. Estatuto da Reprodução Assistida. 2009. 348. Tese 
apresentada no Curso de Pós-Graduação Stricto Sensu. Faculdade de Direito da Universidade 
de São Paulo. São Paulo, 2010. 
 
ZUARDI SPINOLA GARCIA, Felícia. A evolução do direito das famílias e da condução de 
seus conflitos: novos desafios para a sociedade. IBDFAM, 2018. IBDFAM. Disponível em: 
https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reproducao-assistida-homologa-post-mortem-e-sua-eficacia-no-sistema-juridico-brasileiro/336211317.
https://www.jusbrasil.com.br/artigos/reproducao-assistida-homologa-post-mortem-e-sua-eficacia-no-sistema-juridico-brasileiro/336211317.
https://revista.esmesc.org.br/re/article/view/48%3e.
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/07/04/projeto-legaliza-implantacao-de-embrioes-apos-a-morte-de-um-dos-membros-do-casal#:~:text=Na%20Resolu%C3%A7%C3%A3o%202.294%2C%20de%2027,acordo%20com%20a%20legisla%C3%A7%C3%A3o%20vigente.%22
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/07/04/projeto-legaliza-implantacao-de-embrioes-apos-a-morte-de-um-dos-membros-do-casal#:~:text=Na%20Resolu%C3%A7%C3%A3o%202.294%2C%20de%2027,acordo%20com%20a%20legisla%C3%A7%C3%A3o%20vigente.%22
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/07/04/projeto-legaliza-implantacao-de-embrioes-apos-a-morte-de-um-dos-membros-do-casal#:~:text=Na%20Resolu%C3%A7%C3%A3o%202.294%2C%20de%2027,acordo%20com%20a%20legisla%C3%A7%C3%A3o%20vigente.%22
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/07/04/projeto-legaliza-implantacao-de-embrioes-apos-a-morte-de-um-dos-membros-do-casal#:~:text=Na%20Resolu%C3%A7%C3%A3o%202.294%2C%20de%2027,acordo%20com%20a%20legisla%C3%A7%C3%A3o%20vigente.%22
https://www.jusbrasil.com.br/noticias/liminar-autoriza-reproducao-post-mortem/2209896%3e%20.
https://www.jusbrasil.com.br/noticias/liminar-autoriza-reproducao-post-mortem/2209896%3e%20.
https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=352362%3e.
https://jus.com.br/artigos/29287/a-reproducao-humana-assistida-homologa-post-mortem-uma-analise-a-luz-do-direito-sucessorio-brasileiro.
https://jus.com.br/artigos/29287/a-reproducao-humana-assistida-homologa-post-mortem-uma-analise-a-luz-do-direito-sucessorio-brasileiro.
66 
 
<https://ibdfam.org.br/artigos/1273/A+evolu%C3%A7%C3%A3o+do+direito+das+fam%C3
%ADlias+e+da+condu%C3%A7%C3%A3o+de+seus+conflitos:+novos+desafios+para+a+so
ciedade>. Acesso em: 24 set. 2023. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
https://ibdfam.org.br/artigos/1273/A+evolu%C3%A7%C3%A3o+do+direito+das+fam%C3%ADlias+e+da+condu%C3%A7%C3%A3o+de+seus+conflitos:+novos+desafios+para+a+sociedade.
https://ibdfam.org.br/artigos/1273/A+evolu%C3%A7%C3%A3o+do+direito+das+fam%C3%ADlias+e+da+condu%C3%A7%C3%A3o+de+seus+conflitos:+novos+desafios+para+a+sociedade.
https://ibdfam.org.br/artigos/1273/A+evolu%C3%A7%C3%A3o+do+direito+das+fam%C3%ADlias+e+da+condu%C3%A7%C3%A3o+de+seus+conflitos:+novos+desafios+para+a+sociedade.
67 
 
FEMINICÍDIO PRATICADO CONTRA MULHER TRANS: A 
BIOÉTICA DE INTERVENÇÃO E A REINTERPRETAÇÃO DA 
QUALIFICADORA CONTIDA NO INCISO VI DO § 2º DO ARTIGO 121 
DO CÓDIGO PENAL 
 
Bruno de Andrade Martins1 
Eder Neves Leal2 
Jair Pereira Coitinho3 
 
RESUMO 
Este trabalho constitui o resultado de pesquisa efetivada na forma de revisão de bibliografia, 
metodologicamente situada nas grandes áreas bioética e direito penal, no assunto das 
qualificadoras do homicídio doloso, e busca responder a seguinte questão: à luz da bioética de 
intervenção, o feminicídio, como circunstância qualificadora do homicídio (inciso VI do § 2º 
do artigo 121 do Código Penal), tem como vítimas as mulheres apenas pelo sexo biológico, ou 
deve ser interpretado para abranger também as mulheres trans? A importância da pesquisa está 
em que o Brasil foi, em 2022, o país em que mais se mataram pessoas trans no mundo, o que 
impõe uma reinterpretação das regras do homicídio. Nessa ordem de ideias, o trabalho tem o 
objetivo geral de compreender o feminicídio, e o objetivo específico de conduzir a uma 
hermenêutica que tutele adequadamente os direitos das mulheres trans. Assim, na pesquisa, 
chega-se à conclusão de que com base na bioética interventiva uma mulher trans pode, sim, 
configurar-se como sujeito passivo da qualificadora de feminicídio em um homicídio doloso, o 
que impõe a reinterpretação da respectiva qualificadora. 
 
Palavras-chave: Feminicídio; Mulheres Trans; Bioética de Intervenção; Direito Penal. 
 
ABSTRACT 
 
This work constitutes the result of research carried out in the form of a bibliography review, 
methodologically located in the broad area of Criminal Law, on the subject of qualifiers for 
intentional homicide, and it intents to answer the following question: in basis of Intervention 
Bioethics, feminicide, as a qualifying circumstance for homicide (item VI of the § 2 of article 
121 of the Penal Code), has women as victims only because of their biological gender, or should 
it be interpreted to also cover trans women? The importance of the research is that Brazil was, 
in 2022, the country in which the most trans people were killed in the world, which requires a 
reinterpretation of the homicide rules. In this order of ideas, the work has the general objective 
of understanding feminicide, and the specific objective of leading to a hermeneutics that 
adequately protects the rights of trans women. Thus, in the research, we come to the conclusion 
that in basis of Intervention Bioethics a trans woman can, indeed, be configured as a passive 
subject of the qualification of feminicide in an intentional homicide, in fact to reinterpretate the 
institute. 
 
1 Acadêmico do Curso de Direito da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), Campus São Borja. E-mail: 
brunoandrade.aluno@unipampa.edu.br. 
2 Acadêmico do Curso de Direito da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), Campus São Borja. E-mail: 
ederleal.aluno@unipampa.edu.br. 
3 Professor Adjunto do Curso de Direito da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), Campus Sant’Ana do 
Livramento. Doutor em Direito Constitucional (UNIFOR). E-mail: jaircoitinho@unipampa.edu.br. 
mailto:brunoandrade.aluno@unipampa.edu.br
mailto:ederleal.aluno@unipampa.edu.br
mailto:jaircoitinho@unipampa.edu.br
68 
 
Keywords: Feminicide; Trans Women; Intervention Bioethics; Criminal Law. 
 
1 INTRODUÇÃO 
Até pouco tempo atrás, distinguir as pessoas em apenas dois gêneros (masculino e 
feminino), ligados ao sexo biológico, era tarefa considerada usual. Com a evolução social, os 
avanços na seara técnico-científica e o reconhecimento da multiplicidade de formas identitárias, 
notadamente nos últimos 30 anos, tais limites devem ser reinterpretados. 
De certo que para as gerações mais novas, de 20 anos para cá, as coisas são bem mais 
simples e de fácil compreensão. No entanto,para os mais antigos, os que vivenciaram esta fase 
de transição bem no meio de seus ciclos de vida, as coisas já não são tão simples assim. O fato 
é que hoje, já passado um quinto deste século XXI, distinguir as pessoas apenas na condição 
binária “homem” ou “mulher” já não é mais a única visão possível. 
Nesse sentido, mais do que analisar as mudanças de paradigmas sociais dos nossos 
tempos atuais, o tema proposto neste trabalho acadêmico restringir-se-á a alçar uma parte dessa 
celeuma social para responder a seguinte questão: com base na Bioética de intervenção, o 
feminicídio, como circunstância qualificadora do homicídio (inciso VI do § 2º do artigo 121 do 
Código Penal),4 tem como vítimas as mulheres apenas pelo sexo biológico, ou deve ser 
interpretado para abranger também as mulheres trans? 
A pesquisa mostra-se necessária porque não se pode ignorar o aumento exponencial dos 
índices de violência contra pessoas trans e a motivação que leva os autores de crimes brutais 
contra essa parcela da população, e que merecem a mesma diligência do Estado na investigação, 
na apuração e na aplicação da lei penal. Com efeito, em 2022, o Brasil foi, pela 14ª vez consecutiva, 
o país que mais matou pessoas trans no mundo (BENEVIDES, 2023). 
Considerando-se também que no Brasil há cerca de quatro milhões de pessoas 
transgênero ou não binárias (BRASIL, Ministério da Saúde, 2023), insta repensar-se na Bioética 
como uma metódica que, em busca da diminuição de desigualdades e da promoção da Justiça, 
auxilie a reinterpretação do texto normativo da qualificadora do feminicídio para que sejam 
incluídas como vítimas as mulheres trans. 
 
4 A redação do texto legal é esta: “Homicídio qualificado - § 2° Se o homicídio é cometido: [...]VI - contra a 
mulher por razões da condição de sexo feminino: (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) [...] Pena - reclusão, de 
doze a trinta anos”. 
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13104.htm#art1
69 
 
Propôs-se desenvolver o presente trabalho de pesquisa em vista de existirem 
controvérsias no que tange ao entendimento e à interpretação ora proposta. Na doutrina, há 
quem afirme não caber a qualificadora de feminicídio quando a vítima é uma mulher trans. Não 
obstante, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vêm 
adotando decisões no sentido de proteger de forma igual as mulheres, independentemente da 
condição biológica. 
Para os fins deste artigo, será feita na terceira seção a conexão da Bioética de intervenção 
com a hermenêutica constitucional, notadamente quanto aos direitos fundamentais, para 
concluir pela (re)interpretação dos crimes contra a vida de mulheres trans. Antes, porém, é 
preciso estabelecer as premissas da Bioética interventiva – é o que se fará na segunda seção. 
 
2 MULHERES TRANS E A COMPREENSÃO TRADICIONAL DO FEMINICÍDIO: A 
CRÍTICA A PARTIR DA BIOÉTICA DE INTERVENÇÃO 
 
O chamado “transexualismo” é melhor identificado hoje como simplesmente “trans”, 
condição de gênero e que, como tal, resulta de uma construção não dada aprioristicamente pelo 
sexo biológico. É dizer, gênero feminino não é necessariamente o mesmo que sexo feminino; 
por isso, a tutela jurídica haverá de ser integral quer numa, quer noutra situação. É o que se 
procurará demonstrar nesta seção. 
 
2.1 Uma premissa: gênero é construído, não imposto 
 
A pessoa transgênero refere-se à condição do indivíduo cuja identidade de gênero difere 
daquela designada no seu nascimento. Diz-se que “trans” é quem se considera pertencente a um 
gênero diverso do que suporia ser seu sexo biológico de nascimento (com aparelho reprodutor 
masculino ou feminino). Na definição contida em Noah Adams et al. (2017): 
Depending on cultural and geographic context, transgender may be seen as a gender 
identity that denotes a desire to live in a gender role different from that assigned at 
birth, and/or ‘‘an umbrella term which includes transsexuals, cross dressers, 
intersex... persons, gender variant persons and many [others that may or may not 
have] ... undergone any surgery or physiological changes.” 
Assim, pessoas transgênero devem ser vistas desde um enfoque de diversidade, respeito 
e inclusão visto que não se trata apenas de “desejo” sexual: “o transexualismo representa uma 
alteração da psique que dificulta e muitas vezes inviabiliza a integração do indivíduo na 
sociedade” (ARAÚJO, 2000, p. 11). 
70 
 
Para enquadrar as pessoas trans em definições tradicionais, falava-se em patologia 
(ARAN, 2011, p. 49): 
[...] o transexualismo é considerado uma patologia por ser definido como um 
"transtorno de identidade", dada a não-conformidade entre sexo e gênero. Por outro 
lado, ele também pode ser considerado uma psicose graças à suposta recusa da 
diferença sexual. O que define este diagnóstico é uma concepção normativa dos 
sistemas de sexo-gênero, a qual se converte em um sistema regulador da sexualidade. 
Em resposta, teria a Bioética de princípios a potencialidade de iniciar o reconhecimento 
da “disforia” entre sexo/gênero a partir do humanismo e do princípio da beneficência, nos como 
indica Patrícia Soley-Beltran (2014): 
La transexualidad, el transgénero y otras migraciones de género como prácticas y 
categorías médicas han estado atravesadas por cuestiones de bioética desde sus 
mismos inicios. El impulso que movió a un sector de la clase médica a acuñar la 
distinción sexo/género como parte de los protocolos de tratamiento y etiología de la 
denominada disforia de género fue considerada por este mismo sector como una 
acción inspirada por una ética humanista, pues su fin era aliviar el sufrimiento de los 
pacientes que declaraban sentir un doloroso desacuerdo entre su identidad - 
masculina o femenina - y su morfología física. 
Ocorre que desde 2019, com a 11ª revisão da ICD (International Classification of 
Diseases), a transexualidade deixou de constituir um transtorno mental e foi redefinida como 
uma “incongruência de gênero” (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2022): 
Gender Incongruence of Adolescence and Adulthood is characterised by a marked 
and persistent incongruence between an individual´s experienced gender and the 
assigned sex, which often leads to a desire to ‘transition’, in order to live and be 
accepted as a person of the experienced gender, through hormonal treatment, 
surgery or other health care services to make the individual´s body align, as much 
as desired and to the extent possible, with the experienced gender.5 
Com isso, passou efetivamente para o capítulo das “conditions related to sexual 
health”6 (item 17), de modo a impor a atenção integral à saúde de tais pessoas, algo que, no 
Brasil, tomara forma desde o ano de 2008, quando o Ministério da Saúde, por meio da Portaria 
nº 1.707, formalizou diretrizes técnicas e éticas para a atenção ao Processo Transexualizador 
no Sistema Único de Saúde (SUS). 
Para isso, iniciaram-se movimentos como a possibilidade de adequar o sexo biológico 
ao gênero psíquico mediante cirurgia de redesignação sexual. A realização da cirurgia 
 
5 Em tradução livre: “A Incongruência de Gênero da Adolescência e da Idade Adulta é caracterizada por uma 
incongruência marcante e persistente entre o gênero vivenciado de um indivíduo e o sexo atribuído, o que muitas 
vezes leva a um desejo de 'transição', a fim de viver e ser aceito como pessoa da experiência vivida. gênero, por 
meio de tratamento hormonal, cirurgia ou outros serviços de saúde para alinhar o corpo do indivíduo, tanto quanto 
desejado e na medida do possível, com o gênero vivenciado.” 
6 Em tradução livre: “condições relacionadas à saúde sexual”. 
71 
 
representa um direito fundamental do ser humano ligado à sua identidade pessoal, ao seu 
equilíbrio psíquico e ao direito à sua dignidade. Cuida-se,não de uma cirurgia de mutilação, 
mas de um procedimento realizado sob recomendação médica e orientação psicológica, para 
que o interior e o exterior do indivíduo possam harmonizar-se. 
De qualquer forma, ver-se-á adiante que a realização de intervenções para a 
redesignação sexual não é pressuposto para a alteração do gênero de alguém. “Não se nasce 
mulher, torna-se mulher”, registrou Simone de Beauvoir (1980, p. 17), o que indica que o que 
se tem como gênero é resultante da construção identitária própria da pessoa. 
Diz-se por isso que “la identidad es privada, interna y es independiente del modo de 
vestir, actuar, andar o con quien se tienen relaciones sexuales” (ALCALA-MERCADO, 2020, 
p. 14), a impor uma reinterpretação da tutela dos direitos das pessoas transgênero que ultrapasse 
a simbologia tradicional. A base para tanto será a Bioética de intervenção, mas antes disso é 
preciso criticar a forma tradicional como as mulheres trans são vistas. É o que se fará no 
próximo item. 
 
2.2 O “estado da arte” 
 
Como lembrado por Cézar Roberto Bitencourt (2017, p. 94-95), o feminicídio não 
constitui um tipo penal novo ou um crime; trata-se, em realidade, de uma circunstância 
qualificadora do homicídio doloso, com a inserção do inciso VI no § 2º do art. 121 do Código 
Penal por meio da Lei nº 13.104/2015. Além disso, essa lei alterou também a Lei nº 8.072/1990, 
para inserir o feminicídio no rol dos crimes hediondos. 
Segundo o texto incluído no Código Penal, o feminicídio é o homicídio doloso cometido 
“contra a mulher por razões da condição de sexo feminino”. Todavia, a lei foi além e, em seu 
próprio corpo, trouxe uma norma penal explicativa, através de seu § 2º-A do mesmo artigo 121 
do Código Penal. Assim, considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o 
crime envolve: I - violência doméstica e familiar ou II - menosprezo ou discriminação à 
condição de mulher”. 
Através do texto normativo, verifica-se, em uma interpretação literal, que o legislador 
teria sido taxativo em limitar a qualificadora a apenas essas duas hipóteses e nos casos de o 
homicídio ser praticado especificamente contra uma mulher (do ponto de vista biológico). 
72 
 
Ou seja, esse § 2º-A foi acrescentado para esclarecer quando o assassinato de uma 
mulher deverá ser considerado motivado em razão do sexo feminino. Oportuno que se ressalte 
que o conceito de violência doméstica e familiar, constante do inciso I, pode ser obtido no art. 
5º da Lei nº 13.340/2006 (Lei Maria da Penha), a qual será retomada mais à frente neste 
trabalho. 
Chama a atenção do leitor que, como bem ressaltou Cleber Masson (2018, p. 45), o 
reconhecimento da violência doméstica ou familiar contra a mulher não é suficiente para a 
configuração do feminicídio. Ou seja, para que ocorra o feminicídio, o homicídio haverá de ter 
sido motivado por “razões de condição do sexo feminino”, e, por consequência dessas razões, 
resulte a violência doméstica ou familiar. 
Já no requisito “menosprezo ou discriminação à condição de mulher”, não se exige que 
a violência tenha ocorrido no âmbito doméstico ou familiar, bastando o menosprezo do autor 
pela condição de mulher da vítima. 
No mesmo sentido, manifesta-se Rogério Sanches Cunha (2017, p. 96), afirmando que 
o feminicídio pressupõe uma violência motivada no gênero, ou seja, trata-se de agressões cuja 
motivação é a opressão à mulher. Nesse ínterim, torna-se imprescindível que a conduta do 
agente tenha sido motivada pelo menosprezo ou discriminação à condição de mulher da vítima. 
Por fim, mais uma vez enfatiza-se a notoriedade de Rogério Sanches Cunha (2018, p. 
64) ao lembrar que a incidência da qualificadora reclama situação de violência praticada contra 
a mulher, em contexto caracterizado por relação de poder e submissão praticada por homem ou 
por mulher (a agente) sobre outra mulher (a vítima) em situação de vulnerabilidade. 
Por todo o exposto, ficaria razoavelmente claro e fácil subsumir um homicídio doloso 
na qualificadora do art. 121, § 2º, inciso VI, do Código Penal, qual seja, o feminicídio, quando 
a vítima é mulher e claros restarem os fatos e evidências que permitam à autoridade policial e 
ao Ministério Público entenderem que houve, no caso concreto, os requisitos exigidos pelo texto 
normativo em sua literalidade. 
Ocorre, porém, que essa interpretação conduz à exclusão de mulheres trans, cuja 
identidade feminina não pode ser desconsiderada. Para a resolução do problema, propõe-se 
tomar por base a Bioética de intervenção, como se verá no próximo item. 
 
73 
 
2.3 A Bioética de intervenção como instrumento metodológico apto à resolução do 
problema 
 
A Bioética tal como conhecida e estudada tradicionalmente é baseada nos princípios de 
Autonomia, Não Maleficência, Beneficência e Justiça é resultado de um modelo liberal 
implementado desde a segunda metade do Século XX. Como destaca Volnei Garrafa (2005, p. 
128), “[a] bioética se difundiu pelo mundo partindo dos EUA: uma bioética anglo-saxônica, 
com forte conotação individualista e cuja base de sustentação repousava sobre a autonomia dos 
sujeitos sociais”. 
Nessa ordem, ideias como são vistas a partir da liberdade individual em detrimento de 
um modelo inclusivo. Não por acaso, continua Volnei Garrafa (2005, p. 128-129): 
 [a] abordagem de grande parte das questões do âmbito da bioética foi reduzida à 
esfera individual, tratando preferencialmente das contradições: autonomia versus 
autonomia e autonomia versus beneficência. A partir de abusos históricos (como no 
caso Tuskegee) ou das denúncias apresentadas por Henry Beecher(8), a bioética foi 
criada, pelo menos inicialmente, para defender os indivíduos mais frágeis nas 
relações entre profissionais de saúde e seus pacientes ou entre empresas/institutos 
de pesquisa e os cidadãos. 
Ocorre, contudo, que para países de modernidade tardia, como é o caso do Brasil, 
detentor de elevados índices de desigualdade e de intolerância em relação a minorias 
vulneráveis, impõe-se adotar um modelo epistemológico mais duro: entra aí a noção de uma 
bioética “interventiva”, nos moldes do que preconizou o autor (GARRAFA, 2005, p. 130): 
Essa nova proposta conceitual e prática, denominada “bioética de intervenção”, 
propõe uma aliança concreta com o lado historicamente mais frágil da sociedade, 
“(...) incluindo a reanálise de diferentes dilemas, dentre os quais: autonomia versus 
justiça/eqüidade, benefícios individuais versus benefícios coletivos, individualismo 
versus solidariedade, omissão versus participação e mudanças superficiais versus 
transformações concretas e permanentes”.7 
 
Nessa reanálise, a Bioética interventiva indica como pontos elementares justificáveis 
(GARRAFA, 2005, p. 130-131): 
a) “no campo público e coletivo: a priorização de políticas e tomadas de decisão que 
privilegiem o maior número de pessoas, pelo maior espaço de tempo e que resultem 
nas melhores conseqüências, mesmo que em prejuízo de certas situações 
individuais, com exceções pontuais a serem discutidas;” 
 
7 Id. Ibid. p. 130. 
 
74 
 
b) “no campo privado e individual: a busca de soluções viáveis e práticas para 
conflitos identificados com o próprio contexto onde os mesmos acontecem”. 
Na medida em que o reconhecimento e a proteção de minorias, com a erradicação das 
desigualdades, são objetivos da República Federativa do Brasil (inciso IV do art. 3º da CF), a 
Bioética de intervenção assume papel relevantíssimo na medida em que, para dialogar com as 
promessas fundantes do Estado Democrático de Direito, “[f]az opção pela banda frágil da 
sociedade e se propõe a lutar contra todas as formas de opressão e pela promoção da justiça, 
tendo como referencial o princípio da equidade” (FEITOSA; NASCIMENTO, 2015). 
Como consequência, a discussão sobre a identidade de gênero a partirda Bioética de 
intervenção ganha contornos de suceder outras teorias: entre as superadas (ALCALA-
MERCADO, 2020, p. 14): 
[e]stán las teorías sobre los derechos humanos (Cviklová 2012, 45), sobre los 
derechos sexuales y reproductivos, el derecho a la salud, a la vida, a la familia, que 
en el caso del hombre T se refiere a la fertilidad y a las tecnologías de reproducción 
(Armuand et al. 2017, 283), o a los cuidados de la diversidad o de la reproducción en 
estas personas por ser diversas (Hoffkling et al. 2017, 332), y a la paternidad 
mediante adopción por parte de padres diversos (Goldberg et al. 2014, 221) o al 
mercado queer como grupo particular de consumo (Eichler 2012, 1). 
Diz-se assim que a proposta da Bioética de intervenção é a construção de paradigmas 
que busquem, no campo epistemológico, o reconhecimento das minorias vulneráveis; e, no 
campo político, a concretização, quer na área da saúde, quer na área do Direito, de práticas 
comprometidas com a transformação dessa realidade social que hoje é injusta. 
Isso dialoga com a hermenêutica sistemática e que busque a máxima concretização dos 
direitos fundamentais, como se indicará na próxima seção deste trabalho. 
 
3 A BIOÉTICA INTERVENTIVA E A HERMENÊUTICA EM BUSCA DE UMA 
PROTEÇÃO EFETIVA DOS DIREITOS DAS MULHERES TRANS 
 
Buscada a igualdade a partir de uma Bioética interventiva, que busca dar visibilidade às 
minorias vulneráveis, emancipa-se também o conteúdo do “caput” do art. 5º da Constituição 
Federal (CF) para que mulheres (por sexo ou por gênero) sejam protegidas não apenas “no” 
Direito, mas também “perante” o Direito. 
Nesse sentido, Laura Saldivia Menajovsky (2018, p. 137) registra que: 
El paradigma despatologizador del género que encumbra a la autonomía personal 
como su pilar organizador es reflejo de una bioética preocupada por la dignidad 
75 
 
humana y por la protección de los derechos humanos de los grupos más 
desaventajados. Consiste en una bioética respetuosa de la autopercepción que tienen 
las personas respecto de un aspecto íntimo y fundamental de su identidad personal 
como es el género. Además, importa el reconocimiento de la situación de desigualdad 
estructural en la que se encuentran las personas transgénero, brindando 
herramientas para modificar tal desigualdad. 
 Essa nova noção da Bioética articula-se com uma hermenêutica que se projeta a partir 
da Constituição Federal em direção à dignidade humana (artigo 1º, inciso III), afinal as normas 
devem ser vistas, não como mero conjunto de normas justapostas, mas como um sistema 
normativo íntegro e coerente. Com efeito, se se reconhece que “qualquer exegese comete, direta 
ou indiretamente, uma aplicação de princípios gerais, de normas e de valores constituintes da 
totalidade do sistema jurídico” (FREITAS, 1995, p. 47), o princípio da unidade aperfeiçoa-se 
como especificação da própria interpretação sistemática. 
 Nesse sentido, ressalta Jorge Miranda (1990, p. 197-198): 
O Direito não é mero somatório de regras avulsas, produto de ato de vontade, ou mera 
concatenação de fórmulas verbas articuladas entre si. O Direito é um ordenamento ou 
conjunto significativo e não conjunção resultada de vigência simultânea; é coerência 
ou, talvez mais rigorosamente, consistência; é unidade de sentido, é valor incorporado 
em regra. 
 Com base nessa perspectiva, é preciso que o Direito busque a concretização da promessa 
constitucional mediante coerência e integridade, qualidades que informam o sistema como um 
todo, nos dizeres de Ronald Dowrkin (1999, p. 213 e segs.). 
 
3.1 Reinterpretando o espectro do feminicídio 
 
Numa interpretação conservadora e literal, não haveria que se falar em feminicídio na 
morte da mulher trans, pois biologicamente a vítima era homem. Tal interpretação se prende à 
justificativa de que entendimento diverso seria prejudicial ao autor do crime, constituindo-se 
em uma analogia in malam partem, não tolerada pelo Direito Penal. 
Na mesma perspectiva, se a vítima fosse biologicamente mulher e, por gênero, homem, 
ter-se-ia presente a condição do “sexo” (biológico) feminino, pelo que cabível a qualificadora 
do feminicídio. 
O que este trabalho acadêmico visa é exatamente descontruir essa interpretação, 
carreando para uma nova interpretação. Lembra-se, a propósito, das palavras de Carlos 
Maximiliano (2004, p. 7), para quem: 
Interpretar é explicar, esclarecer; dar o significado de vocábulo, atitude ou gesto; 
reproduzir por outras palavras um pensamento exteriorizado; mostrar o sentido 
76 
 
verdadeiro de uma expressão; extrair, de frase, sentença ou norma, tudo o que na 
mesma se contém. 
 
Com efeito, o problema de pesquisa aqui estudado é exemplo de que a interpretação, 
mesmo nos casos em que a lei se mostre aparentemente clara, sempre será necessária, pois a 
sociedade, seus conceitos e seus paradigmas são mutáveis e voláteis, de forma que decorrido 
pouco tempo após a elaboração da norma, poderão surgir casos concretos que suscitarão 
dúvidas sobre o efetivo alcance daquela norma. No mesmo sentido é a lição de Hans Kelsen 
(1998, p. 392), para quem “a necessidade de uma interpretação resulta justamente do fato de a 
norma aplicar ou o sistema das normas deixarem várias possibilidades em aberto...”. 
Percebe-se que a forma de tratamento adotada pela interpretação conservadora com 
relação à possibilidade de uma mulher trans ser vítima de feminicídio remete a uma 
interpretação gramatical, também denominada literal ou sintática; e declaratória, também 
denominada declarativa ou estrita. Isso porque se apega ao fato de no art. 121, § 2º, inciso VI, 
do Código Penal, estarem escritas taxativamente as expressões “contra a mulher” e “sexo 
feminino”. 
Ocorre que, com base no paradigma teórica apontado acima, a redação do texto legal da 
qualificadora do feminicídio não foi adequada, pois no lugar de “razões da condição de sexo 
feminino”, melhor seria se tivesse utilizado algo como em “razão de gênero feminino”, assim 
como fez a Lei Maria da Penha. 
Segundo Cleber Masson (2018, p. 43), o Projeto de Lei nº 8.305/2014, que culminou na 
Lei nº 13.104/2015, teria adotado o termo “razões de gênero”, mas este foi substituído em 
decorrência de manobras políticas da bancada conservadora do Congresso Nacional, 
exatamente com a finalidade de excluir as mulheres trans da tutela do feminicídio. 
No entanto, erros e impropriedades gramaticais em textos legais não são novidade, nem 
tampouco privilégio da qualificadora ora em estudo. Isso faz aumentar a responsabilidade na 
hermenêutica do texto legal – para o que este trabalho se serve da Bioética de intervenção na 
medida em que esta procura “[d]emonstrar o papel do Estado de garantir livre, justa e solidária, 
o respeito aos direitos humanos fundamentais e sua aproximação com bioética” (CRUZ; 
MELO, 2020, p. 71). 
Há ademais importante legislação atual que veio com a missão de resguardar os direitos 
e proteger as mulheres vítimas de violência doméstica e familiar. Refere-se, assim, à Lei nº 
11.340/2006 (Lei Maria da Penha), cujo artigo 2º destaca que “toda mulher, independentemente 
de classe, raça, etnia, orientação sexual, (...), goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa 
77 
 
humana (...)”, o que se coaduna com a Bioética interventiva que ruma para a diminuição de 
desigualdades e para a construção de uma sociedade mais livre, respeitosa e inclusiva. 
Já no art. 4º consta que, “na interpretação desta Lei, serão considerados os fins sociais 
a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de 
violência doméstica e familiar.” Por oportuno, ressalta-se que igual entendimento se faz a partir 
do art. 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), segundo o qual “na 
aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem 
comum”. 
Por fim, destaca-se o art. 5º dareferida lei, segundo o qual “[c]onfigura violência 
doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe 
cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. Esse 
artigo mais uma vez traz à tona o conceito de violência doméstica definida como sendo a 
agressão contra mulher, num determinado ambiente, qual seja o doméstico, familiar ou de 
intimidade, com finalidade específica de objetá-la, isto é, dela retirar direitos, aproveitando-se 
da sua hipossuficiência. Destaca-se contudo a redação do texto normativo, que foi feliz ao 
utilizar a expressão “baseada no gênero”, pois se assim o é, por que não se poderia identificar 
uma pessoa trans como integrante do gênero feminino? 
Desses textos normativos permite-se obter a interpretação segundo a qual as mulheres 
trans devem receber as mesmas garantias que as mulheres cisgênero, no que se tem também a 
doutrina de Cézar Roberto Bitencourt (2017, p. 96): 
Por isso, na nossa ótica, somente quem for oficialmente identificado como mulher 
(certidão do registro de nascimento, identidade civil ou passaporte), isto é, apresentar 
sua documentação civil identificando-a como mulher, poderá ser sujeito passivo dessa 
qualificadora. Nesse sentido, é irrelevante que tenha nascido do sexo feminino, ou que 
tenha adquirido posteriormente, por decisão judicial, a condição legalmente 
reconhecida como do sexo feminino. (...). Cumpridas essas formalidades, a pessoa é 
reconhecida legalmente como do sexo feminino e ponto final. É mulher e tem o direito 
de receber as mesmas garantias à mesma proteção legal dispensada a quem nasceu 
mulher. 
Na mesma linha de raciocínio, Rogério Sanches Cunha (2018, p. 70) ressalta: 
A nosso ver, a mulher de que trata a qualificadora é aquela assim reconhecida 
juridicamente. No caso de transexual que formalmente obtém o direito de ser 
identificado civilmente como mulher, não há como negar a incidência da lei penal 
porque, para todos os efeitos, esta pessoa será considerada mulher. A proteção 
especial não se estende, todavia, ao travesti, que não pode ser identificado como 
pessoa do gênero feminino. 
 
Restaria ainda verificar se e em que medida tais lições encontram eco nos precedentes 
jurisprudenciais. É o que se pretende fazer no próximo item deste trabalho. 
78 
 
3.2 Os precedentes das Cortes Supremas: mulher trans é mulher sim! 
 
A interpretação que, a par da tutela de direitos fundamentais, repousa também na 
Bioética interventiva em prol das pessoas trans, tem sido chancelada tanto pelo Supremo 
Tribunal Federal (STF), quanto pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), chamados de “Cortes 
Supremas” em matéria respectivamente de interpretação/aplicação constitucional e 
infraconstitucional. 
O Pleno do STF, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 4275, 
admitiu por unanimidade a possibilidade de alteração de nome e gênero no assento de registro 
civil mesmo sem a realização de cirurgia de redesignação de sexo. A ementa do acórdão foi 
esta (BRASIL, 2018): 
Ementa: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO 
CONSTITUCIONAL E REGISTRAL. PESSOA TRANSGÊNERO. ALTERAÇÃO 
DO PRENOME E DO SEXO NO REGISTRO CIVIL. POSSIBILIDADE. DIREITO 
AO NOME, AO RECONHECIMENTO DA PERSONALIDADE JURÍDICA, À 
LIBERDADE PESSOAL, À HONRA E À DIGNIDADE. INEXIGIBILIDADE DE 
CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO OU DA REALIZAÇÃO DE 
TRATAMENTOS HORMONAIS OU PATOLOGIZANTES. 
1. O direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de 
gênero. 
2. A identidade de gênero é manifestação da própria personalidade da pessoa humana 
e, como tal, cabe ao Estado apenas o papel de reconhecê-la, nunca de constituí-la. 
3. A pessoa transgênero que comprove sua identidade de gênero dissonante daquela 
que lhe foi designada ao nascer por autoidentificação firmada em declaração escrita 
desta sua vontade dispõe do direito fundamental subjetivo à alteração do prenome e 
da classificação de gênero no registro civil pela via administrativa ou judicial, 
independentemente de procedimento cirúrgico e laudos de terceiros, por se tratar de 
tema relativo ao direito fundamental ao livre desenvolvimento da personalidade. 
4. Ação direta julgada procedente. 
 
A premissa de que partiu a Corte sobre o papel do Estado de reconhecer e não constituir 
a identidade de gênero é importante porque assume o caráter plural da sociedade. 
No mesmo sentido, por meio do Recurso Extraordinário nº 670.422 (Tema 761 - 
Repercussão Geral), Relator o Ministro Dias Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 15 de agosto 
de 2018, o STF decidiu que a pessoa transgênero tem direito fundamental subjetivo à alteração 
de seu prenome e de sua classificação de gênero no registro civil, não se exigindo, para tanto, 
nada além da manifestação da vontade do indivíduo, o qual poderá exercer tal faculdade tanto 
pela via judicial como diretamente pela via administrativa. O acórdão foi assim ementado 
(BRASIL, 2018): 
79 
 
EMENTA Direito Constitucional e Civil. Transexual. Identidade de gênero. Direito 
subjetivo à alteração do nome e da classificação de gênero no assento de nascimento. 
Possibilidade independentemente de cirurgia de procedimento cirúrgico de 
redesignação. Princípios da dignidade da pessoa humana, da personalidade, da 
intimidade, da isonomia, da saúde e da felicidade. Convivência com os princípios da 
publicidade, da informação pública, da segurança jurídica, da veracidade dos registros 
públicos e da confiança. Recurso extraordinário provido. 
1. A ordem constitucional vigente guia-se pelo propósito de construção de uma 
sociedade livre, justa e solidária, voltada para a promoção do bem de todos e sem 
preconceitos de qualquer ordem, de modo a assegurar o bem-estar, a igualdade e a 
justiça como valores supremos e a resguardar os princípios da igualdade e da 
privacidade. Dado que a tutela do ser humano e a afirmação da plenitude de seus 
direitos se apresentam como elementos centrais para o desenvolvimento da sociedade, 
é imperativo o reconhecimento do direito do indivíduo ao desenvolvimento pleno de 
sua personalidade, tutelando-se os conteúdos mínimos que compõem a dignidade do 
ser humano, a saber, a autonomia e a liberdade do indivíduo, sua conformação interior 
e sua capacidade de interação social e comunitária. 
2. É mister que se afaste qualquer óbice jurídico que represente restrição ou limitação 
ilegítima, ainda que meramente potencial, à liberdade do ser humano para exercer sua 
identidade de gênero e se orientar sexualmente, pois essas faculdades constituem 
inarredáveis pressupostos para o desenvolvimento da personalidade humana. 
3. O sistema há de avançar para além da tradicional identificação de sexos para abarcar 
também o registro daqueles cuja autopercepção difere do que se registrou no momento 
de seu nascimento. Nessa seara, ao Estado incumbe apenas o reconhecimento da 
identidade de gênero; a alteração dos assentos no registro público, por sua vez, pauta-
se unicamente pela livre manifestação de vontade da pessoa que visa expressar sua 
identidade de gênero. 
4. Saliente-se que a alteração do prenome e da classificação de sexo do indivíduo, 
independente de dar-se pela via judicial ou administrativa, deverá ser coberta pelo 
sigilo durante todo o trâmite, procedendo-se a sua anotação à margem da averbação, 
ficando vedada a inclusão, mesmo que sigilosa, do termo “transexual” ou da 
classificação de sexo biológico no respectivo assento ou em certidão pública. Dessa 
forma, atende-se o desejo do transgênero de ter reconhecida sua identidade de gênero 
e, simultaneamente, asseguram-se os princípios da segurança jurídica e da confiança, 
que regem o sistema registral. 
5. Assentadas as seguintes teses de repercussão geral: i) O transgênero tem direito 
fundamental subjetivo à alteração de seu prenome e de sua classificação de gênero no 
registrocivil, não se exigindo, para tanto, nada além da manifestação da vontade do 
indivíduo, o qual poderá exercer tal faculdade tanto pela via judicial como diretamente 
pela via administrativa. ii) Essa alteração deve ser averbada à margem no assento de 
nascimento, sendo vedada a inclusão do termo ‘transexual’. iii) Nas certidões do 
registro não constará nenhuma observação sobre a origem do ato, sendo vedada a 
expedição de certidão de inteiro teor, salvo a requerimento do próprio interessado ou 
por determinação judicial. iv) Efetuando-se o procedimento pela via judicial, caberá 
ao magistrado determinar, de ofício ou a requerimento do interessado, a expedição de 
mandados específicos para a alteração dos demais registros nos órgãos públicos ou 
privados pertinentes, os quais deverão preservar o sigilo sobre a origem dos atos. 
6. Recurso extraordinário provido. 
O STF deixou claro que a alteração do nome e da classificação de gênero independe de 
procedimento cirúrgico de redesignação de sexo. Decidiu, ainda, que a alteração pretendida 
80 
 
deve ser averbada à margem no assento de nascimento, sendo vedada a inclusão do termo 
“transexual”. 
O STF também julgou procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão 
(ADO) nº 26 e o Mandado de Injunção (MI) nº 4733 para reconhecer a mora do Congresso 
Nacional em tipificar atos atentatórios a direitos fundamentais dos integrantes da comunidade 
LGBTQIAPN+. Como forma de resolver temporariamente a questão, equiparou tais atos ao 
racismo, assentando a expressão segundo a qual (BRASIL, 2019): 
Garantir aos integrantes do grupo LGBTI+ a posse da cidadania plena e o integral 
respeito tanto à sua condição quanto às suas escolhas pessoais pode significar, nestes 
tempos em que as liberdades fundamentais das pessoas sofrem ataques por parte de 
mentes sombrias e retrógradas, a diferença essencial entre civilização e barbárie. 
Nesse âmbito, tem-se decisão do Ministro Luís Roberto Barroso, Relator da Arguição 
de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 527, ajuizada pela Associação 
Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT) e que questionava decisões judiciais 
contraditórias na aplicação da Resolução Conjunta da Presidência da República e do Conselho 
de Combate à Discriminação nº 1/2014, que estabeleceu parâmetros de acolhimento do público 
LGBTQIAPN+ submetido à privação de liberdade nos estabelecimentos prisionais brasileiros. 
Na decisão monocrática proferida em 19 de março de 2021, o Relator ajustou medida cautelara 
deferida em 26 de junho de 2019 para permitir “que presas transexuais e travestis com 
identidade de gênero feminino possam optar por cumprir penas em estabelecimento prisional 
feminino ou masculino” (BRASIL, 2021). 
Segundo constou no pronunciamento (BRASIL, 2021): 
[a] decisão mais adequada do ponto de vista da dignidade de tais grupos, 
extremamente vulneráveis e estigmatizados, não implicaria apenas olhar para 
questões de identidade de gênero, tais como direito ao nome, à alteração de registro e 
ao uso de banheiro, mas também para as relações de afeto e múltiplas estratégias de 
sobrevivência que eles desenvolvem na prisão. 
A ADPF foi extinta, e a cautelar, revogada, por julgamento virtual encerrado no dia 14 
de agosto de 2023, em razão da edição de Resolução do CNJ que alterou substancialmente o 
panorama normativo descrito quando de seu início. Não obstante, constituiu-se em mais um 
passo rumo à tutela efetiva dos direitos das pessoas trans. 
No âmbito do STJ, acórdão da Sexta Turma no Recurso Especial nº 1.977.124/SP, 
relator Ministro Rogério Schietti Cruz, julgado em 05 de abril de 2022, deu pela interpretação 
teleológica da Lei nº 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), a fim de que tal lei possa ser aplicada, 
além das vítimas mulheres (biologicamente falando), também às vítimas mulheres transexuais. 
81 
 
Segundo entendimento daquela Turma, uma mulher trans também pode ser enquadrada como 
vítima de violência doméstica, afastando qualquer distinção entre sexo e gênero nesse tipo de 
violência em particular. A ementa do acórdão foi esta (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, 
2022): 
RECURSO ESPECIAL. MULHER TRANS. VÍTIMA DE VIOLÊNCIA 
DOMÉSTICA. APLICAÇÃO DA LEI N. 11.340/2006, LEI MARIA DA PENHA. 
CRITÉRIO EXCLUSIVAMENTE BIOLÓGICO. AFASTAMENTO. DISTINÇÃO 
ENTRE SEXO E GÊNERO. IDENTIDADE. VIOLÊNCIA NO AMBIENTE 
DOMÉSTICO. RELAÇÃO DE PODER E MODUS OPERANDI. ALCANCE 
TELEOLÓGICO DA LEI. MEDIDAS PROTETIVAS. NECESSIDADE. RECURSO 
PROVIDO. 
1. A aplicação da Lei Maria da Penha não reclama considerações sobre a motivação 
da conduta do agressor, mas tão somente que a vítima seja mulher e que a violência 
seja cometida em ambiente doméstico, familiar ou em relação de intimidade ou afeto 
entre agressor e agredida. 
2. É descabida a preponderância, tal qual se deu no acórdão impugnado, de um fator 
meramente biológico sobre o que realmente importa para a incidência da Lei Maria 
da Penha, cujo arcabouço protetivo se volta a julgar autores de crimes perpetrados em 
situação de violência doméstica, familiar ou afetiva contra mulheres. Efetivamente, 
conquanto o acórdão recorrido reconheça diversos direitos relativos à própria 
existência de pessoas trans, limita à condição de mulher biológica o direito à proteção 
conferida pela Lei Maria da Penha. 
3. A vulnerabilidade de uma categoria de seres humanos não pode ser resumida tão 
somente à objetividade de uma ciência exata. As existências e as relações humanas 
são complexas e o Direito não se deve alicerçar em argumentos simplistas e 
reducionistas. 
4. Para alicerçar a discussão referente à aplicação do art. 5º da Lei Maria da Penha à 
espécie, necessária é a diferenciação entre os conceitos de gênero e sexo, assim como 
breves noções de termos transexuais, transgêneros, cisgêneros e travestis, com a 
compreensão voltada para a inclusão dessas categorias no abrigo da Lei em comento, 
tendo em vista a relação dessas minorias com a lógica da violência doméstica contra 
a mulher. 
5. A balizada doutrina sobre o tema leva à conclusão de que as relações de gênero 
podem ser estudadas com base nas identidades feminina e masculina. Gênero é 
questão cultural, social, e significa interações entre homens e mulheres. Uma análise 
de gênero pode se limitar a descrever essas dinâmicas. O feminismo vai além, ao 
mostrar que essas relações são de poder e que produzem injustiça no contexto do 
patriarcado. Por outro lado, sexo refere-se às características biológicas dos aparelhos 
reprodutores feminino e masculino, bem como ao seu funcionamento, de modo que o 
conceito de sexo, como visto, não define a identidade de gênero. Em uma perspectiva 
não meramente biológica, portanto, mulher trans mulher é. 
6. Na espécie, não apenas a agressão se deu em ambiente doméstico, mas também 
familiar e afetivo, entre pai e filha, eliminando qualquer dúvida quanto à incidência 
do subsistema da Lei n. 11.340/2006, inclusive no que diz respeito ao órgão 
jurisdicional competente - especializado - para processar e julgar a ação penal. 
7. As condutas descritas nos autos são tipicamente influenciadas pela relação 
patriarcal e misógina que o pai estabeleceu com a filha. O modus operandi das 
agressões - segurar pelos pulsos, causando lesões visíveis, arremessar diversas vezes 
contra a parede, tentar agredir com pedaço de pau e perseguir a vítima - são elementos 
próprios da estrutura de violência contra pessoas do sexo feminino. Isso significa que 
o modo de agir do agressor revela o caráter especialíssimo do delito e a necessidade 
de imposição de medidas protetivas. 
8. Recurso especial provido, a fim de reconhecer a violação do art. 5º da Lei n. 
11.340/2006 e cassar o acórdão de origem para determinar a imposição das medidas 
protetivas requeridas pela vítima L. E. S. F. contra o ora recorrido. 
82 
 
 
Concluindo, o STJ deu mais um passo para uma jurisprudência,ainda não sumulada e 
não vinculante, no sentido de que toda forma de violência contra mulheres transgênero seja 
igual à violência praticada contra mulheres cisgênero. 
A ratio decidendi de tais acórdãos indica que se parte de uma interpretação sistemática 
(própria da Bioética de intervenção) e conforme à Constituição que, no catálogo-tópico de 
princípios de interpretação constitucional (CANOTILHO, 1998, p. 1099-1100), surge como 
verdadeiro mecanismo de controle de constitucionalidade ao afirmar a compatibilidade de uma 
lei com a Constituição (SICCA, 1996, p. 29), procedendo à exclusão das possibilidades de 
interpretação entendidas como inconstitucionais (BASTOS, 1999, p. 170). 
A interpretação conforme à Constituição, havida a partir daqueles precedentes, é 
validada pelo princípio da unidade da ordem jurídica (Einheit der Rechtsordnung), que 
considera a Constituição como contexto superior (Vorrangiger Kontext) às demais normas. As 
leis e as normas secundárias devem ser interpretadas, obrigatoriamente, em consonância com a 
Constituição. Ou seja: pode-se chegar a vários sentidos para o mesmo texto normativo, o que é 
muito compreensível num sistema pluralista. No entanto, a partir de um parâmetro de 
razoabilidade (BULOS, 1997, p. 54), deve ser adotada como válida apenas a interpretação que 
a compatibilize com a Constituição, o que implica elastecer ou restringir a norma de acordo 
com tal finalidade. 
Pretende-se, ainda, que a interpretação seja feita conforme a Constituição. Como citado 
em obra de Rogério Sanches Cunha (2018, p. 69), neste tipo interpretativo a norma legal é 
hierarquicamente inferior ao texto constitucional. Dessa forma, propõe-se o confronto entre a 
estrita literalidade do texto legal do feminicídio e a Constituição. Assim procedendo, dentro de 
uma perspectiva bioética interventiva, verifica-se que a literalidade do texto normativo em 
questão está em desacordo com um exercício hermenêutico que dignifique a situação das 
mulheres trans. 
4 CONCLUSÃO 
 
Mercê da maestria de Cézar Roberto Bitencourt e Rogério Sanches Cunha e de suas 
opiniões acerca do assunto, as quais foram reproduzidas na íntegra ao final do tópico anterior 
e, com as quais, oportuno que se diga, concorda-se, ousa-se ir além: para os autores do presente 
trabalho, além das situações em que a pessoa trans já tenha adquirido o seu reconhecimento 
judicial de mulher, será mulher também aquela que assim tiver construído seu gênero, inclusive 
83 
 
as que eventualmente tenham optado por realizar procedimentos cirúrgicos e estéticos a ponto 
de serem fisicamente identificadas com uma mulher biológica. 
Assim, o que se propõe é que nos casos em que o sujeito ativo mata uma mulher trans, 
e desde que o crime tenha sido praticado em uma situação caracterizadora de violência 
doméstica e/ou familiar ou motivado por menosprezo ou discriminação à condição de mulher, 
incidirá a qualificadora contida no inciso VI do § 2º do art. 121 do Código Penal, incluída pela 
Lei nº 13.140/2015. 
Com tal interpretação, cuja base remonta à Bioética de intervenção, poderá ser tutelada 
juridicamente a vida de mulheres trans, elemento indissociável de sua dignidade (inciso III do 
art. 1º da CF), e poderão ser traçados rumos para uma sociedade mais justa, solidária, inclusiva 
e sem preconceitos, concretizando os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil 
(incisos III e IV do art. 3º da CF). 
 
REFERÊNCIAS 
 
ADAMS, Noah et al. Guidance and Ethical Considerations for Undertaking Transgender 
Health Research and Institutional Review Boards Adjudicating This Research. Transgender 
Health 2, n. (1): 165-75. 2017. Disponível em: https://doi. org/10.1089/trgh.2017.0012. 
Acessado em 23 ago. 2023. 
 
ALCALA-MERCADO, Maria Bernarda Teorías en estudios de hombres transgénero: una 
revisión de la literatura. Revista Colombiana de Bioética, vol. 15, núm. 2, 2020, Octubre, p. 1-
32. Universidad El Bosque, Colombia. Disponível em: 
<https://www.redalyc.org/journal/1892/189265000003/189265000003.pdf>. Acessado em 13 
ago. 2023. DOI: <https://doi.org/10.18270/rcb.v15i2.3054>. 
 
ARAN, Márcia. A transexualidade e a gramática normativa do sistema sexo-gênero. Ágora (Rio 
J.) [online]. 2006, vol.9, n.1, p. 49-63. ISSN 1516-1498. Disponível em: 
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-14982006000100004. Acessado em 04 set. 2023. 
 
ARAÚJO, Luiz Alberto David. A proteção constitucional do transexual. São Paulo: Saraiva, 
2000. 
 
BASTOS, Celso Ribeiro. Hermenêutica e interpretação constitucional. 2. ed. rev. e ampl., São 
Paulo: Celso Bastos, 1999. 
 
BEAUVOIR, Simone de. O Segundo Sexo. v. II. Trad. Sérgio Milliet. Rio de Janeiro: Nova 
Fronteira, 1980. 
 
BENEVIDES, Bruna G. Dossiê: assassinatos e violências contra travestis e transexuais 
brasileiras em 2022. ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais) – Brasília, DF: 
Distrito Drag; ANTRA, 2023. Disponível em: 
https://www.redalyc.org/journal/1892/189265000003/189265000003.pdf
https://doi.org/10.18270/rcb.v15i2.3054
84 
 
<https://antrabrasil.files.wordpress.com/2023/01/dossieantra2023.pdf>. Acessado em 19 set. 
2023. 
 
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial 2: crimes contra a 
pessoa. 17. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2017. 
 
BRASIL. Decreto-Lei no 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acessado em 16 
mar. 2019. 
 
______. Lei nº 11.340, de 07 de agosto de 2006. Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11340.htm>. Acessado em 
13 mar. 2019. 
 
______. Lei nº 13.104, de 09 de março de 2015. Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13104.htm>. Acessado em 
13 mar. 2019. 
 
______. Ministério da Saúde. Mulheres trans e travestis contam com atendimento especializado 
no SUS. Disponível em: <https://www.gov.br/saude/pt-
br/assuntos/noticias/2023/marco/mulheres-trans-e-travestis-contam-com-atendimento-
especializado-no-
sus#:~:text=%E2%80%9CPara%20passar%20pela%20interven%C3%A7%C3%A3o%20h%
C3%A1,Coordena%C3%A7%C3%A3o%2DGeral%20de%20Aten%C3%A7%C3%A3o%20
Especializada>. Acessado em: 31 ago. 2023. 
 
______. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.977.124/SP. Relator Ministro 
Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 5/4/2022, publicado no Diário da Justiça 
eletrônico de 22/4/2022. Disponível em: 
<https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202103918110&dt_p
ublicacao=22/04/2022>. Acessado em: 23 ago. 2023. 
 
______. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4275. Relator 
Ministro Marco Aurélio, Relator para o Acórdão Ministro Edson Fachin, Tribunal Pleno, 
julgado em 1/3/2018, publicado no Diário da Justiça eletrônico de 7/3/2019. Disponível em: 
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=749297200>. 
Acessado em: 01 out. 2023. 
 
______. ______. Recurso Extraordinário nº 670.422 – RS. Tema 761. Relator Ministro Dias 
Toffoli, Tribunal Pleno, julgado em 15/8/2018a, publicado no Diário da Justiça eletrônico de 
10/3/2020. Disponível em: 
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=752185760>. 
Acessado em: 23 ago. 2023. 
 
______. ______. Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão nº 26. Relator Ministro 
Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgado em 13/6/2019, publicado no Diário da Justiça 
eletrônico de 6/10/2020. Disponível em: 
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754019240>. 
Acessado em: 15 set. 2023. 
 
https://antrabrasil.files.wordpress.com/2023/01/dossieantra2023.pdf
http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/DEL%202.848-1940?OpenDocument
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2023/marco/mulheres-trans-e-travestis-contam-com-atendimento-especializado-no-sus#:~:text=%E2%80%9CPara%20passar%20pela%20interven%C3%A7%C3%A3o%20h%C3%A1,Coordena%C3%A7%C3%A3o%2DGeral%20de%20Aten%C3%A7%C3%A3o%20Especializadahttps://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2023/marco/mulheres-trans-e-travestis-contam-com-atendimento-especializado-no-sus#:~:text=%E2%80%9CPara%20passar%20pela%20interven%C3%A7%C3%A3o%20h%C3%A1,Coordena%C3%A7%C3%A3o%2DGeral%20de%20Aten%C3%A7%C3%A3o%20Especializada
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2023/marco/mulheres-trans-e-travestis-contam-com-atendimento-especializado-no-sus#:~:text=%E2%80%9CPara%20passar%20pela%20interven%C3%A7%C3%A3o%20h%C3%A1,Coordena%C3%A7%C3%A3o%2DGeral%20de%20Aten%C3%A7%C3%A3o%20Especializada
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2023/marco/mulheres-trans-e-travestis-contam-com-atendimento-especializado-no-sus#:~:text=%E2%80%9CPara%20passar%20pela%20interven%C3%A7%C3%A3o%20h%C3%A1,Coordena%C3%A7%C3%A3o%2DGeral%20de%20Aten%C3%A7%C3%A3o%20Especializada
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2023/marco/mulheres-trans-e-travestis-contam-com-atendimento-especializado-no-sus#:~:text=%E2%80%9CPara%20passar%20pela%20interven%C3%A7%C3%A3o%20h%C3%A1,Coordena%C3%A7%C3%A3o%2DGeral%20de%20Aten%C3%A7%C3%A3o%20Especializada
https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/noticias/2023/marco/mulheres-trans-e-travestis-contam-com-atendimento-especializado-no-sus#:~:text=%E2%80%9CPara%20passar%20pela%20interven%C3%A7%C3%A3o%20h%C3%A1,Coordena%C3%A7%C3%A3o%2DGeral%20de%20Aten%C3%A7%C3%A3o%20Especializada
https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202103918110&dt_publicacao=22/04/2022
https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202103918110&dt_publicacao=22/04/2022
https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=749297200
https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=752185760
https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754019240
85 
 
______. ______. Mandado de Injunção nº 4733. Relator Ministro Edson Fachin, Tribunal 
Pleno, julgado em 13/6/2019, publicado no Diário da Justiça eletrônico de 29/9/2020. 
Disponível em: 
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=753957476>. 
Acessado em: 15 set. 2023. 
 
______. ______. Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 
nº 527. Relator Ministro Luís Roberto Barroso, julgada em 19/3/2021. Disponível em: 
<https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADPF527decisao19mar.pdf>. 
Acessado em: 28 set. 2023. 
 
______. ______. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 527. Relator 
Ministro Luís Roberto Barroso, Relator para o acórdão Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, 
julgado em 14/8/2023. Disponível em: 
<https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5496473>. Acessado em: 28 set. 
2023. 
 
BULOS, Uadi Lammêgo. Manual da interpretação constitucional. São Paulo: Saraiva, 1997. 
 
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. 2. ed. 
Coimbra: Almedina, 1998. 
 
CRUZ, Núbia dos Santos; MELO, Rafael dos Santos. Bioética e gênero: as faces dos direitos 
humanos, frente à transexualidade. Revista UNIFESO – Humanas e Sociais, v. 6, n. 6, 2020, 
p.70-82, Teresópolis. Disponível em: 
<https://revista.unifeso.edu.br/index.php/revistaunifesohumanasesociais/article/view/2208/92
1>. Acessado em: 28 ago. 2023. 
 
CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º ao 120). 6. ed. rev. 
ampl. e atual. Salvador: JusPODIVM, 2018. 
 
______. Manual de direito penal: parte especial (arts. 121 ao 361). 10. ed. rev. ampl. e atual. 
Salvador: JusPODIVM, 2018. 
 
DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. Trad. Jefferson Luiz Camargo, São Paulo: Martins 
Fontes, 1999. 
 
FEITOSA, Saulo Ferreira; NASCIMENTO, Wanderson Flor do. A bioética de intervenção no 
contexto do pensamento latino-americano contemporâneo. Revista Bioética, vol. 23, n.2: p. 
277-284, 2015. Disponível em: 
<https://www.scielo.br/j/bioet/a/fvVNKZ5673Z3qyZHDWCpZcb/?format=pdf&lang=pt>. 
Acessado em: 29 ago. 2023. <http://dx.doi.org/10.1590/1983-80422015232066>. 
 
FREITAS, Juarez. A interpretação sistemática do Direito. São Paulo: Malheiros, 1995. 
 
GARRAFA, Volnei. Da bioética de princípios a uma bioética interventiva. Revista Bioética. v. 
13, n. 1, 2005, p. 125-134. Disponível em: 
<https://revistabioetica.cfm.org.br/revista_bioetica/article/view/97>. Acessado em 28 ago. 
2023. 
 
https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=753957476
https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADPF527decisao19mar.pdf
https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5496473
https://revista.unifeso.edu.br/index.php/revistaunifesohumanasesociais/article/view/2208/921
https://revista.unifeso.edu.br/index.php/revistaunifesohumanasesociais/article/view/2208/921
https://www.scielo.br/j/bioet/a/fvVNKZ5673Z3qyZHDWCpZcb/?format=pdf&lang=pt
http://dx.doi.org/10.1590/1983-80422015232066
https://revistabioetica.cfm.org.br/revista_bioetica/article/view/97
86 
 
GOMES, Luiz Flávio; CUNHA, Rogério Sanches (Coord.). Legislação criminal especial. 2. 
ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 
 
IG SÃO PAULO. Ministro do Supremo manda travestis cumprirem pena em prisão feminina. 
IG São Paulo. São Paulo, 20 fev. 2018. Disponível em: 
<https://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2018-02-20/travestis.html>. Acesso em: 14 mar. 2019. 
 
______. Ministro do STJ manda transferir travesti para cela especial ou feminina. São Paulo, 
13 mar. 2019. Disponível em: <https://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2019-03-13/stj-travesti-
cadeia.html>. Acesso em: 14 mar. 2019. 
 
KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. 6. ed. Trad. João Baptista Machado. São Paulo: 
Martins Fontes, 1998. 
 
MASSON, Cleber. Direito penal: parte geral (arts 1º a 120). vol. 1. 11. ed. rev. atual. e ampl. 
Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2017. 
 
______. Direito penal: parte especial (arts. 121 a 212). vol. 2. 11. ed. rev. atual. e ampl. Rio de 
Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2018. 
 
MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 
2004. 
 
MENAJOVSKY, Laura Saldivia. La bioética despatologizadora del derecho a la identidad de 
género. In: CAPDEVIELLE, Pauline; MEDINA ARELLANO, María de Jesús. Bioética laica: 
Vida, muerte, género, reprodución y familia. Mexico: UNAM – Universidad Nacional 
Autónoma de Mexico. Instituto de Investigaciones Juridicas, 2018. p. 137-153. 
 
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. Tomo I. 4. ed. Coimbra: Coimbra Editora, 
1990. 
 
SICCA, Gerson dos Santos. A interpretação conforme à Constituição - Verfassungskonforme 
Auslegung - no direito brasileiro. Revista de Informação Legislativa. Brasília, a. 36, v. 143: 19-
33, jul./set. 1996. 
 
SOLEY-BELTRAN, Patrícia. Transexualidad y Transgénero: una perspectiva 
bioética. Revista de Bioética y Derecho, Barcelona, n. 30, p. 21-39, 2014. Disponível em: 
<http://scielo.isciii.es/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1886-
58872014000100003&lng=es&nrm=iso>. Acessado em 
13 ago. 2023. <https://dx.doi.org/10.4321/S1886-58872014000100003>. 
 
WORLD HEALTH ORGANIZATION. ICD-11 for Mortality and Morbidity Statistics: 
HA60 Gender incongruence of adolescence or adulthood. Disponível em: 
<https://icd.who.int/browse11/l-m/en#/http://id.who.int/icd/entity/90875286>. Acesso em: 05 
set. 2023.
https://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/2018-02-20/travestis.html
https://dx.doi.org/10.4321/S1886-58872014000100003
https://icd.who.int/browse11/l-m/en#/http://id.who.int/icd/entity/90875286
87 
 
EUTANÁSIA, DISTANÁSIA E ORTOTANÁSIA: A ÉTICA DO 
RESPEITO À DIGNIDADE E O TESTAMENTO VITAL 
 
Camila Maria Maciel1 
Estéfani Luise Fernandes Teixeira2 
Mariana Assis3 
RESUMO 
O presente artigo tem por escopo refletir sobre o prolongamento da vida do indivíduo e os 
aspectos do direito e da bioética. Para isso, discorreremos brevemente pela diferenciação de 
distanásia, ortotanásia, cuidados paliativos eeutanásia. A distanásia refere-se ao prolongamento 
da vida de um doente em fase terminal, sem perspectiva de melhora, muitas vezes contra a 
vontade desse indivíduo. Trata-se de uma reflexão ética necessária, a qual, por muitas vezes, 
por diversos motivos, não é realizada, muito menos questionam qual seria a vontade do paciente 
acamado. Com efeito, essa discussão necessitaria passar pelo crivo de aliviar a dor, sofrimento, 
morrer em paz, sem medos, ansiedades, proporcionando ao enfermo uma morte digna aos 
pacientes terminais, tendo em vista que somos seres humanos mortais. Em contrapartida, temos 
o testamento vital como documento legal que permite ao paciente no fim da vida expressar sua 
vontade quanto ao tratamento médico que será adotado quando perderem a capacidade de 
decisão. Para tanto, este artigo discorre sobre os aspectos éticos e legais da distanásia, assim 
como da importância do testamento vital como uma ferramenta que garante os desejos do 
paciente. Por fim, a metodologia proposta para atingir os objetivos é hipotético-dedutiva com 
cunho exploratório e realizada por meio de levantamento bibliográfico. 
 
Palavras-chave: Bioética; Diretivas antecipadas de vontade; Distanásia; Cuidados paliativos; 
Testamento vital. 
 
 INTRODUÇÃO 
 
O presente estudo versa sobre as diversas facetas que envolvem o prolongamento da 
vida, elucidando a diferença entre distanásia, eutanásia, ortotanásia, e seus reflexos no 
sofrimento no término da vida dos pacientes. 
A pesquisa, primeiramente, tem o condão de brevemente diferenciar os aspectos 
normativos da distanásia, eutanásia e ortotanásia. A discussão tem se intensificado com o 
 
1 Advogada. Estudante regular do curso de doutorado da Universidade Federal de Buenos Ayres – UBA. Membro 
da Comissão Especial da Saúde (CEDS). E-mail: camilamaciel.advogada@gmail.com OABRS n.87.890. 
2 Mestre em Direito pela Universidade de Passo Fundo – UPF. Especialista pela PUCRS. Advogada e consultora. 
Associada IARGS. Consocia IAB. Coordenadora do GT pesquisa da Comissão Especial da Saúde (CEDS) E-mail: 
estefani.f.teixeira@gmail.com. OABRS n.115.412. 
3 Bacharel em direito. Especialista em Direito Médico e da Saúde – Universidade do Estado do Rio de Janeiro – 
UERJ. Membro da Comissão Especial da Saúde (CEDS). E-mail: mariana.oliveirassis@gmail.com. 
mailto:estefani.f.teixeira@gmail.com
mailto:mariana.oliveirassis@gmail.com
88 
 
avanço da medicina e com os dilemas éticos enfrentados pela sociedade a respeito do fim da 
vida. 
No próximo tópico, aborda-se, os cuidados paliativos e uma abordagem humanizada, 
ética da sacralidade da vida e qualidade de vida do paciente. Desse modo, respeitando os 
direitos inerentes a todo ser humano, essencialmente, sua dignidade. 
No último tópico, exploraremos as diretivas antecipadas de vontade e o princípio da 
dignidade da pessoa humana, examinando as definições e implicações legais. Desse modo, 
respeitando à vontade do paciente, do representante legal e humanização da medicina com um 
olhar atento a bioética. Aborda-se ainda a capacidade civil, que é quando o indivíduo perde a 
sua capacidade de exercer o seu direito de decidir e o testamento vital. 
Importante destacar que, os códigos brasileiros de ética médica ainda são marcados por 
dispositivos tradicionais secular, influenciada de princípios humanitários, mas sem a observar 
as garantias éticas na religião ou cultura, por exemplo. Ademais, existe o estereótipo que 
médicos devem salvar vidas a qualquer custo, caso contrário são por muitas vezes são 
intitulados fracassados em suas condutas, pois temos esse aspecto cultural de manter o 
prolongamento da vida humana, visando ao tempo da vida, não à qualidade desta vida 
prolongada, a qual é chamada “boa morte”. 
Dentro desse desdobramento, passamos analisar os aspectos terminológicos nas 
próximas linhas. 
 
BIOÉTICA E DIREITO: DISTANÁSIA, EUTANASIA E ORTOTANÁSIA 
 
 Sem a pretensão de aprofundar as terminologias e suas origens, frisa-se que a Bioética 
é termo derivado da fusão de vocábulos de origem grega: bio significa “vida” e ethos significa 
“ética”. Por isso, o termo significa “ética da vida”. Há divergências a respeito do período do 
nascimento da bioética, assim como quem seriam seus fundadores e idealizadores. 
Sabemos, no entanto, que o conhecimento se constrói ao longo do tempo e conta com a 
colaboração de muitos estudiosos, pesquisadores e cientistas (LOPES; LIMA; SANTORO, 
2017, p. 97). Lopes, Lima e Santoro (2017, p. 49) fazem a seguinte reflexão: “adotar a 
distanásia, também conhecida como obstinação terapêutica, ou adotar as medidas necessárias 
para preservar e promover a dignidade do paciente, por meio dos cuidados paliativos?” 
Respondem no sentido de que: 
89 
 
Se a morte for compreendida como um processo natural e final da vida e não como 
um fracasso, a ortotanásia será concebida como um procedimento pautado no respeito 
à morte digna, o que possibilitará a humanização do processo de morte. Afinal, se 
todo o processo da vida deve ser pautado pelo respeito à dignidade, não há dúvida que 
o processo de morte também deve ser guiado pelo respeito à dignidade. E a finalidade 
da intervenção médica na ortotanásia é a preservação da dignidade humana, para que 
o paciente tenha garantido o direito à morte boa, ao seu tempo e com respeito aos seus 
valores. Morte boa, segundo Débora Diniz, seria: [...] aquela resultante de uma 
combinação de princípios morais, religiosos e terapêuticos. 
 
De forma mais explicativa, distanásia significa a obstinação terapêutica para adiar a 
morte iminente e os cuidados paliativos “[...] consistem em uma abordagem multidisciplinar 
cujo objetivo é minimizar o sofrimento e preservar a qualidade de vida com doenças graves e 
ameaçadoras a vida, em qualquer ambiente de cuidado.” (TURAÇA; RIBEIRO, 2021, p. 3). 
Portanto, verifica-se que existe um certo paradigma nos cuidados aprisionados pelo 
domínio das técnicas tecnológicas da vez mais modernas e o momento de compreender que 
somos seres mortais e limites para a boa qualidade de vida, dignidade, tratamentos mais 
humanizados e menos sofridos para o enfermo e seus familiares. A tecnologia é inerente à vida 
humana tem suas limitações. Evitar a morte não é uma falha da medicina moderna, mas sim 
proporcionar uma alternativa mais digna ao paciente quando em estado terminal. 
A medicina deve preservar a saúde ou aliviar o sofrimento quando os inovadores e 
promissores aparatos tecnológicos não atingem mais sua finalidade. Assim, aliviando o 
sofrimento e desconforto da morte. 
Tanto a distanásia, eutanásia e ortotanásia abordam o tratamento adotado no fim da vida; 
no entanto, com implicações éticas diferentes. Os denominados métodos denominados 
distanásia, eutanásia e ortotanásia são estudados pela bioética e o direito. 
A eutanásia é apontada como uma ação que tem por finalidade acelerar o processo de 
morte por causas humanistas, uma vez que se conclui que nada que será́ feito a partir de 
determinado momento resultará positivamente, tornando o rompimento do sofrimento do 
paciente uma solução digna. Contudo, ainda assim, sua prática é considerada ilegal e proibida 
no Brasil, porém é aceito em alguns países, como a Holanda e a Bélgica. Imperioso frisar que, 
o Código de Ética Médica brasileiro de 1988 tem todos os artigos alusivos ao tema contrários 
à participação do médico na eutanásia e no suicídio assistido. (FELIX, DA COSTA, ET AL, 
2013 P. 2735). 
Destarte, a ortotanásia é a denominada “boa morte”, humana e correta. Garantindo que 
sejam respeitados os direitos e garantias fundamentais do ser humano também no momento da 
90 
 
terminalidade da vida humana. Sem recorrer a eutanásia (nos países que aderem) ou distanásia 
como recursos. No Brasil, os cuidados paliativos propõem-se a realizar uma abordagem 
multiprofissional, buscandoa garantir a ortotanásia. Assim, objetivando aliviar a dor e o 
sofrimento e os demais sintomas de ordem psicológica, espiritual, social, entre outros, 
priorizando a qualidade de vida para o enfermo e seus familiares. 
Villas Bôas classifica a etimologicamente ortotanásia: “Já a ortotanásia significa morte 
correta - orto: certo; thanatos: morte. Traduz a morte desejável, na qual não ocorre o 
prolongamento da vida artificialmente, através de procedimentos que acarretam aumento do 
sofrimento, o que altera o processo natural do morrer.” (VILLAS BÔAS, 2008, p. 61-83) 
Mendes acresce que, na ortotanásia, o indivíduo em estágio terminal “é direcionado 
pelos profissionais envolvidos em seu cuidado para uma morte sem sofrimento, que dispensa a 
utilização de métodos desproporcionais de prolongamento da vida, tais como ventilação 
artificial ou outros procedimentos invasivos. A finalidade primordial é não promover o 
adiamento da morte, sem, entretanto, provocá-la; é evitar a utilização de procedimentos que 
aviltem a dignidade humana na finitude da vida”. (MENDES, 2008) 
Por outro lado, a distanásia é o excesso terapêutico, o prolongamento excessivo da vida, 
envolvendo técnicas e tratamentos que não trazem benefício à vida do doente e que, muitas 
vezes, são contra a vontade do paciente. Portanto, a distanásia é fazer uso da tecnologia para 
que o resultado morte não ocorra. 
Tanto a distanásia quanto a eutanásia (nos países que é legalizada) levantam 
questionamentos complexos de ética e moral e têm perspectivas legais diferentes de acordo com 
a cultura e conhecimento da pessoa. Se a eutanásia busca aliviar o sofrimento do doente, a 
distanásia, por sua vez, acaba por prolongar esse momento de dor. Em suma, a eutanásia 
antecipa a morte quando se tem o diagnóstico de uma doença sem cura, o resultado prático são 
menos dias de vida e redução no sofrimento, enquanto a distanásia prolonga a morte resultando 
em mais dias de vida através da tecnologia que incluem remédios fortes e/ou aparatos 
tecnológicos, aumentando o sofrimento do paciente. 
No contexto brasileiro verifica-se que a eutanásia é ilegal e a distanásia por maioria das 
vezes não é a vontade do paciente e sim do responsável legal do acamado. No entanto, no direito 
há mecanismos para prevalecer e se fazer valer a vontade tácita e expressa do paciente. Nas 
páginas seguintes, aborda-se as diretivas antecipadas como garantia da dignidade da pessoa 
humana. 
91 
 
DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE E A DIGNIDADE DA PESSOA 
HUMANA 
 
A Diretiva antecipada de vontade trata da manifestação do desejo do paciente, de forma 
antecipada, ainda em plena capacidade civil, em relação aos cuidados e tratamentos dispensados 
quando estiver acometido de uma doença grave, garantindo que não haja lesão ao princípio da 
dignidade da pessoa humana, o valor universal inerente a todo ser humano que garante as 
necessidades vitais de cada indivíduo. 
No que tange à Constituição de 1988, o princípio da dignidade da pessoa humana está 
disposto no primeiro título do texto constitucional (artigo. 1º, III); 2 esse princípio tem 
representatividade e importância no cenário constitucional e internacional, além de ligar-se 
diretamente aos direitos da pessoa humana e direitos e garantias fundamentais (SARLET; 
MARINONI; MITIDIERO, 2019, p.55). 
Na concepção de Sarlet, a dignidade da pessoa humana diz respeito à vida com 
dignidade, com o mínimo existencial e saudável. Este valor supremo é o fundamento de todo 
ordenamento jurídico, bem como o “princípio-guia”, de caráter inspirador da própria aplicação 
do direito, em seus mais diversos níveis. (SARLET, 2015) 
Resumidamente poderíamos dizer então que os direitos humanos, como conjunto de 
valores históricos básicos e fundamentais, que dizem respeito à vida digna jurídico-político-
físico-econômica e afetiva dos seres e de seu habitat, tanto aqueles do presente quando daqueles 
do porvir, surgem sempre como condição fundante da vida, impondo aos agentes político-
jurídico-econômico-sociais a tarefa de agirem no sentido de permitir e viabilizar que a todos 
seja consignada a possibilidade de usufruí-los em benefício próprio e comum ao mesmo tempo 
(SARLET, 2003). 
As diretivas antecipadas baseiam-se, assim, no princípio da dignidade da pessoa humana 
bem como na autonomia privada do indivíduo e na proibição do tratamento desumano. 
Para o Conselho Federal de Medicina, no artigo 1º da Resolução 1.995/2012, as diretivas 
antecipadas são “um conjunto de desejos, manifestados de forma prévia e expressa pelo 
paciente, a respeito de todos os cuidados e tratamentos que deseja ou não receber quando não 
puder expressar, livre e autonomamente, sua vontade”. 
Esta diretiva é um documento legal que permite à pessoa se expressar sobre tratamentos 
médicos futuros a que deseja ou não se submeter, caso se torne incapaz de tomar decisões sobre 
a própria saúde. A diretiva antecipada nada mais é do que a garantia de que os desejos do 
92 
 
indivíduo serão respeitados, pois, mesmo no fim da vida, o ser humano é um sujeito de direitos, 
não devendo ser submetido a tecnologias ou tratamentos que não sejam da sua vontade. 
Incluem-se, nessa recusa, a reanimação cardiopulmonar, a ventilação mecânica e os demais 
tratamentos possíveis. 
De forma explicativa, a distanásia e a obstinação terapêutica para adiar a morte iminente 
e os cuidados paliativos “[...] consistem em uma abordagem multidisciplinar cujo objetivo é 
minimizar o sofrimento e preservar a qualidade de vida com doenças graves e ameaçadoras, em 
qualquer ambiente de cuidado” (TURAÇA; RIBEIRO, 2021). 
Jorge Miranda refere que a primeira forma de defesa dos direitos é a que consiste no seu 
conhecimento, e acrescenta, ainda, que só quem tem consciência dos seus direitos consegue 
usufruir os bens a que eles correspondem e sabe avaliar as desvantagens e os prejuízos que sofre 
quando não os pode exercer ou quando eles são violados ou restringidos (MIRANDA, 2000, 
p.254). 
 
 OS CUIDADOS PALIATIVOS 
 
Os cuidados paliativos são destinados à promoção da qualidade de vida do paciente 
atingido por doenças graves que ameaçam a continuidade da vida. Esses cuidados visam 
proporcionar alívio dos sintomas da doença, no entanto a equipe multidisciplinar deve estar 
atenta não somente aos sintomas físicos, mas também aos sintomas emocionais e espirituais 
tanto do paciente quanto dos familiares. Quando o paciente adoece, toda a família é acometida 
pelo sofrimento e o olhar da equipe responsável pelos cuidados paliativos deve abranger 
também o ente querido do doente. 
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em conceito definido em 1990 e 
atualizado em 2002, cuidados paliativos consistem na assistência promovida por uma equipe 
multidisciplinar, que objetiva a melhoria da qualidade de vida do paciente e seus familiares, 
diante de uma doença que ameace a vida, por meio de prevenção e alívio do sofrimento, por 
meio da identificação precoce, avaliação impecável e tratamento de dor e demais sintomas 
físicos, sociais, psicológicos e espirituais. (INCA, 2023) 
No tocante ao emprego dos cuidados paliativos, em geral exigindo equipe 
multiprofissional, mostra-se um desafio no qual deve ser avaliado pelas vantagens e 
desvantagens para qualidade de vida do paciente, ainda, importante considerar o 
questionamento entre fazer uso de recursos tecnológicos em constante avanço apresentando 
93 
 
diversas alternativas para prolongar a vida do paciente com a necessidade do reconhecimento 
de que somos imortais, que o prolongamento da vida também pode resultar continuidade e 
agravamento do sofrimento do paciente e seus familiares, fazendo prolongar o processo de luto 
já instaurado, tendo em vista que o final da vida apenas será postergado, não poderá ser 
evitado. 
Sabemos também que a extensão dos cuidados paliativos focado na manutenção da 
qualidade de vida da pessoa,abrange profissionais de diversas especialidades da área da saúde 
com comunicação clara e direta para com os familiares, com paciente, quando possível, uso de 
medicamentos diferenciados e emprego de tecnologia avançada para controle dos sintomas e 
apoio à família, sendo assim, não é de acesso geral para população, mantendo-se efetivo para 
um grupo restrito, tendo em vista os custos financeiros envolvidos. 
Cabe refletirmos que o ser humano desde o nascimento merece paz e alívio e assim 
também se espera que seja no leito de morte, um equilíbrio respeitoso com o ciclo da vida, ao 
qual não pode ser alcançado pela eutanásia ou pela distanásia. 
 
PERDA DA CAPACIDADE CIVIL E O TESTAMENTO VITAL 
 
O testamento vital é um documento legalmente reconhecido pela Resolução 1995/2012, 
do Conselho Federal de Medicina, por meio do qual os indivíduos manifestam a sua vontade 
acerca da aceitação ou da recusa de procedimentos ou tratamentos a que seria submetido quando 
acometido de doença em fase terminal. No artigo 4 da referida Resolução infere-se que o 
médico registre, no prontuário, as diretivas antecipadas de vontade que lhes foram diretamente 
comunicadas pelo paciente. (CFM, RESOLUÇÃO 1995/2012, 2012). 
Os testamentos vitais, também conhecidos como living will, testamentos biológicos ou 
testament de vie, são documentos elaborados por uma determinada pessoa que, mediante 
diretrizes antecipadas, realizadas em situação de lucidez mental, declara a sua vontade, 
autorizando os profissionais médicos, no caso de doenças irreversíveis ou incuráveis, em que 
já não seja mais possível expressar a sua vontade, a não prolongarem o tratamento. Nesses 
casos, o paciente em fase terminal ou em estado vegetativo autoriza a suspensão de tratamentos 
que visam apenas a adiar a morte, em vez de manter a vida. (CAROLINA CUNHA, 2011). 
Corroborando Borges aduz que o testamento vital: 
É um documento em que a pessoa determina, de forma escrita, que tipo de tratamento 
deseja para a ocasião em que se encontrar doente, em estado incurável ou terminal, e 
incapaz de manifestar sua vontade. Visa-se, com o testamento vital a influir sobre os 
94 
 
médicos no sentido de determinada forma ou tratamento ou simplesmente, no sentido 
do não tratamento, como uma vontade do paciente que pode vir a estar incapacitado 
de manifestar sua vontade em razão da doença. (BORGES, 2001, p. 283-305.) 
Por intermédio do referido testamento, a pessoa consegue manter o controle da 
assistência médica, mesmo quando perder a capacidade civil. O documento pode abordar desde 
procedimentos que o paciente deseja ou não se submeter como, por exemplo, reanimação 
cardiopulmonar, cateteres, ventilação mecânica, até questões de doações de órgãos. Trata-se de 
uma forma de garantir que os desejos da pessoa sejam plenamente respeitados e para amparar 
familiares no momento decisório. 
Nesse contexto Comparato ensina: 
[...] Ora, a dignidade da pessoa não consiste apenas no fato de ser ela, diferentemente 
das coisas, um ser considerado e tratado, em si mesmo, como um fim em si e nunca 
como um meio para a consecução de determinado resultado. Ela resulta também do 
fato de que, pela sua vontade racional, só a pessoa vive em condições de autonomia, 
isto é, como ser capaz de guiar-se pelas leis que ele próprio edita. " (COMPARATO, 
2019, p.21) 
O representado deve ser capaz no momento da outorga dos poderes ao representante. O 
PCS só começará a atuar quando declarada a incapacidade do paciente. O próprio instrumento 
deve prever as condições para se reconhecer a falta de capacidade e, também, para 
eventualmente, readquiri-la. Não se trata de incapacidade física, mas de tomar decisões, de se 
autodeterminar. (KFOURI NETO, 2019, p. 390). 
 
CONCLUSÃO 
 
A dor e sofrimento humano tornam-se ainda mais relevantes quando se tem uma 
expectativa no contexto da tecnologia que o paciente possui mínimas chances de sobreviver por 
intermédio de aparelhos e/ou administração medicamentosa. 
A distanásia como um prolongamento do processo de morte ou adiamento da morte com 
auxílio de processos reanimadores, objetivando prolongar a vida biológica do paciente, tem-se 
que a preocupação com o sofrimento prolongado do paciente e/ou familiares, amigos, bem 
como empenho de recursos caríssimos, devem avaliados em conjunto e servir como parâmetro 
para adoção de tal conduta. 
Devemos atentar que a distanásia é um termo médico, mas as decisões que antecedem a 
morte não exigem apenas cuidados técnicos em si, trata-se de um momento delicado e que 
carece de tratamento sensível e humano. 
95 
 
No arcabouço legislativo brasileiro, vimos que ainda não há lei específica que verse 
sobre o testamento vital, ficando a decisão amparada no princípio da dignidade da pessoa 
humana e da autonomia privada, ambas previstas na Constituição Federal de 1988 e por 
intermédio da legislação específica do Conselho Federal de Medicina. 
Por fim, devem ser tomadas todas as medidas que visem proteger o bem maior que é a 
vida; no entanto, o médico deve ponderar e ter como objetivo refletir com o paciente, se em 
gozo da capacidade civil, ou com o responsável legal até que ponto isso pode ser realizado, 
evitando o sofrimento desnecessário. É necessário deixar claro aos familiares sobre a situação 
efetiva e chances de sobrevida do familiar. 
Como vimos, um tratamento humanizado somado aos cuidados paliativos pode aliviar 
o sofrimento tanto da família quanto do paciente, visando, assim, ao respeito à morte digna. A 
preservação da dignidade da pessoa humana e os direitos humanos, se conectados, podem dar 
o direito a morrer em paz e sem dor. 
Conclui-se, então, que, quando os inovadores e promissores aparatos tecnológicos não 
atingirem mais sua finalidade, cabe à medicina evitar o sofrimento excessivo e desnecessário. 
 
REFERÊNCIAS 
 
BRASIL. Lei no 8.080 de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, 
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços 
correspondentes e dá outras providências. Brasília, 1990. Disponível em: 
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/ L8080.htm>. Acesso em: 07 out. 2023. 
 
BRASIL. Lei no 12.842 de 10 de julho de 2013. Dispõe sobre o exercício da medicina. Brasília, 
2013. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-
2014/2013/lei/l12842.htm>. Acesso em: 07 out. 2023. 
 
BRASIL. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM 1995/2012. Publicada no 
D..O.U de 30 de agosto de 2012. Disponível em: 
<https://www.testamentovital.com.br/_files/ugd/bc3517_dc11bc92e7354909bfb52b65cd084e
14.pdf>. Acesso em: 05 out. 2023. 
 
BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro. Direito de morrer dignamente: eutanásia, ortotanásia, 
consentimento informado, testamento vital, análise constitucional e penal e Direito Comparado. 
In: SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito: ciência da vida, os novos desafios. São 
Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. P.283-305. 
COMPARATO, F. K. A afirmação histórica dos direitos humanos. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 
2019. 
 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/
https://www.testamentovital.com.br/_files/ugd/bc3517_dc11bc92e7354909bfb52b65cd084e14.pdf
https://www.testamentovital.com.br/_files/ugd/bc3517_dc11bc92e7354909bfb52b65cd084e14.pdf
96 
 
Conselho Federal de Medicina (CFM). Código de Ética Médica. Brasília, 2019. Disponível em: 
<https://portal.cfm.org.br/images/PDF/cem2019.pdf>. Acesso em: 07 out. 2023. 
 
CUNHA, CAROLINA. Disponível em: 
<https://www.ibdfam.org.br/artigos/autor/Carolina%20da%20Cunha%20Pereira%20França%
20Magalhães>. Acesso em: 06 out. 2023. artigo publicado em 04/04/2011. 
 
DADALTO, L.; RIBEIRO, S. C. da C. Aspectos éticos-legais no atendimento na emergência. 
In: VELASCO, I. T.; RIBEIRO. 
 
BIONDO CA, SILVA MJP, SECCO LMD. Distanásia, eutanásia e ortotanásia: percepções dos 
enfermeiros de unidades de terapiaintensiva e implicações na assistência. Rev Lat Am 
Enfermagem 2009;17(5):613-619. 
 
INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER. INCA. Disponível em: <https://www.gov.br/inca/pt-
br/assuntos/gestor-e-profissional-de-saude/controle-do-cancer-do-colo-do-
utero/acoes/cuidados-paliativos>. Acesso em 06 out. 2023. 
 
JUNGES JR. Reflexões legais e éticas sobre o final da vida: uma discussão sobre a 
ortotanásia. Rev Bioet 2010;18(2):275-288 
 
KFOURI NETO, Miguel. Responsabilidade civil do médico – ed.10. rev.,atual e ampl. São 
Paulo: Editora Revista dos Tribunais Ltda, 2009, p. 390. 
 
MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. 2 ed. Coimbra: Coimbra, 1988-2000. 5v. 
p. 254. 
 
SARLET, Ingo Wolfgang (org). Direitos fundamentais sociais: estudos de direito 
constitucional, internacional e comparado. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 55. 
 
 VILLAS-BÔAS ME. A ortotanásia e o direito penal brasileiro. Rev Bioet 2008;1(16):61-83. 
 
 
 
https://portal.cfm.org.br/images/PDF/cem2019.pdf
https://www.ibdfam.org.br/artigos/autor/Carolina%20da%20Cunha%20Pereira%20Fran%C3%A7a%20Magalh%C3%A3es
https://www.ibdfam.org.br/artigos/autor/Carolina%20da%20Cunha%20Pereira%20Fran%C3%A7a%20Magalh%C3%A3es
https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/gestor-e-profissional-de-saude/controle-do-cancer-do-colo-do-utero/acoes/cuidados-paliativos
https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/gestor-e-profissional-de-saude/controle-do-cancer-do-colo-do-utero/acoes/cuidados-paliativos
https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/gestor-e-profissional-de-saude/controle-do-cancer-do-colo-do-utero/acoes/cuidados-paliativos
97 
 
 
A PROBLEMÁTICA DO USO DO CRITÉRIO DE AUTORIDADE 
CIENTÍFICA PARA IMPOR MEDIDAS RESTRITIVAS E LIMITAR 
LIBERDADES INDIVIDUAIS DURANTE A PANDEMIA DO 
CORONAVÍRUS: UMA REFLEXÃO 
 
Cesar Augusto Cavazzola Junior1 
Cidney Antonio Surdi Junior2 
 
RESUMO 
A pandemia do coronavírus (COVID-19) desencadeou uma série de debates éticos e políticos 
em relação às medidas restritivas impostas para conter a disseminação do vírus. Este artigo 
explora a problemática do uso do critério de autoridade científica como base para a imposição 
de tais medidas, examinando seus impactos nas liberdades individuais e no equilíbrio entre a 
saúde pública e os direitos individuais. Através de uma análise crítica das decisões tomadas 
durante a pandemia, este estudo ressalta a importância de abordagens mais equilibradas que 
considerem tanto a expertise científica quanto as implicações éticas e sociais. 
Palavras-chave: Autoridade Científica; Medidas Restritivas; Liberdades Individuais; 
Pandemia de COVID-19; Bioética. 
 
1. INTRODUÇÃO 
A pandemia global desencadeada pelo coronavírus (COVID-19) trouxe consigo não 
apenas desafios médicos e científicos, mas também questionamentos profundos sobre a 
intersecção entre autoridade científica, medidas restritivas e liberdades individuais. 
Desde o início da disseminação do vírus, os governos em todo o mundo se viram diante 
da tarefa complexa de tomar decisões cruciais para proteger a saúde pública, enquanto também 
equilibravam as liberdades civis e os direitos fundamentais dos cidadãos. 
Nesse contexto, o critério de autoridade científica emergiu como uma ferramenta central 
na formulação e justificação das medidas restritivas adotadas. 
A busca pela orientação de especialistas e pela ciência em momentos de crise é, sem 
dúvida, uma abordagem sensata e lógica. A comunidade científica tem um papel inegável na 
 
1 Advogado (OABRS 83.859). Mestre em Direito pela Unisinos (2015). Autor dos livros “Manual de Direito 
Desportivo” (EDIPRO, 2014), “Bacamarte” (Giostri, 2016), “Francês Jurídico” (Jano, 2022) e “A Solidão 
Disciplinada” (Thoth, 2023). É coautor de outras obras jurídicas. E-mail: cesar.cavazzola@gmail.com. 
2 Doutorando em Educação pela Universidade de Brasília, Mestre em Filosofia pela Universidade Federal do 
Paraná e Especialista em Design Instrucional pela Unyleya. É professor de Filosofia, com publicações didáticas 
na área e realiza pesquisas na área de História da Educação e Educação por competências. E-mail: 
cj_surdi@hotmail.com. 
mailto:cesar.cavazzola@gmail.com
mailto:cj_surdi@hotmail.com
98 
 
 
coleta e análise de dados, fornecendo insights valiosos sobre a natureza do vírus, sua 
disseminação e potenciais estratégias de contenção. No entanto, o uso exclusivo do critério de 
autoridade científica como alicerce para a implementação de medidas restritivas levanta uma 
série de preocupações éticas, sociais e políticas que não podem ser ignoradas. 
Este artigo tem como objetivo explorar a complexidade dessa questão, analisando 
criticamente como o uso do critério de autoridade científica impactou a imposição de medidas 
restritivas durante a pandemia do coronavírus. Ao examinar essa dinâmica, pretende-se destacar 
a importância de uma abordagem equilibrada e multidisciplinar que considere tanto os aspectos 
científicos quanto as implicações éticas e sociais das decisões tomadas. 
Além disso, o artigo discutirá como a predominância da autoridade científica não só 
afetou, como também pode afetar as liberdades individuais e os direitos civis, levantando 
questionamentos fundamentais sobre o papel da ciência na formulação de políticas públicas. 
Ao compreendermos as implicações do uso do critério de autoridade científica para 
impor medidas restritivas durante a pandemia, estaremos mais bem equipados para enfrentar 
desafios similares no futuro. Assim sendo, o diálogo entre a ciência, a ética e a sociedade é 
essencial para garantir que as decisões tomadas em resposta a crises de saúde pública sejam 
informadas, justas e respeitosas com os direitos individuais, construindo assim um equilíbrio 
sólido entre a busca pela saúde pública e a preservação das liberdades fundamentais. 
 
2. A PANDEMIA DO CORONAVÍRUS NO MUNDO E NO BRASIL 
 
A pandemia do coronavírus (COVID-19) – segundo fontes oficiais - se originou em 
dezembro de 2019 na cidade de Wuhan, província de Hubei, China, e rapidamente se espalhou 
pelo mundo. O vírus responsável pela doença, o SARS-CoV-2, causou uma crise global sem 
precedentes nas áreas de saúde, economia e sociedade. 
Até o momento desta análise, mais de 220 países e territórios foram afetados pela 
pandemia, resultando em mais de 200 milhões de casos confirmados e um número substancial 
de mortes. A rápida disseminação do vírus foi influenciada por fatores como a conectividade 
global, densidade populacional e a falta de imunidade prévia à nova doença. 
No Brasil, o primeiro caso de COVID-19 foi confirmado em fevereiro de 2020. Desde 
então, o país enfrentou uma série de desafios complexos na gestão da pandemia. O número total 
99 
 
 
de casos confirmados no Brasil atingiu a marca de milhões, com um alto número de óbitos 
registrados. 
A resposta ao surto no Brasil abrangeu medidas como distanciamento social, lockdowns 
em certas regiões, restrições de viagem, suspensão de atividades econômicas não essenciais e 
campanhas de conscientização pública. A eficácia dessas medidas variou de acordo com fatores 
como a prontidão dos sistemas de saúde, a capacidade de teste e a adesão da população. 
Isso não apenas impactou a saúde pública, mas também teve consequências econômicas 
e sociais significativas. A taxa de desemprego aumentou (alcançando o número de 15% de 
desempregados no 1º trimestre de 2021)3, os sistemas de saúde foram sobrecarregados, 
impactando seriamente no represamento de procedimentos não relacionados a COVID-19 
(BIGONI, MALIK, TASCA, CARRERA, et al., 2022) e desafios em relação à educação e 
desigualdades sociais se intensificaram. A vacinação emergiu como a principal estratégia para 
controlar a disseminação do vírus e minimizar o impacto na saúde pública, embora criticada 
por vários setores da sociedade, sobretudo para aqueles coagidos circunstancialmente nos seus 
locais de trabalhoou a fim de acessar determinados serviços públicos. 
A complexidade da pandemia refletiu-se nas respostas variadas dos diferentes estados e 
municípios do Brasil. A infraestrutura de saúde, a disponibilidade de recursos e a compreensão 
local da gravidade da situação contribuíram para as disparidades nas estratégias de 
enfrentamento adotadas. A coordenação nacional e a tomada de decisões coletivas também 
desempenharam um papel fundamental na abordagem à crise. 
A pandemia do coronavírus teve um impacto profundo e multifacetado tanto 
globalmente quanto no Brasil. A rápida disseminação do vírus, aliada à natureza desafiadora de 
sua contenção, enfatizou a importância de respostas ágeis e coordenadas entre as nações e 
dentro dos países afetados. 
 
3. A SUPREMACIA DA CIÊNCIA E AS CRÍTICAS À IMPOSIÇÃO DO 
ARGUMENTO CIENTÍFICO NA PANDEMIA 
A primazia da ciência como alicerce para a tomada de decisões em relação ao COVID-
19 tem sido frequentemente questionada por vozes críticas que destacam as consequências 
negativas desse tipo de enfoque (JIMÉNEZ, 2022; COLLINS e COLLINS, 2022; ALTERIO, 
 
3 Dados sobre a taxa de desocupação da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Trimestral, 
disponibilizada pelo IBGE em: <https://sidra.ibge.gov.br/tabela/4092>. Acesso em: 21 ago. 2023. 
100 
 
 
2023). Embora a expertise científica seja fonte valiosa para informar políticas públicas, a 
abordagem exclusiva em relação a esse critério foi alvo de controvérsias. 
Um dos principais pontos de debate gira em torno da exclusão de perspectivas 
multidisciplinares. Críticos argumentam que a ênfase excessiva na autoridade científica pode 
resultar na marginalização de outros campos de conhecimento, tais como ética, direitos 
humanos, sociologia e economia (COLLINS e COLLINS, 2022). Essa marginalização, por sua 
vez, pode levar a decisões unilaterais que não levam em conta a complexidade das implicações 
éticas e sociais das medidas restritivas. 
Além disso, a imposição unilateral do argumento científico pode negligenciar 
considerações práticas e contextuais. A realidade das populações mais vulneráveis, por 
exemplo, frequentemente é minimizada em favor de soluções aparentemente baseadas apenas 
em dados científicos. A desigualdade no acesso à saúde, às vezes agravada por medidas 
restritivas, exige um exame mais profundo das consequências socioeconômicas das políticas 
adotadas. 
Críticos também alertam para o risco de “cientificismo” (HAYEK, 1955; 
FEYERABEND, 2011; COLLINS e COLLINS, 2022), que é a crença infundada de que todos 
os problemas podem ser resolvidos por meio do conhecimento científico. Esse pensamento 
simplista desconsidera as implicações éticas e morais subjacentes às decisões. A questão da 
liberdade individual versus medidas restritivas serve como exemplo, isso porque as decisões 
estritamente baseadas em dados científicos podem desconsiderar o equilíbrio delicado entre 
saúde pública e direitos individuais. 
Em suma, a predominância do critério de autoridade científica gerou e tem gerado 
críticas substanciais. A imposição unilateral do argumento científico pode levar a decisões que 
carecem de considerações éticas, contextuais e práticas, levantando preocupações sobre a 
equidade, liberdades individuais e o papel de outras disciplinas na tomada de decisões. 
 
4. REFLEXÕES SOBRE A CIÊNCIA E O CRITÉRIO DE AUTORIDADE 
CIENTÍFICA 
A ciência, como empreendimento humano para entender o mundo natural, é uma 
ferramenta inestimável para a busca do conhecimento e para a tomada de decisões informadas. 
101 
 
 
No entanto, é importante compreender que a ciência não é um monólito absoluto, 
fundado em um conjunto rígido de regras metodológicas. Como Feyeranbend (2011) já 
afirmou, a história da ciência mostra como as teorias e métodos científicos mudaram ao longo 
do tempo, muitas vezes de maneira não lineares e contraditórias, sem haver um critério absoluto 
para avaliar a validade das teorias científicas. 
A ciência evolui constantemente, moldada por paradigmas mutáveis, novas descobertas 
e revisões contínuas. A reflexão sobre o critério de autoridade científica no contexto da 
população mundial é um convite à consideração crítica dos princípios fundamentais da ciência 
e dos desafios que surgem quando se impõe esse critério. 
A ciência se baseia na observação, coleta de dados, experimentação e análise rigorosa. 
Ela oferece um método sistemático para compreender os fenômenos naturais, que é apoiado por 
revisões por pares e validações independentes. No entanto, sua própria natureza reconhece que 
o conhecimento é construído incrementalmente, sujeito a correções e reavaliações à medida que 
novas evidências emergem. 
Quando nos deparamos com situações como uma pandemia global, é natural recorrer à 
autoridade científica para orientar as decisões. No entanto, a imposição rígida do critério de 
autoridade científica sem uma avaliação mais ampla pode ter implicações éticas, sociais e 
políticas profundas. A ciência, embora uma fonte confiável de informação, não é infalível e não 
pode abarcar todas as dimensões de um problema complexo. 
O critério de autoridade científica pode levar à supressão de outras vozes e perspectivas 
valiosas. A riqueza da experiência humana não pode ser completamente traduzida em termos 
quantitativos ou qualitativos estritos. A tomada de decisões em uma pandemia envolve não 
apenas análises epidemiológicas, mas também ponderações éticas, considerações 
socioeconômicas e avaliações das implicações a longo prazo sobre as liberdades individuais. 
Devemos também lembrar que a ciência pode ter lacunas, incertezas e limitações. 
Políticas públicas estritamente baseadas na autoridade científica podem se tornar obsoletas à 
medida que novas informações emergem. Portanto, é fundamental adotar uma abordagem 
flexível, permitindo ajustes conforme o conhecimento científico avança. 
Em última análise, a ciência é uma ferramenta poderosa, mas não pode ser isolada do 
contexto maior no qual opera. O critério de autoridade científica deve ser considerado, mas 
também deve ser equilibrado com uma análise abrangente das diversas dimensões das decisões 
tomadas. 
102 
 
 
Assim, a reflexão sobre o papel da ciência na população mundial nos desafia a encontrar 
um equilíbrio entre o conhecimento científico e as necessidades, valores e contextos únicos das 
sociedades em que vivemos. 
 
5. O IMPACTO NAS LIBERDADES INDIVIDUAIS E OS DESAFIOS ECONÔMICOS 
DA IMPOSIÇÃO DE MEDIDAS RESTRITIVAS 
 
A imposição de medidas restritivas como resposta à pandemia do coronavírus teve 
profundas implicações nas liberdades individuais e na dinâmica econômica. Ao examinarmos 
com maior detalhe esses aspectos, torna-se evidente que a busca pela saúde pública muitas 
vezes se choca com a preservação das liberdades individuais e o funcionamento econômico. 
As medidas restritivas, como lockdowns e quarentenas, buscavam conter a disseminação 
do vírus. Entretanto, essas restrições impactaram diretamente as liberdades individuais, como 
o direito à livre circulação, à educação e ao trabalho. A limitação das atividades cotidianas 
gerou inquietações sobre a restrição das escolhas individuais e a perda de autonomia, 
especialmente entre grupos mais vulneráveis. 
Minorias étnicas, trabalhadores informais e populações de baixa renda enfrentaram 
desafios adicionais ao acesso a serviços básicos e apoio governamental durante os períodos de 
restrição. Por conseguinte, o dilema ético entre proteger a saúde pública e salvaguardar as 
liberdades individuais se tornou evidente, demonstrando a necessidade de encontrar um 
equilíbrio delicado entre essas considerações. 
As medidas restritivas também tiveram impactos significativos na economia, gerando 
desafios em diversas frentes. A suspensão de atividades comerciais não essenciais, o 
fechamentode fronteiras e as restrições de viagem afetaram a cadeia de suprimentos e a 
produção, resultando em interrupções econômicas substanciais. Outrossim, setores como o 
turismo foram particularmente afetados, com perdas massivas devido à queda na demanda. 
Além disso, o aumento do desemprego devido ao fechamento temporário de empresas 
e redução de operações gerou dificuldades financeiras para muitos indivíduos e famílias. Essas 
consequências econômicas afetaram a qualidade de vida e a segurança financeira da população 
em geral, até mesmo porque a redução das atividades econômicas também impactou a 
arrecadação de impostos, acrescentando desafios à sustentação de programas de ajuda e 
investimentos governamentais. 
103 
 
 
Como resultado, os desafios econômicos estimularam discussões sobre o equilíbrio 
entre a saúde pública e a recuperação econômica. A imposição de restrições pode ser uma 
medida eficaz para conter o vírus, mas também pode ter implicações profundas para a 
estabilidade econômica e o bem-estar da população. 
Em resumo, a análise mais aprofundada do impacto nas liberdades individuais e nos 
desafios econômicos decorrentes das medidas restritivas na pandemia ressalta a complexidade 
inerente à tomada de decisões nesse contexto. O conflito entre a proteção da saúde pública e a 
preservação das liberdades individuais, bem como o equilíbrio entre a contenção do vírus e a 
sustentação econômica, exige uma abordagem cuidadosa e multidisciplinar. A imposição de 
quarentenas, toques de recolher e limitações nas atividades sociais colocou em evidência a 
delicada balança entre o bem coletivo e as escolhas individuais. 
É importante destacar que a preservação das liberdades individuais é uma pedra angular 
das sociedades democráticas e dos direitos humanos. Restringir essas liberdades em nome da 
saúde pública levanta questões profundas sobre a legitimidade e a proporcionalidade das ações 
adotadas. À vista disso, o desafio reside em encontrar um ponto de equilíbrio que leve em 
consideração não apenas a eficácia das medidas restritivas, mas também o respeito pelos 
direitos individuais e as consequências sociais e econômicas dessas ações. Da mesma forma, o 
equilíbrio entre a contenção do vírus e a sustentação econômica foi um desafio intrincado. 
Portanto, a análise das implicações de longo prazo nas liberdades individuais, nas 
dinâmicas econômicas e nas estruturas sociais deve ser central na formulação de qualquer 
política pública. 
 
6. DILEMA ÉTICO: NAVEGANDO ENTRE A SAÚDE PÚBLICA E OS DIREITOS 
INDIVIDUAIS NA PANDEMIA 
 
A pandemia do coronavírus trouxe à tona um profundo dilema ético que envolve a busca 
pela saúde pública e a preservação dos direitos individuais. Esse dilema se desenrola em meio 
a medidas restritivas que frequentemente se chocam com as liberdades civis fundamentais. 
A priorização da saúde pública é inquestionável; no entanto, a imposição de medidas 
restritivas severas levantou questionamentos essenciais sobre a validade dessas ações em 
relação à liberdade de movimento, expressão e reunião. A necessidade de mitigar a propagação 
do vírus colocou em evidência a tensão entre o bem coletivo e a autonomia individual. 
104 
 
 
Por um lado, os defensores das medidas restritivas argumentaram que a proteção da 
saúde e da vida é imperativa. O direito à saúde é um direito humano universalmente reconhecido 
e a responsabilidade das autoridades de saúde é garantir a minimização de riscos para a 
população. A imposição de restrições temporárias, nesse sentido, pode ser vista como uma 
medida necessária para evitar sobrecarregar sistemas de saúde já precários e salvar vidas. 
Por outro lado, as restrições às liberdades individuais podem ser interpretadas como uma 
violação dos direitos humanos e uma ameaça à democracia. A imposição de quarentenas, por 
exemplo, resultou em isolamento social, impactando negativamente a saúde mental e o bem-
estar emocional das pessoas, sem contar nas denúncias de abusos de poder. 
Além disso, a imposição indiscriminada de medidas restritivas pode afetar 
desproporcionalmente grupos marginalizados e economicamente vulneráveis, agravando ainda 
mais as desigualdades sociais. As populações que dependem de trabalho informal ou que vivem 
em condições precárias podem ser especialmente afetadas, levando a uma situação de escolha 
difícil entre a exposição ao vírus ou à privação econômica. 
Levando isso tudo em consideração, o dilema ético se aprofunda quando observamos a 
necessidade de equilibrar a resposta à pandemia com as implicações econômicas e sociais. A 
preservação dos direitos individuais e a sustentação econômica são elementos interconectados 
que requerem uma abordagem equilibrada e multidisciplinar. Encontrar esse equilíbrio é um 
desafio contínuo e fundamental para tomar decisões responsáveis. 
 
7. A IMPORTÂNCIA DA DELIBERAÇÃO MULTIDISCIPLINAR NA TOMADA DE 
DECISÕES DURANTE A PANDEMIA 
 
Diante da complexidade das questões apresentadas pela pandemia do coronavírus, a 
deliberação multidisciplinar emerge como um pilar fundamental na tomada de decisões 
informadas e abrangentes, numa abordagem que vá além das fronteiras de uma única disciplina. 
O debate, no entanto, centrou-se na seara política. A colaboração entre especialistas de 
diferentes campos, como saúde, ética, economia, sociologia e direitos humanos, deveria ter sido 
vital para abordar a multiplicidade de perspectivas e considerações envolvidas. 
Os especialistas em saúde pública trouxeram, na sua perspectiva, conhecimentos 
técnicos sobre a disseminação do vírus, suas características e as melhores estratégias de 
contenção. Todavia, as decisões relacionadas às restrições de liberdades individuais não 
105 
 
 
deveriam ter sido tomadas unicamente com base em dados epidemiológicos, muitos 
superestimados. 
A ética, por exemplo, entra em jogo ao ponderar os princípios de beneficência e 
autonomia, enquanto a economia desempenha um papel crucial na avaliação dos impactos 
socioeconômicos das medidas adotadas. 
Além disso, a deliberação multidisciplinar promove um ambiente de debate informado, 
no qual diversas perspectivas são ouvidas e consideradas. Essa abordagem desafia a tendência 
de excessiva polarização e permite a identificação de soluções que levem em conta tanto a saúde 
pública quanto os direitos e necessidades individuais. Também, a diversidade de vozes também 
ajuda a evitar soluções simplistas que negligenciam aspectos complexos da situação. 
Ao abraçar a deliberação multidisciplinar, os formuladores de políticas públicas têm a 
oportunidade de tomar decisões mais justas e sustentáveis. A troca de conhecimentos entre 
diferentes campos amplia a visão de problemas complexos e estimula a criatividade na busca 
por soluções inovadoras. 
Em última análise, a pandemia do coronavírus foi um lembrete da interdependência 
global e da necessidade de abordagens colaborativas. A deliberação multidisciplinar é um 
reflexo desse entendimento, oferecendo uma maneira de enfrentar os desafios complexos que a 
pandemia apresenta. Ao reunir uma diversidade de conhecimentos e perspectivas, podemos 
tomar decisões mais fundamentadas e humanas que considerem os interesses e direitos de toda 
a população. 
 
8. CONCLUSÃO: REFLEXÕES CRÍTICAS SOBRE A AUTORIDADE CIENTÍFICA 
E OS ABUSOS ÀS LIBERDADES INDIVIDUAIS 
 
À medida que consideramos os desdobramentos da pandemia do coronavírus, é inegável 
que o embate entre a busca pela saúde pública e a preservação das liberdades individuais 
desencadeou uma série de questionamentos essenciais. Enquanto a ciência é uma ferramenta 
inestimável para entender e combater a doença, a imposição unilateral de medidas restritivas 
baseadas no critério de autoridade científica expôs vulnerabilidades preocupantes em nossa 
sociedade. 
O abuso da autoridade científica, muitas vezes respaldado por decisões governamentais, 
levantouinterrogações sobre os limites éticos e a integridade da tomada de decisões. A 
106 
 
 
imposição de lockdowns indiscriminados e quarentenas prolongadas demonstrou uma falta de 
consideração pelas consequências socioeconômicas e psicológicas que afetaram a população. 
A supressão das liberdades individuais em nome da saúde pública segue levantando dúvidas 
sobre o papel das instituições e dos especialistas em lidar com crises complexas. 
Além disso, a falta de uma abordagem equilibrada e multidisciplinar resultou em 
desigualdades exacerbadas. Grupos marginalizados e economicamente vulneráveis suportaram 
o peso desproporcional das medidas restritivas, enquanto os mais privilegiados puderam se 
isolar com mais facilidade. A suposta "igualdade" das restrições não levou em consideração as 
realidades variadas e as necessidades específicas de diferentes setores da população. 
O abuso da autoridade governamental também entrou em jogo, à medida que se 
impuseram medidas draconianas sem o devido debate público e participação. A transparência 
nas decisões foi comprometida, alimentando a desconfiança e a desinformação. Logo, a falta 
de clareza na comunicação e na justificação das ações reforçou a sensação de que a população 
estava sendo manipulada em nome da saúde pública. 
A conclusão inevitável é que a pandemia destacou tanto a importância da ciência quanto 
os perigos da autoridade científica mal aplicada. As lições aprendidas reforçam a necessidade 
de uma abordagem mais equilibrada, que envolva não apenas especialistas em saúde, mas 
também ética, economia, sociologia e outras disciplinas. A proteção da saúde pública deve ser 
harmonizada com a preservação das liberdades individuais e com a compreensão das 
implicações sociais e econômicas de nossas ações. 
A autoridade científica, assim, deve ser usada com responsabilidade e em conjunto com 
outras considerações essenciais. Devemos aprender com os erros do passado e garantir que a 
busca pela saúde não seja alcançada à custa da dignidade humana, das liberdades fundamentais 
e da justiça social. 
 
REFERÊNCIAS 
 
ALTERIO, T. Big Pharma: o maior e mais obscuro negócio do século XXI. Editora PHVox, 
2023. 
BIGONI, A.; MALIK, A.; TASCA, R.; CARRERA, M. B.; SCHIESARI, L. M.; 
GAMBARDELLA, D.; MASSUDA, A. Brazil’s health system functionality amidst of the 
COLLINS, P. D.; COLLINS, P. A ascendência da ditadura científica: um exame da autocracia 
epistêmica, do século XIX ao XX. Campinas, SP: Vide Editorial, 2022. 
107 
 
 
COVID-19 pandemic: An analysis of resilience. The Lancet Regional Health/Americas. 10. 5, 
March, 2022. Disponível em: <https://doi.org/10.1016/j.lana.2022.100222>. Acesso em: 14 
ago. 2023. 
FEYERABEND, P. Contra o método. Tradução de Cesar Mortari. São Paulo: Editora Unesp, 
2011. 
HAYEK, F. A. The counter-revolution of science: studies on the abuse of reason. Nova York: 
The Free Press, 1955. 
IBGE - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua Trimestral. Disponível em: 
<https://sidra.ibge.gov.br/tabela/4092>. Acesso em: 24 ago. 2023. 
JIMÉNEZ, C. M. A verdade sobre a Pandemia: quem é o culpado e por quê. Campinas, SP: 
Vide Editorial, 2022. 
ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DE SAÚDE. Histórico da pandemia de COVID-19. 
Disponível em: <https://www.paho.org/pt/covid19/historico-da-pandemia-covid-
19#:~:text=Em%2031%20de%20dezembro%20de,identificada%20antes%20em%20seres%20
humanos.>. Acesso em: 25 ago. 2023. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
108 
 
 
BIOÉTICA E DIREITOS HUMANOS: INTERFACES NA 
CONTEMPORANEIDADE 
 
Cristiane Avancini Alves1 
RESUMO 
 
A relação entre bioética e direitos humanos busca delinear os fios condutores e conectivos entre 
dois campos que espelham a realidade humana e que instigam o olhar sobre nós mesmos e, 
assim, sobre a própria humanidade. Nesse sentido, aspectos referentes a situações 
contemporâneas possibilitam a análise de elementos que sustentam essas reflexões, e trazem 
caminhos para tomadas de decisão. A questão dos cuidados paliativos e o enfrentamento da 
pandemia de COVID-19 suscita dilemas éticos e jurídicos que são permeados por princípios 
referentes ao tema, como autonomia e responsabilidade. No âmbito do processo informativo, o 
afastamento da desinformação, embasada pelos direitos humanos, perfectibiliza a sedimentação 
de uma sociedade democrática, em que o enfrentamento das emergências climáticas é situado 
como parte inerente da proteção da dignidade da pessoa humana e dos deveres de cuidado para 
com o meio ambiente. Há, portanto, a estruturação de pontes importantes de relação entre os 
princípios presentes na Declaração Universal de Bioética e de Direitos Humanos e temas que 
perpassam a atualidade, especialmente por meio da construção de sentidos e de significados 
que envolvem os avanços biomédicos e as novas tecnologias informativas. 
 
Palavras-chaves: Bioética; Direitos humanos; Cuidados paliativos; Informação; Meio 
ambiente. 
 
INTRODUÇÃO 
Mas as ciências também refletiram na sua marcha a revolução dupla, em parte porque 
esta lhes colocou novas e específicas exigências, em parte porque lhes abriu novas 
possibilidades e confrontou-as com novos problemas, e em parte porque sua própria exigência 
sugeria novos padrões de pensamento. Não desejo deduzir disto que a evolução das ciências 
entre 1789 e 1848 possa ser analisada exclusivamente em termos dos movimentos da sociedade 
que as rodeavam. (...) O progresso da ciência não é um simples avanço linear, cada estágio 
determinando a solução de problemas anteriormente implícitos ou explícitos nele, e por sua vez 
colocando novos problemas. Este avanço também prossegue pela descoberta de novos 
problemas, de novas maneiras de enfocar os antigos, de novas maneiras de enfrentar ou 
solucionar velhos problemas, de campos de investigação inteiramente novos, de novos 
instrumentos práticos e teóricos de investigação (Hobsbawn, 2012). 
 
 
1 Pós-doutoranda do Programa CAPES junto ao Mestrado Profissional em Pesquisa Clínica do Hospital de Clínicas 
de Porto Alegre (MPPC/HCPA), Pesquisadora junto ao Laboratório de Pesquisa em Bioética e Ética na Ciência 
(LAPEBEC) do HCPA, Doutora em Direito pela Scuola Superiore Sant’Anna de Pisa, Itália, e Mestre em Direito 
pela UFRGS. OABRS 86649. E-mail: crisavancini@gmail.com. 
109 
 
 
O denominado “progresso da ciência”, referenciado por Erik Hobsbawn em sua obra A 
Era das Revoluções, é um tema que perpassa a humanidade. A cada período histórico, novos 
desafios ou novas formas de se lidar com esse progresso instigam a sociedade. No âmbito 
médico, ressalta-se o próprio conceito de saúde, definido após a Segunda Guerra Mundial, 
especialmente em virtude da descoberta de campos de concentração e a experimentação em 
seres humanos operadas nesse contexto. Em julho de 1946, a Constituição da Organização 
Mundial da Saúde (OMS) definiu que o conceito de saúde inclui o bem-estar mental e social, e 
não apenas aquele físico2. Essa definição, analisada dentro do seu contexto histórico, indica o 
surgimento da ideia de um Estado Social, e, também, de uma “medicina social”, o que leva à 
passagem do cuidado à saúde de uma esfera privada para uma responsabilidade pública. 
É nesse sentido que a internacionalização dos direitos humanos constitui um movimento 
extremamente recente na história, que surge com o pós-guerra, e que se legitima através da 
necessidade de que a população mundial precisa, constantemente, renovar ou reascender a 
memória frente às garantias fundamentais que permeiam nossa sociedade. Portanto, “em face 
das atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra Mundial, a comunidade internacional 
passou a reconhecer que a proteção dos direitos humanos constitui questão de legítimo interesse 
e preocupação internacional” (Piovesan, 2012). É por isso que, de acordo com Flávia Piovesan, 
eles transcendeme extrapolam o domínio reservado do Estado ou a competência nacional 
exclusiva, criando parâmetros globais de ação estatal. 
Essa importância associa-se à Bioética, que configura um importante campo de encontro 
de áreas do conhecimento conectadas à proteção da vida humana em suas variadas perspectivas. 
A experimentação em seres humanos ocorrida nos campos de concentração foi um dos 
componentes históricos que levou a comunidade mundial a definir e, também, a aprimorar 
princípios basilares de aplicabilidade e conduta na relação entre a ciência e a pessoa humana. 
Nesse panorama, as percepções de liberdade e autonomia são fortalecidas também na 
esfera biomédica, com a transformação na relação médico-paciente, medicina-sociedade, após 
1960. Antes, o médico tomava a decisão sobre o tratamento, o que se altera na metade de 1970. 
Segundo David Rothman, o impacto desses acontecimentos foi o de “tornar visível o invisível. 
Pessoas de fora do âmbito médico – ou seja, advogados, juízes e acadêmicos – entraram em 
 
2 O conceito de “saúde” presente na Constituição da Organização Mundial da Saúde: “Health is a state of complete 
physicial, mental and social well-being and not merely the absence of disease and infirmity”. Disponível em: 
https://www.who.int/about/governance/constitution, acesso em 30 de outubro de 2023. 
110 
 
 
cada canto e recanto do processo de dar à medicina um excepcional destaque na agenda pública 
e de tornar o tema um discurso popular” (Rothman, 2003). 
O presente artigo visa, portanto, delinear um breve panorama sobre a relação entre 
Bioética e Direitos Humanos e suas conexões com aspectos da contemporaneidade. As 
percepções sobre os cuidados paliativos e o entrelaçamento com a pandemia de COVID-19 
buscam evidenciar caminhos de enfrentamento sobre o tema. Seguindo-se sob o olhar reflexivo, 
a importância da informação – bem como o afastamento da desinformação – são bases 
importantes para a relação entre as emergências climáticas e os direitos humanos. Nesse 
percurso, a Declaração Universal de Bioética e de Direitos Humanos é documento condutor de 
referência principiológica na concreção de práticas sobre os temas abordados. 
 
1 ORIGEM E FUNDAMENTOS DA RELAÇÃO ENTRE BIOÉTICA E DIREITOS 
HUMANOS 
O surgimento da palavra “bioética” e sua relação com os direitos humanos participa de 
um percurso que associa importantes princípios que emergem, especialmente, do pós-Segunda 
Guerra Mundial. A experimentação em seres humanos, prática exercida em campos de 
concentração, e seu repúdio pela comunidade internacional, trouxeram a positivação da 
dignidade da pessoa humana, sua autonomia e um amplo conceito de saúde como aplicações de 
caráter internacional. 
1.1 Percursos de conexão entre Bioética e Direitos Humanos 
No ano de 1971, ocorre o registro da palavra “bioética” associada à conexão entre a 
ciência e a humanidade, sendo que, por muitos anos, esse foi considerado o marco inicial do 
uso da palavra “bioética”. Nesse contexto, o livro “Bioética: uma ponte para o futuro”, do 
bioquímico americano Van Rensselaer Potter (Potter, 1971), procurou imprimir um sentido de 
desenvolvimento e de caráter evolucionista, combinando o conhecimento biológico (‘bio’) com 
o conhecimento do sistema de valores humanos (‘ethics’). Desse primeiro momento, outras 
duas etapas do pensamento de Potter irão caracterizar a bioética: a primeira, ao final da década 
de 1980, quando ele enfatiza o seu caráter interdisciplinar e abrangente, denominando-a de 
“Global”, e a segunda, em 1998, ao redefinir a bioética como “Profunda”, ao entendê-la como 
“ciência ética que combina humildade, responsabilidade e uma competência interdisciplinar, 
intercultural, que potencializa o senso de humanidade” (Goldim, 2009). 
111 
 
 
Por muitos anos, essa referência pautou a origem da palavra “bioética”. Entretanto, 
estudos revelam que o termo “bio-ethics” foi utilizado pela primeira vez em 1926, por Fritz 
Jahr, pastor protestante, filósofo e educador alemão, no texto “Life science and ethics: old 
knowledge in new clothing”, sendo que, até pouco tempo, o primeiro registro da palavra datava 
de 1927, também em um texto de Jahr, publicado na revista Kosmos, quando o autor designou 
a “assunção de obrigações éticas não apenas com relação ao homem, mas a todos os seres vivos” 
(Engels, 2004). Para Jahr, plantas e animais “são parceiros morais dos seres humanos, e essa 
relação atribui obrigações aos humanos para que tratem animais e plantas apropriadamente” 
(Goldim, 2009), uma percepção completa e abrangente, não limitada ao âmbito da saúde e da 
medicina. A bioética, segundo Jahr, “não é uma descoberta do presente” (Jahr, 1926), e remete 
essa percepção a São Francisco de Assis, considerado um grande protetor dos animais. Jahr 
viveu em um período de transformações sociais, sendo que entre os anos 1926 e 1927, datas em 
que escreveu e registrou a palavra “bioética”, há um progressivo avanço das ciências da vida, 
em especial os estudos relacionados à psicologia (Sass, 2008). A Europa ainda não tinha vivido 
a experiência das duas Grandes Guerras Mundiais, que irão influenciar fortemente a própria 
humanidade (Pessini, 2013). Nesse sentido, é interessante perceber que Jahr, já naquele 
contexto, “delineou uma aproximação abrangente da bioética, que incluiu os seres humanos em 
relação de progressiva complexidade com a sociedade, com a humanidade, e com a biosfera” 
(Goldim, 2009). 
Em 1939, a eclosão da Segunda Guerra Mundial e a posterior descoberta dos campos de 
concentração, como “gigantescas máquinas de despersonalização de seres humanos” 
(Comparato, 2003), suscitaram novos debates quanto à proteção da pessoa humana. Um 
elemento peculiar de estudo a respeito desse tema é suscitado por Giorgio Agamben, que o 
denomina de “paradoxo da soberania” (Agamben, 2005), ou seja, quando o soberano está, ao 
mesmo tempo, fora e dentro do ordenamento jurídico. O referido autor associa as suas 
percepções com o pensamento de outras obras que relatam como esse fenômeno participou da 
formação dos campos de concentração, lugares em que o chamado “estado de exceção”, 
proclamado pelo soberano, suspende a própria validade do ordenamento. O paradoxo reside, 
exatamente, no fato de alguém poder estar do lado de fora desse ordenamento e, ao mesmo 
tempo, pertencer a ele, porque consegue suspendê-lo. 
No que concerne ao campo de concentração, Agamben entende que ele “é o espaço que 
se abre quando o estado de exceção começa a tornar-se regra” (Agamben, 2002). Assim, esse 
estado de exceção, que seria a suspensão temporal do ordenamento em determinado contexto 
112 
 
 
fático de perigo, passa a ter uma “disposição espacial permanente que, como tal, permanece, 
porém, estavelmente fora do ordenamento normal” (Agamben, 2002). É por isso que, na medida 
em que esse estado de exceção passa a ser aceito e, até mesmo, desejado, inaugura um novo 
“paradigma jurídico-político, no qual a norma torna-se indiscernível da exceção. O campo é, 
digamos, a estrutura em que o estado de exceção, em cuja possível decisão se baseia o poder 
soberano, é realizado normalmente” (Agamben, 2002). 
A força dessas considerações reside no quanto determinado contexto cultural, social, 
econômico e político pode alterar, profundamente, a configuração jurídica de determinado 
ordenamento, mudança essa que atinge, diretamente, nossa própria humanidade. O fim da 
Segunda Guerra Mundial levou os países vencedores a estabelecer um julgamento das práticas 
efetuadas naquele contexto, no qual o genocídio foi classificado, portanto, como um dos crimes 
contra a humanidade (Lafer, 1988). 
É nesse sentido que a internacionalização dos direitos humanos constitui um movimento 
extremamente recente na história, que surge com o pós-guerra, e se legitima através da 
necessidade de que a população mundialprecisa, constantemente, renovar ou reascender a 
memória frente às garantias fundamentais que permeiam nossa sociedade. Portanto, “em face 
das atrocidades cometidas durante a Segunda Guerra Mundial, a comunidade internacional 
passou a reconhecer que a proteção dos direitos humanos constitui questão de legítimo interesse 
e preocupação internacional” (Piovesan, 2012). É por isso que, de acordo com Flávia Piovesan, 
eles transcendem e extrapolam o domínio reservado do Estado ou a competência nacional 
exclusiva, criando parâmetros globais de ação estatal. 
Essa importância associa-se à Bioética, que configura um importante campo de encontro 
de diversas áreas do conhecimento conectadas à proteção da vida humana em suas variadas 
perspectivas. A experimentação em seres humanos ocorrida nos campos de concentração foi 
um dos componentes históricos que levou a comunidade mundial a definir e, também, aprimorar 
princípios basilares de aplicabilidade e conduta na relação entre a ciência e a pessoa humana. 
1.2 A Declaração Universal de Bioética e de Direitos Humanos 
Entre os documentos internacionais sobre direitos humanos publicados após a Segunda 
Guerra Mundial, que antecederam a Declaração Universal de Bioética e de Direitos Humanos, 
é importante destacar aqueles que trazem princípios relevantes para os temas biomédicos. Tem-
se, no artigo I da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), a afirmação da dignidade 
inerente a toda pessoa humana, titular de direitos iguais e inalienáveis. O artigo III garante o 
113 
 
 
direito à vida, e o artigo XII dispõe sobre a proteção à privacidade e a informações pessoais. 
Esse documento, “retomando os ideais da Revolução Francesa, representou a manifestação 
histórica de que se formara, enfim, em âmbito universal, o reconhecimento dos valores 
supremos da igualdade, da liberdade e da fraternidade entre os homens (...)” (Comparato, 2003). 
Sua implementação requer o esforço sistemático de cada país para que a sociedade incorpore 
os direitos humanos como prática efetiva da vida em comunidade. Por ser uma declaração, 
tecnicamente, o documento não tem força vinculante. Contudo, o reconhecimento desses 
direitos deve ser exercido no âmbito do direito internacional. Afirma-se que “a Declaração 
Universal tem sido concebida como a interpretação autorizada da expressão ‘direitos humanos’, 
constante da Carta das Nações Unidas, apresentando, por esse motivo, força jurídica 
vinculante” (Piovesan, 2012). 
Com esse olhar voltado à sociedade, após a Declaração Universal dos Direitos Humanos 
houve o seguimento da institucionalização dos direitos humanos. Em 1966, o Pacto 
Internacional dos Direitos Civis e Políticos trouxe, em seu artigo 7º, a importância e a 
necessidade da utilização do consentimento informado como documento que atesta a adequada 
informação no processo de tomada de decisão na área biomédica. Essa percepção conecta-se ao 
artigo 12 do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, publicado no 
mesmo ano, ao ressaltar o acesso à saúde e o pleno exercício desse direito como elemento 
fundante da afirmação dos direitos humanos. 
O desenvolvimento de novas tecnologias, no decorrer dos anos posteriores a esses 
documentos, levou as organizações internacionais a uma nova reflexão. O Conselho da Europa, 
através da Convenção sobre Direitos Humanos e Biomedicina realizada em 1997, também 
conhecida como “Convenção de Oviedo”, busca harmonizar o delineamento de reflexões ou 
soluções para os questionamentos ou conflitos que surgem nesse campo. De acordo com 
Roberto Andorno, 
a necessidade “de ‘common standards’ mínimos para os novos dilemas que surgem 
na área biomédica levaram a que organizações governamentais promovessem, a partir 
de meados de 1990, a procura de um consenso internacional relativo a algumas normas 
tidas como básicas na área biomédica” (Andorno, 2008). 
 
A Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos resulta desse panorama. 
Portanto, após a Convenção de Oviedo, outros três importantes documentos que tratam da área 
biomédica surgem no cenário internacional: a Declaração Universal sobre o Genoma Humano 
e os Direitos Humanos (1997), a Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos Humanos 
(2003), e a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (2005). Este último é de 
114 
 
 
grande importância, pois é o primeiro documento internacional que, numa esfera global, 
estabelece a relação entre a Bioética e os Direitos Humanos. 
Entre os objetivos das disposições gerais da Declaração Universal sobre Bioética e 
Direitos Humanos, destaca-se a contribuição para o respeito pela dignidade da pessoa humana 
e a proteção dos direitos humanos, garantindo o respeito pela vida dos seres humanos e as 
liberdades fundamentais de modo compatível com o direito internacional, bem como a 
promoção do acesso equitativo aos progressos da medicina, da ciência e da tecnologia. O 
documento indica, logo após, os princípios e sua aplicação, e como deverá ser feita a promoção 
da Declaração pelos Estados, pela esfera educacional, pela cooperação internacional, além de 
expor as iniciativas de acompanhamento da UNESCO. As disposições finais da Declaração 
indicam que seus princípios devem ser entendidos como complementares e interdependentes, 
nas suas medidas pertinentes e de acordo com as circunstâncias3. 
Um exemplo que pode ser mencionado nesse contexto diz respeito ao seu art. 5º, que 
dispõe que “a autonomia das pessoas no que respeita à tomada de decisões, desde que assumam 
a respectiva responsabilidade e respeitem a autonomia dos outros, deve ser respeitada. No caso 
das pessoas incapazes de exercer a sua autonomia, devem ser tomadas medidas especiais para 
proteger seus direitos e interesses”. De acordo com uma análise desenvolvida por Donald Evans 
sobre esse item da Declaração, a bioética surge através de um diferenciado número de 
contextos, sendo possível destacar dois deles: o primeiro refere-se ao surgimento das noções de 
direitos humanos e individuais durante a segunda metade do século XX, e o segundo denota a 
reação aos abusos cometidos na esfera dos direitos humanos nesse mesmo período quanto à 
prática de pesquisa clínica (Evans, 2009). 
Segundo o autor, a Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948 trouxe uma clara 
referência à proteção desses direitos quando indica que todos os seres humanos nascem livres 
e em igualdade de direitos e de dignidade, documento que “seguiu o Código de Nuremberg 
(1947), que tomou por base os julgamentos de Nuremberg em relação aos médicos 
pesquisadores que foram acusados e condenados por cometer crimes contra a humanidade em 
nome da pesquisa médica” (Evans, 2009). Seguindo esse cenário, o Código traz o 
consentimento informado como tangível expressão do respeito à autonomia. Na importância de 
se conectar a bioética com os direitos humanos, ficou claro para “aqueles que estavam 
 
3 Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos. UNESCO – Organização das Nações Unidas para a 
Educação, Ciência e Cultura. Disponível em: unesdoc.unesco.org/images/0014/.../146180por.pdf. Acesso em 30 
de outubro de 2023. 
115 
 
 
elaborando a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos que um artigo que 
dispõe sobre o respeito pela autonomia das pessoas envolvidas no tratamento médico e de 
pesquisa era uma exigência absoluta” (Evans, 2009). 
Essa exigência tem como fundamento a humanidade ínsita a cada pessoa, o que torna 
possível falar da universalidade dos direitos humanos. O caráter de universalidade presente na 
análise dos direitos humanos, em razão de serem tidos como direitos inerentes a todo ser 
humano, reflete-se na possibilidade de sua aplicação num amplo e importante espectro de 
diversidade cultural. É nesse sentido que países de orientações políticas, religiosasou sociais 
diversas ratificam ou aderem aos tratados e convenções que envolvem esse tema, pois “trata-se 
essencialmente de um direito de proteção, marcado por uma lógica própria, e voltado à 
salvaguarda dos direitos dos seres humanos e não dos Estados” (Cançado Trindade, 1997). 
O ordenamento jurídico brasileiro positiva, no art. 4º, II, da Constituição Federal, a 
prevalência dos direitos humanos como princípio que rege as relações internacionais. Após a 
promulgação da Emenda Constitucional nº 45, de 2004, foi incluído o § 3º ao art. 5º da Carta 
Magna, que assim dispõe: “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que 
forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos 
votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”. Esse 
dispositivo suscitou interessantes debates quanto à hierarquia das normas, mas para a presente 
obra é importante referir, diretamente, que a temática dos direitos humanos possui força 
constitucional (Piovesan, 2012). 
Ressalta-se que a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos não é um 
tratado, mas, conforme também já referido acima, o reconhecimento dos direitos humanos no 
cenário mundial e a importância de sua garantia e memória quanto à proteção da pessoa humana 
remetem à interpretação vinculante de suas disposições, associada aos princípios que embasam 
essa mesma interpretação. É o denominado “sentido de direção” (Lafer, 2005) que se busca 
oferecer à sociedade, especialmente quando nos referimos a temas que nos confrontam com a 
nossa própria humanidade. 
 
2 BIOÉTICA E DIREITOS HUMANOS: QUESTÕES CONTEMPORÂNEAS 
Há diferentes e importantes temas contemporâneos que se associam à análise sobre 
Bioética e Direitos Humanos. A pandemia de COVID-19 suscitou debates necessários sobre o 
olhar para o fim de vida e, assim, também sobre os cuidados paliativos. Paralelamente, a 
preservação da vida em nosso planeta participa, da mesma forma, de espaços fundamentais de 
116 
 
 
debate sobre informação e o afastamento da desinformação sobre a ciência. Nesse sentido, os 
temas tratados buscam delinear reflexões que possam auxiliar nos processos de tomada de 
decisão nessas esferas. 
2.1 COVID-19 e fim de vida: aspectos sobre os cuidados paliativos 
A relação entre Bioética e Direitos Humanos atua diretamente na percepção quanto à 
importância dos denominados “cuidados paliativos” no atual debate sobre o fim de vida. Esse 
tema foi roteiro de um interessante filme italiano ambientado, inicialmente, na década de 1970 
numa praia da Toscana, quando uma bela jovem ganha o concurso de “mãe mais bonita” 
daquele verão (Alves, 2011). Os anos passam, e a agora senhora luta contra um câncer que não 
a desanima; pelo contrário, sempre com um sorriso nos lábios, ela procura unir, novamente, sua 
família, e restabelecer laços que tinham se perdido com o tempo. Esse panorama dos cuidados 
paliativos ultrapassa as telas do cinema e se torna tema legislativo em diversos países. 
No âmbito internacional, a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera que os 
cuidados paliativos “são uma parte crucial dos serviços de saúde integrados e centrados nas 
pessoas. Aliviar o sofrimento grave relacionado com a saúde, seja ele físico, psicológico, social 
ou espiritual, é uma responsabilidade ética global”4. Nessa visão ampla, sedimenta-se a 
percepção da vida, em que a morte é tida como um processo normal, sem qualquer intenção de 
acelerar ou retardar esse processo. 
A origem da palavra “paliativo” advém do latim pallium (manto, pálio, um termo que 
hoje caracteriza o pálio papal, uma estola de lã de carneiro que simboliza a ovelha perdida que 
o bom pastor carrega em seus ombros). Com essa imagem, o termo “cuidado paliativo” refere-
se ao atendimento a pacientes com doenças terminais com o objetivo de melhorar sua qualidade 
de vida, ao invés de prolongar a sobrevida, oferecendo aos pacientes e a suas famílias um 
cuidado contínuo e abrangente no que diz respeito tanto aos aspectos médicos e de saúde quanto 
aos psicossociais, existenciais e espirituais, em um único modelo holístico (Cetto, 2010). 
Nesse ponto, a percepção do sofrimento entendido num aspecto mais amplo, que inclui 
não apenas a dor física, torna-se elemento de reflexão conjugado à própria evolução das 
tecnologias e das práticas biomédicas. Assim, se o aparato técnico em relação ao tratamento de 
doenças está em constante desenvolvimento, “o que permanece, porém, inalterada, é a natureza 
intrínseca do homem, com suas necessidades básicas” (Mitscherlich, 1977). Portanto, a 
 
4 World Health Organizations (WHO), Palliative care: https://www.who.int/health-topics/palliative-care. Acesso 
em 30 de outubro de 2023. 
117 
 
 
formação de estruturas de acolhimento de pacientes que possuem diagnóstico de poucos meses 
de vida é demonstração do quanto esse tema também está em processo de desenvolvimento e 
aprimoramento no cenário mundial. 
Essas estruturas surgem com a denominação “hospice”, que traduz o termo em latim 
hospitium e retoma a imagem de um lugar de acolhimento (Cunietti et al, 1994). Ainda que haja 
significativas mudanças decorrentes da evolução dos tratamentos médicos, essa abordagem 
permanece por meio da importância que o hospice oferece aos “cuidados paliativos do que aos 
curativos, à qualidade da vida ao invés da quantidade da vida, ao alívio físico e espiritual do 
paciente ao invés da aplicação dos regimes terapêuticos e preordenados que seriam, de qualquer 
forma, não mais decisivos” (Cirillo, 2002). 
O primeiro hospice com as características de envolvimento dos cuidados paliativos 
semelhantes aos atuais foi idealizado por Dame Cicely Saunders, em 1967, na Inglaterra. O St. 
Christopher’s Hospice, localizado em um subúrbio de Londres, criou o protótipo do hospice 
moderno, formado por uma equipe multidisciplinar e que se apresentava como uma alternativa 
para a casa do paciente, uma vez que possibilitou um atendimento de saúde específico sem 
interrupção (24h), em um ambiente confortável e como alternativa para o hospital. Promoveu, 
também, a personalização do tratamento e possibiliou a presença contínua de familiares e 
amigos próximos ao paciente (Cunietti et al, 1994). 
No âmbito jurídico, há países que introduziram legislativamente o tema em seu 
panorama legal. Por exemplo, a Lei 2/2010 Ley de Derechos y Garantías de la Dignidad de la 
Persona en el Proceso de la Muerte da Andalusia, na Espanha, afirma em seu preâmbulo que 
“O direito a uma vida humana digna não pode ser obstaculizado com uma morte indigna. O 
ordenamento jurídico está, portanto, chamado também a concretizar e proteger este ideal da 
morte digna”5. Na França, os cuidados paliativos foram oficialmente introduzidos no sistema 
nacional através da circulaire Laroque de 1986, relativa “à organização e acompanhamento dos 
doentes em fase terminal”. Após a proposta do deputado Jean Leonetti sobre “o 
acompanhamento do fim de vida”, realizada em 2002, foi promulgada a Loi relative aux droits 
des malades et à la fin de vie em 2005, e em fevereiro de 2010 o governo francês inaugurou um 
“Observatório nacional do fim de vida”6. O Observatório tem como objetivo divulgar 
informações sobre os aspectos da lei relativa ao fim da vida. 
 
5 Lei disponível em: http://www.parlamentodeandalucia.es/webdinamica/portal-web-
parlamento/pdf.do?tipodoc=coleccion&id=47573&cley=2. Acesso em 30 de outubro de 2023. 
6JORF n°0092 du 20 avril 2010 page 7331 - texte n° 60 - Arrêté du 12 avril 2010 fixant la composition du comité 
de pilotage de l'Observatoire national de la fin de vie, http://www.legifrance.gouv.fr. 
http://www.parlamentodeandalucia.es/webdinamica/portal-web-parlamento/pdf.do?tipodoc=coleccion&id=47573&cley=2
http://www.parlamentodeandalucia.es/webdinamica/portal-web-parlamento/pdf.do?tipodoc=coleccion&id=47573&cley=2http://www.legifrance.gouv.fr/
118 
 
 
No cenário italiano, o então Ministro da Saúde autorizou, em outubro de 1998, a 
implementação de 2.900 leitos para o âmbito dos cuidados paliativos. O decreto ministerial de 
28 de outubro de 1999, relativo à Lei n. 39, de 26 de fevereiro de 19997, determinou a realização 
do programa de cuidados paliativos previsto no Plano Sanitário Nacional de 1998-2000, e 
introduziu linhas de atuação para a estruturação de centros de cuidados paliativos e dos critérios 
de integração desses centros com outras atividades assistenciais (Cirillo, 2002). Nesse campo, 
são indicadas duas leis fundamentais sobre o tema: a primeira teve como objetivo principal o 
financiamento do hospice para auxiliar seu nascimento e desenvolvimento, o que ocorreu em 
1999; a segunda, em 2010, buscou o entrelaçamento da rede de cuidados paliativos, ou seja, a 
integração entre hospice e assistência domiciliar8. 
Especialistas nesse assunto afirmam que, normalmente, o hospice recebe pacientes com 
capacidade de discernimento e decisão, que assim permanecem até seus últimos dias de vida, 
estando habilitados a se manifestar e relacionar como todos aqueles que os circundam (Valenti, 
2009). O contexto dos cuidados paliativos relaciona-se a um processo de cura, que envolve 
tanto o paciente quanto sua família. Os funcionários e a equipe médica auxiliam ambas as 
partes, pois os familiares sofrem indiretamente da mesma doença do paciente, tornando-se parte 
de todo o processo. É por isso que “se passa da unidade de cura ‘individual’ para uma unidade 
de cura ‘social” (Cirillo, 2002). 
Nesse ponto, o princípio da autonomia possui força fundamental, associado ao art. 6º da 
Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos, quando se faz referência ao 
consentimento. Cita-se, ainda, o art. 8º desse documento, por se tratar da preservação da 
integridade da pessoa humana, bem como o art. 11, ao indicar a não discriminação e a não 
estigmatização de cada indivíduo. Esse mesmo princípio é trazido, também, nas palavras de 
Stefano Rodotà, que alerta para uma espécie de “direito à doença”, ou seja, para além do direito 
à cura “se percebe a necessidade de aceitação social do doente, da não discriminação de quem 
sofre anomalias físicas ou psíquicas, como indispensável requisito da sua decisão de perceber 
a vida para além dos sofrimentos e dos meios que possam a alivar materialmente” (Rodotá, 
2006). Para o autor, apenas quando a dor não for considerada um mecanismo de exclusão – da 
família, do trabalho, da vida em comum – que irão crescer as possibilidades de não se ver (a 
 
7 Legge 26 febbraio 1999, n. 39, “Conversione in legge, con modificazioni, del decreto-legge 28 dicembre 1998, 
n. 450, recante disposizioni per assicurare interventi urgenti di attuazione del Piano sanitario nazionale 1998-
2000", pubblicata nella Gazzetta Ufficiale n. 48 del 27 febbraio 1999. 
8 Legge 15 marzo 2010, n. 38, "Disposizioni per garantire l'accesso alle cure palliative e alla terapia del dolore", 
pubblicata nella Gazzetta Ufficiale n. 65 del 19 marzo 2010. 
119 
 
 
dor) como um atentado à dignidade e, assim, aceitá-la e com ela conviver. É, propriamente, o 
equilíbrio entre essas considerações e a dignidade da pessoa (Andorno, 2005) expressa, 
também, pela sua autonomia, que sedimenta a implementação dos cuidados paliativos. 
No cenário brasileiro, o Código de Ética Médica (CEM) refere-se à terminalidade da 
vida e entre seus princípios fundamentais assim dispõe: “XXII - Nas situações clínicas 
irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e 
terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados 
paliativos apropriados”9. No art. 36, parágrafo 2º, tem-se como vedado ao médico “Abandonar 
paciente sob seus cuidados”, e segue: (...) § 2° Salvo por motivo justo, comunicado ao paciente 
ou à sua família, o médico não o abandonará por este ter doença crônica ou incurável e 
continuará a assisti-lo e a propiciar-lhe os cuidados necessários, inclusive os paliativos”. 
Entende-se que, dessa forma, o Código “preconiza o surgimento da identidade do médico como 
orientador e parceiro do paciente, a partir de uma visão não só biológica, mas fundamentalmente 
humanista” (Chaves, 2011). Novamente, ressalta-se a percepção da totalidade da pessoa 
humana e, mesmo que não haja legislação específica sobre o tema no Brasil, é necessário o 
delineamento de diretrizes que possam garantir a prática dos cuidados paliativos no país. 
Deve-se atentar, portanto, à percepção de como as políticas públicas devem atuar e 
assumir responsabilidades quanto à implementação dos cuidados paliativos como tratamento 
partícipe do panorama sanitário. Nesse sentido, o não oferecimento do acesso a esse cuidado 
poderia ser alvo de efetiva discussão também no âmbito jurídico. De acordo com John Keown, 
“a lei, tanto civil como penal, pode ter um papel importante a desempenhar, não apenas para 
reivindicar os direitos das pessoas para quem foi negado o alívio da dor e do sofrimento, mas, 
também, como um estímulo para promover a prática adequada” (Keown, 2012). 
Para além das reflexões acima, a pandemia de COVID-19 suscitou novos desafios, 
especialmente para os sistemas de saúde. Um estudo de autoria de membros do Cicely Saunders 
Institute, do King’s College de Londres, retrata que a pandemia de COVID-19 trouxe a 
necessidade de adaptações às realidades hospitalares, demandando flexibilidade às equipes 
médicas e rápida alocação de recursos para o tratamento dos pacientes. Contudo, os dados de 
análise ainda são escassos, o que leva a discussão ao entendimento de possíveis balanceamentos 
entre o cuidado paliativo comunitário (“community palliative care”) e o cuidado em “hospice” 
ou em centros de cuidados paliativos. No âmbito do cuidado paliativo comunitário, uma solução 
 
9 Código de Ética Médica. Disponível em: http://portal.cfm.org.br/. Acesso em 30 de outubro de 2023. 
http://portal.cfm.org.br/
120 
 
 
seria o planejamento e controle dos pacientes para evitar a admissão hospitalar e respeitar o 
desejo de quem prefira permanecer em casa. Um outro caminho seria acrescentar a esse 
panorama a atuação de voluntários que, devido às medidas de distanciamento social, possam 
efetuar o acompanhamento de pacientes por meios digitais ou telefone, treinados para apoio 
psicológico. Os autores ressaltam a escassez de estudos frente ao tema, e sugerem que “Em uma 
pandemia que deve durar vários meses, como o COVID-19, a implementação de sistemas de 
coleta de dados antecipadamente ajudaria os serviços a planejar e melhorar o atendimento e 
poderia ser usado para projetar necessidades futuras” (Etkind et al, 2020). 
Um editorial da Revista The Lancet, em 202010, trouxe a preocupação com a sobrecarga 
do sistema de saúde frente à pandemia, o que tornaria especialmente vital, mas, também, difícil 
o fornecimento de cuidados paliativos seguros e eficazes. Ainda, considera-se que esse cenário 
pode ser agravado, principalmente, em países de baixa e média renda, onde a escassez de 
serviços de cuidados intensivos e paliativos é maior. Na mesma linha do estudo acima citado, 
há o indicativo de que os cuidados paliativos devem ocupar uma parte explícita dos planos de 
resposta nacionais e internacionais para a COVID-19, e o delineamento de medidas práticas, 
entre elas garantir o acesso a medicamentos, considerar um maior uso de telemedicina e vídeo, 
discutir planos de cuidados antecipados, fornecer melhor treinamento e preparação para toda a 
força de trabalho de saúde e abraçar o papel de cuidadores leigos e a comunidade em geral. 
 O uso da telemedicina e de vídeos para a comunicação entre equipes, pacientes e 
familiares tem sido um caminho para a aproximação no distanciamento,em um paradoxo 
necessário nesse contexto. Assim, associa-se a reflexão quanto à necessidade, também, de 
acesso a esses formatos e tecnologias, inclusive em âmbito informacional, especialmente para 
grupos sociais que tenham pouco contato com os meios digitais. Esse mesmo processo 
informativo é extensivo às equipes, que se deparam com novas formas de atuação em seus 
escopos profissionais. 
 O Brasil também enfrentou desafios semelhantes aos já citados, para além das 
disparidades econômicas e sociais de um país continental. Em seminário virtual estruturado 
pela Organização Panamericana de Saúde (OPA) e Organização Mundial da Saúde (OMS) em 
2020, foram expostas experiências de serviços de cuidados paliativos durante a pandemia de 
 
10 Palliative care and the COVID-19 pandemic. Editorial. The Lancet, Vol. 395, April 11, 2020, p. 1168. 
121 
 
 
COVID-19 na América Latina e nos Estados Unidos11. O caso brasileiro apresentado trouxe a 
iniciativa de dois hospitais de São Paulo, um deles privado e filantrópico, de excelência, e o 
outro parte do sistema público de saúde, considerado o maior complexo hospitalar do Brasil12. 
Ambos se associaram em abril de 2020, com o objetivo de abrir uma nova Unidade de Cuidados 
Intensivos (UCI) com 11 leitos no prazo de 10 dias, em virtude do rápido avanço da pandemia 
no país. Foi formada uma equipe multiprofissional, coordenada sob uma estratégia de três 
etapas: pessoas, processos e resultados. Entre os diferentes aspectos que compuseram cada 
etapa, destaca-se a ênfase dada às pessoas como ponto inicial e fundante da estratégia elaborada. 
 Com a etapa de “pessoas” estruturada, a etapa de processos levou ao estabelecimento de 
funções claras e bem definidas dos componentes da equipe, bem como rondas 
multiprofissionais diárias, objetivas e inclusivas, e a própria alteração do processo durante a 
aprendizagem em equipe, para seu aperfeiçoamento. Os resultados, como terceira etapa, foram 
uma consequência da estratégia delineada: concentraram não apenas a análise de dados, mas, 
também, a partilha de cada resultado em equipe no âmbito tanto das altas hospitalares, quanto 
dos óbitos. As altas foram celebradas com os pacientes, com a saída deles sob aplausos da 
equipe. Essa iniciativa tornou-se, também, uma forma de energizar cada profissional, que 
retornaria a trabalhar com os demais pacientes. Quanto aos óbitos, o médico Daniel Neves 
Forte, coordenador do grupo e paliativista, reunia toda a equipe para conversar com a família, 
para expressar seus sentimentos e dizer aos familiares que seu ente querido não morreu sozinho, 
pois todos estavam junto com ele. Segundo Daniel Forte, retorna-se às pessoas: se o trabalho 
foi iniciado com elas, a elas se retorna, pois são a base de tudo. 
 É por meio dessa percepção que os cuidados paliativos caracterizam sua 
transversalidade e sua inserção na complexidade bioética, no sentido de transitarem por áreas 
tão importantes e sensíveis de cada paciente e de seus familiares. Nas palavras de José Roberto 
Goldim, vale lembrar que 
Muitas vezes as notícias falam de mortes que ficam anônimas, quando transformadas 
apenas em estatísticas. Na realidade são perdas singulares e irreparáveis para as 
famílias, amigos e para toda a humanidade. É a indissociabilidade do indivíduo com 
a comunidade humana. É a manifestação da Alteridade na prática, onde todos contam, 
onde todos são interdependentes, onde todos são singulares (Goldim, 2021). 
 
 
11 Seminário web “Los cuidados paliativos durante la pandemia de COVID-19”, promovido pela OPA/OMS em 
19 de junho de 2020. Disponível em: https://www.paho.org/es/node/71350. Acesso em 10 de setembro de 
2021. 
12 O caso brasileiro foi apresentado pelo médico Daniel Neves Forte no painel “Experiencias en los servicios de 
cuidados paliativos en la región”. Os hospitais citados foram o Hospital Sírio-Libanês e o Hospital das Clínicas da 
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. 
https://www.paho.org/es/node/71350
122 
 
 
Neste sentido, também é importante compreender que “A dignidade humana também se 
preserva pela memória. Parafraseando o Talmud, que afirma que ‘quem salva uma vida, salva 
o mundo inteiro’, é possível dizer que quem relembra estas vidas perdidas, preserva a nossa 
identidade como humanidade” (Goldim, 2021). 
A pandemia de COVID-19 trouxe inúmeras perdas afetivas, sociais e econômicas à 
população brasileira e mundial. O enfrentamento desse cenário possui, entre suas bases, o 
fomento à educação e à ciência como instrumentos primordiais para o bem-estar de cada ser 
humano. Isso porque, em um panorama pandêmico, esses elementos poderão auxiliar à 
compreensão da finitude da vida como parte do percurso natural da existência, e não através da 
dor originada pela ausência de tratamento ou pela falta de estruturas sanitárias. O incentivo às 
pesquisas leva, ainda, a um efetivo apoio às equipes que atuam diretamente com pacientes 
contaminados pelo vírus, na perspectiva de que o trabalho efetuado irá trazer seu retorno via 
aprimoramento do próprio sistema de saúde, pela busca de vacinas e de medicamentos no 
combate à pandemia. Sobretudo, tem-se a circularidade da vida, em seu início e em seu fim, em 
que cada vivência potencializa sua singularidade na coletiva percepção de humanidade em cada 
um de nós. 
2.2 Informação e assertividade da ciência: os direitos humanos e a bioética no debate sobre 
emergências climáticas 
A emergência das mudanças climáticas suscita novas reflexões em sua associação com 
os direitos humanos. É importante considerar que “A identificação de que o ser humano é parte 
da natureza, que é um ser que tem interações ativas com seu meio, reconhecendo que pode 
alterar o seu próprio destino e de toda a natureza, introduziu uma nova pauta de 
questionamentos” (Goldim, 2009). Esses questionamentos abrangem tanto o início e o fim de 
vida humana, bem como a temática referente às interações com as esferas animal e ambiental13. 
O surgimento de diferentes patologias que podem se desenvolver para dimensões 
pandêmicas mostra a importância da associação entre essas diferentes áreas para a prevenção e 
tratamento de doenças que podem surgir desse contexto. A OMS, já em 2010, propôs uma 
direção estratégica de longo prazo para a colaboração internacional destinada a compartilhar 
responsabilidades e coordenar atividades globais para lidar com os riscos à saúde que surgem 
quando humanos, animais e o ecossistema interagem. Essa abordagem recebeu a denominação 
 
13 Parte dessas reflexões foram expostas em Consulta Pública junto ao Ministério das Relações Exteriores em 30 
de agosto de 2023, sob o tema “emergência climática e direitos humanos”, representando o Laboratório de Pesquisa 
em Bioética e Ética na Ciência (LAPEBEC) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. 
123 
 
 
de “One Health” (Saúde Única). A tripartição advém da cooperação multissetorial entre OMS, 
Organização das Nações unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e Organização Mundial 
da Saúde Animal (OIE). Em 2022, essa estrutura torna-se quadripartite, com a inclusão do 
Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA)14. 
Nesse contexto, o conceito de “One Health” (Saúde Única) emerge do estudo integrado 
de zoonoses, que consistem na transmissão de doenças entre humanos e animais. Na atualidade, 
este conceito “abrange as interconexões entre saúde humana, animal, ambiental e plantas em 
uma abordagem interdisciplinar representada por um complexo sistema biológico e social, que 
envolve múltiplos atores e processos e suas interações ao longo do tempo a nível local, nacional 
e global” (Carneiro; Pettan-Brewer, 2021). 
A OMS refere-se, propriamente, à percepção de Saúde Única como uma abordagemintegrada, que visa equilibrar e otimizar, de forma sustentável, a saúde de pessoas, animais e 
ecossistemas, todos conexos e interdependentes15. É, portanto, na conexão e interdependência 
entre essas esferas que a atuação dos direitos humanos é elemento não apenas integrador, mas, 
também, elo de atuação estatal. A Declaração de Viena de 1993, na esteira da Conferência 
Mundial de Direitos Humanos, afasta a divisão dos mesmos em gerações, para os sedimentar 
nos aspectos da indivisibilidade, inter-relação e interdependência. Em seu item 5, o documento 
dispõe que “é dever dos Estados promover e proteger todos os direitos humanos e liberdades 
fundamentais, sejam quais forem seus sistemas políticos, econômicos e culturais”16. 
Em 1966, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional 
dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais sedimentaram aspectos referentes ao acesso à 
saúde e ao pleno exercício desse direito como elemento fundante da afirmação dos direitos 
humanos, conexos a elementos trabalhistas e ambientais. Com a Declaração Universal sobre 
Bioética e Direitos Humanos, em 2005, destaca-se o princípio da dignidade da pessoa humana 
e a proteção dos direitos humanos, garantindo o respeito pela vida dos seres humanos e as 
liberdades fundamentais de modo compatível com o direito internacional, bem como a 
promoção do acesso equitativo aos progressos da medicina, da ciência e da tecnologia – que 
atuam, diretamente, também no panorama das mudanças climáticas. A promoção desses 
 
14 Abordagem disponível em: https://www.who.int/news-room/questions-and-answers/item/one-health. Acesso 
em 06 de junho de 2023. 
15 Definição presente em: https://www.who.int/health-topics/one-health#tab=tab_1. Acesso em 15 de agosto de 
2023. 
16 Declaração e Programa de Ação de Viena (1993). Disponível em: https://www.onumulheres.org.br/wp-
content/uploads/2013/03/declaracao_viena.pdf. Acesso em 15 de agosto de 2023. 
https://www.who.int/news-room/questions-and-answers/item/one-health
124 
 
 
direitos pode ser efetuada, pelos Estados, por meio da esfera educacional, bem como pela 
cooperação internacional17. 
Essa dimensão integradora embasa, portanto, a atuação dos Estados frente aos temas 
apresentados. Os processos que envolvem o alcance do dever de prevenção dos Estados diante 
dos fenômenos climáticos gerados pelo aquecimento global participam, na atualidade, da 
importância de uma visão integrada e integradora da relação entre o meio ambiente e os direitos 
humanos. Registra-se que, na esfera interamericana, um dos pilares da estruturação da 
Organização dos Estados Americanos (OEA) se assenta nos direitos humanos, e a proteção da 
pessoa humana perpassa pelo cuidado com sua existência e, assim, pela manutenção do 
ambiente em que vive. 
Esse cenário revela que o processo informativo assume importante relevância sobre a 
emergência climática à luz da ciência e dos direitos humanos. O direito de acesso à informação 
e as obrigações sobre produção ativa de informação e transparência, conforme o artigo 13 da 
Convenção Americana (OEA), conectam-se aos artigos 22, 23 e 24 da Declaração Universal de 
Bioética e de Direito Humanos. Os artigos 22 e 23 evidenciam o papel dos Estados, que devem 
tomar as medidas apropriadas para colocarem em prática os princípios enunciados na 
Declaração por meio de ações nos campos da educação, da formação e da informação ao 
público. Esses elementos perpassam a cooperação internacional, na medida em que, de acordo 
com o artigo 24, “Os Estados devem apoiar a difusão internacional da informação científica e 
encorajar a livre circulação e a partilha de conhecimentos científicos e tecnológicos”18. 
Essa percepção reforça a importância do afastamento da desinformação em sua 
dimensão ampla e, também, diretamente relacionada ao contexto científico - especialmente 
após o período pandêmico mundialmente vivenciado, que trouxe questionamentos a respeito da 
assertividade da ciência. Estudos indicam que, para adiar a tomada de decisões políticas ou para 
favorecer interesses econômicos, há grupos que tentam manter as controvérsias sobre temas 
como mudanças climáticas ou chuvas ácidas para criar dúvida sobre o consenso da comunidade 
científica. Segundo Yurij Calstelfranchi. “o problema não são notícias falsas, fakenews, mas 
sim fakeissues, falsas questões, controvérsias construídas para desacreditar o valor da evidência 
científica ou criar no público a sensação de que os cientistas discordam entre si e que, portanto, 
 
17 Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos. UNESCO – Organização das Nações Unidas para a 
Educação, Ciência e Cultura. Disponível em: unesdoc.unesco.org/images/0014/.../146180por.pdf. Acesso em 09 
de setembro de 2021. 
18 Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos. Disponível em: 
https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000146180_por. Acesso em 28 de fevereiro de 2023. 
https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000146180_por
125 
 
 
todas as explicações têm o mesmo valor” (Castelfranchi, 2019). Para Geoffrey Thomas e John 
Durant, quanto maior o entendimento público sobre a ciência, maior a promoção de tomadas de 
decisões democráticas, e, também, maior a sua efetividade. Assim, “uma compreensão mais 
ampla dos aspectos científicos de uma determinada questão não levará, automaticamente, a um 
consenso sobre a melhor resposta, mas, pelo menos, levará a uma tomada de decisão informada 
e, portanto, melhor” (Thomas; Durant, 1987). 
No contexto da informação ambiental, a pandemia de COVID-19 trouxe a complexidade 
frente à transmissão de doenças de animais para seres humanos, bem como a necessidade de 
uma adequada orientação social em relação à prevenção e vacinação. Além desse fato, as 
mudanças climáticas têm aumentado casos de doenças em locais anteriormente isentos dessas 
patologias. Assim, a informação conecta-se à promoção da democracia pelo processo 
informativo ambiental na promoção da saúde tanto em seu contexto internacional (por meio da 
definição da OMS), quanto pelo viés nacional, por meio da garantia constitucional à saúde no 
âmbito dos direitos sociais. Como direito social, há relação intrínseca com os direitos humanos, 
também promovidos pela Constituição Federal, na principiologia presente no art. 4º, II, por 
meio da prevalência dos direitos humanos, elemento que embasa as relações internacionais. 
Verifica-se, portanto, a intrínseca relação entre os direitos humanos e a bioética, em sua 
complexidade. A bioética complexa “é uma abordagem abrangente na resolução de problema 
que envolvem a vida e o viver” (Goldim, 2009). Na medida em que as emergências climáticas 
afetam tanto a vida quanto o viver, insere-se a abordagem da Saúde Única nesse panorama, por 
se perceber que os deveres para com os animais, plantas e meio ambiente participam do 
entendimento da alteridade (Levinas, 2005). Nesse sentido, a percepção do viver pode se 
expandir para a proteção do conviver – no equilíbrio necessário entre as esferas humana e 
ambiental. 
 
CONCLUSÃO 
 
O caráter de universalidade dos direitos humanos, já referida no início do presente 
artigo, é retomado em sua relação com a bioética e sua complexidade, nas interações entre as 
diversas esferas de atuação desses dois campos do conhecimento. Um fator determinante na 
conjugação entre a bioética e os direitos humanos advém da publicação do conceito de saúde 
pela Organização Mundial de Saúde em 1948, após o fim da Segunda Guerra Mundial, quando 
a descoberta dos campos de concentração demonstrou ao mundo que o ser humano não se limita 
126 
 
 
à corporeidade: os reflexos morais, culturais, psicológicos e afetivos compõem o “ser pessoa”, 
e a caracterização da saúde irá, então, abranger a totalidade do ser humano. 
A promulgaçãoda Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos reflete a 
ampliação do debate sobre os temas biomédicos associados ao âmbito jurídico, na medida em 
que o direito passa a ser chamado na resolução de casos que envolvem o cuidado médico. Um 
dos fatores responsáveis por essa conjugação é o avanço das novas tecnologias na área da saúde 
que, ao promoverem melhorias e descobertas importantes nesse campo, suscitaram a reflexão 
quanto aos limites de práticas relacionadas a diferentes aspectos da contemporaneidade – o 
enfrentamento de uma pandemia que alterou as bases sociais e econômicas mundiais trouxe um 
olhar ainda mais aguçado ao próprio sentido da vida. 
Nessa esteira, as questões que envolvem os processos informativos e a própria 
sedimentação do afastamento da desinformação para a estruturação de governança e de 
democracia também atuam no contexto das emergências climáticas. Os direitos humanos e a 
bioética atuam na busca de ponderação e de adequação nas tomadas de decisões referentes ao 
tema, conjugados às esferas nacionais e internacionais, na medida em que mares, rios e ar 
ultrapassam questões unicamente limítrofes e políticas. A relação entre Bioética e Direitos 
Humanos participa, portanto, de um amplo olhar sobre a sociedade, sobre o meio ambiente e 
sobre a importância do olhar atento para as presentes e futuras gerações. 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
 
AGAMBEN, Giorgio. Homo sacer: il potere sovrano e la nuda vita. Torino: Einaudi, 2005. 
 
AGAMBEN, Giorgio. Homo sacer: o poder soberano e a vida nua I. Belo Horizonte: Editora 
da UFMG, 2002. 
 
ALVES, Cristiane Avancini. “La prima cosa bella”: uno sguardo alle cure palliative. Revista de 
Bioética y Derecho, núm. 22, mayo 2011, pp. 48-55. 
 
ANDORNO, Roberto. Global Bioethics and Human Rights. Medicine and Law, 2008, 27(1):1-
14. 
 
ANDORNO, Roberto. La notion de dignité humaine est-elle superflue en bioéthique? Revue 
Générale de Droit Médical, n° 16, 2005, pp. 95-102. 
 
CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. Tratado de Direito Internacional dos Direitos 
Humanos, volume I. Porto Alegre: Sergio Fabris Editor, 1997. 
 
CARNEIRO, Liliane Almeida e PETTAN-BREWER, Christina. One Health: conceito, história 
e questões relacionadas – revisão e reflexão. In MIRANDA, A. M. M. (Org.). Pesquisa em 
127 
 
 
saúde & ambiente na Amazônia: perspectivas para sustentabilidade humana e ambiental na 
região. São Paulo: Editora Científica Digital, 2021. 
 
CASTELFRANCHI, Yurij. (2019b). Notícias falsas na ciência, Ciência Hoje, janeiro. 
Disponível em: http://cienciahoje.org.br/artigo/noticias-falsas-na-ciencia/. Acesso em 18 de 
maio de 2023. 
 
CETTO, Gian Luigi. La funzione delle cure palliative nel garantire la dignità della persona e il 
raggiungimento di una “buona morte”. Il Sole 24 Ore – Sanità, marzo 2010. 
 
CHAVES, José Humberto Belmino; MENDONÇA, Vera Lúcia Gama de; PESSINI Leo; 
REGO, Guilhermina; NUNES, Rui. Cuidados paliativos na prática médica: contexto bioético. 
Rev Dor. São Paulo, 2011 jul-set;12(3):250-5. 
 
CIRILLO, Mario, In GIORGETTI, Raffaella. Legislazione e organizzazione del servizio 
sanitario. Maggioli Editore, 2002. 
 
COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos. São Paulo: 
Saraiva, 2003. 
 
CUNIETTI, Ettore; VIGANÒ, Antonio; MONTI, Massimo; CRUCIATTI, Flavio, In DI 
MOLA, Giorgio (a cura di). Cure palliative: approccio multidisciplinare alle malattie 
inguaribili. Milano: Masson, 1994. 
 
ENGELS, Eve-Marie. O desafio das biotécnicas para a ética e a antropologia. Veritas – Revista 
Trimestral de Filosofia da PUCRS. Porto Alegre, v. 50, n. 2, junho 2004. 
 
ETKIND, Simon N., BONE, Anna E., LOVELL, Natasha, CRIPPS, Rachel L., HARDING, 
Richard, HIGGINSON, Irene J., and Katherine E. SLEEMAN. The Role and Response of 
Palliative Care and Hospice Services in Epidemics and Pandemics: A Rapid Review to Inform 
Practice During the COVID-19 Pandemic. Jounal of Pain and Symptom Management, Vol. 60, 
No. 1 July 2020. 
 
EVANS, Donald. Article 5: Autonomy and individual responsibility. In The UNESCO 
Universal Declaration on Bioethics and Human Rights: background, principles and application. 
Edited by TEN HAVE, Henk A. M. J. and JEAN, Michèle S. Paris: UNESCO 2009. 
 
GOLDIM, José Roberto. Bioética complexa: uma abordagem abrangente para o processo de 
tomada de decisão. Revista da AMRIGS, Porto Alegre, 53 (1): 58-63, jan.-mar. 2009. 
 
GOLDIM, José Roberto. Bioética e complexidade. In MARTINS-COSTA, Judith; MÖLLER, 
Letícia Ludwig (orgs). Bioética e Responsabilidade. Rio de Janeiro: Forense, 2009. 
 
GOLDIM, José Roberto. COVID-19 e a bomba de Hiroshima e Nagasaki. Disponível em: 
https://bioeticacomplexa.blogspot.com/2020/08/covid-19-e-bomba-de-hiroshima-e-
nagasaki.html. Acesso em 09 de setembro de 2021. 
 
GOLDIM, José Roberto. Revisiting the Beginning of Bioethics: the contribution of Fritz Jahr 
(1927). Perspectives in Biology and Medicine, volume 52, number 3 (summer 2009):377–80, 
by The Johns Hopkins University Press. 
http://cienciahoje.org.br/artigo/noticias-falsas-na-ciencia/
128 
 
 
HOBSBAWN, Erick. A era das revoluções. Paz & Terra; Edição Revista, 2012. 
 
JAHR, F. “Life science and ethics: old knowledge in new clothing”, Fritz Jahr: Wissenschaft 
vom Leben und Sittenlehre, in: Die Mittelschule. Zeitschrift für das gesamte mittlere 
Schulwesen, 1926, 40:604-6-5 [15.Dezember 1926]. 
 
LAFER, Celso. A Internacionalização dos Direitos Humanos: Constituição, Racismo e 
Relações Internacionais. Barueri, SP: Manole, 2005. 
 
LAFER, Celso. A reconstrução dos direitos humanos: um diálogo com o pensamento de 
Hannah Arendt. São Paulo: Companhia das Letras, 1988. 
 
LEVINAS, E. Entre nós: ensaios sobre a alteridade. 2nd ed. Petrópolis: Vozes; 2005. 
 
MITSCHERLICH, Alexander. Malattia come conflitto. Milano: Giangiacomo Feltrinelli 
Editore, 1977. 
 
PESSINI, L. At the origins of bioethics: from Potter's bioethical creed to Fritz Jahr's bioethical 
imperative. Rev bioét (Impr.) 2013; 21 (1): 9-18. 
 
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: 
Saraiva, 2012. 
 
POTTER, Van Rensselaer. Bioethics: bridge to the future. Englewood Cliffs, New Jersey: 
Prentice-Hall, 1971. 
 
RODOTÀ, Stefano. La vita e le regole: tra diritto e non diritto. Milano: Feltrinelli Editore, 
2006. 
 
ROTHMAN, David J. Strangers at the bedside: a history of how law and bioethics transformed 
medical decision making. New York: Aldine de Gruyter, 2003. 
 
SASS, Hans-Martin. Fritz Jahr’s 1927 Concept of Bioethics. Kennedy Institute of Ethics 
Journal, Vol. 17, No. 4, 2008. 
 
THOMAS, Geoffrey e DURANT, John. Why should we promote the public understanding of 
science? Scientific Literary Papaers: a Journal of Research in Science, Education and Research. 
Summer, 1987. 
 
VALENTI, Danila. Curare quando non si può guarire. In La Professione: medicina, scienza, 
etica e società. Trimestrale della Federazione nazionale degli Ordini dei medici chirurghi e degli 
odontoiatri. Convegno Nazionale “Dichiarazioni anticipate di volontà”, Terni, XII Giugno 
MMIX. 
 
 
 
 
 
 
129 
 
 
A MORTE COMO DIREITO: 
UMA ANÁLISE DO DIREITO À MORTE SOB O PONTO DE VISTA 
MÉDICO-LEGAL 
 
Daniel Oliver Franco1 
Viviane Teixeira Dotto Coitinho2 
Thais Campos Olea3 
RESUMO 
 
A presente pesquisa aborda o direito à morte, expressado pelo indivíduo que deseja decidir pelo 
momento e técnica que vai morrer, observadas as discussões sobre a eutanásia, ortotanásia e o 
suicídio assistido, bem como a complexidade do diagnóstico de morte encefálica previsto pelo 
ordenamento jurídico para se constatar a morte real. A partir da relação entre bioética, direito e 
medicina, visa-se compreender se a conduta médica pode ser penalmente tipificada diante da 
ausência de positivação de um direito à morte digna. Para tanto, realizou-se uma revisão da 
literaturacientífica e julgado. Conclui-se que o debate ainda é incipiente dentro dos tribunais e 
no legislativo, bem como a sociedade deixa de discutir muitas destas questões por motivos 
religiosos, culturais e de não aceitação da finitude da vida. Os argumentos gerados nas últimas 
décadas pelo biodireito podem auxiliar a positivação do direito à morte, dentro de um 
regramento socialmente aceito no Brasil. 
 
Palavras-chave: Óbito; Eutanásia; Ortotanásia; Suicídio assistido; Bioética. 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
É preciso, primariamente, entender em que momento ocorre a morte real para o direito. 
No Código Civil, Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002, no seu artigo 6° traz que a existência 
da pessoa natural termina com a morte, enquanto que a Lei n.º 9.434, de 04 de fevereiro de 
1997, que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de 
transplante e tratamento, no seu artigo 3°, trará que a retirada post mortem de tecidos, órgãos e 
partes do corpo humano deverá ser precedida de diagnóstico de morte encefálica. Portanto, a 
morte real, para o direito, ocorre quando do diagnóstico da morte encefálica, encerrando a 
existência da pessoa natural. 
 
1 Acadêmico do curso de direito da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA) – Campus São Borja. E-mail: 
danielfranco.aluno@unipampa.edu.br. 
2 Docente da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA) – Campus São Borja. Graduada em ciências jurídicas 
e sociais pela URCAMP, especialista em direito processual civil pela PUCRS, mestre em direito pela UNISC e 
doutora em direito constitucional pela UNIFOR. E-mail: vivianecoitinho@unipampa.edu.br. 
3 Docente substituta da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA) – Campus São Borja. Graduada em direito 
pela FURG, especialista em direito administrativo e gestão pública pela FESMP-RS e mestre em direito e justiça 
social pela FURG. OAB/RS 110.623. E-mail: thaisolea@unipampa.edu.br. 
 
mailto:danielfranco.aluno@unipampa.edu.br
mailto:vivianecoitinho@unipampa.edu.br
mailto:thaisolea@unipampa.edu.br
130 
 
 
Na medicina, no entanto, o diagnóstico de morte encefálica pode ser um conceito 
controverso e mais complexo de ser atestado no caso em concreto, principalmente no que 
implica no desligamento de aparelhos que dão sustentação a vida. Apesar do Conselho Federal 
de Medicina, através da Resolução n.º 2.173, de 15 de dezembro de 2017, definir os critérios e 
procedimentos para o diagnóstico de morte encefálica, a realidade das diferentes regiões 
geográficas do Brasil podem implicar numa variabilidade de critérios e na inexistência da 
uniformidade de exames complementares para o diagnóstico. 
Por mais que o direito o possua outras teorias para tratar o momento da morte, 
legalmente possuímos o conceito que resulta na conclusão que quando o artigo 121 do Código 
Penal, Decreto-Lei n.º 2.848, de 07 de dezembro de 1940, que tipifica o homicídio como matar 
alguém, analogamente, diz que o agente ocasionou a morte encefálica da vítima e assim 
encerrou a existência da pessoa natural. 
Destes pontos levantados, podemos chegar à hipótese que aquele que provoca a morte 
encefálica de um ser humano, mesmo que dentro da estrita função da sua atividade ou do desejo 
da vítima, poderia estar cometendo um dos crimes tipificados no capítulo dos crimes contra a 
vida do Código Penal. 
Ante o exposto, o artigo procura fazer uma análise da prática da medicina, no que se 
refere o momento da morte, no que trata a bioética, o direito constitucional e a possível incursão 
nos crimes contra a vida previstos no Código Penal. Fazendo-se um levantamento da literatura, 
por artigos científicos, dissertações e julgados, busca-se demonstrar como o direito à morte se 
insere no debate brasileiro, através do método dedutivo. 
 
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 
2.1 Diagnóstico do óbito 
O momento que a vida cessa deve ser claro dentro da lei, pois é neste momento que se 
encerra a existência da pessoa natural e habilita a abertura da sucessão definitiva. A morte no 
direito civil pode se dar de duas formas: morte real e a morte presumida. A primeira hipótese 
é aquela atestado pelo médico e que autoriza o registro no Cartório de Registro Civil das 
Pessoas Naturais para elaboração do atestado de óbito, enquanto que a segunda é aquela que 
ocorre o desaparecimento do corpo da pessoa e pode ser presumida por ser provável 
(TARTUCE, 2022). 
131 
 
 
Nota-se, deste modo, que no direito civil a morte do agente pode ser atestado ou pode 
ser aberto um procedimento de reconhecimento, decorrente da ausência de corpo. 
Existe, no entanto, diversas situações que podem até mesmo confundir as autoridades 
médicas sobre o limite da vida e a morte. Nucci (2022), traz a classificação de Fernando 
Verdú Pascual para elucidar quatro situações entre a vida e a morte possíveis, conforme 
Quadro 1. 
Quadro 1 – Classificação de situações entre a vida e morte. 
Classificação Situação 
Vida atuada 
Dificuldade na percepção dos sinais vitais 
básicos, independentemente da origem, e 
que somente com exames médicos é 
possível detectar sinais derivados das 
funções neurológica, cardíaca e respiratória. 
Vida suspensa 
Perda de um dos sinais vitais que demanda a 
ação emergencial para recupera-la, em geral 
a suspensão das funções cardíacas e 
respiratórias. 
Morte certa 
Existência de lesões incompatíveis com a 
vida, como a decapitação, desmembramento, 
achatamento do crânio, entre outros. 
Morte absoluta 
Não identificação de sinal vital, bem como 
verificação de um conjunto de sinais 
suficientes para se presumir a morte 
Fonte: Nucci (2022). 
 
Assim, para a morte ser atestada deve-se existir um fator fisiológico que permite a 
autoridade competente verificar e certificar. Por muito tempo a parada cardiorrespiratória foi 
esse fator, dada a possibilidade de verificação dos visíveis sinais vitais extintos, no entanto com 
o crescente desenvolvimento científico o coração deixou de ser o órgão vital para a 
sobrevivência humana (podendo inclusive ser transplantado) dando lugar ao cérebro, único 
órgão que não pode ser substituído artificialmente ou transplantado (MONTE, 2019; CABEÇA, 
2018). 
O marco desta transição advém da publicação do artigo The depassed coma: preliminar 
memoir, que definiu a morte encefálica, e consolidou-se em 1968 pela ação do Committee of 
the Harvard Medical School to Examine the Definition of Brain Death, sendo trazido na Lei n.º 
132 
 
 
9.434/97 que dispõe sobre a legalidade do uso de partes do corpo humano para fins de 
transplante e tratamento. A lei determina que os critérios clínicos e tecnológicos seriam 
definidos por resolução do Conselho Federal de Medicina – CFM (CABEÇA, 2018). 
Desta maneira, o CFM definiu os critérios de morte encefálica pela Resolução n.º 
1.480/97, atualizada em 2017 pela Resolução n.º 2.173/17, em decorrência das transformações 
sociais e evolução da medicina. Assim, a resolução vigente, determina que deverá existir dois 
exames clínicos que confirmem coma não perceptivo e ausência de função do tronco encefálico, 
realizados por dois médicos diferentes, em um intervalo de no mínimo uma hora entre eles; a 
realização de um teste de apneia que confirme ausência de movimentos respiratórios, bem como 
a realização de exame complementar que comprove ausência de atividade encefálica, podendo 
ser a angiografia cerebral, o eletroencefalograma, o doppler transcraniano e a cintilografia 
(CFM, 2017). 
Apesar da morte encefálica ser aceita na medicina e no direito, este conceito pode trazer 
controvérsias na sua determinação, frente a diversidade geográfica e do acesso a aparelhos e 
exames no Brasil, bem como para a compreensão dos familiares, que podem se deparar com 
seu ente apresentando batimentos cardíacos e respiração auxiliadas por aparelhos, e, no entanto, 
ter sido determinada a sua morte pelaparada cerebral, baseando-se em critérios neurológicos 
(SHEMIE, 2007). 
Com a determinação da morte encefálica algumas consequências decorreram, como a 
retirada de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano com autorização do cônjuge ou parente, 
maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau; ou mesmo, 
a suspensão dos procedimentos de suporte terapêuticos em não-doador, conforme artigo 1° da 
Resolução CFM n.º 1.826/2017. 
Apesar dos critérios definidos, a determinação do óbito continua a ser discutido em 
decorrência da progressão das tecnologias e do conceito de morte na sociedade. Constantemente 
aumenta a habilidade médica de sustentar a falência de órgãos e as técnicas de transplante o que 
impulsiona debates sobre a determinação de quando uma doença não é terminal, quando a 
continuidade do tratamento é ineficaz e quando ocorre o óbito realmente (SHEMIE, 2007). 
2.2 A morte provocada 
Quando se trata da morte provocada através da intervenção médica, podemos ter, ao 
menos, três tipos: eutanásia, ortotanásia e o suicídio assistido. Sendo a eutanásia, também 
conhecida como homicídio piedoso, a pratica de abreviar o sofrimento do paciente acometido 
133 
 
 
de doença incurável e profundamente angustiado através de atos e medicamentos que matam o 
enfermo (ativa) ou a diminuição de intervenções que promovem a manutenção da vida 
(passiva). A ortotanásia, chamada de homicídio piedoso omissivo, trata-se da prática médica de 
deixar de intervir para prolongar a vida artificialmente, permitindo a morte do paciente com 
doença incurável, em estado terminal e irremediável.. Já o suicídio assistido trata da opção do 
paciente pela morte frente a uma doença ou condição que ocasione um sofrimento intenso, ou 
mesmo degenerativa, ocorrendo com o auxílio de práticas médicas (NUCCI, 2022; SANTOS, 
2011). 
Trata-se, portanto, da tentativa de proporcionar ao paciente com uma doença terminal, 
em situação dolorosa ou de grande sofrimento, o termino de sua vida de maneira altruísta e a 
possibilidade de não ser penalmente incriminado por tal conduta, fazendo uso, ainda da 
autonomia da vontade e do direito de escolha, o direito à morte. A morte digna, não está apenas 
relacionada aos procedimentos de eutanásia, ortotanásia e suicídio assistido, mas no direito 
individual de optar pelo momento e método de se chegar a este fim, devendo a cada um 
determinar o que significa este conceito (ORSELLI e FAISSEL, 2019). 
 
2.2.1 Eutanásia 
A eutanásia, de acordo com a Associação Médica Mundial, é considerada como a prática 
consciente e intencional de por fim a vida de um paciente em estado de doença incurável por 
pessoa capacitada e competente. Assim, o médico pode agir de forma ativa, injetando 
medicamentos ou mesmo desligando aparelhos essenciais que mantenham o paciente, com a 
autorização desse e/ou de seus familiares; ou, de forma passiva, pode deixar de intervir, se 
omitindo de proceder com tratamentos terapêuticos necessários, a fim de não prologar a vida 
do paciente. Válido ressaltar que o médico, nestes casos age de forma intencional e consciente. 
(DUBÓN-PENICCHE e BUSTAMANTE-LEIJA, 2020; RODRIGUES, 2018). 
Nos países em que a prática é legalizada, temos como principais doenças a demência 
(que não se trata de uma doença específica, mas sim um conjunto de sintomas que alteram a 
função cerebral, principalmente memória e o discernimento) e doença do neurônio motor (como 
esclerose lateral amiotrófica, atrofia muscular progressiva, esclerose lateral primaria e paralisia 
bulbar progressiva) (TREJO-GABRIEL-GALÁN, 2021). 
A eutanásia está relacionada ao direto à morte. Os que apoiam a legalização, assim, 
tratam que este direito não viria para contrapor o direito à vida, mas sim compor o princípio da 
dignidade da pessoa humana, dado que a pessoa acometida de doença incurável teria o direito 
134 
 
 
a expressar e requer a execução da eutanásia como forma de manter sua própria dignidade. 
Entretanto, o ordenamento jurídico do país não expressa está questão, não existindo qualquer 
menção do direito à morte como direito fundamental. 
Dessarte, Rodrigues (2018) traz uma reflexão que permeia o debate quanto a legalização 
da eutanásia: 
Embora a eutanásia seja um gesto nobre que visa a garantir a integridade da pessoa 
humana, ao respeitar o seu direito de não apenas viver com dignidade e sim morrer 
com dignidade, é de suma importância que tal ato seja previsto na nossa legislação 
para se punirem aqueles que praticam a mesma com má-fé; entretanto, como ressalva 
o professor Cabette, não é só porque uma autoridade define tal conduta como crime 
que a mesma será moralmente errada (2009, p.15). 
Considerando como princípios da bioética: “da não maleficência”, de não ocasionar 
dano ao paciente de forma intencional; “da justiça”, de se ter imparcialidade em relação aos 
riscos e benefícios que a pratica médica ocasiona no paciente; “da beneficência”, de sempre 
preservar o maior interesse do paciente nas práticas médicas, visando o bem-estar; e “da 
autonomia”, do respeito a vontade do paciente. A eutanásia não seria uma prática abominável, 
pois estaria dentro do direito do paciente, no entanto, questões culturais e de costume ainda 
levantam o debate sobre sua legalização, não se chegando a um posicionamento do legislativo, 
que não criminaliza expressamente a conduta (não possuí tipo penal específico), porém não a 
prevê sua execução dentro do ordenamento jurídico brasileiro (RODRIGUES, 2018). 
Para aqueles que veem a prática como reprovável, no entanto, trazem como argumentos 
que a eutanásia sempre é ruim a própria pessoa, que pode estar sendo influenciada pela situação 
ou por terceiros; que a morte provocada sempre viola algum valor pessoal, seja religioso ou 
moral que a própria pessoa crê; e que a legalização poderia acarretar num efeito negativo a 
terceiros, pessoas que teriam sua autonomia da vontade desprezada no momento da opção 
médica pelo procedimento (PEREIRA, 2019). 
2.2.2 SUICÍDIO ASSISTIDO 
O suicídio assistido relaciona-se com a morte assistida, portanto, assim como a 
eutanásia, diz respeito ao auxílio médico para que o paciente alcance a morte no momento 
desejado, associando-se com a ideia de compreensão do momento do óbito, com a escolha, 
privacidade, dignidade e alivio da dor e do sofrimento, bem como com a opção de local de 
morte, das pessoas que o acompanharão no processo e momento, o suporte emocional e 
espiritual escolhidos e a expressão das últimas palavras e desejos (MELO e ASSIS, 2023). 
135 
 
 
Assim, o suicídio assistido nada mais é do que a expressão da eutanásia de forma 
voluntária, permitindo a pessoa da liberdade de dispor sobre sua própria vida. Trata-se de ato 
causador da morte por parte da própria pessoa, requerendo auxilio médico para concretizar a 
ação. Nos aspectos bioéticos, não se trata de incentivar o suicídio como prática, mas permitir 
que os indivíduos possam optar pelo momento e métodos que possam cessar sua dor, tratando-
se da autonomia da vontade individual e da morte digna (MELO e ASSIS, 2023; ORSELLI e 
FAISSEL, 2019). 
Diferentemente da eutanásia, onde o médico manipula a medicação e a aplica, no 
suicídio assistido o paciente fará a ingestão da medicação preparada e fornecida pelo agente de 
saúde, não se excluindo a hipótese da aplicação de medicações intravenosas para encerrar o ato 
que por si só já seria capaz de gerar o óbito. Assim, enquanto na eutanásia o agente que provoca 
a morte é o médico, no suicídio assistido o agente é o próprio paciente, que o faz com o auxílio 
médico (ORSELLI e FAISSEL, 2019). 
Destarte, quando falamos do direito à morte, este instituto trata o suicídio assistido como 
uma forma de liberdade do indivíduo de manifestar sua própria vontade e exigir que o Estado 
e a sociedade deem condições necessárias para a sua realização, relacionando-se assim comos 
princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da liberdade, bem como aos 
princípios fundamentais do direito à integridade física e psíquica. O suicídio assistido trata-se 
de direito personalíssimo, não podendo ser expressado por outra pessoa que não, 
exclusivamente, pelo paciente que almeja e expressa sua vontade de morrer, embora não tenha 
capacidade de proceder sozinho na ação (MELO e ASSIS, 2023; ORSELLI e FAISSEL, 2019). 
Outrossim, o debate que envolve esta questão chegou, a exemplo, na Corte 
Constitucional Italiana, que entendeu em 2019 que o suicídio assistido não estaria relacionado 
ao crime de auxílio ao suicídio, mas sim a proteção de direitos fundamentais (CORTE, 2019). 
Visto a lacuna legal existente no ordenamento italiano, a Corte tem por entendimento 
que a prática não se caracteriza no crime penal previsto de auxílio ao suicídio, desde que 
praticado certos métodos e que estes sejam verificados por uma estrutura pública do serviço 
nacional de saúde, bem como tal exceção se aplicaria a casos específicos. A pessoa acometida 
de doença incurável, mantida por aparelhos e capaz de decidir e exigir o término do tratamento, 
estaria passando por grande sofrimento físico e psicológico (CORTE, 2019). 
 
136 
 
 
2.2.3 Ortotanásia 
A ortotanásia, tecnicamente, não se trata de uma morte provocada, mas sim, da morte 
no momento certo, do não prolongamento da vida e, neste aspecto, difere da eutanásia e do 
suicídio assistido. Trata-se da suspensão dos atos e métodos que prolongam a vida de forma 
artificial, com o objetivo de evitar sofrimento e conceder a pessoa uma morte digna (ALMEIDA 
et al., 2021). 
Para compreensão da ortotanásia é preciso entender o conceito de distanásia. A 
distanásia, conforme Nucci (2022), é a “morte lenta e sofrida de uma pessoa, prolongada pelos 
recursos que a medicina oferece”. Portanto a ortotanásia, também conhecida como homicídio 
piedoso omissivo, trata-se da prática médica de não prolongar artificialmente a vida do paciente 
(NUCCI, 2022). 
Outrossim, a ortotanásia se diferencia da eutanásia, pois na primeira hipótese, com a 
compreensão do fim da vida biológica, o médico deixa de agir de forma a prolongar a vida (que 
levaria a distanásia), enquanto na segunda o agente manipula e aplica medicação que ocasionará 
a morte do paciente (ORSELLI e FAISSEL, 2019). 
No que se refere a eutanásia passiva, está se refere ao abandono de qualquer tratamento 
terapêutico com o objetivo de abreviar a vida, enquanto que a ortotanásia garante a ação 
multidisciplinar de cuidados com o paciente e seus familiares, preservando a dignidade da 
morte, que ocorre de forma natural (CAVALCANTE, BARROS e GANEM, 2020). 
A ortotanásia é pratica respaldada no Código de Ética Médica e em outras resoluções 
do CRM, no entanto ainda causa insegurança de ser executada por não haver legislação 
específica sobre o tema, dado que o caso concreto, caso levado ao judiciário, coloca o agente 
de saúde que praticou nas mãos dos juristas que não possuem conhecimentos técnicos para 
analisar, pois apesar da possibilidade de chamamento de perito, ainda pode resultar numa 
incompreensão da motivação do ato. Este temor e a proximidade dos conceitos de eutanásia 
omissiva (penalmente punível) levam aos médicos a prática da indesejável distanásia 
(ALMEIDA et al., 2021; CAVALCANTE, BARROS e GANEM, 2020). 
Apesar da polêmica que envolve o tema, em trabalho realizado por Almeida et al. 
(2021), consultando 15 docentes de uma universidade do norte do Brasil, verificou-se que 
ortotanásia não é prática corriqueira na rotina médica, não concluindo se a ortotanásia não é 
praticada pela falta de conhecimento dos agentes de saúde ou pela sua não compreensão. Alerta 
os autores do estudo que a temática não é estudada no currículo disciplinar do curso de 
137 
 
 
medicina, apesar do reconhecimento da importância do tema e como sendo uma terapia útil a 
determinados casos. 
Conclusão similar teve Cavalcante, Barros e Ganem (2020) ao entrevistar 139 
anestesiologistas inscritos na Sociedade Brasileira de Anestesiologia (SBA). A pesquisa 
constatou que a maioria dos entrevistados não acreditaram ser satisfatória a abordagem ética e 
legal que tiveram na universidade, bem como que a distanásia, embora indesejada, era prática 
recorrente, apesar de se verificar, em outros estudos inclusive, que a ortotanásia possuí 
predileção entre médicos, cientistas e familiares em pacientes terminais internados em unidades 
de terapia intensiva. 
 
2.3 Direito à morte 
Na antiguidade, o poder de morrer ou deixar viver estava nas mãos do soberano, nele 
estava concentrado o poder de matar sem cometer homicídio e sem um conceito sacro de 
sacrifício. Com o cristianismo, houve a ideia de inviolabilidade da vida, a vida como um bem 
supremo e divino, baseado no conceito de não matarás e nos ensinamentos de teólogos, como 
Santo Agostinho que teorizou que até aquele que mata a si mesmo, mata um homem (SILVA, 
2013; COUTINHO e MARTINEZ, 2019). 
Posteriormente, o poder sobre a vida passou para as mãos do Estado, estando, 
atualmente, centrado na medicina e no chamado campo da biopolítica. Assim, com a 
politização, a vida passou a ser um bem supremo e inviolável, transpassando, por vezes, o 
conceito de um direito à vida para um dever de viver (SILVA, 2013). 
Silva (2013) traz um conceito de Agamben, que trata de qual seria a vida sem valor ou 
a indigna de ser vivida, passando a ser na era contemporânea aquela vivida por pacientes 
incuráveis ou vítimas de ferimentos graves, que tendo consciência, perdem o significado de 
viver. Este conceito nos permite entender a forma como a politização do direito a vida passou 
para a tutela do Estado, convertendo-se numa biopolítica, num biopoder, ou mesmo na 
tanatopolítica, decidindo quem deve viver e quem deve morrer. 
Está decisão do Estado pode ser observada quando o artigo 5°, XLVII, “a” da 
Constituição Federal, que determinam que não haverá pena de morte no Brasil, exceto em caso 
de guerra declarada; bem como no artigo 23 do Código Penal que determina como excludente 
de ilicitude quando o agente pratica o fato em estado de necessidade, em legítima defesa ou em 
estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular de direito. 
138 
 
 
Ademais, Silva (2013) traz a decisão da medicina, que em vista do conceito de vida sem 
valor ou a indigna de ser vivida na contemporaneidade, pode proceder com a morte provocada, 
seja de forma dolosa ou culposa, independente da licitude e das consequências jurídicas do ato. 
Tratada estas questões, a carta magna não prevê o direito à morte expressamente, sendo 
tratada por doutrinadores e cientistas como uma extensão do princípio da dignidade da pessoa 
humana e do direito à vida. Portanto o Estado optou por garantir como direito fundamental à 
vida, discutindo-se na atualidade o conceito de vida digna como a expressão correta deste 
direito. 
Moraes (2023) disciplina que o princípio da dignidade da pessoa humana “afasta a ideia 
de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade 
individual” (p. 18), assim este fundamento da República Federativa do Brasil é uma 
manifestação da autodeterminação consciente e responsável da própria vida, podendo ser 
limitado em razão da prática dos direitos fundamentais, porém não podendo ser menosprezado 
a condição humana das pessoas. 
Quanto o direito à vida, previsto no artigo 5º da Constituição Federal, refere-se a tutela 
do Estado de assegurar a vida, de não ser morto ou privado dela, tanto em face do Estado, 
quanto de particulares. Possui um duplo sentido, relacionando a um direito de continuar vivo e 
de uma existência digna. No que se refere aos particulares, existe a obrigação negativa, de não 
atentar contra, enquanto o Estado possui deveres negativos, de se abster, e deveres positivos, 
de atuar em prol.Assim, deste direito que surgirá a problemática do direito de dispor sobre a 
própria vida, de morrer com dignidade, ou seja, do direito à morte (MORAES, 2023; LENZA, 
2023; BARROSO, 2022). 
O direito à morte surge na discussão do direito à vida. A normativa constitucional prevê 
como direito fundamental a liberdade de escolha, devendo o Estado se abster de tomar decisões 
que privem o indivíduo de fazer aquilo que considera digno em sua existência. O Estado não 
pode proibir alguém de colocar sua vida em risco, por exemplo atuando em uma zona de guerra. 
Ao mesmo tempo, é dever do Estado garantir não só que a vida seja garantida, como que essa 
seja digna, não expondo os cidadãos a uma vida miserável e de sofrimento. 
Neste mesmo sentido, se a vida deve ser preservada pelo Estado de uma maneira digna, 
no contraponto, sem contradizer o direito à vida, é dever do Estado preservar a morte digna, de 
acordo com a crença e cultura do indivíduo. Ao mesmo tempo que se abstém a escolha 
individual e pessoal do indivíduo dispor de sua vida. O suicídio não é prática penalmente ou 
139 
 
 
civilmente punível, porque o indivíduo pode dispor de sua vida e escolher a morte, no entanto, 
quando esta é feita com auxílio de um terceiro, o Estado puni aquele que promove a morte, pois 
cabe nas relações privadas a obrigação negativa, de não atentar contra a vida de ninguém. 
Deste modo, o Código Penal, na parte especial, no capítulo dos crimes contra a vida, 
trará dois tipos penais que se deve atentar quando se trata da morte provocada com auxílio 
médico, sendo o primeiro: 
Art. 121. Matar alguém: 
Pena – reclusão, de seis a vinte anos. 
§ 3º Se o homicídio é culposo: 
Pena – detenção, de um a três anos. 
§ 4º No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta 
de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de 
prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, 
ou foge para evitar prisão em flagrante. Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada 
de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou 
maior de 60 (sessenta) anos. 
 
O agente de saúde que pratica a eutanásia comete o delito previsto no artigo 121 do 
Código Penal, pois assume o dolo da ação quando manipula o tratamento com o objetivo de 
ocasionar morte. 
Valido ressaltar que o médico que, erroneamente, procede de forma a ocasionar a 
eutanásia estaria cometendo o delito do artigo 121, § 3° do Código Penal, observado ainda o 
aumentativo de pena de 1/3 àquele que pratica homicídio culposo por inobservância de regra 
técnica da profissão. 
O segundo tipo penal que devemos nos atentar, previsto no Código Penal, é: 
Art. 122. Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação ou 
prestar-lhe auxílio material para que o faça: 
Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. 
§ 2º Se o suicídio se consuma ou se da automutilação resulta morte: 
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos. 
§ 7º Se o crime de que trata o § 2º deste artigo é cometido contra menor de 14 
(quatorze) anos ou contra quem não tem o necessário discernimento para a prática 
do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência, responde o 
agente pelo crime de homicídio, nos termos do art. 121 deste Código. 
 
A autoridade sanitária que pratica o suicídio assistido comete o crime o previsto no 
artigo 122, § 2° do Código Penal. Resguardando-se ainda o paciente que não possuí o 
discernimento necessário para a prática ou incapaz de oferecer resistência, no qual o agente 
responderia pelo crime de homicídio. 
Destarte, tanto a eutanásia, quanto o suicídio assistido são práticas que se amoldam aos 
tipos penais previstos, não havendo previsão legislativa para alguma excludente de licitude, 
140 
 
 
dada a possível empatia ou piedade que motivam o ato, bem como a observância de técnica 
médica para evitar qualquer sofrimento. 
No que se refere a ortotanásia, no entanto, deve-se analisar com maior cautela. 
Primeiramente, preciso entender que o crime culposo, conforme artigo 18, II, do Código Penal, 
é aquele que “o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.”, 
consequentemente, o médico que age de forma culposa no mínimo estaria agindo no crime de 
homicídio culposo, previsto no artigo 121, § 3°, do Código Penal. 
Todavia, o médico não age com imprudência, negligência ou imperícia ao praticar a 
ortotanásia, nem mesmo de forma dolosa, ou seja, toma atitudes que objetivam a morte do 
agente. A ortotanásia se refere a permitir que paciente morra no tempo certo, a intervenção 
médica cessa no momento em que a continuidade de seus atos apenas prolongaria a vida do 
paciente de forma de forma artificial e anômala, não evitando o fim da vida. 
Dessarte, a ortotanásia não é um crime previsto legalmente, dado que caso o médico 
queira a morte do paciente estaria praticando a eutanásia; ao mesmo tempo o médico não estaria 
agindo de forma culposa, deixando de proceder algum tratamento por não conhecimento, 
esquecimento ou descaso, o profissional encerra suas atividades por não serem eficazes e apenas 
ocasionarem, a partir daquele momento, um prolongamento artificial da vida, no entanto, presta 
todo o auxílio necessário. Assim, a ortotanásia deixa de ser uma questão penal, ou mesmo de 
garantia de direito de morrer no momento que se deseja, e passa a ser uma questão técnica-
médica e bioética. 
Destas questões levantadas está a importância de observar como o Conselho Federal de 
Medicina trata a questão da ortotanásia, prática prevista na Resolução n° 1.805 de 09 de 
novembro de 2006. O médico, esclarecendo as modalidades terapêuticas adequadas a cada 
situação, pode limitar ou suspender os procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida de 
paciente de enfermidade grave e incurável, respeitando a vontade do paciente ou de seu 
representante legal, dando possibilidade de ter uma segunda opinião. 
É dever do médico, ainda, continuar a dar todos os cuidados que aliviam o sofrimento 
do paciente, assegurando “a assistência integral, o conforto físico, psíquico, social e espiritual, 
inclusive assegurando-lhe o direito da alta hospitalar.” (artigo 2° da Res. CFM n.º 1.805/2006). 
Respaldada, ainda, está a questão no princípio XXII do Código de Ética Médica: “Nas 
situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos 
141 
 
 
diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os 
cuidados paliativos apropriados.” (p. 17, CÓDIGO DE ÉTICA MÉDICA). 
 Portanto, o médico, o paciente e os seus familiares devem ter consciência da finitude 
da vida e que a morte é inevitável, debatendo sobre a necessidade de continuidade de 
tratamentos que adiam a morte à custa de prolongar o sofrimento dos envolvidos e tornando-se 
uma obsessão manter a vida biológica daquele que se encontra com doença terminal 
(RESOLUÇÃO CFM n.º 1.805/2006). 
Oportuno ressaltar que o Juiz Federal Substituto Roberto Luis Luchi Melo, da 14º Vara 
Federal do Distrito Federal, entendeu, na Ação Civil Pública n.º 2007.34.00.014809-3 (MPF x 
CFM), pela tese defendida pelo CFM de “que regulamenta(da) a possibilidade de o médico 
limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente na fase 
terminal de enfermidades graves e incuráveis, realmente não ofende o ordenamento jurídico 
posto.”. 
Retomando a questão do desejo de antecipar a morte, o CFM, na Resolução n.º 
1.995/2012, entende que o médico deverá levar em consideração os desejos previamente 
expressos pelo paciente sobre os cuidados e tratamentos, ou de representante designado para 
este fim, desde que em acordo com o Código de Ética Médica. 
Por conseguinte, o Código de Ética Médica, definido pela Resolução CFM n.º 
2.217/2018, veda o médicode abreviar a vida do paciente, ainda que expressamente 
manifestado pelo paciente ou seu representante legal, resguardando no seu parágrafo único a 
questão: 
Nos casos de doença incurável e terminal, deve o médico oferecer todos os cuidados 
paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis ou 
obstinadas, levando sempre em consideração a vontade expressa do paciente ou, na 
sua impossibilidade, a de seu representante legal. (art. 41, parágrafo único, p. 28, 
Código de Ética Médica). 
 
Observa-se, deste modo, que o médico possui o dever de proceder os tratamentos 
necessários na promoção da cura e da vida do paciente, sendo vedado ocasionar a morte do 
paciente de forma intencional, independente da manifestação da vontade do paciente, do seu 
representante legal e/ou de seus familiares. Possui ainda o dever de não exceder nestes 
tratamentos para além do necessário, podendo limitar ou suspender os procedimentos e 
tratamentos que prolonguem a vida de paciente de enfermidade grave e incurável, desde que 
prestando os auxílios necessários, bem como é legal e ético a suspensão dos procedimentos de 
suporte terapêuticos quando determinada a morte encefálica. 
142 
 
 
No entanto, o direito à morte encontra-se resguardado no ordenamento jurídico no que 
se refere a manifestação da vontade do paciente de doença grave e incurável, em situação 
terminal de vida, podendo expressar o desejo de limitar ou cessar os tratamentos. Quanto ao 
que se refere no desejo expresso pela morte, seja na busca de um auxílio para sua execução ou 
em um procedimento que leve a morte, a prática é vedada, sendo penalmente punível. 
A vida no ordenamento jurídico encontra-se como bem supremo, sendo que o direito à 
vida, por mais que não absoluto, não é relativizado perante a autonomia da vontade, dado que 
não pode ser oponível pelo próprio titular do bem jurídico tutelado (ORSELLI e FAISSEL, 
2019). 
 
2.4 Nos Tribunais 
 
Observada as questões conceituais e legais, sobre o tema nota-se a importância que o 
judiciário possui, dado que além do debate da sociedade e do legislativo, a justiça deve garantir 
o respeito a constitucionalidade das normas, bem como julgar casos concretos. 
O Supremo Tribunal de Justiça julgou o Agravo Regimental no Mandado de Injução n.º 
6.825 – DF, no qual se recorria a decisão monocrática do ministro Edson Fachin que considerou 
manifestação incabível e negou o seguimento do mandado de injução. O autor da ação sustentou 
que o direito fundamental à morte digna não encontrava-se positivado na Constituição Federal, 
porém decorria dos princípios da dignidade da pessoa humana, da vedação de tortura, 
tratamento desumano ou degradante, da liberdade e autonomia individual, da integridade 
psicológica e moral, da liberdade religiosa, do dever de solidariedade por parte de terceiros e 
do direito fundamental à vida. O Ministro, no entanto, entendeu que o mandado de injução 
pressupõe uma omissão legislativa que torna inviável o exercício de direitos e liberdades 
assegurados pela Constituição Federal, o que não ocorreria no caso que o autor encontrar-se-ia 
numa situação futura de finitude da vida. O direito à morte seria uma interpretação reflexa dos 
princípios constitucionais, não existindo uma obrigação jurídico-constitucional de emanar 
provimentos legislativos. O autor, então agravante, buscou então “demonstrar, em suma, a 
existência de uma lacuna técnica no ordenamento jurídico que possibilitaria a regulamentação, 
através de mandado de injunção, do direito à morte digna.” (p. 08). 
Na plenária, realizada nos dias 18 e 24 de maio de 2018, o Ministro-relator Edson 
Fachin, acompanhado pelos votos dos ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar 
143 
 
 
Mendes, manteve sua decisão, entendendo que o mandando de injução não seria a via para 
preencher lacuna decorrente de direito eventual e incerto, autorizando o direito à morte. 
O Ministro Luís Roberto Barroso trouxe em seu voto que o direito à morte é garantido 
em diversos ordenamentos jurídicos internacionais de forma expressa. Que ao mesmo tempo 
que não cabe ao Estado a autorização ou legalidade de um direito à retirada da própria vida, a 
imposição de um dever ou obrigação de viver em agonia também não parece razoável, no 
entanto o debate possuí diversas camadas, entre a legitimação, aceitação da sociedade e do 
regramento para se proceder. No caso, acompanhou o voto do relator, por não estar 
demonstrado o direito invocado. Pelo Ministro: 
O impetrante simplesmente afirmou que existe a possibilidade de encontrar-se em 
situação de terminalidade vital no futuro. Ou seja, o que há, verdadeiramente, é a mera 
possibilidade de existência do direito em data futura e incerta. Assim sendo, 
considerando que o status do impetrante não se enquadra nas hipóteses de exercício 
do direito invocado, deve ser reconhecida sua ilegitimidade ativa e, portanto, o 
mandado de injunção não merece seguimento. (p. 10, AG.REG. NO MANDADO DE 
INJUNÇÃO 6.825/DF) 
 
O Tribunal, por unanimidade negou provimento do agravo, no entanto, como ressaltado 
pelo Ministro Barroso: “uma decisão de não reconhecimento imediato do direito ou uma 
decisão com efeito vinculante mitigado podem ser instrumentos de um produtivo diálogo da 
Corte com o legislador” (p. 08). 
Debate intrigante também surgiu no Superior Tribunal de Justiça no Habeas Corpus n.º 
732868-ES (2022/0092851-9), onde o Ministro Rogerio Schietti Cruz, em decisão monocrática, 
julgou como improcedente a liminar do direito à morte de um feto diagnosticado com Síndrome 
de Edwards ou Trissomia do 18. Dentre os documentos médicos apresentados, pareceres dos 
Conselhos Regionais de Medicina do Estado do Ceará e de São Paulo que concluíam pela 
ortotanásia do feto. No entanto, O Ministro levou em consideração que apesar da ampla maioria 
dos nascidos vivos viverem até um ano, existem casos de portadores da Síndrome de Edwards 
com até 19 anos. Mesmo que pese a gestação de alto risco, pela idade avançada da gestante e a 
malformação do feto, bem como o sofrimento dos genitores a concessão da interrupção da 
gravidez teria caráter satisfatório e irreversível e exigiria “demonstração de alta probabilidade 
do direito invocado - o que não se verifica na hipótese.”. Ainda se verifica no caso em concreto 
que a gestação contava com 25 semanas, superior, portanto, ao período de 12 semanas 
recomendas para o procedimento. 
A Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande, em 
análise do Recurso em Sentido Estrito n° 70084544147, sob a relatoria do Desembargador 
144 
 
 
Honório Gonçalves da Silva Neto manteve parcialmente a decisão que pronunciou E.R.G. por 
incurso na sanção do artigo 121, §§ 2°, IV e 2º-A, I, do Código Penal, após o réu ter causado a 
morte de vítima, que se encontrava acamada há mais de 12 anos, sem diagnóstico de possível 
melhora, desferindo golpes de faca contra ela. Apesar da condição da vítima, não seria caso 
admissível de absolvição sumária do acusado por conta do bem tutelado ser indisponível, 
mesmo se houvesse consentimento da vítima. Assim, entendeu o Tribunal que não seria 
possível permitir a inimputabilidade por uma possível eutanásia praticada pelo agente ao 
proceder a morte de paciente sem possibilidade de cura, tipificando o caso como incurso no 
crime de homicídio qualificado pela impossibilidade de defesa do ofendido, ao mesmo tempo 
que não seria caso de feminicídio por não ter sido praticado contra mulher em razão do sexo 
feminino. 
A Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande, em análise 
da Apelação Cível n.º 70054988266, sob a relatoria do Desembargador Irineu Mariani 
desproveu a apelação movida pelo indeferimento do pedido do Ministério Público de supressão 
da vontade do idoso J.C.F. que se negava à amputação do seu pé esquerdo, necrosado, e que 
poderialevar o paciente a morte por infecção generalizada. O Ministério Público sustentava 
que o idoso corria risco de vida e não tinha condições psíquicas de recusar o tratamento pelo 
quadro depressivo que possuía. O juízo singular e o Tribunal entenderam, no entanto, que o 
caso se inseria no biodireito, na dimensão da ortotanásia; o paciente não poderia ser obrigado a 
se submeter a cirurgia ou tratamento, ainda mais cirurgia mutilatória, que poderia causar 
sofrimento moral, sendo motivada a razão do paciente, que em pleno gozo das faculdades 
mentais, se recusa, assumindo os riscos inerentes a sua escolha. 
Ante os julgados apresentados, nota-se que o debate ao direito à morte digna surgiu nos 
tribunais de forma incipiente, provocando o Supremo Tribunal Federal a debater com o 
legislativo e ao Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul limitar 
a prática da ortotanásia, aceita no ordenamento jurídico, e punir a eutanásia. 
 
3 CONCLUSÃO 
As discussões sobre um possível direito à morte iniciam-se no diagnóstico do óbito. 
Atualmente a medicina e o direito entendem que ele ocorre quando pronunciado a morte 
encefálica, no entanto os avanços tecnológicos colocam este diagnóstico em questão, podendo, 
em breve, ser levado novamente a análise quando, por exemplo, se avançar na manutenção das 
atividades neurais. 
145 
 
 
Este diagnóstico ainda encontra desafios quanto a praticidade do previsto pelo Conselho 
Regional de Medicina, dado as diferenças geográficas e de disponibilidade de equipamentos e 
exames existentes no Brasil que podem inviabilizar a constatação da morte encefálica. 
O direito à morte, no que se refere a escolha de momento e forma de morrer, ainda 
encontra resistência nos debates nacional, estando bem menos definido do que situações como 
o aborto de anencéfalos. A eutanásia e o suicídio assistido ainda são práticas penalmente 
puníveis no ordenamento jurídico nacional, embora possam ocorrer na surdina de hospitais 
brasileiros, sendo possivelmente licito pelos costumes. 
A ortotanásia é prática prevista como técnica médica para evitar o prolongamento 
anômalo da vida, relacionando exclusivamente a bioética e não sendo penalmente punível. 
Apesar disso, inexistem dados suficientes que possam demonstrar sua ordinariedade na rotina 
de hospitais, bem como as doenças e motivos para sua prática. 
A grande questão, no que se relaciona a autonomia da vontade do desejo de morrer, 
parece ser a questão psíquica do paciente. Observa-se que deve ser resguarda a condição do 
acometido por enfermidade e sua família que encontram-se sensibilizados pelo grande 
sofrimento, depressão, abandono e falta de perspectivas que o estado terminal de uma doença 
e/ou o ambiente de uma unidade de tratamento intensivo podem causar, ficando o 
questionamento se estes teriam capacidades de entender e arcar com as consequências da opção 
da morte adiantada como solução. 
O judiciário brasileiro, por sua vez, não parece debater estas questões com a devida 
cautela que o tema merece. Não entendem, como aqueles que buscam a positivação do direito 
à morte, que este seria um direito implicitamente inserido na Constituição Federal, crendo-se 
que o legislador foi intencional em não o mencionar. Ao mesmo, a constatação do Ministro 
Luís Roberto Barroso é apropriada. O direito à morte é um debate que deve ser apropriado pelos 
Poderes Judiciário e Legislativo, bem como pela sociedade. Existe um grande arcabouço de 
argumentos produzido pelo biodireito. 
 
REFERÊNCIAS 
 
ALMEIDA, Naara Perdigão Cota de. Et al. Ortotanásia na formação médica: tabus e 
desvelamentos. Revista Bioética, Brasília, v. 29, n. 4, out.-dez. 2021. 
 
BARROSO, Luís R. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo - Os conceitos 
Fundamentais. Editora Saraiva, 2022. E-book. ISBN 9786555596700. Disponível em: 
146 
 
 
<https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786555596700/>. Acesso em: 27 set. 
2023. 
 
BRASIL. Decreto-Lei n.º 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: < 
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm>. Acesso em: 20 set. 
2023. 
 
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < 
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 
27 set. 2023. 
 
BRASIL. Lei n.º 9.434, de 04 de fevereiro de 1997. Dispões sobre a remoção de órgãos, tecidos 
e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento e dá outras providências. 
Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9434compilado.htm>. Acesso 
em: 20 set. 2023. 
 
BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Instituí o Código Civil. Disponível em: < 
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>. Acesso em: 20 set. 
2023. 
 
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (6º Turma). Habeas Corpus n.º 732868/ES 
(2022/0092851-9). Processo n.º 0092851-35.2022.3.00.0000. Impetrante: Renato Mendes dos 
Santos. Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo. Relator: Ministro Rogerio 
Schietti Cruz, 04 de abril de 2022. 
 
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Mandado de Injução 6.825 – 
Distrito Federal. Agravo regimental no mandado de injunção. Direito à morte digna. 
Inadequação da via eleita. Ausência de lacuna técnica. Inexistência de efetivo impedimento do 
exercício do direito alegado. Inadmissibilidade do writ. Desprovimento do agravo. Agravante: 
George Salomão Leite. Agravado: Câmara dos Deputados, Senado Federal e Presidente da 
República. Relator: Min. Edson Fachin, 11 de abril de 2019. 
 
CABEÇA, Hideraldo. Determinação de morte encefálica: uma análise de sete meses de 
vigência. Medicina S/A. Artigo. 17 de setembro de 2018. Disponível em:< 
https://medicinasa.com.br/determinacao-de-morte-encefalica-uma-analise-de-sete-meses-de-
vigencia/>. Acesso em: 20 set. 2023. 
 
CAVALCANTE, Rodney Segura. BARROS, Guilherme Antonio Moreira de. GANEM, Eliana 
Marisa. O anestesiologista frente à terminalidade: estudo observacional baseado em 
questionário. Revista Brasileira de Anestesiologia, V. 70, n. 3, p. 225-232, 2020. 
 
CFM. CFM atualiza resolução com critérios de diagnóstico da morte encefálica. Conselho 
Federal de Medicina. Artigo. 12 de dezembro de 2017. Disponível em: < 
https://portal.cfm.org.br/noticias/cfm-atualiza-resolucao-com-criterios-de-diagnostico-da-
morte-encefalica/>. Acesso em: 20 set. 2023. 
 
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Código de Ética Médica. Resolução CFM n.º 2.217, 
de 27 de setembro de 2018, Brasília, 2019. Disponível em:< 
https://portal.cfm.org.br/images/PDF/cem2019.pdf>. Acesso em: 28 set. 2023. 
 
147 
 
 
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM n.º 1.805/2007. Publicado no 
Diário Oficial da União, de 28 de novembro de 2006, Seção I, p. 169. Disponível em: < 
https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2007/1826>. Acesso em: 20 set. 
2023. 
 
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM n.º 1.826/2007. Publicado no 
Diário Oficial da União, de 06 de dezembro de 2007, Seção I, p. 133. Disponível em: < 
https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2006/1805>. Acesso em: 28 set. 
2023. 
 
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução CFM n.° 2.173/2017. Publicado no 
Diário Oficial da União, de 15 de dezembro de 2017, Seção I, p. 274-276. Disponível em: < 
https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/resolucoes/BR/2017/2173>. Acesso em: 20 set. 
2023. 
 
CORTE Constituzionale. Fine vita: Quando non è punibile l’aiuto al suicidio. Ufficio Stampa 
della Corte constituzionale, Comunicato del 22 novembre 2019, Roma, nov. 2019. 
 
COUTINHO, Nilton Carlos de Almeida. MARTINEZ, Viviane de Oliveira. Reflexões sobre o 
suicídio assistido e eutanásia: uma análise sob a ótica da dignidade humana. Quaestio Iuris, 
Rio de Janeiro, V. 12, n. 3, p. 147-169, 2019.DISTRITO FEDERAL. 14° Vara Federal. Processo n.º 2007.34.00.014809-3. Autor: 
Ministério Público Federal. Réu: Conselho Federal de Medicina. Sentença proferida. 01 de 
dezembro de 2010. Disponível em:< https://www.conjur.com.br/dl/sentenca-resolucao-cfm-
180596.pdf>. Acesso em: 28 set. 2023. 
 
DUBÓN-PENICHE, Ma del Carmen. BUSTAMANTE-LEIJA, Luis E. Entre la enfermedad y 
la muerte: Eutanasia. Cirugia y Cirujanos, v.88, n. 04, p. 519-525, 
DOI:10.24875/CIRU.18000626. 2020. 
 
LENZA, Pedro. Direito constitucional. (Coleção esquematizado®). Editora Saraiva, 2023. E-
book. ISBN 9786553624900. Disponível em: 
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786553624900/. Acesso em: 27 set. 2023. 
 
MELO, Cinthia Carvalho de. ASSIS, Ana Elisa Spaolonzi Queiroz. O suicídio assistido sob um 
olhar normativo e social. Argumental Journal Law, Jacarezinho, n. 39, p. 121-156, jan./abr. 
2023. 
 
MONTE, Sarah Araujo do. O direito de objeção ao diagnóstico de morte encefálica. 2019. 41 
fls. Dissertação (Graduação em direito) – Faculdade de Direito, Universidade de Brasília, 
Brasília, 2019. 
 
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. Grupo GEN, 2023. E-book. ISBN 
9786559774944. Disponível em: 
https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559774944/. Acesso em: 27 set. 2023. 
 
NUCCI, Guilherme de S. Crimes contra a vida. In: NUCCI, Guilherme de S. Curso de Direito 
Penal: Parte Especial. Arts. 121 a 212 do Código Penal. v.2. Grupo GEN, 2022. E-book. p. 3-
68 ISBN 9786559643721. Disponível em: 
148 
 
 
<https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559643721/>. Acesso em: 20 set. 
2023. 
 
ORSELLI, Helena de Azevedo. FAISSEL, Fernanda Xanteli. O suicídio assistido quando 
praticado com finalidade altruísta e o respeito à autonomia. Revista Brasileira de Direito, 
Passo Fundo, V. 15, n. 1, p. 123-144, jan.-abr. 2019. 
 
PEREIRA, Rafael Rodrigues. A eutanásia e suas razões. O que nos faz pensar, Rio de Janeiro, 
v. 28, n. 45, p. 546-570, jul.-dez. 2019. 
 
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça (1ª Câmara Cível). Apelação Cível n.º 
70054988266 (n.º CNJ: 00223453-79.2013.8.21.7000). Apelação cível. Assistência à saúde. 
Biodireito. Ortotanásia. Testamento vital. Apelante: Ministério Público. Apelado: João Carlos 
Ferreira. Relator: Des. Irineu Mariani, 20 de novembro de 2013. 
 
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça (1ª Câmara Criminal). Recurso no Sentido Estrito 
n.º 70084544147 (n.º CNJ: 0092773-59.2020.8.21.7000). Recurso em sentido estrito. 
Homicídio qualificado. Eutanásia. Pronúncia. Recorrente: Everaldo Rodrigues Guterres. 
Recorrido: Ministério Público. Relator: Des. Honório Gonçalves da Silva Neto, 11 de março de 
2021. 
 
RODRIGUES, Raphaela Lopes. A visão da prática da eutanásia no Brasil. Artigo, Jus.com.br, 
04 de março de 2018. Disponível em: < https://jus.com.br/artigos/64560/a-visao-da-pratica-da-
eutanasia-no-brasil>. Acesso em: 20 set. 2023 
 
SANTOS, Sandra Cristina Patrício dos. Eutanásia e suicídio assistido: O direito e liberdade de 
escolha. 2011. 196 fls. Dissertação (Mestrado em História Contemporânea e Estudos 
Internacionais) – Faculdade de Letras, Universidade de Coimbra, Coimbra, 2011. 
 
SHEMIE, Sam D. Parada cerebral, parada cardíaca e incertezas na definição de morte. Jornal 
de Pediatria, Rio de Janeiro, V. 83, n. 2, abr. 2007. 
 
SILVA, Sergio Gomes da. Eutanásia, finitude e biopolítica. Revista mal-estar e subjetividades, 
Fortaleza, V. XIII, n. 1-2, p. 331-368, mar.-jun. 2013. 
 
TARTUCE, Flávio. Parte geral do Código Civil de 2002. In: TARTUCE, Flávio. Manual de 
Direito Civil - Volume Único. Grupo GEN, 2022. E-book. p. 152-158. ISBN 9786559643134. 
Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9786559643134/>. Acesso 
em: 20 set. 2023. 
 
TREJO-GABRIEL-GALÁN, J.M. Eutanasia y suicidio assistido en enfermedades 
neurológicas: una revisión sistemática. Neurologia. S0213-4853(21)00090-6, DOI: 
10.1016/j.nrl.2021.04.016, jun. 2021 
 
 
 
 
 
149 
 
 
DIREITO E BIOÉTICA POR INTERMÉDIO DA CIÊNCIA: 
CONSIDERAÇÕES JURÍDICAS 
 
 
Edgar de Medeiros Pinto1 
RESUMO 
 
O presente trabalho, possui como objetivo central a análise dos limites das pesquisas com seres 
humanos no direito brasileiro, no tocante à área do biodireito, dos quais conforme a 
modernização do sistema jurídico em si, através das mudanças sociais, tornaram o supracitado 
tema, um meio discutível sobre até qual seria os limites de amparo legal. A partir daí, o Direito 
tal como disciplina normativa das ações e atitudes do ser humano como um todo surge para 
guiar na forma da lei os atos cometidos por profissionais interligados à saúde humana, e aos 
princípios da ética, tais como médicos, cientistas, farmacêuticos, geneticistas e etc. 
Consequentemente, a Ética trouxe equilíbrio à existência do Biodireito, para quem está usando 
essas novas tecnologias para o bem estar da saúde humana, onde através dela, possibilita vigiar 
as ações as condutas dos profissionais da saúde (médicos, farmacêuticos, cientistas etc.), e 
subsequentemente nascem desta junção (Direito e Ética), a “Bioética” e o “Biodireito” para a 
proteção da dignidade da pessoa humana e do bem jurídico mais preciso que é a “Vida”. Por 
conseguinte, na prática advém um dos maiores obstáculos enfrentados para a regulamentação 
do Biodireito no Brasil, a lentidão dos legisladores, sendo imprescindível destacar que nos 
fatores emergentes é muito mais difícil as normas acompanharem a evolução das descobertas e 
avanços das pesquisas na área genética e informática. Destaca-se com isso, que nada impede 
no futuro, a possibilidade do direito acompanhar o avanço da ciência e das tecnologias para dar 
o suporte à pessoas que vão utilizar delas. A presente pesquisa, basear-se-á na modalidade 
qualitativa, em sentido exploratório-descritiva, a partir da busca em obras literárias, artigos 
científicos e e-books, bem como na própria rede de internet. 
 
Palavras-chave: Bioética; Direito; Brasil; Dignidade; Modernização. 
 
INTRODUÇÃO 
 
Através dos tempos o ser humano evoluiu em todos os sentidos, e como de todo modo, 
os sistemas legislativos necessitaram adequações e modernizações de acordo com os tempos 
vividos pela sociedade. Consequentemente, ao mundo contemporâneo, inúmeras são as 
inovações realizadas pelo homem e por conseguinte, pela ciência, através de descobertas e 
experimentos. 
Por intermédio de tais descobertas, foi capaz de surgir uma nova área que abrange as 
questões médicas de dignidade à vida humana, e conjuntamente e tais dogmas, a 
 
1 Advogado-OAB-RS n. 125.543. Professor em Carreiras Jurídicas. Especialista em Direito Digital. Especialista 
em Direito Penal e Processo Penal. Especialista em Criminologia e Justiça Criminal. Especialista em Direito 
Desportivo. Especialista em Direito Civil. 
150 
 
 
responsabilidade jurídica geradas pelas ações rodeadas pelas mesmas. A bioética, precursora 
do biodireito, torna por exigir um maior comprometimento do campo jurídico, bem como das 
pessoas e profissionais envolvidas com uma questão que envolve o tema. 
Em suma, são diversas as discussões sobre o que de fato deve estar limitado ao 
dispositivo legal, ou não, tais como a proteção jurídica concedida ao nascituro, ou do paciente 
terminal, o direito à vida, sendo tais fatos impossíveis de ser resolvido de forma voluntarista, 
seja por parte do legislador, pelos médicos ou pela família, fazendo com que a moral seja a 
introdução para a resolução de questões de vida e morte. 
Primeiramente, abordou-se ao capítulo inicial, acerca da bioética, tutela jurídica e 
conflitos com o crédulo religioso, como uma forma de elucidar, na prática, como ocorre o 
cuidado e o resguardo de direitos perante às pessoas por sua crença religiosa, em especial aos 
Testemunhas de Jeová e os casos que envolvam transfusões

Mais conteúdos dessa disciplina