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Historia da matemática

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Prévia do material em texto

HERMES ANTONIO PEDROSO 
Setembro/2009 
 
 
1
 
 
PrefácioPrefácioPrefácioPrefácio 
 
 
Este livro originou-se como notas de aula da disciplina História 
da Matemática, de 60 horas/aula, ministrada nos cursos de 
Licenciatura e Bacharelado em Matemática do IBILCE – UNESP de 
São José de Rio Preto, desde 1991. Na época de sua publicação, em 
forma de apostila em 1992, só existiam dois textos em português, 
traduções de obras famosas, escritos originalmente em inglês. 
Essas obras, clássicas, ainda hoje são incluídas em qualquer 
bibliografia sobre o assunto, mas nunca se adequaram como guia 
didático para sala de aula. São muito detalhadas para uma disciplina 
semestral, e de difícil acesso para a maior parte dos estudantes. Isso 
me motivou a elaborar um texto que preservasse o essencial das 
referidas obras, mas pensando nos tópicos que mais contribuiriam 
para o futuro professor ou mesmo futuro pesquisador. 
Atualmente temos outros bons livros, traduções ou mesmo de 
autores brasileiros, mas que também não se adéquam às prioridades 
dos referidos cursos, devido à grande quantidade de informações a 
serem assimiladas em tão pouco tempo. 
A apostila foi indicada e bem aceita pelos alunos de graduação, 
inclusive de outras instituições de nível superior, e por professores 
da rede oficial de ensino, quando ministrei Tópicos de História da 
Matemática em projetos como Teia do Saber e até mesmo em curso 
de pós-graduação Lato Sensu, em que tive oportunidade de orientar 
algumas monografias com temas que utilizavam história da 
matemática. 
Após todos esses anos, somente agora foi possível fazer uma 
revisão e complementar com novas informações importantes, 
provenientes de pesquisas realizadas através de vários projetos 
desenvolvidos durante esse período na universidade. 
Quanto à estrutura do texto, não há muita uniformidade. Alguns 
assuntos são mais desenvolvidos que outros, tendo em vista a 
importância que considero na formação dos graduandos, que 
poderão utilizar a história da matemática como recurso didático no 
ensino fundamental e médio. 
 
 
 
 
2
 
 Apresento ao final de cada sessão, uma lista de exercícios que 
servirão como revisão, despertando oportunidade de debates e 
apresentação de trabalhos em forma de seminários. 
 
 
O autor 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
3
 
SUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIO 
 
Introdução ......................................................................... 07 
Por que História da Matemática? ................................ 08 
Origens Primitivas ........................................................... 13 
Egito .................................................................................... 15 
A matemática egípcia ........................................................... 18 
Mesopotâmia .................................................................... 37 
A matemática mesopotâmia .................................................. 39 
Grécia .................................................................................. 47 
Homero ................................................................................. 48 
Hesíodo ................................................................................. 50 
A matemática grega .............................................................. 51 
O racionalismo jônico e os pitagóricos .................... 59 
Tales ..................................................................................... 59 
Anaximandro, Anaxímenes ................................................. 62 
Pitágoras ............................................................................... 63 
Parmênides, Zenon ............................................................... 70 
Melisso, Heráclito ................................................................. 73 
Demócrito ............................................................................. 75 
Os ideais platônicos e a lógica aristotélica ............. 77 
Anaxágoras ........................................................................... 78 
Hipócrates ............................................................................. 79 
Hípias .................................................................................... 81 
Sócrates ................................................................................ 82 
Platão .................................................................................... 83 
Arquitas, Teaetecto, Menaecmo .......................................... 90 
Dinóstrato ............................................................................. 91 
Eudoxo .................................................................................. 92 
Aristóteles ............................................................................. 94 
Epicuro ................................................................................. 98 
 
 
 
 
 
4
 
A ciência helenística ....................................................... 103 
Euclides ............................................................................... 104 
Aristarco .............................................................................. 118 
Arquimedes .......................................................................... 119 
Arquimedes e Euclides ........................................................ 134 
Eratóstenes ........................................................................... 134 
Apolônio .............................................................................. 136 
Hiparco ................................................................................ 140 
 
Período Greco,romano ................................................. 145 
Roma .................................................................................... 145 
Lucrécio, Ptolomeu .............................................................. 149 
Heron ................................................................................... 154 
Diofanto .............................................................................. 157 
Papus ................................................................................... 159 
Hipatia, Proclo, Boécio ........................................................ 163 
 
Europa na Idade Média, China, Índia e Arábia ..... 167 
Alcuim ................................................................................. 171 
Gerbert ................................................................................. 172 
China .................................................................................... 172 
Índia ..................................................................................... 178 
Aryabhata ............................................................................. 179 
Brahmagupta ........................................................................ 180 
Bhaskara ............................................................................. 183 
Arábia .................................................................................. 185 
Al-Khowarizmi .................................................................... 187 
Abu’l-wefa, Omar Khayyam .............................................. 189 
Al-Tusi, Al-Kashi ................................................................ 191 
Aurora do Renascimento .............................................. 195 
Fibonacci ............................................................................. 196 
Nemorarius, Sacrobosco, Bacon .......................................... 198 
Bacon ................................................................................... 199 
Dante, Oresme ..................................................................... 200 
Oresme ................................................................................. 201 
 
 
 
 
 
5
 
O Renascimento ............................................................... 209 
Nicolaude Cusa .................................................................... 211 
Peurbach, Regiomontanus .................................................... 212 
Copérnico ............................................................................. 214 
Giordano Bruno .................................................................... 218 
Tycho Brahe ......................................................................... 220 
Kepler ................................................................................... 223 
Galileu .................................................................................. 226 
Pacioli ................................................................................... 230 
Leonardo da Vinci ................................................................ 232 
Rafael .................................................................................... 233 
Stifel ..................................................................................... 234 
Recorde ................................................................................. 235 
Tartaglia, Cardano ................................................................ 236 
Cardano................................................................................. 237 
Bombelli ............................................................................... 240 
Viète ..................................................................................... 241 
Mercator ............................................................................... 244 
Napier ................................................................................... 245 
Briggs ................................................................................... 246 
Stevin .................................................................................... 248 
Inícios da matemática moderna ................................. 251 
Descartes ............................................................................... 252 
Cavalieri ............................................................................... 257 
Fermat ................................................................................... 260 
Pascal .................................................................................... 264 
Wallis .................................................................................... 267 
Barrow .................................................................................. 269 
Newton ................................................................................. 270 
Leibniz .................................................................................. 277 
O século das luzes .......................................................... 283 
Euler ..................................................................................... 286 
D’Alembert ........................................................................... 289 
Lagrange ............................................................................... 290 
Laplace ................................................................................. 292 
 
 
 
 
6
 
A matemática se estruturou ........................................ 297 
Gauss ................................................................................... 299 
Riemann ............................................................................... 304 
Bolzano ................................................................................ 305 
Cauchy ................................................................................. 307 
Weierstrass ........................................................................... 310 
Os problemas de Hilbert ...................................................... 311 
 
A matemática propiciou maravilhas ......................... 317 
Einstein ................................................................................ 320 
 
Referências bilbliográficas........................................... 327 
 
Sobre o autor ................................................................... 332 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7
 
INTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃOINTRODUÇÃO 
 
 
 Por que história?Por que história?Por que história?Por que história? 
 
O objetivo da história não é apenas o de narrar e constatar fatos 
do passado, mas buscar as suas origens e as suas conseqüências. 
Quando nos propomos estudar a história de um país ou de um 
povo, ou simplesmente um determinado episódio histórico, não nos 
deve mover somente um interesse anedótico ou mera curiosidade. 
Também não se pode resumi-la a uma exaltação de heróis para 
incentivo da juventude, ou mera recordação de nossas glórias 
passadas. 
O que queremos da história é muito mais do que isso. Ela não se 
pode limitar a uma simples enumeração cronológica dos fatos, mas 
deve buscar as relações entre eles, aprofundar, descer às suas raízes, 
até encontrar as causas desses fatos, numa espécie de anamnese 
social, assim como o médico que, ao examinar um doente, para 
maior firmeza do diagnóstico, desce a todos os seus antecedentes 
pessoais e familiares. 
Encarada a história como ciência, com suas características de 
método e relação com a realidade, um mundo novo surge aos nossos 
olhos, por trás de cada fato ou acontecimento. Desse modo ela nos 
permite não só explicar o presente, e compreender o passado, mas 
também prever o futuro, ou pelo menos, antever as perspectivas do 
desenvolvimento de cada fato estudado, na medida do nosso 
conhecimento das causas e das leis que as governam. 
A história não se desenvolve como força espiritual absoluta 
independente da existência dos homens, como queria Hegel. Ela 
nasce, ao contrário, da atividade do homem sobre a Terra e é 
condicionada e delimitada por leis objetivas, independentes da 
vontade humana. Karl Marx (1818 – 1883) enfatizava em A 
Ideologia Alemã que a história é a mais alta, a mais nobre e a mais 
importante das ciências. 
Assim sendo, se é verdade que os homens fazem a história 
condicionados por leis indestrutíveis, não é menos verdade que, 
 
 
 
 
8
 
conhecendo as leis que a regem, eles podem traçar, dentro de dados 
limites, o seu próprio destino. E se o objetivo do homem sobre a 
Terra é buscar a felicidade, dentro de uma comunidade harmônica, 
só o estudo da história, e o conhecimento das leis que regem o 
desenvolvimento das sociedades, poderão ajudá-lo. 
É possível que o mesmo aconteça com a Matemática ou com a 
Ciência em geral. Torna-se difícil, senão impossível, compreender o 
seu estágio atual sem o estudo concomitante da história das idéias 
científicas. Talvez por isso é que Göethe (1749-1832) afirmava que 
a história da Ciência é a própria Ciência. Sem o conhecimento da 
evolução das idéias, do choque das hipóteses e das teorias, podemos 
criar bons técnicos, mas não cientistas verdadeiros. Muito maior 
interesse educativo apresenta o conhecimento da maneira pela qual o 
cientista trabalha, das suas fontes de inspiração, da árvore 
filogenética de seus pensamentos, do que a pura e simples massa de 
fatos por ele descobertos. O estudo da História da Ciência poderá ser 
o guia da luta do homem contra o mistério. 
 
Por que História da Matemática?Por que História da Matemática?Por que História da Matemática?Por que História da Matemática? 
 
Por vários motivos, mas o principal seria dar subsídios para o 
futuro professor no tratamento de um programa no ensino 
fundamental e médio ou na universidade. 
Pode-se destacar alguns exemplos de dificuldades encontradas 
pelo homem, no desenvolvimento da matemática, que serão motivos 
de reflexão para o futuro educador. 
 
• Os números negativos, introduzidos pelos hindus de espírito 
prático, por volta de 600 d.c. não tiveram aceitação durante um 
milênio. A razão: faltava-lhes apoio intuitivo. Alguns dos maiores 
matemáticos tais como Cardano, Viète, Descartes e Fermat, 
recusaram-se a operar com números negativos.Assim é razoável 
que para ensinar números negativos devemos ter cuidado. Para o 
aluno das séries iniciais o conceito e as operações podem não ser tão 
naturais. 
 
• O uso de uma letra para representar um número fixo, porém 
desconhecido, data dos tempos gregos. Contudo, o uso de uma letra 
 
 
 
9
 
ou letras para representar toda uma classe de números só foi 
concebido em fins do século XVI. Nesse tempo François Viète 
introduziu expressões como ax + b em que a e b podem ser qualquer 
número (real positivo). Hoje está claro que ao resolver a equação 
quadrática ax² + bx + c = 0, pode-se solucionar todas as equações 
quadráticas porque a, b e c representam quaisquer números. 
Durante todos os séculos em que os babilônicos, egípcios, gregos, 
hindus e árabes operaram com álgebra não ocorrera a idéia de 
empregar as letras para uma classe de números. Aqueles povos 
faziam suas operações de álgebra empregando expressões concretas 
tais como 3x² + 5x + 6 = 0, ou seja, usavam sempre coeficientes 
numéricos e, na verdade, a maioria não usava sequer um símbolo tal 
como x para a incógnita. Usavam palavras. 
Por que demorou tanto tempo para o uso de letras para coeficientes 
gerais? Ao que parece, a resposta é que esse processo constitui um 
nível superior de abstração em matemática, um nível bastante 
afastado da intuição. 
 
• A teoria de limites com épsilons e deltas é do final do século XIX 
e com ela colocou-se um ponto final nas controvérsias sobre a 
questão do rigor no cálculo. No entanto o cálculo existe desde a 
Grécia antiga com Eudoxo e Arquimedes. O que acontece hoje? 
Apresentamos a teoria de limites aos alunos como algo muito 
“natural”. “Natural” mas incoerente com o desenvolvimento 
histórico do Cálculo. 
 
Parece claro que os conceitos que têm o sentido mais intuitivo, 
como os geométricos, os de números inteiros positivos e os de 
frações foram aceitos e utilizados primeiramente. Os menos 
intuitivos tais como os de números irracionais, números negativos, o 
uso de letras para coeficientes gerais e os do cálculo exigiram 
muitos séculos, quer para serem criados, quer para serem aceitos. 
Além disso, quando foram aceitos não foi apenas a lógica que 
induziu os matemáticos a adotá-los, porém os argumentos por 
analogia, o sentido físico de alguns conceitos e a obtenção dos 
resultados científicos exatos. 
Não há muita dúvida de que as dificuldades que os grandes 
matemáticos encontraram, são precisamente os tropeços que os 
 
 
 
10
 
estudantes experimentam. Assim, através da história da 
matemática o ensino da matemática poderá alcançar objetivos que 
vão além do fortemente marcado “desenvolver o raciocínio lógico”; 
porque ela mostra a matemática como expressão de cultura, a 
matemática como uma forma de comunicação humana. 
Refletindo um pouco mais sobre a questão “Por que História da 
Matemática?” deve-se lembrar que o conhecimento é um todo e a 
matemática faz parte desse todo. Ela não se desenvolveu à parte de 
outras atividades e interesses. Talvez uma grande falha no ensino da 
matemática é tentar abordá-la como disciplina isolada. E esse 
processo, sem dúvida, é uma distorção do verdadeiro conhecimento. 
Provavelmente por isso, muitos jovens se sintam humilhados 
por não compreenderem muitos símbolos e regras, longe da intuição. 
Generaliza-se, então, uma certa aversão pela disciplina e a 
Matemática torna-se para muitos como algo inatingível. Cria-se o 
mito do gênio ou que a Matemática é somente para loucos e gênios. 
Essa aversão tende também a desvalorizar um ramo do 
conhecimento dos mais importantes. 
É sempre bom lembrar que além da aritmética das necessidades 
cotidianas, a matemática tem muito a oferecer. Ela é a chave para 
nossa compreensão do mundo físico, dá-nos o poder sobre a 
natureza; e deu ao homem a convicção de que ele pode continuar a 
sondar os seus segredos. 
A matemática tem possibilitado aos pintores a pintar 
realisticamente e fornecido não só a compreensão dos sons musicais 
como também uma análise desses sons, indispensável na 
planificação do telefone, do rádio e de outros instrumentos de 
registro e reprodução de sons. Ela está se tornando cada vez mais 
valiosa na pesquisa biológica e médica. A pergunta “Que é 
verdade?” não pode ser discutida sem envolver o papel que a 
matemática tem exercido ao convencer o homem de que ele pode ou 
não obter verdades. Muito de nossa literatura está permeado de 
temas que tratam de realizações matemáticas. Finalmente, a 
matemática é indispensável em nossa tecnologia. 
Portanto, o curso de História da Matemática pode ser a 
oportunidade para se discutir tudo isso, e, como disse Plutarco, “a 
mente não é uma vasilha para ser enchida, porém, um fogo para se 
atear” e, segundo Henri Poincaré (1854-1912), “Os zoólogos 
 
 
 
11
 
afirmam que num breve período, o desenvolvimento do embrião 
de um animal recapitula a história de seus antepassados de todas as 
épocas geológicas. Parece que o mesmo se dá no desenvolvimento 
da mente. A tarefa do educador é fazer a mente da criança passar 
pelo que seus pais passaram, atravessar rapidamente certos 
estágios, mas sem omitir um. Para esse fim a história da Ciência 
deve ser nosso guia.” 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
12
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
13
 
ORIGENS PRIMITIVASORIGENS PRIMITIVASORIGENS PRIMITIVASORIGENS PRIMITIVAS 
 
 
Se quisermos pesquisar a origem histórica das primeiras noções 
matemáticas, seremos levados a fontes da chamada pré-história. É 
provável que a percepção de que certos grupos podem ser colocados 
em correspondência um a um, tenha surgido há uns 300.000 anos. O 
homem primitivo não sabia contar e nem precisava, pois conseguia 
com certa facilidade caça, pesca e frutas. Quando essas começaram 
a se tornar escassas, ele teve necessidade de se sedentarizar, por isso 
passou a criar animais e praticar a agricultura. Da necessidade, por 
exemplo, de preservação do rebanho, aprendeu a contar as ovelhas, 
mesmo sem conhecer os números. As primeiras contagens eram 
feitas com os dedos (que pode ter dado origem ao sistema decimal), 
quando estes eram inadequados, passaram a usar montes de pedras 
(calculus em latim) e como tais métodos não eram muito seguros 
para conservar informação, o homem primitivo registrava um 
número com marcas num bastão, pedaço de osso ou no barro. 
Descobertas arqueológicas fornecem provas de que a idéia de 
número é muito mais antiga do que progressos tecnológicos como o 
uso de metais ou de veículos com rodas. 
Supõe-se usualmente que a matemática surgiu em resposta a 
necessidades práticas, mas estudos antropológicos sugerem a 
possibilidade de uma outra origem. Foi sugerido que a arte de contar 
surgiu em conexão com rituais religiosos primitivos e que o aspecto 
ordinal precedeu o conceito quantitativo. 
Em ritos cerimoniais, representando mitos da criação, era 
necessário chamar os participantes à cena segundo uma ordem 
específica, e talvez a contagem tenha sido inventada para resolver tal 
problema. 
Esse ponto de vista, embora esteja longe de ser provado, estaria 
em harmonia com a divisão ritual dos inteiros em ímpares e pares, 
os primeiros considerados como masculinos e os últimos, como 
femininos. 
Sábios gregos não quiseram se arriscar a propor origens mais 
antigas da matemática do que a egípcia. Heródoto afirmava que 
 
 
 
 
14
 
a geometria se originou no Egito, pois acreditava que tinha 
surgido da necessidade prática de fazer novas medidas de terras após 
cada inundação anual no vale do Nilo. Aristóteles achava que a 
existência no Egito de uma classe sacerdotal com lazeres é que tinha 
conduzido ao estudo da geometria. 
Que os primórdios da matemática são mais antigos que as mais 
antigas civilizações está claro. As teses apresentadas acima são até 
discutíveis mas não podemos desprezar os conhecimentos 
matemáticos envolvidos nas diversasatividades humanas. A seguir 
apresentamos exemplos de algumas atividades em que podemos 
identificar imediatamente elementos matemáticos no trabalho 
humano: ornamentação (vasos, armas); produção de rodas (sem ou 
com raios); plantações (irrigação, divisão de terras); edificações 
(monumentos); pastoreio (contagem); comércio (trocas, moedas); 
orientação no tempo e no espaço (calendários, mapas). Nesse 
sentido é interessante observar que muitas vezes o pensamento 
matemático desenvolveu-se de maneira semelhante em sociedades 
totalmente independentes. Foi o que aconteceu, por exemplo, com o 
Egito e a Mesopotâmia por volta do ano 2000 a.C. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
15
 
EGITOEGITOEGITOEGITO 
 
 
“O Egito é um presente do Nilo” (Heródoto) 
 
 
Entre 4000 e 3000 a.C., na idade Neolítica (ou da Pedra Polida) 
tivemos culturas bem estabelecidas na Mesopotâmia e no Egito. Ali 
se formaram as primeiras cidades e estados organizados, mas as 
duas regiões deram origem a civilizações um tanto diferentes. 
O Egito era uma região centrada no Nilo, com ambiente hostil 
no sul e nas fronteiras leste e oeste. Na verdade, era como uma ilha, 
limitado ao norte pelo mar Mediterrâneo e em suas outras fronteiras, 
pelo deserto. De várias maneiras, a civilização egípcia mostrou-se 
isolada, era conservadora e voltada para si mesma; e, de um modo 
geral, não estava interessada na expansão e na conquista de outras 
terras. Para um egípcio antigo, o Egito era um universo auto-
suficiente: tinha seus deuses independentes e seu modo de vida 
especial. A língua egípcia e a escrita hieroglífica desenvolveram-se 
de mãos dadas; o próprio sistema de hieróglifos era insular, 
impróprio para expressar qualquer outra língua, e, na 
correspondência diplomática com outros países, usava-se um 
sistema de escrita diferente. Efetivamente, os antigos egípcios 
viviam em isolamento cultural. 
Mas, se o isolamento era a característica fundamental do antigo 
Egito, sua civilização foi, contudo, magnífica; era olhada com inveja 
pelos que circundavam suas fronteiras, e somente os desertos a sua 
volta, impediram que se tornassem vítima de vizinhos ciumentos. Na 
realidade, alguns nômades se estabeleceram na área esparsamente 
povoada do delta do Nilo, mas não perturbaram a natureza, 
basicamente pacífica, do país, que era essencialmente uma terra de 
agricultores e escribas. 
 
 
 
 
 
 
 
16
 
A inundação anual do Nilo, que ocorria regulamente em julho, 
era o alicerce da vida egípcia. Havia um sistema bem organizado de 
irrigação e tomava-se um cuidado especial com as águas disponíveis 
por ocasião da cheia anual. Boas colheitas eram a regra geral – 
muitas vezes três por ano – e havia belos rebanhos de gado, a 
maioria em pastagens na área do delta. Nenhum egípcio se 
sacrificava trabalhando uma terra hostil e árida para a sua 
sobrevivência, embora os métodos agrícolas fossem primitivos e 
conservadores. 
A história do Egito começa com o primeiro faraó, chamado 
Menes, que uniu num só, o Alto e Baixo Egito por volta de 3360 
a.C. e, exceto por dois períodos de instabilidade, manteve-se unido 
por mais de 2000 anos. 
Os principais períodos de domínio unificado são: o Antigo 
Império, ou Época das Pirâmides, de 3000 a 2475 a.C. Esse período 
assinala um progresso rápido no domínio das forças mecânicas (das 
pirâmides, apenas 80 de conservaram de modo completo). O 
segundo, o Império Médio ou Época Feudal, de 2160 a 1788 a.C., 
caracteriza-se pelo desenvolvimento intelectual e pelo comércio 
exterior. Formaram-se bibliotecas de rolos de papiro e os navios 
cruzavam os mares Egeu e Vermelho. O terceiro período, o do Novo 
Império, estende-se de 1580 a 1150 a.C., sendo a época das grandes 
construções. 
 
 
17
 
 
Os soberanos eram os faraós, cujo despotismo era temperado 
por ideais de responsabilidade em relação ao povo comum; 
considerando-se os tempos primitivos em que viveram, eles 
realmente procuraram fazer com que seus súditos tivessem vida feliz 
e razoavelmente confortável (apesar da escravidão); governava pela 
lei, que parece ter sido geralmente justa. Além do faraó e da família 
real, os sacerdotes, os nobres e os guerreiros pertenciam às classes 
privilegiadas. Na classe média encontravam-se os escribas, os 
comerciantes, os artesãos e os camponeses e, os servos ocupavam as 
classes inferiores. 
O Egito tinha uma grande e eficiente administração. A maior 
parte dela parece ter sido centrada nas grandes construções de 
templos, embora, periodicamente, os próprios faraós demonstrassem 
grande capacidade administrativa. A administração padronizou 
pesos e medidas, enquanto seus funcionários, os escribas, em grande 
parte clérigos, escreviam em hieróglifos ou na escrita hierática ou 
sacerdotal, mais correntemente usada. Os egípcios escreviam em 
papiros, produzidos no país desde épocas primitivas; parecem ter 
sido usados antes de 3500 a.C. Eram feitos com o cerne de uma alta 
ciperácea (Cyperus papyrus) que se encontrava em abundância nos 
pântanos ao redor do delta e sua manufatura em folhas era simples. 
Tratava-se do material ideal para ser usado nas secas condições do 
Oriente Médio e foi empregado em grande quantidade em Roma. No 
clima mais úmido da Europa, o papiro era menos estável, mas, no 
Egito, era superior a qualquer outro material para escrita. 
Permaneceu em uso até o nono século depois de Cristo. O papiro era 
também usado como alimento(os brotos), como combustível(as 
raízes), e ainda, para se fazer cestos, cordas, esteiras, sandálias e até 
pequenos barcos. A propósito, é interessante notar que os gregos, 
que consideravam os egípcios um povo de imensa sabedoria, 
chamavam uma folha de papiro de “biblion”, da qual deriva a 
palavra “bíblia”; a palavra “papel” é derivada de “papiro”, embora 
na verdade, o papel seja um material bem diferente e tenha sido 
inventado pelos chineses e não pelos egípcios. 
O fato de os gregos terem superestimado a sabedoria egípcia 
pode ter resultado, pelo menos em parte, da impressão causada 
naqueles que visitaram o Egito e ficaram maravilhados com as 
magníficas construções que lá encontraram e, na verdade, a 
 
 
18
 
 
construção era uma das maiores formas de expressão desse povo. O 
vale do Nilo é uma vasta pedreira e, embora tivessem de importar 
toda a madeira de que precisava, da Líbia ou da Síria, logo 
aprenderam a manusear os materiais locais. Eram peritos cortadores 
de pedras, soberbos escultores, pintavam bem e eram mestres 
artífices em metais, especialmente o ouro. 
A habilidade dos egípcios na construção de grandes edifícios e 
estátuas, não é, por si mesma, uma ciência: havia o que hoje 
chamaríamos de princípios de mecânica, mas parece que inexistia 
um conjunto básico de conhecimentos científicos ou uma teoria em 
que os construtores pudessem se basear. Seu valor como 
construtores era alicerçado em sólida experiência pratica e num 
instinto para a engenharia estrutural. Realmente, os egípcios 
parecem ter sido essencialmente um povo muito prático, mais 
voltado para resultados efetivos do que para a filosofia dos 
princípios básicos concernentes. A curto prazo, essa atitude traz 
sucesso, mas, a longo prazo, não encoraja nem a especulação e nem 
idéias novas. Isso significa, por exemplo, que quando Akhenaton 
construiu seu grande templo em Carnac, no ano de 1370 a.C., as 
técnicas usadas não foram substancialmente diferentes das utilizadas 
por Quéops cerca de treze séculos antes. 
A falta de interesse dos egípcios pela reflexão filosófica e a 
tendência para o aspecto prático podem ser observadas mesmo na 
astronomia. Para eles, a astronomia era a base utilitária necessária 
para a marcação do tempo. Os astrônomos egípcios não estavam 
preocupados com teorias a respeito do Sol e da Lua., nem com 
quaisquer idéias a respeito do movimento dos planetas, embora 
soubessem que os planetas se moviam entre as estrela fixas. 
O calendário nos dá um exemplo de êxito brilhante obtidopela 
ciência egípcia. O ano egípcio, por volta de 2.500 a.C., contém 365 
dias como o nosso. Os meses repartem-se em três estações de quatro 
meses cada uma: inundação, inverno e verão. 
 
A MATEMÁTICA EGÍPCIAA MATEMÁTICA EGÍPCIAA MATEMÁTICA EGÍPCIAA MATEMÁTICA EGÍPCIA 
 
A matemática no Egito, a exemplo da astronomia, não era em 
si mesma, considerada uma forma de conhecimento independente 
de sua aplicação, como aconteceria na Grécia. Assim, a pesquisa dos 
 
 
19
 
 
princípios matemáticos era desprezível e não havia uma teoria 
básica de aritmética ou geometria e sim procedimentos práticos. 
 
As fontesAs fontesAs fontesAs fontes 
 
Um certo número de papiros egípcios de algum modo resistiu 
aos desgastes do tempo por mais de três e meio milênios. Os 
principais de natureza matemática são o Papiro Rhind, o Papiro de 
Moscou e o Papiro de Berlim, copiados em escrita hierática. 
 
● O Papiro Rhind, o mais extenso, mede 0,30 m de largura por 5 m 
de comprimento, e também 
o mais importante, 
encontra-se no Museu 
Britânico. Foi adquirido em 
1858 numa cidade à beira 
do Nilo, pelo antiquário 
escocês, Alexander Henry 
Rhind (1833-1866), daí a 
origem do seu nome, muito 
embora seja conhecido 
também, como Papiro 
Ahmes em honra ao escriba 
que o copiou por volta de 
1650 a.C de outro mais 
antigo, provavelmente de 
1800 a,C. Trata-se de um texto na forma de manual prático que 
contém 85 problemas, enunciados e resolvidos, e logo no início 
apresenta uma interessante proposta: “Guia para conhecimento de 
todas as coisas obscuras”. Quando chegou ao Museu Britânico esse 
Papiro não estava completo, formado de duas partes, e faltava-lhe a 
porção central. Cerca de quatro anos depois de Rhind ter adquirido 
seu papiro, o egiptólogo norte americano Edwin Smith comprou no 
Egito o que pensou que fosse um papiro médico. A aquisição de 
Smith foi doada à Sociedade Histórica de Nova York em 1932, 
quando os especialistasdescobriram por sob uma camada fraudulenta 
a parte que faltava do Papiro Ahmes. A sociedade, então, doou 
o rolo ao Museu Britânico, completando-se assim a obra original. 
 
 
20
 
 
● O Papiro de Moscou ou Golenischev é de 1850 a,C. e encontra-
se no Museu de Belas Artes de Moscou. Foi adquirido no Egito em 
1893 pelo colecionador russo Golenischev, mede 0,07m de largura 
por 5m de comprimento e contém 25 problemas. 
 
● Quanto ao Papiro de Berlim não dispomos das informações 
seguras dos anteriores, apenas que está muito deteriorado. 
 
A seguir, o mais importante da matemática contida nesses três 
papiros. 
 
AritméticaAritméticaAritméticaAritmética 
 
Sistema de numeração 
 
O sistema de numeração dos egípcios era decimal aditivo (não 
posicional). 
Ressalta-se que não eram conhecidos os números negativos e 
nem o zero. 
Quadro de hieróglifos 
 
Símbolo egípcio descrição nosso número 
 
bastão 1 
 calcanhar 10 
 rolo de corda 100 
 
flor de lótus 1000 
 
dedo apontando 10000 
 
peixe 100000 
 
homem 1000000 
 
 
 
21
 
Por exemplo, o número 12345, se escrevia como 
 
 
As quatro operações 
 
Adição: 24 + 97 
 e é igual a 
 
 
Subtração: 12 – 7 
 O raciocínio era: quanto se deve somar a 7 para formar 12? 
 
Multiplicação: 
 Enquanto hoje aprende-se as tabuadas de somar e de multiplicar 
até 10, o que permite efetuar todas as operações simples, os egípcios 
usavam apenas a tabuada do 2. Para multiplicar um número dado, 
por um multiplicador maior que 2, realizavam uma série de 
“duplicações”, o que lhes permitia fazer todas as multiplicações, 
sem na realidade, recorrerem à memória. 
 Por exemplo, para multiplicar 13 por 7. o escriba opera da 
seguinte maneira: 
 - 1 7 
 2 14 
 - 4 28 
 - 8 56 
 
 Escreve, na coluna da direita o fator 7 e na da esquerda 1; dobra, 
em seguida, os números das duas colunas, até obter, por adição de 
números da coluna da esquerda, o valor do outro fator. No exemplo 
dado, 13 é obtido pela adição de 1, 4 e 8. Chegando a esse ponto da 
operação, marca-se com um traço os números que tomou e soma, em 
seguida, os números correspondentes da coluna da direita, ou seja, 
7 + 28 + 56 = 91. Portanto a adição desses números lhe dá o 
resultado da multiplicação. Como se verificou, o escriba só operou 
com adições e é nisso que reside o caráter “aditivo” da aritmética 
egípcia. 
 
 
22
 
 
Outros exemplos: resolução de 4 x 3 e 12 x 16 
 
 1 3 1 16 
 2 6 2 32 
 - 4 12 - 4 64 
 - 8 128 
 
 4 x 3 = 12 12 x 16 = (4 + 8) x 16 = 64 + 128 = 192 
 
Divisão: 
 Na divisão usava-se o mesmo processo da multiplicação, mas 
em sentido inverso. Assim, para dividir 168 por 8, o escriba 
dispunha os cálculos, como no caso de uma multiplicação: 
 
1 8 – 
2 16 
4 32 – 
8 64 
16 128 – 
 
Feito isso, procura-se na coluna da direita (e não na da esquerda 
como na multiplicação) os números que, somados, darão o 
dividendo 168. No nosso exemplo, toma-se os números 8, 32 e 128 
e marca-se com um traço os correspondentes da coluna da esquerda, 
a saber: 1, 4 e 16, que somados perfazem 21, que é o quociente da 
divisão. 
Facilmente depara-se com divisões não exatas, como por 
exemplo, 168 dividido por 9: 
 1 9 
 2 18 – 
 4 36 
 8 72 
 16 144 – 
Não se conseguindo a soma do dividendo na coluna da direita, 
assinala-se os números cuja soma mais se aproxima do dividendo, 
no caso 144 + 18 = 162. Portanto tem-se o quociente 16 + 2 = 18 e o 
resto 168 – 162 = 6. 
 
 
 
23
 
Frações 
 
O estudo de frações surgiu por necessidade prática, quando as 
divisões não eram exatas, como vimos no exemplo anterior. 
Com exceção de 
3
2
 que era representado por os egípcios 
usavam apenas frações unitárias, ou seja, com numerador igual a 1. 
Na escrita a fração era expressa por meio do signo , que 
significa parte ou porção, sendo que o denominador é escrito abaixo 
ou ao seu lado. 
Exemplos: 
 
 
 
Notações especiais: 
 
 
Outras frações de denominador 
potência de 2, encontram-se 
representadas no olho do deus Horo, que 
combina o udjat (olho humano) com as manchas coloridas que 
envolvem o olho de um falcão. 
 
Operações com frações: 
 Recusando-se a priori a conceber uma fração que não tivesse 
numerador 1, boa parte do seu trabalho era dedicado a escrever uma 
certa fração como soma de frações de numerador 1. Por exemplo, 
5
2
 
escrevia-se como 
15
1
3
1
+ . É possível que para essas transformações 
fossem utilizadas fórmulas do tipo: 
2
1
1
2
1
12
)n(nnn +
+
+
= ou 
.
)qp(q)qp(ppq
2
1
2
12
+
+
+
= Por isso, os cálculos que utilizavam 
frações ocupam a maior parte do Papiro Rhind. 
5
1
 43
1
 276
1
 
 
2
1
 
4
1
 
 
 
24
 
 
 O princípio dessas operações é idêntico ao utilizado para os 
números inteiros: a “duplicação” sistemática. Quando o 
denominador da fração a duplicar era um número par, não havia 
qualquer dificuldade: bastava dividi-lo por 2. Por exemplo, para a 
operação simples 7 x 
8
1
, o escriba egípcio colocaria como 
habitualmente. 
 - 1 
8
1
 
 - 2 
4
1
 
 - 4 
2
1
 
 Sendo a soma dos números da primeira coluna igual ao 
multiplicador 7, transcreveria diretamente o resultado: 
 
8
1
4
1
2
1
8
1
7 ++=x 
Mas, no caso de uma operação com denominadores ímpares, o 
sistema adotado torna-se inoperantes e é necessário encontrar um 
meio de superar a dificuldade. 
Qualquer fração da forma 
n
2
, em que n é um número ímpar, 
pode ser decomposta numa soma de duas ou mais frações, cujo 
numerador é 1. Assim, como vimos 
5
2
 pode escrever-se 
15
1
3
1
+ . Os 
egípcios conheciam bem esse fato e, como a decomposição de 
frações implica cálculos longos e delicados, estabeleceram uma 
tábua modelo de decomposição, começando em 
5
2
 e chegando em 
101
2
. Essa tábua, que desempenhava um papelconsiderável no 
ensino, constitui a parte mais importante do Papiro Rhind. Eis um 
exemplo de como ela se apresenta: 
 
 
 
25
 
Dividir 2 por 41: 
24
1
3
2
1 + corresponde a 
246
1*
 a 
6
1
 
24
1
,
*
 e 
328
1*
 a 
8
1
 
 
Modo de realizar a operação: 
 
8
1
6
1
 resto 
24
1
3
2
1
24
17
1 
24
1
12
1
3
1
3 
12
1
6
1
3
2
6 
6
1
 
3
2
13 
3
1
 
3
1
27 
3
2
 41 1
+
+=
+
+ 
 
Total 1 41 
 /2 82 
 /4 164 
 /6 246 
6
1
 
 /8 328 
8
1
 
 
Segundo os nossos métodos habituais, exporíamos assim a 
resposta do problema: 
328
1
246
1
24
1
41
2
++= 
A técnica dos escribas para chegar ao resultado é difícil de ser 
acompanhada e os próprios matemáticos não estão totalmente de 
acordo quanto ao método utilizado. É possível, aliás, que não 
 
 
26
 
 
houvesse de início, um método bem definido e que os escribas 
chegassem ao resultado por meio de tentativas sucessivas. Nem por 
isso deixa de ser assombrosa a facilidade e a segurança com que os 
egípcios manejavam suas frações; posteriormente os gregos e os 
romanos adotaram esse método. 
 
Partições proporcionais 
 
 É possível que os egípcios tenham adquirido uma grande 
habilidade no manejo das frações devido ao sistema econômico e 
social da realeza faraônica. Conheceram tardiamente a moeda, 
somente por ocasião da conquista persa. Todo o comércio, até o 
mais indispensável à vida, realizava-se através da troca. 
Além disso, a propriedade privada era, ao que parece, das mais 
limitadas; a terra, na maioria dos casos, pertencia ao rei ou aos 
templos. Um sistema social dessa natureza, em que o indivíduo em 
tudo depende necessariamente de seu empregador, no caso do faraó 
ou dos sacerdotes, implica, dada a ausência de qualquer padrão 
monetário, em enorme contabilidade material. De um lado, para o 
controle da produção no fornecimento de sementes, instrumentos, 
matérias primas, etc.; e, de outro, para a divisão dos bens de 
consumo tais como alimento, roupa, etc., entre os diversos membros 
das comunidades artesanais ou agrícolas. Competia ao escriba 
repartir os recursos acumulados nos celeiros do estado ou dos 
templos e daí a importância dos problemas de partições 
proporcionais na aritmética. Esse fato também explica o motivo pelo 
qual os escribas permaneceram fiéis ao sistema das frações de 
numerador 1, que facilitava a divisão dos objetos e gêneros 
alimentícios. 
Dividir 7 pães entre 10 homens: deve-se multiplicar 
30
1
3
2
+ por 
10. Resultado 7. 
 
 
 
 
 
 
 
27
 
 
Modo de realizar a operação: 
7
15
1
3
1
1
5
1
15
1
3
1
5
5
1
15
1
3
1
5 8
30
1
10
1
3
2
2 4 
15
1
3
1
1 2
30
1
3
2
 1 
=++++
++−
++
+−
+
 
 
Total: 7 pães; é exatamente isso. (Papiro Rhind, problema 4) 
 
Outros processos aritméticos 
 
Para poder resolver todos os problemas da vida cotidiana, os 
egípcios tiveram de realizar diversas operações aritméticas, tais 
como elevar um número ao quadrado e extrair raízes quadradas. À 
raiz quadrada concedem o nome de “canto”. Esse termo deriva 
claramente da representação de um quadrado cortado em diagonal e 
mostra até que ponto os egípcios mantiveram-se ao nível concreto, 
onde outros povos teriam recorrido à abstração. No Papiro de 
Berlim, há o cálculo correto das raízes quadradas de 
4
1
6 e de 
 ,
16
1
2
1
1 + mas não sabemos se essas extrações foram obtidas 
segundo um processo determinado ou se o escriba chegou ao 
resultado por meras tentativas. 
 As proporções desempenharam um papel essencial na 
aritmética egípcia. 
 
 
 
 
 
 
28
 
 
Progressões Aritmética e Geométrica 
 
Ora, sabe-se que a hierarquia era fortemente acentuada na 
sociedade. A diferença de posição na escala social era marcada pelo 
direito a uma parte considerável em todas as partilhas, daí porque o 
escriba se defronta, frequentemente, com problemas do seguinte 
tipo: 
100 pães para 5 homens, 
7
1
 (da parte) dos 3 primeiros para os 2 
últimos homens. Qual será a diferença entre as partes? (Papiro 
Rhind, problema 40). 
 
Parece que de acordo com a maneira pela qual o escriba o 
resolve, o problema consiste em dividir 100 pães entre 5 homens de 
tal modo que as partes estejam em progressão aritmética e que a 
soma das duas menores seja 
7
1
 da soma das maiores. 
O método empregado não é claro, talvez porque os cálculos 
indicados sejam tentativas sucessivas; entretanto a solução é correta: 
as partes deverão ser de 
6
5
10 20 
6
1
29 
3
1
38 ,,, e ,
3
2
1 números que 
satisfazem as condições do problema. 
Os matemáticos egípcios tinham, portanto, uma idéia confusa, 
sem dúvida, da progressão aritmética. Outro problema 
mostra que conheciam também a progressão geométrica; o seu 
enunciado apresenta-se de maneira algo misteriosa. 
 
Inventário de um patrimônio: 
 7 casas Modo de realizar a operação: 
 49 gatos -1 2801 
 343 camundongos -2 5602 
 2401 espigas de trigo -4 11204 
 16807 alqueires 
 
 Total: 19607 (Papiro Rhind, problema 79) 
 
 
 
 
29
 
 
Parece razoável supor que havia um patrimônio composto de 7 
casas, cada casa possuía 7 gatos, cada gato matava 7 camundongos, 
cada camundongo comia 7 espigas de trigo, cada espiga de trigo 
teria produzido 7 alqueires. Quanto se obteria no conjunto? 
O total contém a soma de tudo o que é mencionado e nada significa 
no nosso entender. Devemos notar que não se chega a esse total pela 
soma dos números da enumeração, mas pela multiplicação de 2801 
por 7; o que nos conduz à soma dos termos da seqüência (7, 49, 343, 
2401, 16807), que é uma progressão geométrica de razão 7. 
 
ÁlgebraÁlgebraÁlgebraÁlgebra 
 
Uma série de problemas cuja finalidade é tão utilitária como a 
daqueles que vimos até agora, indica um conhecimento razoável, por 
parte dos egípcios, de laboriosas técnicas de resolução de equações 
algébricas. 
Nesses problemas são pedidos o que equivale a soluções de 
equações lineares da forma x + ax = b ou x + ax + bx = c onde a, b e 
c são números racionais positivos conhecidos e x é desconhecido. A 
incógnita é chamada de “aha” (palavra egípcia que significa “pilha”, 
“monte”). 
 
Exemplo 1: 
 O problema 24 do Papiro Rhind, pede o valor de aha sabendo-se 
que aha mais um sétimo de aha dá 19. Nas nossas notações seria 
resolver a equação 19
7
=+
x
x . A solução é característica de um 
processo conhecido como “método de falsa posição” ou “regra do 
falso”. Um valor específico, provavelmente falso, é atribuído para 
aha, e as operações indicadas à esquerda do sinal de igualdade são 
efetuadas sobre esse número suposto. O resultado é então 
comparado com o resultado que se pretende, e, usando regra de três, 
chega-se à resposta correta. 
 Nesse exemplo o valor tentado para a incógnita é 7, de 
modo que 87
7
1
7 =+ em vez de 19. 
 
 
 
30
 
 
Como 19
8
1
4
1
28 =++ )( deve-se multiplicar 7 por 
8
1
4
1
2 ++ para 
obter a resposta 
8
1
2
1
16 ++ , isto é, 7 8 
 x 19 
 
 
8
1
4
1
2
8
19
7
++==
x
 ⇒ )(x
8
1
4
1
27 ++= 
 
 Pode-se conferir a resposta verificando que se a 
8
1
2
1
16 ++=x 
somarmos 
7
1
 de x (que é 
8
1
4
1
2 ++ ) de fato obteremos 19. 
Aqui notamos outro passo significativo do desenvolvimento da 
matemática, pois a verificação é um exemplo simples de prova. 
 
Exemplo 2: 
 Instrução para dividir 700 pães entre 4 pessoas, 
3
2
 para uma, 
2
1
 
para a segunda, 
3
1
 para a terceira e 
4
1
 para a quarta. 
Modo de realizar a operação: 
Some ,,,,
4
1
3
1
2
1
3
2
 o que dá .
4
1
2
1
1 ++ 
Divida 1 por 
4
1
21
1 ++ o que dá 
14
1
2
1
+ . 
Agora ache 
14
1
2
1
+ de 700, que é 400. 
Tudo se passa então, como se estivéssemos resolvendo a equação: 
700
4
1
3
1
2
1
3
2
=+++ xxxx pela mesma técnica usada hoje, porém 
de forma retórica. (Papiro Rhind, problema 63) 
 
 
 
 
 
31
 
 
 O estudo dos “problemas aha” levantou a questão de saber se os 
egípcios conheceram a álgebra. Com efeito, esses problemas 
exprimem as nossas equações de primeiro grau, e alguns deles se 
prendem até mesmo a equações do segundo grau. Alguns autores 
não hesitaram em reconhecer o fato. No entanto, é preciso admitir 
que subsistem dúvidas a respeito. 
 Há um exemplo, pelo menos, no Papiro de Berlim que não 
deixa dúvidas. Trata-se de um problema de partilha que não se 
refere a pão ou cerveja ou a qualquer outra coisa do cotidiano. Esse 
problema tem o seguinte enunciado: 
 A soma das áreas de dois quadrados é 100 unidades, sendo que 
a medida de um lado é 
4
3
da medida do outro. Quais são os lados? 
Em notação atual escreveríamos: 
100
16
9
 seja,ou 
4
3
 onde 100 2222 =+==+ xx,xy,yx 
 Na solução que propõe, o escriba não emprega símbolos como x 
ou y. Parte de um número arbitrário 1, por exemplo e, em 
conseqüência, também de 
4
3
. Eleva esses números ao quadrado e 
soma os resultados, ou seja, );
16
9
1( 
16
1
2
1
1 =+ extrai a raiz quadrada 
do total, isto é, .
4
1
1 Procede em seguida à extração da raiz quadrada 
de 100, ou seja, 10, número que representa .x8
4
1
1 Admite-se então 
que o número base, arbitrário, deve ser multiplicado por 8, para se 
obter a solução: 8 x 1 e 8 x 
4
3
, ou 8 e 6, o que é exato. (Papiro de 
Berlim). 
 
GeometriaGeometriaGeometriaGeometria 
 
 No campo da geometria, são propostos problemas dependentes 
do uso de fórmulas numéricas, não abstratas, que não são deduzidas 
 
 
32
 
 
no texto. Tais problemas incluem o cálculo de área de campos 
limitados por linhas retas ou por arcos de circunferência, 
considerando-se no primeiro caso apenas triângulos, retângulos e 
trapézios. Também se estuda o volume do tronco de pirâmide 
quadrática. 
 O clássico problema da “quadratura do círculo” é abordado, 
obtendo-se para o número π a aproximação de ...,16043
81
256
= que, 
comparada com a verdadeira, 3,1415..., representa um resultado 
excelente para a época. 
 Os autores gregos fazem particular menção dos métodos de 
agrimensura usados pelos egípcios, devido às cheias do Nilo que 
destruíam as demarcações. Segundo conta Heródoto, Sesóstris tinha 
dividido as terras em retângulos iguais entre todos os egípcios, de 
modo que todos pagavam o mesmo tributo. Quem perdesse parte de 
sua terra em conseqüência da cheia devia comunicar ao rei, que 
mandava então um inspetor calcular a perda e fazer um desconto 
proporcional no imposto. Foi assim que nasceu a geometria 
(literalmente: medição de terras). 
 
Área do triângulo isósceles 
 
 Calcular a superfície de um campo triangular de 10 côvados de 
altura e 4 côvados de base. 
 
Modo de realizar a operação: 
1 400 
 
2
1
 200 
1 1000 
2 2000 
Resposta: sua superfície é de 2000 
côvados (Papiro Rhind, problema 51) 
 
 
 
 
B C 
C’ B’ A 
 
 
33
 
Área do círculo (Considerado o maior êxito dos egípcios). 
 
 Calcular uma porção de terra circular, cujo diâmetro é de 9 
varas. Qual a sua superfície? 
 Subtrair 1 da nona parte dela. Resta 8; então, multiplicar oito 
vezes oito, resultando 64. A superfície é de 6 kha e 4 setat. 
 
Modo de realizar a operação: 
1 9 
 
9
1
 daquilo 1 
Subtrai daquilo, resta 8 
1 8 
2 16 
4 32 
 8 64 
Resposta: a superfície da terra é de 6kha (escrito 60) e 4 setat 
(Papiro Rhind, problema 50) 
 
 Na verdade, na engenhosa resolução anterior há indícios de que 
para calcular a área do círculo, era usada a fórmula: ,dA
2
9
8





= 
sendo d o diâmetro. Assim, 2
2
81
256
2
9
8
rrA =




= . Logo, 
16043,=π . 
 Essa aproximação de π , obtido empiricamente era muito mais 
exata que o valor 3 utilizado pela maioria dos povos antigos do 
Oriente. 
 
Área de um quadrilátero 
 
 No templo de Horo, em Edfu, foi encontrado inscrições de uma 
fórmula para o cálculo de áreas de quadriláteros, que em notação 
atual é: 
 
 
34
 





 +





 +
=
22
dbca
S , sendo a, b, c, d, os lados do quadrilátero. 
Essa fórmula é muito prática, porém conduz a erros sempre 
que o quadrilátero não tiver a regularidade do quadrado ou do 
retângulo. Para trapézios e losangos, por exemplo, os resultados 
encontrados são bem maiores que os verdadeiros. 
 Portanto, os egípcios sabiam calcular a área do triângulo, de 
quadriláteros e do círculo, bem como o volume de alguns sólidos 
elementares, inclusive o tronco de pirâmide de altura h e bases 
quadradas, com os lados a e b, respectivamente. 
 
)baba(
h
V 22
3
++= (Papiro de Moscou) 
 
 
 
 
 Finalizando, pode-se dizer que a matemática dos egípcios 
apresenta as seguintes características por volta de 2000 a.C.: 
conhecimentos bastante desenvolvidos sobre as operações com 
números inteiros e frações, um método para resolver equações do 
primeiro grau com uma incógnita, diversas fórmulas, tanto exatas 
como aproximadas, para a área de figuras planas e sólidos 
elementares e, ainda, um método aproximado para calcular a área de 
um círculo de raio determinado. 
 
 
ExercíciosExercíciosExercíciosExercícios 
 
1. Quais são as três mais importantes contribuições do Egito ao 
desenvolvimento da matemática? Explique porque as considera 
importantes. 
 
2. Explique quais são as três mais importantes deficiências da 
matemática egípcia. 
 
3. Escreva o número 7654 em forma hieroglífica egípcia. 
 
 
a 
 
 
35
 
4. Resolva pelo método da falsa posição a equação 16
2
=+
x
x 
(Problema 25 do Papiro Rhind). 
 
5. Encontre 101 : 16, exprimindo o resultado em hieróglifos 
egípcios. 
 
6. Até que ponto é correto dizer que os egípcios conheciam a área do 
círculo? 
 
7. Exprima 
103
2
 como soma de duas frações unitárias diferentes e 
escreva-as em notação hieroglífica. 
 
 
8. Por que você acha que os egípcios preferiam a decomposição 
30
1
10
1
15
2
+= à alternativa 
20
1
12
1
15
2
+= ? 
 
9. Mostre que se n é um múltiplo de três, 
n
2
 pode ser decomposto na 
soma de duas frações unitárias, uma sendo a metade de 
n
1
. 
 
10. Mostre que se n é um múltiplo de 5, 
n
2
 pode ser decomposto na 
soma de duas frações unitárias, uma sendo um terço de 
n
1
. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
36
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
37
 
 
MESOPOTÂMIAMESOPOTÂMIAMESOPOTÂMIAMESOPOTÂMIA 
 
 
Admira, meu filho, a sabedoria divina que fez o rio passar bem perto da 
cidade! (autor desconhecido) 
 
 
 A Mesopotâmia, a terra “Entre os Rios”, ocupa a área aluvial 
plana entre o Tigre e o Eufrates, onde hoje se situa o Iraque. Entre a 
atual Bagdá e o golfo Pérsico, a terra se inclina suavemente, 
originando uma diferença de altura total de apenas dez metros; 
assim os rios correm vagarosamente, depositando grandes 
quantidades de sedimentos, inundando suas margens e mudando 
ligeiramente de curso, de tempos em tempos. No extremo sul, há 
pântanos e brejos de juncos. O suprimento de água é irregular e a 
precipitação pluvial, pequena. Desse modo o cultivo deve ser feito 
próximo aos rios ou apoiado pela irrigação. Ao norte o solo das 
planícies é compacto e impróprio para as culturas durante oito meses 
do ano. 
 Embora não tivesse uma área própria para a cultura, como o 
Egito, possuía um enorme suprimento de matérias primas, produtos 
 
 
 
 
38
 
 
agrícolas, incluindo animais, peixes e tamareiras, e desde cedo 
surgiu a indústria de juncos, que fornecia produtos de fibra da 
planta, assim como os próprios juncos. Além disso, há fontes de 
betume e pedra calcária a oeste,mas não há madeira, exceto o tipo 
inferior obtido das tamareiras, apropriado apenas para confecção de 
vigas toscas, do mesmo modo não existem pedras duras, havendo 
ainda pouco metal. 
 Durante toda a sua história, a Mesopotâmia vivia praticamente 
do comércio; particularmente, a parte sul se tornou um vasto 
mercado e um centro de troca e disseminação de idéias. 
 A civilização mesopotâmia, bem antes dos árabes atuais, se 
formou literalmente de uma mistura de povos. Sumérios, acádios, 
amoritas, assírios, hititas, caldeus, medos e babilônios. A 
Mesopotâmia é tida como vale turbulento e isso pode ser 
confirmado quer pelos grandes degelos imprevisíveis (nas 
montanhas da Síria e Turquia) que provocam cheias nos rios, quer 
pelas lutas constantes pelo poder entre esses povos. 
 Temos assim, a Mesopotâmia como uma região 
economicamente próspera e militarmente organizada, que possuía 
uma agricultura avançada, bem como um sistema de captação de 
impostos que financiava a expansão de uma cultura sofisticada para 
os padrões da época. Foi nessa região, que por volta de 3500 a.C. 
nasceu a escrita, invenção dos sumérios, caracterizada por marcas 
cuneiformes em placas de argila (mais ou menos 30 x 50 cm) 
cozidas ao sol. Milhares dessas placas, hoje conservadas em museus 
norte americanos e europeus, traduzidas, revelaram a existência de 
uma matemática original e de medidas sistemáticas do tempo. 
 O conhecimento das estações do ano foi fundamental para o 
desenvolvimento da agricultura. O ano mesopotâmio, em 2000 a.C., 
tinha 360 dias, divididos em doze meses. Relógios solares 
assinalavam a passagem do tempo e o dia já era dividido em horas, 
minutos e segundos. Com a observação do movimento aparente do 
Sol e dos planetas entre as estrelas fixas foram nomeados os sete 
dias da semana com os nomes do Sol, da Lua e dos outros cinco 
planetas conhecidos (Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno). 
Foi traçada, também, a trajetória percorrida pelo Sol, dividindo-a em 
doze partes associadas a animais míticos e denominadas de signos 
do zodíaco. 
 
 
39
 
 
 O Universo era representado como uma caixa fechada, cujo 
fundo era a Terra. Observações de muitos fenômenos astronômicos, 
como eclipses do Sol e da Lua e as posições de Vênus, estão 
registradas em placas de argila. Com essas observações os 
astrólogos mesopotâmios tiveram muito sucesso na interpretação de 
sonhos e na prática de realizar previsões. 
 Devemos destacar que os povos que viveram na “terra entre 
dois rios” deixaram uma ciência prática, sem a preocupação de 
fundamentar metafísica ou teologicamente os fatos. 
 
A MATEMÁTICA MESOPOTÂMIA 
 
 O que se sabe sobre a matemática mesopotâmia é relativamente 
recente. Data, na realidade, dos trabalhos de Otto Neugebauer (1899 
– 1990) que por volta de 1930 liderou as pesquisas em Princeton, 
realizando um estudo exaustivo em cerca de dez mil placas de 
argila, buscando reconstruir os conceitos aritméticos e geométricos 
daquela civilização, por volta de 2000 a.C. 
 De um modo geral, os textos matemáticos mesopotâmios 
(grande parte de matemática financeira) podem ser classificados em 
duas categorias: as tábuas numéricas e as de problemas. As 
primeiras quase não diferem das tábuas modernas e as outras são 
coletâneas didáticas de exercícios. 
 Nos textos de caráter geométrico é freqüente a presença de 
figuras, muitas vezes acompanhadas de uma legenda numérica. São 
figuras simples que servem apenas para ilustrar o enunciado, nunca 
interferem na solução, e, geralmente, não eram respeitadas as 
proporções. Dessa forma podemos dizer que os mesopotâmios 
souberam calcular “corretamente” com figuras falsas. 
 
Aritmética 
 
 Por volta do ano 2000 a. C. era usado pelos mesopotâmios uma 
combinação de dois sistemas de numeração, um de base dez e o 
outro posicional de base sessenta e, sem dúvidas, essas 
características originais não foram encontradas em qualquer outro 
 
 
 
40
 
 
sistema de numeração da antiguidade. Como exemplo escrevemos o 
número: 
3904 = 4 + 9.10² + 3.10³ na base 10 e 3904 = 1.60² + 5.60 + 4 na 
base 60. 
 Os números inteiros positivos eram expressos, em geral, 
mediante o emprego de dois sinais básicos: = 1 e = 10. 
 
 De 1 a 59, os números são expressos pela repetição dos sinais 
correspondentes a 1 e 10, sendo as unidades precedidas pelas 
dezenas. 
Exemplos: 
 
 2 11 20 
 
 
 60 
 
 
 
 = 520 = 8.60 + 40 
 
 
 = 2 + 2. 60 + 2.60² ou 1 + 1.60 + 1.60² + 
+1.60³ + 2.604 ou 2.60-1 + 2 + 2.60. 
 Muitas vezes o contexto eliminava a ambigüidade e, a falta de 
um símbolo para o zero, deve ter sido muito inconveniente. Tanto 
que no período selêucida, ao tempo de Alexandre, melhoraram a 
notação adotando duas cunhas inclinadas para sua representação. 
 Atualmente para escrevermos números na base 60 com os 
nossos numerais, utilizamos a seguinte notação: 
2,31,8 = 8 + 31.60 + 2.60² 
0;4,6 = 0 + 4.60-1 + 6.60-2 
2,14;5,7 = 14 + 2.60 + 5.60-1 + 7.60-2 
 
Operações 
 
 As operações eram realizadas da mesma maneira que fazemos 
hoje. 
 59 
 
 
41
 
 
 Na subtração usavam a idéia de “chegar”: 16 para chegar no 40 
é 24. 
 Na multiplicação e divisão utilizavam tabelas auxiliares. Por 
exemplo, para se calcular 
15
8
, multiplicava-se por 8 o valor que 
constava na tabela para 
15
1
. 
 Havia tabelas também para recíprocos, quadrados, cubos, raízes 
quadradas e cúbicas. 
Exemplo de uma tabela de recíprocos: 
 
2 30 
3 20 
4 15 
5 12 
6 10 
8 7;30 
9 6;40 
10 6 
12 5 
 
 Nessa tabela, notamos a ausência dos recíprocos de 7 e 11, 
porque são sexagesimais infinitos, que chamavam de irregulares. 
 
Juros compostos 
 
 Tabelas de potências sucessivas de um dado número, 
semelhantes as nossas de logaritmos, eram utilizadas para resolver 
questões específicas, como por exemplo, temos o problema a seguir, 
resolvido por interpolação. 
 
 Quanto tempo levaria uma quantia em dinheiro para dobrar, a 
20% ao ano? A resposta dada é 3;47,13,20. 
 
 Parece que o escriba aplicou interpolação linear entre os valores 
(1;12)³ e (1;12)4, usando a fórmula para juros compostos 
 
 
 
42
 
 
n)r(CC += 10 em que r = 20% ou 12.60-1, e C0 é a quantia 
inicial colocada a juros, usando valores de uma tabela exponencial 
com potências de 1;12. 
 
Raiz quadrada 
 
 Os matemáticos mesopotâmios foram hábeis no 
desenvolvimento de processos algorítmicos, entre os quais um para 
extrair raiz quadrada, que descreveremos a seguir. 
 
Algoritmo para a , sendo a um número inteiro positivo. 
 Sejam a1 uma primeira aproximação dessa raiz e 
1
1 a
a
b = (se 
a1 é por falta, b1 é por excesso e vice-versa). Logo a média 
aritmética a2 = 
2
1
 (a1 + b1) = )
a
a
a(
1
12
1
+ é uma nova aproximação 
plausível. A seguir, avaliamos 
2
2 a
a
b = e a média aritmética 
)
a
a
a()ba(a
2
2223 2
1
2
1
+=+= para obtermos um resultado 
melhor. O processo pode ser continuado indefinidamente. 
 
Exemplo: calcular 17 
 
Modo de realizar a operação: 
 
a = 17, a1 = 4, 4² = 16 
Logo b1 = 
4
17
 e a2 = .,)( 1254
4
17
4
2
1
=+ 
A seguir, b2 = 
1254
17
,
 = 4,1212 e a3 = )
,
,(
1254
17
1254
2
1
+ = 4,1231 
Assim 17 ≅ a3 
 
 
 
 
43
 
 
 Com esse método, os mesopotâmios encontraram 2 como 
1,414222 que é uma ótima aproximação. Aliás tinham facilidade em 
aproximações, talvez pela notação posicional para frações que foi a 
melhor até a Renascença. 
 
Álgebra 
 
 De uma forma discursiva, com poucos símbolos para as 
incógnitas, os mesopotâmios sabiam resolver, sem o uso de 
fórmulas, a equação do primeiro grau, sistemas lineares com duas 
incógnitas, equação do segundo grau, sistemas do segundo grau com 
duas incógnitas e equações biquadradas. 
 
Sistemas lineares 
 




=+
=+10
7
4
1
yx
yx
 
y
x
→=−
→=
=−
=
 4 6 10 
 6 3:18 
18 10 28 
28 4.7 :Solução
 
 
Equação do 2º grau 
 
 Para o egípcios era muito difícil resolver equações do tipo x² - 
px = q, mas os mesopotâmios resolviam seguindo uma receita. 
 Problema: Qual o lado de um quadrado tal que a área menos o 
lado perfaz 14,30? 
 A solução desse problema equivale a resolver x² - x = 870 (base 
10) ou x² - x = 14,30 (base 60). 
 Solução: x² = 1.x + 14,30 
 Tome a metade de 1, que é 0;30 e multiplique 0;30 por 0;30, o 
que dá 0;15. Some isto a 14,30, o que dá 10,30;15 que é o quadrado 
de 29;30. Agora some 0;30 a 29;30 e o resultado é 30, o lado do 
quadrado. 
 A solução equivale exatamente à fórmula 
22
2 p
q)
p
(x ++= 
para uma raiz da equação x² - px = q. 
 No final de cada solução, escreviam “este é o procedimento”. 
 
 
44
 
 
Transformações algébricas 
 
 Muitas vezes usavam transformações algébricas, algo avançado 
para a época. Assim dada a equação 11x² + 7x = 6;15, procurava-se 
chegar no tipo padrão x² - px = q e para isso, multiplicando por 11 
ambos os membros de 11x² + 7x = 6;15 temos: 
 (11x)² + 11.7x = 11.6;15 = 1;18;45 
 Fazendo y = 11x, temos y² + 7y = 1;18;45 que pode ser 
resolvida pela fórmula 
22
2 p
q)
p
(y ++= e depois se calcula o 
valor de x. 
 Sabiam também passar da equação ax4 + bx² = c para ay² + by 
= c. 
 Resolviam uma equação do 2º grau com duas incógnitas, como 
por exemplo 




=
=+
yx
,yx
7
1
152122
 
 
Equações cúbicas 
 
 Não há registro no Egito de resolução de uma equação cúbica, 
mas entre os mesopotâmios há muitos exemplos. Cúbicas puras 
como x³ = 0;7,30 eram resolvidas por tabelas de cubos e raízes 
cúbicas, e a solução era 0;30. Para melhor aproximar resultados 
usavam frequentemente interpolação linear. 
 Com a tabela de inteiros n³ + n² resolviam cúbicas como x³ + x² 
= a. Por exemplo verifica-se que x³ + x² = 4,12 tem solução 6. 
 Resolviam também, cúbicas do tipo 144x³ + 12x² = 21. 
Multiplicavam por 12, os dois membros e, fazendo y = 12x a 
equação tornava-se y³ + y² = 4,12, da qual se encontrava y = 6, e 
finalmente x = 1/2 ou 0;30. 
É possível até que tenham resolvido cúbicas completas: ax³ + bx² + 
cx = d. 
 
 
 
 
 
45
 
Teoria dos NúmerosTeoria dos NúmerosTeoria dos NúmerosTeoria dos Números 
 
 O desenvolvimento da matemática mesopotâmia teve o seu 
apogeu por volta de 1800 a.C. Ao contrário de outros povos, deram-
se ao luxo de formular problemas matemáticos de características 
eminentemente especulativas. Na placa de argila 322 da Coleção 
Plimpton da Universidade de Columbia, Nova York, estudada por 
Neugebauer em 1945, temos uma tabela com 15 linhas por 4 
colunas, sendo que 3 delas, após um ajuste nos cálculos, estão 
relacionadas entre si como as conhecidas ternas pitagóricas. Na 
linha 4, por exemplo, encontramos a = 3,31,49; b = 3,45,0 e 
c = 5,9,1 que satisfazem a relação a² + b² = c², em que a, b, c são 
lados de um triângulo retângulo. Assim, aproximadamente, mil anos 
antes de Pitágoras nascer, já era conhecido entre os rios Tigre e 
Eufrates o famoso teorema atribuído ao sábio grego. 
 Outro documento, provavelmente do tempo dos Caldeus, 
apresenta identidades interessantes: 1 + 2 + 2² +...+ 29 = 210 – 1 e 
1² + 2² + ... + 10² = )...)(( 1021
3
20
3
1
++++= . 
GeometriaGeometriaGeometriaGeometria 
 
 A geometria mesopotâmia, como a dos egípcios, é 
extremamente pobre quando comparada a dos gregos. Não havia 
definições e teoremas; era essencialmente uma álgebra aplicada e 
figuras. Limitava-se ao cálculo da diagonal do quadrado, altura do 
triângulo eqüilátero, áreas de triângulos, retângulos e trapézios, bem 
como aproximação da área do círculo, que conheciam como sendo o 
quadrado do comprimento da circunferência dividido por 12. 
Conheciam, portanto, o valor de π como sendo 3. 
 
 
 
46
 
 
 Na placa Plimpton 355 destacam-se números que muito se 
aproximam da tangente e secante de alguns ângulos, embora, sabe-
se hoje, não conhecessem a trigonometria. Analisando a Plimpton 
470, destaca-se o cálculo aproximado do volume do tronco de cone, 
cilindro e pirâmide, quando esses resultados eram aplicados às suas 
construções, bem como ao comércio de ouro e prata. Curioso é que 
não sabiam calcular o volume da esfera, ou melhor, as aproximações 
que fizeram foram extremamente grosseiras. 
 
ExercíciosExercíciosExercíciosExercícios 
 
1. Quais são as mais importantes contribuições da Mesopotâmia ao 
desenvolvimento da matemática? Explique porque as considera 
importantes. 
 
2. Quais são as deficiências da matemática mesopotâmia? Explique. 
 
3. Descreva as vantagens e desvantagens relativas as notações dos 
mesopotâmios para os números, 
 
4. Escreva os números 10000 e 0,0862 em notação mesopotâmia. 
 
5. Use o algoritmo mesopotâmio para raiz quadrada para encontrar a 
raiz quadrada de 2, com seis casas decimais e compare com o valor 
mesopotâmio 1;24,51,10. 
 
6. Mostre que a representação sexagesimal de 1/7 tem periodicidade 
de três casas. Quantas casas há na periodicidade em representação 
decimal? 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
47
 
 
GRÉCIAGRÉCIAGRÉCIAGRÉCIA 
 
 
“Em matemática todos os caminhos levam à Grécia” (Thomas Heath) 
 
 
 A chegada dos dórios, no século XII a.C., às circunvizinhanças 
do mar Egeu, constitui momento decisivo na formação do povo e da 
cultura grega. Na península e nas ilhas – cenário natural da Grécia 
em gestação – está então instalada a civilização micênica ou 
aqueana, que se desenvolvera em estreita ligação com a civilização 
cretense e em contato com povos orientais. 
 A sociedade micênica apresenta-se composta por grande 
número de famílias principescas, que reinam sobre pequenas 
comunidades. Essa pluralidade, decorrente da originária divisão em 
clãs, é fortalecida pelas próprias características físicas da região: o 
relevo, compartimentando o território, torna alguns locais mais 
facilmente interligáveis através do mar. 
 Assim, muito antes que as condições geográficas contribuam 
para que as cidades-estados venham a se desenvolver como unidades 
autônomas, já são motivo para que, desde suas raízes micênicas, a 
cultura grega se constitua voltada para o mar: via de comunicação e 
de comércio com outros povos, de intercâmbio e de confronto com 
outras civilizações. 
 
 
48
 
 
 Chegando em bandos sucessivos, vindos do norte, os dórios 
dominam a região. Embora da mesma raiz étnica dos aqueus, 
apresentam índice civilizatório mais baixo. Possuem, porém, uma 
incontestável superioridade: o uso de utensílios e armas de ferro, 
fator decisivo para a vitória sobre os micênicos que permaneciam na 
Idade do Bronze. 
 As invasões dóricas acarretam migrações de grupos de aqueus, 
que se transferem para as ilhas e as costas da Ásia Menor (Turquia) 
e ali fundam colônias, tentando preservar suas tradições, suas 
instituições e sua organização social de cunho patriarcal e gentílico. 
 As novas condições de vida das colônias e a nova mentalidade 
delas decorrentes encontram sua primeira expressão através das 
epopéias: em poesia o homem grego canta o declínio das arcaicas 
formas de viver ou pensar, enquanto prepara o futuro advento da era 
científica e filosófica que a Grécia conhecerá a partir do século VI 
a.C. 
 Resultantes da fusão de lendas eólias e jônicas, as epopéias 
incorporaram relatos mais ou menos fabulosos sobre expedições 
marítimas e elementos provenientes do contato do mundo helênico, 
em sua fase de formação, com culturas orientais. A língua desses 
primeiros poemas da literatura ocidental é uma mistura dos dialetos 
eólio e jônico, com predominância do último. Entremeando lendas e 
ocorrências históricas – relatando particularmente os acontecimentos 
referentes à derrocada da sociedade micênica – surgem então cantos 
e sagas que os aedos (poetas e declamadores ambulantes) 
continuamente foramenriquecendo. Constituídos por seqüências de 
episódios relativos a um mesmo evento ou a um mesmo herói, 
surgem, assim, “ciclos” que cantam principalmente as duas guerras 
de Tebas e a Guerra de Tróia. Desses numerosos poemas, apenas 
dois se conservaram: a Ilíada e a Odisséia de Homero, escritos entre 
os séculos X e VIII a.C. 
 
HOMERO HOMERO HOMERO HOMERO (século X a.C.) 
 
 Da vida de Homero praticamente nada se sabe com segurança, 
embora dados semilendários sobre ele fossem transmitidos desde a 
antiguidade. Sete cidades gregas reivindicam a honra de ter sido sua 
terra natal. Homero é frequentemente descrito como velho e cego, 
 
 
49
 
 
perambulando de cidade em cidade, a declamar seus versos. 
Chegou-se mesmo a duvidar de sua existência e de que a Ilíada e a 
Odisséia fossem obra de uma só pessoa. Poderiam ser coletâneas de 
contos populares de antigos aedos e, ainda que tenha existido um 
poeta chamado Homero que realizou a compilação desse material e 
enriqueceu com contribuições próprias, o certo é que essas obras 
contêm passagens procedentes de épocas diversas. 
 Além de informar sobre a organização da polis arcaica, as 
epopéias homéricas são a primeira expressão documentada da visão 
mitopoética dos gregos. A intervenção benéfica ou maléfica dos 
deuses está no âmago da psicologia dos heróis de Homero e 
comanda suas ações. Com efeito, a Ilíada e a Odisséia apresentam-
se marcadas pela presença constante de poderes superiores que 
interferem na luta entre gregos e troianos (tema da Ilíada) e nas 
aventuras de Ulisses ou Odisseu (tema da Odisséia). 
 Nas epopéias homéricas, mesmo quando representam forças da 
natureza, os deuses revestem-se de forma humana; esse 
antropomorfismo atribui-lhes aspecto familiar e até certo ponto 
inteligível, afastando os terrores relativos a forças obscuras e 
incontroláveis. Sobrepondo-se a arcaicas formas de religiosidade, 
Homero exclui do Olimpo, mundo dos deuses, as formas 
monstruosas da mesma maneira que exclui do culto as práticas 
mágicas. 
 A racionalização do divino conduz a uma religiosidade 
“exterior”, que mais convém ao público a que se dirigem as 
epopéias: à polis aristocrática. 
 Essa religiosidade “apolínea” permanecerá como uma das 
linhas fundamentais da religião grega: a do sentido político que 
servirá para justificar as tradições e instituições da cidade-estado. 
 É por oposição aos homens que os deuses homéricos se 
definem: ao contrário dos humanos, seres terrenos, os deuses são 
princípios celestes; à diferença dos mortais, escapam à velhice e à 
morte. Escapam à morte, mas não são eternos nem estão fora do 
tempo: em princípio pode-se saber de quem cada divindade é filho 
ou filha. A imortalidade, esta sim, está indissoluvelmente ligada aos 
deuses que, por oposição aos humanos mortais, são frequentemente 
designados de “os imortais” e constituem, na sua organização e em 
seu comportamento, uma sociedade imortal de nobres celestes. 
 
 
50
 
 
 Em Homero, a noção de virtude (areté) significava o mais alto 
ideal cavalheiresco aliado a uma conduta cortesã e ao heroísmo 
guerreiro. Identificada a atributos da nobreza, a areté, em seu mais 
amplo sentido, designava não apenas a excelência humana, como 
também a superioridade de seres não-humanos, como a força dos 
deuses ou a rapidez dos cavalos nobres. Em geral, a virtude 
significava força e destreza dos guerreiros ou dos lutadores, valor 
heróico intimamente vinculado à força física. A virtude em Homero 
é, portanto, atributo dos nobres, os aristoi; uma minoria que se eleva 
acima da multidão de homens comuns. 
 
HESÍODOHESÍODOHESÍODOHESÍODO (século VIII a.C.) 
 
 O complexo processo de formação do povo e da cultura grega 
determinou o aparecimento dentro do mundo helênico, de áreas 
bastante diferenciadas, não só quanto às atividades econômicas e às 
instituições políticas, mas também quanto à própria mentalidade e 
suas manifestações nos campos da arte, da religião, do pensamento. 
À Grécia Continental, mais presa às tradições da polis arcaica, 
contrapunham-se as colônias da Ásia Menor, situadas em regiões 
mais distantes pelo intercâmbio comercial e cultural com outros 
povos. Da Jônia surgem as epopéias homéricas e, a partir do século 
VI a.C., as primeiras formulações filosóficas e científicas dos 
pensadores de Mileto, de Samos, de Éfeso. Entre esses dois 
momentos de manifestação do processo de racionalização da cultura 
grega, situa-se a obra poética de Hesíodo – voz que se eleva da 
Grécia Continental – conjugando as conquistas da nova mentalidade 
surgida nas colônias da Ásia Menor com os temas extraídos de sua 
gente e de sua terra. 
 Hesíodo foi um mestre da poesia instrutiva; viveu em Ascra, na 
Beócia, e é exaltado agora por seus dois poemas, A Teogonia e Os 
trabalhos e os dias. O primeiro pode ser chamado de genealogia dos 
deuses. Os trabalhos e os dias referem-se, basicamente, a regras de 
agricultura e navegação, embora também forneça um calendário de 
dias felizes e infelizes e ofereça uma homilia moral. 
 Com Hesíodo dá-se a aparição do subjetivo na literatura. Na 
épica mais antiga, o poeta era o simples veículo anônimo das Musas; 
já Hesíodo “assina” sua obra para fazer história pessoal. 
 
 
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 Tomando como ponto de partida velhos mitos, que coordena e 
enriquece, Hesíodo traça uma genealogia sistemática das divindades. 
O drama teogônico tem início, com a apresentação das entidades 
primordiais. Adotando implicitamente o postulado de que tudo tem 
origem, Hesíodo mostra que primeiro teve origem o Caos – abismo 
sem fundo – e, em seguida, a Terra e o Amor (Eros), “criador de 
toda a vida”. 
 As duras condições de trabalho de sua gente sugerem assim a 
Hesíodo uma visão pessimista da humanidade, perseguida pela 
animosidade dos deuses. E a mulher deixa de ser exaltada, como na 
visão aristocrática de Homero, para ser caracterizada, por esse 
camponês, como mais uma boca a alimentar e a exigir sacrifícios; 
“Raça maldita de mulheres, terrível flagelo instalado no meio dos 
homens mortais”. 
 Do mesmo modo que o mito de Prometeu ilustra a idéia de 
trabalho, o mito das Idades (de ouro, prata, bronze e ferro) ilustra a 
idéia de justiça; nenhum homem pode furtar-se à lei do trabalho, 
assim como evitar a justiça. Com Hesíodo surge a noção de que a 
virtude (areté) é filha do esforço e a de que o trabalho é o 
fundamento e a salvaguarda da justiça. 
 
 
A MATEMÁTICA GREGAA MATEMÁTICA GREGAA MATEMÁTICA GREGAA MATEMÁTICA GREGA 
 
 Hoje nos referimos à matemática grega, de forma inadequada, 
como um corpo de doutrina homogêneo e bem definido. Na verdade 
com essa visão simplista adotamos que a geometria sofisticada do 
tipo Euclides – Arquimedes – Apolônio, era a única espécie que os 
gregos conheciam. Devemos lembrar que a matemática no mundo 
grego cobriu um intervalo de tempo indo pelo menos de 600 a.C. a 
600 d,C. e que viajou da Jônia à ponta da Itália, de Atenas a 
Alexandria, e a outras partes do mundo civilizado. Bastam os 
intervalos de tempo e espaço para produzir modificações na 
profundidade e extensão da atividade matemática e, a ciência grega 
não tinha a uniformidade, século após século, encontrada nos 
egípcios e mesopotâmios. Além disso, mesmo num dado tempo e 
lugar (como hoje em nossa civilização) havia marcadas diferenças 
no nível de interesse e realização matemática. Veremos como até na 
 
 
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obra de um único indivíduo, como Ptolomeu, poderia haver dois 
tipos de estudos – O Almajesto para os racionalistas e o Tetrabiblos 
para os místicos. É provável que sempre houvesse pelo menos dois 
níveis de percepção matemática, mas que a escassez de obras 
preservadas, especialmente do nível inferior, tenda a obscurecer esse 
fato. 
 
Períodos da História da Matemática GregaPeríodos da História da Matemática GregaPeríodos da História da Matemática GregaPeríodos da História da Matemática Grega 
 
 Não houve, é claro, uma quebra brusca marcando a transição da 
liderança intelectual dos vales

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