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VIOLÊNCIA NAS RELAÇÕES 6

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AULA 6 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
VIOLÊNCIA NAS RELAÇÕES 
INTERPESSOAIS E SOCIAIS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Prof.ª Andressa Ignácio da Silva 
 
 
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INTRODUÇÃO 
O bullying é uma forma de violência que começou a ser estudada na Suécia 
na década de 1970. No Brasil, o assunto passou a ser tema de pesquisas 
acadêmicas de forma mais sistemática a partir do ano 2000. A ocorrência do 
bullying tem sido objeto de grande discussão, bem como de preocupação por 
parte de familiares, educadores e gestores. 
Nesta aula, abordaremos os aspectos conceituais das características e 
formas de bullying e agentes envolvidos nessa prática, bem como os principais 
efeitos desse fenômeno sobre os indivíduos envolvidos e seu impacto nas 
relações no ambiente escolar. Também apresentaremos algumas reflexões sobre 
o enfrentamento do bullying com base na educação para os direitos humanos. 
TEMA 1 – BULLYING – ASPECTOS CONCEITUAIS 
A compreensão do fenômeno do bullying e sua ocorrência no ambiente 
escolar pressupõe analisá-lo em relação a fenômenos sociais mais amplos, como 
a violência social e intrafamiliar. Nesse sentido, é possível compreender tais 
correlações partindo-se da definição desse fenômeno e suas características. 
Como fenômeno complexo, o bullying é objeto de múltiplas abordagens e 
perspectivas por parte de pesquisadores de diferentes áreas: educação, 
psicologia, sociologia, direito, entre outras. Além disso, o bullying tem sido tema 
de grande repercussão midiática, mobilizando a opinião pública. 
O bullying pode ser compreendido como uma manifestação da violência no 
ambiente escolar, a qual está relacionada à violência em outras esferas da 
sociedade. Uma das definições desse fenômeno (Campos; Jorge, 2010, p. 107) 
aponta que: 
O bullying envolve todas as atitudes agressivas, intencionais e 
repetitivas – adotadas por uma ou mais pessoas contra outra – que 
acontecem sem motivação evidente, causando dor e angústia. Quando 
executado na escola, resulta em comprometimento da aprendizagem, da 
vontade de estudar e de todo o ambiente educativo. 
De acordo com Linhares e Martinez (2011), o termo bullying diz respeito à 
prática de atos repetitivos de agressão e violência que intimidam as vítimas. O 
caráter intencional e repetitivo das agressões é uma peculiaridade do bullying. 
A prática de bullying ocorre de diversas maneiras, destacando-se, segundo 
Silva (2010, p. 7), as formas: 
 
 
3 
 verbal (insultar, ofender, falar mal, colocar apelidos pejorativos, 
“zoar”); 
 física e material (bater, empurrar, beliscar, roubar, furtar ou destruir 
pertences da vítima); 
 psicológica e moral (humilhar, excluir, discriminar, chantagear, 
intimidar, difamar); 
 sexual (abusar, violentar, assediar, insinuar); 
 virtual ou cyberbullying (bullying realizado por meio de ferramentas 
tecnológicas: celulares, filmadoras, internet etc.). 
Ainda de acordo com Silva (2009), quanto a sua forma o bullying pode ser 
classificado como bullying físico, quando envolve o uso da força física por parte 
do agressor, ou psicológico, quando o agressor busca atingir a vítima por meio de 
humilhação, constrangimento, rebaixamento, entre outras formas de intimidação. 
Para Aguiar e Barrera (2017), o bullying pode ser classificado ainda em 
direto e indireto. No bullying direto, o agressor ataca a vítima de forma direta e 
presencial. No indireto, a vítima é submetida a exclusão ou isolamento intencional 
por parte de um indivíduo ou grupo. Ainda de acordo com esses autores, o bullying 
direto inclui comportamentos como agressões físicas, abusos sexuais, insultos, 
prejuízos materiais, entre outros. Já o bullying indireto compreende 
comportamentos como fofocas, boatos e intrigas. O cyberbullying, que 
abordaremos adiante, é uma forma de bullying indireto. 
Quanto aos papéis dos envolvidos no bullying, ainda segundo Aguiar e 
Barrera (2017), estes podem ser: autores ou agressores, vítimas ou alvos, alvos-
autores e espectadores ou testemunhas. 
Os “autores” ou “agressores” são aqueles que praticam o bullying, os 
quais foram caracterizados como tendo boa autoestima, serem 
insensíveis aos sentimentos dos outros, serem fortes física e 
emocionalmente, apresentarem fraco controle de impulsos, elevado grau 
de agressividade e desejo de domínio, além de perceberem a violência 
como uma qualidade. (Aguiar; Barrera, 2017, p. 671) 
As vítimas ou alvos são aqueles que são expostos à ação dos 
agressores/autores. Os alvos-autores são indivíduos que sofrem agressões e 
também têm comportamentos agressivos contra terceiros. Por fim, os 
espectadores ou testemunhas são os indivíduos que presenciam as agressões. 
Lopes Neto (2005) classifica os espectadores como: 
 espectadores auxiliares – participam ativamente da agressão; 
 espectadores incentivadores – estimulam as agressões; 
 espectadores observadores – apenas observam ou se afastam das 
situações de agressão; 
 
 
4 
 espectadores defensores – intervêm, defendem as vítimas ou interrompem 
as agressões. 
As diferentes manifestações do bullying e seus efeitos sobre a convivência 
no ambiente escolar são temas centrais para famílias, profissionais da educação, 
gestores públicos, profissionais da saúde, entre outros, e seu enfrentamento 
demanda atuação conjunta e multidisciplinar. 
TEMA 2 – BULLYING E VIOLÊNCIA NO ESPAÇO ESCOLAR 
A escola é uma instituição de fundamental importância no processo de 
socialização. Este pode ser definido, conforme abordamos anteriormente, como 
um conjunto de processos sociais pelos quais novos membros da sociedade 
tomam ciência das normas e dos valores sociais, o que contribui para que 
adquiram um senso distinto de si próprios (Giddens, 2017, p. 208). Ainda de 
acordo com esse autor, a socialização transforma a criança, capacitando-a para 
a vida em sociedade. 
De acordo com Bandeira e Hutz (2012), além do processo de 
aprendizagem e do desenvolvimento cognitivo, a escola possibilita a convivência 
com as diferenças, na medida em que, nesse espaço, crianças e adolescentes 
terão contato com um grupo mais amplo e diverso do que seu grupo familiar de 
origem. Nesse sentido, pode-se afirmar que a escola é um espaço multicultural; 
nos termos propostos por Hall (2003, p. 52): 
o termo multicultural é qualificativo, relacionado a características sociais 
e problemas de governabilidade em qualquer sociedade na qual 
convivem diferentes comunidades culturais, enquanto o termo 
multiculturalismo é substantivo, referindo-se a estratégias e políticas 
adotadas para governar ou administrar problemas de diversidade 
gerados pelas sociedades multiculturais. 
O ambiente escolar é marcado ainda por relações de hierarquia, controle e 
poder. A violência escolar e o bullying emergem nesse contexto perpassado por 
múltiplos fatores sociais e em que ocorrem diversas interações. 
A violência escolar e o bullying são fenômenos relacionados, porém 
conceitualmente distintos, visto que o “termo violência escolar se refere a todos 
os comportamentos agressivos e antissociais, incluindo conflitos interpessoais, 
danos ao patrimônio e atos criminosos” (Bandeira; Kutz, 2012, p.37), e o bullying 
é uma das manifestações da violência escolar que, como dissemos anteriormente, 
tem como característica o caráter intencional e repetitivo das agressões. 
 
 
5 
As diferentes formas de violência escolar, bem como o bullying, têm efeitos 
significativos sobre os indivíduos envolvidos. Segundo Marcolino et al. (2018), as 
vítimas são indivíduos com características socialmente discriminadas que se 
tornam alvo dos agressores. As agressões sofridas podem gerar: 
instabilidade emocional, tendência a transtornos psíquicos, depressão, 
suicídio; tristeza relacionada ao ambiente escolar desencadeando baixo 
rendimento de aprendizagem e até abandono, com consequente, 
redução da qualidade de vida desses adolescentes. (Marcolino et al., 
2018, p. 7) 
Aindasegundo Marcolino et al. (2018), os agressores, por sua vez, 
apresentam instabilidade emocional e dificuldades de relacionamento. A 
ocorrência de agressões e a não intervenção em comportamentos agressivos 
favorecem a naturalização da violência. Os agressores também podem 
apresentar, de acordo com Lopes Neto (2005), maior risco para consumo de álcool 
e drogas. Nesse sentido, o autor destaca a necessidade de atuação profissional 
que contemple vítimas e agressores. 
O tratamento indicado para o autor de bullying deve ser o de habilitá-lo 
para que controle sua irritabilidade, expresse sua raiva e frustração de 
forma apropriada, seja responsável por suas ações e aceite as 
consequências de seus atos. Portanto, aqueles pacientes que relatarem 
situações em que protagonizam ações agressivas contra seus colegas 
merecem atenção, tanto quanto os que são por eles agredidos. (Lopes 
Neto, 2005, p. 169) 
No que diz respeito à aprendizagem, estudo conduzido por Santos, 
Perkoski e Kienen (2015) indica que professores observam dificuldades de 
concentração e falta de motivação entre estudantes vítimas de bullying. Segundo 
Zequinão et al. (2017), o bullying pode ainda gerar reprovações, abandono e 
indisciplina. Esses efeitos podem ser observados entre vítimas, agressores e 
espectadores. Os resultados apresentados por Zequinão et al. (2017) apontam 
ainda que vítimas, agressores e espectadores de bullying apresentaram pior 
desempenho em testes de escrita, leitura e aritmética. 
Como dissemos anteriormente, a violência escolar e o bullying são 
fenômenos complexos que se relacionam a aspectos pessoais, familiares e 
sociais. Os estudos reforçam que o bullying no ambiente escolar está relacionado 
à violência social e intrafamiliar, ou seja, pode ser compreendido como parte de 
um ciclo vicioso de naturalização e reprodução da violência. 
 
 
 
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TEMA 3 – CIBERBULLYING E SOCIABILIDADE VIOLENTA 
As transformações tecnológicas vivenciadas nas últimas décadas geraram 
alterações profundas em praticamente todas as áreas da vida humana: 
interações, comunicação, processos de aprendizagem, relacionamentos, entre 
outras. 
Tais transformações tecnológicas possibilitam a consolidação de uma nova 
esfera de interação: o ciberespaço. De acordo com Silva, Teixeira e Freitas (2015), 
o ciberespaço pode ser compreendido como um espaço de comunicação aberto 
pela interconexão mundial dos computadores que, pautado por uma nova relação 
homem-máquina, amplia as possibilidades dos seres humanos. 
Entretanto, de acordo com Wendt e Lisboa (2013), a difusão da tecnologia 
e sua utilização trazem consigo novas preocupações, entre as quais o 
cyberbullying que, por definição, compreende o uso de ferramentas tecnológicas 
para assediar, ameaçar, constranger ou humilhar outra pessoa, simular ou tentar 
violar senhas das vítimas (Wendt; Lisboa, 2013, p. 78). 
O cyberbullying pode se manifestar de diferentes formas: ameaça, assédio 
virtual, difamação, violação de identidade e violação de intimidade. Um dos 
aspectos que distinguem o cyberbullying do bullying é a amplitude e a 
continuidade das agressões, tendo em vista que, no caso de agressões no 
ciberespaço, 
Além de a propagação das difamações ser praticamente instantânea o 
efeito multiplicador do sofrimento das vítimas é imensurável. O 
cyberbullying extrapola, em muito, os muros das escolas e expõe a 
vítima ao escárnio público. Os praticantes desse modo de perversidade 
também se valem do anonimato e, sem nenhum constrangimento, 
atingem a vítima da forma mais vil possível. Traumas e consequências 
advindos do bullying virtual são dramáticos. (Silva, 2010, p.8) 
Schreiber e Antunes (2015) destacam ainda a dificuldade de percepção do 
impacto dos atos, em função da rápida difusão e reprodutibilidade das 
informações, típicas do ambiente virtual. Por fim, os autores reforçam que a ilusão 
do anonimato é um fator significativo no que diz respeito ao cyberbullying, na 
medida em que muitos indivíduos expressam no meio virtual comportamentos que 
reprimem nas relações sociais cotidianas. 
Nesse sentido, o comportamento violento no ciberespaço e o cyberbullying 
referem-se às práticas violentas nas relações sociais, aos processos de 
naturalização da violência e à consolidação de sociabilidades violentas nas quais 
 
 
7 
a força física, [...] deixa de ser um meio de ação, regulado por fins que 
se deseja atingir, para se transformar em um princípio de coordenação 
das práticas. Em outras palavras, a força física se libera da regulação 
“simbólica”, isto é, de sua subordinação às restrições e 
condicionamentos representados por fins materiais ou ideais. Ela torna-
se um fim em si mesma. [...] em suma, [...], ela é sua própria explicação 
e regula-se a si própria. (Machado da Silva, 2010, p. 96) 
O conceito de sociabilidade violenta foi desenvolvido por Machado da Silva 
(2010) com base na análise da sociedade brasileira. De acordo com esse autor, 
há um uso indiscriminado da violência nas relações cotidianas, ou seja, a violência 
é naturalizada e seu uso, justificado pelos indivíduos. 
Assim, o cyberbullying pode ser compreendido como uma reprodução, no 
ciberespaço, dos comportamentos agressivos verificados nas relações sociais 
cotidianas. Para Silva (2014), a violência, no ambiente virtual, está relacionada ao 
aumento da violência na sociedade em geral, mas também à impunidade e à 
espetacularização, em especial na mídia de massa. 
Assim como as demais formas de bullying, o cyberbullying demanda ações 
de enfrentamento em diferentes esferas. Destacamos o papel dos professores na 
consolidação de estratégias de enfrentamento a comportamentos violentos no 
ambiente escolar. 
TEMA 4 – A FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO E O 
ENFRENTAMENTO DO BULLYING 
Em função de sua relevância como instituição de socialização, a escola 
pode contribuir com o processo de formação de cidadãos autônomos e 
conscientes. De acordo com Faleiros e Faleiros (2008), a escola é uma instituição 
fundamental para a construção da cidadania. Para tanto, a convivência 
harmoniosa, o respeito aos direitos humanos e, por conseguinte, o enfrentamento 
da violência são condições fundamentais. 
Os autores destacam que, no âmbito das políticas públicas de 
enfrentamento da violência contra a criança e o adolescente, a escola é uma 
instituição com grande responsabilidade. Ainda de acordo com Faleiros e Faleiros 
(2008), a Constituição Brasileira, o Estatuto da Criança e do Adolescente e as 
legislações internacionais destacam a universalidade dos direitos humanos e os 
direitos específicos de crianças e adolescentes. 
O artigo 227 da Constituição e o artigo 4.º do ECA (que o transcreve) 
definem os direitos da população infanto-juvenil brasileira, bem como os 
responsáveis por garanti-los. 
 
 
8 
É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder 
Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos 
referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao 
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à 
liberdade, à convivência familiar e comunitária. (Faleiros; Faleiros, 2008, 
p. 30) 
Ainda segundo esses autores, as violações de direitos de crianças e 
adolescentes são passiveis de punições no Código Penal. Entretanto, discursos e 
práticas severas, punitivas, arbitrárias e violentas em relação a crianças e 
adolescentes coexistem com as garantias legais. Para Faleiros e Faleiros (2008), 
a violência historicamente perpetrada contra crianças e adolescentes tem muitas 
vezes como agressores agentes e instituições responsáveis pela proteção e 
salvaguarda da cidadania desses grupos. 
Além da Constituição Brasileira e do Estatuto da Criança e Adolescente, 
que resguardam os direitos fundamentais de crianças e adolescentes, a Lei n. 
13.185/2015, instituiu o Programa de Combate à Intimidação Sistemática 
(Bullying). Tal lei apresentaconceitos e classificações das práticas, bem como 
objetivos e medidas que devem ser adotadas. O art. 4, inciso II da referida lei 
estabelece como um dos objetivos do Programa “capacitar docentes e equipes 
pedagógicas para a implementação das ações de discussão, prevenção, 
orientação e solução do problema” (Brasil, 2015). Em 2018, a Lei n. 13.633 alterou 
o art. 12 da LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n. 
9.394/1996) e incluiu a promoção de medidas de conscientização, prevenção e 
combate ao bullying entre as incumbências dos estabelecimentos de ensino 
(Brasil, 2018). 
De acordo com Ristum (2010), a implementação de ações de 
enfrentamento do bullying demanda fundamentação e conhecimento do 
fenômeno por parte de gestores, professores e demais funcionários dos 
estabelecimentos de ensino. 
Segundo Vasconcelos (2017), a formação continuada está entre os 
aspectos que podem contribuir para o enfrentamento de violências no âmbito 
escolar, entre elas o bullying. De acordo com o autor, é fundamental que 
professores e demais profissionais da educação estejam atentos aos documentos 
oficiais, diretrizes, legislações e políticas públicas que envolvam a questão da 
violência escolar e do bullying. Entretanto, o autor destaca a necessidade de um 
posicionamento crítico frente a esse conjunto de informações e materiais. 
 
 
9 
Quanto à formação de professores, Vasconcelos (2017) aponta que, para 
o enfrentamento do bullying e de outras formas de violência escolar, 
É preciso romper a centralização do poder e do controle nos processos 
educacionais, cabendo à escola superar o modelo autoritário 
prevalecente há séculos e cabendo aos educadores conduzir os 
estudantes a uma convivência pacífica, pautada no diálogo, no respeito 
e na consciência. A educação precisa ser compreendida como um 
percurso de formação humana, para além da transmissão de conteúdos 
formais, portanto, articulando informação e formação. (Vasconcelos, 
2017, p. 906) 
Tal processo inclui, ainda segundo o mesmo autor, a ruptura com os 
modelos educacionais empregados também no meio universitário, na medida em 
que, segundo Vasconcelos (2017), a formação de professores, em geral, é 
pautada na transmissão de conteúdos formais, já que, ao iniciar na docência, os 
professores tendem a reproduzir os métodos por meio dos quais foram formados. 
A ruptura mencionada demanda a formação continuada dos professores, 
que deve ser pensada 
como espaços de intercâmbio e construção coletiva de saberes, de 
análise da realidade, de confrontação de experiências, de criação de 
vínculos socioafetivos e de exercício concreto dos Direitos Humanos. 
[...]. Trata-se, portanto, de transformar mentalidades, atitudes, 
comportamentos, dinâmicas organizacionais e práticas cotidianas dos 
diferentes atores, individuais e coletivos, e das organizações sociais e 
educativas. (Candau, Scavino, 2013, p. 63) 
A perspectiva de Vasconcelos (2017) vai ao encontro dos debates sobre o 
processo de enfrentamento do bullying no ambiente escolar, os quais sugerem 
transformações nas dinâmicas de interação do ambiente escolar e nas premissas 
dos processos educativos. 
TEMA 5 – DEBATES CONTEMPORÂNEOS SOBRE O ENFRENTAMENTO DO 
BULLYING NO ESPAÇO ESCOLAR 
As pesquisas iniciais sobre o bullying contemplavam classificações do 
fenômeno, os efeitos psicológicos sobre a vítima e os fatores que explicariam a 
ação dos agressores. As reflexões contemporâneas buscam compreender o 
fenômeno para além de classificações e dicotomias entre vítimas e agressores, 
procurando apontar para a necessidade de ações que englobem diferentes 
agentes e instituições. 
Como assinala Leitão (2010), o enfrentamento das violências, entre as 
quais inclui-se o bullying, pressupõe um deslocamento do enfoque do processo 
 
 
10 
de aprendizagem. Nesse sentido, segundo a autora, a escola deve ter consciência 
da violência como fenômeno social historicamente constituído e presente no 
cotidiano dos estudantes. 
Em sua obra, o educador Paulo Freire (1989) aponta como diferentes 
períodos e processos ao longo da história do Brasil são marcados pelo 
autoritarismo, pela violência e pela opressão. Diante de tal conjuntura, Freire 
defende a consolidação de um modelo de educação que promova a formação de 
indivíduos críticos e atuantes na sociedade democrática. Esses indivíduos 
atuariam nas transformações de sua realidade social, bem como da sociedade de 
forma mais ampla. 
Entre as estratégias possíveis para o enfrentamento de manifestações de 
violência no ambiente escolar, diferentes autores mencionam transformações nas 
relações e a democratização das relações escolares. As reflexões sobre o sistema 
educacional apresentadas por Freire (1989) já indicavam a relação entre os 
processos pedagógicos e os processos de emancipação. 
A educação emancipadora, voltada ao empoderamento e à autonomia, está 
na base da educação para os direitos humanos, mencionada por Moehlecke 
(2010) como uma ferramenta de enfrentamento da violência e do bullying no 
ambiente escolar: 
a educação em direitos humanos constitui uma educação 
permanente e global, que não trabalha apenas com a dimensão 
da razão e da aprendizagem cognitiva e com o conhecimento das 
leis. Ela envolve também aspectos afetivos e valorativos que 
precisam ser sentidos e vivenciados cotidianamente. É preciso 
experimentar o direito de liberdade, de igualdade, de justiça, de 
dignidade para entender o que significam e, principalmente, para 
que sejam difundidos. (Moehlecke, 2010, p. 37) 
A educação em direitos humanos visa “formar sujeitos de direito, 
empoderar os grupos socialmente vulneráveis e excluídos e resgatar a memória 
histórica da luta pelos Direitos Humanos na nossa sociedade” (Candau; Scavino, 
2013, p. 63), o que, por sua vez, demanda uma nova formação continuada dos 
professores, em que os próprios processos formativos sejam pautados pelos 
princípios da educação em direitos humanos, ou seja: 
como espaços de intercâmbio e construção coletiva de saberes, de 
análise da realidade, de confrontação de experiências, de criação de 
vínculos socioafetivos e de exercício concreto dos Direitos Humanos. 
[...]. Trata-se, portanto, de transformar mentalidades, atitudes, 
comportamentos, dinâmicas organizacionais e práticas cotidianas dos 
 
 
11 
diferentes atores, individuais e coletivos, e das organizações sociais e 
educativas. (Candau; Scavino, 2013, p. 63) 
A intervenção nas situações de bullying com base na perspectiva da 
educação em direitos humanos significa reconfigurar, de forma articulada, 
diferentes elementos do processo educativo, entre os quais a didática, a gestão 
escolar e os currículos. Nesse panorama, as ações educativas com atuação ativa 
dos estudantes são privilegiadas em detrimento de ações puramente punitivas, na 
medida em que se reconhece que a mediação desse tipo de fenômeno no 
ambiente escolar envolve a formação do sujeito para a vida em sociedade e para 
o exercício da cidadania. 
 
 
 
12 
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