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Competências profissionais de professores de matemática do ensino médio

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Bolema, Rio Claro (SP), v. 27, n. 45, p. 143-164, abr. 2013
Competências Profissionais de Professores de
Matemática do Ensino Médio Valorizadas por uma
Boa Escola: a supremacia da cultura da
performatividade
Professional Skills of High School Mathematics
Teachers Valued by a Good School: the supremacy of
the culture of performativity
Vanessa Franco Neto*
Marcio Antonio da Silva**
Resumo
Este artigo apresenta alguns resultados de uma pesquisa realizada em uma escola que
obteve um ótimo desempenho no ENEM/2009. Os principais objetivos foram investigar
e analisar quais competências profissionais de professores de Matemática do ensino
médio são consideradas relevantes por essa instituição de ensino e qual a influência da
cultura da performatividade no trabalho desses docentes. Para isso, entrevistamos a
coordenadora, a supervisora e os quatro professores do ensino médio da instituição
investigada. Verificamos que as competências mais valorizadas são influenciadas
diretamente pela necessidade de obtenção de bons resultados em avaliações internas e
* Mestre em Educação Matemática pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).
Tutora a Distância do curso de Matemática (EaD/UFMS). Professora da Universidade Federal de
Mato Grosso do Sul (UFMS) e da Universidade Anhanguera (Uniderp). Campo Grande, MS, Brasil.
Membro do GP100 (GPCEM – Grupo de Pesquisa Currículo e Educação Matemática). Endereço para
correspondência: Cidade Universitária, Caixa Postal 549, CEP: 79070-900, Campo Grande, MS,
Brasil. E-mail: vanessaneto@rocketmail.com.
** Doutor em Educação Matemática pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).
Professor do Centro de Ciências Exatas e Tecnologia, do Programa de Pós-Graduação em Educação
Matemática e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso
do Sul (UFMS), Campo Grande, MS, Brasil. Líder do GP100 (GPCEM – Grupo de Pesquisa Currículo
e Educação Matemática). Endereço para correspondência: Cidade Universitária, Caixa Postal 549,
CEP: 79070-900, Campo Grande, MS, Brasil. E-mail: marcio.silva@ufms.br.
ISSN 0103-636X
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externas. São elas: administrar o tempo, manter-se atualizado quanto às avaliações externas
e relacionar-se bem com os alunos. Também constatamos que boa parte das ações da
equipe gestora consiste em alinhar o corpo docente, objetivando a aprovação de seus
estudantes nos mais concorridos exames vestibulares do país.
Palavras-chave: Educação Matemática. Formação de Professores de Matemática.
Competências Profissionais. Cultura da Performatividade. Avaliações em Larga Escala.
Abstract
This article presents some results of research conducted in a school that had excellent
results in the 2009 ENEM Exam (National Examination of High School Education). The
main aims were to investigate and analyze what professional skills for mathematics
teachers in high school are considered relevant for this institution. We also aimed to
identify the influence of the culture of performativity in the work of these teachers. We
interviewed the coordinator, supervisor and four high school teachers from the institution
investigated. Our research showed that the most valued skills are directly influenced by
the need to obtain good results in internal and external evaluations. The most valued
skills were time management, keeping up to date with external evaluations and relating
well to students. Another aspect we noticed about the management team was how the
faculty aimed to ensure that their students were prepared for the most competitive
entrance examinations in the country.
Keywords: Mathematics Education. Mathematics Teacher Education. Professional Skills.
Culture of Performativity. Large-Scale Evaluations.
1 Delineando um cenário recorrente nos últimos anos
Segunda-feira, 19 de julho de 2010. Nessa data, o Instituto Nacional de
Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) divulgou os resultados do Exame
Nacional do Ensino Médio (ENEM), relativo ao ano de 2009. Em poucos minutos,
a imprensa recebeu os dados do Inep, colocou os resultados das escolas em
ordem decrescente e divulgou um ranking com a classificação geral por Estados,
e até por municípios, das instituições de ensino que participaram de tal exame.
A partir de então, repórteres de várias mídias passaram a produzir e
divulgar reportagens que enfatizavam o segredo do sucesso das escolas mais
bem-sucedidas no ENEM, como se o bom resultado das instituições nesse exame
fosse um atestado de qualidade do ensino médio, emitido pelo Governo Federal.
Essa ansiedade de buscar modelos que possam ser copiados em outros
contextos parece fazer parte da natureza humana, representando uma forma
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ingênua de encontrar padrões de sucesso, não levando em conta as
especificidades das milhares de instituições de ensino espalhadas por um país
com dimensões continentais como é o caso do Brasil.
Os resultados que trazemos neste artigo são um recorte da pesquisa de
Mestrado da primeira autora (NETO, 2011), orientada pelo segundo autor, no
Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática da Universidade Federal
de Mato Grosso do Sul.
A investigação emergiu da curiosidade em conhecer os professores de
Matemática que trabalham nas instituições que lideram esses rankings. Quem
são esses professores? Quais competências profissionais desses professores
são mais valorizadas pela equipe gestora da escola? Como o trabalho deles é
influenciado pela necessidade de obter resultados excelentes em avaliações
externas?
2 Questões e objetivos da pesquisa
A partir das mais variadas questões que surgiram, algumas delas
enunciadas no tópico anterior, optamos por desenvolver nossa pesquisa
investigando quais competências profissionais dos professores de Matemática
são consideradas relevantes por determinados segmentos de uma escola (gestores
e os próprios professores) bem classificada no Exame Nacional do Ensino Médio
(ENEM), no ano de 2009, pois tínhamos como objetivo compreender como esses
resultados influenciam o professor de Matemática na constituição de suas
competências profissionais.
Ao buscarmos uma escola que tivesse atingido resultados significativos
em avaliações externas, encontramos, no ranking de classificação das escolas
no ENEM 2009, uma instituição de ensino localizada na cidade de Campo Grande
– MS, onde os autores da pesquisa residem. Interessamo-nos pela escola em
questão, pois ela obteve um resultado muito significativo em âmbito nacional,
alcançando posição entre as dez melhores classificadas do país.
Utilizamos itálico para nos referirmos ao adjetivo boa, pois essa é uma
qualificação que não foi atribuída por nós, mas, sim, adquirida pela escola no
âmbito sociopolítico no qual está inserida. Não faz parte dos nossos objetivos
investigar as razões que permitiram que a instituição recebesse tal qualificação,
mesmo porque os pesquisadores não compartilham da referida adjetivação feita.
Todavia, existe uma validação social quanto às práticas de gestão empreendidas
na instituição, que são bem vistas pela sociedade em geral.
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É importante destacar que o ranking dos resultados do ENEM não faz
parte dos objetivos do Governo Federal e não é estabelecido por ele. Essa listagem
é organizada e divulgada pelos órgãos de imprensa nacional e a forma como
essa divulgação é feita já foi comentada no início deste artigo.
Após essas constatações e discussões iniciais, chegamos à elaboração
de nossas questões de pesquisa, a fim de que elas nos auxiliem a compreender
todas as peculiaridades existentes nessa unidade escolar:
(i) Quais as competências profissionais de professores de Matemática
do ensino médio são consideradas relevantes por uma escola destacada em
avaliaçãoexterna?
(ii) Qual a influência da cultura da performatividade na constituição
das competências profissionais desse professor?
Os dados para a construção de nossa pesquisa foram obtidos mediante
entrevistas com quatro professores de Matemática, uma coordenadora e uma
supervisora, atuantes no ensino médio da instituição pesquisada.
A fim de nortearmos nossa investigação rumo às possíveis respostas
aos nossos questionamentos, elaboramos nossos objetivos:
(i) delinear as competências profissionais de professores de Matemática
do ensino médio que são consideradas relevantes por uma escola com ótimo
desempenho no ENEM 2009;
(ii) verificar como a cultura da performatividade influencia o trabalho
dos professores de Matemática do ensino médio que atuam em uma escola de
excelência.
Para nos auxiliar a responder nossas questões e alcançar nossos objetivos,
utilizamos dois aportes teóricos, detalhados nos próximos tópicos: as competências
profissionais e a cultura da performatividade.
3 As competências profissionais de professores
Quando tratamos de competências profissionais, no âmbito da formação
de professores, um nome citado recorrentemente é o do pesquisador Philippe
Perrenoud, um dos mais expressivos promotores do termo e de sua aplicabilidade
quando inserido no contexto da educação. Ele define competência como “a
capacidade de mobilizar diversos recursos cognitivos para enfrentar um tipo de
situação” (PERRENOUD, 2000, p. 15).
De acordo com ele, competência profissional também é:
[...] um conjunto diversificado de conhecimentos da
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profissão [docente], de esquemas de ação e de posturas
que são mobilizadas no exercício do ofício. De acordo com
esta definição bem ampla, as competências são, ao mesmo
tempo, de ordem cognitiva, afetiva, conativa e prática
(PERRENOUD et al. 2001, p. 12).
Em outra obra, o pesquisador clarifica o conceito de competência,
argumentando que se trata de
[...] aptidão para enfrentar uma família de situações
análogas, mobilizando de uma forma correta, rápida,
pertinente e criativa, múltiplos recursos cognitivos: saberes,
capacidades, microcompetências, informações, valores
atitudes, esquemas de percepção, de avaliação e de
raciocínio (PERRENOUD, 2002, p. 19).
As orientações para a formação de professores no Brasil têm se
fundamentado, entre outros conceitos, no de competência profissional. A ênfase
nesse conceito, como sendo nuclear na organização curricular da formação
docente, acentuou-se a partir de 1996, ano da promulgação da Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional1.
Perrenoud (2000) relacionou dez famílias de competências, classificando-
as como prioritárias na formação de professores: (i) organizar e dirigir situações
de aprendizagem; (ii) administrar a progressão das aprendizagens; (iii) conceber
e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação; (iv) envolver os alunos em suas
aprendizagens e em seu trabalho; (v) trabalhar em equipe; (vi) participar da
administração da escola; (vii) informar e envolver os pais; (viii) utilizar novas
tecnologias; (ix) enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão; (x)
administrar sua própria formação continuada.
Neste recorte de pesquisa, limitaremos nossas análises a três famílias
de competências (ii, vii e x) e investigaremos como essas são valorizadas ou
desvalorizadas pelos professores e pela equipe gestora da escola ou, ainda, quais
outras competências emergem a partir das análises das transcrições das
entrevistas feitas com os participantes2 da pesquisa.
1 Não discutiremos, neste artigo, as críticas ao conceito de competências, mas o leitor pode consultar
alguns artigos e livros que discorrem sobre o tema. Entre eles: Sacristán et al. (2011), Dias e Lopes
(2003).
2 Optamos por utilizar o termo participantes, ao invés de sujeitos, assim como recomenda Yin
(2011) ao se referir aos indivíduos que aceitam participar de estudos qualitativos.
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Segue-se uma breve descrição dessas três famílias de competências,
na concepção de Perrenoud (2001).
Ao sugerir a administração da progressão das aprendizagens,
Perrenoud (2001) abarca a necessidade de produção de um ensino estratégico,
no qual deveriam ser considerados os objetivos do ensino, as limitações e
potencialidades dos alunos, as avaliações periódicas das inferências e dos
resultados obtidos pelo professor e uma visão longitudinal do ensino, promovendo
a continuidade dos assuntos tratados. Portanto, essa competência está
relacionada ao gerenciamento das atividades de ensino.
Ao evocar a participação dos pais no desenvolvimento dos saberes
de seus filhos, o pesquisador atribui à responsabilidade dos pais de educarem
seus filhos uma importância tão grande quanto à dos professores de instruírem
seus alunos. Nesse caso, a competência requerida do professor seria a de propor
acordos entre o programa da escola e as convicções pedagógicas e sociais dos
pais, aceitando-os como eles são, em sua diversidade e chamando-os a
colaborarem para o sucesso escolar dos seus filhos.
Importante ressaltar que os pais, ao matricularem seus filhos em
determinada instituição, concordam com a proposta pedagógica apresentada
pela escola. Portanto, há um contrato implícito e, muitas vezes, uma das cláusulas
mais valorizadas é garantir a aprovação do estudante nos mais concorridos
exames vestibulares.
Perrenoud (2001) argumenta que, para administrar sua própria
formação continuada, o professor necessita de constante aperfeiçoamento
profissional, independentemente do apoio dado pela instituição de ensino na qual
ele trabalha.
Além de participar de cursos, a reflexão sobre a própria prática e a
troca de experiências entre os pares também fazem parte dessa família de
competências, podendo colaborar com o aprimoramento profissional. Para o
pesquisador, as trocas de experiências entre professores podem trazer grandes
contribuições para o trabalho docente.
A partir dessas três famílias de competências, procuramos algumas
similaridades na fala dos professores e gestores que pudessem caracterizá-las.
Além disso, buscamos encontrar traços que revelassem a influência da busca
exagerada por bons resultados em avaliações externas no trabalho do professor,
o que configura traços da cultura da performatividade. Pretendemos elucidar
tal expressão no próximo tópico, trazendo contribuições importantes e pouco
utilizadas na Educação Matemática brasileira.
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4 A cultura da performatividade
Santos (2004) afirma que as atuais políticas educacionais que apoiam as
avaliações em larga escala acabam evidenciando uma nítida diferenciação de
desempenho entre os estabelecimentos de ensino frequentados por estudantes
das classes sociais alta e baixa. Segundo a autora, a mesma divisão de classes
gerada pelo poder aquisitivo das famílias é reproduzida no setor educacional,
evidenciando uma grande desigualdade, que resulta em um ensino voltado às
elites e outro voltado aos mais pobres.
Desse modo, “se delineia uma nova arquitetura para o setor educacional,
edificada a partir de critérios de eficiência e eficácia em consonância com os
interesses de mercado” (SANTOS, 2004, p. 1146). Assim, aos moldes da cultura
do desempenho e da qualidade medida pela relação entre investimento e eficiência,
observa-se a absorção de elementos de mercado pelos sistemas de educação.
A cultura de desempenho remodela as formas de trabalho dos
profissionais da área educacional. Santos (2004) nota que a grande motivação
dos professores imersos nessa cultura está ligada à obtenção de bons resultados
dos seus alunos em avaliações em larga escala e não a proporcionar ao seu
aluno uma educação de qualidade que vise à formação de um cidadão crítico,
preocupado com a transformação social e com a melhoria das condições de
vida da comunidadena qual ele está inserido.
O pesquisador da Universidade de Londres, Stephen J. Ball, sociólogo e
principal divulgador da expressão cultura da performatividade, argumenta
que o setor educacional é influenciado pelos movimentos que regem as tendências
atuais de organização da sociedade e sua relação com o trabalho.
De acordo com Lopes e Macedo (2011, p. 245), o objetivo do pesquisador
inglês é “investigar as políticas de maneira que o compromisso com a eficiência
e os resultados instrucionais não sejam considerados em detrimento do
compromisso com a justiça social”. Tal interpretação dos trabalhos do pesquisador
pode ser compreendida quando, no excerto a seguir, Ball justifica seus
posicionamentos acerca dos temas que trata. Segundo ele:
Cada vez mais, as políticas sociais e educacionais estão
sendo articuladas e legitimadas explícita, direta e, muitas
vezes, exclusivamente em função do seu papel em aumentar
a competitividade econômica por meio do desenvolvimento
de habilidades, capacidades e disposições exigidas pelas
novas formas econômicas da alta modernidade. [...]
Almejados e celebrados por quase todos os Estados das
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sociedades ocidentais, os valores e incentivos das políticas
de mercado legitimam e dão impulso a certos compromissos
e ações – empreendimentos, competição, excelência – ao
mesmo tempo que inibem e deslegitimam outros – justiça
social, equidade, tolerância (BALL, 2004, p. 1109 e 1122).
Dessa maneira, o autor apresenta indícios do culto a esse processo de
organização social na educação. Ball (2005) trata da instauração desse modelo
nos setores privados da sociedade e define o termo performatividade,
compreendendo-o no contexto da atual sociedade econômica.
A performatividade é uma tecnologia, uma cultura e um
método de regulamentação que emprega julgamentos,
comparações e demonstrações como meios de controle,
atrito e mudança [...] A performatividade é alcançada
mediante a construção e publicação de informação e de
indicadores, além de outras realizações e materiais
institucionais de caráter promocional, como mecanismo para
estimular, julgar e comparar profissionais em termos de
resultados: a tendência para nomear, diferenciar e classificar
(BALL, 2005, p. 543-544).
Os estudiosos que se preocupam em investigar a influência dessa cultura
na sociedade buscam compreender os mecanismos que a constituem. Para nós
interessava encontrar os efeitos dessa tendência na instituição pesquisada.
Mais especificamente, estávamos empenhados em saber como essa
cultura atinge gestores e professores de Matemática do ensino médio e como
eles se posicionam frente a essa cultura.
Além da preocupação, em termos das exigências feitas aos alunos e
que os conduzem a buscar, quase que exclusivamente, os resultados em avaliações
externas e internas, outra preocupação com essa tendência é que a atuação dos
professores pode tornar-se limitada.
Ao profissional que atua em meio a esses propósitos cabe apenas a
execução das ordens que lhes são dadas. Espera-se que, nessa execução, sejam
efetivamente realizadas todas as incumbências preestabelecidas pela equipe
gestora. Não há espaço para a criatividade. Impera a homogeneização de
processos de ensino, até mesmo com relação à forma de tratamento dos alunos.
Todavia, verificamos que esse posicionamento é, também, uma exigência
social, pois a comunidade escolar valoriza os bons resultados, mesmo não
conhecendo bem os instrumentos que os geraram.
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Ball (2005, p. 541) afirma que, em meio a essa tendência, “o
profissionalismo só tem significado dentro da moldura de uma racionalidade
substantiva, e as tentativas de redefinir o profissionalismo dentro de uma estrutura
dominada pela racionalidade técnica tornam esse termo sem sentido”.
Em meio à cultura da performatividade, Ball ainda afirma que, para
atender às objetividades do modelo, há de se admitir que “a eficácia só existe
quando é medida e demonstrada, e as circunstâncias locais só existem como
desculpa inaceitável para falhas na execução ou na adaptação” (BALL, 2005,
p. 543).
Assim, para um professor que esteja atuando em sala de aula, nas
instituições que atendem às especificidades dessa tendência (cultura da
performatividade), não cabe avaliar e julgar as necessidades de seus alunos e
fazer com que sua atividade adquira um sentido no referido contexto no qual
está inserido. Cabe a ele, para ser considerado um bom profissional, cumprir o
programa preestabelecido e encontrar os meios que proporcionem aos seus
alunos a assimilação desses conteúdos.
Nossa pesquisa também objetivou encontrar traços dessa cultura na
fala de professores e gestores, e verificar se surgem novas competências que
representam um antagonismo em relação às competências profissionais citadas
no tópico anterior.
5 Características da pesquisa, da escola e dos participantes analisados
Esta investigação é caracterizada como uma pesquisa qualitativa, na
modalidade estudo de caso.
É qualitativa por, dentre várias características, contemplar as cinco
principais elencadas por Bogdan e Biklen (1994): (i) a pesquisa qualitativa tem o
ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu
principal instrumento; (ii) os dados coletados são predominantemente descritivos;
(iii) a preocupação com o processo é muito maior do que com o produto; (iv) a
análise dos dados tende a seguir um processo indutivo e (v) o significado que os
participantes da pesquisa dão às coisas e à sua vida são focos de atenção especial
do pesquisador.
É um estudo de caso devido às propriedades significativamente
peculiares da escola a qual nos propusemos investigar. A escolha pela referida
instituição deu-se por ser uma das instituições mais bem classificadas no ranking
do ENEM de 2009, figurando entre as dez escolas com melhor desempenho no
Brasil.
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Yin (2005, p. 63) lista cinco fundamentos lógicos para um caso único.
Classificamos nosso caso como sendo o terceiro elencado por esse pesquisador:
quando temos um caso representativo ou típico. O objetivo é investigar um
caso que seja representativo dentro de um conjunto de casos similares. Para o
autor, “parte-se do princípio de que as lições que se aprendem desses casos
fornecem muitas informações sobre as experiências da pessoa ou instituição
usual”.
Dessa maneira, entendemos que a escola investigada representa o que
ocorre em boa parte das instituições de ensino que obtêm resultados significativos
em avaliações externas no Brasil.
A escola investigada se localiza na cidade de Campo Grande, no Estado
de Mato Grosso do Sul. Trata-se de uma instituição privada de ensino que possui
uma boa infraestrutura e oferece desde a educação infantil até o terceiro ano do
ensino médio. Também, disponibiliza aos seus estudantes a opção de realizarem
um curso pré-vestibular.
Os alunos que se candidatam a ingressar na instituição passam por uma
avaliação para verificar se possuem conhecimentos mínimos para frequentar as
aulas. As gestoras relataram que, em geral, os que não obtêm um bom resultado
nessa avaliação preliminar não são prontamente rejeitados. O procedimento é
alertar os pais acerca das dificuldades que eles poderão enfrentar e, também,
da necessidade de maior dedicação por parte desse aluno para que ele não
tenha rendimento abaixo do que seria considerado o mínimo para a progressão
para a série seguinte.
Todos os entrevistados relataram que a escola se insere no perfil de
instituição tradicional e, na visão deles, esse adjetivo define uma estrutura na
qual impera o respeito ao professor, ou seja, ele sempre tem razão frente ao
aluno.
O ensino centra-se na concepção mecanicista,ou seja, boa parte das
ações docentes está ligada ao ensino de técnicas que devem ser utilizadas no
menor tempo possível. Para os profissionais que entrevistamos, essa ênfase no
treinamento é a melhor maneira de conduzir os alunos à aprendizagem dos
conteúdos que podem ser cobrados no vestibular.
O destacado resultado do ENEM foi obtido pelos alunos que cursavam
o terceiro ano em 2009. Esse grupo era formado por apenas dezessete alunos.
As entrevistas foram realizadas com a supervisora, a coordenadora
pedagógica e os quatro professores de Matemática do ensino médio.
O quadro 1, apresentado a seguir resume as principais informações a
respeito dos entrevistados:
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Quadro 1 – Resumo das informações sobre os participantes da pesquisa analisados
O objetivo inicial era realizar duas entrevistas com cada participante
pesquisado. Como as entrevistas foram semiestruturadas, algumas delas
suscitaram novos encontros para o esclarecimento e o aprofundamento de
assuntos levantados.
Ao todo foram quatorze entrevistas, cada uma com duração média de
quarenta minutos, todas feitas nas dependências da própria escola analisada.
Todas as entrevistas foram transcritas para que fosse iniciado o processo
de análise, detalhado no tópico a seguir.
6 Análise das transcrições das entrevistas
As análises das transcrições das entrevistas realizadas foram feitas por
intermédio do processo de categorização.
Ao construirmos o roteiro das entrevistas, pretendíamos relacionar as
respostas dos nossos entrevistados às dez famílias de competências citadas por
Perrenoud (2000) e já citadas nesse artigo. Portanto, pretendíamos realizar uma
categorização a priori.
No entanto, algumas categorias emergiram da análise feita, inclusive
3 O professor SA começou a trabalhar nessa escola quando ainda não havia concluído seu curso de
licenciatura.
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representando um total antagonismo em relação às categorias mencionadas por
Perrenoud. Dessa forma, optamos pelo tipo de categorização que Fiorentini e
Lorenzato (2007, p. 135) chamam de mista: “quando o pesquisador obtém as
categorias a partir de um confronto entre o que diz a literatura e o que encontra
nos registros de campo”.
As quatro categorias que representam competências profissionais
valorizadas pelas gestoras e pelos próprios professores da instituição pesquisada,
e que surgiram a partir das análises, foram: (i) administrar o tempo; (ii) relacionar-
se bem com os alunos; (iii) manter-se atualizado quanto às avaliações; (iv) utilizar
bem o material didático. Neste artigo, nos limitaremos à análise das três primeiras.
As análises apresentadas mostram que essas competências vêm de
encontro com algumas citadas por Perrenoud, expressando justamente ideias
contrárias àquelas que o pesquisador suíço concebeu ao listar suas dez famílias
de competências.
6.1 Administrar o tempo versus administrar a progressão das
aprendizagens
Como já vimos, Perrenoud (2000) se refere à administração da
progressão das aprendizagens, levando em conta a necessidade de produzir
atividades de ensino que se adaptem à peculiaridade de cada estudante.
Isso faz com que seja imprescindível retomar objetivos de ensino, inserir
novos temas, excluir outros, reformular a estrutura organizacional do currículo,
realizar avaliações periódicas, entre outras ações que demandam tempo.
Na instituição de ensino pesquisada, essas ações seriam consideradas
como sendo sinônimo de atraso e incompetência.
A coordenadora do ensino médio salienta que a questão do tempo é
fiscalizada até pelos estudantes, os quais podem relatar se a rotina esperada
pelos gestores para as aulas está sendo cumprida de maneira adequada. Os
alunos do ensino médio respondem periodicamente a um questionário que avalia
o professor:
C – Ela não é uma avaliação onde você pergunta: o professor é
legal?. Não, são perguntas onde, é feito assim: os exercícios
condizem com a aula?, o tempo de exercícios condiz com a aula?,
as questões cobradas em prova são coerentes com a aula dada
pelo professor? Então, a gente vai e volta nas perguntas, que não
tem como o aluno ser diretamente contra aquele professor, ele está
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falando sobre o geral, o trabalho daquela disciplina. Então, a gente
leva as perguntas para esse lado: cumpre o conteúdo no prazo
certo? Essas coisas assim: aproveita a aula cem por cento?,dá
tarefa?, cobra tarefa?, faz perguntas difíceis ou só fáceis?, então
a gente vai fazendo com que o aluno esqueça a figura professor e
se lembre do momento aula.
Sobre a administração do tempo, um dos professores relata que o fato
de levar os alunos ao laboratório de informática pode significar perda de tempo:
SA – É, tem o laboratório [de informática], mas eu, eu sinceramente
nunca usei. [...] Então o tempo que eu desloco para subir, para
ligar computador, para tal e para descer, eu podia estar resolvendo
exercício, entendeu?
Uma das formas para otimizar o tempo das aulas nessa escola é dividir
os alunos de acordo com o desempenho deles em avaliações periódicas realizadas
internamente. Dessa maneira, as turmas são divididas segundo a nota dos
estudantes nessas provas. Os melhores classificados formam a sala A, o segundo
bloco de alunos compõe a sala B, e assim por diante.
Sobre a existência de divisão de salas, a coordenadora pedagógica do
ensino médio justifica tal fato pelo melhor rendimento da aula:
C – Qual é o objetivo da sala A? Os professores são os mesmos, a
prova é a mesma, a carga horária é a mesma, só que eu tenho ali,
alunos mais ou menos no mesmo nível. Então rende mais em exercício
[...].
Mesmo assim, é inevitável ter que lidar com as diferenças de desempenho
entre os estudantes. Para tentar padronizar ainda mais as aulas, os alunos são
encaminhados para o chamado plantão de dúvidas, onde eles podem ter as
suas dúvidas dirimidas.
MC – Então, essa questão de retornar a atividade para eles, fica
um pouco complicada no terceiro ano e no cursinho. Por quê?
Porque como eu te falei, nós temos um problema sério que é o tempo.
Duas aulas4 para cumprir a carga horária é um tempo muito ínfimo
para você poder voltar naquele conteúdo que passou, que você
viu que ele não aprendeu. Então, como é que a gente pode suprir
4 Há cinco aulas semanais de Matemática no ensino médio dessa escola. Essas aulas são divididas em
duas frentes: Álgebra, com três aulas semanais, e Geometria, com duas. Cada frente é ministrada por
um professor diferente. Dessa maneira, o professor MC leciona apenas Geometria. Portanto, ele
tem apenas duas aulas semanais em cada turma.
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isso? Num trabalho que nós fazemos que é o plantão de dúvida.
O mesmo professor se refere a uma verdadeira corrida contra o tempo
para cumprir o conteúdo, mesmo em detrimento do aprendizado dos alunos. A
ênfase é a preparação para os exames vestibulares. Dessa maneira, a aula é
vista como um treino de um atleta para participar de uma maratona.
MC – Nós trabalhamos com uma aula ainda reduzida [referindo-se
aos quarenta e cinco minutos de tempo de aula]. Você vê: eu tenho
duas aulas, eu tenho noventa minutos para cumprir todo o conteúdo
de Geometria. No caso de Geometria, no meu ponto de vista, eu
acho muito pouco. Então não dá tempo de você trabalhar de uma
forma diferente, assim no caso: ah, vamos fazer uma atividade
diferente, em grupo então. Ou então: vamos propor que o aluno
faça a atividade e vá para o quadro e, depois de terminada essa
atividade, ele vai paro o quadro e corrige, vamos fazer a correção.
Não dá tempo disso! Então eu trabalho nesse esquema: eu explico
a teoria de um modo bem sucinto, resolvodois, no máximo três
exercícios e, o que sobra da aula, é o tempo que eu passo de exercício
para eles resolverem e me entregarem.
Esses poucos trechos extraídos das transcrições das entrevistas feitas
com os participantes da pesquisa revelam que o tempo deve ser administrado
com eficiência, ou seja, deve-se cumprir o conteúdo no prazo predeterminado,
sem levar em consideração as especificidades dos estudantes.
6.2 Relacionar-se bem com os alunos versus informar e envolver os pais
A competência de informar e envolver os pais, como já vimos, valoriza
ações docentes que estimulam a participação e o envolvimento dos pais na vida
escolar dos filhos.
Essa relação entre familiares e professores, a qual Philippe Perrenoud
se refere, é alicerçada em uma harmonia entre as opiniões dos pais sobre o que
é uma boa educação e a proposta pedagógica seguida pela escola. Desse
modo, os possíveis conflitos advindos desse vínculo são resolvidos por intermédio
de diálogos que tem o projeto pedagógico da escola como referência.
Se, por exemplo, a proposta da escola está alicerçada nas ideias
construtivistas e o professor de Matemática ministra todas suas aulas seguindo
a sequência – apresentação de definições, exposição de exemplos simples,
resolução de exercícios e correção dos mesmos – os pais irão questioná-lo, pois
157
Bolema, Rio Claro (SP), v. 27, n. 45, p. 143-164, abr. 2013
o contrato pedagógico implícito não está sendo seguido.
No caso da escola investigada, a principal cláusula desse contrato é
obter aprovação nos mais concorridos exames vestibulares do país. Isso inclui
um olhar atento dos pais e gestores sobre os resultados obtidos em avaliações
internas e externas. Sobre esse assunto, a supervisora revela quais as
características de um bom professor de Matemática:
S – Se eu fosse resumir pra você: qualidade de aula, qualidade do
aprendizado desse aluno. Ele tem que garantir que esse aluno
apreenda de verdade, através das avaliações, através do
desempenho dos alunos nos vestibulares. Internamente, através da
movimentação desse professor em sala de aula, através dos testes,
através das avaliações, através dos simulados e através da
avaliação institucional do professor que é feita por nós e pelos
alunos. E, externamente, através da aprovação em vestibulares.
A opinião dos alunos referente a aspectos didático-pedagógicos do
professor é levada em conta, mas é evidente que esses jovens não têm condição
de analisar pedagogicamente o trabalho dos seus professores. Então, como eles
são ouvidos? A escola dá voz a eles, assim como um prestador de serviços dá
voz aos seus clientes, por intermédio de pesquisas de satisfação. A máxima do
cliente tem sempre razão é seguida à risca:
VA – Ah, isso [referindo-se à avaliação que os alunos fazem dos
seus professores] é bom para o colégio saber quem [...] quem são
os clientes são os alunos, não é? Então eles têm que estar satisfeitos
e mostrar também para a gente mudar se não está [...] algum ponto
está falho a gente tem que mudar, não é? Não pode ficar
acomodado. Isso é importante.
Essa avaliação que, supostamente, mensura a qualidade da atuação
docente é questionada apenas por uma professora:
MO – Porque um aluno, se ele tiver com raiva de você, ele não
responde a seu favor. Se eles combinarem entre eles, eles detonam
um professor, você concorda? [...] E outra coisa, o que um menino
de dezesseis anos, quinze anos, pode dizer [a respeito da prática
do professor]? Pode dizer que você não sabe?
Um termo recorrente utilizado pelas gestoras é o alinhamento. Esse
alinhamento que a escola faz nos seus docentes está ligado a agradar os alunos,
cumprir os conteúdos e garantir bons resultados dos estudantes em avaliações
externas.
Competências Profissionais de Professores de Matemática do Ensino Médio Valorizadas...
Bolema, Rio Claro (SP), v. 27, n. 45, p. 143-164, abr. 2013
158 NETO, V. F.; SILVA, M. A.
Um docente menciona que a coordenação da escola se preocupa com a
provável relação que os estudantes poderiam fazer entre bom professor e
professor amigo, pois o fato de ser complacente não significa que os objetivos
educacionais são atingidos:
SA – O grande medo da coordenação era que talvez eles [os alunos]
confundissem a parte de ser legal, e talvez eles pudessem achar
que ser legal é ser amigo, e tal. Mas eles [os alunos] conseguem
dividir [distinguir] bem [entre o bom professor e o professor amigo].
Ainda sobre o alinhamento, a supervisora relata que a opinião e satisfação
do estudante é um fator importante nas decisões administrativas da escola e
reforça que a aprovação dos seus alunos nos exames vestibulares é o principal
objetivo da instituição:
S – (...) de qualquer forma esse professor ele é alinhado. O que é o
alinhamento? Todas as vezes que se chama esse professor são
apontadas referências de atuação para ele. Esse feedback é
constante. Entretanto, se eu falo e se já foi apontado na avaliação
do aluno, se foi continuamente apontada falhas na nossa avaliação
e nada for feito por este profissional, dá-se um tempo. A escola
sempre dá um tempo para esse profissional se alinhar, mas eu também
prezo pelo meu aluno. Então o meu aluno não pode pagar pelo
erro de um. Eu tenho a qualidade de muitos aqui, eu tenho vestibular
pela frente, eu tenho um compromisso, tá?
Quase não encontramos menção aos pais, tanto nas transcrições das
entrevistas das gestoras, quanto nas dos professores.
Mesmo sendo questionados sobre a participação dos pais na vida escolar
dos seus filhos, todos os entrevistados afirmaram que os mesmos só são
convidados a comparecerem à instituição caso haja problemas muito graves
envolvendo seus filhos. Mesmo nesse caso, os professores são poupados do
contato com os pais. A equipe gestora faz o máximo para evitar tal encontro.
Por outro lado, como evidenciam os fragmentos de transcrições mostrados
neste tópico, a opinião dos alunos é supervalorizada, evidenciando uma relação
que considera o aluno como um cliente da escola e, para sua satisfação, é
exigido grande esforço, por parte do professor, para agradar sua clientela.
159
Bolema, Rio Claro (SP), v. 27, n. 45, p. 143-164, abr. 2013
6.3 Manter-se atualizado quanto às avaliações versus administrar a própria
formação continuada
A competência de administrar sua própria formação continuada é
uma das citadas por Philippe Perrenoud. Tanto o professor MC como VA não
possuem nenhum tipo de formação complementar, além da graduação. Eles
sustentam que não se envolvem com programas de formação continuada devido
à elevada carga horária semanal de trabalho.
Já a professora MO participou de um programa de Pós-Graduação em
Tecnologias na Educação em uma instituição de ensino superior privada. No
entanto, ela nos esclarece que essa não foi uma experiência proveitosa:
MO – É, tecnologia. Mas eu diria que olha [...] só ficou no nome,
porque de tecnologia eu não aprendi nada. Aliás, eu não sei, eu
não aprendi nada na Pós.
Apenas o professor SA nos informou, à época da pesquisa, que estava
cursando uma especialização em Educação Matemática, em uma instituição
privada.
O fato dos professores não buscarem cursos de formação continuada
também é justificado pela consequente redução do número de aulas semanais
que eles teriam, caso optassem por realizar tais programas de estudo:
MC – Se eu for fazer o mestrado eu vou ter que diminuir minha
carga horária, vamos dizer pela metade. Ou mais da metade.
Quando eu terminar o mestrado e voltar para o colégio eu não vou
ter mais essas minhas aulas. Eu tenho um colega também, o professor
M. de Física, que é formado em Matemática, mas dá aula de Física,
que ele também sente essa mesma dificuldade: como é que nós vamos
fazer um mestrado se nós estamos nessa realidade? Então, assim,
eu estou tentando me preparar pra poder fazer um mestrado. Três
anos que eu estou nesse preparo aí, e eu vou adiando, vou adiando.
[...] Por que eu estou precisando até, assim do mestrado, não é?
Por que eu quero continuar, quero fazer na área de Educação
Matemática. Por que hoje eutrabalho nessa área, não é?
A instituição se fecha para influências de tendências educacionais que
levam em conta as pesquisas realizadas nos últimos anos. Essa blindagem é
evidenciada no depoimento de um professor que relata um evento intitulado
Semana Pedagógica que ocorre na semana que antecede o início do ano letivo.
Competências Profissionais de Professores de Matemática do Ensino Médio Valorizadas...
Bolema, Rio Claro (SP), v. 27, n. 45, p. 143-164, abr. 2013
160 NETO, V. F.; SILVA, M. A.
VA – A gente faz um trabalho na semana pedagógica, a gente tem
que realizar uma apresentação. Alguns professores são voluntários
para fazer uma palestra de acordo com o tema que ele vai escolher.
E para esse ano eu fiz uma palestrinha, mas vários professores
fizeram. Praticamente não vem quase ninguém de fora, fica entre
nós mesmo. É bem bacana.
Esse evento é fechado para profissionais da própria escola e o objetivo
principal é a divulgação e troca de boas experiências de ensino. No entanto, as
discussões centralizam-se na otimização do uso do material didático utilizado
pela instituição:
C – Este ano nós tivemos a professora MO de matemática, o SA de
matemática também, e a professora de Biologia, colocando para
todos os professores como eles tiveram resultados positivos com o
material [apostilado. Adotado pela escola, desde 2010, para todos
os anos do ensino médio]. [...] A gente não precisa trazer gente de
fora porque temos gente boa aqui.
Reforçando essa pretensa autossuficiência pedagógica da instituição,
um dos docentes relata que precisa manter-se atualizado quanto às tendências
dos exames vestibulares:
VA – E sempre focando o objetivo que é o vestibular, não é?
Principalmente o vestibular. Procuro baixar as questões do
vestibular, do assunto que estou tratando em sala. E falo: caiu no
vestibular isso. [...] Aí tem que já ir acostumando com o tipo de
questão que eles vão encarar.
O mesmo professor salienta que o objetivo fulcral do seu trabalho é
fazer com que os seus alunos alcancem bons resultados em avaliações externas
para promover a escola. Essa finalidade do ensino, na instituição, constitui uma
exaltação da cultura da performatividade.
VA – Trabalhar em cima do que eles vão prestar, não é? Por que é
o marketing, não é? É o marketing do colégio também. E, esse
negócio da colocação do ENEM, nossa, alavancou o colégio [...]
nesse nível social que o colégio atinge.
Na concepção do professor VA, para que um profissional seja
considerado bem-sucedido, exercendo a docência na escola pesquisada, é preciso
estar preparado para sanar todas as dúvidas dos alunos com relação às questões
dos exames vestibulares que eles realizarão, incluindo as tendências específicas
de cada prova. Sobre isso, ele afirma:
161
Bolema, Rio Claro (SP), v. 27, n. 45, p. 143-164, abr. 2013
VA – Tem que estar estudando essas provas que os meninos têm
tendência a resolver. Essas provas da FGV, FUVEST, UNICAMP,
UNESP, UEM, UEL, são provas que têm as questões de Matemática
bem elaboradas. [...] Ele [o estudante] tem que estar antenado
com as provas e com as tendências.
Portanto, a escola não se preocupa com a formação dos seus professores
realizada fora da instituição. Pelo contrário, assume que os docentes devem
preocupar-se apenas com a troca de informações entre eles, visando o bom uso
do material disponível e, principalmente, com a atualização em relação às
avaliações externas, identificando tendências que são consideradas informações
valiosas e podem representar a diferença entre a aprovação e a reprovação dos
seus estudantes.
7 Considerações finais
Nossas questões de pesquisa consistiram em discutir quais as
competências profissionais são valorizadas no contexto de excelência da escola
investigada e, também, como a cultura da performatividade influencia o trabalho
dos docentes que lá atuam.
Ao final de nossa investigação, concluímos que as competências
profissionais enfocadas neste artigo e elencadas por Philippe Perrenoud –
administrar a progressão das aprendizagens; informar e envolver os pais;
administrar sua própria formação continuada – são pouco ou nada valorizadas
por uma das instituições de ensino mais bem conceituadas em âmbito nacional,
levando-se em conta os resultados de seus alunos em uma avaliação externa.
A partir da análise da valorização ou não dessas competências,
verificamos que outras são extremamente valorizadas, tanto pela equipe gestora
quanto pelos próprios professores de Matemática do ensino médio: administrar
o tempo; relacionar-se bem com os alunos; manter-se atualizado quanto às
avaliações.
Essas três competências que emergiram a partir da análise das
transcrições, representaram um antagonismo em relação às outras três citadas
por Philippe Perrenoud. A figura 1, apresentada a seguir, ilustra como esse
processo antagônico, constituído por oposições de competências profissionais, é
mediado pela supremacia da cultura da performatividade existente na instituição
investigada.
Competências Profissionais de Professores de Matemática do Ensino Médio Valorizadas...
Bolema, Rio Claro (SP), v. 27, n. 45, p. 143-164, abr. 2013
162 NETO, V. F.; SILVA, M. A.
Figura 1 – Algumas competências consideradas relevantes pela escola e as relações
que se podem fazer com as competências profissionais elencadas por Perrenoud
Constatamos, em quase todas as transcrições, a preocupação com os
resultados dos estudantes e dos próprios professores. É evidente que não estamos
questionando a busca por bons resultados em testes. O que verificamos é a
supervalorização dessas ações, caracterizando uma espécie de obsessão pela
obtenção dos conceitos máximos em todos os exames. Esse fato ressalta o peso
da cultura da performatividade nas ações e nas decisões tomadas na instituição
investigada.
Muitas vezes, seduzido pelo bom salário que recebe e pela valorização
social que conquista, o professor que trabalha em tal instituição se rende ao
culto ao desempenho, mesmo tendo sua prática e até suas convicções modeladas,
deturpadas e aviltadas.
A escola investigada conquistou um ótimo desempenho no ENEM 2009.
Ocorre que, para atingir esse objetivo, a ênfase na performatividade deixa para
trás várias metodologias e resultados de pesquisa que a Educação Matemática
trouxe nas últimas décadas, o que é de se esperar, já que os objetivos da instituição
de ensino são completamente diferentes das visões sobre educação que as
contribuições dos educadores matemáticos trazem.
A partir dessa oposição, configura-se um debate que precisa ser feito, a
partir de questões como: que Educação Matemática queremos para os futuros
estudantes? Prepará-los para testes? Para o mercado de trabalho? Para o
prosseguimento dos estudos? Para a formação da cidadania? Isso se confunde
com o próprio estatuto indefinido do ensino médio brasileiro e com os objetivos
para a educação, mas seria recomendável que a Educação Matemática se
posicionasse claramente sobre esses assuntos.
163
Bolema, Rio Claro (SP), v. 27, n. 45, p. 143-164, abr. 2013
A pesquisa em Educação Matemática sobre instituições com ótimo
desempenho em avaliações em larga escala parece um campo promissor a ser
investigado, porém ainda pouco explorado.
Esperamos que a leitura deste artigo suscite novas pesquisas em escolas
que, por um lado são consideradas pela sociedade como sendo de excelência,
mas, por outro lado estão à margem das discussões educacionais contemporâneas.
Talvez, a exposição dessa incoerência leve à reflexão sobre a
necessidade de reformular os objetivos de avaliações em larga escala como o
ENEM e, consequentemente, modifique o enfoque do próprio objetivo do ensino
médio brasileiro que, pelo menos para a elite investigada por nós, parece caminhar
cada vez mais em direção a uma educação propedêutica.
Referências
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Sociedade, Campinas, v. 25, n. 89, p. 1105-1126, set./dez. 2004.
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Submetido em Abril de 2012.
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