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Uma perspectiva psicanalítica sobre o TDAH-152

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Foi com este viés que procuramos circunscrever redes explicativas e compreensivas sobre o 
chamado TDAH, a partir do marco teórico da psicanálise, de reflexões epistemológicas sobre a 
constituição das ciências e dos saberes modernos, bem como de uma revisão da literatura médico-
científica. 
Como indicamos na Introdução, consideramos a instigante polêmica em torno de uma possível 
causalidade neurofisiológica cerebral; porém, o que problematizamos não foi tal direção, mas a 
excessiva e cada vez mais precoce medicalização infantil, justificada por tais hipóteses e estudos 
clínicos. 
Ademais, como buscamos destacar, a diversidade de quadros clínicos presentes nas crianças 
encaminhadas ao Serviço de Psicologia/UFBA nos fez questionar a presença de um único 
diagnóstico: TDAH. Com essa nomeação médico-psiquiátrica, o Serviço acolheu e acolhe 
crianças pequenas com dificuldade em sustentar a atenção por períodos longos na escola; outras 
com excessiva atividade motora; alguns apáticos e outros manifestando agressividade; relatos da 
escola ou família sobre práticas sociais infantis tidas como inadequadas, por não serem aceitas 
naquele contexto, até crianças e adolescentes em que a presença de déficit de atenção e de 
agitação intensa estava associada a quadros psicóticos, a uma depressão ou à debilidade mental. 
Diante dessa abrangência de manifestações sintomáticas reunidas sob o rótulo de TDAH, 
passamos a considerar a hipótese de um uso indiscriminado e, por vezes, abusivo do diagnóstico. 
Fomos instigados, então, a receber tais demandas e a escutá-las na clínica psicanalítica, cujo 
cerne é levar em conta a singularidade do sujeito, oferecendo-lhes um lugar de palavra para além 
da queixa, seja ela proveniente do próprio sujeito, do meio social próximo ou estendido. 
A partir desses casos trazidos pelos estagiários, começamos a estudar a descrição do quadro 
“Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade”, tal como se apresenta para as ciências 
médicas, isto é, tal como construído pelo discurso médico. Em seguida, e com base em premissas 
epistemológicas e conceituais da psicanálise, promovíamos a (re)discussão de cada queixa e de 
cada quadro sintomático, aparentemente estabilizados naquele diagnóstico-sigla. O objetivo 
desses encontros era conduzir-nos, estudantes, psicólogos e supervisora, à construção de um 
espaço diferenciado de reflexão acerca da complexidade de um tema que é, ao mesmo tempo, 
recente e antigo, sem eludir nem diluir a dimensão de sujeito, recoberta pela sigla diagnóstica, 
mas pronta a se manifestar no contexto da escuta clínica.

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