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Condomínios - Conflitos e Soluções Condomínios - Conflitos e Soluções Márcio Rachkorsky é advogado especialista pelo Centro de Extensão Universitária - CEU, membro efetivo da equipe " Chame o síndico" do Fantástico- Rede Globo, membro da Comissão de Direito Urbanístico da OAB- SP, docente do SENAC, consultor do portal do síndico, articulista do Jornal do Síndico e da Revista Em Condomínios, palestrante e conferencista. Carta Forense - Os condomínios podem ser considerados como um grande mercado de trabalho para os advogados? Márcio Rachkorsky - Tenho plena convicção que os condomínios representam um vasto mercado de trabalho e oportunidades para os advogados, sobretudo nos grandes centros urbanos. Na cidade de São Paulo, por exemplo, há mais de 27.000 (vinte e sete mil) condomínios, que anualmente movimentam bilhões de reais, gerando centenas de milhares de empregos diretos e indiretos. Para uma boa gestão, indispensável ao condomínio uma assessoria jurídica de qualidade, especialmente por conta da pesada responsabilidade civil, criminal e tributária carreada ao síndico. Além da consultoria preventiva, o advogado pode também atuar nos seguintes casos, comuns na grande maioria dos condomínios: - análise de contratos diversos, tais como de administração do condomínio, manutenção de elevadores, prestação de serviços, terceirização de mão de obra, etc.. - cobrança extrajudicial e judicial aos condôminos inadimplentes; - comparecimento nas assembléias gerais e reuniões do corpo diretivo; - atualização da convenção de condomínio; - elaboração de pareceres; - envio de notificações extrajudiciais; - distribuição de ações judiciais em face da construtora; CF - Quais as principais habilidades que o mercado de condomínios exige do advogado? MR - Para bem atuar na área de condomínios, o advogado precisa possuir amplo conhecimento e vivência no direito imobiliário, conhecer muito bem a Lei de Incorporações Imobiliárias (Lei 4.591/64), conhecer profundamente o Código Civil, em especial o Capítulo que trata dos "Condomínios Edilícios". O mercado exige constante atualização e reciclagem do profissional, à medida que muitas questões importantes são resolvidas através de interpretação de dispositivos legais e jurisprudenciais , bem como através de analogia. Advogar para condomínios requer do profissional plena desenvoltura para falar em público, paciência para ouvir opiniões e idéias diversas e acima de tudo um enorme discernimento para fazer valer uma palavra essencial: BOM-SENSO. Por fim, indispensável uma esposa ou marido compreensivo, pois advogar para condomínios significa quase sempre chegar tarde da noite em casa, por conta das exaustivas assembléias gerais. CF - Qual o impacto gerado nos condomínios, com a redução da multa ao condômino inadimplente de até 20% para apenas 2%? MR - Obviamente a redução da multa gerou aumento da inadimplência. Porém, o grande malefício gerado pela drástica redução da multa foi a criação de uma nova categoria de inadimplentes, os chamados "devedores não contumazes", que constantemente pagam o condomínio com um ou dois meses de atraso, eis que privilegiam o pagamento de todas as outras contas com maiores penalidades (cartão de crédito, cheque especial), em detrimento da quota condominial, justamente porque a multa é ínfima. Essa nova categoria de inadimplentes inviabiliza por completo uma boa gestão financeira e destrói a previsão orçamentária do condomínio. Entendo que a multa diária de 0,33%, limitada a 10% traria mais equidade na relação condomínio/devedor. CF - Existe uma fórmula mágica para reduzir a inadimplência nos condomínios? MR - Por todo Brasil, tenho acompanhado verdadeiras aberrações jurídicas. Com idéias mirabolantes, advogados e administradores prometem acabar com a inadimplência e, não raramente, colocam o cliente em sério risco. Sugerem a cobrança de juros de mercado; a proibição de uso dos elevadores e equipamentos sociais; o reajuste da quota e um desconto pontualidade, caracterizando multa mascarada, dentre outros caminhos. Não canso de repetir que o combate à inadimplência deve ser feito dentro da legalidade e através de amplo trabalho de conscientização dos moradores e efetividade na cobrança. Deve o advogado, com bastante celeridade, adotar diversas providências face ao condômino inadimplente, a começar pelo envio de uma cartinha de cobrança, passando por um plantão de cobrança, culminando com a propositura de ação judicial, caso infrutíferas as tentativas de recebimento amigável. CF - Muito se fala em "expulsão/exclusão do condômino anti-social". Tal procedimento é juridicamente possível no Brasil? MR - Já pesquisei muito sobre o assunto e, para minha surpresa, em muitos países a lei contempla tal procedimento. Na Suíça, é prevista a exclusão do condômino autor de faltas graves e a venda judicial da unidade. No Uruguai, está previsto o despejo de ocupantes nocivos. Até na Argentina há previsão legal para o seqüestro do imóvel, em caso de uso nocivo da propriedade. O novo Código Civil não fala expressamente em exclusão, mas prevê pesadas multas aos condôminos nocivos. Todavia, o Parágrafo Único do artigo 1.337 do Código Civil fala em "reiterado comportamento anti-social" e "incompatibilidade de convivência com os demais condôminos", abrindo, ao meu ver, uma lacuna interpretativa para a discussão profunda acerca da possibilidade de exclusão do chamado condômino anti-social. Certamente os operadores do direito trabalharão muito o tema e, com o passar dos anos, a jurisprudência construirá sólida fundamentação para tal avanço social. CF - Quais as lições extraídas das gravações do quadro "Chame o Síndico" na Rede Globo e das palestras ministradas por todo Brasil? MR - Participar das gravações do "Chame o Síndico" foi uma experiência maravilhosa e me fez realmente acreditar na grandeza do tema "viver em condomínio" e sobretudo consolidou a importância da atuação conciliadora e mediadora do advogado, como verdadeiro pacificador social. O quadro no Fantástico trouxe o assunto à baila e agora, felizmente, a mídia escrita, falada e televisiva aborda com freqüência o tema "viver em condomínio". Nas minhas andanças pelas grandes capitais do Brasil, pude concluir que os problemas enfrentados por síndicos, administradores e advogados são basicamente os mesmos e que os assuntos preferidos nos Tribunais são: inadimplência, barulho, cachorro, intolerância, vagas de garagem, vazamentos, briga de vizinhos, questões trabalhistas, multas e falhas construtivas. CF - Lembra de algum caso pitoresco ou engraçado ocorrido em condomínio? MR - Lembro de um sensacional: Num condomínio de luxo, recém entregue pela construtora, o fluxo de prestadores de serviços (pedreiros, marceneiros, gesseiros, montadores de móveis, etc.) era muito grande. Num dos apartamentos, a proprietária, muito excêntrica, resolveu mandar quebrar o banheiro e instalar uma bela banheira (estilo ofurô), para seus longos banhos. Eis que o pedreiro contratado para executar os serviços compareceu no dia marcado e, 04 dias depois, a obra estava concluída. Todavia, um pequeno equívoco aconteceu... A bela reforma fora executada no apartamento 31 e não no 21 !!!!!!!!!! Resultado: O pedreiro nada recebeu; a proprietária do apartamento 21 ficou enlouquecida e o mocinho do 31 toma longos e memoráveis banhos em sua faraônica banheira. E para finalizar, porteiro e zelador foram demitidos. CF - Os cursos de graduação formam profissionais capacitados para o mercado imobiliário? MR - Decididamente não ! É lamentável, principalmente nos grandes centros urbanos, não haver na grade curricular um semestre dedicado ao direito imobiliário, mais especificamente parao direito aplicado aos condomínios. Além do ensino acerca dos direitos reais e da propriedade, os alunos deveriam aprender mais sobre as incorporações imobiliárias e condomínios edilícios. CF - Os condomínios, antes considerados verdadeiros oásis de segurança, hoje são alvos de assaltos cinematográficos. Qual sua opinião sobre o tema? MR - Recentemente tive a oportunidade de acompanhar brilhante palestra do meu amigo Capitão PM José Elias de Godoy e aprendi muito sobre a natureza dos crimes ocorridos nos condomínios. Há basicamente duas modalidades. Os arrastões, normalmente praticados por quadrilhas especializadas, bem organizadas e fortemente armadas, que preferem os edifícios de luxo, onde roubam jóias, dólares, equipamentos eletrônicos e até carros de luxo. A segunda modalidade, são os chamados crimes pontuais ou eventuais, praticados por meliantes oportunistas, sem qualquer planejamento ou organização. Trata-se do roubo ou furto cometido pelo criminoso que se aproveita de uma facilidade de acesso ao condomínio ou da distração de algum morador, porteiro, entregador ou prestador de serviço. E tal meliante pontual é extremamente perigoso e violento, justamente por conta de seu despreparo e por estar, na maioria das vezes, sob efeito de drogas. Assim, temos que o combate aos cinematográficos arrastões, requer, acima de tudo, grande planejamento e investimento em projetos de segurança, compra e instalação de equipamentos, contratação de seguranças, obras estruturais, blindagem de guaritas e contratação de assessoria especializada. Já o combate aos crimes pontuais, tão ou mais importantes que os arrastões, requer, essencialmente, um esforço contínuo de conscientização dos moradores e porteiros, no sentido de atenção a pequenos vacilos do dia-a-dia, que podem facilitar o ingresso de um meliante ao condomínio. CF - Para as ações judiciais de cobrança de quotas condominiais, as inovações da Lei 11.232/05 representam um grande avanço? MR - Como frisei em artigo escrito na Carta Forense, edição de outubro/06, a nova lei trouxe racionalização e simplificação ao sistema processual, verdadeira unicidade entre o procedimento de conhecimento e executivo. Ademais, a nova lei fixa importante penalidade ao devedor-executado, eis que, a requerimento do credor, a dívida não paga após 15 (quinze) dias da intimação, será acrescida de multa punitiva de 10% (dez por cento) sobre o montante total devido. CF - Todo condomínio tem um morador barulhento, que sistematicamente incomoda seus vizinhos. Há algo a fazer contra ele? MR - Pertubar o sossego do vizinho é crime ! O barulho, certamente, é o maior responsável por desentendimentos entre vizinhos nos condomínios. O assunto é delicado e polêmico, sobretudo porque os limites e preferências das pessoas são extremamente variáveis, o que torna ainda mais difícil impor regras claras acerca do que é barulho tolerável. A verdade é que a poluição sonora constitui grave infração dos deveres de vizinhança, valendo a máxima de que "todos têm o direito de fazer, ou não fazer, em sua casa o que bem entender, desde que não cause nenhuma intranqüilidade ou dano ao seu vizinho". Apelar para o bom-senso é sempre a melhor saída. Perturbar o sossego alheio (mediante gritaria, algazarra, abuso de instrumentos musicais, sinais acústicos, dentre outras situações) é crime, nos moldes do artigo 42 do Decreto-Lei Nº 3.688/41, passível de prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, ou multa. CF - E o barulho causado por animais domésticos? MR - Mais uma questão extremamente controvertida nos condomínios, pois discute-se a própria validade da estipulação proibitiva da mantença de animais em apartamentos, sendo comum o Judiciário rechaçar tal proibição, salvo quando o animal produzir alguma espécie de grave incômodo. Eis então mais uma árdua missão aos síndicos, administradores, advogados, zeladores e condôminos: decidir quando determinado barulho configura desrespeito ao sossego alheio. Realmente a questão caminha sobre uma linha tênue e não raramente os casos concretos acabam na Delegacia ou no Fórum. Na grande maioria das situações, a letra fria da Lei ou da convenção de condomínio cede espaço às normas surgidas através do convívio social entre os vizinhos, de forma que cada comunidade acaba por definir seus próprios limites, levando em consideração a faixa etária dos moradores, os equipamentos e áreas de lazer, dentre outros aspectos. Cabe lembrar que o condômino "barulhento", alem das sanções criminais, pode ser penalizado com as multas previstas na convenção de condomínio, regulamento interno e nos artigos 1.336 §2º e 1.337 do Código Civil. CF - Quais cuidados devem ser adotados, nos casos de arrematação de unidade autônoma em leilão judicial? MR - O artigo 1.345 do Código Civil Brasileiro determina expressamente que "O adquirente de unidade responde pelos débitos do alienante, em relação ao condomínio, inclusive multas e juros moratórios." Logo, quem adquire uma unidade autônoma passa a ser responsável por toda e qualquer dívida de condomínio existente naquele imóvel, em razão da natureza propter rem das despesas, sempre vinculadas ao próprio imóvel. Muito embora a Lei e a Jurisprudência não deixem qualquer dúvida acerca da responsabilidade do adquirente pelas dívidas do imóvel, muitas pessoas que arrematam unidades autônomas em leilões judiciais se dizem surpreendidas pela existência de altíssimas dívidas de condomínio e não raramente tentam esquivar-se de tal pagamento, através da via judicial. Para evitar longos e desgastantes litígios após a arrematação de imóvel em leilão judicial, atrasando ainda mais o recebimento do crédito pelo condomínio, os advogados devem, em todos os casos, fazer constar no edital de praça e leilão o montante total dos débitos condominiais incidentes sobre o imóvel a ser leiloado, fazendo constar inclusive que todas as parcelas vincendas até a efetiva praça serão incluídas no saldo devedor. Jornal Carta Forense, quarta-feira, 19 de março de 2008
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