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CAPÍTULO 1 Introdução ao Sistema Cardiovascular 1. CASO CLÍNICO Sr. Jorge, 58 anos, aposentado, comparece ao atendimento acompanhado da sua neta para avaliação de rotina. Ele nega queixas importantes e deseja passar por uma avaliação geral. Nega possuir doenças crônicas e uso de medicações contínuas. Após questionamentos, informou apresentar episódios frequentes de cefaleia em situações de estresse, como, quando perde partidas seguidas de baralho para sua esposa Marizete. Hábito de lazer dos fi nais de semana. Questionado, então, sobre a alimentação da família, Sr. Jorge informa que sua esposa e fi lho possuem “pressão alta”, e que por isso tentam regular a ingesta de sal. Porém, não há outras restrições alimentares e, frequentemente nos fi nais de semana, eles comem feijoada, lasanha, pizza, cachorro quente e comida japonesa, além de três a cinco latas de cerveja. Quanto à pratica de exercícios físicos, alegou fazer uma ou duas caminhadas de aproximadamente 30 minutos durante a semana. Sobre seu histórico familiar, informou que sua mãe, falecida aos 60 anos, também era hipertensa. Ao exame físico se obteve uma circunferência abdominal de 108 cm e uma pressão arterial sistêmica de 138 x 84 mmHg. Sem outras alterações dignas de nota. Dr. Barros esclarece que tudo indica para a possibilidade de Sr. Jorge ser também portador de hipertensão arterial sistêmica, explicando que seus hábitos e esta alteração do exame físico podem estar prejudicando a circulação nas artérias e, consequentemente, o risco de isso acometimento futuro da sua visão, dos rins, cérebro e até do coração. Entretanto, alega que precisaria avaliá-lo daqui a um mês para confi rmar essa hipótese. Enquanto isso, acorda com Sr Jorge que ele e sua família mudariam imediatamente de hábitos alimentares e que iniciariam uma prática regular de caminhadas de pelo menos 30 minutos cinco vezes na semana até o novo encontro. Enzo, o neta do Sr. Jorge, até então calado, inicia uma série de questionamentos destinados ao Dr. Barros: “O que são artérias?”, “O que elas têm a ver com o coração de meu avô?”. Dr. Barros, surpreso com a curiosidade da moça, resolve utilizar isso duplamente ao seu favor – “As artérias são como tubos por onde o sangue circula pelo corpo de seu avô. Se você ajudar seu avô a seguir o que acordamos, na próxima consulta, ele(a) (apontando para você, acadêmico de Medicina que estava sentado no canto do consultório durante todo esse tempo) irá te explicar como funciona a circulação com detalhes e te apresentar os tipos de vasos que possuímos em nosso corpo. O que acha?” – E assim, ele conseguiu uma parceira para cuidar da saúde de seu paciente e ainda deu ao seu acadêmico aquela motivação para os estudos que andava em falta. O que você acha que precisa estudar para não decepcionar a Polyanna e o Dr. Barros? 1. Possíveis palavras desconhecidas “doença crônica”: Uma doença crônica, geralmente, se difere de uma doença aguda pelo tempo de instalação, sendo a crônica caracterizada por uma doença já estabelecida e a aguda por um acometimento recente. O tempo que delimita a classificação depende da doença. “hipertensão arterial sistêmica”: Hipertensão, popularmente chamada de “pressão alta”, é ter medidas de pressão arterial, sistematicamente, igual ou maior que 130 por 80 mmHg (1), de acordo com a última diretriz americana sobre o assunto. 2. Palavras-chaves “Doenças crônicas”, “dores de cabeça”, “pressão alta”, “hábitos alimentares”, “exercícios físicos”, “circunferência abdominal”, “pressão arterial sistêmica”, “hipertensão”, “mãe falecida aos 60 anos”, “circulação”, “artérias”, “vasos”, “coração”. 3. OBJETIVOS Descrever o sistema circulatório e suas funções • Caracterizar os tipos de vasos sanguíneos Caracterizar os tipos de vasos sanguíneos 2. INTRODUÇÃO AO SISTEMA CIRCULATÓRIO 1. DEFINIÇÕES, COMPOSIÇÃO E FUNÇÕES Desde o início dos estudos na biologia, aprende-se que o corpo humano é composto por unidades denominadas de células. Mais adiante, ao decorrer dos anos colegiais, aprofundam-se os conhecimentos a respeito dos processos metabólicos que ocorrem nestas unidades, desde a produção de energia (ATP) até a sua utilização nos mais diversos mecanismos celulares. Sendo assim, passamos a visualizar as células como “microfábricas” que necessitam de recursos para seu funcionamento: o oxigênio que inspiramos em nossos pulmões e os nutrientes extraídos da nossa alimentação através do sistema digestório. Além disso, as células precisam expulsar os resíduos dos processos metabólicos, como o dióxido de carbono (CO2). Em resumo, assim como uma fábrica, para as células se faz necessária uma extensa rede de transporte para fornecer recursos e extrair resíduos. Em outras palavras, existem estruturas que carregam até as células o que lhes é necessário e trazem delas o que se tornou inútil para a eliminação. Apresento-lhe o sistema circulatório. O sistema circulatório é uma grande rede de tubos (os vasos) em que uma bomba (o coração) faz com que o fluído do sistema (o sangue) circule por todo o corpo. Entretanto, o sistema não se limita apenas à função de transporte. Ele também tem a função de redistribuir e dispersar o calor pelo corpo, algo que não é difícil de compreender se você lembrar um pouco da física. O sangue circulante absorve o calor produzido nos processos metabólicos e durante o seu trajeto, redistribui este calor que foi armazenado para as zonas mais frias. Já a dissipação fica por conta dos vasos periféricos que trocam calor com o ambiente. E é por isso que algumas pessoas de pele muito clara ficam mais vermelhas em locais quentes, pois o corpo está direcionando o sangue para a superfície, objetivando dissipar o excesso de calor. Por outro lado, pensando em um ambiente frio, são suas extremidades que ficam mais frias e perdem mais a cor, pois o corpo está direcionando o sangue para o interior do corpo. Estratégia para preservar o calor que está produzindo no metabolismo. Para realizar tais funções, o sistema circulatório engloba dois sistemas: o sistema cardiovascular e o sistema linfático. O primeiro tem o papel principal na circulação, ao passo que o sistema linfático possui uma participação mais coadjuvante, como veremos nos dois próximos parágrafos. O sistema cardiovascular é composto pelo coração e pelos vasos sanguíneos: as artérias, as veias e os capilares. O coração, através de suas contrações, irá proporcionar o movimento do sangue através das artérias, que são vasos eferentes ou vasos de saída – isto é, as artérias têm, na sua ponta proximal o coração ou outra artéria que saiu do coração e seguem em direção a um leito capilar que já abordaremos adiante. O sangue apresentará fluxo unidirecional neste circuito devido a basicamente dois mecanismos: o fechamento das válvulas cardíacas (Capítulo 04) e o funcionamento das válvulas venosas, que ainda abordaremos neste capítulo. Por conseguinte, a partir do coração, o sangue, ejetado pela artéria aorta, alcançará, através de seus ramos, todo o corpo. Como um tronco de uma árvore, a artéria aorta se ramifica e essas ramificações vão aumentando em quantidade e diminuindo em diâmetro até chegar aos leitos capilares, tão difundidos pelo corpo que pode chegar a uma extensão de 96000 km. Esses capilares possuem fenestrações (aberturas ou buracos) que servirão para transbordar parte do seu conteúdo no espaço intersticial (espaço entre células) onde ocorrerá troca direta de oxigênio, nutrientes e excretas. Ainda nos leitos capilares, a maior parte do conteúdo, agora pobre em oxigênio e nutrientes, é reabsorvido e segue pelas veias, ao mesmo tempo que o conteúdo restante é absorvido pelos vasos linfáticos que desembocam posteriormente em veias de maior calibre. O sangue então seguirá pelas veias, vasos aferentes ou de chegada - isto é, as veias sempre possuem na sua ponta distal uma outra veia ou o coração e surgiram de um leito capilar. E inversamente às artérias, as veias se convergem até se tornarem cada vez maiores e, finalmente, retornar ao coração,fechando o circuito (Figura 1.1). E quanto ao sistema linfático? Seus vasos, estruturalmente muito simples, compostos apenas por uma camada de endotélio e por uma lâmina basal incompleta, formam uma rede de drenagem alternativa ao líquido intersticial para que retorne ao sistema venoso (Figura 1.2). Cerca de 10% do líquido intersticial segue esta rota, em detrimento da rota venosa clássica – ainda bem, porque esta rota constitui a única possível para trazer de volta as proteínas que foram lançadas ao interstício e, se não fosse por esse mecanismo, as proteínas se acumulariam, trariam consigo água (pressão oncótica que veremos no próximo capítulo) e todos viveríamos com edema periférico (inchaço por líquido). Neste caminho, a linfa (nome que se dá ao líquido presente no sistema linfático), irá banhar linfonodos, tonsilas, baço e convergir até dois grandes troncos: o ducto torácico (à esquerda) e o ducto linfático direito, que desembocarão na junção das veias jugular interna esquerda com subclávia esquerda e na confluência das veias jugular interna direita com veia subclávia direita, respectivamente (Figura 1.3). Figura 1.1: Visão geral do sistema circulatório. Do coração, no centro da imagem, saem as artérias que se dividem em artérias menores, arteríolas e capilares, onde há extravasamento de sangue para o espaço intersticial e troca nutrientes e excretas, retornando para a circulação venosa (azul) em vênulas, depois veias menores que convergem até formar as grandes veias que retornam ao coração. Uma via alternativa pode ser tomada: a circulação linfática (verde) coleta linfa do interstício, passa por nodos linfáticos e retorna para a circulação venosa em grandes veias próximas ao coração. Figura 1.2: Circulação linfática torácica (retirada do Netter). Figura 1.3: Figura esquemática mostrando o espaço intersticial rondado por capilares arteriais, venosos e linfáticos. Esse trajeto (coração -> leitos capilares sistêmicos -> coração), parte inferior da Figura 1.1, é denominado Circulação Sistêmica ou Grande Circulação. O sangue que retorna ao coração será agora enviado aos pulmões pela artéria pulmonar para uma nova oxigenação, retornando pelas veias pulmonares ao coração, quando se reinicia o ciclo. Este trajeto (coração -> leitos capilares pulmonares -> coração), parte superior da Figura 1.1, é denominado Circulação Pulmonar ou Pequena Circulação. Portanto, se considerarmos a circulação pulmonar, podemos verificar que as definições de artéria e veia, não guardam relação com os níveis de oxigenação do sangue presente em um ou outro vaso, e sim, se este vaso está levando sangue do coração para os demais órgãos (artérias) ou se está trazendo sangue dos órgãos de volta ao coração (veias). Afinal os vasos que desembocarão o sangue oxigenado ao coração são as veias pulmonares. Você prestou atenção que escrevemos no parágrafo anterior? Desliga esse celular, vamos repetir para você: o que define se um vaso é artéria ou veia não é a oxigenação do sangue nele presente, muito menos a cor com que desenharam no livro de anatomia. O dado que realmente importa nessa definição é: a artéria sai do coração em direção aos órgãos, e a veia volta dos órgãos em direção o coração. Agora que você entendeu, sem querer dificultar, você precisa saber que existe uma exceção a essa regra: a circulação “porta”. Neste caso, o sangue flui de uma veia para outro órgão, antes de retornar ao coração. Um exemplo clássico disso é demonstrado na circulação do fígado: 75% do sangue que entra neste órgão é proveniente da veia porta hepática que coletou o sangue do baço, estômago, vesícula, pâncreas e, principalmente, o intestino (2). Calma, isso não precisa ser decorado. O importante é entender a razão de existir essa exceção: uma das grandes funções do fígado é desintoxicar o corpo. Sendo assim, ele atua como um “porteiro” e “lixeiro”, recebendo o sangue contaminado destas regiões e eliminando as substâncias nocivas, antes que elas cheguem ao coração e ganhem acesso irrestrito a todos os órgãos do corpo (imagine a quantidade de lixo que entrou na sua circulação após aquela feijoada pós- prova no fim do semestre e imagine se não existisse o fígado para te proteger disso). Agora que os conceitos mais básicos foram apresentados, você é capaz de entender como dividiremos nosso estudo. Em um primeiro momento, focaremos nas vias do sistema, os vasos sanguíneos, quando abordaremos a tríade básica: anatomia, histologia e fisiologia de uma forma integrada. Em um segundo momento, passaremos para a bomba, o coração, novamente utilizando a tríade na mesma metodologia. Desta forma, ao final do livro, você terá sido apresentado aos principais tópicos do sistema de uma forma gradual e associada, facilitando a sua compreensão. 3. ARTÉRIAS, VEIAS E CAPILARES Se a gente pudesse ligar todos os vasos sanguíneos de nosso corpo em uma única linha, o comprimento desta linha seria duas vezes a circunferência do nosso planeta terra. E por que isso é importante? Essa informação, além de te fazer perder a dimensão restrita que pode ter sido criada de alguns poucos tubos ligando o coração aos demais órgãos, instiga a curiosidade de saber como algo tão extenso ocupa o interior de nosso corpo. A resposta para esse possível enigma são as variadas dimensões dos vasos. Assim como dividimos os vasos sanguíneos a depender da direção de seu fluxo, podemos dividi-los em subtipos a depender de suas dimensões e características histológicas. Quanto às dimensões, os diâmetros dos vasos variam desde aproximadamente 40 mm (3 cm2 de área transversa) de uma artéria aorta a capilares invisíveis a olho nu. Por isso, outra forma de divisão possível do sistema cardiovascular é em macrocirculação, que engloba os vasos que possuem mais de 0,1mm em diâmetro, e microcirculação que abrange os vasos menores que 0,1mm em diâmetro. Em relação às características histológicas, sabemos que os capilares são formados por uma única camada endotelial, enquanto as artérias e veias possuem três camadas principais, como podemos ver na Figura 1.4. Estas camadas possuem características gerais e alguns detalhes específicos que diferenciam cada subtipo. Estas camadas histológicas nos vasos sanguíneos são chamadas de túnicas: a túnica íntima, a túnica média e a túnica adventícia. Figura 1.4: Corte demonstrando camadas das artérias e veias. 1. AS CARACTERÍSTICAS GERAIS DAS TÚNICAS Dentre as três camadas dos vasos, a mais interna é denominada túnica íntima. Esta reveste o interior do vaso sanguíneo e é constituída por uma única camada de células endoteliais pavimentosas, o que chamamos nos vasos sanguíneos de endotélio. Essas células se ancoram em uma fina lâmina de transição para o tecido conjuntivo que denominamos de lâmina basal. Posteriormente, temos um tecido conjuntivo frouxo, que chamamos de camada subendotelial, onde podem estar presentes também células musculares lisas dispostas longitudinalmente. Por fim, temos uma fina camada limitante que chamamos de lâmina elástica interna que separa a túnica íntima da túnica média. O que a túnica íntima possui de simplicidade estrutural, possui de complexidade funcional, e todas essas fascinantes funções que você lerá nos tópicos abaixo só foram descritas a partir do ano de 1980(3). As células endoteliais, as grandes estrelas da histologia circulatória e mais fascinantes também, desenvolvem papel crucial na troca de substâncias Secreção de colágeno dos tipos II, IV e V; Secreção de substâncias pró-coagulantes, como Fator de von Willebrand, PAI-1, fator V ativado e também de substâncias anti- coagulantes como prostaciclinas, tPA e heparinas. Isso tem importância crucial na manutenção da sua vida: quando a secreção de substâncias pró-coagulantes é mais ativada, corrige pequenos danos à sua circulação. Ao passo que quando um homem sofre um infarto agudo do miocárdio (oclusão total de uma artéria que irriga o coração), as substâncias anti-coagulantes teoricamente devem estar mais ativadas, para reduzir o dano causado e tentar “abrir”essa artéria(4); Secreção de fatores vasoativos, ou seja, têm a capacidade de diminuir ou aumentar o diâmetro do vaso, aumentando a pressão em seu interior e redirecionando seu fluxo. Essas substâncias são responsáveis pelo controle da pressão arterial e a disfunção delas está quase invariavelmente presente nos choques hemodinâmicos. São elas: (1) o óxido nítrico (ON ou NO), com suas propriedades endoteliais descobertas em 1980 e cuja pesquisa rendeu ao seu autor o prêmio Nobel da Fisiologia e Medicina em 1988. O ON possui propriedades vasodilatadoras, anti-inflamatórias e anti- coagulantes (5,6); (2) a endotelina, descoberta em 1988(7), uma substância vasoconstrictora potente, ou seja, capaz de reduzir o diâmetro do vaso; Possuem enzimas ligadas à membrana, como a enzima conversora de angiotensina, que converte angiotensina I em angiotensina II (também um vasoconstrictor), que também terá papel fundamental na regulação da pressão arterial.; Conversão de bradicinina, serotonina, prostaglandinas, norepinefrina e trombina. Todas essas substâncias com capacidade de regular o fluxo sanguíneo por causar vasoconstricção ou vasodilatação serão melhor detalhadas no capítulo 3. Realizam lipólise de lipoproteínas para transformá-las em triglicerídios e colesterol. Quanto à túnica média, esta é, geralmente, a camada mais espessa dos vasos. Ela é composta por camadas concêntricas de células musculares lisas organizadas helicoidalmente, circundada por uma matriz extracelular composta de fibras elásticas e reticulares, além de proteoglicanos e glicoproteínas. Limitando a túnica média podemos encontrar a lâmina elástica externa. Ela é semelhante à lâmina elástica interna, porém mais delgada e podemos encontra-la apenas nas artérias, principalmente em um subtipo que são as artérias musculares, como veremos adiante. A túnica adventícia é a camada de revestimento dos vasos e torna-se gradualmente contínua com o tecido conjuntivo pelo qual o vaso está passando. Ela é composta, principalmente, por fibroblastos, fibras de colágeno tipo I e fibras elásticas dispostas longitudinalmente. A túnica adventícia possui fenestrações que permitem a nutrição da porção mais interna da túnica média por difusão dos nutrientes do sangue circulante. Afinal, as células dos vasos sanguíneos também precisarão receber os recursos necessários para seu metabolismo e, por isso, em grandes vasos, existe a presença de vasa vasorum (“vasos dos vasos”). São arteríolas e vênulas muito pequenas que penetram pela túnica mais externa (adventícia) e nutrem esta camada e a camada média. Porções em que a difusão dos nutrientes do sangue circulante não alcança. (Figura 1.5) Figura 1.5: Vasa Vasorum (retirada de Junqueira). A maior parte dos vasos sanguíneos é provida por uma rede de fibras não mielinizadas de inervação simpática, através do neurotransmissor norepinefrina. Tendo em mente que essas fibras não penetram na túnica média dos vasos, a norepinefrina precisa se difundir por alguns micrômetros até atingir esta camada, e faz isto através de junções intercelulares. A inervação parassimpática também existe, liberando acetilcolina e levando células endoteliais a produzir ON. Em veias, as terminações nervosas chegam a uma profundidade maior, alcançando a túnica adventícia, mas com uma densidade menor. A importância do sistema nervoso autônomo, este que é dividido em simpático e parassimpático e que citamos nesse parágrafo que você quase pulou, será mais detalhada no capítulo 6. Resumindo a ópera, nas artérias e nas veias sempre teremos uma fina camada de revestimento interno, a túnica íntima; seguida de uma camada predominantemente muscular, a túnica média; terminando em uma cada de tecido conjuntivo, a túnica adventícia. Portanto, o que vai diferenciar os vasos serão a espessura destas camadas e os diferenciais da composição, o que refletirá diretamente na função de cada tipo de vaso como veremos a partir de agora. Releia este último parágrafo lentamente antes de passar para a próxima sessão. 2. AS ARTÉRIAS As artérias podem ser dividas nas grandes artérias elásticas, nas artérias musculares médias e nas arteríolas. Elas irão aparecer na circulação nessa exata ordem de ramificações e uma vez que você entenda as suas funções, mais facilmente lembrará das suas características. As grandes artérias elásticas são as primeiras a receber o sangue impulsionado pelo coração e são denominadas de artérias condutoras. Para o entendimento completo da sua função, o conceito de energia potencial elástica da física será importante. O ventrículo esquerdo ejeta uma determinada quantidade de sangue de aproximadamente 95 ml em cada batimento. Essa contração impulsiona o sangue adiante no circuito através da principal artéria elástica da circulação sistêmica, que é a artéria aorta. Hipoteticamente, se as artérias fossem um tubo rígido, quando chegasse o momento do fim da impulsão fornecida pela contração cardíaca, haveria uma redução brusca no fluxo sanguíneo, inclusive com breves momentos de estagnação. Porém, o que ocorre é que parte dessa força de impulsão é armazenada como energia elástica pelo estiramento das paredes artérias elásticas: é o chamado Efeito Windkessel (8). Sendo assim, quando ocorre a redução da impulsão no período de relaxamento cardíaco, essa energia latente acumulada novamente se transforma em uma força de impulsão para o sangue, enquanto as paredes das artérias retornam para as suas conformações originais. Ou seja, a função das grandes artérias elásticas é a de estabilizar o fluxo sanguíneo e garantir que o fluxo permaneça contínuo (Figura 1.6). Figura 1.6: Efeito Windkessel. A complacência do vaso faz com que, na diástole, a artéria se contraia, gerando pressão arterial diastólica e fluxo sanguíneo (retirada de Berne e Levy). São artérias elásticas a artéria aorta e seus principais ramos: o tronco braquiocefálico, as carótidas comuns, as subclávias e as ilíacas comuns. Também são elásticas a artéria pulmonar e as artérias pulmonares. São as grandes quantidades de fibras elásticas e elastina em suas camadas que possibilitam essa maior complacência desta categoria. A túnica média das artérias elásticas possui por volta de 40 membranas elásticas no recém-nascido e continua aumento ao longo da vida, chegando a mais de 70 membranas em um indivíduo adulto. Em seguida, temos as artérias musculares ou médias. Devido à sua função de regular o direcionamento do fluxo sanguíneo, determinando onde chegará mais ou menos sangue através da vasodilatação e da vasoconstrição, respectivamente, possuem função de artérias distribuidoras. Esta função é possível devido a possuírem até 40 camadas de feixes musculares lisos que permitem a redução do lúmen do vaso através da sua contração. Desta forma, o nosso organismo realiza vasoconstrição nas regiões onde não há necessidade de um maior aporte sanguíneo, direcionando o sangue para as demais regiões. O que é fundamental, por exemplo, para situações de emergências, como uma hemorragia de grande volume. Pois, o corpo consegue direcionar o sangue restante para os órgãos mais importantes, como o coração e o cérebro. Uma característica que auxilia na diferenciação nos cortes histológicos das artérias musculares das grandes artérias elásticas, além da cada média espessa, é a lâmina elástica interna proeminente como poderá ver em seu atlas histológico. Além disso, a sua túnica intima é mais delgada do que nas artérias elásticas, porém não é uma característica que ressalta facilmente aos olhos. Desta classificação fazem parte as demais artérias nominadas que não fizeram parte da categoria das artérias elásticas. Ou seja, com exceção das artérias citadas anteriormente (os grandes ramos da artéria aorta, artéria tronco pulmonar e as artérias pulmonares) que são artérias elásticas, qualquer outra artéria que é identificada por um nome, por ter calibre e/ou função de extrema relevância, você pode ter certeza que é uma artéria muscular: artérias braquiais, artérias renais, artérias femorais, etc. Por fim,temos a última categoria: as arteríolas. Como estamos seguindo o caminho lógico da ramificação, é dedutível que estas são as menores artérias. Por isso, só podem ser vistas quando ampliadas. Elas possuem a função de resistência e, consequentemente, reduzem a velocidade do fluxo para que sejam possíveis as trocas nos leitos capilares com maior eficiência através de uma ou duas camadas de feixes musculares lisos. Inclusive, os livros tradicionais de fisiologia trazem o conceito de meta-arteríolas. Estas nada mais são que arteríolas pré-capilares que, através da contração de sua musculatura lisa, determinam uma resistância ao fluxo sanguíneo de maneira semelhante às artérias musculares, auxiliando no controle do fluxo para o leito capilar e determinando quando chegará mais ou menos aporte sanguíneo na microcirculação. Apesar de não estar citado nos livros de fisiologia da graduação, hoje sabemos que este mecanismo parece estar presente apenas na circulação mesentérica (9) – vide detalhes no capítulo 3. 3. OS CAPILARES Os capilares são vasos extremamente simples se comparados às artérias e veias. Eles são formados basicamente por um endotélio apoiado e envolto por uma lâmina basal. Em alguns locais ao longo dos capilares, o endotélio pode ser envolto por pericitos, células que possuem uma lâmina basal própria que se funde com a lâmina basal do endotélio. Essa simplicidade é necessária para que ocorra o extravasamento de substâncias do leito capilar para o espaço intersticial. Por isso, a parede de um capilar é tão fina que é formada apenas por uma a três camadas de células, tendo, portanto, uma luz de apenas 4 a 8mm de diâmetro. O lúmen é tão estreito que geralmente permite apenas a passagem de células sanguíneas isoladas, por vezes necessitando de considerável deformação, algo que apenas é possível pela ausência de núcleo das hemácias. Quanto aos pericitos, estas são células que envolvem os capilares e também as vênulas pós-capilares com seus longos prolongamentos, possuem duas funções aparentes: a recuperação em caso de lesões, pois elas se diferenciam para formar células endoteliais ou células musculares lisas e talvez função contrátil, sugerida devido a presença de miosina, actina e tropomiosina em abundância em sua composição. Os capilares, por sua vez, são divididos em três tipos com características, funções e localizações distintas. Vamos falar deles agora. O primeiro tipo são os capilares contínuos ou somáticos. Eles são caracterizados pela ausência de fenestras, ou seja, orifícios em sua parede. Eles estão presentes nos tecidos musculares, nos tecidos conjuntivos, nas glândulas exócrinas e no tecido nervoso. Em alguns lugares desses tecidos, com exceção do tecido nervoso, eles possuem vesículas pinocíticas que são responsáveis pelo transporte de macromoléculas pela parede já que não possuem fenestras. O segundo tipo são os capilares fenestrados ou viscerais. Estes são caracterizados por possuírem fenestras nas paredes que podem ou não ser obstruídas por um diafragma mais fino que uma membrana celular. Quando possuem diafragma, são característicos de locais onde ocorre um intercâmbio intenso entre o tecido e o sangue, como é o caso dos rins, intestinos e glândulas endócrinas. Quando são destituídos de diafragma, o sangue só é separado dos tecidos pela lâmina basal. Este tipo está presente apenas no glomérulo renal. Algumas referências consideram este tipo específico (desprovido de diafragma) como um quarto tipo de capilar. A última categoria são os capilares sinusóides. Esta categoria está presente no fígado e em órgãos hemocitopoiéticos como a medula óssea e o baço. Eles possuem um trajeto tortuoso e um diâmetro maior do que os demais tipos de capilares, o que irá resultar na redução da velocidade do fluxo sanguíneo (esta afirmação pode não fazer sentido agora, mas fará quando você ler o capítulo 2). Além disso, as células endoteliais são descontínuas, assim como a lâmina basal. Tais características permitem o contato direto do sangue com os tecidos. Portanto, o sangue irá extravasar massivamente ao passar pelos sinusoides, permitindo, por exemplo, o metabolismo hepático de substâncias presentes no sangue, assim como a hemocaterese (destruição das hemácias) no baço. 4. AS VEIAS Focando apenas na circulação sistêmica, o sangue sai do coração rico em oxigênio, segue pelas artérias até os capilares, onde realiza o primeiro objetivo: a entrega de recursos para as células. Os próximos passos, então, são a drenagem dos resíduos do processo metabólico e o seguimento pela circulação venosa, onde grande parte destes resíduos serão metabolizados no fígado, o CO2 será eliminado na circulação pulmonar e os demais resíduos eliminados na urina e nas fezes. Este processo de extravasamento e drenagem no leito capilar será esmiuçado no Capítulo 02. As veias estão presentes em maior número em nosso corpo, possuem paredes mais finas e, geralmente, possuem maior diâmetro que as artérias correspondentes, portanto, possuem a função potencial de reservatório de sangue, chegando a conter mais de 70% do sangue circulante. Além disso, devido ao fato de as veias possuírem uma quantidade muito inferior de feixes musculares e pressões menores do que as artérias, usualmente, elas não possuem pulso. O que justifica a diferença do comportamento de um sangramento arterial, que ocorre em jatos intermitentes e concordantes com o pulso, e de uma hemorragia venosa, que ocorre em com um fluxo contínuo e lento, “babando”, como costumamos falar. Este fluxo lentificado, quando oriundo de estruturas inferiores ao coração tende a um refluxo, por ocorrer contra a força da gravidade. Porém, como foi adiantado no início do capítulo, as válvulas venosas impedem o movimento contrário e garantem, com o auxílio das bombas venosas (exploradas adiante), um fluxo unidirecional. As válvulas venosas são dobras da túnica íntima, compostas de tecido conjuntivo rico em fibras elásticas, revestidas em ambos os lados por endotélio, em forma de meia lua que se projetam para o interior da veia. Elas estão mais presentes em veias em que o sangue precisa enfrentar a força da gravidade para retornar ao coração, como as veias dos membros inferiores. Essas válvulas se abrem apenas para um lado, portanto, se houver tentativa de refluxo elas se fecham e quando o sangue flui na direção correta, elas se abrem. As veias, seguindo o mesmo padrão, também serão divididas em três categoriais com características e funções próprias. Sendo assim, logo após o leito capilar, teremos as vênulas que, irão confluir na formação das veias médias que, por fim, irão convergir até formação das grandes veias, como as veias cava superior e inferior. As vênulas pós-capilares são também chamadas de vênulas pericíticas. Elas são formadas apenas por uma camada de células endoteliais, envoltas de pericitos como já vimos. Porém, diferente dos capilares, existem vênulas um pouco maiores que possuem algumas células musculares lisas ao invés de pericitos em sua parede para realizar a função contrátil. As veias possuem uma íntima bem desenvolvida, porém é a túnica adventícia a mais espessa e bem desenvolvida. Esta que frequentemente possui feixes longitudinais de músculo liso. As veias, em grande parte, acompanham artérias em seu trajeto. Por isso, os nomes das veias usualmente recebem o mesmo nome da artéria que acompanham (exemplos: veia femoral, veia subclávia...), porém existem exceções como: as veias cavas (superior e inferior), a veia cefálica, a veia basílica e as veias safenas magna e parva. 4. OUTROS CONCEITOS IMPORTANTES 1. ANASTOMOSES E CIRCULAÇÃO COLATERAL Uma anastomose é uma comunicação entre os vasos sanguíneos que pode criar uma circulação colateral ou uma rota alternativa para a circulação do sangue. Estas podem ser classificadas em quatro tipos: Anastomose término-terminal: quando duas artérias se comunicam diretamente. Anastomose por convergência: quando duas artérias convergem e se fundem. Anastomose transversa: quando um pequeno vaso arterialliga duas artérias transversalmente. Anastomose arteriovenosa: quando há uma conexão direta entre as menores artérias e veias. Estas são importantes para conservação do calor corporal. 2. ARTERIOGÊNESE E ANGIOGÊNESE A arteriogênese é definida como o desenvolvimento de fluxo através de artérias colaterais derivadas de anastomoses arterio-arteriais pré-existentes. Isto ocorre em processos de obstrução parcial ou total que resultam no aumento da pressão na região, forçando a ampliação do diâmetro de vasos pré-existentes, permitindo, desta forma, a passagem de sangue por uma rota alternativa. A angiogênese é o processo de formação de pequenos novos vasos como capilares, resultado de um estímulo isquêmico. Ou seja, o organismo ao passar por momentos em que os vasos existentes não são suficientes, estimula a criação de uma circulação colateral. Porém, ambos os processos necessitam de tempo para ocorrer com eficiência (10). A diferença entre ambos os mecanismos está disposta na Figura 1.7 Figura 1.7: Arteriogênese (A) é a indução de fluxo através de artérias colaterais previamente existentes através do gradiente de pressão gerado pela ausência de fluxo em uma das artérias. Angiogênese (B) é o crescimento de capilares a partir de vasos existentes, processo geralmente engatilhado por hipóxia (retirada da referência 6). 3. BOMBAS VENOSAS Existem três bombas que irão auxiliar no retorno venoso: a bomba arteriovenosa, a bomba musculovenosa e a bomba respiratória. A bomba arteriovenosa é possível devido a uma bainha vascular relativamente rígida que circunda as veias acompanhantes de uma determinada artéria. Sendo assim, quando a artéria se expande com a chegada de um pulso, ela comprime as veias nessa bainha, ordenhando desta forma o sangue no interior das veias em direção ao coração devido ao direcionamento das válvulas venosas. A bomba musculovenosa vai possuir o mesmo objetivo da bomba anterior, porém a ordenha das veias será realizada a partir da contração muscular das extremidades, principalmente dos membros inferiores. Por isso, alguns autores se referem as panturrilhas como corações secundários. Este é o motivo de se colocar um paciente acamado para caminhar assim que possível. As contrações musculares na caminhada irão auxiliar o retorno venoso, além de evitar úlceras por pressão. A bomba respiratória se utiliza da pressão negativa criada durante a expansão torácica na inspiração. O racional disso é que todo sistema de pressão desloca o fluído de onde há mais pressão para as regiões com menores pressões, logo a diminuição da pressão da caixa torácica, auxilia a “sugar” o sangue para a região, consequentemente, facilitando o deslocamento do sangue em direção ao coração. Quadro 1.1: Arteriosclerose e aterosclerose A arteriosclerose é o processo de enrijecimento das artérias resultado da perda de elastina com o envelhecimento do indivíduo. Sendo assim, ocorre uma progressiva perda da capacidade de se acumular energia nas grandes artérias elásticas (perda do Efeito Windkessel), assim como influencia diretamente no aumento da pressão arterial sistólica e sua pressão de pulso. A aterosclerose é um processo complexo de formação de um trombo, resultado de um processo inflamatório iniciado pelo acúmulo de colesterol com posterior agregação de componentes sanguíneos nas artérias. Este processo pode vir a gerar uma obstrução parcial ou total no vaso, suspendendo o suprimento de recursos para os tecidos da região. Caso este processo permaneça, o tecido pode vir a necrosar, ou seja, morte tecidual. 5. CONFERÊNCIAS Confira aqui a aula dinâmica do Medicina Resumida sobre os assuntos abordados nesse capítulo! CAPÍTULO 1 Introdução ao Sistema Cardiovascular 1. CASO CLÍNICO Sr. Jorge, 58 anos, aposentado, comparece ao atendimento acompanhado da sua neta para avaliação de rotina. Ele nega queixas importantes e deseja passar por uma avaliação geral. Nega possuir doenças crônicas e uso de medicações contínuas. Após questionamentos, informou apresentar episódios frequentes de cefaleia em situações de estresse, como, quando perde partidas seguidas de baralho para sua esposa Marizete. Hábito de lazer dos fi nais de semana. Questionado, então, sobre a alimentação da família, Sr. Jorge informa que sua esposa e fi lho possuem “pressão alta”, e que por isso tentam regular a ingesta de sal. Porém, não há outras restrições alimentares e, frequentemente nos fi nais de semana, eles comem feijoada, lasanha, pizza, cachorro quente e comida japonesa, além de três a cinco latas de cerveja. Quanto à pratica de exercícios físicos, alegou fazer uma ou duas caminhadas de aproximadamente 30 minutos durante a semana. Sobre seu histórico familiar, informou que sua mãe, falecida aos 60 anos, também era hipertensa. Ao exame físico se obteve uma circunferência abdominal de 108 cm e uma pressão arterial sistêmica de 138 x 84 mmHg. Sem outras alterações dignas de nota. Dr. Barros esclarece que tudo indica para a possibilidade de Sr. Jorge ser também portador de hipertensão arterial sistêmica, explicando que seus hábitos e esta alteração do exame físico podem estar prejudicando a circulação nas artérias e, consequentemente, o risco de isso acometimento futuro da sua visão, dos rins, cérebro e até do coração. Entretanto, alega que precisaria avaliá-lo daqui a um mês para confi rmar essa hipótese. Enquanto isso, acorda com Sr Jorge que ele e sua família mudariam imediatamente de hábitos alimentares e que iniciariam uma prática regular de caminhadas de pelo menos 30 minutos cinco vezes na semana até o novo encontro. Enzo, o neta do Sr. Jorge, até então calado, inicia uma série de questionamentos destinados ao Dr. Barros: “O que são artérias?”, “O que elas têm a ver com o coração de meu avô?”. Dr. Barros, surpreso com a curiosidade da moça, resolve utilizar isso duplamente ao seu favor – “As artérias são como tubos por onde o sangue circula pelo corpo de seu avô. Se você ajudar seu avô a seguir o que acordamos, na próxima consulta, ele(a) (apontando para você, acadêmico de Medicina que estava sentado no canto do consultório durante todo esse tempo) irá te explicar como funciona a circulação com detalhes e te apresentar os tipos de vasos que possuímos em nosso corpo. O que acha?” – E assim, ele conseguiu uma parceira para cuidar da saúde de seu paciente e ainda deu ao seu acadêmico aquela motivação para os estudos que andava em falta. O que você acha que precisa estudar para não decepcionar a Polyanna e o Dr. Barros? 1. Possíveis palavras desconhecidas “doença crônica”: Uma doença crônica, geralmente, se difere de uma doença aguda pelo tempo de instalação, sendo a crônica caracterizada por uma doença já estabelecida e a aguda por um acometimento recente. O tempo que delimita a classificação depende da doença. “hipertensão arterial sistêmica”: Hipertensão, popularmente chamada de “pressão alta”, é ter medidas de pressão arterial, sistematicamente, igual ou maior que 130 por 80 mmHg (1), de acordo com a última diretriz americana sobre o assunto. 2. Palavras-chaves “Doenças crônicas”, “dores de cabeça”, “pressão alta”, “hábitos alimentares”, “exercícios físicos”, “circunferência abdominal”, “pressão arterial sistêmica”, “hipertensão”, “mãe falecida aos 60 anos”, “circulação”, “artérias”, “vasos”, “coração”. 3. OBJETIVOS Descrever o sistema circulatório e suas funções • Caracterizar os tipos de vasos sanguíneos Caracterizar os tipos de vasos sanguíneos 2. INTRODUÇÃO AO SISTEMA CIRCULATÓRIO 1. DEFINIÇÕES, COMPOSIÇÃO E FUNÇÕES Desde o início dos estudos na biologia, aprende-se que o corpo humano é composto por unidades denominadas de células. Mais adiante, ao decorrer dos anos colegiais, aprofundam-se os conhecimentos a respeito dos processos metabólicos que ocorrem nestas unidades, desde a produção de energia (ATP) até a sua utilização nos mais diversos mecanismos celulares. Sendo assim, passamos a visualizar as células como “microfábricas” que necessitam de recursos para seu funcionamento: o oxigênioque inspiramos em nossos pulmões e os nutrientes extraídos da nossa alimentação através do sistema digestório. Além disso, as células precisam expulsar os resíduos dos processos metabólicos, como o dióxido de carbono (CO2). Em resumo, assim como uma fábrica, para as células se faz necessária uma extensa rede de transporte para fornecer recursos e extrair resíduos. Em outras palavras, existem estruturas que carregam até as células o que lhes é necessário e trazem delas o que se tornou inútil para a eliminação. Apresento-lhe o sistema circulatório. O sistema circulatório é uma grande rede de tubos (os vasos) em que uma bomba (o coração) faz com que o fluído do sistema (o sangue) circule por todo o corpo. Entretanto, o sistema não se limita apenas à função de transporte. Ele também tem a função de redistribuir e dispersar o calor pelo corpo, algo que não é difícil de compreender se você lembrar um pouco da física. O sangue circulante absorve o calor produzido nos processos metabólicos e durante o seu trajeto, redistribui este calor que foi armazenado para as zonas mais frias. Já a dissipação fica por conta dos vasos periféricos que trocam calor com o ambiente. E é por isso que algumas pessoas de pele muito clara ficam mais vermelhas em locais quentes, pois o corpo está direcionando o sangue para a superfície, objetivando dissipar o excesso de calor. Por outro lado, pensando em um ambiente frio, são suas extremidades que ficam mais frias e perdem mais a cor, pois o corpo está direcionando o sangue para o interior do corpo. Estratégia para preservar o calor que está produzindo no metabolismo. Para realizar tais funções, o sistema circulatório engloba dois sistemas: o sistema cardiovascular e o sistema linfático. O primeiro tem o papel principal na circulação, ao passo que o sistema linfático possui uma participação mais coadjuvante, como veremos nos dois próximos parágrafos. O sistema cardiovascular é composto pelo coração e pelos vasos sanguíneos: as artérias, as veias e os capilares. O coração, através de suas contrações, irá proporcionar o movimento do sangue através das artérias, que são vasos eferentes ou vasos de saída – isto é, as artérias têm, na sua ponta proximal o coração ou outra artéria que saiu do coração e seguem em direção a um leito capilar que já abordaremos adiante. O sangue apresentará fluxo unidirecional neste circuito devido a basicamente dois mecanismos: o fechamento das válvulas cardíacas (Capítulo 04) e o funcionamento das válvulas venosas, que ainda abordaremos neste capítulo. Por conseguinte, a partir do coração, o sangue, ejetado pela artéria aorta, alcançará, através de seus ramos, todo o corpo. Como um tronco de uma árvore, a artéria aorta se ramifica e essas ramificações vão aumentando em quantidade e diminuindo em diâmetro até chegar aos leitos capilares, tão difundidos pelo corpo que pode chegar a uma extensão de 96000 km. Esses capilares possuem fenestrações (aberturas ou buracos) que servirão para transbordar parte do seu conteúdo no espaço intersticial (espaço entre células) onde ocorrerá troca direta de oxigênio, nutrientes e excretas. Ainda nos leitos capilares, a maior parte do conteúdo, agora pobre em oxigênio e nutrientes, é reabsorvido e segue pelas veias, ao mesmo tempo que o conteúdo restante é absorvido pelos vasos linfáticos que desembocam posteriormente em veias de maior calibre. O sangue então seguirá pelas veias, vasos aferentes ou de chegada - isto é, as veias sempre possuem na sua ponta distal uma outra veia ou o coração e surgiram de um leito capilar. E inversamente às artérias, as veias se convergem até se tornarem cada vez maiores e, finalmente, retornar ao coração, fechando o circuito (Figura 1.1). E quanto ao sistema linfático? Seus vasos, estruturalmente muito simples, compostos apenas por uma camada de endotélio e por uma lâmina basal incompleta, formam uma rede de drenagem alternativa ao líquido intersticial para que retorne ao sistema venoso (Figura 1.2). Cerca de 10% do líquido intersticial segue esta rota, em detrimento da rota venosa clássica – ainda bem, porque esta rota constitui a única possível para trazer de volta as proteínas que foram lançadas ao interstício e, se não fosse por esse mecanismo, as proteínas se acumulariam, trariam consigo água (pressão oncótica que veremos no próximo capítulo) e todos viveríamos com edema periférico (inchaço por líquido). Neste caminho, a linfa (nome que se dá ao líquido presente no sistema linfático), irá banhar linfonodos, tonsilas, baço e convergir até dois grandes troncos: o ducto torácico (à esquerda) e o ducto linfático direito, que desembocarão na junção das veias jugular interna esquerda com subclávia esquerda e na confluência das veias jugular interna direita com veia subclávia direita, respectivamente (Figura 1.3). Figura 1.1: Visão geral do sistema circulatório. Do coração, no centro da imagem, saem as artérias que se dividem em artérias menores, arteríolas e capilares, onde há extravasamento de sangue para o espaço intersticial e troca nutrientes e excretas, retornando para a circulação venosa (azul) em vênulas, depois veias menores que convergem até formar as grandes veias que retornam ao coração. Uma via alternativa pode ser tomada: a circulação linfática (verde) coleta linfa do interstício, passa por nodos linfáticos e retorna para a circulação venosa em grandes veias próximas ao coração. Figura 1.2: Circulação linfática torácica (retirada do Netter). Figura 1.3: Figura esquemática mostrando o espaço intersticial rondado por capilares arteriais, venosos e linfáticos. Esse trajeto (coração -> leitos capilares sistêmicos -> coração), parte inferior da Figura 1.1, é denominado Circulação Sistêmica ou Grande Circulação. O sangue que retorna ao coração será agora enviado aos pulmões pela artéria pulmonar para uma nova oxigenação, retornando pelas veias pulmonares ao coração, quando se reinicia o ciclo. Este trajeto (coração -> leitos capilares pulmonares -> coração), parte superior da Figura 1.1, é denominado Circulação Pulmonar ou Pequena Circulação. Portanto, se considerarmos a circulação pulmonar, podemos verificar que as definições de artéria e veia, não guardam relação com os níveis de oxigenação do sangue presente em um ou outro vaso, e sim, se este vaso está levando sangue do coração para os demais órgãos (artérias) ou se está trazendo sangue dos órgãos de volta ao coração (veias). Afinal os vasos que desembocarão o sangue oxigenado ao coração são as veias pulmonares. Você prestou atenção que escrevemos no parágrafo anterior? Desliga esse celular, vamos repetir para você: o que define se um vaso é artéria ou veia não é a oxigenação do sangue nele presente, muito menos a cor com que desenharam no livro de anatomia. O dado que realmente importa nessa definição é: a artéria sai do coração em direção aos órgãos, e a veia volta dos órgãos em direção o coração. Agora que você entendeu, sem querer dificultar, você precisa saber que existe uma exceção a essa regra: a circulação “porta”. Neste caso, o sangue flui de uma veia para outro órgão, antes de retornar ao coração. Um exemplo clássico disso é demonstrado na circulação do fígado: 75% do sangue que entra neste órgão é proveniente da veia porta hepática que coletou o sangue do baço, estômago, vesícula, pâncreas e, principalmente, o intestino (2). Calma, isso não precisa ser decorado. O importante é entender a razão de existir essa exceção: uma das grandes funções do fígado é desintoxicar o corpo. Sendo assim, ele atua como um “porteiro” e “lixeiro”, recebendo o sangue contaminado destas regiões e eliminando as substâncias nocivas, antes que elas cheguem ao coração e ganhem acesso irrestrito a todos os órgãos do corpo (imagine a quantidade de lixo que entrou na sua circulação após aquela feijoada pós- prova no fim do semestre e imagine se não existisse o fígado para te proteger disso). Agora que os conceitos mais básicos foram apresentados, você é capaz de entender como dividiremos nosso estudo. Em um primeiro momento,focaremos nas vias do sistema, os vasos sanguíneos, quando abordaremos a tríade básica: anatomia, histologia e fisiologia de uma forma integrada. Em um segundo momento, passaremos para a bomba, o coração, novamente utilizando a tríade na mesma metodologia. Desta forma, ao final do livro, você terá sido apresentado aos principais tópicos do sistema de uma forma gradual e associada, facilitando a sua compreensão. 3. ARTÉRIAS, VEIAS E CAPILARES Se a gente pudesse ligar todos os vasos sanguíneos de nosso corpo em uma única linha, o comprimento desta linha seria duas vezes a circunferência do nosso planeta terra. E por que isso é importante? Essa informação, além de te fazer perder a dimensão restrita que pode ter sido criada de alguns poucos tubos ligando o coração aos demais órgãos, instiga a curiosidade de saber como algo tão extenso ocupa o interior de nosso corpo. A resposta para esse possível enigma são as variadas dimensões dos vasos. Assim como dividimos os vasos sanguíneos a depender da direção de seu fluxo, podemos dividi-los em subtipos a depender de suas dimensões e características histológicas. Quanto às dimensões, os diâmetros dos vasos variam desde aproximadamente 40 mm (3 cm2 de área transversa) de uma artéria aorta a capilares invisíveis a olho nu. Por isso, outra forma de divisão possível do sistema cardiovascular é em macrocirculação, que engloba os vasos que possuem mais de 0,1mm em diâmetro, e microcirculação que abrange os vasos menores que 0,1mm em diâmetro. Em relação às características histológicas, sabemos que os capilares são formados por uma única camada endotelial, enquanto as artérias e veias possuem três camadas principais, como podemos ver na Figura 1.4. Estas camadas possuem características gerais e alguns detalhes específicos que diferenciam cada subtipo. Estas camadas histológicas nos vasos sanguíneos são chamadas de túnicas: a túnica íntima, a túnica média e a túnica adventícia. Figura 1.4: Corte demonstrando camadas das artérias e veias. 1. AS CARACTERÍSTICAS GERAIS DAS TÚNICAS Dentre as três camadas dos vasos, a mais interna é denominada túnica íntima. Esta reveste o interior do vaso sanguíneo e é constituída por uma única camada de células endoteliais pavimentosas, o que chamamos nos vasos sanguíneos de endotélio. Essas células se ancoram em uma fina lâmina de transição para o tecido conjuntivo que denominamos de lâmina basal. Posteriormente, temos um tecido conjuntivo frouxo, que chamamos de camada subendotelial, onde podem estar presentes também células musculares lisas dispostas longitudinalmente. Por fim, temos uma fina camada limitante que chamamos de lâmina elástica interna que separa a túnica íntima da túnica média. O que a túnica íntima possui de simplicidade estrutural, possui de complexidade funcional, e todas essas fascinantes funções que você lerá nos tópicos abaixo só foram descritas a partir do ano de 1980(3). As células endoteliais, as grandes estrelas da histologia circulatória e mais fascinantes também, desenvolvem papel crucial na troca de substâncias Secreção de colágeno dos tipos II, IV e V; Secreção de substâncias pró-coagulantes, como Fator de von Willebrand, PAI-1, fator V ativado e também de substâncias anti- coagulantes como prostaciclinas, tPA e heparinas. Isso tem importância crucial na manutenção da sua vida: quando a secreção de substâncias pró-coagulantes é mais ativada, corrige pequenos danos à sua circulação. Ao passo que quando um homem sofre um infarto agudo do miocárdio (oclusão total de uma artéria que irriga o coração), as substâncias anti-coagulantes teoricamente devem estar mais ativadas, para reduzir o dano causado e tentar “abrir” essa artéria(4); Secreção de fatores vasoativos, ou seja, têm a capacidade de diminuir ou aumentar o diâmetro do vaso, aumentando a pressão em seu interior e redirecionando seu fluxo. Essas substâncias são responsáveis pelo controle da pressão arterial e a disfunção delas está quase invariavelmente presente nos choques hemodinâmicos. São elas: (1) o óxido nítrico (ON ou NO), com suas propriedades endoteliais descobertas em 1980 e cuja pesquisa rendeu ao seu autor o prêmio Nobel da Fisiologia e Medicina em 1988. O ON possui propriedades vasodilatadoras, anti-inflamatórias e anti- coagulantes (5,6); (2) a endotelina, descoberta em 1988(7), uma substância vasoconstrictora potente, ou seja, capaz de reduzir o diâmetro do vaso; Possuem enzimas ligadas à membrana, como a enzima conversora de angiotensina, que converte angiotensina I em angiotensina II (também um vasoconstrictor), que também terá papel fundamental na regulação da pressão arterial.; Conversão de bradicinina, serotonina, prostaglandinas, norepinefrina e trombina. Todas essas substâncias com capacidade de regular o fluxo sanguíneo por causar vasoconstricção ou vasodilatação serão melhor detalhadas no capítulo 3. Realizam lipólise de lipoproteínas para transformá-las em triglicerídios e colesterol. Quanto à túnica média, esta é, geralmente, a camada mais espessa dos vasos. Ela é composta por camadas concêntricas de células musculares lisas organizadas helicoidalmente, circundada por uma matriz extracelular composta de fibras elásticas e reticulares, além de proteoglicanos e glicoproteínas. Limitando a túnica média podemos encontrar a lâmina elástica externa. Ela é semelhante à lâmina elástica interna, porém mais delgada e podemos encontra-la apenas nas artérias, principalmente em um subtipo que são as artérias musculares, como veremos adiante. A túnica adventícia é a camada de revestimento dos vasos e torna-se gradualmente contínua com o tecido conjuntivo pelo qual o vaso está passando. Ela é composta, principalmente, por fibroblastos, fibras de colágeno tipo I e fibras elásticas dispostas longitudinalmente. A túnica adventícia possui fenestrações que permitem a nutrição da porção mais interna da túnica média por difusão dos nutrientes do sangue circulante. Afinal, as células dos vasos sanguíneos também precisarão receber os recursos necessários para seu metabolismo e, por isso, em grandes vasos, existe a presença de vasa vasorum (“vasos dos vasos”). São arteríolas e vênulas muito pequenas que penetram pela túnica mais externa (adventícia) e nutrem esta camada e a camada média. Porções em que a difusão dos nutrientes do sangue circulante não alcança. (Figura 1.5) Figura 1.5: Vasa Vasorum (retirada de Junqueira). A maior parte dos vasos sanguíneos é provida por uma rede de fibras não mielinizadas de inervação simpática, através do neurotransmissor norepinefrina. Tendo em mente que essas fibras não penetram na túnica média dos vasos, a norepinefrina precisa se difundir por alguns micrômetros até atingir esta camada, e faz isto através de junções intercelulares. A inervação parassimpática também existe, liberando acetilcolina e levando células endoteliais a produzir ON. Em veias, as terminações nervosas chegam a uma profundidade maior, alcançando a túnica adventícia, mas com uma densidade menor. A importância do sistema nervoso autônomo, este que é dividido em simpático e parassimpático e que citamos nesse parágrafo que você quase pulou, será mais detalhada no capítulo 6. Resumindo a ópera, nas artérias e nas veias sempre teremos uma fina camada de revestimento interno, a túnica íntima; seguida de uma camada predominantemente muscular, a túnica média; terminando em uma cada de tecido conjuntivo, a túnica adventícia. Portanto, o que vai diferenciar os vasos serão a espessura destas camadas e os diferenciais da composição, o que refletirá diretamente na função de cada tipo de vaso como veremos a partir de agora. Releia este último parágrafo lentamente antes de passar para a próxima sessão. 2. AS ARTÉRIAS As artérias podem ser dividas nas grandes artérias elásticas, nas artérias musculares médias e nas arteríolas. Elas irão aparecer na circulação nessa exata ordem de ramificações e uma vez que você entenda as suas funções, mais facilmente lembrará das suas características. As grandes artérias elásticas são as primeirasa receber o sangue impulsionado pelo coração e são denominadas de artérias condutoras. Para o entendimento completo da sua função, o conceito de energia potencial elástica da física será importante. O ventrículo esquerdo ejeta uma determinada quantidade de sangue de aproximadamente 95 ml em cada batimento. Essa contração impulsiona o sangue adiante no circuito através da principal artéria elástica da circulação sistêmica, que é a artéria aorta. Hipoteticamente, se as artérias fossem um tubo rígido, quando chegasse o momento do fim da impulsão fornecida pela contração cardíaca, haveria uma redução brusca no fluxo sanguíneo, inclusive com breves momentos de estagnação. Porém, o que ocorre é que parte dessa força de impulsão é armazenada como energia elástica pelo estiramento das paredes artérias elásticas: é o chamado Efeito Windkessel (8). Sendo assim, quando ocorre a redução da impulsão no período de relaxamento cardíaco, essa energia latente acumulada novamente se transforma em uma força de impulsão para o sangue, enquanto as paredes das artérias retornam para as suas conformações originais. Ou seja, a função das grandes artérias elásticas é a de estabilizar o fluxo sanguíneo e garantir que o fluxo permaneça contínuo (Figura 1.6). Figura 1.6: Efeito Windkessel. A complacência do vaso faz com que, na diástole, a artéria se contraia, gerando pressão arterial diastólica e fluxo sanguíneo (retirada de Berne e Levy). São artérias elásticas a artéria aorta e seus principais ramos: o tronco braquiocefálico, as carótidas comuns, as subclávias e as ilíacas comuns. Também são elásticas a artéria pulmonar e as artérias pulmonares. São as grandes quantidades de fibras elásticas e elastina em suas camadas que possibilitam essa maior complacência desta categoria. A túnica média das artérias elásticas possui por volta de 40 membranas elásticas no recém-nascido e continua aumento ao longo da vida, chegando a mais de 70 membranas em um indivíduo adulto. Em seguida, temos as artérias musculares ou médias. Devido à sua função de regular o direcionamento do fluxo sanguíneo, determinando onde chegará mais ou menos sangue através da vasodilatação e da vasoconstrição, respectivamente, possuem função de artérias distribuidoras. Esta função é possível devido a possuírem até 40 camadas de feixes musculares lisos que permitem a redução do lúmen do vaso através da sua contração. Desta forma, o nosso organismo realiza vasoconstrição nas regiões onde não há necessidade de um maior aporte sanguíneo, direcionando o sangue para as demais regiões. O que é fundamental, por exemplo, para situações de emergências, como uma hemorragia de grande volume. Pois, o corpo consegue direcionar o sangue restante para os órgãos mais importantes, como o coração e o cérebro. Uma característica que auxilia na diferenciação nos cortes histológicos das artérias musculares das grandes artérias elásticas, além da cada média espessa, é a lâmina elástica interna proeminente como poderá ver em seu atlas histológico. Além disso, a sua túnica intima é mais delgada do que nas artérias elásticas, porém não é uma característica que ressalta facilmente aos olhos. Desta classificação fazem parte as demais artérias nominadas que não fizeram parte da categoria das artérias elásticas. Ou seja, com exceção das artérias citadas anteriormente (os grandes ramos da artéria aorta, artéria tronco pulmonar e as artérias pulmonares) que são artérias elásticas, qualquer outra artéria que é identificada por um nome, por ter calibre e/ou função de extrema relevância, você pode ter certeza que é uma artéria muscular: artérias braquiais, artérias renais, artérias femorais, etc. Por fim, temos a última categoria: as arteríolas. Como estamos seguindo o caminho lógico da ramificação, é dedutível que estas são as menores artérias. Por isso, só podem ser vistas quando ampliadas. Elas possuem a função de resistência e, consequentemente, reduzem a velocidade do fluxo para que sejam possíveis as trocas nos leitos capilares com maior eficiência através de uma ou duas camadas de feixes musculares lisos. Inclusive, os livros tradicionais de fisiologia trazem o conceito de meta-arteríolas. Estas nada mais são que arteríolas pré-capilares que, através da contração de sua musculatura lisa, determinam uma resistância ao fluxo sanguíneo de maneira semelhante às artérias musculares, auxiliando no controle do fluxo para o leito capilar e determinando quando chegará mais ou menos aporte sanguíneo na microcirculação. Apesar de não estar citado nos livros de fisiologia da graduação, hoje sabemos que este mecanismo parece estar presente apenas na circulação mesentérica (9) – vide detalhes no capítulo 3. 3. OS CAPILARES Os capilares são vasos extremamente simples se comparados às artérias e veias. Eles são formados basicamente por um endotélio apoiado e envolto por uma lâmina basal. Em alguns locais ao longo dos capilares, o endotélio pode ser envolto por pericitos, células que possuem uma lâmina basal própria que se funde com a lâmina basal do endotélio. Essa simplicidade é necessária para que ocorra o extravasamento de substâncias do leito capilar para o espaço intersticial. Por isso, a parede de um capilar é tão fina que é formada apenas por uma a três camadas de células, tendo, portanto, uma luz de apenas 4 a 8mm de diâmetro. O lúmen é tão estreito que geralmente permite apenas a passagem de células sanguíneas isoladas, por vezes necessitando de considerável deformação, algo que apenas é possível pela ausência de núcleo das hemácias. Quanto aos pericitos, estas são células que envolvem os capilares e também as vênulas pós-capilares com seus longos prolongamentos, possuem duas funções aparentes: a recuperação em caso de lesões, pois elas se diferenciam para formar células endoteliais ou células musculares lisas e talvez função contrátil, sugerida devido a presença de miosina, actina e tropomiosina em abundância em sua composição. Os capilares, por sua vez, são divididos em três tipos com características, funções e localizações distintas. Vamos falar deles agora. O primeiro tipo são os capilares contínuos ou somáticos. Eles são caracterizados pela ausência de fenestras, ou seja, orifícios em sua parede. Eles estão presentes nos tecidos musculares, nos tecidos conjuntivos, nas glândulas exócrinas e no tecido nervoso. Em alguns lugares desses tecidos, com exceção do tecido nervoso, eles possuem vesículas pinocíticas que são responsáveis pelo transporte de macromoléculas pela parede já que não possuem fenestras. O segundo tipo são os capilares fenestrados ou viscerais. Estes são caracterizados por possuírem fenestras nas paredes que podem ou não ser obstruídas por um diafragma mais fino que uma membrana celular. Quando possuem diafragma, são característicos de locais onde ocorre um intercâmbio intenso entre o tecido e o sangue, como é o caso dos rins, intestinos e glândulas endócrinas. Quando são destituídos de diafragma, o sangue só é separado dos tecidos pela lâmina basal. Este tipo está presente apenas no glomérulo renal. Algumas referências consideram este tipo específico (desprovido de diafragma) como um quarto tipo de capilar. A última categoria são os capilares sinusóides. Esta categoria está presente no fígado e em órgãos hemocitopoiéticos como a medula óssea e o baço. Eles possuem um trajeto tortuoso e um diâmetro maior do que os demais tipos de capilares, o que irá resultar na redução da velocidade do fluxo sanguíneo (esta afirmação pode não fazer sentido agora, mas fará quando você ler o capítulo 2). Além disso, as células endoteliais são descontínuas, assim como a lâmina basal. Tais características permitem o contato direto do sangue com os tecidos. Portanto, o sangue irá extravasar massivamente ao passar pelos sinusoides, permitindo, por exemplo, o metabolismo hepático de substâncias presentes no sangue, assim como a hemocaterese (destruição das hemácias) no baço. 4. AS VEIAS Focando apenas na circulação sistêmica, o sangue sai do coração rico em oxigênio, seguepelas artérias até os capilares, onde realiza o primeiro objetivo: a entrega de recursos para as células. Os próximos passos, então, são a drenagem dos resíduos do processo metabólico e o seguimento pela circulação venosa, onde grande parte destes resíduos serão metabolizados no fígado, o CO2 será eliminado na circulação pulmonar e os demais resíduos eliminados na urina e nas fezes. Este processo de extravasamento e drenagem no leito capilar será esmiuçado no Capítulo 02. As veias estão presentes em maior número em nosso corpo, possuem paredes mais finas e, geralmente, possuem maior diâmetro que as artérias correspondentes, portanto, possuem a função potencial de reservatório de sangue, chegando a conter mais de 70% do sangue circulante. Além disso, devido ao fato de as veias possuírem uma quantidade muito inferior de feixes musculares e pressões menores do que as artérias, usualmente, elas não possuem pulso. O que justifica a diferença do comportamento de um sangramento arterial, que ocorre em jatos intermitentes e concordantes com o pulso, e de uma hemorragia venosa, que ocorre em com um fluxo contínuo e lento, “babando”, como costumamos falar. Este fluxo lentificado, quando oriundo de estruturas inferiores ao coração tende a um refluxo, por ocorrer contra a força da gravidade. Porém, como foi adiantado no início do capítulo, as válvulas venosas impedem o movimento contrário e garantem, com o auxílio das bombas venosas (exploradas adiante), um fluxo unidirecional. As válvulas venosas são dobras da túnica íntima, compostas de tecido conjuntivo rico em fibras elásticas, revestidas em ambos os lados por endotélio, em forma de meia lua que se projetam para o interior da veia. Elas estão mais presentes em veias em que o sangue precisa enfrentar a força da gravidade para retornar ao coração, como as veias dos membros inferiores. Essas válvulas se abrem apenas para um lado, portanto, se houver tentativa de refluxo elas se fecham e quando o sangue flui na direção correta, elas se abrem. As veias, seguindo o mesmo padrão, também serão divididas em três categoriais com características e funções próprias. Sendo assim, logo após o leito capilar, teremos as vênulas que, irão confluir na formação das veias médias que, por fim, irão convergir até formação das grandes veias, como as veias cava superior e inferior. As vênulas pós-capilares são também chamadas de vênulas pericíticas. Elas são formadas apenas por uma camada de células endoteliais, envoltas de pericitos como já vimos. Porém, diferente dos capilares, existem vênulas um pouco maiores que possuem algumas células musculares lisas ao invés de pericitos em sua parede para realizar a função contrátil. As veias possuem uma íntima bem desenvolvida, porém é a túnica adventícia a mais espessa e bem desenvolvida. Esta que frequentemente possui feixes longitudinais de músculo liso. As veias, em grande parte, acompanham artérias em seu trajeto. Por isso, os nomes das veias usualmente recebem o mesmo nome da artéria que acompanham (exemplos: veia femoral, veia subclávia...), porém existem exceções como: as veias cavas (superior e inferior), a veia cefálica, a veia basílica e as veias safenas magna e parva. 4. OUTROS CONCEITOS IMPORTANTES 1. ANASTOMOSES E CIRCULAÇÃO COLATERAL Uma anastomose é uma comunicação entre os vasos sanguíneos que pode criar uma circulação colateral ou uma rota alternativa para a circulação do sangue. Estas podem ser classificadas em quatro tipos: Anastomose término-terminal: quando duas artérias se comunicam diretamente. Anastomose por convergência: quando duas artérias convergem e se fundem. Anastomose transversa: quando um pequeno vaso arterial liga duas artérias transversalmente. Anastomose arteriovenosa: quando há uma conexão direta entre as menores artérias e veias. Estas são importantes para conservação do calor corporal. 2. ARTERIOGÊNESE E ANGIOGÊNESE A arteriogênese é definida como o desenvolvimento de fluxo através de artérias colaterais derivadas de anastomoses arterio-arteriais pré-existentes. Isto ocorre em processos de obstrução parcial ou total que resultam no aumento da pressão na região, forçando a ampliação do diâmetro de vasos pré-existentes, permitindo, desta forma, a passagem de sangue por uma rota alternativa. A angiogênese é o processo de formação de pequenos novos vasos como capilares, resultado de um estímulo isquêmico. Ou seja, o organismo ao passar por momentos em que os vasos existentes não são suficientes, estimula a criação de uma circulação colateral. Porém, ambos os processos necessitam de tempo para ocorrer com eficiência (10). A diferença entre ambos os mecanismos está disposta na Figura 1.7 Figura 1.7: Arteriogênese (A) é a indução de fluxo através de artérias colaterais previamente existentes através do gradiente de pressão gerado pela ausência de fluxo em uma das artérias. Angiogênese (B) é o crescimento de capilares a partir de vasos existentes, processo geralmente engatilhado por hipóxia (retirada da referência 6). 3. BOMBAS VENOSAS Existem três bombas que irão auxiliar no retorno venoso: a bomba arteriovenosa, a bomba musculovenosa e a bomba respiratória. A bomba arteriovenosa é possível devido a uma bainha vascular relativamente rígida que circunda as veias acompanhantes de uma determinada artéria. Sendo assim, quando a artéria se expande com a chegada de um pulso, ela comprime as veias nessa bainha, ordenhando desta forma o sangue no interior das veias em direção ao coração devido ao direcionamento das válvulas venosas. A bomba musculovenosa vai possuir o mesmo objetivo da bomba anterior, porém a ordenha das veias será realizada a partir da contração muscular das extremidades, principalmente dos membros inferiores. Por isso, alguns autores se referem as panturrilhas como corações secundários. Este é o motivo de se colocar um paciente acamado para caminhar assim que possível. As contrações musculares na caminhada irão auxiliar o retorno venoso, além de evitar úlceras por pressão. A bomba respiratória se utiliza da pressão negativa criada durante a expansão torácica na inspiração. O racional disso é que todo sistema de pressão desloca o fluído de onde há mais pressão para as regiões com menores pressões, logo a diminuição da pressão da caixa torácica, auxilia a “sugar” o sangue para a região, consequentemente, facilitando o deslocamento do sangue em direção ao coração. Quadro 1.1: Arteriosclerose e aterosclerose A arteriosclerose é o processo de enrijecimento das artérias resultado da perda de elastina com o envelhecimento do indivíduo. Sendo assim, ocorre uma progressiva perda da capacidade de se acumular energia nas grandes artérias elásticas (perda do Efeito Windkessel), assim como influencia diretamente no aumento da pressão arterial sistólica e sua pressão de pulso. A aterosclerose é um processo complexo de formação de um trombo, resultado de um processo inflamatório iniciado pelo acúmulo de colesterol com posterior agregação de componentes sanguíneos nas artérias. Este processo pode vir a gerar uma obstrução parcial ou total no vaso, suspendendo o suprimento de recursos para os tecidos da região. Caso este processo permaneça, o tecido pode vir a necrosar, ou seja, morte tecidual. 5. CONFERÊNCIAS Confira aqui a aula dinâmica do Medicina Resumida sobre os assuntos abordados nesse capítulo! CAPÍTULO 2 Dinâmica dos Fluídos (hemodinâmica) 1. CASO CLÍNICO Sr. Jorge (vide capítulo anterior), retorna à consulta novamente acompanhado da sua neta Pollyana após um mês com os resultados dos exames, como combinado. Ele alega estar seguindo à risca todas recomendações realizadas na última consulta com exceção dos finais de semana, período em que ainda mantem seus hábitos antigos – “ninguém é de ferro”. Ele informa que já se sente mais disposto e que acreditava que os valores elevados da sua pressão sanguínea registrados na última consulta, provavelmente, se deviam à sua ansiedade. Dr. Barros esclarece que realmente existe essa possibilidade e explica queexiste um fenômeno conhecido como “hipertensão do avental branco”. Esta é definida pelo aumento da pressão dentro do consultório médico provocada pela ansiedade do paciente, porém em outras situações, os valores retornam à normalidade. Sendo assim, após realizar uma nova aferição e verificar uma pressão arterial de 144 x 92 mmHg, Dr. Barros dá uma breve explicação sobre o risco cardiovascular do Sr. Jorge, que não é alto, e que o paciente tem 3 a 6 meses para reduzir a pressão arterial ao valor normal, de acordo com as últimas diretrizes. Então, durante esse tempo, Sr. Jorge terá que demonstrar mais esforço no controle não-farmacológico da pressão arterial e também realizará uma MAPA para excluir a tal “hipertensão do jaleco branco”. Após esclarecer o procedimento, Pollyana tornou a se mostrar curiosa: “o que é essa pressão arterial? Todo mundo tem? O que você ouve nesse aparelho para saber qual é a pressão arterial de meu avô?”. Novamente intrigado com a curiosidade da garota, Dr. Barros cobra a você, afortunado acadêmico, as explicações que ele havia solicitado na última consulta, alegando que precisaria destas informações para responder às novas perguntas. Como você leu com atenção ao Capítulo 1, voou baixo nas explicações. Orgulhoso, Dr. Barros acrescentou que os vasos possuem propriedades fisiológicas elementares, e como seu paciente já tinha uma idade mais avançada, algumas podiam estar mais prejudicadas, contribuindo para a elevação da pressão arterial. Além disso, durante as suas explicações, o preceptor informou que comprimir o braço do Sr. Jorge e depois ir liberando aos poucos, provocava colisões do sangue com as paredes dos vasos daquele local e que essas colisões poderiam ser auscultadas. Através destes sons e olhando no relógio (manômetro) era possível determinar indiretamente a pressão arterial. 1. POSSÍVEIS PALAVRAS DESCONHECIDAS “Pressão arterial”: Vide capítulo “MAPA”: Monitorização Ambulatorial da Pressão Arterial. Esta é realizada através de um aparelho que o paciente carrega consigo por 24hs e de tempos em tempos, registra a pressão arterial do paciente. Dessa forma é possível avaliá-la em diversos cenários da rotina. 2. PALAVRAS-CHAVES “Pressão arterial”, “mudança de hábitos”, “MAPA”, “aferir a pressão arterial “, “choques do sangue com as paredes desse vaso que podiam ser auscultados”, “propriedades dos vasos 3. OBJETIVOS Compreender as propriedades dos vasos sanguíneos Compreender a pressão arterial e a técnica de aferição indireta 2. DISTRIBUIÇÃO DO VOLUME SANGUÍNEO O volume de sangue que circula em um indivíduo é de aproximadamente 7% de seu peso corpóreo. Este volume em um estado fisiológico é constante. Ou seja, se houver aumento do volume em uma região é porque houve a redução em outra. Portanto, há um gerenciamento baseado nas necessidades dos sistemas. Se o indivíduo realiza uma alimentação volumosa, por exemplo, haverá uma maior demanda do sistema digestório e mais sangue será direcionado a este trato. Consequentemente, considerando o volume absoluto constante, ocorrerá uma pequena redução da quantidade de sangue em outros sistemas. Esta redução quando ocorre no cérebro proporciona o estado de sonolência pós-prandial. Outro exemplo que aprofundaremos adiante é o estado de luta ou fuga. Uma situação em que o indivíduo seja exposto a um estressor (situação de risco de vida, falar em público, etc.) e o corpo responde preparando o mesmo para reagir a situação. Ou seja, prepara o indivíduo para o enfrentamento ou para a fuga. Desta forma, os sistemas nervoso, cardiovascular, respiratório e muscular são priorizados. E dentre diversas respostas que a situação promove está o aumento do fluxo sanguíneo para estes sistemas. Estes dois exemplos servem para ilustrar que há esse gerenciamento por demanda que é resultado da regulação neuroendócrina. E como vimos no capítulo anterior, essa função de regular o fluxo sanguíneo na macrocirculação é artérias musculares e na microcirculação das arteríolas. Sendo estas as principais atuantes nesse gerenciamento. Entretanto, apesar de estarmos analisando uma situação estável, constantemente o nosso corpo precisa alterar esse volume. Seja reduzindo-o através da urina e do suor, assim como também o aumentando, pelo estímulo da sede e da fome. A distribuição do volume no sistema cardiovascular é de aproximadamente 84% na circulação sistêmica, 9% na circulação pulmonar e 7% no coração. Sendo que desses 84% presentes na sistêmica, 64% se encontra nas veias, 13% nas artérias e 7% nas arteríolas e capilares sistêmicos. 3. PROPRIEDADES DOS VASOS SANGUÍNEOS Imagine um aparato de bombeamento de algum líquido que consegue, de acordo com as próprias necessidades, através de um software avançado, reduzir ou aumentar o seu diâmetro, suas pressões internas, modificar o fluxo em seu interior, deixar mais líquido no reservatório e menos líquido corrente ou vice-versa, aumentar a força da bomba – tudo sem a necessidade de um operador manual. Pois bem, esta máquina perfeita existe e está dentro de cada um de nós. Os vasos sanguíneos são mais do que apenas tubos em um sistema de hidráulico de pressão. Como vimos, são estruturas de lúmen adaptável, e quem controla isso não é um software. 1. FLUXO SANGUÍNEO O fluxo sanguíneo é o movimento contínuo do sangue através do sistema cardiovascular, resultado dos gradientes de pressão criados pela bomba do sistema, o coração. Ou seja, se forcarmos nossa atenção em uma porção do sangue, esta irá percorrer de forma contínua o sistema de uma zona de maior pressão para uma zona de menor pressão. As paredes dos vasos promovem, contra o líquido circulante, uma resistência na forma de atrito. Em situações de normalidade, esta resistência será maior na periferia do vaso, onde há contato direto com as paredes, do que no centro, onde o sangue terá mais liberdade de fluir. Ok até aqui? Este dado leva a duas conclusões importantes no entendimento na dinâmica dos fluidos: o primeiro é que quanto menor for o calibre do vaso, maior será a proporção de sangue em contato com sua parede e maior será a resistência à passagem do fluxo sanguíneo; o segundo é que esta disposição da passagem do sangue mais lento pela periferia resulta na formação de lâminas, camadas concêntricas de sangue, em que a velocidade do fluxo aumenta quanto mais se aproxima do centro. Este é o conceito de fluxo laminar, como podemos ver na Figura 2.1, painel B. Figura 2.1: Fluxo laminar x Fluxo turbulento (retirada do Guyton). Entretanto, caso haja algum tipo de obstrução por placas ateroscleróticas, se o sangue possuir uma densidade elevada, ou ainda se as propriedades elásticas das artérias forem perdidas, o fluxo perde essa característica laminar, como podemos ver na Figura 2.1, painel C e se torna turbulento, chocando-se contra as paredes do vaso e contra o próprio sangue. Apesar do fluxo turbulento geralmente estar associado a situações patológicas, podemos utilizá-lo a nosso favor para aferir indiretamente a pressão arterial de um indivíduo, e isto se dá porque estes choques desorganizados contra a parede do vaso são audíveis ao estetoscópio. Sendo assim, o método de aferição da pressão arterial se baseia, primeiramente, na obstrução total do vaso que ocorre ao se insuflar o manguito do esfigmomanômetro a uma pressão maior que a que é realizada pelo sangue de dentro do vaso. Ao desinsuflar lentamente o manguito, o examinador perceberá o momento em que a pressão sanguínea é suficiente para vencer a obstrução mecânica, iniciando um fluxo turbulento audível através da obstrução parcial e pode-se verificar no manômetro a pressão que foi necessária para vencer a resistência (Figura 2.2). Essa será considerada a pressão arterial sistólica. Você pode conferir a descrição completa do método no quadro 2.1. Quadro 2.1: A aferição da pressão arterial Passos para obtenção da pressão arterial pelo método indireto segundo a VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão: Preparo do paciente: 1. Explicar o procedimento ao paciente e deixá-lo
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